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Operações Humanitárias

Autor do curso
Tenente Coronel René Wagemans (aposentado),
Exército Belga

Em cooperação com
o Centro de Operações de Paz de Caráter Naval

Editor da série
Harvey J. Langholtz, Ph.D.

Instituto de Treinamento em Operações de Paz*


Estude sobre paz e ajuda humanitária em qualquer lugar e em qualquer momento
Operações Humanitárias

Três mulheres carregam um saco de grãos enquanto membros do Programa


Mundial de Alimentos (PMA) distribuem mantimentos na Aldeia de Nacate, perto
de Macomia. Esta imagem faz parte de uma série de fotografias realizadas nos dias
que antecederam a chegada do Secretário-Geral António Guterres a Moçambique.
O Sr. Guterres visitou o país para fazer um balanço dos esforços de recuperação
nas áreas impactadas pelos Ciclones Idai e Kenneth, que ocorreram com apenas
algumas semanas de intervalo em março e abril de 2019. 9 de julho de 2019. Foto
da ONU por Eskinder Debebe.

Autor do curso
Tenente Coronel René Wagemans (aposentado),
Exército Belga

Em cooperação com
o Centro de Operações de Paz de Caráter Naval

Editor da série
Harvey J. Langholtz, Ph.D.

Instituto de Treinamento em Operações de Paz*


Estude sobre paz e ajuda humanitária em qualquer lugar e em qualquer momento
O POTI quer agradecer à Capitão-Tenente Mariana Lemos Müller pelo
trabalho e cooperação em traduzir este curso.

© 2022 Instituto de Treinamento em Operações de Paz*

*Peace Operations Training Institute® Reg. U.S. Pat & Tm. Off.
1309 Jamestown Road, Suite 202
Williamsburg, VA 23185 USA
www.peaceopstraining.org

Primeira edição: Dezembro de 2017 por Tenente Coronel René Wagemans (aposentado), Exército Belga
Segunda edição: 2021 por Tenente Coronel René Wagemans (aposentado), Exército Belga

O material aqui contido não reflete, necessariamente, as opiniões do Instituto para Treinamento em Operações de Paz,
do(s) autor(es) do curso, de qualquer órgão das Nações Unidas ou de organizações a ela afiliadas. Embora todos os
esforços tenham sido envidados no sentido de verificar o conteúdo do presente curso, o Instituto de Treinamento em
Operações de Paz e o(s) autor(es) do curso não se responsabilizam por fatos e opiniões contidos no texto, os quais
foram, em grande parte, assimilados a partir de mídias abertas ou outras fontes independentes. O presente curso foi
desenvolvido com a finalidade de produzir um documento pedagógico e educativo compatível com a política e doutrina
atuais da ONU, embora não estabeleça nem promulgue nenhuma doutrina. Somente documentos da ONU oficialmente
examinados e aprovados podem estabelecer ou promulgar a política ou a doutrina das Nações Unidas. Informações com
visões diametralmente opostas sobre determinados temas são às vezes fornecidas no intuito de estimular o interesse
escolástico dos alunos, em conformidade com as normas da pesquisa acadêmica pura e simples.

Os tradutores envidaram todos os esforços para preservar a integridade das informações aqui contidas.
Operações Humanitárias

