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As Perícias Psicológicas

nos Processos de
Regulação do Exercício
das Responsabilidades
Parentais:
o como, o quando e o
porquê

O Como...
 “(...) práticas de excelência, garantindo que a referência do
exercício profissional é o máximo ético e não o mínimo
aceitável” (Preâmbulo);
 “(...) de acordo com os pressupostos técnicos e científicos
da profissão, a partir de uma formação pessoal adequada e
de uma constante atualização profissional, de forma a
atingir os objetivos da intervenção psicológica” (Princípio
Geral B – Competência);
 “(...) de acordo com as boas práticas baseadas em
conhecimentos científicos atualizados, por existir um risco
acrescido de prejudicar seriamente alguém se prestarem
um serviço para o qual não estão convenientemente
qualificados” (Princípio Geral B – Competência);
O Como...
 “(...) selecionar e utilizar, de modo apropriado, protocolos
de avaliação suficientemente válidos, atualizados e
fundamentados do ponto de vista científico. Estes
protocolos incluem entrevistas, testes e outros
instrumentos de avaliação psicológica que são utilizados
para justificar formulações e conclusões incluídas em
avaliações, diagnósticos, relatórios, pareceres,
recomendações e outros tipos de comunicação” (Princípio
Específico 4 – Avaliação Psicológica);
 “(...) fundamentam a avaliação, as decisões relativas à
intervenção ou as recomendações em dados ou resultados
de testes reconhecidamente úteis e apropriados para os
objetivos gerais e específicos da avaliação” (Princípio
Específico 4 – Avaliação Psicológica);

O Como...
 “(....) têm em conta (...) os vários princípios associados a
um exercício cientificamente informado, rigoroso e
responsável da Psicologia, nomeadamente, princípios
como a beneficência e não-maleficência ou a competência
específica” (Princípio Específico 5 – Prática e Intervenção
Psicológicas);
 “(...) desenvolvem atividades baseadas no conhecimento
científico válido e procuram manter e atualizar a sua
competência ao longo do seu percurso profissional”
(Princípio Específico 5 – Prática e Intervenção Psicológicas);
 “(...) mantêm-se informados sobre os desenvolvimentos
científicos e profissionais das suas áreas de trabalho”
(Princípio Específico 6 – Ensino, Formação e Supervisão
Psicológicas).
O Como...

Múltiplos saberes e competências


 Carácter geral e específico, teóricas e metodológicas
(e.g., avaliação psicológica, psicologia do
desenvolvimento da criança e da família,
psicopatologia, vinculação, impacto do divórcio);
 Noções básicas do Direito (e.g., legislação, doutrina e
jurisprudência afeta à regulação das responsabilidades
parentais e subjacentes trâmites processuais);
 Áreas afins (e.g., vitimologia, negligência e maus
tratos, violência conjugal, abuso sexual)
(Pereira & Matos, 2011).

O Como...
Procedimentos
(American Psychological Association, 1994, 2009)
 Atenção aos quesitos na condução da perícia e na
elaboração do parecer;
 Obtenção de consentimento informado e a explicitação,
junto dos avaliados, dos limites da confidencialidade;
 Recurso a múltiplos métodos (e.g., entrevistas, testes,
observação de interações);
 Manutenção de um processo/arquivo com diferentes
registos e, finalmente, que o parecer se cinja e
fundamente na informação recolhida e, dentro desta,
apenas na que for corroborada por diferentes fontes.
O Como...
Orientações para a prática pericial forense dos
psicólogos nos Processos de Regulação do Exercício
das Responsabilidades Parentais

I. Linhas Orientadoras: Finalidade das Perícias


1. O objetivo da avaliação é auxiliar na determinação
do melhor interesse psicológico da criança.
2. O bem-estar da criança é primordial.
3. A avaliação incide sobre as competências parentais,
as necessidades psicológicas da criança e o ajuste
entre ambas (APA, 2009; Pereira & Matos, 2011).

