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HISTÓRIA DAS ARTES VISUAIS

Ao contemplarmos as obras de arte, produzidas desde o período


primitivo até o contemporâneo, podemos, de certo modo, entender
como nossos ancestrais viveram. A arte nos permite conhecer nossa
origem e identidade como sociedade, além de ser uma maneira de nos
comunicarmos com as gerações anteriores e futuras. As representações
artísticas representam uma espécie de língua universal. Por isso,
entender as artes visuais é importante para qualquer profissional que
venha a trabalhar com algum tipo de criação, seja artística, industrial,
publicitária ou com design, moda, educação, decoração, arquitetura etc.

ANA CRISTINA MAGALHÃES JARDIM

Código Logístico Fundação Biblioteca Nacional


ISBN 978-85-387-6574-5

59133 9 788538 765745


História das
artes visuais

Ana Cristina Magalhães Jardim

IESDE
2019
© 2019 – IESDE BRASIL S/A.
É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito da autora e do detentor
dos direitos autorais.
Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A.
Imagem da capa: Avgust Avgustus/vvoe/ABO PHOTOGRAPHY/cobalt88/Shutterstock

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
J42h
Jardim, Ana Cristina Magalhães
História das artes visuais / Ana Cristina Magalhães Jardim. - 1. ed. - Curitiba [PR] :
IESDE Brasil, 2019.
100 p. : il.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-387-6574-5
1. Artes - História. I. Título.
CDD: 700.9
19-60817
CDU: 7(09)

Todos os direitos reservados.

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Batel – Curitiba – PR
0800 708 88 88 – www.iesde.com.br
Ana Cristina Magalhães Jardim
Doutoranda e mestre em História pelo Programa de Pós-Graduação em História da
Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). Especialista em Cultura e Arte Barroca pelo
Instituto de Filosofia, Arte e Cultura da UFOP e licenciada em História pela mesma instituição. Foi
premiada como pesquisadora bolsista da Biblioteca Nacional.

Foi professora de História da Arte e do Teatro no curso de Artes Cênicas da UFOP e do


curso de formação de atores na Fundação Clóvis Salgado, Palácio das Artes. Autora de diversos
artigos científicos e livros sobre história da arte, teatro, cinema e educação. É professora de nível
superior e produz conteúdo didático para EaD.
Sumário

Apresentação 7

1 Da pintura rupestre à reprodução da obra de arte 9


1.1 Arte rupestre: os primeiros desenhos 9
1.2 Arte e suporte: papel, tela ou parede 10
1.3 A gravura e suas técnicas 16

2 Escultura: arte tridimensional 25


2.1 Pedra, papel, tesoura! 25
2.2 Renascimento e temas clássicos na escultura 29
2.3 Outros materiais para esculturas 31
2.4 Escultura no Brasil 33
2.5 Escultura contemporânea 36

3 Fotografia e cinema: a captura do momento e do movimento 41


3.1 Fotografia, primeiros experimentos (origem) 41
3.2 Cinema: fotografia em movimento 47

4 Artes cênicas: a arte da imitação 59


4.1 Teatro: origem e evolução 59
4.2 Origem do teatro no Brasil 67
4.3 Variações teatrais: o palco, a atuação 68
4.4 Dança: corpo em movimento 74
4.5 Ópera: música, teatro e dança reunidos 77

5 O mundo contemporâneo e as artes visuais 83


5.1 Arte contemporânea 83
5.2 Alguns movimentos dentro da arte contemporânea 84
5.3 Performance e artes visuais 88
5.4 Poéticas visuais 89
5.5 Instalação artística 91
5.6 Espaços: museus, galerias de arte e bienais 92

Gabarito 99
Apresentação

A denominação artes visuais, adotada nesta obra, representa um agrupamento de


subconjuntos de linguagens artísticas. Em cada capítulo deste livro, observamos o percurso
de cada tipo de representação artística, como pintura, desenho, gravura, escultura, fotografia,
cinema e artes cênicas. Algumas delas têm raízes no período em que o homem ainda era um ser
primitivo, marcando o início da compreensão humana sobre o mundo. Com o passar dos anos,
a humanidade passou a compreender que poderia modificar seu modo de viver, dominando e
processando recursos naturais na fabricação de inúmeros artefatos, inclusive os artísticos. A
ciência, o conhecimento e a arte acompanharam desde o princípio todo esse caminho trilhado
pelo ser humano.

Ao contemplarmos as obras de arte, produzidas desde o período primitivo até o


contemporâneo, podemos, de certo modo, entender como nossos ancestrais viveram. A arte nos
permite conhecer nossa origem e identidade como sociedade, além de ser uma maneira de nos
comunicarmos com as gerações anteriores e futuras. As representações artísticas representam
uma espécie de língua universal. Por isso, entender as artes visuais é importante para qualquer
profissional que venha a trabalhar com algum tipo de criação, seja artística, industrial, publicitária
ou com design, moda, educação, decoração, arquitetura etc.

Pensando nisso, ao final de cada capítulo, temos atividades de revisão para promover um
melhor aprendizado e fixar o conhecimento adquirido. É possível, também, encontrar nesta obra
diversas dicas de livros, filmes e sites para instigar sua sede de conhecimento sobre as artes.

Vamos começar nossa trajetória pela história das artes?

Boa viagem!
1
Da pintura rupestre à reprodução da obra de arte

Para que serve, afinal, a arte? Refletindo brevemente sobre o papel da arte na sociedade,
podemos perceber que ela acompanha a nossa história e foi, desde sempre, um meio de marcar nossa
existência no mundo, mesmo que os primitivos não tivessem sobre essa forma de expressão a mesma
concepção que temos hoje.
Neste capítulo, abordaremos o percurso das artes visuais pelos desenhos, pinturas e
gravuras, além de conhecer sua trajetória em diversas práticas criativas, desde os tempos
primitivos até os dias atuais.

1.1 Arte rupestre: os primeiros desenhos


Chamamos de arte rupestre as representações artísticas de um período entre 35.000 e
10.000 a.C., caracterizadas por pinturas e desenhos feitos por sociedades primitivas, que podem
ser observados, geralmente, em formações rochosas e encontrados em vários lugares do mundo,
inclusive no Brasil. Curiosamente, encontramos semelhanças entre essas figuras, mesmo que esses
povos jamais tenham tido contato entre si para compartilhar qualquer ideia de arte. Por isso,
concluímos que o desejo de produzir ou apreciar a arte é inato aos seres humanos.
Figura 1 – Arte rupestre

Dante Petrone/Shutterstock

Caverna das mãos. Patagônia, Argentina.

Podem ser considerados arte desde esses desenhos mais rudimentares até os que apresentam
mais requinte e segurança no fazer, no uso de cores, nas proporções e na precisão do traço.
10 História das artes visuais

Segundo Janson (1996), as pesquisas sobre essa representação artística primitiva sugerem
que sua evolução até um estágio mais avançado (Figura 2) foi lenta e acompanhou o próprio avanço
das sociedades.
Figura 2 – Arte rupestre

Caverna Lascaux. França [ca.15.000 a.C.].

Os desenhos encontrados em cavernas nos permitem identificar o modo de subsistência


daqueles povos. Pinturas de animais, por exemplo, sugerem uma alimentação baseada fortemente
na caça e em um modo de vida situado entre o período de nomadismo e o momento em que
os humanos passaram a se agrupar, fixando-se na terra, construindo suas moradias e plantando
o próprio alimento. Essa trajetória foi registrada por desenhos e utensílios encontrados por
antropólogos, demonstrando, também, o aperfeiçoamento da técnica no fazer artístico.
A arte rupestre possibilitou, ainda, saber em que acreditavam os homens dos períodos
primitivos, que vão do Paleolítico ao Neolítico. Mesmo os ancestrais mais distantes tinham suas
crenças, que eram guiadas pelo temor e pelo desconhecimento a respeito da vida, da morte e
das forças da natureza, como o sol, o trovão e as calamidades naturais para as quais não tinham
explicação e que os faziam recorrer a rituais – fato que demonstra alguma crença em um ser divino.
Assim como em outras áreas, estudiosos divergem em alguns pontos quanto à arte rupestre.
Não há, portanto, um consenso sobre o que é considerado arte, sobre as motivações dos povos que
as produziram ou se a produção daqueles desenhos era relacionada a um tipo de ritual de caça,
fertilidade das plantações, crença ou religiosidade.

1.2 Arte e suporte: papel, tela ou parede


Chamamos de suporte todo material sobre o qual é realizada a obra artística, como cavernas,
papel, telas ou paredes; nesse caso, trata-se dos objetos artísticos bidimensionais, elaborados por
meio de linhas e pontos.
A partir do momento em que os seres humanos se tornaram capazes de extrair matéria­
‑prima da natureza e transformá-la em artefatos que facilitavam a vida, foi possível, também,
Da pintura rupestre à reprodução da obra de arte 11

avançar no modo de fazer arte. A manipulação de vários materiais nos permitiu fabricar desde
vasos cerâmicos, lanças e casas – voltados à sobrevivência – até papel e tinta, que tinham como
funcionalidade produzir arte. Posteriormente, foram criados tecidos especiais, sobre os quais eram
realizadas pinturas que foram emolduradas e que, após séculos, permanecem em bom estado e à
disposição para apreciação.
Infelizmente, não é possível abranger aqui todas as possibilidades sobre desenho, pintura
e seus materiais e suportes. Abordaremos, portanto, os aspectos mais importantes do desenho e
da pintura.

1.2.1 Desenhos: estudo ou arte final


O desenho pode ser uma obra de arte em si ou um esboço para a concepção de uma pintura,
escultura ou obra arquitetônica. Leonardo da Vinci, por exemplo, tornou-se conhecido por fazer
uso do desenho para diversos fins. Considerado um gênio da arte, Da Vinci fez pinturas, afrescos,
desenhos de invenções e estudou áreas variadas, como anatomia humana e equipamentos de
guerra. Para a realização de todos esses trabalhos, o artista utilizou o desenho, como esboço ou
produto final. O Homem vitruviano e o seu Autorretrato, representados na Figura 3, estão entre
seus desenhos mais conhecidos.
Figura 3 – Obras de Leonardo da Vinci
A Homem vitruviano B Autorretrato
Janaka Dharmasena/Shutterstock

Fonte: DA VINCI, L. Homem vitruviano, 1492. Fonte: DA VINCI, L. Autorretrato. ca. 1512.
Tinta sobre papel: 24,5 x 34,3 cm. Milão, Itália. Sanguínea sobre papel: 33,3 cm x 21,6 cm.
Biblioteca Reale, Turim.

Os desenhos também são importantes para registrar a história. Entre os séculos XVIII e
XIX, por exemplo, inúmeros viajantes de todo o globo vieram ao Brasil em caráter exploratório.
12 História das artes visuais

As grandes navegações e a colonização da América abriram um novo mundo, e as histórias de


maravilhas naturais encantavam os europeus que queriam conhecer nossas terras. O desenho
se tornou, então, a maneira mais fácil e rápida encontrada pelos viajantes para reproduzir e
transportar as inúmeras imagens de suas descobertas. O desenho da Figura 4, publicado pelo
viajante Jean-Baptiste Debret quando voltou para seu país, a França, representa um índio do Brasil
no século XIX.
Figura 4 – Índio brasileiro, por Jean-Baptiste Debret (Paris, 1844).

Marzolino/Shutterstock
Fonte: DEBRET, Jean-Baptiste. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. São Paulo: Edusp, 1978.

Diversos livros sobre o Brasil, com imagens da natureza, dos índios, dos animais e da fauna,
foram publicados na Europa. Os desenhos dos viajantes foram os responsáveis por mostrar a nova
terra ao mundo. Por se tratar de uma época em que viajar longas distâncias não era algo muito
acessível, os desenhos acabaram sendo uma das únicas formas de muitas pessoas conhecerem
outros lugares, povos e estilos de vida. Além de serem belos trabalhos, esses desenhos nos
permitiram conhecer melhor como era o nosso país, colaborando, assim, para a reconstrução da
nossa memória.

1.2.2 Afrescos
Avançando um pouco mais nas possibilidades das artes visuais, trataremos agora de
um suporte permanente e fixo: as paredes. Nelas podemos encontrar representações artísticas
como afrescos, murais e grafites, que apresentam semelhanças e diferenças entre si. Entre as
características comuns, podemos observar que todas demandam um planejamento em escala,
pois são pinturas de grande porte; sua execução pode demorar muito tempo; e necessitam de
grande quantidade de material, bem como andaimes, escadas, auxiliares, além da preocupação
Da pintura rupestre à reprodução da obra de arte 13

com a segurança do artista. Já a principal diferença entre os afrescos, os murais e os grafites é


a técnica de produção empregada, em parte devido aos materiais disponíveis na época em que
essas representações eram executadas.
Os afrescos têm origem nos períodos greco-romano e medieval. Segundo Janson (1996), os
mais renomados são datados do período do Renascimento europeu, sendo que os mais célebres –
como A escola de Atenas, produzido pelo artista Rafael, entre 1510 e 1511, e o da Capela Sistina,
feito por Michelangelo, entre 1508 e 1512, a pedido do Papa Julio II – são encontrados no Vaticano.
A técnica original para o afresco consiste em trabalhar com a parede ainda fresca, isto é, a cobertura
final da parede (ou o que hoje seria conhecido como reboco) vai sendo executada junto com a
pintura enquanto, com a massa fresca, vai se aderindo aos pigmentos em pó.
Segundo Janson (1996, p. 213), Michelangelo, ao produzir A Capela Sistina, “criou uma
obra-prima cuja importância é verdadeiramente memorável. O teto é um gigantesco organismo
com centenas de figuras distribuídas ritmicamente no interior da estrutura arquitetônica”. Na
Figura 5, podemos observar o teto da Capela Sistina, no Vaticano.
Figura 5 – Teto da Capela Sistina

Aaron Logan/Wikimedia Commons

Michelangelo levou quatro anos para pintar as centenas de figuras e passagens bíblicas em
vários nichos entre as estruturas arquitetônicas, com uma pintura diferente em cada um deles. Lá
estão imagens bastante conhecidas, como O juízo final e A criação do homem, na qual Deus toca o
dedo de Adão, conforme ilustra a Figura 6.
14 História das artes visuais

Figura 6 – Pintura da Capela Sistina

Wikimediacommons
Fonte: MICHELANGELO. A criação do homem. 1510. Afresco: 280 x 570 cm. Capela Sistina, Vaticano, Roma.

Além das obras já citadas na seção anterior, dentro da categoria de afrescos, Leonardo da
Vinci produziu, entre 1495 e 1498, A última ceia.

1.2.3 Mural e grafite


Apesar de serem representações artísticas parecidas, as técnicas e as temáticas usadas para a
pintura de murais são diferentes em comparação às utilizadas nos afrescos. Por exemplo, os murais
criados pelo pintor Diego Rivera trazem temas contemporâneos e retratam cenas de produção
capitalista, momentos cotidianos, parques, a vida do povo mexicano e dos operários etc.

Você pode acessar imagens dos trabalhos de Rivera e conhecer um pouco mais
sobre o artista neste site:

ARTE E ARTISTAS. Diego Riveira. 2019. Disponível em: https://arteeartistas.


com.br/diego-rivera/. Acesso em: 27 nov. 2019.

No século XX, o grafite expandiu as possibilidades estéticas dos murais, que passaram a
ganhar ruas e ambientes públicos como forma de manifestação e apropriação do espaço urbano.
Seu surgimento se deu durante o movimento da contracultura, conquistando representatividade
e dando visibilidade a grupos sociais que, muitas vezes, eram marginalizados, tornando-se, assim,
a expressão artística de comunidades periféricas das grandes cidades. Por essas características, o
grafite é frequentemente considerado uma arte marginal.
De acordo com Rink (2015, p. 21), “o estudo sobre o graffiti – enquanto produção objetiva
e subjetiva no meio urbano – contribui e repercute socialmente, visto o grande impacto que esta
Da pintura rupestre à reprodução da obra de arte 15

forma de arte tem tido nas grandes cidades de todo o mundo”. Ainda hoje o grafite é representado
por grandes pinturas realizadas em muros, fachadas de prédios, viadutos e outros espaços urbanos
ao redor do mundo. É uma arte bastante democrática, além de ser de fácil acesso e apreciação, uma
vez que, por serem um meio de contestação do estado das coisas, estão sempre visíveis para toda a
comunidade. Passamos por essas pinturas diariamente. Convivemos com elas.
O grafite vem ganhando uma visibilidade diferente daquela de sua origem. Ele ainda é
usado com o objetivo de contestar e expor as mazelas urbanas, mas, no momento presente, muitos
grafiteiros são reconhecidos internacionalmente como artistas e convidados a grafitarem espaços
urbanos e privados, assim como os murais tradicionais.
A técnica usada na produção do grafite, a exemplo dos afrescos e murais, também deve
levar em consideração um planejamento – que inclui a produção de um desenho prévio a ser
reproduzido em grande escala –, mas se diferencia pelo uso mais tradicional de tinta spray. A
maioria dessas pinturas é efêmera, ou seja, não é feita para durar muito tempo. A linha que separa
o mural e o grafite é tênue, e diversos artistas se dedicam aos dois.
O brasileiro Eduardo Kobra, por exemplo, se autodenomina muralista, mas, segundo o site
oficial do artista (KOBRA, 2019), ele iniciou sua carreira como grafiteiro na periferia de São Paulo.
Existem também outros artistas dessa modalidade que alcançaram reconhecimento mundial.
É o caso dos paulistas Gustavo e Otávio Pandolfo, conhecidos como OSGEMEOS, que começaram
a se destacar nos anos 1980 e passaram a ser convidados para pintar grandes espaços urbanos em
todo o mundo. Um dos famosos trabalhos deles foi o grafite produzido em silos de concreto em
Vancouver, no Canadá, no qual há a representação de figuras humanas estilizadas, que olham para
a fábrica e para a baía, humanizam e se integram ao ambiente urbano industrial.

Você pode acessar, via QR code, a imagem da obra que marcou a


presença dos gêmeos na Vancouver Biennale, entre 2014 e 2016.
Trata-se de um mural de 360°, com 20 metros de altura e mais de
2.000 m² (OSGEMEOS, 2019).

Podemos perceber que as artes visuais realizam um percurso que acompanha as sociedades
e o período em que estão inseridas, adaptando as técnicas, o estilo artístico, os materiais
disponíveis, o suporte e a dimensão da obra, deslocando-se de espaços interiores para exteriores
e fixando, cada uma no seu tempo, o modo de viver, pensar e se relacionar consigo e com suas
crenças e os desafios humanos.
16 História das artes visuais

1.3 A gravura e suas técnicas


A gravura é considerada uma das maneiras mais antigas de gravar cópias de um desenho,
sendo a xilogravura e a litogravura variações dessa técnica.
No mundo informatizado em que vivemos, que oferece recursos facilitadores de
comunicação, transmissão e impressão de imagens e textos, podemos não perceber a importância
dessas descobertas para os sujeitos que viveram séculos atrás, momento em que aperfeiçoamentos
na reprodução de imagens e livros ilustrados eram muito lentos.
Tratava-se de um período em que a maioria das pessoas não tinha acesso à leitura. A partir daí
temos dois pontos importantes na reprodução de cópias: o primeiro é que as imagens facilitavam a
compreensão dos conteúdos – bíblicos, por exemplo; o segundo é que os livros feitos primeiramente
por meio da xilografia e, depois, da tipografia, foram se tornando gradativamente mais baratos,
contribuindo para o crescimento da alfabetização na Europa. A Figura 7, a seguir, mostra uma das
páginas iniciais de um livro publicado com essas técnicas, reproduzindo textos e imagens.
Devido ao aumento de interesse das Figura 7 – Livro do filósofo e arcebispo italiano
Nicolai Perotti
pessoas em possuir as imagens ou os livros

IgorGolovniov/Shutterstock
ilustrados, as gravuras se popularizaram e houve
um aumento de sua demanda. Antes da gravura,
as imagens e os textos dos livros precisavam
ser copiados e desenhados à mão – o que era
realizado, por exemplo, nos mosteiros –, de modo
quase artesanal, tornando os livros muito caros
e acessíveis apenas a uma camada mais rica da
população.
A gravura foi trazida do Oriente para
a Europa, por volta do século XV, durante o
período das navegações e das descobertas de
novos mundos. Segundo Costella (2003, p. 10),
“os chineses praticam a xilografia há mais de um
milênio e meio. Empregaram-na inicialmente
para imprimir orações budistas e, depois, cartas
de baralho e papel-moeda”.
Existem diversas maneiras tradicionais e
antigas de registrar imagens e textos em suportes Fonte: PEROTTI, Nicolai. Horativs. 1543.

diferentes. Vamos analisar, por meio do quadro


a seguir, um breve resumo de algumas dessas
técnicas.
Da pintura rupestre à reprodução da obra de arte 17

Quadro 1 – Maneiras de gravar ou imprimir

Nome Tipo de matriz Formas de gravar Suporte Observação

De topo – sentido
transversal da
madeira.
Xilogravura Madeira Entalhe Papel ou tecido
Ao fio – paralela
ao fio da madeira
(tábua).

Comumente
Gravura Metal Relevo Papel chamada de gravura
feita em metal.

Não é feito o
entalhe, a técnica
consiste em
desenhar com um
lápis gorduroso,
aplicar substâncias
Litogravura Pedra Plana Papel
próprias para
fixação e gravar
o desenho. Ela
permite reaproveitar
a matriz várias
vezes.

Matriz feita em
um tipo de tecido
Serigrafia Tecido Permeação Tecido próprio que permite
vazar o desenho a
ser impresso.

Os tipos móveis de
metal eram moldes
de letras separadas
Letras ou tipos Papel, livros e para formar
Tipografia Metal
móveis jornais palavras em uma
matriz, formando
páginas a serem
impressas.
Fonte: Elaborado pela autora.

A partir do período em que as grandes navegações chegaram à Europa com muitas


novidades – como sedas, porcelanas e especiarias do Oriente, o que culminou com a colonização
da América e, consequentemente, do Brasil –, iniciou-se uma troca de experiências em vários
âmbitos, influenciando também a arte. Entre essas experiências, Gutenberg, conhecido como o
inventor da impressão, foi inspirado por técnicas trazidas do Oriente pelos viajantes europeus e
conseguiu ampliar a produção de livros, incluindo o uso de imagens. Ele foi o responsável por criar
um processo de produção em maior escala.
18 História das artes visuais

1.3.1 Xilografia
Conheceremos um pouco melhor a arte de xilogravar, que é uma das maneiras mais antigas
de fazer cópias. A xilografia é um modo de reproduzir uma gravura a partir de uma matriz talhada
na madeira – o que possivelmente facilitava a sua produção, visto que a madeira era a matéria mais
fácil de ser encontrada e talhada. Essa aparente simplicidade permitiu enorme riqueza e diversidade
de produções artísticas, algo que permanece até os dias atuais.
Para cada imagem a ser multiplicada, é feita uma matriz com sulcos talhados na madeira e
que vão espelhar as formas e contornos no papel. O que caracteriza a gravura como arte é o olhar
e a produção do artista. A xilogravura se tornou um meio de difusão cultural e religiosa, sendo
bastante usada para fazer imagens de santinhos, orações, cartas de baralho e ilustrações de livros.
Para produzir uma matriz que será utilizada para fazer várias cópias por meio da técnica
da xilogravura, é necessário um pedaço de madeira com um lado liso, no qual será entalhada a
imagem. O artista começa fazendo um desenho a lápis (Figura 8a), ou seja, um esboço da imagem
que pretende reproduzir. A partir desse rascunho, ele vai entalhando, com pequenos formões de
metal, sulcos sobre as linhas do desenho esboçado (Figura 8b). O passo seguinte é aplicar tinta
nessa matriz utilizando um rolo, o que permitirá uniformidade à gravura e manterá os sulcos em
branco, reproduzindo o desenho ao se prensar a matriz sobre o papel. Resumidamente, funciona
como um grande carimbo feito de madeira.
Figura 8 – Xilogravura que ilustra o processo de xilografia (1568).
A Profissional fazendo o esboço B Profissional entalhando a matriz na madeira

Fonte: AMMAN, Jost. 1568.

