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19/05/2017 às 05h00
Cultura & Estilo
A ciência do olhar
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Por Daniela Chiaretti e Robinson Borges | Do Rio
Cantor Kid Vinil morre em São Paulo, aos 62 anos
19/05/2017 às 19h00
Mas isso tudo só saberemos no fim de quase duas horas de conversa com
João é assim que o chamam , no prédio de Ipanema onde ficam a redação
da "piauí", a revista de fôlego que criou em 2006, e a VideoFilmes, a
produtora que fundou há 30 anos com o irmão cineasta, Walter. A
confidência sobre o nome do filme é a última coisa que ele nos conta antes de
concordar, gentil, mas claramente constrangido, com uma breve sessão de
fotos no deque da produtora e sair, apressado, rumo a um almoço no Jardim
Botânico. Não sabíamos com quem e não ousamos perguntar.
Corta!
Videos
Era uma quartafeira de maio e a entrevista estava marcada para as 10h. O
acertado com a assessora Anna Luiza Muller era que João Moreira Salles
falaria sobre o novo filme, o jornalismo e a "piauí", a nova sede do Instituto
Moreira Salles e o recente Serrapilheira, instituição que fundou em março
com a mulher, a linguista e professora da PUCRJ Branca Vianna, ao doarem
R$ 350 milhões para formar um instituto de fomento à ciência rara boa
notícia na desgraceira em que está metido o país. Não falaria sobre o Brasil
nem sobre por onde caminha a humanidade. Nada sobre sua vida e a do clã
Moreira Salles. Acabou que João ultrapassou os perímetros combinados e
falou sobre todas essas coisas deixando apenas ele e os Moreira Salles de Inteligência artificial possibilita a interação entre o
fora. Foi assim que, às 10h, batemos no discreto prédio em Ipanema, a público e as obras na Pinacoteca de SP
12/05/2017
sobriedade da fachada de metal aquecida por um bonito portão de madeira.
João nos conduz pelas escadas ao andar de baixo, onde fica a redação da "Hoje em dia é
"piauí". Vamos à sala de reuniões, envidraçada pelo lado dos jornalistas e de constrangedor
frente para uma cortina natural, de plantas. Além da mesa há um balcão e, ser político"
12/05/2017 às 05h00
ali, uma garrafa térmica com café, água de coco e água mineral. É tudo do
que precisamos. "Dormi pouco. Fui dormir à uma e acordei às três. Estou FERNANDA LIMA
meio confuso, mas vamos lá", ri.
Cabeça aberta
O motivo da insônia foi a derrota do Botafogo por 2 a 0 para o equatoriano para o desejo
05/05/2017 às 05h01
Barcelona de Guayaquil pela Libertadores. O Glorioso, como eles dizem, foi
derrotado em casa, no estádio Nilton Santos, e o sujeito ao lado coloca os
óculos dourados sobre a mesa e diz que foi lá ver tudo ao vivo. É difícil saber CLAUDIA SENDER
onde João Moreira Salles nasceu, se tem filhos, há quantos anos está casado, A executiva na
onde estudou. Mas todo mundo sabe que o homem é botafoguense doente. primeira classe
papa sombrio
João Moreira Salles começou a articular o única sequência colorida, retirada de um AAA
filme em 2012, 2013, 2014: "Foi o período vídeo amador, vêse o pai, o diplomata e
em que a gente experimentou essa banqueiro Walther Moreira Salles na
incapacidade de se relacionar com quem piscina, brincando com o menino Walter. Livros
tem uma opinião diferente da tua"
Elisa Margarida Gonçalves, a mãe de Pamuk renova
AA+
Walter e João, aparece em maiô duas peças e touca de borracha no cabelo.
"Minha mãe dizia: 'Santiago faz os mais lindos arranjos de flor que conheço'",
ouvese no documentário de 2006 narrado por Fernando, o mais velho dos Livros
irmãos, filho do embaixador com a primeira mulher, Helène Matarazzo. "Tudo o que Eu
Nunca Contei'
perdida
Dois anos depois, leu o relato que a mãe escreveu e que foi publicado nos BBB
EUA e na revista "Cruzeiro". Elisa foi à China com amigos "um grupo de
industriais, banqueiros e gente de sociedade", se escuta no longa. Era TV
outubro de 1966, tinha 37 anos. Não se tem absoluta certeza que foi Elisa "Silicon Valley"
quem tenha filmado, mas supõese que sim, porque ela aparece pouco nas (4ª temporada)
cenas. AA+
"A pessoa que talvez tenha feito estas imagens disse assim, nas primeiras
linhas do relato que escreveu: 'Chegamos à noite, para aquela que seria a Legenda AAA Excepcional BBB Acima da média
CCC Baixa qualidade AA+ Alta Qualidade
viagem mais penosa e fascinante de minha vida. À descida do avião, tivemos BB+ Moderado C Alto Risco
o primeiro contato com a Guarda Vermelha, que nos formava uma ala de
honra...", diz João no filme que estreou em Berlim, foi o mais premiado no
francês Cinéma Du Réel, passou por Buenos Aires e TelAviv e foi convidado
a participar em mais de 20 festivais internacionais. No Brasil estreou no É
Tudo Verdade e a previsão é de que entre em exibição em agosto.
