“Por isso, vos declaro: todo pecado e blasfêmia serão perdoados aos homens; mas a blasfêmia contra o Espírito não será perdoada” (Mt 12:31) TEXTO: Marcos 3:20-35 Há três posições distintas sobre a pessoa de Jesus que introduzem este solene assunto da blasfêmia contra o Espírito Santo. 1. A posição da multidão – Mt 12:22,23 = Jesus acabara de curar um endemoninhado cego e mudo. Diante desse sinal evidente do poder de Jesus, a multidão ficou admirada e começou a ponderar sobre o fato de que Jesus era o Messias. A admiração da multidão desencadeou a hostilidade dos escribas. 2. A posição da família – Mc 3:21 = A família de Jesus vem para prendê-lo, por julgar que ele estava fora de si. Eles querem colocar Jesus debaixo de uma custódia protetora. Jesus estava tão atarefado que não tinha tempo nem para comer (3:20). Por essa razão, sua família chegou a duvidar da sua sanidade mental. Para eles quem serve aos outros sem ter tempo para si mesmo é incompetente para cuidar da sua própria vida. 3. A posição dos inimigos – Mc 3:22 = Os escribas, tomados de inveja, diante da crescente popularidade de Jesus, resolvem dar mais um passo na direção de impedir que o povo o seguisse. Eles já haviam censurado Jesus de ser blasfemo por perdoar pecados. Consideraram-no um transgressor do sábado. Mancomunaram-se com os herodianos para matá-lo. Agora, dizem que Jesus está endemoninhado e possesso do maioral dos demônios. Os escribas acusam Jesus não apenas de estar possesso de um espírito imundo (3:30), mas de estar dominado por Belzebu, o maioral dos demônios (3:22). Belzebu é a contração de dois nomes: Baal, que significa senhor, e zebu que significa mosca: o senhor das moscas. Dizer que Jesus expulsava demônios em nome desse monstro horrível era de fato o pecado imperdoável contra o Espírito Santo. A encarnação do Deus misericordioso que visa redimir seu povo, torna-se a encarnação do maligno. Transformam Jesus num diabo que faz o bem, num diabo ainda mais ardiloso. I. O QUE NÃO É BLASFEMIA CONTRA O ESPÍRITO SANTO A. Incredulidade final = Billy Graham em seu livro O Espírito Santo diz que a blasfêmia contra o Espírito Santo é a rejeição total e irrevogável de Jesus Cristo. Não obstante o fato de que a incredulidade até a hora da morte ser um pecado imperdoável, visto que não há oportunidade de salvação depois da morte, o contexto prova que Jesus está falando que o pecado imperdoável é um pecado que se comete não no leito da enfermidade, mas antes da morte. B. Rechaçar por um tempo a graça de Deus = Muitas pessoas vivem na ignorância, na desobediência por longos anos e depois são convertidas ao Senhor. Por um tempo Paulo rejeitou a graça de Deus (At 26:9; 1 Tm 1:13). Os próprios irmãos de Jesus não criam nele (3:21; Jo 7:5). 3. Negação de Cristo = Paulo perseguiu a Cristo (At 9:4). Pedro negou a Cristo (Mt 26:69-75). Os irmãos de Cristo no início não creram em Jesus (Jo 7:5). Cristo disse que quem blasfemasse contra o Filho seria perdoado (Lc 12:10). Um ateu não necessariamente cometeu o pecado imperdoável. D. Negação da divindade do Espírito Santo = Se assim fosse nenhum ateu poderia ser convertido. Se fosse essa a interpretação, nenhum membro da seita Testemunha de Jeová poderia ser salvo. E. Pecados contra o Espírito Santo = A Palavra de Deus menciona alguns pecados contra o Espírito Santo que não são a blasfêmia contra o Espírito Santo: • Primeiro, não é entristecer o Espírito Santo (Ef 4:30). Um crente pode entristecer o Espírito Santo, mas jamais pode cometer o pecado imperdoável. Davi entristeceu ao Espírito Santo, mas arrependeu-se. • Segundo, não é apagar o Espírito Santo (1 Ts 5:19). Um crente pode apagar o Espírito Santo, deixando de obedecê-lo, deixando de honrá-lo, mas jamais pode blasfemar contra o Espírito Santo. • Terceiro, não é resistir ao Espírito Santo (At 7:51). Muitas pessoas que durante um tempo resiste ao Espírito Santo, ao cabo de um tempo, humilha-se diante dele, como alguns dos sacerdotes que rejeitaram a mensagem de Estevão, mais tarde, foram convertidos a Cristo. • Quarto, não é mentir ao Espírito Santo (At 5:3) – Ananias mentiu ao Espírito Santo através da dissimulação. Muitas pessoas ainda hoje tentam impressionar as pessoas para ganhar o aplauso delas e mentem ao Espírito Santo, aparentando ser quem