Com o tempo e o advento da Revolução Industrial, a xilografia perdeu sua função de


ilustração e, dessa forma, passou a se tornar a representação artística que conhecemos ainda hoje.
De acordo com o pesquisador e artista da xilografia Costella (2003, p. 44),
Da pintura rupestre à reprodução da obra de arte 19

dispensada da função utilitária, a xilografia, entretanto, veio a conhecer um


riquíssimo renascimento no século vinte. Muitos artistas, dentre eles Gauguin,
Munch e Vallotton, lançaram mão da matriz de madeira para se expressarem
livremente, comprometidos apenas com objetivos estéticos.

Henri Matisse, Lasar Segall e Pablo Picasso também produziram obras por meio da
xilografia. Apesar dos avanços tecnológicos do século XXI, a xilografia continua a ser utilizada
por muitos artistas.

1.3.2 Xilografia no Brasil


Oficialmente, a xilogravura chegou ao Brasil somente após a vinda da família real portuguesa
para o Rio de Janeiro em 1808. Antes disso, a criação de toda e qualquer fábrica era proibida
por aqui. Com a instalação da Imprensa Régia, que passou a produzir livros e jornais, a arte da
xilografia também se firmou em terras brasileiras. Em 1816, chegou à corte instalada no Brasil
a Missão Artística Francesa, mas seu objetivo por aqui foi apenas parcialmente atingido com a
criação, em 1826, da Academia Imperial de Belas Artes do Rio de Janeiro. Dentre os mais de vinte
artistas que vieram nessa missão, estava o pintor e gravador Jean-Baptiste Debret, que fez inúmeras
gravuras retratando as paisagens e os costumes brasileiros.
Vale lembrar ainda que, naquele momento – início do século XIX–, todos os artistas,
incluindo os xilógrafos, eram de outras nacionalidades. Entretanto, apesar de ser uma técnica muito
valorizada e de grande demanda no período, somente em 1860 foi criado um curso de xilografia
no Rio de Janeiro, capital do Brasil na época. Os primeiros xilógrafos brasileiros foram autodidatas
e aprenderam o ofício trabalhando com os profissionais estrangeiros, e o aprendizado formal só
começou após o surgimento das primeiras escolas de arte e xilografia. É importante mencionar
esse detalhe para lembrar a importância das escolas de arte, que, se comparadas a outros países,
demoraram a ser implantadas no Brasil.
Com relação à arte popular brasileira, um exemplo do uso da xilografia é a literatura de
cordel, caracterizada por pequenos livros de versos ilustrados, surgidos a partir do final do
século XIX por “cantadores”, que, em sua maioria, eram naturais do Norte e do Nordeste do
Brasil. A tradição reúne a música ao cordel, cujos versos, recitados em praças e feiras, contam
com o acompanhamento musical.
Figura 9 – Xilografia usada pela literatura de cordel
Um fato curioso sobre a
ARY FALCAO/Shutterstock

literatura de cordel é que ela leva esse


nome por ficar exposta para venda em
cordas – os cordéis.
20 História das artes visuais

Durante muito tempo, esse tipo Figura 10 – Cordéis em exposição nas cordas que lhe deram
o nome
de arte popular usou a xilografia para

Viniciusmc/Wikimedia Commons
manter vivo um repertório de histórias
e personagens como cangaceiros,
padres, coronéis e o povo típico
do Norte e do Nordeste brasileiro.
Atualmente, podemos encontrar com
mais facilidade um estilo xilográfico
feito em equipamento gráfico.
Por outro lado, no século XX,
muitos artistas retornaram ao modo
original de trabalhar com a xilografia,
mantendo viva a tradição. Em matrizes de vários tamanhos, suas obras ilustravam cenas, paisagens
e costumes nordestinos – as baianas, a capoeira e o frevo, por exemplo. Existiam também artistas
que criavam cenas urbanas e cenas da realidade das cidades em que viviam.
Dedicamos uma parte significativa desta obra à xilografia a fim de compreendermos que
algumas formas artísticas se reinventam ao longo do tempo. Assim, ainda podemos encontrar
artistas que deixam sua marca por meio dessa técnica em várias partes do mundo e em ateliês por
todo o Brasil.

1.3.3 Litografia
Na litografia, a matriz é feita na pedra calcária, em superfície plana, isto é, sem entalhe. O
artista que deseja trabalhar com essa técnica deve ter uma preparação que o permita realizar as
etapas na sequência correta, principalmente na repulsão entre óleo e água.
Figura 11 – Processo de litografia Dmytro Vietrov/Shutterstock
Da pintura rupestre à reprodução da obra de arte 21

Por ser tecnicamente mais difícil, a litografia é menos popular e, de certo modo, menos
acessível do que a xilografia. Em contrapartida, esse princípio possibilita um trabalho mais
detalhado, no qual o artista desenha na pedra plana, com um tipo de lápis “gorduroso”, a imagem
a ser espelhada e gravada no papel. Em seguida, aplica a tinta na matriz, que deve se fixar no óleo
do desenho, que, por sua vez, ao ser prensado no papel, será transferido. Outro detalhe importante
dessa técnica é que o desenho pode ser apagado para que a pedra seja reutilizada em outra gravação.
No século XIX, muitos artistas se deslocaram para o Brasil e realizaram trabalhos em
litografia, nos quais podemos observar a riqueza de detalhes do traço mais fino, que evidencia
figuras humanas e da natureza e cria nuances com mais facilidade, como a perspectiva que dá a
noção de profundidade às imagens planas.
Figura 12 – Rio de Janeiro (século XIX).

Fonte: RUGENDAS, Johann Moritz. Vista da igreja. Rio de Janeiro, século XIX.

A litografia foi inventada em 1796 pelo alemão Alois Senefelder e eliminou a necessidade
da existência de duas etapas diferentes para produzir a matriz. Na xilografia, era preciso fazer
primeiramente o desenho e, depois, o trabalho de entalhe. A litografia, então, possibilitou ao artista
desenhar diretamente na pedra calcária. Se, por um lado, desenhar diretamente na matriz parecia
mais difícil devido às etapas de execução, por outro, era mais rápido e simples, e o desenho, por
depender somente dos traços do artista, acabava sendo mais preciso.

1.3.4 Uso de cores na gravura


A gravura não precisa ser sempre em preto e branco. É possível, também, produzir ilustrações
que utilizem a quantidade de cores desejada pelo autor. Para isso, basta que ele aplique, na matriz,
cada cor isoladamente e grave uma de cada vez sobre o papel, de modo que a sobreposição das
imagens coincida. Isso pode ser realizado utilizando-se uma matriz para cada cor ou pintando cada
parte da mesma matriz com cores diferentes. A técnica depende do autor e do tipo de imagem a ser
gravada, como a ilustrada na Figura 13.
22 História das artes visuais

Na litogravura Aqueduto do Rio de Janeiro (Figura 14), feita pelo artista Johann Jacob
Steinmann por volta de 1844, é possível observar outro exemplo do uso de cores. Nesse caso, ele
pintou sobre a litografia tradicional, produzindo, após a gravação, o efeito das cores como em uma
pintura natural.
Figura 13 – Xilografia colorida Figura 14 – Litogravura aquarelada
japonesa

Wikimedia Commons

Fonte: STEINMANN, J. J. Aqueduto do Rio de


Janeiro. 1844.

Fonte: HIROSHIGE, A. Procissão noturna nas


montanhas. 1985. Xilografia: 36.4 x 24.6 cm.
Japão.

Assim como na litografia, a gravura produzida por Figura 15 – Xilografia colorida

Wikimedia Commons
xilografia também pode ser colorida, conforme mostra a
Figura 15.
Como pudemos perceber, a arte de produzir
a xilogravura passa por um processo praticamente
artesanal, tanto na produção de imagens com uma única
cor quanto nas coloridas, nas quais o artista precisa gravar
as diferentes cores, cada uma de uma vez, precisamente
no mesmo lugar. Essas sutilezas mantêm, ainda hoje,
muitos apaixonados por essa técnica artística.

1.3.5 A obra de arte na era de sua


Fonte: BRANDT, Hanna. Paraná. 2018.
reprodutibilidade técnica
Fechando este capítulo, falaremos brevemente sobre um texto fundamental para todos
aqueles que desejam conhecer um pouco melhor os conceitos e debates relativos à arte. Trata-se
de A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica, escrito pelo filósofo, sociólogo e crítico
de arte, o alemão Walter Benjamin, que produziu a maior parte de sua obra entre a Primeira e a
Segunda Guerra Mundial.
Da pintura rupestre à reprodução da obra de arte 23

Assim como o mundo passou a produzir uma enorme quantidade de produtos de todo
tipo nas fábricas, o que os tornou mais baratos para quem os fabrica, a cultura e a arte também
aderiram a essa forma de produção em série. O termo reprodutibilidade vem da ideia de reproduzir
(ou produzir inúmeras vezes) o mesmo item com recursos técnicos, em oposição à ideia de
autenticidade ligada à arte.
O conceito de reproduzir sempre esteve ligado à arte, relacionado à imitação feita pelos
discípulos ou à cópia. Com o tempo, foram realizados avanços no sentido de copiar a arte. Segundo
Benjamin (1994, p. 166), “com a xilogravura, o desenho tornou-se pela primeira vez tecnicamente
reprodutível, muito antes que a imprensa prestasse o mesmo serviço para a palavra escrita”. O autor
também menciona o aumento da precisão e a facilidade na reprodução de gravuras, o que permitiu
fazer um número maior de cópias e de maneira mais rápida.
No entanto, mesmo a melhor cópia que a reprodutibilidade técnica é capaz de produzir não
pode ser comparada à autenticidade de uma obra de arte original. O que Benjamin (1994) expõe
é que um pôster da Mona Lisa na nossa parede não tem o mesmo valor que a pintura autêntica de
Leonardo da Vinci, agora preservada em museu. Atualmente, isso é de conhecimento popular, mas
foi justamente Walter Benjamin que nos trouxe esse conceito no início do século XX.
O que faz com que uma obra de arte seja considerada original ou autêntica é o fato de ter
sido tocada pelo artista em pessoa, que ela tem uma história, marcas que o tempo deixou, que é
possível ver as pinceladas que o artista deu na tela. Pensando nesses detalhes, o autor afirmou que
as obras de arte possuem uma “aura” que as torna únicas.
Por outro lado, a reprodutibilidade, iniciada, dentre outros métodos, com a xilogravura,
foi importante para que as obras artísticas pudessem ser conhecidas e apreciadas por um círculo
muito maior de pessoas. Somente a partir das cópias é que foi possível universalizar o acesso a
obras de arte, que eram restritas a um ambiente elitista.
Benjamin se dedicou a vários temas relacionados à história e às artes. Ele escreveu seus textos
sobre esses assuntos pouco tempo depois da invenção do cinema, que é derivado da fotografia e no
qual a noção de reprodutibilidade técnica se amplia com mais evidência.
Como foi exposto anteriormente, ficaremos, por ora, com essas informações. É importante
que, a partir de agora, você procure perceber o efeito dessas técnicas na cultura e na arte produzidas
principalmente a partir do século XX. A apreciação e a observação constantes nos ajudam a
compreender cada vez melhor todas as possibilidades que a arte nos oferece.

Considerações finais
Neste capítulo, foi possível conhecer um pouco sobre a trajetória das artes visuais produzidas
em suportes planos, como a pintura, o desenho e a gravura. Estudamos que a evolução da arte corre
em paralelo à do ser humano, ao mesmo tempo em que, de alguma forma, ajuda a impulsioná-lo.
Com base na visão que a arte nos proporciona, conhecemos as marcas deixadas no mundo antes de
nós e percebemos que também podemos usá-la para deixar o nosso legado.
24 História das artes visuais

Ampliando seus conhecimentos


• ASSOCIAÇÃO Brasileira de Arte Rupestre. Global Rock Art. Disponível em: http://www.
globalrockart2009.ab-arterupestre.org.br/default.asp. Acesso em: 24 out. 2019.
Nessa página, é possível conhecer um pouco mais sobre a arte rupestre dos achados
arqueológicos encontrados no Brasil. Vale a pena acessar os textos.
• KOBRA. Projetos. Disponível em: http://www.eduardokobra.com/projetos/. Acesso em:
24 out. 2019.

• OSGEMEOS. Projetos. Disponível em: http://www.osgemeos.com.br/pt/projetos/. Acesso


em: 27 nov. 2019.
Para apreciar mais grafites e murais, sugerimos que visite os sites de Eduardo Kobra e dos
gêmeos Gustavo e Otávio Pandolfo. Essas páginas, além de trazerem diversos projetos
feitos por eles, permitem conhecer a trajetória desses importantes artistas brasileiros.

• LITOGRAVURA. 2017. 1 vídeo (2 min.). Publicado pelo canal Prefeitura de Curitiba.


Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=zSP__TcquSU. Acesso em: 24 out. 2019.
Esse vídeo traz, de maneira didática, todas as etapas do processo de litogravura. Trata-se
de uma produção da Fundação Cultural de Curitiba com a professora Juliana Kudlinski.

Atividades
1. Qual é a importância das pinturas rupestres encontradas em cavernas primitivas para o
nosso conhecimento sobre a origem das artes visuais?

2. Como podemos avaliar a evolução da arte por meio dos afrescos, murais e grafites? Que
aspecto foi mudando nesses três tipos de artes visuais ao longo do tempo?

3. Sobre a produção de gravuras feitas com a xilografia e com a litografia, quais principais
aspectos você destacaria?

Referências
BENJAMIN, W. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica. In: Magia e técnica, arte e política:
ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo: Brasiliense, 1994.

COSTELLA, A. F. Breve história ilustrada da xilogravura. Campos do Jordão: Mantiqueira, 2003.

JANSON, H. W. Iniciação à história da arte. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

KOBRA. Biografia: Eduardo Kobra. Disponível em: http://www.eduardokobra.com/biografia/. Acesso em:


23 out. 2019.

OSGEMEOS. Projetos: Vancouver biennale. Disponível em: http://www.osgemeos.com.br/pt/projetos/


vancouver-biennale/. Acesso em: 23 out. 2019.

RINK, A. Graffiti: intervenção urbana e arte. Curitiba: Appris, 2015.


2
Escultura: arte tridimensional

Neste capítulo, abordaremos a diferença entre a arte bidimensional (pinturas e desenhos em


superfícies planas) e a tridimensional. Para tanto, vamos tratar sobre as esculturas. A escultura é
a arte visual que ganha volume, isto é, a arte que pode ser moldada por meio de várias técnicas.
Conhecer a arte de esculpir também nos faz voltar ao passado.
É comum imaginarmos que um escultor é aquele que bate na pedra para transformá-la em
uma obra de arte. Esse pensamento de fato se confirma, mas esse não é o único modo de esculpir. A
criatividade humana é ilimitada e costuma se adequar ao lugar e ao tempo em que é produzida. Por
essa razão, neste capítulo, conheceremos outras técnicas para esculpir em materiais rígidos ou mais
maleáveis. Além disso, também observaremos os painéis de esculturas, um tipo de arte esculpida em
paredes. Inclusive, parte dessa arte pode ser encontrada no Brasil, como as obras sacras do Barroco,
feitas em Minas Gerais, principalmente pelo artista Aleijadinho, no período colonial.

2.1 Pedra, papel, tesoura!


Estudar esculturas nos leva há um Figura 1 – Pedra esculpida

Lefteris Tsouris/Shutterstock
passado muito distante. De acordo com Janson
(1996, p. 16), “além da arte das cavernas feita em
grandes proporções, os homens do Paleolítico
também criaram pequenas esculturas do
tamanho de uma mão, utilizando-se de osso,
chifre ou pedra cortados com talhadeiras
rudimentares”. A estatueta da fertilidade,
conhecida pelo nome de Vênus de Willendorf
(Figura 1), é um exemplo de escultura datada
no período primitivo.
As esculturas demonstram um tipo de
evolução dos povos primitivos. Há milhares
de anos eles conseguiram criar objetos que
demonstram uma noção cognitiva e artística,
imitando formas humanas e suas proporções
em escala menor. Além disso, objetos como a A escultura original (de 10,45 cm) foi encontrada pelo
paleontólogo Hugo Obermaler em 1908, na baixa Áustria.
Vênus nos mostram o conhecimento técnico (BOZAL, 1995 apud Velázquez, 2017).

e a existência de ferramentas produzidas por Fonte: VÊNUS de Willendorf (cópia do original de 25.000 a.C.).
Pedra: 12 cm. Museu de História Natural de Viena.
esses povos, que já começavam a dominar e
transformar a natureza a seu favor.
26 História das artes visuais

Quem vence o jogo pedra, papel ou tesoura? Depende. Uma pedra mais dura pode quebrar
uma pedra mais mole. A tesoura pode vencer o papel e a pedra, ao menos no que se refere ao jogo
de esculpir, visto que ela representa o metal. Depois que a humanidade descobriu o fogo e percebeu
que com ele era possível fundir o metal, iniciou-se uma verdadeira revolução. Isso permitiu inúmeras
invenções e toda a evolução das civilizações. Em paralelo, ocorreu também a evolução da arte. As
esculturas, entre outros utensílios, marcaram o período aproximado em que ocorreu o fim de uma
era e o início de outra. Janson (1996, p. 17), em relação à arte primitiva, elucida que:
há, então, uma diferença básica entre o Paleolítico e o Neolítico, embora o
homem ainda dependesse da pedra como o material de seus principais utensílios
e armas. A nova forma de vida deu origem a um grande número de habilidades
e invenções, muito antes do surgimento dos metais: a cerâmica, a tecelagem e a
fiação, métodos básicos de construção arquitetônica. Sabemos tudo isso a partir
dos povoados do Neolítico que foram revelados por escavações.

Ao longo de muitos anos, por meio da arqueologia, foram encontradas esculturas feitas
com materiais diferentes, por exemplo o barro, a madeira e a pedra, as quais representam figuras
humanas e de diferentes deuses por todo o mundo, como no Himalaia, no Havaí, em diferentes
regiões dos continentes africano, europeu e americano.

2.1.1 A antiga arte de esculpir


Ao avançar alguns anos, após a invenção da escrita, chegamos ao Egito faraônico, época
em que temos materiais que testemunham a evolução, esculturas, tábuas de hieróglifos, símbolos
esculpidos e também grandes monumentos como as pirâmides, que hoje são considerados bens
artísticos.
O ato de esculpir está ligado à escrita hieroglífica. Seus pequenos símbolos usados para
comunicação, em conjunto com imagens esculpidas, eram dedicados às atividades cotidianas,
artísticas e relacionadas ao poder da coletividade. Como nos esclarece o egiptólogo Yoyote (2010,
p. 95), no Egito faraônico, constituído a partir de 3000 a.C., “a religião e a ética dão ênfase à
manutenção de uma disciplina rigorosa, que beneficia toda a comunidade dos súditos, e à ação
exclusiva da pessoa real na administração e nos ritos. A própria arte prefere o geral ao particular”.
Das monumentais obras esculpidas no Egito Antigo, certamente, uma das mais conhecidas
é a Esfinge, considerada, por alguns estudiosos, como sendo a cabeça de um dos faraós do período.
Junto a ela temos 3 grandes pirâmides que foram construídas para servirem como túmulo para os
faraós: Queóps (2530 a.C.), Quéfren (2500 a.C.) e Miquerinos (2470 a.C). A seguir, na Figura 2,
podemos observar a magnitude desse monumento histórico.
Escultura: arte tridimensional 27

Figura 2 – Esfinge

AlexAnton/Shutterstock
Ao fundo, encontram-se as pirâmides dos faraós Queóps (2530 a.C.), Quéfren (2500 a.C.) e Miquerinos (2470 a.C.).
Fonte: A GRANDE Esfinge. 2500 a.C. 20 x 19 x 73 m. Gizé, Egito.

Com relação às pirâmides, na Figura 2, ao tomarmos como referência o camelo e a pessoa


próximos da Esfinge, podemos ter uma dimensão da grandiosidade do conjunto. O que representa
toda a relação entre os faraós e deuses.
Por mais distantes que fossem, os deuses, motores do mundo, eram sentidos como
seres pessoais, próximos de cada mortal [...] (a Grande Esfinge de Gizé,
principalmente, era considerada como um ídolo tanto do Sol como de Hurun, o
deus curandeiro tomado de empréstimo aos cananeus). (YOYOTTE, 2010, p. 92)

Em 1360 a.C., tivemos o modelo mais próximo do que Figura 3 – Escultura da Rainha Nefertiti
entendemos hoje por escultura: o busto da rainha Nefertiti
tkachuk/Shutterstock

(Figura 3), que reinou ao lado do faraó Akhenaton.

2.1.2 Painéis de escultura


Esculturas não propriamente tridimensionais são
pouco lembradas, pois estão ancoradas a um painel ou
à outra superfície. Esse tipo de representação artística
geralmente conta uma história e foi muito produzido
durante o Império Romano. É semelhante à pintura de
painéis, mas tem mais volume e busca trazer a sensação de
movimento nas sequências representadas. Alguns exemplos
trazem painéis inteiros, como no fórum romano, que
representa a vitória do imperador Septímio Severo no ano Fonte: BUSTO da Rainha Nefertiti. 1360 a.C.
Calcário esculpido: 51 cm. Museu do Estado,
203 d.C. (Figura 4). Berlim, Alemanha.
28 História das artes visuais

Figura 4 – Esculturas do arco triunfal do Imperador Septímio Severo – Itália.

Jbribeiro1/Wikimedia Commons
Esculturas em uma das laterais do arco triunfal do Imperador Septímio Severo com colunas de pedra no Fórum
Romano na Itália.

Esse tipo de escultura também é comum de ser encontrado em túmulos arquitetados durante
os primórdios da era cristã, como o sarcófago de Junius Bassus, prefeito de Roma (Figura 5).
Figura 5 – Sarcófago de Junius Bassus

Fonte: SARCÓFAGO de Junius Bassus. 395 d.C. 1,18 x 2,44 m. Grutas do Vaticano, Roma.
Escultura: arte tridimensional 29

Janson (1996, p. 94) afirma que a escultura, “comparada à pintura e à arquitetura, teve
um papel secundário”. Como o Velho Testamento havia proibido o culto a ídolos esculpidos, as
esculturas religiosas passaram a ser evitadas, e “as primeiras obras esculpidas que podem ser
chamadas de cristãs são os sarcófagos construídos para membros mais ricos da congregação;
tendo seu início nos meados do século III” (JANSON, 1996, p. 94). A prática de esculpir painéis,
sarcófagos ou túmulos importantes se estendeu até o Renascimento. Michelangelo, por exemplo,
chegou a esculpir vários deles, como o Túmulo de Giuliano Médici, família rica e influente na Itália,
em Florença, entre 1524 e 1534.

2.2 Renascimento e temas clássicos na escultura


A arte se torna cada vez mais compreensível para nós ao estudarmos os clássicos. Essa
compreensão também se dá quando revisitamos artistas que conseguiram se tornar referência
em diferentes modos do fazer artístico. Nesta seção, abordaremos as esculturas do período
Greco-romano e do período do Renascimento.