"No Intenso Agora" é costurado pela fala de João, uma lente de intimidade ao
que se trata na tela. Os Moreira Salles moravam em Paris desde 1964 e ali
ficaram até 1968. "Voltávamos para o Brasil nas férias. Na minha lembrança,
a França era escura e o Brasil, luminoso. Aqui tinha bichos e sol; lá, as portas
dos edifícios eram pesadas e davam para pátios escuros onde uma concièrge
fumava. Eu era feliz nas férias. Na minha memória, minha mãe era feliz o ano
inteiro."
O mordomo, uma noite, acordou João criança, ao tocar piano no salão. Vestia
fraque. "Por que essa roupa?", espantouse o menino. "Porque é Beethoven",
respondeu o argentino. João Moreira Salles trai seu passado pelo repertório
Walter Salles disse em entrevista que o caçula é o mais intelectual dos
irmãos. Ele não usa clichês e é divertido. Às vezes termina as frases em
carioquês. "Entende?"
"O que me pareceu correto, na relação que tentei fazer é que há, tanto no
relato de minha mãe como no relato dos que viveram 68, essa sensação de
plenitude, do tal do intenso agora, e a dificuldade de enfrentar o
desfazimento disso. Até porque, o que vem depois? O que vem depois é o
centro do filme. Alguns conseguiram dar prosseguimento, encontraram
sentido e razões para continuar. Na militância política, inclusive. Mas outros
tantos não conseguiram se desvencilhar da sensação de que o melhor ficou
para trás. E é compreensível, porque o relato daquelas semanas é realmente
um relato do sublime. A sensação de estar irmanado, nas ruas, fazendo
história."
1 de 4 slideshow
Em 1992, a família Moreira Salles reunida em Londres: Pedro e o patriarca
Walther à frente; Walter, João e Fernando na fileira de trás
Créditos: Instituto Moreira Salles
O fim da felicidade das ruas de Paris vem quando a câmera migra para a
invasão da Thecoslováquia pelas tropas soviéticas, que impediram a
implantação do que Alexander Dubcek chamou de "socialismo humano",
durante a Primavera de Praga. Ali não há revolução com festa. As imagens
são feitas com medo, entre frestas de cortinas. O discurso de Fidel Castro
sobre a invasão destrói qualquer esperança. Jan Palach é o jovem tcheco que
ateia fogo em si mesmo para protestar contra a sociedade que se conforma
em seu funeral, as ruas são tomadas por uma multidão silenciosa. No Maio
francês morreram cinco pessoas, duas delas alinhadas a De Gaulle.
João avisa que está pensando algo de trás para a frente, e pela primeira vez.
"Talvez aquilo tenha me chamado tanto atenção em função do que eu via no
dia a dia, entre amigos, na família, na redação. As conversas eram pobres,
binárias. Ou se é zero ou se é um."
Corta!
Voltamos à curva ascendente. João agora é o jornalista, publisher e dono da
"piauí", revista que criou em 2006, tem 60 mil exemplares e faz um
jornalismo contemporâneo único no país. "Comecei a fazer documentário por
causa do jornalismo. De determinado tipo de jornalismo", especifica, citando
a "New Yorker" e alguns de seus lendários jornalistas, Lillian Ross, o escritor
Joe Mitchell.
"E isso não é retórico, não me sinto um cinéfilo. Cinema nunca foi central na
minha vida, como para o Waltinho. Sou acidental, o que não significa que
seja um diletante. Aprendi a me tornar um profissional desse negócio. Mas o
que me levou a filmar de determinada maneira são coisas que li, muito mais
do que coisas que vi. E o jornalismo americano teve uma influência muito
grande."
E como business...
JMS contou na "piauí" quem era Avila, à época com 31 anos, o que era o Impa
("sob vários aspectos a melhor instituição de ensino superior do país") e
também como o rapaz resolveu um problemão ao acordar de madrugada, no
seu apartamento do Leblon, e, em vez de virar para o lado, decidiu "pensar
um pouco". Aquele foi um perfil visionário. Em 13 de agosto de 2014 Avila
ganhou a medalha Fields, a maior honra que um matemático pode receber e
"o feito mais importante da história da ciência brasileira". A frase está na
única edição especial da "piauí", dedicada a ele.
João é conhecido por ser perfeccionista. Com a ideia na cabeça, foi conhecer
o terceiro setor, que, como diz, "é muito mais complexo do que o IMS". A
cruzada está descrita em um slideshow divulgado no dia do lançamento do
instituto. Visitou fundações, agências de fomento e organizações sociais de
todas as áreas. Foi às fundações Ford, Avina, Roberto Marinho, Bradesco e
Arapyaú, para citar algumas no Brasil. Visitou a Sloan e a Rockfeller, nos
Estados Unidos; a Organization of Tropical Studies, na Costa Rica; a
Fraunhofer Gessellschaft, na Alemanha. Ouviu com atenção o método de
criação da Fundação Simons, de Jim Simons. Tratase de um "extraordinário
matemático", conta, que "se tornou muitas vezes bilionário" e tomou a
decisão, com sua mulher, de criar uma fundação para apoiar a ciência básica.
Reuniu em casa 20 cientistas de diferentes campos para perguntar qual área
de estudos não deslancha por falta de dinheiro. "E aí definiu em que iria
investir. Só investem em 'profound questions', questões realmente
fundamentais da ciência."
Corta!
Globo Notícias