não são. F. Não é a queda dos salvos = Os salvos não podem blasfemar contra o Espírito Santo, pois quem o pratica é réu de pecado eterno (Mc 3:29), enquanto o ensino claro das Escrituras é que uma vez salvo, salvo para sempre (Jo 10:28). E impossível um salvo cair permanentemente e perecer (Fp 1:6). Hebreus 6:4,5 não se refere a pessoas salvas, mas aos réprobos, aqueles que deliberadamente rejeitam a graça e por isso, estão incluídos no pecado da blasfêmia contra o Espírito Santo. II. O QUE É BLASFEMIA CONTRA O ESPÍRITO SANTO A palavra blasfêmia significa injuriar, caluniar, vituperar, difamar, falar mal. A blasfêmia contra o nome de Deus era pecado imperdoável no Antigo Testamento (Lv 24:10-16). Por isso, os fariseus e escribas julgaram Jesus digno de morte porque dizia que era Deus e isto para eles era blasfêmia (2:7; 14:64; Jo 10:33). A alma que pecava por ignorância trazia oferenda pelo pecado, mas a pessoa que pecava deliberadamente era eliminada, cometia um pecado imperdoável (Nm 15:30). Pecar consciente e deliberadamente contra um conhecimento claro da verdade é evidência da blasfêmia contra o Espírito Santo, e por natureza, este pecado faz com que o perdão seja impossível, porque a única luz possível é deliberadamente apagada. A blasfêmia contra o Espírito é a atitude consciente e deliberada de negar a obra de Deus em Cristo pelo poder do Espírito e atribuir o que Cristo faz ao poder de Satanás. A blasfêmia constitui no fato de afirmar que o poder que age em Cristo não é o Espírito Santo, mas Satanás. É afirmar que Cristo está não apenas possesso, mas possesso do maioral dos demônios. E dizer que Cristo é aliado de Satanás, em vez de estar engajado contra ele. João Calvino entendia que o pecado imperdoável é uma espécie de apostasia total. Aquele que cometeu este pecado nunca terá perdão. Toda a igreja pode orar por ele, mas ele nunca será salvo. De fato, a igreja nem deveria orar por ele, pois cometeu pecado para a morte (1 Jo 5:16). Segundo Jesus é réu de pecado eterno (Mc 3:29) e não terá perdão nem neste mundo nem no vindouro (Mt 12:32). A. A acusação – (3:22) = “Os escribas, que haviam descido de Jerusalém, diziam: ele está possesso de Belzebu. E pelo maioral dos demônios que expele os demônios” (3:22). Eles, por inveja, deliberada e conscientemente estão acusando Jesus de ser aliado e agente de Satanás. Acusam Jesus de estar possesso do maioral dos demônios. Estão atribuindo as obras de Cristo não ao poder do Espírito Santo, mas à influência de Satanás. A acusação contra Cristo foi a seguinte: Jesus, habitado e em parceria com Satanás, estava expulsando demônios, pelo poder derivado desse espírito mau. B. A refutação – (3:23-26) = Jesus refutou o argumento dos escribas contando-lhes duas parábolas com o mesmo significado: o reino dividido e a casa dividida. Com essas duas parábolas, Jesus mostra o quanto o argumento dos escribas era ridículo e absurdo. Satanás estaria destruindo sua própria obra e derrubando seu próprio império. Estaria havendo uma guerra civil no reino do maligno. John Charles Ryle diz que não há poder onde há divisão. Tratando deste assunto, William Hendriksen argumenta: Se o que os escribas diziam era verdade, o dominador estaria destruindo o seu próprio domínio; o príncipe, o seu próprio principado. Primeiro, ele estaria enviando os seus emissários, os demônios, para criar confusão e desordem no coração e na vida dos seres humanos, destruindo-os, muitas vezes pouco a pouco. Depois, como se existisse uma base de ingratidão e loucura suicida, ele estaria suprindo o poder necessário para a derrota vergonhosa e expulsão dos seus próprios servos obedientes. Nenhum reino assim dividido contra si mesmo consegue sobreviver por muito tempo. O reino de Satanás é um sistema fechado. A aparência pluralista é ilusória. Contra Jesus Pilatos e Herodes se uniram e se tornaram amigos (Lc 23:12). Herodes e Pilatos “com gentios e gente de Israel se uniram contra o servo santo de Deus” (At 4:27). Isso faz sentido: Satanás junta suas forças e não trabalha contra si mesmo. C. A explicação – (3:27) = Jesus explica sobre sua vitória sobre os demônios e Satanás: “Ninguém pode entrar na casa do valente para roubar-lhe os bens, sem primeiro amarra-lo; e só, então, lhe saqueará a casa” (3:27). Jesus