O Como...
Guia de boas práticas
Colégio Oficial de Psicólogos de Madrid
Três princípios amplamente consensuais
(i) o superior interesse da criança;
(ii) qualquer avaliação sobre a competência dos
progenitores para exercer a guarda dos filhos deve
partir do critério de que ambos são igualmente
competentes para o seu exercício;
(iii) a avaliação a realizar tem que incluir o grupo
familiar no seu conjunto e na sua totalidade.
O Como...
Protocolo de Avaliação

Guião de Entrevista Semiestruturado


Protocolo de Entrevista Forense

O Como...
Protocolo(s) de Avaliação
 Consulta de dados processuais e preparação do processo de
avaliação;
 Entrevistas individuais aos progenitores (avaliação instrumental);
 Entrevistas individuais à criança (avaliação instrumental);
 Informação colateral (e.g., familiares-chave, escola, profissionais
envolvidos no caso);
 Observação das dinâmicas relacionais (interação mãe/pai e
filho/s; irmãos);
 Integração dos dados do processo de avaliação e elaboração de
relatório (Agulhas & Anciães, 2014, 2017; APA, 1994, 2009; Colégio Oficial de
Psicólogos de Madrid, 2009; Peixoto, Ribeiro & Manita, 2007; Pereira, 2014;
Pereira & Matos, 2011; Sani, 2017).
O Como...
Consulta de dados processuais e preparação do
processo de avaliação
Estudo e análise das peças processuais disponíveis,
definição dos intervenientes e procedimentos a utilizar.

Entrevistas individuais aos progenitores


 Diversas áreas do funcionamento dos progenitores
(e.g., antecedentes pessoais e familiares, rede de suporte social,
histórico da relação com o outro progenitor, dinâmicas do processo de
separação/divórcio, parentalidade, constituição atual do agregado).
 Avaliação instrumental
(e.g., sintomatologia, personalidade, crenças).

O Como...
Entrevistas individuais à criança
 Diversas áreas de funcionamento da criança
(e.g., escola, padrão relacional com os pares, dinâmicas
familiares prévias e posteriores ao processo de separação
parental).
 Avaliação instrumental
(e.g., sintomatologia, autoconceito, personalidade, dinâmicas
relacionais e familiares).

Informação colateral
Rede formal e/ou informal (e.g., familiares, escola,
profissionais envolvidos no caso).
O Como...
Observação das dinâmicas relacionais
 Dimensão emocional (e.g., afetos e expressão emocional,
capacidade de regulação emocional);
 Comunicação não-verbal (e.g., olhar, sorriso, tom de voz,
postura corporal, toque);
 Diálogo e comunicação (e.g., imposição de limites);
 Reforço (e.g., espontâneo, solicitado pela criança, inexistente);
 Competências didáticas;
 Prestação de cuidados (no caso de crianças mais
pequenas);
 Comparação entre o discurso da criança e o seu
comportamento.

O Como...
Observação das dinâmicas relacionais
Interação Livre
Pais e filhos exploram a sala e interagem de forma livre sem a
intromissão do perito.
Interação com prescrição de tarefas
Pais e filhos realizam, em conjunto, uma ou mais tarefas
intencionalmente prescritas pelo perito (e.g., construção em
lego, peças de madeira).
Interação mista (livre com prescrição gradual de tarefas)
Interação inicialmente livre com introdução gradual de
instruções, quando os parâmetros a observar não surgem
espontaneamente.
O Como...
Integração dos dados do processo de avaliação e
elaboração de relatório
 Sistematização e análise da informação considerada
relevante, permitindo a emissão de um parecer
fundamentado e coerente, fornecendo ao Tribunal os dados
necessários para emitir uma decisão que satisfaça realmente
o superior interesse da criança.
 Variáveis a ter em conta no estabelecimento do parecer:
 qualidade da relação da criança com cada um dos
progenitores e a capacidade de cada um destes em
reconhecer e satisfação adequadamente as necessidades da
criança;
 etapa evolutiva em que a criança se encontra;
 distância geográfica entre ambas as casas.

O Como...
Entrevista à criança
 Expressão livre sobre a separação dos pais e respetivas
razões;
 Descrição livre de cada um dos pais e dos seus
sentimentos sobre cada deles;
 Exposição livre do momento em que o progenitor não
residente a vai buscar;
 Descrição livre das visitas ou outros contactos com o
progenitor não residente;
 Expressão livre das suas fantasias e desejos
relativamente aos seus pais;
 Expressão livre dos seus desejos de vida.
O Quando...
Finalidade
 Necessários conhecimentos especiais que os
julgadores não possuem para a perceção ou
apreciação de factos;
 Tribunal entenda como necessário o esclarecimento
da personalidade e do carácter dos membros da
família e da dinâmica das suas relações mútuas;
 Avaliação diagnóstica das competências parentais e
aferição da disponibilidade das partes para um
acordo, designadamente em matéria de regulação
do exercício das responsabilidades parentais, que
melhor salvaguarde o interesse da criança.

