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Negocie Como Se Sua Vida

Dependesse Disso (Chris Voss)

CAPÍTULO 1 – AS NOVAS REGRAS


Como se tornar o mais esperto... em qualquer ambiente

Continuação...

Negociação à moda antiga

O sequestro e a negociação de reféns existem desde que se começou a registrar


o tempo. O Antigo Testamento é recheado de histórias de israelitas e seus
inimigos transformando cidadãos em reféns como espólio de guerra. Os
romanos, por sua vez, costumavam obrigar os príncipes de Estados vassalos a
enviar seus filhos a Roma para serem educados lá, a fim de assegurar a lealdade
dos pais.

Até o governo Nixon, porém, a negociação de reféns como processo


limitava-se a enviar tropas e tentar libertar os prisioneiros a tiros. Na polícia,
nossa abordagem consistia, sobretudo, em dialogar até descobrir uma maneira
de resgatá-los usando uma arma. Força bruta.

Então uma série de desastres com reféns nos forçou a mudar.

Em 1971, 39 reféns foram mortos quando a policia tentou resolver a bala as


rebeliões na prisão de Attica, no norte do estado de Nova York. Depois, nos
Jogos Olímpicos de 1972 em Munique, 11 atletas e treinadores israelenses foram
mortos por seus captores palestinos após uma tentativa fracassada de resgate
por parte da polícia alemã.
Mas o maior gatilho para a mudança institucional nas polícias americanas
ocorreu em uma pista de pouso do aeroporto de Jacksonville, Flórida, em 4 de
outubro de 1971.

Na época, os Estados Unidos enfrentavam uma epidemia de sequestros


aéreos; houve cinco em um período de três dias em 1970. Foi nessa atmosfera
carregada que um homem desequilibrado chamado George Giffe Jr. sequestrou
um avião fretado que saíra de Nashville, Tennessee, com destino às Bahamas.

Quando tudo terminou, Giffe havia assassinado dois reféns – sua ex-
mulher, que estava a bordo, e o piloto – e ainda se matara.

Mas dessa vez a culpa não recaiu sobre o sequestrador, e sim diretamente
sobre o FBI. Os dois reféns tinham conseguido convencer Gifie a libertá-los em
Jacksonville, onde o avião havia parado para reabastecer. Mas os agentes se
descontrolaram e atiraram na turbina. Isso impeliu Giffe para a opção drástica.

Na verdade, a atribuição da culpa ao FBI foi tão forte que, quando a esposa
do piloto e a filha de Giffe impetraram uma ação judicial por homicídio culposo
alegando negligência do órgão de inteligência, os tribunais aceitaram.

No histórico veredito do caso Downs versus Estados Unidos, em 1975, a


Corte de Apelações dos Estados Unidos estabeleceu que “havia uma alternativa
mais adequada para proteger o bem-estar dos reféns” e declarou que o FBI
transformara “o que havia sido um ‘jogo de espera’ bem-sucedido, durante o qual
duas pessoas deixaram o avião em segurança, em uma ‘competição de tiros’ que
deixou três pessoas mortas”. A corte concluiu que “deve haver uma tentativa
razoável de negociação antes de uma intervenção tática”.

O caso Downs de sequestro se tornou o epítome de tudo que não se deve


fazer em uma situação de crise e inspirou o desenvolvimento de teorias,
treinamentos e técnicas atualmente empregadas em negociação de reféns.

Logo depois da tragédia de Giffe, a polícia da cidade de Nova York (NYPD,


na sigla em inglês) tornou-se a primeira força policial dos Estados Unidos a reunir
uma equipe de especialistas para elaborar um processo que lhes permitisse lidar
com negociações de crises. O FBI e outros órgãos acompanharam esse
movimento.

Começava uma nova era de negociação.


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