2.2.1 Período clássico: Greco-romano


Antes de abordarmos o Renascimento, estudaremos as esculturas greco-romanas, cujo
período de maior florescimento ocorreu, aproximadamente, em 1100 a.C. Posteriormente, os
romanos se apropriaram de toda a cultura grega.
O mármore, a cerâmica e o bronze foram as matérias-primas usadas na época para a
produção de esculturas, embora o mármore tenha sido usado na maioria das esculturas da Grécia
Antiga. O tema para a produção das esculturas era voltado à relação de impotência dos homens
diante desígnios dos deuses gregos. O corpo humano era valorizado e considerado a obra‑prima da
criação e da própria natureza. Por isso, ficava sempre exposto nos detalhes de sua plenitude.
Na escultura de Laocoonte, por exemplo,
Figura 6 – Laocoonte e seus filhos
(Figura 6) podemos perceber toda a agonia final da
história de Laocoonte, que teria irritado os deuses
durante a guerra de Troia. Segundo a mitologia grega,
o próprio deus Apolo teria enviado serpentes gigantes
para matar a ele e os filhos.
Se analisarmos com atenção, a escultura não
parece ser estática; pelo contrário, todo o conjunto
parece estar em movimento. Podemos observar a
agonia e o desespero na morte do pai e dos dois filhos.
Fonte: LAOCOONTE e seus filhos. 40 a.C. Mármore: 160 x
A autoria da obra é desconhecida e, portanto, não se 213 cm. Museus do Vaticano. Roma. Itália.

sabe ao certo se é grega ou romana.


Além de sua beleza indiscutível, é importante saber que “a peça impressionou profundamente
os escultores italianos, especialmente Michelangelo, quando foi encontrada” (JANSON, 1996, p. 66),
o que só ocorreu no ano de 1506, em Roma.
30 História das artes visuais

2.2.2 Renascimento
No capítulo anterior, analisamos os afrescos da Capela Sistina, realizados por Michelangelo.
Apesar de ser um excelente pintor, Michelangelo é mais reconhecido como escultor, uma vez que
foi no mármore que o artista deixou a marca de sua genialidade, durante o Renascimento.

Contextualizando: o período ficou conhecido como Renascimento porque


significou um “renascer” da cultura clássica, greco-romana; a retomada em
todo esplendor artístico após o período medieval. Esse período compreende
uma variedade enorme de obras e artistas.

Com o passar dos anos o mundo foi mudando e, com ele, a arte. Pouco antes
do Renascimento ocorreram fatos que marcaram nossa história, como a
queda de Constantinopla, a descoberta da América e a Reforma Protestante.
“O Renascimento [...] não dividiu o passado de acordo com o plano divino da
salvação, mas sim com base nas ações humanas” (JANSON, 1996, p. 168). É aí
que o período se diferencia dos períodos anteriores da história, em que os vários
deuses sempre foram o centro de toda a criação. A arte renascentista vai refletir
a valorização humana e questionar as imposições religiosas.

Figura 7 – Escultura em mármore Seria extenso citar as obras do Renascimento,


mesmo que somente as mais relevantes de
gurb101088/Shutterstock

Michelangelo. Por esse motivo, focaremos em


apenas duas, que não podem deixar de ser estudadas
e que já revelam sua genialidade. A primeira é a
escultura de David (Figura 7), da história bíblica
Davi e Golias, um monumental bloco de mármore,
com mais de 5 metros de altura; enquanto segura
a pedra que lançará, ele desafia o oponente que
parecia impossível abater. O adversário, cujo destino
é conhecido, não é ilustrado e fica a cargo da nossa
imaginação.
O David de Michelangelo impressiona não
somente por ser grande, mas também pelos detalhes
que podem ser percebidos após um olhar atento e
próximo, como os cachos nos cabelos, os globos
oculares, as sobrancelhas expressivas, o interior
das orelhas e das narinas, além de músculos e veias
Fonte: MICHELANGELO. David. 1501-1504. Escultura: 517
x 199 cm. Academia de Belas Artes de Florença. Florença, da anatomia humana perfeitamente esculpidos.
Itália.
A segunda escultura importante de
Michelangelo é a Pietà (Figura 8), que retrata Maria
Escultura: arte tridimensional 31

carregando nos braços seu filho morto e recém-retirado da cruz. Nessa obra podemos perceber a
entrega das figuras no mármore. Fica evidente a dor da mãe que perdeu seu filho. Os detalhes
anatômicos e nos tecidos são surpreendentes.
Figura 8 – Escultura em mármore, Pietà.

Fonte: MICHELANGELO. Pietà. 1498-1499. 174 x 195 cm. Basílica de São Pedro. Florença, Itália.

Michelangelo se inspirou no modelo clássico greco-romano para criar suas esculturas e


tornou-se um modelo de escultor e da arte do Renascimento.

2.3 Outros materiais para esculturas


A criatividade humana não se limita às esculturas e aos painéis esculpidos em mármore ou
em outro tipo de pedra. À medida que dominamos a natureza, fomos capazes de descobrir outros
tipos de matéria-prima para fazer as esculturas, como o barro e o metal. Nesta seção abordaremos
as obras produzidas com essas matérias-primas.

2.3.1 O barro e a maleabilidade de esculpir


Se é possível esculpir pedras extremamente duras, inclusive o mármore, imagine as
possibilidades ao moldar o barro. Com a combinação de determinados tipos de argila misturados
à água é possível produzir um tipo de matéria-prima que, por ser mais mole, pode ser moldado
com facilidade e, após certo tempo, se torna um objeto sólido, mantendo a forma produzida.

Lembrete: outros materiais também podem ser moldados, produzindo esculturas ou


objetos decorativos, como o gesso. Nesse caso a durabilidade é menor.
32 História das artes visuais

Em 1974, agricultores que cavavam um poço de água, na China, encontraram milhares de


guerreiros no tamanho real de humanos, moldados em um tipo de argila chamada terracota. Após a
descoberta, os pesquisadores assumiram o trabalho de trazer esses guerreiros à tona e, atualmente,
o local está aberto à visitação aos Guerreiros de Xian (Figura 9). O conjunto de guerreiros “é uma
coleção composta por mais de oito mil estátuas de guerreiros e cavalos em tamanho natural, todas
feitas de terracota, encontradas em valas próximas ao túmulo do Primeiro Imperador” (COUTO,
2008, p. 38).
Figura 9 – Esculturas feitas de terracota

Fonte: GUERREIROS de Terracota. 246 a.C. Província de Xian, China.

Esses guerreiros foram colocados próximos ao túmulo do imperador Qin Shi Huang
para protegê-lo durante a vida após a morte, como creem os chineses. Assim, “estima-se que a
construção, datada de 246 a.C., levou 38 anos para ser completada e que empregou a incrível marca
de 700 mil trabalhadores” (COUTO, 2008, p. 39). A China é uma civilização milenar e, embora
nós não estudemos e não conheçamos tão bem a história oriental, é interessante mencioná-la para
compreendermos toda a importância desse povo e a abrangência global da arte.

2.3.2 Esculturas de metal


Anteriormente, citamos a importância do metal como ferramenta que ajudou a esculpir a
pedra. Agora, observaremos o metal como matéria-prima na composição da própria escultura. O
metal também pode ser moldado. Exposto a grandes temperaturas, necessárias para sua fundição,
o material se torna líquido e, quando resfriado, adquire a forma dada a ele, ou seja, além de entrar
na composição industrial de vários produtos, equipamentos das fábricas, ferragem que sustenta as
construções de concreto ou automóveis, por exemplo, o metal pode ser moldado para a realização
de inúmeras criações artísticas.
Escultura: arte tridimensional 33

Existem diversos tipos de metais, como ouro, Figura 10 – Escultura em bronze


prata, bronze e outros. O ouro foi usado para obras

Rafael Ramirez Lee/Shutterstock


mais relevantes e demonstra, naturalmente, maior
poder, visto que se trata do metal mais nobre, embora
possa ser um pouco difícil de ser moldado em grandes
proporções. A prata tem características semelhantes.
Moldá-los requer uma mistura com outros metais.
O metal mais utilizado em esculturas, desde o
período grego até os dias atuais, é o bronze. Dentre os
inúmeros escultores que se dedicaram à escultura em
bronze, estão os franceses Auguste Rodin (Figura 10) e
sua aluna e discípula Camille Claudel. Apesar de terem
se dedicado também a esculpir mármore, no bronze
ganharam grande visibilidade.
Alguns apreciadores ou estudiosos dizem que
a discípula chegou a superar o mestre em alguns
aspectos, mas os dois são igualmente importantes para RODIN, Auguste. O pensador. 1880-1882. Bronze:
189 x 98 cm. Jardim do Museu Rodin, Paris,
esse tipo de representação artística. Nas esculturas de França.

Camille Claudel (Figura 11) é possível observarmos Figura 11 – Escultura em bronze


uma delicadeza mais expressiva, mas a força das obras
de Rodin é indiscutível.

2.4 Escultura no Brasil


A história do Brasil começou a ser contada,
oficialmente, a partir da colonização pelos portugueses,
em 1500. No entanto, antes disso existiam habitantes
originais do território, que produziam uma arte
primitiva, como a rupestre, e objetos artísticos, como
estátuas ou esculturas.
O monumento que representa o Brasil, e o tornou
conhecido em todo mundo, é uma escultura gigante, o
Fonte: CLAUDEL, Camille. Le implorer. 1893.
Cristo Redentor. A história e a arte brasileira são bastante Bronze: 27.9 × 36.8 × 21.3 cm. Paris, França.
ricas, passam por períodos mais relevantes, como as
esculturas barrocas à arte popular, como esculturas de barro e também artistas contemporâneos que
trabalham com metal. A seguir, abordaremos essas obras contemporâneas para compreender a arte
de esculpir feita no Brasil, um país tão extenso em seu território quanto nas diversas representações
artísticas e culturais.
34 História das artes visuais

2.4.1 Arte sacra barroca: Aleijadinho


A descoberta de toneladas de ouro em Minas Gerais, no ano de 1698, levou milhares de
pessoas do Brasil e de Portugal para a Vila Rica. Tamanha riqueza movimentou a economia,
desenvolveu a urbanidade do local e possibilitou o investimento em arte. Na verdade, o que hoje
consideramos como arte foi encomendado aos artífices para preencher as demandas religiosas,
como a construção de igrejas, confecção de imagens de pequeno porte para os altares e para as
residências dos fiéis. Portugal levou a fé católica para todas as suas colônias, mas essa fé encontrou
terreno mais fértil no Brasil. Esse período é considerado um dos primeiros em que floresceu a arte
que, embora fosse fruto da escola europeia, tinha os primeiros traços de originalidade, adaptando
o Barroco europeu às necessidades, aos materiais e ao traço de artistas nascidos no Brasil.
Reconhecido como nome mais relevante desse primeiro respiro artístico nacional, Antônio
Francisco Lisboa, mais conhecido como Aleijadinho, se dedicou à escultura. A seguir, observaremos
esculturas desse grande artista talhadas em madeira.
Figura 12 – Passo da subida do calvário

Tetraktys/Wikimedia

Fonte: ALEIJADINHO (Antônio Francisco Lisboa). Passo da subida do calvário. Santuário do Bom Jesus de Matosinhos. Congonhas, MG.

O apelido de Aleijadinho lhe foi dado devido a uma doença que o fez perder partes das mãos
e dos pés, membros fundamentais para o ofício de escultor. Mesmo com essa limitação, ele não
deixou de esculpir seus trabalhos até o fim de sua vida, deixando profundas marcas no barroco
brasileiro:
a figura do Aleijadinho constitui, na arte de Minas, o ponto máximo duma
verdadeira escola que, nascida de mestres europeus, frutificou e amadureceu
na ânsia de encontrar uma expressão própria e autêntica, tal como o ser de
exceção viria a plasmar em definitivo. Tendo aludido à importância da talha da
reafirmação do barroco em Minas. (HOLANDA, 1997, p.119-120)

Aleijadinho realizou trabalhos também na pedra calcária (pedra‑sabão), encontrada na


região de Minas Gerais, para esculpir anjos e santos, nas fachadas das igrejas. Os Profetas esculpidos
no pátio em frente ao Santuário do Bom Jesus de Matosinhos (Figura 13), em Congonhas, Minas
Gerais, fazem parte de um trabalho reconhecido pelos detalhes e traços característicos do artista.
Escultura: arte tridimensional 35

Figura 13 – Santuário do Bom Jesus de Matosinhos

Eric Gaba/Wikimedia Commons


Fonte: ALEIJADINHO (Antônio Francisco Lisboa). Os Profetas. 1800-1805. Santuário do Bom Jesus de Matosinhos. Congonhas, MG.

São atribuídas à autoria do Aleijadinho mais de quatrocentas obras; são tantas que alguns
historiadores questionam como ele teria conseguido realizar tudo isso sozinho, em cidades
diferentes, em uma época em que o transporte era mais difícil e com o agravante de sua doença. Uma
das explicações que justificam a autoria de Aleijadinho é o fato de que artistas como ele, também
chamados de artífices, tinham suas oficinas e, portanto, tinham aprendizes e ajudantes. O dono da
oficina, como era o caso de Aleijadinho, faria somente o trabalho final, dando a cada obra o seu toque
original (GRAMMONT, 2008), o que não diminui em nada o seu valor e a sua genialidade.
Atualmente, sabemos que Aleijadinho não foi o único artista a trabalhar com escultura e
talha nesse período. Muitos outros artistas estão sendo descobertos, pesquisados e tendo seus
nomes divulgados pelos historiadores da arte nos últimos anos.

2.4.2 Escultura popular


A arte pode ser erudita, como a maioria das esculturas que já estudamos aqui, mas também
pode ser popular. Isso significa que a arte é produzida mesmo por pessoas que não tiveram uma
formação acadêmica artística e se torna expressão das tradições e da cultura popular. No caso do
Brasil, um país tão extenso em território e em miscigenação, suas regiões têm grande variedade de
obras que retratam crenças, miscigenação das raças e outras formas de cultura.
As carrancas esculpidas na madeira (Figura 14), por exemplo, são colocadas nos barcos que
navegam nos rios. A tradição diz que elas espantam os maus espíritos, portanto sua aparência
amedrontadora permite afugentar todo o mal.
36 História das artes visuais

Figura 14 – Carrancas de madeira – Petrolina, Pernambuco, Brasil.

Elysangela Freitas/Shutterstock
Também na região do Nordeste brasileiro, encontramos um tipo de arte popular esculpida
no barro. São figuras que retratam, muitas vezes, o povo típico daquela região, como artistas (Figura
15). Outra representação bastante encontrada dessas pequenas esculturas são os cangaceiros
Lampião e Maria Bonita e as imagens de santos de devoção católica.
Figura 15 – Músicos nordestinos

Marcio Jose Bastos Silva/Shutterstock

Muitas dessas obras têm autores conhecidos regionalmente e são, constantemente,


chamadas de artesanato, o que não está errado, pois não deixam de ser a demonstração do talento
de representação de nossas tradições, memória e cultura.

2.5 Escultura contemporânea


A partir do século XX, tudo se torna mais rápido: a evolução dos meios de transporte nos
permite conhecer todo o mundo e, com isso, outras culturas e mais representações artísticas.
Tudo influencia a todos no mundo globalizado. A tecnologia aproxima as pessoas e é capaz de
Escultura: arte tridimensional 37

disponibilizar imagens, conhecimento e experiências globais. Todo esse contexto influencia,


também, a arte, que passou a romper com as regras e os padrões que legitimavam o fazer artístico.
Nesta seção, citaremos alguns escultores contemporâneos, mas não abordaremos todos, uma vez
que são inúmeros e não caberiam aqui. Observaremos aqui uma pequena seleção, que pode servir
como incentivo para conhecermos cada vez mais a arte contemporânea.
Fernando Botero é um pintor e escultor colombiano, nascido em 1932. Uma característica
marcante em praticamente todas as suas obras é a representação de pessoas e animais em grandes
proporções, como podemos conferir na Figura 16.
Figura 16 – Escultura de Fernando Botero

FlickrLickr/Wikimedia Commons
Fonte: BOTERO, Fernando. Grande pássaro. 1990. Singapura.

Um artista de muitas facetas é o espanhol Picasso, que fez pinturas, esculturas (Figura 17),
cerâmicas e até poesia, sendo considerado pertecente ao movimento abstrato e cubista, com um
estilo pessoal inconfundível. Quem conhece alguma obra desse artista, ao ver outra, provavelmente
a reconhecerá como arte do Picasso. Ele foi influenciado por vários artistas que o antecederam,
mas não apenas pelos clássicos ou por outros de sua época, além de também usar “a arte primitiva
como aríete contra a concepção clássica de beleza. Não somente as proporções, mas também a
integridade orgânica e a continuidade do corpo humano são negados” (JANSON, 1996, p. 366).
Ao usar o termo aríete, Janson (1996) se refere a uma grande tora de madeira usada em combate
para derrubar barreiras e, com essa analogia, está nos dando uma grande referência da importância
de Picasso como artista, que derrubou barreiras e influenciou inúmeros artistas do que é hoje
conhecido como arte contemporânea.
38 História das artes visuais

Figura 17 – Escultura do Richard J. Daley Center.

Jcrocker/Wikimedia Commons
Fonte: PICASSO, P. Maquette for Richard J. Daley Center Sculpture. 1964. Chicago, Illinois, EUA.

Umberto Boccioni tem uma liberdade artística presente no tamanho, na composição e nos
materiais das obras. A Figura 18 traz um exemplo de escultura desconstruída, com chapas de metal
cortadas e soldadas, produzida pelo artista Umberto Boccioni.
Figura 18 – Escultura em bronze

Fonte: BOCCIONI, Umberto. Formas únicas da continuidade no espaço. 1913. Bronze: 111,2 x 88,5 cm. Museu de Arte Contemporânea da
USP, São Paulo.

A artista plástica japonesa, naturalizada brasileira, Tomie Ohtake representa a leveza nas
formas da escultura. Na Figura 19, podemos observar uma obra da artista que deixa a liberdade de
criação evidente.
Escultura: arte tridimensional 39

Figura 19 – Monumento Tomie Ohtake

Christian Eric/Wikimedia Commons


Fonte: OHTAKE, Tomie. Cem anos da imigração japonesa para o Brasil. 2008. Porto de Santos, Brasil.

A seleção de esculturas, neste capítulo, foi feita de modo livre, assim como a concepção
delas, visto que é importante deixarmos as imagens falarem por si. Alguns desses escultores
contemporâneos ainda estão vivos e produzem suas obras, sendo possível conhecê-los e acompanhar
a produção deles.

Considerações finais
Neste capítulo, abordamos um longo percurso de tempo, cruzando milhares de anos para
compreender as obras de artes visuais em esculturas. Conhecemos o fazer artístico primitivo, do
Egito Antigo, dos períodos greco-romano e renascentista, do Brasil e contemporâneo. No Brasil,
foi possível, mesmo que brevemente, entender o percurso artístico original e relevante, desde a
arte erudita até a arte popular. Sobre a arte contemporânea, foi possível conhecer um leque de
escultores recentes e as infinitas possibilidades de suas obras.

Ampliando seus conhecimentos


• MOKHTAR, Gamal (editor). História Geral da África II. Brasília: UNESCO, 2010.
Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/ue000319.pdf

Para conhecer um pouco mais sobre a história e a arte dos faraós do Egito Antigo, você
pode acessar esse livro que a Unesco disponibilizou on‑line. Ele não trata apenas da arte,
mas de toda a história do continente africano, onde está inserido o Egito e outros países.
Aqui você vai conhecer a história de civilizações africanas milenares que culminou na
riqueza de arte do continente.
40 História das artes visuais

• A MÚMIA 3. Direção: Rob Cohen. Elenco: Brendan Frases, Jet Li, Maria Bello, John
Hannah. Universal Pictures, 2008. (122 min.).
Esse filme é interessante para conhecermos os guerreiros de terracota da China. Embora
seja uma obra de ficção, nos ajuda a visualizar as esculturas do período.

• CAMILLE Claudel. Direção: Bruno Nuytten. Elenco: Isabelle Adjani, Gérard Depardieu,
Alain Cuny. DD Productions, 1989. (175 min.).
O filme Camille Claudel nos ajuda a conhecer um pouco mais a história da escultura em
bronze, produzida por Auguste Rodin e Camille Claudel na França do século XIX. É um
filme com base na história dos dois escultores.

Atividades
1. Descreva as matérias‑primas que podem ser usadas na produção de esculturas ao longo de
sua história e onde elas podem ser encontradas.

2. Como as obras de arte da Grécia e Roma antigas influenciaram artistas ao longo da história?
Cite ao menos um artista que tenha sido marcado por esse período.

3. Determine algumas características das obras contemporâneas.

Referências
COUTO, S. P. A extraordinária história da China. São Paulo: Universo dos Livros, 2008.

GRAMMONT, G. de. Aleijadinho e o Aeroplano: o paraíso barroco e a construção do herói colonial. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2008.

HOLANDA, Sérgio Buarque de (Intr./org.). A época colonial, tomo II: administração, economia, sociedade.
(Coleção: História Geral da Civilização brasileira; v.1, t.2) Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997.

JANSON, H. W. Iniciação à história da arte. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

VELÁZQUEZ. C. A história da Vênus feita arte em Willendorf. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA,
29, jul. 2017, Brasília, Anais [...]. Brasília: UNB, 2017. Disponível em: https://www.snh2017.anpuh.org/
resources/anais/54/1501619461_ARQUIVO_AVenusdeWillendorf.pdf. Acesso em: 14 out. 2019.

YOYOTTE, J. O Egito faraônico: sociedade, economia e cultura. In: MOKHTAR, Gamal (editor). História
Geral da África II. Brasília: UNESCO, 2010.
3
Fotografia e cinema: a captura do momento e do
movimento

Neste capítulo, abordaremos a história da fotografia e do cinema. Para isso, faremos uma
viagem no tempo e voltaremos dois séculos. Começaremos pela origem e evolução da arte de
capturar e fixar um momento: a fotografia; em seguida, conheceremos a história do cinema, que
teve origem ao ceder movimento à fotografia.

3.1 Fotografia, primeiros experimentos (origem)


Ao delinear a base e o contexto necessários para o surgimento da fotografia, verificamos que
o mundo experimentou uma grande mudança a partir do momento em que o modo de produção
deixou de ser apenas artesanal e passou a usar de novas tecnologias para produzir em escala
industrial. Essa produção envolveu grandes mudanças, como o surgimento das máquinas a vapor e
da energia elétrica, ambos impulsionando a produção das fábricas. O surgimento da fotografia está
intimamente ligado a esse período. Segundo Kossoy (2001, p. 25),
Com a Revolução Industrial verifica-se um enorme desenvolvimento das
ciências: surge naquele processo de transformação econômica, social e cultural
uma série de invenções que viriam influir decisivamente nos rumos da história
moderna. A fotografia, uma das invenções que ocorre naquele contexto,
teria papel fundamental enquanto possibilidade inovadora de informação e
conhecimento, instrumento de apoio à pesquisa nos diferentes campos da
ciência e também como forma de expressão artística.

Desse modo, a fotografia surgiu no século XIX e foi se aperfeiçoando até chegar ao que
conhecemos hoje. Conforme Janson (1996, p. 424),
Em 1822, um inventor francês chamado Joseph Nicéphore Niépce conseguiu,
aos 57 anos, fazer a primeira imagem fotográfica permanente, embora a mais
antiga de suas fotos que chegou até nós seja de 1826. Na época Niépce juntou
suas forças às de um jovem chamado Louis Jacques Mandé Daguerre, que havia
criado uma câmara improvisada. Depois de mais de dez anos de pesquisas
químicas e mecânicas, o daguerreotipo, usando exposições positivas, foi trazido
a público em 1839, dando origem à era da fotografia.