explica que em vez de ser aliado de Satanás e estar agindo na força dele, está saqueando a casa de Satanás e arrancando de sua casa e de seu reino aqueles que estavam cativos (At 26:18; Cl 1:13). Jesus está ensinando algumas preciosas lições: • Primeiro, Satanás é o valente. Jesus não nega o poder de Satanás nem subestima a sua ação maligna, antes afirma que ele é um valente. • Segundo, Satanás tem uma casa. Satanás tem uma organização e seus súditos presos e seguros nessa casa e nesse reino. • Terceiro, Jesus tem autoridade sobre Satanás. Jesus é o mais valente. Ele tem poder para amarrar Satanás. Jesus venceu Satanás e rompeu o seu poder. Isso não significa que Satanás está inativo, mas sob autoridade. Por mais ativo e forte que seja Belzebu, ele não tem poder para impedir os acontecimentos, pois está amarrado. O seu poder está sendo seriamente diminuído pela vinda e obra de Cristo. Jesus venceu Satanás no deserto, triunfou sobre todas as suas investidas. Esmagou sua cabeça na cruz, triunfando sobre suas hostes (Cl 2:15). Satanás é um inimigo limitado e está debaixo da autoridade absoluta de Jesus. • Quarto, Jesus tem poder que liberta os cativos das mãos de Satanás. Jesus não apenas amarra Satanás, mas também arrebata de suas mãos os cativos. O poder que está em Jesus não é o poder de Belzebu, mas o poder do Espírito Santo. Satanás está sendo e progressivamente continuará a ser destituído dos seus “bens”, ou seja, a alma e o corpo dos seres humanos, e isso não somente por meio de curas e expulsões demoníacas, mas principalmente por meio de um majestoso programa missionário (Jo 12:31,32; Rm 1:16). William Hendriksen diz que os milagres de Cristo, longe de serem provas do domínio de Belzebu, como se o maligno fosse o grande capacitador, são profecias de seu julgamento. D. Exortação – (3:28-30) = Jesus introduz essa solene exortação com um alerta profundo: “Em verdade vos digo que tudo será perdoado aos filhos dos homens: os pecados e as blasfêmias que proferirem. Mas aquele que blasfemar contra o Espírito Santo não tem perdão para sempre, visto que é réu de pecado eterno. Isto, porque diziam: Está possesso de um espírito imundo”. A referência é, naturalmente, a todos os pecados dos quais os seres humanos sinceramente se arrependem. Este verso ressalta duas solenes verdades: Em primeiro lugar, a imensa misericórdia de Deus. Ele perdoa todos os pecados. O sangue de Cristo nos purifica de todo pecado. Se confessarmos nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados. Ele é rico em perdoar. Vivemos num tempo de graça, a dispensação do Espírito Santo. Deus perdoa os pecados que cometemos contra ele e contra o próximo. Adolf Pohl diz que o monte mais alto da maldade é sobrepujado pelo cume da graça de Deus. Geralmente as pessoas perdem essa promessa e preocupam-se apenas com a advertência que se segue. Mas precisamos estar convencidos de que quando há confissão e arrependimento, nenhum pecado está além da possibilidade do perdão de Deus. John Charles Ryle diz que essa doutrina do livre e completo perdão é a coroa e glória do evangelho. Em segundo lugar, o imenso perigo de se cruzar a linha divisória da paciência de Deus. Há um pecado que não tem perdão nem neste mundo nem no vindouro, é a blasfêmia contra o Espírito Santo. Por esse pecado, uma alma pode perecer eternamente no inferno. Esse pecado não é simplesmente uma palavra ou ação, mas uma atitude. Não é apenas rejeitar a Jesus, mas rejeitar o poder que está atrás dele. O que constitui o pecado imperdoável? Dewey Mulholland diz que Jesus encarna o perdão de Deus. Logo que persiste em resistir e desprezar a oferta do perdão de Deus em Jesus é excluído do perdão. Essa rejeição deliberada de Jesus é a única limitação ao ilimitado perdão de Deus. Os pecados mais horrendos podem ser perdoados. Manassés era feiticeiro e assassino e arrependeu-se. Nabucodonosor era um déspota sanguinário e arrependeu-se. Davi adulterou e matou, mas foi perdoado. Saulo perseguiu a igreja de Deus e foi convertido. Maria Madalena era prostituta e possessa, mas Jesus a transformou. Mas a blasfêmia contra o Espírito Santo não tem perdão. Quem pratica esse pecado atravessa a linha divisória da oportunidade e torna-se réu de pecado eterno. O processo de endurecimento chega a um ponto