O Quando...
Variáveis a considerar
 Resistência abrupta, inesperada, exacerbada da(s) criança(s)
às visitas (e.g., condutas de interferência);
 Alegada violência doméstica e/ou situação de abuso sexual;
 Indicadores de desajustamento continuado (i.e., não reativo)
do(s) progenitor(es) devido a parca elaboração psicológica da
rutura conjugal;
 Histórico de psicopatologia ou traçado de personalidade
patológico;
 Apresentados documentos psicológicos por uma das partes
que não acautele o contacto com ambos os progenitores.
O Quando...
Resistência às Visitas
 Processos de desenvolvimento (e.g., ansiedade de
separação em crianças muito novas);
 Casamento e/ou divórcio com elevado conflito (e.g.,
medo ou dificuldade em lidar com um processo de
transição que envolve conflito);
 Resistência face ao estilo parental de um progenitor (e.g.,
rigidez, expressão de emoções negativas muito intensas,
baixa sensibilidade face à criança);
 Resistência devido à perceção de fragilidade de um
progenitor (e.g., medo de deixar esse progenitor
sozinho);

O Quando...
Resistência às Visitas
 Resistência devido a uma nova relação do progenitor
(e.g., comportamentos por parte do padrasto ou
madrasta que alteram o desejo da visita);
 Vivência real negativa prévia;
 Processo de alteração dos vínculos afetivos entre a
criança e o progenitor rejeitado, alteração que pode ser
induzida ou potencializada pelo progenitor não rejeitado;
 Processos sistémicos (e.g., triangulação da criança no
conflito conjugal, vivência de um processo de separação
ou divórcio muito litigioso).
O Quando...
Análise processos transitados em julgado e
respetivas perícias
 Discordância entre o parecer do perito e a decisão
judicial num caso;
 Em 18 casos, a participação do perito e alguns aspetos da
perícia eram mencionados e/ou referidos;
 Em oito acórdãos existiam transcrições diretas do
relatório forense (Castro, Martins, Machado & Gonçalves, 2006, citado por
Gonçalves, 2010).

O Porquê...
O divórcio obriga a uma reestruturação tanto dos
direitos como das responsabilidades dos pais face
aos filhos, reestruturação esta onde deverá
prevalecer sempre, independentemente dos
motivos e argumentos dos pais, o…

Superior Interesse da Criança.


Necessidades físicas, emocionais, morais e intelectuais
dos filhos no centro das relações entre pais e filhos,
prevalecendo os interesses da criança sobre o dos
adultos (Bolieiro & Guerra, 2014; Ramião, 2009;
Sottomayor, 2011).
O Porquê...
“um texto legal não pode apreender o
fenómeno familiar na sua infinita
variedade e imensa complexidade”
(Sottomayor, 2008, p. 38).

“(...) inaceitável afastar um dos


progenitores sem avaliar o seu
relacionamento com a criança e com o
outro progenitor” (Rosa et al., 2013, p. 641).

O Porquê...

As responsabilidades parentais não devem ser


afetadas pela dissolução ou anulação do
casamento ou de outra relação formal, nem pela
separação legal ou factual entre os pais.

Principles of European Family Law regarding Parental


Responsabilities
O Porquê...
Constitui um facto incontestável para os que
lidam com as famílias em rutura que existem
alterações significativas das dinâmicas
familiares que consubstanciam
comportamentos que psicológica e
juridicamente são relevantes e censuráveis, por
incapacidade de um dos progenitores ou ambos
conseguirem destrinçar entre conjugalidade e
parentalidade.

O Porquê...
Crescente consciencialização das perceções relativamente
aos conceitos de maternidade e de paternidade
 Considerar que a maternidade é diferente e superior à
paternidade, reconhecendo à mulher uma predisposição
biológica para cuidar dos filhos - preferência legal da mãe
para a guarda dos filhos que influência a decisão judicial;
 As mães obtêm na grande parte das vezes a guarda dos filhos,
só sendo possível aos pais obtê-la provando a incapacidade da
mãe;
 Uma grande parte dos entrevistados (40 progenitores
divorciados e 27 profissionais - legisladores, juízes,
terapeutas) acredita que os homens não estão muito
interessados em obter a guarda exclusiva da criança nem
numa guarda partilhada (Hacker, 2005, citado por Machado & Sani, 2014).
O Porquê...
 Apenas a convivência normal dos filhos com ambos os
pais permite que aqueles vivenciem, de forma natural, os
processos de identificação e diferenciação pessoal, sem
desequilíbrios ou prejuízos emocionais na constituição da
sua personalidade.
 O desenvolvimento de uma relação segura com ambos
os progenitores minimiza o impacto negativo do conflito
conjugal nos descendentes.
 Os filhos precisam de ter a oportunidade de construir
uma imagem própria sobre cada um dos pais, a partir
dos seus próprios referenciais e não a partir da
interpretação do outro.