Outros inventores já haviam tentado esse feito, mas o grande desafio era descobrir a
substância ou o processo que permitiria fixar imagens reais em um suporte. Quando a fotografia
foi inventada, nem se imaginava a possibilidade das fotos digitais, como as que temos hoje. As fotos
tinham que ser feitas dentro de uma câmara escura, pois se entrassem em contato com a luz, não
seria possível fixar a imagem vista na frente da lente do fotógrafo no papel localizado no fundo
da câmera. Demorou até que esse efeito fosse possível, uma vez que era necessário descobrir qual
produto químico devia ser usado para fixar a imagem no papel.
42 História das artes visuais

Daguerreótipo foi o nome dado à primeira câmera fotográfica, em uma evidente homenagem
ao jovem de sobrenome Daguerre que se uniu a Nièpce. A seguir, podemos ver uma ilustração do
daguerreótipo.
Figura 1 – Daguerreótipo (1839)

Claplante/W.Commons
Os motores a vapor foram um dos maiores exemplos de toda inovação no período que
compreendeu a invenção da fotografia. Utilizados nas máquinas das fábricas, nos trens e nos navios,
os motores a vapor eram impulsionados pela queima de carvão e foram sendo aperfeiçoados ao
longo do século XIX. Esses meios de transporte mais rápidos permitiram a muitos fotógrafos que
viajassem pelo mundo registrando cidades, pessoas em suas rotinas, monumentos, paisagens e até
obras de arte, como pinturas, que passaram a ser amplamente conhecidas pela circulação cada vez
maior das fotografias ao redor do mundo, possibilitando aos indivíduos conhecer lugares e pessoas,
sem a necessidade de ter o efetivo contato. Entretanto, essa forma artística acabou gerando para si
mimética: vem de uma “reputação pouco atraente de ser a mais realista e, portanto, a mais fácil das artes miméticas”
mimese, que, do
grego, significa (SONTAG, 2004, p. 34).
imitação.

3.1.1 Fixando uma imagem, um momento


O daguerreótipo foi a primeira câmera a ser comercializada. Considerado um objeto de fácil
transporte e manuseio, para os que dominavam suas técnicas, espalhou-se aos poucos pelo mundo,
reproduzindo imagens de lugares antes desconhecidos.
O mundo tornou-se de certa forma “familiar” após o advento da fotografia;
o homem passou a ter um conhecimento mais preciso e amplo de outras
realidades que lhe eram, até aquele momento, transmitidas unicamente pela
tradição escrita, verbal e pictórica. Com a descoberta da fotografia e, mais
tarde, com o desenvolvimento da indústria, que possibilitou a multiplicação da
imagem fotográfica em quantidades cada vez maiores através da via impressa,
iniciou-se um novo processo de conhecimento do mundo, porém de um mundo
em detalhe, posto que fragmentário em termos visuais e, portanto, contextuais.
(KOSSOY, 2001, p. 26)
Fotografia e cinema: a captura do momento e do movimento 43

Isso nos permitiu conhecer, hoje, os rostos de pessoas ilustres ou mesmo de familiares e
antepassados. Foi possível também registrar acontecimentos, o que marcou o início do uso de
imagens jornalísticas, pois “fotos fornecem um testemunho. Algo de que ouvimos falar, mas de
que duvidamos, parece comprovado quando nos mostram uma foto” (SONTAG, 2004, p. 9). As
primeiras fotos só podiam ser reproduzidas em preto e branco e ainda não possuíam a nitidez das
fotografias atuais. A seguir, na Figura 2 observaremos uma foto feita com o daguerreótipo.
Figura 2 – Foto de Munique, na Alemanha, feita com o daguerreótipo.

Franz von Kobell; Carl August von Steinheil; James E. Pioneiros da fotografia na
Alemanha 1839-1869. Foto de Munique, 1839, em papel de cloreto de prata.

Uma foto é um registro de um momento único, que não se repetirá no tempo. De acordo
com Barthes (1984, p. 129), “toda fotografia é um certificado de presença. Esse certificado é o gene
novo que sua invenção introduziu na família das imagens”.
É importante, também, saber que “três elementos são essenciais para a realização de uma
fotografia: o assunto, o fotógrafo e a tecnologia” (KOSSOY, 2001, p. 37) e esses elementos se
completam “quando o objeto teve sua imagem cristalizada na bidimensão do material sensível,
num preciso e definido espaço e tempo” (KOSSOY, 2001, p. 37). Outra foto pode ser reproduzida
com a mesma pessoa ou paisagem, no entanto se trata de outro momento, em que, de alguma
maneira, será possível observar alguma diferença em relação à imagem anterior.
Após o início da Revolução Industrial, as mudanças foram se tornando cada vez mais
velozes. Grande parte da população se deslocou do campo às cidades para trabalhar nas fábricas;
as transformações trouxeram invenções, benefícios e novos desafios sociais e econômicos. A
fotografia faz parte das grandes inovações e, curiosamente, foi também a responsável por registrar
toda essa vertiginosa mudança mundial.
As imagens sem conta produzidas a partir de 1840 dos micro aspectos captados
de diferentes contextos sócio geográficos tem preservado a memória visual de
inúmeros fragmentos do mundo, dos seus cenários e personagens, dos seus
eventos contínuos, de suas transformações ininterruptas. (KOSSOY, 2001, p. 27)
44 História das artes visuais

A fotografia em preto e branco percorreu um longo caminho e sua versão colorida foi
inventada somente no século XX. Com isso, houve a continuidade do aperfeiçoamento das câmeras,
com o intuito de melhorar a qualidade das fotos produzidas. A Figura 3 a seguir exemplifica um
pouco a trajetória evolutiva dos aparelhos de fotografia.
Figura 3 – Evolução das câmeras fotográficas do século XIX ao XX.

Babich Alexander/Shutterstock
Da esquerda para a direita: daguerreótipo (1839), câmera de fole (1947), Rolleiflex (1950), Leica (1958) e Canon (1983).

A popularização das câmeras veio com o surgimento do filme fotográfico (Figura 4), que
facilitou a revelação das imagens e possibilitou a cópia de uma mesma fotografia quantas vezes
fosse desejado.
Figura 4 – Rolo de filme fotográfico

Chamille White/Shutterstock

3.1.2 Fotografia: do simples retrato à arte


Todo conhecimento acumulado até aqui nos leva, finalmente, à questão central da relação
entre a fotografia e as artes visuais.
A fotografia é uma arte? O fato de ainda colocarmos essa questão é uma prova
de que esse debate continua em aberto. As respostas têm variado de acordo com
as mudanças relativas à definição e à compreensão da arte. Em si, naturalmente,
a fotografia é apenas um meio (como a pintura a óleo ou pastel) utilizado para
fazer arte, sem qualquer pretensão intrínseca de ser arte. Afinal, o que faz com
que algo seja arte e não apenas habilidade é por que, e não como, tal coisa é feita.
No entanto, assim como a arte, a fotografia também está associada à criatividade,
pois, por sua própria natureza, seu desempenho envolve necessariamente a
imaginação. (JANSON, 1996, p. 424)
Fotografia e cinema: a captura do momento e do movimento 45

Não é toda fotografia que é considerada arte. O que faz da fotografia arte é o olhar criativo
de alguns fotógrafos. Nesse debate, conforme Janson (1997), entre alguns exemplos de fotografias
como representação artística estão as da fotógrafa Dorothea Lange. A Figura 5, denominada Mãe
migrante da Califórnia, nos permite observar o olhar de Lange, que, em 1936, registrou uma mãe
com seus filhos, todos atingidos pela fome ocasionada pelo efeito da depressão econômica iniciada
nos Estados Unidos da América em 1929. Além da estética, o impacto da imagem, dentro do
contexto histórico, a tornou um objeto artístico conhecido em todo o mundo.
Figura 5 – Mãe e filhos migrantes da Califórnia, 1936.

Dorothea Lange/W.Commons

Fonte: LANGE, Dorothea. Mãe migrante. Estados Unidos, 1936.

3.1.3 Fotografia no Brasil


A partir do momento em que a invenção do daguerreótipo passou a ser comercializada,
muitos fotógrafos se espalharam pelo mundo. No Brasil, a fotografia teve origem no período
imperial do século XIX. Conforme Schwarcz (1998, p. 345),
se até então a grande maioria das imagens do Império eram compostas de
litogravuras, pinturas, esculturas e aquarelas, a partir, sobretudo, do início
dos anos 1860 [...] torna-se cada vez mais nítido o predomínio do material
fotográfico.

No Brasil, um dos primeiros entusiastas da fotografia foi D. Pedro II, que definia a si
mesmo como um homem de letras e ciência e “que não só foi um grande incentivador dessa
técnica, como se tornou, ele próprio, um fotógrafo precoce: o primeiro fotógrafo brasileiro, o
primeiro soberano--fotógrafo do mundo” (SCHWARCZ, 1998, p. 345). Na biografia sobre o
imperador, Schwarcz (1998) cita-o como pioneiro, por ter feito uso da fotografia dois anos antes
da rainha Vitória, da Inglaterra.
46 História das artes visuais

Figura 6 – Imperador do Brasil D. Pedro II

Fonte: FROND, Victor. Retrato de D. Pedro II. c. 1858. Fotografia, 7,5 x 5,5 cm. Coleção privada.

A coleção de fotografias do imperador era composta, em sua maioria, de fotos tiradas do


próprio D. Pedro II (como a Figura 6), dos membros da família e locais por onde o monarca
viajou. Diferentemente de hoje, para que a imagem naquela época ficasse o mais perfeita possível,
era preciso permanecer parado em frente ao daguerreótipo por cerca de 10 minutos. As fotos
eram distribuídas para amigos como uma forma de ampliar a visibilidade do imperador, que
também era presenteado com fotografia de outros para sua coleção pessoal. Na Figura 7 vemos
o imperador ao lado da imperatriz Teresa Cristina e da comitiva de viagem, em uma fotografia
capturada durante uma viagem de férias, em 1987.
Figura 7 – O imperador D. Pedro II do Brasil em viagem

CÂMARA, Arsênio Neumão da. O Imperador Pedro II do Brasil partindo de férias


para a Europa. 1887. Fotografia.
Fotografia e cinema: a captura do momento e do movimento 47

Podemos citar, também, outros fotógrafos do Brasil imperial, como Marc Ferrez e Christiano
Júnior, que retrataram, por exemplo, os índios e escravos da época. Ferrez, durante a década de
1870, foi fotógrafo da corte e, segundo Mauad (1997), das paisagens brasileiras. A Figura 8 é uma
imagem capturada por Marc Ferrez em 1875, no Rio de Janeiro.
Figura 8 – Foto de paisagem tirada por Marc Ferrez

FERREZ, Marc. Corcovado visto da Rua São Clemente.1880-1900. Fotografia, 24 x 30 cm. Coleção
Instituto Moreira Salles.

O registro de paisagens, do nosso povo e das celebridades da época, ocorrido após a


invenção do daguerreótipo, colocou o Brasil em um patamar semelhante ao resto do mundo,
pois “o desenvolvimento técnico e a conquista de novos mercados e de paisagens exóticas foram
ingredientes importantes para os novos usos e funções da imagem, notadamente a fotográfica”
(MAUAD, 1997, p. 190). Chegando no século XX, a fotografia no Brasil acompanhou os avanços
tecnológicos que proporcionaram mais qualidade às imagens, e os profissionais da fotografia se
diversificaram para acompanhar as tendências e os vários momentos vividos pelo país.

3.2 Cinema: fotografia em movimento


Uma conjunção de fatores propiciou a criação e o aperfeiçoamento do cinema. De acordo
com Costa (2006), os primeiros 20 anos do cinema (de 1895 a 1915) foram de rápida e constante
transformação e, a cada nova ideia, uma melhoria era proporcionada ao que foi chamado de
sétima arte.
Entre os fatores que levaram ao surgimento do cinema, podemos citar, principalmente, a
fotografia, os equipamentos rudimentares que projetavam imagens e a energia elétrica. O cinema
“quando apareceu, por volta de 1895, não possuía um código próprio e estava misturado a outras
formas culturais, como os espetáculos de lanterna mágica, o teatro popular, os cartuns” (COSTA,
2006, p. 16). Era projetado como um tipo de curiosidade em feiras e a maioria das projeções durava
em torno de um minuto.
48 História das artes visuais
a
Figura 9 – Lanterna mágica Na Figura 9, podemos ver a imagem de um
AndreasPraefcke/W.Commons
dos primeiros aparelhos que inspiraram a criação do
cinema, um modelo de lanterna mágica. Segundo
Costa (2006), as variações dessa modalidade
existem desde o século XVII. Utilizando diferentes
modos de iluminar e projetar, como lamparinas,
a técnica basicamente consiste em movimentar
o vidro em frente à luz, a fim de permitir que as
imagens sejam projetadas na parede ou em uma
tela. Esse aparelho permitia a várias pessoas que
contemplassem a projeção ao mesmo tempo.
Outro aparelho que inspirou o aparecimento
do cinema, conforme Costa (2006), é o zootrópio
(Figura 10a), em que o observador, ao olhar as
imagens pelas fendas do cilindro (Figura 10b), tem a
ilusão de movimento.
Figura 10 – Zootrópio
A Sequência de imagens que criam a ilusão de movimento.

Fæ/W.Commons
B Zootrópio externamente c–
C Zootrópio internamente
Monkey Business Images/ShutterStock

Solipsist~commonswiki/Wikimedia Commons

Uma espécie de combinação de lanterna mágica e zootrópio concedeu origem ao


cinematógrafo, ao reunir os seguintes elementos:
• projeção, sobre tela ou parede, de uma sequência de fotografias que criam a ilusão de
movimento;
• projeção feita para um grupo grande de pessoas;
• utilização de energia elétrica para alimentar a parte mecânica e a luz projetada.
Fotografia e cinema: a captura do momento e do movimento 49

Historicamente os pesquisadores concordam com a afirmação de que


Não existiu um único descobridor do cinema, e os aparatos que a invenção
envolve não surgiram repentinamente num único lugar. Uma conjunção de
circunstâncias técnicas aconteceu quando, no final do século XIX, vários
inventores passaram a mostrar os resultados de suas pesquisas na busca
da projeção de imagens em movimento: o aperfeiçoamento nas técnicas
fotográficas, a invenção do celuloide (o primeiro suporte fotográfico flexível,
que permitia a passagem por câmeras e projetores) e a aplicação de técnicas de
maior precisão na construção dos aparatos de projeção. (COSTA, 2006, p. 18)

Mas algumas invenções obtiveram mais sucesso do que outras nesse caminho e os inventores
chegaram a requisitar a paternidade de sua criação.
As primeiras exibições de filmes com uso de um mecanismo intermitente
aconteceram entre 1893, quando Thomas A. Edison registrou nos EUA a
patente de seu quinetoscópio, e 28 de dezembro de 1895, quando os irmãos Louis
e Auguste Lumière realizaram em Paris a famosa demonstração, pública e paga,
de seu cinematógrafo. (COSTA, 2006, p. 17)

O quinetoscópio de Thomas Edison, também inventor da lâmpada, era um aparelho que


“possuía um visor individual através do qual se podia assistir, mediante a inserção de uma moeda,
à exibição de uma pequena tira de filme em looping” (COSTA, 2006, p. 18-19). Na figura 11b,
podemos observar como funcionava o equipamento.
Figura 11 – Quinetoscópio
A Homem assistindo a um filme em um B Quinetoscópio internamente
quinetoscópio (c. 1895)

O cinematógrafo é o equipamento mais próximo da exibição de filmes como conhecemos


hoje. Paris, dos Lumières, era um dos centros urbanos responsáveis por grande parte da evolução
tecnológica do mundo no século XIX. De acordo com Rittaud-Hutinet (1995), autor de uma
biografia dos irmãos em comemoração aos cem anos de invenção do cinema, eles possuíam
50 História das artes visuais

equipamentos fotográficos na família e os manuseavam desde muito jovens. Com o passar dos
anos passaram a ser donos de um estúdio e Antoine Lumière instalou em seu porão um pequeno
gerador, uma vez que a energia elétrica ainda não estava em rede.
De acordo com Rittaud‑Hutinet (1995), os Lumière pensaram em reproduzir fotos
capturadas em sequência, mas isso ainda não era possível, visto que a tecnologia da época não
permitia a captura rápida o bastante para obter a sequência de movimentos. Anos mais tarde, o pai
deles trouxe a notícia de que um americano conseguiu registrar a corrida de um cavalo a galope
(RITTAUD-HUTINET, 1995), conforme Figura 12.
Figura 12 – Sequência de fotos reproduzindo movimento.

Todas essas informações e experiências combinadas fizeram com que Auguste e Louis
Lumière chegassem a um equipamento que chamaram de cinematógrafo (Figura 13), que teve sua
estreia em 1895, em Paris.
Figura 13 – Cinematógrafo
Victorgrigas/W.Commons
Fotografia e cinema: a captura do momento e do movimento 51

Para produzir a ilusão de movimento, era necessário projetar várias fotos por segundo em
rotação. Anos após, o padrão usado era de 24 fotos, ou frames, por segundo: 24 FPS. Na Figura a
seguir podemos ver a imagem do interior do projetor de cinema, o que nos permite compreender
um pouco melhor o processo. As engrenagens são responsáveis pela reprodução das sequências
fotográficas, resultando na projeção do filme.
Figura 14 – Projetor de cinema

Fabio Pagani/Shutterstock
O cinema também passou por grandes evoluções. Assim, a partir do século XXI, passamos
a ter a possibilidade de assistir aos filmes com mais facilidade; as plataformas provedoras de filmes
on-line vieram para ficar. E as evoluções continuam, atualmente temos o cinema 3D e diversas
novidades. Isso prova que a arte e a tecnologia podem andar juntas.

3.2.1 Cinema de narrativa


Foi possível entendermos minimamente o funcionamento técnico da sétima arte. Agora,
conheceremos sua origem enquanto arte criativa, e não apenas uma amostra de trens, cavalos ou
pessoas em movimento.
Em pouco tempo, aqueles que hoje conhecemos como os primeiros cineastas perceberam
a capacidade que o cinema tinha de trazer vida às histórias, com tamanho realismo e ao mesmo
tempo com tantas possibilidades técnicas diante da ficção. Segundo Gunning (1996, p. 25), “o
cinema sempre oscilou entre dois polos, o de fornecer um novo padrão de representação realista e
(simultaneamente) o de representar um sentido de irrealidade, um reino de fantasmas impalpáveis”.
Essa irrealidade está ligada ao fato de que o cinema só existe enquanto é uma imagem projetada.
Embora passe a perfeita ilusão de que aquelas pessoas estão em movimento diante de nós, se
formos até a tela não será possível tocá-las de verdade, tudo ali é apenas uma projeção. Quando
desligamos a projeção, o filme deixa de existir, não é permanentemente palpável como um quadro
ou uma escultura, por exemplo. Mas enquanto ele está sendo exibido nos parece totalmente real.
Após os primeiros anos de projeções de curta duração, exibidas em feiras de variedades, o
cinema encontrou sua vocação, teria “superado suas limitações iniciais e se transformado em arte
ao encontrar os princípios específicos de sua linguagem, ligados ao manejo da montagem como
elemento fundamental da narrativa” (COSTA, 2006, p. 22).
52 História das artes visuais

Um cineasta imprescindível para a formação da primeira linguagem cinematográfica foi


George Méliès, um dos primeiros que percebeu a vocação do cinema para contar histórias reais ou
fantásticas. “Quando surgiu o cinematógrafo em 1895, Meliès, aos 35 anos de idade, era a principal
figura do teatro de mágica e ilusionismo na Europa” (GOMES, 2015, p. 38-39). O cinema forneceu
recursos técnicos para que Meliès fizesse pequenos filmes de ilusionismo, como O homem da cabeça
de borracha. A Figura 15 traz uma representação da ilusão criada por ele; eram gravados dois
filmes separados, um deles com a cabeça ampliada e o outro com o cenário e demais elementos. Ao
sobrepor os dois filmes, era criada a ilusão de que o homem enchia a cabeça sobre a mesa como se
fosse um balão; Méliès atuou como os dois personagens do filme.
Figura 15 – Filme O homem da cabeça de borracha (1901)

No filme Viagem à Lua, George Méliès traz à tona o desejo do homem, que já conhece todo
o mundo, de viajar pelo espaço por meio da ficção.
Figura 16 – Filme Viagem à lua (1902)
Fotografia e cinema: a captura do momento e do movimento 53

George Méliès, por meio de cenários construídos em seu estúdio, como a cápsula que é
lançada ou a própria superfície lunar, produziu sua narrativa com princípio, meio e fim. Isso
em um tempo em que não havia possibilidades científicas de realizar qualquer viagem para
fora do planeta.

3.2.2 Cinema autoral


O que chamamos aqui de cinema autoral diz respeito àquela marca pessoal que o diretor deixa
em seus filmes e que só de vê-la sabemos que o longa-metragem foi produzido por determinado
profissional. Desde cedo, no cinema vários diretores fizeram isso, como Charles Chaplin, artista
do qual é bem possível que você conheça algum dos filmes. Seu principal personagem, usando um
chapéu e uma bengala, é um inesquecível vagabundo que se envolve em histórias extremamente
criativas – ainda mais se pensarmos nas limitações superadas pelo cinema mudo. A lista é ampla
e vale a pena assistir aos filmes Tempos modernos (Figura 17), O garoto (1921), Em busca do ouro
(1925), Luzes da cidade (1931) e O grande ditador (1940), uma crítica direta a Hitler em plena
Segunda Guerra Mundial.
Figura 17 – Filme Tempos modernos (1936)

Orson Welles é outro diretor que deixou uma marca tão permanente que não pode deixar de
ser mencionado nessa breve história da criação da sétima arte. Seu filme mais conhecido é Cidadão
Kane (Figura 18), até hoje considerado um dos melhores filmes de todos os tempos. Nele, Welles
exercita vária funções, como a de ator, diretor e roteirista, para contar a história de um magnata da
imprensa.
Cidadão Kane é talvez o único filme falado americano que parece tão novo
hoje quanto no dia em que estreou. Talvez pareça ainda mais novo. [...] as
caracterizações populares viraram modernas, e até melhores do que na época.
As novas plateias podem gostar ainda mais da exuberância teatral de Orson
Welles. (KAEL, 2000, p. 163)
54 História das artes visuais

Figura 18 – Filme Cidadão Kane (1941)

O filme é tão comemorado por usar uma série de detalhes de filmagem que ajuda a contar
a história, “Kane faz alguma coisa tão bem, e com tal espírito, que sua plenitude e complexidade
continuam a satisfazer” (KAEL, 2000, p. 164). Cidadão Kane continua um filme atual pela história
que conta, os recursos de filmagem e as surpresas em seu enredo. Conforme Kael (2000, p. 164),
“raramente o mecanismo do cinema é tão absorvente como em Cidadão Kane, tão inteligentemente
planejado para ser essa diversão que nos mantêm alertas e conscientes do prazer dos artifícios em
si”. Parece um pouco exagerado, mas o filme é insuperável em alguns aspectos, principalmente se
pensarmos na limitação de recursos no período em que foi produzido.