em que é impossível que essa pessoa seja renovada para o arrependimento (Hb 6:4-6). Deus a entrega a si mesma e a uma disposição mental reprovável (Rm 1:24-28). Ela comete o pecado para a morte (1 Jo 5;16). Não tem perdão para sempre visto que é réu de pecado eterno (Mc 3:29). Só lhe resta uma expectativa horrível de juízo (Hb 10:26-31). Por que a blasfêmia contra o Espírito Santo não pode ser perdoada? Porque aqueles que a cometem dizem que Jesus é ministro de Satanás, que a fonte de seu poder não é o Espírito Santo, mas Belzebu. E imperdoável porque rejeitam o Espírito Santo e a Cristo, dizendo que o Salvador é ministro de Satanás. E imperdoável porque é um pecado consciente, intencional e deliberado de atribuir a obra de Cristo pelo poder do Espírito Santo a Satanás. Esse pecado constitui uma irreversível dureza de coração. A blasfêmia contra o Espírito Santo não é um pecado de ignorância. Não é por falta de luz. Para que uma pessoa seja perdoada precisa estar arrependida. O perdão precisa ser desejado. Adolf Pohl diz que graça que fosse lançada sobre nós como o reboco na parede não seria graça. Os escribas, entretanto, mesmo sob a evidência incontroversa das obras de Cristo, negam e invertem essa obra. Eles não sentiam nenhuma tristeza pelo seu pecado. William Hendriksen diz que eles substituíram a penitência pela insensibilidade, e a confissão pela intriga. Portanto, devido à sua insensibilidade criminosa e completamente indesculpável, eles estavam condenando a si mesmos. Eles fecham a porta da graça com suas próprias mãos. CONCLUSÃO Há duas implicações a destacar: • Primeiro, evitar o julgamento. Billy Graham diz que devemos tocar neste assunto com muito cuidado. Devemos hesitar em sermos dogmáticos em nossas afirmações sobre aqueles que cruzaram essa linha divisória da paciência de Deus. Devemos deixar essa decisão com Deus. Somente Deus sabe se e quando alguém ultrapassa essa linha do pecado para a morte. • Segundo, evitar o desespero. Muitos crentes ficam angustiados e preocupados de terem cometido esse pecado imperdoável. Ninguém pode sentir tristeza pelo pecado sem a obra do Espírito Santo. Quem comete esse pecado, jamais sente tristeza por ele. O medo excruciante de pensar ter cometido o pecado imperdoável é, por si só, evidência de que tal pessoa não o cometeu. • Terceiro, evitar a leviandade. Aqueles que zombam de Deus, da sua graça podem cruzar essa linha invisível e perecerem para sempre. O PECADO PARA A MORTE “Se alguém vir a seu irmão cometer pecado não para morte, pedirá, e Deus lhe dará vida, aos que não pecam para morte. Há pecado para morte, e por esse não digo que rogue” (1 Jo 5:16). O pecado para a morte é mencionado por João em sua primeira carta: "Há pecado para morte, e por esse não digo que rogue (5.16c)". A morte a que João se refere é a morte espiritual eterna, a condenação final e irrevogável determinada por Deus, tendo como castigo o sofrimento eterno no inferno. Todos os demais pecados podem ser perdoados, mas o “pecado para morte” acarreta de forma inexorável a condenação eterna de quem o comete, a ponto do apóstolo dizer: "e por esse não digo que rogue". E o apóstolo continua: "Toda injustiça é pecado, e há pecado não para a morte (5.17; cf. 3.4)". João não está sugerindo que a distinção entre pecado mortal e pecado não mortal implique na existência de pecados que não sejam tão graves assim. Todo pecado é contra o Deus justo, contra a sua justiça. Portanto, todo pecado traz a morte, que é a penalidade imposta por Deus contra o pecado. Mas, para que seus leitores não fiquem aterrorizados, João repete: há pecado não para morte (5.17b). Nem todo pecado é o pecado mortal. Há perdão e vida para os que não pecam para a morte. O Senhor mesmo convida seu povo a buscar o perdão que Ele concede (Is 1.18). O que, então, é o pecado para a morte? O apóstolo João não declara explicitamente a que tipo de pecado se refere. Através dos séculos, estudiosos cristãos têm procurado responder a esta pergunta. Alguns têm entendido que João se refere à morte física, e têm sugerido que se trata de pecados que eram punidos com a pena de morte conforme está no Antigo Testamento (Lv 20.1-27; Nm 18.22). Não adiantaria orar pelos que cometeram pecados punidos com a morte, pois seriam executados de