Considerações Finais

Em sede de Direito da Família e da Criança, as


perícias psicológicas assumem relativamente
às psiquiátricas uma maior importância;
Crescente número de pedidos de relatórios
periciais;
Evitar o recurso a terminologia esotérica ou
pseudocientífica.
Considerações Finais
 A investigação sugere que a perícia psicológica no âmbito
de processos de regulação das responsabilidades
parentais está entre as mais complexas e difíceis perícias
de avaliação psicológica forense;

 Alguns autores chegam a considerá-la como contexto de


risco para os profissionais envolvidos, existindo uma
grande probabilidade de verem as suas práticas
contestadas e refutadas através de queixas e processos
(Huss, 2011; Pereira & Matos, 2011).

Considerações Finais
Estudo nacional com quatro Juízes e um
Procurador do Ministério Público
Aspetos da perícia mais valorizados
 Fontes;
 Entrevista (e.g., forma, número de pessoas ouvidas);
 Conteúdos que explicam a forma como é exercida a
parentalidade;
 Perícia abrangente e esclarecedora quanto ao que é
pedido;
 Fundamentação;
 Síntese conclusiva e a inclusão de recomendações e
sugestões de intervenção (Machado & Sani, 2014).
Considerações Finais
Estudo nacional com quatro Juízes e um
Procurador do Ministério Público
 “eu não me limito a ler uma conclusão. Preciso de perceber
como é que se chegou àquela conclusão. Tem que ter as
conclusões, mas a fundamentação é absolutamente
fundamental”.

 “que tragam recomendações, sugestões de intervenção, que


tenha os elementos que permitam obter uma resposta
adequada para aquela situação”.

 Para a credibilidade da perícia, os decisores judiciais


destacaram por quem a perícia é realizada e o facto de o
relatório pericial ser conclusivo, emitindo um parecer.

Considerações Finais

ÉTICA, MORAL E
DIREITO
PSICOLOGIA
Obrigado pela
atenção!

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geral@mauropaulino.com

Referências
 Agulhas, R. & Anciães, A. (2014). Casos práticos em Psicologia Forense: Enquadramento legal e Avaliação Pericial.
Lisboa: Edições Sílabo
 Agulhas, R. & Anciães, A. (2017). Avaliação pericial no âmbito do exercício das responsabilidades parentais: que
contribuição para a atribuição de residência alternada?. In Uma família parental, duas casas. Lisboa: Edições Sílabo
 Código Deontológico da Ordem dos Psicólogos Portugueses
 Colegio Oficial de Psicólogos de Madrid (2009). Guía de buenas práticas para la elaboración de informes
psicológicos periciales sobre custodia y régimen de visitas de menores. Madrid: Colegio Oficial de Psicológos de
Madrid
 Magalhães, T. & Jardim, P. (s.d.). Crimes sexuais: questões médico-legais. Documento de trabalho não publicado,
Universidade do Porto
 Machado, M. & Sani, A. (2014). Avaliação psicológica forense na regulação do exercício das responsabilidades
parentais. Perceções dos juízes. In Psicologia, Justiça & Ciências Forenses. Lisboa: Pactor
 Peixoto, C., Ribeiro, C. & Manita, C. (2007). Avaliação psicológica forense das capacidades parentais. Revista da
Sociedade de Psicologia do Triângulo Mineiro, 11, 2, 142-156
 Pereira, D. (2014). Parentalidade e proteção à infância: Um guia para a avaliação da capacidade parental (Tese de
Doutoramento não publicada). Coimbra: Universidade de Coimbra
 Pereira, A. & Matos, M. (2011). Avaliação psicológica das responsabilidades parentais nos casos de separação e
divórcio. In M. Matos, R. Gonçalves & C. Machado (Coords.). Manual de Psicologia Forense: Contextos Práticos e
Desafios (pp.311-347). Braga: Psiquilibrios Edições
 Real, B., Almeida, F. & Real, F. (2014). A perícia médico-legal e o respeito pela autonomia da criança. In Psicologia,
Justiça & Ciências Forenses. Lisboa: Pactor
 Ribeiro, C. (2009). A criança na Justiça: trajectórias e significados do processo judicial de crianças vítimas de abuso
sexual intrafamiliar. Coimbra: Almedina
 Sani, A. (2017). Perícias psicológicas em casos de conflito interparental: Recomendações para a Prática. Temas em
Psicologia, 25, 2, 427-436
 Sottomayor, C. (2008). Regulação do exercício do poder paternal nos casos de divórcio (4ª edição). Coimbra:
Almedina
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