3.2.3 Cinema no Brasil


A origem do cinema em nosso país lembra um pouco a história da fotografia. Logo que foi
inventado, surgiram, no Brasil, imagens de outros lugares do mundo para serem aqui exibidas.
De acordo com Silva Junior (2016), em pouco tempo começaram a ser produzidas imagens em
movimento do nosso povo e das nossas cidades, “a filmagem de uma embarcação chegando à
costa brasileira demarcaria o nascimento do cinema nacional” em 1898, pelas mãos de Afonso
Segreto “apenas três anos após a primeira exibição feita pelos irmãos Lumiére” (SILVA JUNIOR,
2016, p. 1).
Não é possível abranger neste livro toda a variedade de autores e filmes do cinema brasileiro,
todavia apontaremos alguns caminhos.
Neste país de imensos contornos geográficos e de certas condições históricas
e culturais em comum, a diversidade ainda é nossa mais intrínseca marca
identitária. Nas manifestações culturais e artísticas, esse nosso “comum
incomum” escancara-se, desnuda-se, e isso logo inviabiliza a cristalização de
uma única ideia sobre o cinema brasileiro. (MIRANDA, 2018, p. 15)
Fotografia e cinema: a captura do momento e do movimento 55

Semelhante a outros países, desde muito cedo criamos aqui um modo de narrar histórias,
por meio de imagens em movimento. Humberto Mauro, ator e diretor mineiro, foi um nome
indispensável na compreensão dessa trajetória, visto que mesmo com poucos recursos fez inúmeros
filmes entre os anos de 1930 a 1940, retratando histórias de pessoas comuns.
Nascido em 1897, quase simultaneamente com o cinema, Humberto Mauro
foi espectador e ator de todo o processo de criação e evolução da linguagem
cinematográfica: dos filmes mudos ao advento do som ótico; do preto e branco
à cor; das câmeras acionadas por manivelas às Arriflex; da película de nitrato
ao acetato; dos irmãos Lumière a Glauber; do artesanato à indústria, passando
por Griffith, Eisenstein, Chaplin, Murnau, Welles, Rossellini, Buñuel, Huston e
Ford. Nada no século do cinema lhe foi indiferente. (ADRIES, 2001, p. 19)

A arte do cinema também carrega em si as marcas de cada cultura. No Brasil, não seria
diferente. Nosso cinema acompanha fases da nossa história, desde a formação de uma indústria
cinematográfica embrionária no estúdio Vera Cruz nos anos 1930, cujo maior sucesso foi o filme
O cangaceiro, de Lima Barreto, exibido internacionalmente; até o surgimento de personalidades
marcantes como Mazzaropi, Oscarito e Grande Otelo, para citar apenas alguns da fase fundadora
do cinema brasileiro.
Mesmo acompanhando o decorrer de todas as transformações na historiografia
sobre o cinema nacional até os dias de hoje, a diversidade permanece como
a marca central dos estudos aqui presentes, que abrangem desde a transição
do cinema silencioso para o sonoro, passando pela produção de obras não
ficcionais e educativas, a chanchada, o Cinema Novo, a produção da Embrafilme
e o cinema experimental até a inclusão de temas ainda pouco valorizados na
historiografia, como a presença das mulheres no cinema, as temáticas de gênero
e a participação de atores negros e indígenas na produção cinematográfica.
(MIRANDA, 2018, p. 16)

São muitas questões a serem levadas em consideração, visto que o cinema no Brasil não
deixa de estar inserido no modo de fazer cinema da indústria estrangeira, mas, ao mesmo tempo,
demanda recursos técnicos que pedem um enorme investimento financeiro para ser concretizado.
Desse modo tivemos, e ainda temos, por aqui tanto uma trajetória voltada ao entretenimento,
quanto para um cinema artístico e contestador.
Outro nome importante foi o de Glauber Rocha, cineasta nascido na Bahia, que marcou
seu espaço na criação de filmes autorais e críticos sobre as difíceis condições do Brasil na região
Nordeste, mais distante do chamado eixo cultural, Rio-São Paulo.
Queremos fazer filmes anti-industriais; queremos fazer filmes de autor, quando
o cineasta passa a ser um artista comprometido com os grandes problemas
de seu tempo; queremos filmes de combate na hora do combate e filmes para
construir no Brasil um patrimônio cultural. (ROCHA, 1981, p. 17)

Glauber Rocha ficou conhecido pelos filmes Terra em transe e Deus e o diabo na terra do
sol, ambos com uma linguagem diferente e única do movimento chamado Cinema Novo no Brasil,
“movimento notadamente carioca, que engloba de forma pouco discriminada tudo o que se fez de
melhor – em matéria de ficção ou documentário” (GOMES, 1996, p. 81). O Cinema Novo, iniciado
em 1960, como o nome diz, propôs um novo modo, mais criativo, de fazer cinema no Brasil.
56 História das artes visuais

O pensamento dos intelectuais mais ou menos ligados ou simpáticos ao


movimento, a visão da crítica e do público sobre as obras exibidas, os cineastas,
seus filmes e personagens, bem como a sociedade que os produziu, são elementos
fundamentais para a compreensão do significado do Cinema Novo no âmbito
geral da estética e da história do cinema. (CARVALHO, 2006, p. 289)

O movimento cinematográfico brasileiro era feito por cineastas que não queriam mais copiar
o chamado filme de qualidade de outros países; “o Cinema Novo expressou sua direta relação com o
momento político em filmes onde falou a voz do intelectual militante, sobreposta à do profissional
de cinema” (XAVIER, 2001, p. 62). Eles queriam criar um modo de fazer cinema que ainda fosse
experimental, mas que contasse os problemas da sociedade brasileira.
Entre o Cinema Novo e a retomada do cinema brasileiro, nos anos 1990, após alguns anos de
crise nas produções, o filme Carlota Joaquina (1995) conta, de modo caricato, a história da chegada
da família real portuguesa ao Brasil em 1808. O filme, dirigido por Carla Camurati, produzido com
poucos recursos, foi “considerado o primeiro filme do período da retomada do cinema nacional”
(BORGES, 2007, p. 107) e por isso é tão celebrado na história do cinema brasileiro.
Lançada em 1995 por Elimar Produções/Copacabana Filmes, empresa da atriz
e produtora Carla Camurati, a comédia Carlota Joaquina atraiu 1,3 milhões de
espectadores aos cinemas, ainda que se tratasse de uma produção independente
e sem grandes campanhas de marketing. O filme, que conta a história da infanta
espanhola que se casou com o príncipe de Portugal e veio com a corte portuguesa
para o Brasil, não contou com nenhuma ajuda governamental e, apesar de ser
obra de época, custou apenas R$ 600 mil. De acordo com a empresa produtora,
seu êxito pode ser explicado pela sua participação em mais de 40 festivais de
cinema, o que acabou lhe proporcionando publicidade. (BORGES, 2007, p. 18)

No mesmo período, Walter Salles foi um diretor igualmente relevante, de quem podemos
mencionar dois filmes que marcaram a sua carreira. O primeiro é Terra estrangeira (1995), feito em
parceria com a diretora Daniela Thomas, em que o protagonista Paco, um jovem ator, vê sua mãe
falecer devido ao confisco das poupanças de todos os brasileiros. Então, o personagem parte para
Portugal em busca das raízes familiares e de si mesmo. O segundo filme, denominado Central do
Brasil (1998), traz a história da trajetória de busca pessoal de Dora que, após ver o menino Josué
ficar órfão e sozinho no Rio de Janeiro, o ajuda a encontrar sua família no Nordeste. Nesse filme, a
atriz Fernanda Montenegro concorreu ao Oscar por sua atuação.
Por fim, temos o cineasta Fernando Meirelles, que conseguiu grande projeção como
diretor para seu filme Cidade de Deus (2002), adaptado de um livro com o mesmo nome, e para
a questão das periferias brasileiras que vivem sob o domínio do tráfico de drogas. O cinema
brasileiro costuma, assim como os exemplos citados, retratar as realidades das pessoas que
vivem no Brasil.

Considerações finais
Neste capítulo, passamos brevemente pela história da fotografia e do cinema. Abordamos a
origem e os principais artistas de ambas representações artísticas. As duas formas de artes visuais
Fotografia e cinema: a captura do momento e do movimento 57

nasceram da evolução das tecnologias e vieram para ficar. Mais do que nunca a ordem: “Luz,
câmera, ação!” estabelece novos padrões para a sétima arte.

Ampliando seus conhecimentos


• FUNDAÇÃO BIBLIOTECA NACIONAL. Portal Brasiliana Fotografia. Disponível em:
http://brasilianafotografica.bn.br. Acesso em: 16 out. 2019.
Nesse site você encontrará um acervo de fotografias do Brasil no século XIX. Os originais
dessas fotografias estão sob os cuidados de várias instituições brasileiras. As fotos
eternizam as cidades, os imigrantes, a expansão ferroviária e algumas coleções, como a de
fotos do imperador D. Pedro II.

• BRASIL. Ministério da Cidadania. Ancine: Agência Nacional do Cinema. Disponível em:


https://www.ancine.gov.br/. Acesso em: 16 out. 2019.
A Ancine é um órgão federal criado em 2001 com a função de desenvolver e regular o setor
audiovisual em benefício da sociedade brasileira. Nesse site você encontrará informações
sobre a produção do cinema brasileiro atual.

• ACERP – Associação de Comunicação Roquette Pinto. Cinemateca brasileira. Disponível


em: http://cinemateca.org.br. Acesso em: 15 nov. 2019.
Nesse site você encontrará muitas informações valiosas de como o cinema nacional foi e
é feito.

• ACADEMIA Brasileira de Cinema. Disponível em: http://academiabrasileiradecinema.


com.br. Acesso em: 16 out. 2019.
A Academia Brasileira de Cinema concede o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro aos
melhores filmes nacionais desde 2002, apelidado de O Oscar brasileiro. Nesse site você
pode encontrar as indicações ao prêmio e os vencedores.

Atividades
1. Como a fotografia modifica, a partir do século XIX, a relação de reprodução de imagens?

2. A origem do cinema está intimamente ligada à invenção da fotografia. Por quê?

3. O que chamamos de retomada do cinema brasileiro?

Referências
ANDRIES, A. O cinema de Humberto Mauro. Rio de Janeiro: Funarte, 2001.

BARTHES, R. A câmara clara: nota sobre a fotografia. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.
58 História das artes visuais

BORGES, D. S. A retomada do cinema brasileiro: uma análise da indústria cinematográfica nacional de


1995 a 2005. Barcelona, 2007. 170f. Dissertação (Doutorado em Ciências da Comunicação) – Universidade
Autônoma de Barcelona.

CARVALHO, M. S. Cinema Novo Brasileiro. In: MASCARELLO, F. História do cinema mundial. Campinas,
SP: Papirus, 2006.

COSTA, A. M.; SHWARCZ, L. M. 1890-1914, no tempo das certezas. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

COSTA, F. C. Primeiro cinema. In: MASCARELLO, F. História do cinema mundial. Campinas, SP: Papirus,
2006.

GOMES, P. E. S. Cinema: trajetória no subdesenvolvimento. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

GOMES, P. E. S. O cinema no século. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.

GUNNING, T. Cinema e História: “Fotografias animadas”, contos do esquecido futuro do cinema. In: Xavier,
Ismail (org.). O cinema no século. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

JANSON, H. W. Iniciação à história da arte. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

KAEL, P. Criando Kane. Rio de Janeiro: Record, 2000.

KOSSOY, B. Fotografia & História. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001.

MASCARELLO, F. História do cinema mundial. Campinas, SP: Papirus, 2006.

MAUAD, A. M. Imagem e autoimagem do segundo reinado. In: NOVAIS, F. A. (org.). História da vida
privada no Brasil: império. São Paulo: Cia das Letras, 1997.

MIRANDA, D. S. A pluralidade do cinema brasileiro. In: RAMOS, F. P.; SCHVARZMAN, S. (organizadoress).


Nova história do cinema brasileiro V. 1. São Paulo: SESC, 2018.

RITTAUD-HUTINET, J. Os irmãos Lumière. São Paulo: Scritta, 1995.

ROCHA, G. Revolução do Cinema Novo. Rio de Janeiro: Alhambra-Embrafilme: Paz & Terra, 1981.

SILVA JUNIOR, N. Cinema Brasileiro primeiros anos: origens e história. Publicação do 60 Encontro Regional
sul de História da Mídia, 2016.

SONTAG, S. Sobre fotografias: ensaios. São Paulo: Cia das Letras, 2004.

SHWARCZ, L. M. As barbas do imperador: D. Pedro II, um monarca nos trópicos. São Paulo: Cia das Letras,
1998.

THOMAS, D. Terra estrangeira: roteiro. Rio de Janeiro: Rocco, 1995.

XAVIER, I. O cinema brasileiro moderno. São Paulo: Paz e Terra, 2001.


4
Artes cênicas: a arte da imitação

Neste capítulo, abordaremos três artes cênicas: o teatro, a dança e a ópera. As artes cênicas
são todas aquelas que acontecem em cena ou no palco. Apesar de serem modalidades antigas
das artes visuais, elas continuam se reinventando e se mantêm modernas e atuais, evoluindo de
acordo com a época e as tecnologias disponíveis. São representações artísticas efêmeras, uma vez
que têm início e fim no palco. Cada apresentação é única. Conheceremos essas e muitas outras
características próprias das artes cênicas.
Então, vamos lá. Que se abram as cortinas e bom espetáculo!

4.1 Teatro: origem e evolução


Por ser tão natural à humanidade, estima-se que a encenação surgiu na Pré-história, enquanto
os humanos ainda pintavam cenas de caça nas cavernas como uma maneira de comunicação. De
acordo com Berthold (2001, p. 1),
o teatro é tão velho quanto a humanidade. Existem formas primitivas desde os
primórdios do homem. A transformação numa outra pessoa é uma das formas
arquetípicas da expressão humana [...] O Xamã que é o portador do deus, o
dançarino mascarado que afasta os demônios, o ator que traz a vida à obra do
poeta – todos obedecem ao mesmo comando, que é a conjuração de uma outra
realidade mais verdadeira.

Por ser uma arte que parece fazer parte da formação das civilizações, podemos encontrar
representações teatrais na história de vários povos, desde a Mesopotâmia, como um precursor
do teatro grego, até a América, com os povos originários do Brasil em danças aos deuses de sua
devoção.

4.1.1 Teatro grego


O teatro como conhecemos hoje, com atores, texto, palco e figurinos teve início na
Grécia, para
honrar os deuses ‘em cujas mãos impiedosas estão o céu e o inferno’ [...] duas
correntes foram combinadas, dando à luz a tragédia; uma delas provém do
legendário menestrel da Antiguidade remota, a outra dos ritos de fertilidade dos
sátiros dançantes. De acordo com Heródoto, os coros de cantores com máscaras
de bode existiam desde o século VI a.C. (BERTHOLD, 2001, p. 104)

Heródoto é considerado o primeiro historiador. Os coros de cantores, originalmente,


cantavam homenagens a heróis e reis gregos antigos, além de algumas histórias de batalhas
lendárias. Posteriormente, surgiu a representação de bodes dançarinos, que acompanhavam o
canto do coral com gestos e dança. Nesse momento, segundo Berthold (2001), originou-se uma
forma de arte que misturava canto e dança e que, anos mais tarde, daria início ao teatro.
60 História das artes visuais

Desse modo, o teatro foi sendo formado, agrupando seus elementos um a um. Primeiro, os
cantos para agradecer a colheita de uvas a Dionísio, deus do vinho e, posteriormente, do teatro.
Depois, os cantos tornaram-se tradicionalmente coro, unindo música e dança à celebração. Ao sair
do que era primitivo, surgiu a organização de tudo isso em encenação de fato.
Pisístrato, o sagaz tirano de Atenas que promoveu o comércio e as artes e foi o
fundador [...] das Grandes Dionisíacas, esforçou-se para emprestar esplendor a
essas festividades públicas. Em março do ano de 534 a.C., trouxe de Icária para
Atenas o ator Téspis, e ordenou que ele participasse da Grande Dionisíaca. Téspis
teve uma nova e criativa ideia que faria história. Ele se colocou à parte do coro
como solista, e assim criou o papel do hypokrites (“respondedor” e, mais tarde
ator), que apresentava o espetáculo e se envolvia num diálogo com o condutor
do coro. Essa inovação, primeiramente não mais do que um embrião dentro do
rito do sacrifício, se desenvolveu mais tarde na tragédia. (BERTHOLD, 2001, p.
104-105)

Berthold (2001) menciona vários termos importantes, como a criação das Grandes
Dionisíacas, que se tornariam os monumentais festivais teatrais com milhares de pessoas assistindo
às tragédias; os ritos do sacrifício, que também deram origem ao teatro; e, por fim, a Téspis, que
se colocou como solista e interpretou o papel de Dionísio. Essa foi a primeira encenação da qual
temos conhecimento e fez de Téspis o primeiro ator da história.
Desde sua origem, o teatro foi muito conhecido pela Grécia e permaneceu sendo usado em
festividades. Diversas peças gregas foram preservadas e chegaram até os nossos dias. Esses textos
são, em sua maioria, tragédias e algumas comédias. Conforme Aristóteles (2006), as tragédias eram
consideradas obras superiores, por retratarem a vida dos reis e dos deuses, já as comédias eram
inferiores, por serem feitas com base na vida do povo.
Foi preservado também o texto A poética, escrito pelo filósofo Aristóteles em 335 a.C. e que,
segundo Vasconcelos (2010), nos conta em detalhes como eram as encenações da época e nos
permite compreender com mais facilidade a maneira como ocorriam os festivais que eram
promovidos na Grécia.
As festividades Grandes Dionisíacas, Figura 1 – Máscaras de teatro

tinham a duração de, em geral, seis dias. O povo


La Gorda/Shutterstock

comparecia para assistir a histórias de mitos


como Édipo, Medeia e várias outras que tratavam
da relação entre os homens e os deuses. Máscaras
eram utilizadas para definir as expressões dos
personagens, como tristeza ou alegria. Por isso,
até hoje, o teatro é representado pela imagem
de duas máscaras (Figura 1); uma representa a
tragédia e a outra simboliza a comédia.
Artes cênicas: a arte da imitação 61

De acordo com Berthold (2001), a multidão reunida não era meramente espectadora, mas
participante; o público se envolvia ativamente nas encenações e, com cantos ritmados, o coro rodeava
a orquestra. O evento representava o ponto alto e festivo da vida religiosa, intelectual e artística da
cidade-Estado de Atenas. Os espaços teatrais foram sendo aperfeiçoados, aproveitando-se os vales
entre duas montanhas, onde eram colocados acentos para a público e à sua frente um semicírculo
onde ficavam a orquestra e o coro, além de um tipo de cenário de pedra com portas e janelas para
a aparição dos atores. A seguir, na Figura 2, podemos observar como eram monumentais os teatros
gregos que comportavam esses espetáculos.
Figura 2 – Ruínas do teatro Odeon em Atenas, Grécia

Aerial-motion/Shutterstock
Diferentemente da sua fase primitiva e fundadora, em que a aglutinação de coro e dança
fez surgir a representação artística por encenação, o teatro passou a ser produzido com base em
um texto escrito. De acordo com Aristóteles (2006), a poesia representava o teatro, imitando a
realidade pela voz, e se distinguia das artes plásticas, que imitavam pela forma e cor. Essa definição
de poesia permitia ao filósofo estabelecer diferentes formas poéticas, desde a dança até a poesia
lírica, a tragédia e a comédia. Por causa dessa relação entre teatro, poesia e escrita, o livro desse
filósofo se chamava Poética, que significa a arte de escrever versos ou dramas.
Aristóteles viveu no século IV a.C., época em que deu início ao seu livro Poética. Em sua
obra, o pensador grego afirmou que poética é considerada toda forma de arte, porém o foco de seu
texto era tratar da arte da imitação. A preservação de um livro como Poética foi fundamental para
a história do teatro.

4.1.2 Teatro romano


Roma, que herdou toda a arte da Grécia, após conquistá-la, passou a apresentar uma
modalidade diferente de teatro, adaptando-o a sua própria tradição e história. Mais ligado à
guerra, aos torneios de gladiadores e a comédias em que se criticava o poder, o teatro romano era
apresentado em ambientes semelhantes aos teatros gregos (Figura 3).
62 História das artes visuais

Figura 3 – Teatro romano de Orange na França

Sebastián Liera/Wikimedia Commons


Enquanto o teatro grego era construído em um vale montanhoso, aproveitando o terreno
para propiciar uma acústica em que o espetáculo pudesse ser ouvido até pelo último espectador
da plateia, o teatro romano era totalmente construído, inclusive as grossas arquibancadas de pedra
que acomodavam a plateia. É possível encontrar teatros romanos na França, em Portugal e por
todo lugar dominado pelo Império Romano, isso porque era necessário construi-los em cada novo
território conquistado.
O Império Romano foi um estado militar. Antes de Augusto, os romanos
eram guerreiros, depois de Augusto, governaram o mundo [...] o império
mundial romano é uma sucessão de guerras de conquista e, ao mesmo tempo, a
legitimação de um nacionalismo fundamentado, desde os primórdios, no poder
da autoridade. (BERTHOLD, 2001, p. 139)

Por essa razão, as encenações apresentadas eram sempre ligadas à guerra, os grandes
espetáculos eram lutas entre gladiadores. O Coliseu foi um espaço dedicado a isso e ainda se
encontra preservado. Na Figura 4 podemos observar o local.
Figura 4 – Coliseu Viacheslav Lopatin/Shutterstock
Artes cênicas: a arte da imitação 63

O espaço era bem complexo em sua construção e seu funcionamento, recebia milhares
de espectadores e muitos guerreiros que participavam das lutas. O espaço dedicado ao público
também precisava ser grande e, como podemos observar na Figura 5, não era mais um semicírculo,
como o dos gregos, mas tinha um formato oval completo.
Figura 5 – Coliseu internamente

Vitold Muratov/Shutterstock
Ao observar a estrutura interna do Coliseu podemos ver os espaços dedicados ao público,
as salas usadas para a preparação dos gladiadores e, no centro, o palco, onde aconteciam as lutas.

4.1.3 Teatro medieval


A Idade Média foi um período histórico ocorrido entre a queda do Império Romano, no ano
de 476 d.C. e a tomada de Constantinopla em 1453, época das grandes navegações que mudaram
a face da história do mundo. O período medieval é, portanto, muito extenso e foi nesse momento
que surgiu outro importante estágio para o teatro, o chamado teatro medieval.
Com o fim do Império Romano, a Igreja Católica, por conta de sua ascensão, teve o poder de
governar ao lado dos reis e de exigir proibições de cunho moral e religioso. A produção de teatro foi
proibida, no entanto a própria igreja encenava passagens bíblicas nas celebrações religiosas. Essas
encenações são denominadas autos e revivem datas como a morte e o nascimento de Cristo. Um
exemplo importante é O Auto Pascal, que durante o
século XIII trouxe consigo duas inovações de grande importância para o
desenvolvimento do teatro ocidental. Cristo, que até então havia estado presente
apenas como “símbolo”, agora aparece em pessoa como parceiro que fala e atua,
e a linguagem vernácula traz vida aos rígidos textos litúrgicos. A cerimônia
dramática ampliou-se para representação adaptada livremente. (BERTHOLD,
2001, p. 196)

As características dos grandes teatros também compõem as missas celebradas que, até hoje,
têm o padre em um espaço elevado, como uma espécie de palco, e os fiéis sentados em frente ao
púlpito, como que em uma plateia.
Eram feitas também encenações em outros períodos de celebração religiosa e em procissões.
As procissões são tradições ainda existentes em algumas cidades brasileiras por ocasião da Semana
Santa, por exemplo, “as origens do carro-palco remontam a 1264, quando o papa Urbano IV
64 História das artes visuais

instituiu a festa de Corpus Christi, que foi depois celebrada com procissões solenes por toda a
Europa ocidental” (BERTHOLD, 2001, p. 208).
Em uma época que poucas pessoas sabiam ler, as encenações e as missas eram o único acesso
dos fiéis à liturgia e ao texto da Bíblia.

4.1.4 Teatro renascentista e barroco


Após o período medieval, chegamos ao Renascimento. Nesse período, houve um resgate da
arte greco-romana nas artes plásticas e uma revalorização das tragédias gregas nas artes cênicas.
Acontece que, com a proibição do teatro, instituída pela Igreja católica, todos os textos das tragédias,
comédias e o livro Poética, de Aristóteles, ficaram escondidos em monastérios medievais. Com o
fim do período medieval, os textos gregos foram reencontrados, traduzidos e, consequentemente,
difundidos e reencenados. De acordo com Carlson (1997, p. 35),
a história da crítica dramática durante o Renascimento italiano é,
essencialmente, a história da redescoberta de Aristóteles, do estabelecimento
de sua Poética como ponto de referência central na teoria dramática e também
das tentativas de relacionar-lhe a obra e tradição já firmada.