qualquer forma pela autoridade civil. Ou então, trata-se de pecados que o próprio Deus puniria com a morte aqui neste mundo, como ele fez com os filhos de Eli (2 Sm 2.25), com Ananias e Safira (At 5.1-11) e com alguns membros da igreja de Corinto que profanavam a Ceia (1 Co 11.30; cf. Rm 1.32). A Igreja Católica fez uma classificação de pecados veniais e pecados mortais, incluindo nos últimos os famosos sete pecados capitais, como assassinato, adultério, glutonaria, mentira, blasfêmia, idolatria, entre outros. Este tipo de classificação é totalmente arbitrário e não tem apoio nas Escrituras. A interpretação que nos parece mais correta é que João está se referindo à apostasia, que no contexto de seus leitores, significaria abandonar a doutrina apostólica que tinham ouvido e recebido e seguir o ensinamento dos falsos mestres, que negava a encarnação e a divindade do Senhor Jesus. “Pode-se inferir do contexto que este pecado não é uma queda parcial ou a transgressão de um determinado mandamento, mas apostasia, pela qual as pessoas se alienam completamente de Deus” (Calvino). Trata-se, portanto, de um pecado doutrinário, cometido de forma voluntária e consciente, similar ao pecado de blasfêmia contra o Espírito Santo, cometido pelos fariseus, e que o Senhor Jesus declarou que não haveria de ter perdão nem aqui nem no mundo vindouro (cf. Mt 12.32; Mc 3.29; Lc 12.10). Em ambos os casos, há uma rejeição consciente e voluntária da verdade que foi claramente exposta. No caso dos leitores de João, a apostasia seria mais profunda, pois teriam participado das igrejas cristãs, como se fossem cristãos, participado das ordenanças do batismo e da Ceia, participado dos meios de graça. À semelhança dos falsos mestres que também, antes, tinham sido membros das igrejas, apostatar seria sair delas (2.19), e se juntar aos pregadores gnósticos e abraçar a doutrina deles, que consistia numa negação de Cristo. Tal pecado era “para a morte” por sua própria natureza, que é a rejeição final e decidida daquele único que pode salvar, Jesus Cristo. “Este pecado leva quem o comete inexoravelmente a um estado de incorrigível embotamento moral e espiritual, porque pecou voluntariamente contra a própria consciência” (J. Stott). É provavelmente sobre pessoas que apostataram desta forma que o autor de Hebreus escreveu, dizendo que “é impossível outra vez renová-los para arrependimento, visto que, de novo, estão crucificando para si mesmos o Filho de Deus e expondo-o à ignomínia” (Hb 6.4-6). Ele descreve essa situação como sendo um viver deliberado no pecado após o recebimento do pleno conhecimento da verdade. Neste caso, “já não resta sacrifício pelos pecados; pelo contrário, certa expectação horrível de juízo e fogo vingador prestes a consumir os adversários” (Hb 10.26-27). Este pecado é descrito como calcar aos pés o Filho de Deus, profanar o sangue da aliança com que foi santificado e ultrajar o Espírito da graça (Hb 10.29), uma linguagem que claramente aponta para a blasfêmia contra o Espírito e a negação de Jesus como Senhor e Cristo (ver também 2 Pe 2.20-22, onde o apóstolo Pedro se refere aos falsos mestres). Não é sem razão que o apóstolo João desaconselha pedirmos por quem pecou dessa forma. Alguém pode perguntar se Deus fecharia a porta do perdão se pessoas que pecaram para a morte se arrependessem. Tais pessoas, porém, não poderão se arrepender. Elas não o desejam. E além disto, o Senhor determinou sua condenação, a ponto de João não aconselhar que oremos por elas. “Tais pessoas foram entregues a um estado mental reprovável, estão destituída do Espírito Santo, e não podem fazer outra coisa senão, com suas mentes obstinadas, se tornarem piores e piores, acrescentando mais pecado ao seu pecado” (Calvino). Notemos que nestes versículos João não chama de “irmão” aquele que peca para a morte. Apenas declara que há pecado para a morte e que não recomenda orar pelos que o cometem. É evidente que os nascidos de Deus jamais poderão cometer este pecado. Portanto, não se impressione com as ameaças de pastores do tipo "você está blasfemando contra o Espírito Santo" se o que você estiver fazendo é simplesmente perguntando qual a base bíblica para cair no Espírito, rir no Espírito, a unção da leoa, e outras "manifestações" atribuídas ao Espírito Santo.