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INTRODUÇÃO
Uma vez que todos os anos falamos de quaresma, nós não temos dificuldade
nenhuma de entender que a espiritualidade que a Igreja nos propõe, a partir dos seus
tempos litúrgicos, é como que cíclica: ao longo de um ano fazemos um percurso e isso
nos traz uma riqueza que é muito proveitosa, porque a intenção da Igreja com essa
metodologia não é outra senão fazer com que a gente percorra o mistério redentor, o
grande mistério do Deus amor que se revelou para nós. Por isso que todos os anos
vivenciamos esse ciclo: Quaresma, Semana Santa, Páscoa, Advento, Natal e tantas
outras festas que nos remetem a aspectos do grande mistério de Cristo.
Sabemos que nesse tempo de quaresma nós somos exortados a rever e dar
passos na nossa vida de conversão (não sei vocês, mas eu me pego pensando que
durante o ano a gente se “desconverte”, para na quaresma se converter novamente). Se
vocês tem essa impressão, como às vezes eu tenho, então precisamos vigiar muito,
porque essa impressão é equivocada. A quaresma não está para que a gente volte de
novo e se converta. Não! Por que embora nós tenhamos uma espiritualidade que nos
faz passar pelo mistério de cristo, numa metodologia cíclica, a nossa caminhada não é
em círculo. A nossa caminhada é prosseguir, é ir adiante, sempre se lançando ao que
ainda resta. Nós vivemos a vida passando pelo grande mistério da vida de Cristo, mas
a nossa direção, a nossa meta, o nosso rumo é ir adiante e caminhar com um olhar fixo
naquilo que está faltando. Assim deve ser por nós vivenciada e aproveitada a
quaresma.
E esse tempo espiritual da quaresma é extremamente oportuno para que a
gente possa, cada vez mais, viver o processo de continuidade da nossa conversão de
uma forma madura. A quaresma, assim como a páscoa e qualquer outro tempo
litúrgico que se atualiza a cada ano para nós, coloca-nos esse questionamento acerca da
medida do nosso amadurecimento, que não pode ser em círculo; que não existe um
“até aqui” ou “já está bom”. Nós sabemos que a medida de maturidade oferecida para
nós é a estatura de Cristo.
Desse modo, tem algumas questões que precisamos observar e considerar no
modo como atualizamos a cada ano a vivência quaresmal.
Começou a quaresma para mim, a direção é que eu ponha mais força, que eu
aprofunde e me volte mais urgentemente para a conversão. Então o que eu penso: “eu
estou mais preguiçoso, eu preciso ler mais a bíblia”. Mas isso é muito superficial e
insuficiente para a medida que nos foi dada e para a identidade que nós portamos. Eu
preciso, de fato, fazer um reconhecimento de modo pessoal, como estou. Aqui não é
assim: “eu tô mais cansado, ou sem gosto”. Não é nomear as sensações, condição ou
reações. Nós estamos falando de um aprofundamento. Se eu estou sem gosto, o que me
fez ficar assim? Porque que eu estou sem gosto? Ou o que é que na verdade está tendo
mais gosto para mim? O que é que está sendo para mim mais interessante do que
passar mais tempo na Adoração, na Palavra, na presença do Senhor?
Preciso me perceber e me reconhecer, mas eu também preciso - por um dever de
responsabilidade, de caridade e de zelo - lançar um olhar sobre a comunidade e vê qual
a sua necessidade, qual a sua ferida. Que perigo lhe ameaça, que risco ela está
correndo. Porque eu preciso, no meu processo de aprofundamento da conversão, tocar
nessa realidade. Não somos chamados a ser produtivos na quaresma, nem produtivos
enquanto conversão. Nós somos chamados de fato a nos aprofundarmos e nos
aproximarmos ainda mais da medida estabelecida que é Cristo.