Esse período foi muito importante devido ao surgimento de grandes artistas em todos os
segmentos das artes visuais, inclusive no teatro. Dentre eles, por exemplo, tivemos, na Inglaterra,
o dramaturgo que é considerado um grande gênio do teatro e da literatura inglesa e mundial:
William Shakespeare, autor de grandes clássicos, como Hamlet (1601), Otelo (1605), Rei Lear
(1606) e Romeu e Julieta (a data dessa produção é incerta).
De acordo com Berthold (2001), durante essa época, foram escritas mais de trinta mil
comédias na Península Ibérica, isto é, em Portugal e na Espanha. Entretanto, as que mais se
destacaram foram as de produção do dramaturgo espanhol Pedro Calderón de la Barca. De origem
familiar aristocrática, o autor teve boa formação erudita e foi bastante influenciado durante sua
permanência no colégio jesuíta. Calderón escreveu mais de 100 peças ao longo de sua vida. Dentre
suas peças mais relevantes estão A vida é sonho (1636), O príncipe Constante (1636) e O grande
teatro do mundo (1655) – espetáculos grandiosos e de grande profundidade existencial.
Na França, brilhou o gênio de Jean-Baptiste Poquelin, mais conhecido como Molière. Autor,
ator e encenador, o que hoje equivale à função de diretor do espetáculo, absorveu influências da
Commedia dell’arte1, mas não usou a encenação de improviso, que era característica desse modo
teatral.
Todo o trabalho de Molière se tornou possível porque ele teve como admirador e apoiador
o rei da França, Luís XIV.
Em 24 de outubro de 1658, veio a grande oportunidade com o qual qualquer
diretor de companhia sonhava: Molière e seu conjunto apresentaram-se no
Louvre diante do rei [...] A peça principal redundou em um fracasso, mas a
divertida intriga que se seguiu e seu autor - e intérprete – foram calorosamente
aplaudidos por Luís XIV e sua corte. (BERTHOLD, 2001, p. 347)

1 Estilo abordado na subseção 4.3.2.


Artes cênicas: a arte da imitação 65

Molière tentou escrever tragédias e peças dramáticas, mas sua vocação se manifestava
mesmo por meio da comédia. Dentre elas podemos citar A Escola de mulheres (1662), Médico à
força (1666) e O doente imaginário (1673).

4.1.5 Teatro romântico


O Romantismo foi um movimento muito maior, que surgiu e dominou o meio artístico,
literário, filosófico e político na Europa, no final do século XVIII, e ainda perdurou durante a
primeira metade do século XIX. Os românticos tinham uma visão nacionalista do mundo e,
assim, primavam pela cultura e pelos valores da pátria. Isso, de certo modo, ajudou a consolidar os
Estados-nação da Europa pós-monarquias.
Sendo bastante conhecidos os poetas e suas musas inatingíveis – em um contexto que levava
à busca espiritual, ao idealismo a à fuga da realidade –, os artistas românticos eram idealistas e
contempladores da vida. De um ponto de vista artístico, faziam isso com individualismo, um certo
pessimismo e apreço pela morte, subjetiva ou não, na poesia, na pintura e no teatro.
A Alemanha foi um dos primeiros países a experimentar em plenitude o romantismo e, por
isso, foi responsável por determinar o caráter do estilo por meio de um movimento que foi
denominado Sturm und drang, traduzido como tempestade e ímpeto. Esses termos ajudam a
caracterizar o romantismo, pois a tempestade é como algo que está dentro da alma dos poetas e há
o ímpeto poético e idealista de acreditar na arte como meio de expressão. Exemplo disso são as
peças de Johann von Goethe (1749-1832) e Friedrich von Schiller (1759-1805).
Goethe foi um advogado alemão que dividiu sua profissão com o amor pela literatura e
pelo teatro. Dentre suas obras, podemos citar a peça Fausto, composta em diálogos rimados. O
personagem principal, Fausto, ao Figura 6 – Teatro Nacional Alemão, em Weimar.
fazer um pacto com o demônio,

LaMiaFotografia/Shutterstock/Shutterstock
recebe tudo o que deseja na terra
e, em troca, tem de entregar a
sua alma. Já Schiller foi poeta,
filósofo e historiador; escreveu a
peça Maria Stuart, que contava
a vida da rainha da Escócia. Na
Figura 6 podemos observar o
teatro da província de Weimar,
na Alemanha, com as estátuas de
Goethe e Schiller, representando
a importância dos autores para a
nação alemã.
66 História das artes visuais

4.1.6 Teatro realista


O Realismo é uma corrente estética, cuja emergência se situa historicamente entre 1830 e
1880. "O termo realismo aparece [...] em 1826, com a finalidade de reagrupar as estéticas que se
opõem [...] ao romantismo e à arte pela arte, pregando uma imitação fiel da natureza" (PAVIS,
2008, p. 327). É também a busca por uma técnica capaz de dar conta, de maneira objetiva, da
realidade psicológica e social da época.
O Realismo, no teatro, vem carregado de um modo de encenação que busca imitar e levar
ao palco a vida “real” ou a sociedade como é na realidade; por isso é chamado de realismo. Quando
surgiu, o movimento buscava superar o Romantismo, com o idealismo e ufanismo patriótico.
Compreender os tempos e sua realidade significa também ver o homem em
sua vida cotidiana, em seu meio ambiente e seus compromissos sociais. Como
afirmou Alexandre Dumas Filho, era tarefa do teatro realista desnudar o abuso
social, discutir o relacionamento entre o indivíduo e a sociedade e, tanto no
sentido literal quanto em outro mais elevado, mostrar-se como um théatre útile
(teatro útil). (BERTHOLD, 2001, p. 441)

O teatro que conhecemos atualmente tem em si muitas características desse teatro realista.
Um espetáculo realista é tão fiel aos detalhes da vida cotidiana que poderíamos quase morar no
palco. O cenário representa uma casa como a que vivemos de fato. A sala tem poltronas, cortinas,
porta-retratos e, se houver um telefone e ele tocar, por exemplo, os personagens o atendem e travam
um diálogo fiel ao que temos com amigos e familiares. Esse é outro ponto importante desse estilo, o
texto não é erudito e em versos, como os de Goethe durante o Romantismo, tampouco rebuscado
de palavras difíceis e poéticas, como nos espetáculos trágicos clássicos. O diálogo no teatro realista
representa o modo como as pessoas falam diariamente. Além disso, o importante para o Realismo
era valorizar a vida das pessoas em sociedade, mostrar como viviam de fato em suas relações
pessoais e como a comunidade, com seus limites e desafios, interfere na vida das pessoas.
Um autor que podemos dar como exemplo do teatro realista é o norueguês Henrik Ibsen,
considerado o pai do drama moderno. Ele chegou a ser comparado a Shakespeare. Bernard Shaw,
dramaturgo irlandês da época, afirmou que o teatro moderno teve sua origem quando Ibsen
produziu sua peça Casa de bonecas (BERTHOLD, 2001), em 1879, seu maior reconhecimento
como dramaturgo. A peça é uma das primeiras a discutir a necessidade de emancipação da mulher,
a possibilidade de que as mulheres deixassem de viver como se estivessem em uma casa de bonecas
obedecendo ao marido, cuidando dos filhos, sem a possibilidade de trabalhar. Podemos analisar
que a peça, portanto, trata de um problema real da sociedade da época em que foi escrita, assim
como é característico do estilo realista.

4.1.7 Teatro naturalista


Originado entre os anos 1880 e 1890, pode ser considerado um aprimoramento do Realismo
em si. É como se o Naturalismo quisesse produzir um teatro que fosse ainda mais real que o próprio
Realismo.
Nas palavras de Pavis (2008), no teatro, o Naturalismo propõe uma forma de encenar a
realidade de modo que possa reproduzi-la fotograficamente e não seja estilizada. “A representação
Artes cênicas: a arte da imitação 67

naturalista se dá como sendo a própria realidade, e não como uma transposição artística no palco
[...] propõe-se ao espectador como a própria realidade” (PAVIS, 2008, p. 261), ou seja, o teatro
deve ser capaz de realizar uma imitação ainda maior da própria natureza, daí o nome. O teatro
naturalista se tornou um estilo de interpretação que caracteriza toda uma corrente contemporânea.
Pavis exemplifica como esse estilo influenciou a telenovela, mas podemos observar isso desde o
cinema até os comerciais.

4.2 Origem do teatro no Brasil


Conforme Magaldi (1997), o teatro em terras brasileiras teve início quando os jesuítas
chegaram ao Brasil, pouco tempo após o país ter sido colonizado por Portugal. O teatro foi a
maneira mais fácil que eles encontraram para ensinar a religião católica aos povos indígenas. Entre
esses jesuítas, estava o Padre Anchieta, que tinha grandes talentos literários e escreveu alguns
dos autos, usados na catequização. Essas peças eram encenadas em português, o que colaborou
diretamente com o ensino da língua para os indígenas.
Após esse período inicial, houve o que alguns estudiosos do teatro brasileiro chamam de
“um vazio de dois séculos”. Esse vazio se refere ao período entre o final do século XVI e o final
do século XVIII em que não houve registros relevantes de apresentações teatrais ou textos com
essa finalidade. Somente no fim do século XVIII apareceram registros de escritos destinados à
encenação teatral por alguns letrados de Minas Gerais, também conhecidos como inconfidentes,
devido ao movimento de revolta que culminou com o enforcamento de Tiradentes em 1792. Antes
da revolta, quando ainda produziam seus textos, sem noção do que o futuro os aguardava.
O teatro teve mais um capítulo importante com a construção de casas de ópera no século
XVIII. Em Minas Gerais, graças ao enriquecimento rápido de algumas vilas, com a descoberta de
ouro e pedras preciosas, foram construídos teatros particulares. Na Figura 7, podemos observar a
Casa de Ópera de Vila Rica, hoje conhecida como Teatro Municipal de Ouro Preto, considerado o
teatro mais antigo ainda em funcionamento da América Latina.
Figura 7 – Teatro Municipal de Ouro Preto
Cecioka/Wikimedia Commons
68 História das artes visuais

O teatro se firmou no Brasil após a vinda da família real portuguesa, em 1808. A Corte trouxe
consigo costumes culturais, como bibliotecas e a imprensa e, segundo Cafezeiro (1996, p. 99), para
receber as companhias europeias foi preciso construir edifícios de teatro no Rio de Janeiro. Os
primeiros atores e dramaturgos brasileiros aprenderam seu ofício assistindo a essas companhias
teatrais. Durante muito tempo, as peças de origem brasileira foram consideradas inferiores, de
acordo com o padrão europeu, contudo muitas comédias fizeram grande sucesso e encheram os
teatros contando histórias do nosso povo, em um primeiro encontro com nossa nacionalidade.
Entre os autores fundamentais do teatro brasileiro, no século XX, estão Nelson Rodrigues
e Ariano Suassuna. O primeiro foi jornalista e dramaturgo, conseguindo elevar o nosso teatro ao
nível da originalidade e maturidade artística diante de todo o mundo.
A lufada renovadora da dramaturgia contemporânea partiu de Vestido de
Noiva – não se contesta mais. Nelson Rodrigues conheceu de súbito a glória
teatral e a repercussão transcendeu os limites do palco, irmanando-se ele às
outras artes. Talvez, em toda história do teatro brasileiro, nenhuma outra peça
tenha inspirado tantos artigos, tantos elogios, um pronunciamento maciço dos
escritores e dos intelectuais. (MAGALDI, 1997, p. 217)

Vestido de noiva foi levada ao palco por um grupo denominado Os comediantes, em 1943.
Nessa peça o autor usa as memórias, o inconsciente e os sonhos dos personagens para tecer uma
trama que só se fecha no final. Ainda considerada genial, é um marco do teatro brasileiro.
Magaldi (1997, p. 236) define Ariano Suassuna como “dramaturgo paraibano, fixado
no Recife, [que] aproxima o Nordeste de Florença e Roma renascentista”. Isso porque Suassuna
conseguiu prestar uma homenagem a vários textos clássicos, dos quais era grande conhecedor,
reunindo elementos que homenageiam comédias greco-romanas e o teatro mambembe medieval
com enorme genialidade. O exemplo mais claro disso é a obra O Auto da Compadecida, de 1955,
em que Suassuna soube traduzir para o teatro personagens do Nordeste brasileiro e reuniu
elementos de uma comédia romana chamada A aulularia e da peça O avarento, de Molière – o
grande comediante francês do século XVI, renascentista.

4.3 Variações teatrais: o palco, a atuação


A Grécia e a Roma nos deixaram modelos de civilização ainda seguidos na arte, escultura,
filosofia, política e, principalmente, no teatro. Partindo desse último modelo, foi possível criar
outros modos de encenar. Na Figura 2 pudemos visualizar o espaço onde as peças gregas eram
encenadas, esse tipo é denominado semiarena. Ele permite que haja público em frente e nas laterais
dos atores e normalmente é a céu aberto. Existe também o teatro de arena, em que o palco é circular
e o público pode ficar atrás do espetáculo, como os romanos.
Na Figura 8 podemos ver o Globe Theater, conhecido como o teatro de Shakespeare, pois se
encontra no mesmo lugar do antigo teatro em que o autor inglês apresentava seus espetáculos; foi
reconstruído igual ao anterior que havia sido destruído no século XVII.
Artes cênicas: a arte da imitação 69

Figura 8 – Globe Theater externamente

Aiwok/Shutterstock
O Globe Theater apresenta uma estrutura de semiarena. Parcialmente ao ar livre, ele possui
balcões nas laterais para acomodar o público sentado, enquanto na parte da frente do palco as
pessoas assistem à peça em pé, assim como era no tempo de Shakespeare.
Figura 9 – Globe Theater internamente

Flux Garden~commonswiki/Wikimedia Commons

O espaço teatral mais conhecido é o de palco italiano (Figura 10). Nele, o público tem acesso
apenas à parte em frente ao palco e as laterais são utilizadas para entrada e saída de atores durante
o espetáculo. Alguns teatros maiores possuem, em frente ao palco, de modo não visível ao público,
um fosso usado para a orquestra executar a música ao vivo. A iluminação nesse modelo de palco
não é natural, como nas semiarenas; ela era feita com velas e todo tipo de lamparinas, mas isso
causava muitos incêndios e destruição dos teatros. Com a invenção da lâmpada incandescente, o
teatro passou a fazer uso da luz elétrica. O palco italiano permite aos espetáculos ter mais recursos
técnicos, como mudanças de cenários, com sistema de cordas e roldanas que elevam um painel
inteiro e substituem por outro.
70 História das artes visuais

Figura 10 – Palco italiano

Kozlik/Shutterstock
Um exemplo de espetáculo que precisa de recursos gerados pelo palco italiano, ou seja, a sala
escura e totalmente fechada, é o teatro de sombra, pois sem a escuridão não é possível projetar a luz
nem conseguir formar as sombras.
Figura 11 – Teatro de sombras

Tatiana Bobkova/Shutterstock
Artes cênicas: a arte da imitação 71

No teatro de sombras os atores ficam escondidos atrás de um pano e somente a sombra deles é
exibida. Ao se movimentarem, fazem com que as imagens projetadas fiquem maiores ou menores, de
acordo com a proximidade da iluminação no fundo do palco. Isso ajuda a contar a história.

4.3.1 Mambembe
Mesmo tendo sido proibido pela Igreja católica durante a Idade Média, o teatro continuou
existindo e se desenvolvendo. Assim, nesse período, teve início o teatro mambembe.
O teatro mambembe tem como característica a improvisação dos artistas, “guardada sua
relação com a arte milenar do circo no seu aspecto de arena para a prática de jogos populares ou
de espaço reservado à recreação” (SANTOS, 2010, p. 34). O circo, grande influenciador da arte
mambembe, talvez seja o elemento mais presente em nossa memória coletiva. Assim como o artista
de circo, o ator mamabembe precisa viajar com todo o aparato cênico, indo de uma cidade a outra,
para se apresentar em praças e sobreviver como profissional das artes cênicas. Ele vive em um grande
modelo de “família artística”, cada dia mais raro nos dias atuais.
Falar sobre teatro mambembe, destacar as trupes amadoras que circulam [...]
é um pouco referir esse universo de trânsitos culturais e de permeabilidade
entre manifestações de literatura e cultura. Primeiro pela própria natureza da
atividade (o teatro mambembe), que não deixa de ser uma expressão genuína de
arte, feita a partir da força de vontade, apreendida na comunhão entre gerações,
sem o necessário aporte das escolas e da reflexão crítica. (SANTOS, 2010, p. 34)

O teatro mambembe pode ser um teatro de rua ou não, uma vez que os espetáculos podem
ser encenados dentro de um teatro ou até mesmo em uma lona, como é o caso do circo, que é de
natureza mambembe. A tradição que é mantida por meio do teatro mambembe carrega consigo o
desejo mais profundo de se fazer teatro, esteja o público onde estiver.

4.3.2 Commedia dell’arte


A Commedia dell’arte é um tipo de apresentação teatral que surgiu a partir do século XVI, na
Itália, com um grupo de atores.
Quando o conceito de Commedia dell’arte surgiu na Itália no começo do século
XVI, inicialmente significava não mais que uma delimitação em face do teatro
literário culto, a commédia erudita. Os atores dell’arte eram, no sentido original
da palavra, artesãos de sua arte, a do teatro. (BERTHOLD, 2001, p. 353)

Trata-se de um tipo de teatro que é chamado desse modo por reunir um conjunto específico
de características. Era uma performance de grupos itinerantes que visitavam as cidades para
apresentar encenações caracterizadas, segundo Pavis (1999), pela criação em conjunto dos atores
que, com base em um roteiro básico, improvisavam cenas com acontecimentos e pessoas conhecidas
da cidade onde estavam se apresentando.
72 História das artes visuais

As apresentações eram feitas em feiras, teatros encontrados pelo caminho, ruas, praças
públicas ou na própria carroça que a trupe usava para se locomover. Os personagens eram
predefinidos e representavam casais jovens, velhos e criados. A interpretação usava de falas e gestos
improvisados, e a utilização de máscara era um recurso fundamental nesse teatro, pois era o que
definia grande parte dos personagens, como na Figura 12, na qual podemos ver a ilustração de um
Arlequim, e na 13, que demonstra a representação de um espetáculo.
Figura 12 – Arlequim Figura 13 – Representação de atores da Commedia
dell’arte

Eugene Ivanov/Shutterstock

KUCO/Shutterstock
Esse tipo de teatro se diferencia dos outros porque, enquanto no convencional o público
saía de casa para apreciar um espetáculo, a Commedia dell’art era apresentada nas ruas, em todo o
mundo, há muitos séculos.

4.3.3 Teatro de bonecos


O teatro de bonecos coloca toda a interpretação, a voz, os gestos e as intenções nos bonecos
que são manipulados por atores. É como se o ator se escondesse por trás do boneco para lhe dar
vida ou, ainda, como se o boneco fosse um tipo de máscara que o ator usa para interpretar.
“Boneco é o termo usado para designar um objeto que, representando a figura humana, ou
animal, é dramaticamente animado diante de um público” (AMARAL, 1996, p. 71, grifos nossos).
De acordo com a autora, os bonecos – assim como as técnicas usadas para o teatro de bonecos –
surgiram na China em 1000 a.C.; na Índia 200 a.C.; e no Japão no século VIII da Era Cristã.
Nos últimos anos, convencionou-se usar a palavra boneco como um termo
genérico que abrangesse suas várias técnicas. Assim, marionete é o boneco
movido a fios; fantoche, ou boneco de luva, é o boneco que o bonequeiro calça ou
veste; boneco de sombra refere-se uma figura de forma chapada, articulável ou
não, visível com projeção de luz; boneco de vara é um boneco cujos movimentos
são controlados por varas ou varetas; marote é também um boneco de luva que
o bonequeiro veste e com sua mão articula a boca do boneco. (AMARAL, 1996,
p. 71-72)
Artes cênicas: a arte da imitação 73

Como podemos ver, o teatro de bonecos é Figura 14 – Boneco do tipo marionete

julienj/Shutterstock
praticamente um novo mundo teatral a ser explorado, com
características e história próprias. Na Figura 14, podemos
observar um boneco do tipo marionete, suspenso e
manipulado por cordas ou fios.
Os atores por trás dos bonecos dedicam toda uma
vida ao aperfeiçoamento dessa técnica. De acordo com
Amaral (1996), enquanto na encenação teatral o ator cria
a imagem do personagem, no teatro de bonecos a imagem
já vem pronta e é dever do ator-manipulador servir ao
boneco, sem ser visível. Para isso, o ambiente em que as
peças são apresentadas deve esconder os manipuladores,
de modo que apenas os bonecos possam ser vistos pela
plateia. A Figura 15 traz um exemplo de estrutura usada
nesses tipos de apresentações.

Figura 15 – Teatro de fantoches

Paolo Gallo/Shutterstock

Como citado anteriormente, não existe somente um tipo de boneco, visto que pode ser
pequeno ou gigante; pode ser manipulado por um único bonequeiro, como o fantoche; ou pode
precisar de vários, como os bonecos gigantes Royal de Luxe em que a manipulação é feita com
guindastes e são necessárias muitas pessoas para mover um único boneco que, em tamanho,
equivale a um prédio de dois andares.
A própria confecção dos bonecos é um processo artístico. Os bonecos podem ser esculpidos
em madeira ou gesso, feitos com papel machê, com tecido ou até mesmo com materiais diversos.
74 História das artes visuais

4.4 Dança: corpo em movimento


A dança é natural ao ser humano e são inúmeras as linguagens existentes dentro dessa
representação artística. Segundo estudiosos da área, antes mesmo de falar, o ser humano dançou
para se expressar e se comunicar. Todos os gestos e todas as ações presentes no nosso dia a dia,
como cair, correr, andar, deitar-se, pular etc., são encenados na dança, sendo que o “movimento
engloba, ainda, inúmeros, variados e diferentes vocabulários de dança: técnicas de danças sociais,
esportes, balé, frevo, jazz, capoeira” (RENGEL; SCHAFFNER; OLIVEIRA, 2016, p. 11).
Dança primitiva: relação natural do ser humano
Conforme Tadra (2009), desde o início da civilização, antes mesmo do desenvolvimento da
fala, a dança foi uma forma de expressão e de comunicação compreendida por todos os povos, por
mais distantes que fossem. Pinturas primitivas representando pessoas dançando foram encontradas
em cavernas, como podemos observar na Figura 16, o que comprova essa relação de longa data
entre o ser humano e a dança.
Figura 16 – Pintura em caverna de pessoas dançando

gerasimov_foto_174/Shutterstock

Atualmente alguns grupos étnicos ainda mantêm as representações de danças antigas e


tradicionais para que suas antigas origens não caiam no esquecimento.
No Brasil, a despeito da forte tentativa de aculturação sofrida, alguns grupos indígenas ainda
mantêm por meio da dança suas tradições. Apesar de adotarem vestimentas mais modernas, no
lugar e que outrora os corpos nus fariam naturalmente a reverência em suas celebrações espirituais,
o povos indígenas brasileiros têm tentado preservar os rituais sagrados e as tradições. De acordo
com Müller (2004), as danças rituais são preservadas no Xingu, na Amazônia, pelo povo tupi-
guarani, como podemos observar na Figura 17.
Artes cênicas: a arte da imitação 75

Figura 17 – Dança de índios do Xingu, no Brasil.

celio messias silva/Shutterstock


O Brasil, assim como outros povos, tem sua origem ancestral, artística e cultural que
custamos muito para preservar e é muito importante para o conhecimento de nossas origens
e evolução.
Dança clássica
Durante o período do renascimento, em festas das cortes reais, como casamentos e
aniversários, um tipo diferente de dança se desenvolveu, uma dança erudita e cheia de regras,
chamada dança de corte, o que anos depois seria conhecido como balé.
A dança de corte assinalará uma nova etapa: desde o século XII, a dança
“metrificada” havia se separado, na França, da dança popular. No Quattrocento,
ela se tornará uma dança erudita, onde será preciso não somente saber a métrica,
mas também os passos. (BOUCIER, 2001, p. 64)

Esse período foi um divisor de águas para a dança, pois, foi nessa época que surgiu, pela
primeira vez, os profissionais dessa área, como dançarinos e mestres (BOUCIER, 2001). Por se
tratar de uma arte extremamente erudita, feita por nobres para a apreciação de outros nobres, era
inevitável que seus mestres, ensaiadores e criadores pertencessem à nobreza.
até então, a dança era uma expressão corporal de forma relativamente livre;
a partir deste momento, toma-se consciência das possibilidades de expressão
estética do corpo humano e da utilidade das regras para explorá-lo. Além disso,
o profissionalismo caminha, sem dúvida, no sentido de uma elevação do nível
técnico. (BOUCIER, 2001, p. 64)

Depois que as danças de corte saíram dos palácios, passaram a ser apresentadas em teatros,
e esse é o momento em que podemos dizer que surgiu de fato a dança clássica. Segundo Boucier
(2001), Charles-Louis Pierre de Beauchamps foi o responsável pela evolução ao elaborar a dança
76 História das artes visuais

técnica clássica, impondo a essa forma de representação artística uma organização universal.
“Como toda arte da época de Luís XIV, seu sistema tende à beleza das formas, à sua conformidade
a um cânone fixo e, consequentemente, à sua rigidez” (BOUCIER, 2001, p. 116).
Outras danças
A Figura 18 traz um breve resumo sobre outros tipos de dança.
Figura 18 – Danças
Capoeira

Dani Llao Calvet/Shutterstock


Criada por africanos escravizados como uma forma de
resistência cultural, é um tipo de luta e dança que surgiu entre
os séculos XVI e XVII e, na década de 1930, se popularizou no
Brasil. Seu acompanhamento musical é feito com berimbau
e atabaques, também tradicionais da cultura africana. Foi
reconhecida como patrimônio imaterial brasileiro pela
Unesco.

Jazz dance
Pavel Rumme/Shutterstock

Surgiu entre o fim do século XIX e início do XX. Recebeu


influência tanto do balé clássico quanto da dança moderna.
Carrega também o estilo de improviso.

Samba
Dragon Images/Shutterstock

Considerada uma mistura de elementos musicais da África


e da Europa, surgiu como estilo musical no século XIX, na
cidade do Rio de Janeiro e teve como derivação a dança.
Possui diversas vertentes e é comumente dançado nas
festas de carnaval.

Sapateado
Pablo Serrano Huguet/Shutterstock

Surgiu na Irlanda e se popularizou nos EUA. Em 1930


ganhou destaque junto aos musicais da Brodway. Tem como
característica o som forte e ritmado produzido pelos sapatos
dos dançarinos ao tocarem no chão.
Artes cênicas: a arte da imitação 77

Tango

BonnieBC/Shutterstock
Essa dança surgiu nos bairros populares da Argentina,
derivada do estilo musical de mesmo nome. Dançada em
par, pode possuir coreografia complexa e que exige muita
preparação dos bailarinos. Além da grande interação entre
os dançarinos, tem como características a paixão e a
sensualidade.

Dança moderna

Nanette Grebe/Shutterstock
Surgiu entre a década de 1920 e 1930, nos Estados Unidos.
Tem origem diretamente ligada a Isadora Duncan, que ao
dançar descalça com túnicas no lugar da roupa tradicional
de balé questionou e se opôs aos estatutos rígidos do
balé clássico, e a Martha Graham, que estruturou a dança
moderna.

Frevo
Juniorpetjua/Wikimedia Commons

Derivado de danças e brincadeiras trazidas pelos portugueses


para o Brasil, o frevo surgiu como ritmo em Pernambuco
e se popularizou a partir da década de 1930. É um tipo de
dança que exige resistência física e é caracterizado pela
sombrinha colorida que permanece na mão do dançarino
durante a performance. Foi reconhecido como patrimônio
cultural imaterial pela Unesco e costuma ser apresentado em
espaços abertos e nos carnavais de rua.

Street dance
Luis Molinero/Shutterstock

Dança que nasceu nas periferias das grandes cidades, mas


atualmente ganhou visibilidade pelos grandes músicos
norte-americanos. Se popularizou nos Estados Unidos,
em 1970, quando foi desenvolvida nos estúdios e acabou
conquistando as ruas e as festas. É uma dança urbana que
ganhou várias derivações, como rap, funk e hip-hop.

Fonte: Elaborada pela autora com base em: Boucier (2001); Franco (2016); Iphan (2019).

4.5 Ópera: música, teatro e dança reunidos


Caracterizado pelo exagero e pelos contrastes, o Barroco é um movimento artístico que teve
grande influência na arquitetura e na música. O estilo produziu efeitos na arquitetura pelo uso de
muitos ornamentos, imagens e, às vezes, excesso de ouro em templos religiosos e palácios reais da
Europa; já na música, isso ocorre pelo exagero de instrumentos sobrepostos nas orquestras, nos
coros e, por fim, na ópera. Dentre os músicos do período, podemos citar Mozart e Bach.
78 História das artes visuais

A dança clássica também surgiu nesse período e é marcada pelo rebuscamento do cenário,
das roupas e das carruagens, por exemplo. Nesse contexto, segundo Berthold (2001), o Barroco viu
a ópera nascer.
A ópera é considerada um espetáculo completo por misturar teatro, música e dança clássica. Se
por um lado é positiva essa mistura dos elementos que a compõem, por outro, segundo Vaconcellos
(2010), essa junção de linguagens é o grande problema desse gênero artístico. Isso porque, para
compor uma boa ópera, o compositor deve ser um exímio músico e, ao mesmo tempo, deve dominar
a escrita do drama. Alguns prodígios conseguiam reunir essas facetas, mas, por não ser uma atividade
comum, muitos compunham as partituras com base em dramas já produzidos. Muitas vezes, era
necessário que um outro profissional ficasse responsável pelas coreografias do balé.
Na busca dessa adequação, desde o início até nossos dias, cinco nomes devem
ser destacados: Cláudio Monteverdi (1567-1643), o primeiro a chegar a algum
resultado na fusão de música e drama; Christoph Gluck (1714-1787); Wolfgang
Amadeus Mozart (1756-1791); Richard Wagner (1813-1883) e Richard Strauss
(1864-1949). Evidentemente, esses cinco nomes não esgotam a lista dos grandes
compositores de ópera, mesmo que as obras dos demais se reduzam, muitas
vezes, a um enredo. (VASCONCELLOS, 2010, p. 171)

Mozart talvez seja o mais conhecido, e algumas de suas composições no gênero ópera são:
Don Giovanni, A flauta mágica e As bodas de Fígaro. Dentre os compositores não citados por
Vasconcellos está, por exemplo, George Bizet, que compôs a ópera Carmen, com libreto de Henri
Meilhac e Ludovic Halévy, em 1875.
A encenação das óperas clássicas ainda é uma tradição mantida em todo o mundo; todavia,
com o tempo, esse gênero evoluiu e passou a ganhar outras formas, como as óperas modernas e
os musicais. O fantasma da ópera, por exemplo, é um musical bastante apresentado pelo mundo.
Nesse enredo, uma soprano é assombrada por um músico desconhecido e obcecado por ela. Como
ninguém o conhece, acaba-se por chamá-lo de fantasma da ópera. O musical é baseado no livro de
mesmo nome. Na Figura 19, podemos observar um cartaz que traz a imagem de divulgação desse
musical.
Figura 19 – O fantasma da ópera
Artes cênicas: a arte da imitação 79

Do mesmo modo como os espetáculos de ópera são grandiosos, os espaços dedicados às


suas apresentações também são bastante imponentes e ostentam o poder cultural e financeiro
de seus apreciadores, conforme podemos ver na Figura 20. Como se destinam, originalmente, a
apresentações eruditas, para um público erudito, são espaços grandiosos em toda a sua plenitude.
As fachadas, o interior e os recursos disponíveis no palco são imponentes.
Figura 20 – Ópera de Paris internamente

Benh/Wikimedia Commons/Shutterstock
Os movimentos artísticos não são estáticos, com início e fim definidos por uma data. Eles
se misturam e influenciam-se. O mesmo ocorre com a ópera: desde que surgiu, sob a influência do
estilo barroco, vem permitindo novas criações e continua a brilhar e emocionar a todos com sua
grandiosidade.

Considerações finais
As artes cênicas são todas aquelas concebidas para a cena ou para o palco. São também
artes efêmeras, que terminam imediatamente após a apresentação, mesmo com a possibilidade de,
atualmente, gravar as apresentações de dança, teatro ou ópera. Isso ocorre porque as artes cênicas
são interativas e o momento único do acontecimento artístico se esgota sem a presença do público.
80 História das artes visuais

Ampliando seus conhecimentos


• A VIAGEM do capitão tornado. Direção: Ettore Scola. Elenco: Emmanuelle Béart,
Giuseppe Cederna, Jean-François Perrier, Lauretta Masiero. Itália: Vintage Films, 1990.
(132 min.).
Nesse filme, é possível conhecer o percurso de um grupo de teatro do tipo commedia
dell’arte. O enredo conta a história de um filho de nobre que, já falido, pega carona com
uma trupe que estava de passagem por seu castelo, para ir a Paris e ser reconhecido como
nobre pelo rei. Mas, ao longo da viagem, as coisas mudam para o jovem. O filme é muito
interessante pois apresenta a jornada do grupo teatral, suas viagens pelas vilas da Europa,
apresentações, o espaço cênico e os desafios dos atores da época.

• PODEROSA Afrodite. Direção: Woody Allen. Elenco: Michael Rapaport, Helena Bonham
Carter, Mira Sorvino, F. Murray Abraham. EUA: Europa Filmes, 1995. (95 min.).
Nesse filme, o diretor Woody Allen, com seu estilo peculiar, ambienta a história de um
homem de Nova York como se fosse uma tragédia grega antiga.

• SHAKESPEARE apaixonado. Direção: John Madden. Elenco: Ben Affleck, Judi Dench,
Tom Wilkinson, Geoffrey Rush, Gwyneth Paltrow. Inglaterra: Universal Pictures, 1999.
(124 min.).
Esse filme consegue se aproximar bastante do que pode ter sido a época em que
Shakespeare trabalhou, inclusive é gravado no teatro onde ele encenou.

• O AUTO da compadecida. Direção: Guel Arraes. Elenco: Lima Duarte, Matheus


Nachtergaele, Marco Nanini, Diogo Vilela, Fernanda Montenegro. Brasil: Columbia
Pictures, 2000. (104 min.).
Aqui podemos ver a maestria do texto de Ariano Suassuna. A curiosidade é que no filme a
história se mistura com outra peça do autor, O santo e a porca. O filme tem tanta qualidade
quanto a peça de teatro; são linguagens diferentes, cada uma com suas peculiaridades.

Atividades
1. Como o teatro clássico greco-romano se conecta e supera sua versão primitiva?

2. Quais são as formas consideradas eruditas nas artes cênicas? Elas se relacionam entre si?
Como?

3. Quais são os modos mais populares das artes cênicas e suas principais características?
Artes cênicas: a arte da imitação 81

Referências
AMARAL, A. M. Teatro de formas animadas: máscaras, bonecos, objetos. São Paulo: Edusp, 1996.

ARISTÓTELES. A Poética. São Paulo: Martin Claret, 2006.

BERTHOLD, M. História mundial do teatro. São Paulo: Perspectiva, 2001.

BOURCIER, P. História da dança no Ocidente. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

CAFEZEIRO, E. História do teatro brasileiro: um percurso de Anchieta a Nelson Rodrigues. Rio de Janeiro:
UFRJ: Euerj: Funarte, 1996.

CARLSON, M. Teorias do teatro: Estudo histórico-crítico, dos gregos à atualidade. São Paulo: Fundação
Editora Unesp, 1997.

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iniciais com o tema. Revista Repertório, Salvador, n. 26, p. 266-272, 2016.1

IPHAN. Frevo. Patrimônio Cultural Brasileiro. Disponível em: http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/


arquivos/Frevo%20%E2%80%93%20Patrim%C3%B4nio%20Cultural%20brasileiro.pdf. Acesso em: 04 dez.
2019.

MAGALDI, S. Panorama do teatro brasileiro. São Paulo: Global, 1997.

MÜLLER, R. P. Danças indígenas: arte e cultura, história e performance. Indiana, n. 21, p. 127-
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PAVIS, P. Dicionário de teatro. São Paulo: Perspectiva, 1999.

PAVIS, Patrice. Dicionário de teatro. São Paulo: Perspectiva, 2008.

RENGEL, L. P.; SCHAFFNER, C. P.; OLIVEIRA, E. Dança, corpo e contemporaneidade. Salvador: UFBA,
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Acesso em: 1 nov. 2019.

SANTOS, P. B. Brasil adentro, Brasil afora: teatro mambembe em cartaz. Fragmentum, Laboratório
Corpus: UFSM, n. 25, abr.–jun. 2010. Disponível em: https://periodicos.ufsm.br/fragmentum/article/
view/11137/6746. Acesso em: 25 nov. 2019.

TADRA, D. S. A. et al. Metodologia do ensino de artes: linguagem da dança. Curitiba: Ibpex, 2009.

VANCOCELLOS, L. P. Dicionário de teatro. Porto Alegre: L&PM, 2010.


5
O mundo contemporâneo e as artes visuais

A arte reflete cada período da história. Por isso, estudar arte contemporânea nos permite
compreender e conhecer o olhar de vários artistas sobre o mundo em que vivemos e sobre as
mudanças vertiginosas de um planeta globalizado. Neste capítulo, abordaremos o que é a arte
contemporânea e conheceremos os principais movimentos artísticos do período.

5.1 Arte contemporânea


Para compreendermos a arte contemporânea, é necessário entendermos o momento
de transição entre os séculos XIX e XX. A partir de certo ponto de avanços e ampliação do
conhecimento humano, passamos a ter noção de que ciência, arte e história não têm um passado
pronto e estático e, assim, não é errado dizer que o passado pode mudar. Afinal, isso é possível
sempre que descobrimos novos elementos sobre fatos acontecidos ou quando novos conhecimentos
modificam o nosso entendimento sobre o passado.
O que os homens medievais pensavam sobre si mesmos era diferente do que os renascentistas
pensavam sobre eles. Do mesmo modo, a nossa visão sobre os indivíduos de ambas as épocas
também é diferente, pois hoje temos conhecimentos que pessoas de outras épocas não tinham. O
que vemos são apenas novos modos de perceber e incorporar todo o conhecimento acumulado ao
longo dos séculos. E a arte contemporânea reflete todo esse modo de perceber os acontecimentos.
As invenções surgidas no fim do século XIX e início do século XX tiveram grande impacto
sobre nossa vida cotidiana. No início do século XX, o surgimento da energia elétrica permitiu
inúmeras descobertas, como o computador e a internet, mesmo que o aperfeiçoamento e acesso
ilimitado dessas ferramentas só tenha ocorrido após os anos 1980.
No entanto, nem todas as invenções trouxeram coisas boas: a invenção de armamentos mais
modernos nos levou à eclosão de duas guerras mundiais, entre 1914 e 1945. Ao atingir milhares de
pessoas em todo o mundo, o grande impacto causado por esses conflitos se fez sentir fortemente no
campo artístico. Mortes, destruição de países inteiros, perdas e sofrimento deixados pelas guerras
influenciaram a mente e a produção dos artistas.
Outra consequência das guerras foi o surgimento de uma nova superpotência mundial: os
Estados Unidos da América. A mudança empreendida no cenário econômico norte-americano
acabou gerando dois fatos: de um lado, grandes incentivos à arte, e, de outro, uma nova visão
estadunidense foi incorporada à arte clássica e milenar.
84 História das artes visuais

5.2 Alguns movimentos dentro da arte contemporânea


Se pararmos para pensar, vamos perceber que até o século XIX parece que existiu um
movimento artístico de cada vez: a arte greco-romana, depois a medieval, a renascentista e por aí
vai. Os períodos são estudados como convenções e, por isso, acabamos tendo a impressão de que
são limitados e não se misturam, o que não é necessariamente verdade, pois podemos encontrar
traços de um período em outro. Temos essa impressão porque alguns períodos se destacaram mais
que outros e, assim, adquiriram grande relevância para a história universal. O movimento artístico
que estamos vivendo atualmente pode ser chamado de contemporâneo, e a arte da qual ele deriva,
denominada contemporânea, tem como características centrais a diversidade, a globalização e a
liberdade criativa absoluta.
O termo movimento artístico tenta dar ideia da modificação incessante dos
processos de criação, assinalando as faixas de tempo em que determinados valores
predominaram na arte [...] É preciso deixar claro que os nomes dos movimentos
são abrangentes, que as datas constituem meros pontos de referência e que nem
todo artista pode ser enquadrado em um único agrupamento. A classificação
em vertentes não pode ser tomada com muita rigidez; ela serve, muitas vezes,
para homogeneizar obras superficialmente semelhantes, assim como para
separar de um corpo de trabalho um conjunto portador de diferenças mínimas.
(COSTA, 2004, p. 9)

Alguns movimentos pertencentes à arte moderna influenciaram a arte contemporânea,


entre eles o Cubismo e o Abstracionismo. Picasso foi um importante artista do movimento cubista,
cujo nome foi cunhado pelos primeiros críticos das obras do pintor, ao perceberem a prevalência
de cantos e ângulos agudos (JANSON, 1996). Desse modo, Picasso tornou-se referência da
vanguarda cubista.

Arte moderna

As senhoritas de Avignon é uma das obras mais conhecidas


de Picasso, na qual o pintor usa a natureza do corpo humano
como modelo para modificá-la totalmente em formas e, até
mesmo, numa nova anatomia.

Além do Cubismo, o estilo abstrato também abriu caminho para as vanguardas


contemporâneas na arte. Seu grande precursor foi Kandinsky, que possui um estilo tão peculiar
quanto Picasso, como demonstra a Figura 1.
O mundo contemporâneo e as artes visuais 85

Figura 1 – Paisagem de chuva, de Kandinsky.

Everett - Art/Shutterstock
Fonte: KANDINSKY, Vasily. Rain Landscape. 1911. Watercolor on paper, 25.4 x 318 cm. The Metropolitan Museun of Art, Nova York.

A abstração é um estilo que, a partir do seu surgimento, entrou definitivamente na


composição de todo tipo de arte.
A abstração na arte tornou-se conhecida a partir de 1910, quando Wassily
Kandinsky pintou as suas primeiras aquarelas com signos e elementos gráficos
que apenas sugerem modelos figurativos, assinalando nova etapa no processo
de desmanche da figura que se iniciara com Pablo Picasso e Georges Braque, na
criação do Cubismo, por volta de 1907. (COSTA, 2004, p.10)

O Cubismo e o Abstracionismo abandonaram a imagem da figura perfeitamente


identificável e, no lugar de um estilo totalmente natural, propuseram novos ângulos. Picasso
chegou a pintar vários estilos diferentes de rostos femininos em um mesmo quadro, como em
As senhoritas de Avignon, enquanto Kandinsky rompeu totalmente com as figuras inteligíveis.
Assim, ao juntarmos os elementos até aqui assinalados, temos um esboço do surgimento da arte
contemporânea.

5.2.1 Abstração
A abstração entra na composição da arte a partir do início do século XX. Costa (2004,
p.10) nos ajuda a entender um pouco mais o que esse movimento significa.
Chama-se abstração toda representação não figurativa, isto é, que não apresenta
figuras reconhecíveis de imediato (seres humanos, animais, paisagens e objetos
quaisquer), preocupando-se com formas – geométricas ou não – cores,
composição, texturas, pesos, manchas e relevos. Isso vale para pintura, escultura,
desenho, gravura, fotografia, cinema, vídeo, objeto e todos os meios possíveis.
86 História das artes visuais

Jackson Pollock é um conhecido e importante nome do movimento expressionista abstrato.


“O expressionismo não objetivo de Kandinsky, e a exploração surrealista dos efeitos do acaso são,
na verdade, as principais fontes de Pollock, mas não explicam satisfatoriamente sua técnica
revolucionária e o apelo emocional de sua arte” (JANSON, 1996, p. 384-385). O trabalho do artista
define bem as características do estilo abstrato.

Jackson Pollock (1912-1956) tinha como estilo gotejar a


tinta em uma tela. No QR code ao lado, você pode observar
a obra Número 1, produzida pelo artista em 1949. Ao dar
um número para denominar a obra, Pollock faz referência
à própria contemporaneidade, pois trata de uma arte não
figurativa, mas abstrata.

Cada artista contemporâneo adota um estilo próprio. Se observarmos as linhas da pintura


de Pollock, perceberemos que, de acordo com o resultado, o artista parece arremessar ou gotejar
a tinta líquida no quadro. Essa técnica compõe livremente a obra, destacando-se, também, outro
elemento importante: a variedade de cores.
A partir desses artistas citados, emergiram outros estilos artísticos: o Concreto, em que
há a valorização das formas geométricas puras; o Surrealismo, de Salvador Dali; o Dadaísmo, de
Duchamp; e a fusão de outros, como o Cubo-expressionismo. Surgiu também o Hiper-realismo, a
Pintura monocromática, que, como o próprio nome diz, é feita usando apenas uma cor. Mencionanos
esses estilos apenas para que você saiba da existência de alguns deles e perceba como é possível
expandir as possibilidades artísticas.

5.2.2 Pop Art


Outro movimento relevante para a arte contemporânea é a Pop Art, que começou na década
de 1950, em Londres, e era feita com base na mídia norte-americana.
Portanto, não nos surpreende que a nova arte tivesse um apelo especial para os
americanos na década seguinte [...] a Pop Art não é motivada pelo desespero
ou animosidade contra a civilização atual; considera a cultura comercial sua
matéria-prima, uma fonte inesgotável de material pictórico, mais do que um
mal a ser combatido. (JANSON, 1996, p. 395)

Entre os principais artistas do movimento, temos Andy Warhol, bastante conhecido, cujo
estilo vemos copiado e recriado, ainda hoje, por outros artistas e pela publicidade, além de Roy
Lichtenstein, com obras produzidas nos anos 1960, expostas na galeria do Museu de Arte Moderna
de Viena.
O mundo contemporâneo e as artes visuais 87

5.2.3 Arte conceitual


Esse é um dos movimentos mais difíceis de compreender, a arte conceitual não tem um
produto final para ser apresentado ao público. O mais importante não é a forma acabada, não é
obrigatoriamente a presença de uma obra concreta que pode ser tocada, mas sim o percurso feito
pela concepção artística em si. A arte conceitual:
surgiu dos Happenings [...] durante a década de 1960, nos quais o próprio
evento era a manifestação artística. No entanto, a Arte Conceitual desafia a nossa
definição de arte de forma ainda mais radical, ao insistir que somente o voo da
imaginação, não a execução, constitui a arte. (JANSON, 1996, p. 399)

Os Happenings são eventos artísticos nos quais a produção se dá de modo efêmero, ali no
momento, como um tipo de performance que incorpora elementos de improvisação de maneira
mais planejada e que nunca se repetem. Já no que concerne à arte conceitual, Janson avalia que:
[...] já que os produtos da arte são produtos secundários, acidentais, podemos
dispensá-los totalmente, da mesma forma o público do artista. O processo
criativo só tem que ser documentado de alguma maneira – geralmente de
uma forma verbal, e às vezes através da fotografia e do cinema. (JANSON,
1996, p. 399)

Ou seja, nesse movimento, não temos uma imagem como de costume para a visualização de
uma obra de arte final, mas um processo.
Marcel Duchamp é o padroeiro desse Figura 2 – Fonte, de Marcel Duchamp.

WikiArt
movimento e é um importante representante
do Dadaísmo1. Em 1917, ao expor a Fonte
(Figura 2), considerada uma das obras mais
significativas do ponto de vista da renovação
e mobilização causadas no meio artístico,
Duchamp se notabilizou como o precursor da
arte conceitual.
A obra em questão era um mictório,
também conhecido como urinol, que,
quando foi exposta em uma galeria de arte
em Nova York, em 1917, causou polêmica
justamente por contestar o status das obras
de arte. Transcendendo a peça, a obra
representava uma ideia, um conceito além Fonte: DUCHAMP, Marcel. Fonte (reprodução). 1917-1964.
Cerâmica vidrada com tinta preta, 38.1 x 48.9 cm x 62.55 cm. Tate
do objeto, e questionava se o urinol ganharia Modern, Londres, Reino Unido.
status de obra de arte ao ser assinada por
um pseudônimo. Com essa atitude, a arte deixou de ser somente o produto (como pinturas ou
esculturas) e passou a ser a concepção que o artista tem sobre o que é arte.

1 Um movimento de vanguarda artística iniciado em Zurique, 1916, de caráter antirracionalista ou mesmo ilógico, no
qual se pensava que destruir também era criar.
88 História das artes visuais

5.3 Performance e artes visuais


Se perguntarmos às pessoas o que elas entendem por performance nas artes, provavelmente
nos dirão que é um ato artístico que acontece durante um período em determinado local. Essa
definição não está errada, mas é apenas uma das formas de se fazer performances. Todos esses
elementos são determinados por um tipo de busca do artista, a qual percorre o caminho artístico.
Nas artes visuais, sempre que ouvimos a palavra performance, é comum nos
remetermos de imediato à utilização do corpo como parte constitutiva da obra
[...] em um único formato, baseado no artista em uma ação ao vivo, visto por
um público, num tempo e espaços específicos. (MELIM, 2008, p. 5)

Por outro lado, é comum ouvirmos falar de performance no sentindo de desempenho, como
performance nos estudos, nos negócios ou, até, de um carro de corrida.
O termo performance é tão genérico quanto as situações nas quais é utilizado.
Na vida, bem como em distintas áreas do conhecimento, a palavra transita em
muitos discursos. Talvez por isso, por resistir tanto a uma única classificação,
torna-se tão instigante para o campo da arte. (MELIM, 2008, p. 5)

Daí a generalidade do termo, mas é preciso ter um elenco definido para o formato, que
nos permita compreendê-lo e até mesmo reproduzi-lo. “Performance é uma forma de arte
difícil de definir. Entre os seus ancestrais estão os ritos tribais, o teatro grego de improvisação
e, mais recentemente, as noitadas futuristas” (COSTA, 2004, p. 61). Melim (2008) esclarece que
a performance carrega consigo práticas interdisciplinares, ou seja, mescla teatro, dança, música,
poesia nos anos 1960 e, posteriormente, também vídeos.
Algumas performances propõem exercícios de dor física e até um enorme perigo de morte
e exposição pessoal em lugares públicos. “O performer geralmente é um artista plástico e a
performance pode se realizar por meio de gestos intimistas ou numa grande apresentação de cunho
teatral” (COSTA, 2004, p. 61). Uma das performers mais conhecidas no mundo artístico e que tem
trabalhos impactantes “foi a sérvia Marina Abramovic, sem dúvida, não apenas na década de 1970
– ela mantém até o presente essa mesma postura –, uma das artistas a levar seu corpo aos limites
físicos mais extremos para a experiência espiritual plena” (MELIM, 2008, p. 15-16).
O mundo contemporâneo e as artes visuais 89

Figura 3 – Performer Marina Abramovic

Thousandrobots/ Wikimedia Commons


Na Figura 3 podemos observar Marina Abramovic realizando uma performance no Museu de
Arte Moderna de Nova York, em 2010. Nela, a performer (de vestido vermelho) permanece sentada
e uma pessoa pode se sentar na cadeira à sua frente para olhá-la nos olhos por alguns minutos.
Uma possibilidade interpretativa, entre muitas, é que a obra é uma referência à dificuldade das
pessoas em manter contato visual no mundo contemporâneo.

5.4 Poéticas visuais


Surgida na década de 1950, inicialmente conhecida como poesia concreta, a poesia visual
explora os aspectos gráficos da materialidade das palavras. Nas figuras 4, 5 e 6, a seguir, temos um
poema visual de Joan Brossa, um artista catalão multifacetado, que nos ajuda a visualizar as letras
e palavras como objeto material.
Figura 4 – Poesia visual transitável em três tempos
Canaan/Wikimedia Commons
90 História das artes visuais

Vê-se, na Figura 4, uma enorme letra A feita de concreto, em exposição permanente em


um parque, na natureza. Todo esse contexto é pensado com determinada intenção. Observando
ao fundo, depois das árvores, é possível ver pequenos símbolos, também feitos de concreto, em
referência ao “transitável” pela obra, ou seja, ao transitar pelo parque é possível passar por ela.
Figura 5 – Poesia visual transitável em três tempos

Canaan/ Wikimedia Commons


O concreto representa algo bastante sólido. Já na Figura 5 vemos que a grande letra A (visível
no fundo da foto) foi desmontada nesse segundo momento e suas partes estão no chão, como que
formando um quebra-cabeças a ser montado.
Figura 6 – Poesia visual transitável em três tempos
Canaan/Wikimedia Commons

Por fim, o poema visual transitável é representado por símbolos (Figura 6), como aspas,
colchetes e outros não visíveis na fotografia.
O mundo contemporâneo e as artes visuais 91

No Brasil, “explorando novos campos perceptivos graças ao uso de palavras e imagens, os


poetas concretos [...] Augusto de Campos, Haroldo de Campos, Décio Pignatari desenvolveram
uma visão material-construtivista que faz do módulo sintático o eixo da composição” (COSTA,
2004, p. 69).
As possibilidades nessa modalidade são inúmeras, diante da criatividade dos artistas,
como as produzidas em papel, em que a palavra casa faz o contorno do desenho de uma casa.

5.5 Instalação artística


Nas artes visuais, a instalação permite aos artistas dar “asas” à imaginação e pensar não
somente em um objeto artístico, mas na junção de vários objetos e linguagens e na maneira como
eles se relacionam com o espaço em que será feita a instalação.
Os ambientes e as instalações são espaços em que o artista usa a arquitetura
sem se confundir com ela. São formas híbridas e, portanto, abrangem diferentes
gêneros artísticos entrecruzados. Podem incluir a performance, o objeto, o vídeo
e inúmeros outros meios, estabelecendo uma relação ou interação entre eles.
Tratam tanto da arte e seus limites como da relação, ou mesmo fusão, entre vida
e arte. (COSTA, 2004, p. 63-64)

As instalações artísticas podem ser feitas em ambientes internos ou externos e instaladas


permanente ou temporariamente. É importante que os materiais selecionados para a produção
artística sejam condizentes com o ambiente e o período de exposição. No caso das instalações ao ar
livre e permanentes, por exemplo, é preciso que a produção seja feita com materiais que resistam
às intempéries.
A Figura 7 traz uma instalação realizada em um ambiente interno. Nesse caso, há limites
espaciais, como o tamanho do cômodo, das paredes laterais e a altura do teto, e isso interfere na
forma e no tamanho da obra que o artista pode criar.
Figura 7 – Instalação de Tunga, do acervo do colecionador Marcos Amaro.
Fma2019/Wikimedia Commons
92 História das artes visuais

Vamos imaginar que se decidirmos retirar todos os objetos da instalação exposta na


Figura 7 e os colocarmos em outro ambiente, mesmo que tentando respeitar e reproduzir o
que foi feito anteriormente, a instalação não será mais a mesma obra artística. Ao modificá-la,
tudo o que ali estava e que foi concebido pelo artista para aquele ambiente vai se transformar
em outro local, com outro tamanho e outra iluminação. Assim, mudar esse fator faz com que a
instalação seja diferente.

5.6 Espaços: museus, galerias de arte e bienais


Afinal de contas, para onde devemos ir quando queremos conhecer e apreciar a arte em
suas diversas possibilidades? Para responder a essa indagação, abordaremos agora os espaços onde
podemos encontrar objetos de arte de variados tipos, meios e linguagens. É possível apreciar desde
obras de arte do Antigo Egito até obras contemporâneas. Nesta seção, observaremos os ambientes
que temos a nossa disposição e os tipos de materiais que podemos encontrar em cada lugar.

5.6.1 Museus e suas variedades


Os museus deixaram de ser instituições tradicionais para integrarem-se na proposta da
arte contemporânea. Segundo Giraudy e Bouilhet, “o museu surge a partir da coleção, seja ela de
origem religiosa ou profana. Desde a Idade da Pedra, o homem pré-histórico reúne ao redor de si
objetos agrupados em determinada ordem” (1990, p. 19). Os museus surgiram como uma maneira
de a alta nobreza colecionar obras de artes na Antiguidade e, em alguns casos, os objetos eram
produtos de saques de guerra. Essas coleções foram abertas para visitação de algumas pessoas, mas,
com o tempo, passaram a ser cada vez mais acessíveis ao público, tornando-se responsabilidade dos
órgãos públicos de cada país a guarda e manutenção desses itens valiosos.
Tradicionalmente, os museus são instituições dedicadas a guardar obras de grande valor
financeiro, cultural ou arqueológico, preservando, assim, o patrimônio, conhecimento e a cultura
dos povos. Porém, no decurso da história, passamos a ter outro olhar sobre a ideia e função dos
museus. A mudança ocorreu, mais ou menos, na virada dos dois últimos séculos.
Até o final do século XX os museus eram somente locais onde se acumulavam objetos
velhos. Todavia, essa ideia começou a mudar a partir do momento em que começaram a surgir
novas propostas de museus interativos, com vídeos, computadores, permissão para tocar em
algumas obras e propostas ao ar livre em que as obras de arte e o público convivem em contato
com a natureza.
Alguns museus tradicionais revisaram seu modo de se relacionar com o público, acervo
ou arquitetura tradicional. Um bom exemplo de atualização é o Museu do Louvre (Figura 8), em
Paris, com a construção de uma pirâmide de vidro que se destaca totalmente e contrasta com a
arquitetura original antiga.
O mundo contemporâneo e as artes visuais 93

Figura 8 – Museu do Louvre

Benh/Wikimedia Commons
No Rio de Janeiro, o Museu do Amanhã, inaugurado em 2015, por exemplo, rompe com
a ideia de coisas antigas e do passado, trazendo em seu próprio nome uma projeção do futuro
da arte, da ciência e da tecnologia. O edifício do museu já é uma obra de arquitetura inovadora
(Figura 9) e o espaço oferece às crianças atividades culturais regulares, como clube de leitura, shows
de música, entre outras.
Figura 9 – Museu do Amanhã

vitormarigo/Shutterstock

Na cidade de Brumadinho, em Minas Gerais, há o Museu Inhotim, localizado em um


grande espaço natural, com esculturas e instalações de arte contemporânea que convivem com
os visitantes nos jardins. O espaço é dedicado à apreciação das artes e à fruição de passeios com
a família. Além disso, ele é referência mundial, por seu caráter de inserção das obras de arte na
própria natureza e em espaços abertos onde o visitante pode caminhar para conhecer o acervo de
obras contemporâneas.
A Figura 10 nos dá uma ideia da proposta do Museu Inhotim.
94 História das artes visuais

Figura 10 – Museu Inhotim com obras de arte contemporânea

Sturm/Wikimedia Commons
A estrutura do Inhotim segue uma tendência mundial muito similar, por exemplo, àquela
presente no Museu Calouste Gulbenkian. Este, localizado no centro de Lisboa, faz parte da fundação
de mesmo nome e possui uma ala tradicional somada ao jardim, no qual se expõem esculturas.
Além desses, temos outros museus por todo o mundo com espaços semelhantes ao de Inhotim, os
quais interagem com a população, possuem jardins com esculturas ou mesmo zoológicos.

5.6.2 Galerias de arte


Como vimos, os museus são instituições públicas e normalmente guardam acervo de obras
de arte já consagradas. As galerias de arte, por outro lado, são privadas e têm um importante papel
na divulgação, apreciação e venda dos trabalhos dos novos artistas.
As galerias de arte ocupam um espaço importante no mercado artístico, pois, nelas, os
artistas podem ser valorizados e lançados à fama ou, pelo menos, ter um local seguro, climatizado
e adequado para a acomodação dos objetos artísticos e pessoal técnico conhecedor das tendências
e do mundo da arte.
As galerias podem se dedicar a expor diferentes tipos de objetos artísticos, periodicamente,
ou serem especializadas em apenas um deles, como fotografia, pintura ou escultura, por exemplo.
Outro detalhe relevante é que as galerias são ambientes privilegiados, tanto para os artistas quanto
para os visitantes, e a iluminação e temperatura são adequadas para cada tipo de objeto.

5.6.3 As bienais
As bienais são eventos que ocorrem de dois em dois anos, com determinado tempo
de duração, e que promovem o encontro de novos artistas e obras, como pinturas, instalações,
esculturas, vídeos, performances e as mais recentes produções artísticas. Normalmente acontecem
em grandes espaços ou pavilhões e reúnem centenas de artistas de várias linguagens, mas costumam
focar na arte contemporânea.
O mundo contemporâneo e as artes visuais 95

É possível que você associe esse evento à Bienal do Livro, mas eles são
diferentes. A Bienal do Livro promove o encontro entre escritores, livros,
livrarias e editoras, demonstrando ter também um apelo comercial. No
caso da literatura, a comercialização é um aspecto importante, pois a
venda de livros é um dos pontos fundamentais na ampliação do número
de leitores. Já a Bienal de Arte não tem esse viés comercial, mas gera a
promoção dos artistas e amplia o alcance de suas carreiras.

No Brasil, a Bienal Internacional de Arte de São Paulo é umas das mais relevantes e conhecidas.
Ela ocorre tradicionalmente nos pavilhões do Parque Ibirapuera, que, além das edificações, conta
com uma ampla área verde. A escolha do local não é somente pelas condições técnicas, mas,
também, pela relação do paulistano com o parque, que é um espaço cultural, de shows e eventos.
As edificações dedicadas à Bienal de São Paulo, projetadas pelo arquiteto Oscar Niemeyer,
são monumentais, com vários andares e muito espaço para acomodação de centenas de obras de
todo tipo de linguagem, conforme se pode observar na Figura 11.
Figura 11 – Um dos espaços internos da Bienal de São Paulo

Ibirapuera/Wikimedia Commons

A Bienal de São Paulo acontece desde 1951 e costuma estabelecer um tema, pulsante no
mundo da arte, que guia a curadoria no convite aos artistas. Durante todos esses anos o evento viu
nascer muitas tendências e seria impossível citarmos aqui tudo de interessante que já foi exposto
em cada uma de suas edições.
96 História das artes visuais

Considerações finais
A arte contemporânea é de caráter totalmente livre e inovador. Nela, é difícil enquadrar os
artistas ou as linguagens em um único modo de se fazer arte, pois são inúmeras as possibilidades de
criatividade dos artistas. Por esse motivo, é crucial observarmos a nossa civilização, seus conflitos
e como a arte absorve e transforma tudo isso: aqui e agora, somos testemunhas da arte.

Ampliando seus conhecimentos


• POLLOCK. Direção: Ed Harris. Elenco: John Heard, Marcia Gay Harder, Val Kilmer, Ed
Harris. EUA, 2001. (117 min.).
Esse filme possibilita conhecer a vida, a época e as descobertas de Pollock, além de seu
estilo abstrato de difícil enquadramento, mesmo dentro da arte contemporânea.

• O SORRISO de Monalisa. Direção: Mike Newell. Elenco: Julia Stiles, Marcia Gay Harder,
Julia Roberts, Kirsten Dunst. EUA: Columbia Pictures. (119 min.).
Esse filme é bastante conhecido e acessível. Dirigido por Mike Newell, tem como
protagonista Julia Roberts, que interpreta uma professora de História da Arte em uma
escola tradicional para moças. O filme discute a função e a importância da arte como
um todo, passando por obras clássicas e citando, inclusive, o próprio Pollock, na arte
contemporânea.

• MARINA ABRAMOVIC INSTITUTE. Mai Art. Disponível em: https://mai.art/about-


mai. Acesso em: 21 nov. 2019.
Esse site é dedicado ao legado da performer Marina Abramovic, que nos traz muitas
informações sobre suas produções artísticas. Abramovic é uma artista sérvia , atualmente
residente em Nova York, que iniciou sua carreira no início dos anos 1970. Ativo por mais
de quatro décadas, seu trabalho explora a relação entre intérprete e público, os limites do
corpo e as possibilidades da mente.

• MUSEU DO AMANHÃ. Disponível em: https://museudoamanha.org.br/pt-br. Acesso


em: 21 nov. 2019.
Esse site é destinado a divulgar atividades permanentes do museu e sua relação com
a arte e a ciência do amanhã. Os visitantes podem, além de ser apenas passageiros no
conhecimento de seu acervo, passar a frequentadores e utilizar o espaço como local de
conhecimento efetivo.

• FUNDAÇÃO BIENAL DE SÃO PAULO. Disponível em: http://www.bienal.org.br/


Acesso em: 21 nov. 2019.
Nesse site é possível visualizar os catálogos de todas as edições anteriores da Bienal de São
Paulo, bem como as informações sobre a próxima edição.
O mundo contemporâneo e as artes visuais 97

Atividades
1. Dentre os movimentos estudados, dois podem ser considerados opostos, de acordo com a
concepção e objetivos artísticos. Quais são eles?

2. Quais são as principais características da arte contemporânea?

3. Quais são os projetos mais modernos/contemporâneos propostos pelos museus? Como isso
modifica a relação do visitante/usuário com essas instituições?

Referências
COSTA, C. T. da. Arte no Brasil 1950-2000: movimentos e meios. São Paulo: Alameda, 2004.

GIRAUDY, D.; BOUILHET, H. O museu e a vida. Rio de Janeiro: Fundação Nacional Pró-Memória; Porto
Alegra: Instituto Estadual do Livro-RS; Belo Horizonte: UFMG, 1990.

JANSON, H. W. Iniciação à história da arte. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

MELIM, R. Performance nas artes visuais. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.


Gabarito

1 Da pintura rupestre à reprodução da obra de arte


1. As pinturas rupestres, encontradas em cavernas, são importantes para nosso conhecimento sobre
as artes visuais, pois, sem elas, não saberíamos que o desenho e a pintura já eram produzidos por
nós, seres humanos, há milhares de anos. Esse tipo de conhecimento é vital para percebermos
nossa evolução artística. Além disso, os aspectos artísticos dessas pinturas revelam o modo de
vida daqueles povos.

2. A evolução das pinturas realizadas em superfícies fixas, como afrescos, murais e grafites, aconte-
ceu de acordo com as matérias-primas, sejam fabricadas ou encontradas na natureza, disponíveis
em cada época – o tipo de tinta, por exemplo. Também influenciaram essa transição os temas
retratados. Nos afrescos, que foram produzidos desde o período medieval até o Renascimento
e o Barroco, era necessário aplicar os pigmentos ainda nas paredes frescas, que funcionavam
como um tipo de reboco ainda molhado. Nos murais do início do século XX, já existiam tintas
que poderiam ser aplicadas em paredes acabadas. Já no período em que se deu início ao grafite,
as ma­térias-primas passaram a ser principalmente tintas em spray. Cada período acompanhou a
disponibilidade e a evolução dos materiais.

Outro aspecto que deve ser levado em consideração são os temas pintados em cada período: nos
afrescos, eles eram majoritariamente religiosos; nos murais do artista Diego Rivera, por exemplo,
as questões retratadas estavam relacionadas à vida do homem nas fábricas e às condições de vida
do povo mexicano. Já o grafite se apresentou como manifestação de temas sobre a vida urbana
nas grandes cidades.

3. Os principais aspectos a serem considerados sobre a gravura dizem respeito aos processos en-
volvidos em sua produção, que é realizada gravando-se o desenho da matriz em um suporte. A
xilografia é uma técnica que usa a matriz feita de madeira, na qual o desenho é entalhado; na
litografia, por sua vez, a matriz é de pedra plana e o desenho é feito diretamente nela com o uso
de um lápis gorduroso, para depois ser aplicada a tinta que gravará o desenho no papel. Por fim,
é importante observar que a gravura popularizou a cópia de imagens ao redor de todo o mundo.

2 Escultura: arte tridimensional


1. Para produzir uma escultura, é possível usar diversos materiais, por exemplo: pedras de vários
tipos; metal fundido, como o bronze, ou metal cortado em chapas; barro; terracota ou gesso que
podem ser moldados. Pedras e alguns tipos de argila ou barro são comumente encontrados na
região em que são produzidos; pode acontecer de se transportar algum material para o local onde
será produzida a obra, mas é mais difícil e raro.

2. As obras de arte greco-romanas foram e ainda são uma grande influência para os artistas de
todo o mundo. Neste capítulo, observamos a influência que essas artes tiveram sobre as obras
de Michelangelo, em suas esculturas de mármore, produzidas durante o período do Renasci-
mento na Itália.
100 História das artes visuais

3. As obras de arte contemporâneas têm como influência o mundo globalizado, urbano e cada vez mais
veloz, estabelecido a partir do século XX. Elas são livremente mais criativas.

3 Fotografia e cinema: a captura do momento e do movimento


1. A partir do surgimento da fotografia, a reprodução das imagens não ocorre apenas por meio da pin-
tura, do desenho ou de xilogravura, como antigamente. Agora, é possível eternizar um momento de
modo bem mais próximo ao real, seja a imagem de uma pessoa, de uma paisagem ou de um aconte-
cimento.

2. O cinema teve origem com os irmãos Lumière ao reproduzirem em velocidade uma sequência de
fotografias. Por isso, a invenção da fotografia está tão ligada à origem do cinema. Se não houvesse essa
invenção, dificilmente haveria o cinema.

3. Chamamos de retomada do cinema brasileiro um momento histórico para nosso cinema, ocorrido
em 1990. A partir desse período, iniciaram-se produções cinematográficas que atingiram grande pú-
blico e que até os dias atuais influenciam o mercado cinematográfico nacional.

4 Artes cênicas: a arte da imitação


1. O teatro greco-romano se conecta ao teatro primitivo anterior a ele por meio dos rituais compostos de
danças e coros surgidos durante os festivais das colheitas de uvas. Ele o supera no momento em que
leva essa celebração para a arena do teatro e coloca um ator para dialogar com o coro, criando assim
a arte de contracenar.

2. São exemplos de artes cênicas que podem consideradas formas eruditas de arte: a tragédia, a dança
clássica e a ópera. Elas se relacionam na ópera, que reúne elementos da tragédia e da dança clássica
em seus espetáculos.

3. São formas populares de fazer teatro: o teatro mambembe, a commedia dell’arte e o teatro de bonecos.
Essas representações teatrais são consideradas populares, uma vez que eram de fácil acesso para a
população, diferentemente das representações eruditas, as quais eram feitas para a nobreza.

5 O mundo contemporâneo e as artes visuais


1. A arte conceitual e a poesia visual podem ser consideradas movimentos opostos em relação aos objeti-
vos e concepções artísticas. Enquanto a primeira pretende ser apenas um percurso criativo e se afastar
da obra de arte material, a segunda faz da palavra um objeto artístico palpável.

2. A arte contemporânea tem como características principais a diversidade, a globalização e a criativi-


dade absoluta.

3. Os museus deixaram de ser espaços apenas para guardar objetos antigos, que poderiam ser visita-
dos pelo público, e passaram a interagir com os visitantes, oferecendo oficinas culturais e artísticas
relacionadas ao seu tipo de acervo. Alguns museus possuem grandes áreas abertas com obras de arte
expostas ao ar livre. As informações sobre as obras de arte estão disponíveis via terminais de compu-
tador dentro das instituições museológicas e também via internet, sendo possível até fazer visitas via
web. Nessa nova perspectiva, o público passou a ter uma relação bem mais próxima com os museus.
HISTÓRIA DAS ARTES VISUAIS
Ao contemplarmos as obras de arte, produzidas desde o período
primitivo até o contemporâneo, podemos, de certo modo, entender
como nossos ancestrais viveram. A arte nos permite conhecer nossa
origem e identidade como sociedade, além de ser uma maneira de nos
comunicarmos com as gerações anteriores e futuras. As representações
artísticas representam uma espécie de língua universal. Por isso,
entender as artes visuais é importante para qualquer profissional que
venha a trabalhar com algum tipo de criação, seja artística, industrial,
publicitária ou com design, moda, educação, decoração, arquitetura etc.

ANA CRISTINA MAGALHÃES JARDIM

Código Logístico Fundação Biblioteca Nacional


ISBN 978-85-387-6574-5

59133 9 788538 765745

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