Índice

Prefácio   x

Método de Estudo   xi

Lição 1 Intervenção humanitária   12

Seção 1.1 O que é uma operação de ajuda humanitária?   14

Seção 1.2 Visão geral histórica — da caridade à intervenção   17

Seção 1.3 Diferentes tipos de emergências e desastres   20

Seção 1.4 Princípios Humanitários e Aspectos Legais   24

Seção 1.5 O ambiente operacional em mudança e suas consequências   29

Seção 1.6 O princípio “Não causar danos”   31

Seção 1.7 Conscientização cultural   33

Lição 2 Atores em operações de ajuda humanitária e seus


mandatos   37

Seção 2.1 Tipos de organizações — O que são ONGs, IGOs e GOs?   39

Seção 2.2 Antecedentes históricos e política   43

Seção 2.3 Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente


Vermelho   45

Seção 2.4 Gabinete de Coordenação dos Assuntos Humanitários   47

Seção 2.5 Comitê Permanente Interagências   49

INSTITUTO DE TREINAMENTO EM OPERAÇÕES DE PAZ

v
Operações Humanitárias

Seção 2.6 Agências da ONU — Uma breve descrição   50

Seção 2.7 “Super” ONGs   56

Seção 2.8 Consórcios de ONGs e o Banco Mundial   57

Lição 3 Os militares e os trabalhadores humanitários   61

Seção 3.1 O que é uma Cooperação Civil-Militar?   63

Seção 3.2 O que é a Coordenação Civil-Militar?   64

Seção 3.3 Militares versus Trabalhadores de Ajuda Humanitária —


Incompatibilidade ou Oportunidade?   64

Seção 3.4 Militares nacionais versus militares internacionais   68

Seção 3.5 Os Princípios Militares e Humanitários — “O que uma palavra


significa?”   69

Seção 3.6 Oslo, MCDA e Diretrizes específicas do país — Um breve


panorama   71

Seção 3.7 Diferentes tipos de assistência e opções de último recurso   75

Seção 3.8 Adequação de FMAs implantados e risco potencial   77

Seção 3.9 Desafios nos espaços militares e humanitários   78

Lição 4 Mecanismo de Coordenação Humanitária   84

Seção 4.1 O Que é “Coordenação”? — Uma Atividade Desafiadora   86

Seção 4.2 IASC e a Abordagem de Cluster   88

Seção 4.3 RC/HC, UNCT e HCT   90

Seção 4.4 OCHA e ERC   92

Seção 4.5 UNDAC e o conceito OSOCC   93

Seção 4.6 Missões Integradas da ONU e Percepção de Coordenação   102

Seção 4.7 Disposições de Coordenação Civil-Militar Durante Desastres


Naturais   103

Seção 4.8 Financiamento Humanitário   104

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vi
Operações Humanitárias

Lição 5 Questões Transversais   109

Seção 5.1 Populações Afetadas — Diferentes Tipos e Definições   111

Seção 5.2 Questões de Gênero e Grupos Vulneráveis   115

Seção 5.3 Proteção   119

Seção 5.4 Segurança e Proteção   123

Seção 5.5 Gerenciamento de restos mortais durante um desastre   128

Lição 6 Avaliação   135

Seção 6.1 Visão geral e introdução à avaliação   137

Seção 6.2 Desafios   137

Seção 6.3 Tipos de Avaliação   138

Seção 6.4 MIRA   140

Seção 6.5 O ciclo de GI   141

Seção 6.6 A Estrutura Analítica MIRA   144

Seção 6.7 Seleção do Local e Amostragem Proposital   148

Seção 6.8 Técnicas de Coleta de Dados   150

Seção 6.9 Etapas de Análise   152

Seção 6.10 Plano de Avaliação e Organização de Visitas de Campo   154

Seção 6.11 Relatórios   154

Seção 6.12 ACAPS e GEGA   156

Seção 6.13 O Projeto Esfera   156

Seção 6.14 MapAction   158

Seção 6.15 Mídia e Mídias Sociais   158

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vii
Operações Humanitárias

Lição 7 Impacto de desastres no setor de abrigos e itens


não alimentares   161

Seção 7.1 Abrigo — A Diferença entre Conflito Armado e Desastres


Naturais   163

Seção 7.2 Desenvolvimentos Demográficos e Desastres   163

Seção 7.3 Desastres — Fatos e Números   164

Seção 7.4 Impacto Físico de Terremotos   165

Seção 7.5 Impacto Físico das Inundações   167

Seção 7.6 Impacto Físico de Ciclones Tropicais   168

Seção 7.7 Opções de Assentamento Transitório   170

Seção 7.8 Planejamento de Abrigo   176

Seção 7.9 Padrões de Abrigo   179

Seção 7.10 Itens Não Alimentares   180

Lição 8 Impacto de Desastres, WASH e o Setor de


Saúde   183

Seção 8.1 Diferentes tipos de desastres e seus efeitos sobre


o WASH   185

Seção 8.2 Diferentes tipos de desastres e seus efeitos na saúde   187

Seção 8.3 Abastecimento de Água e Higiene (WASH)   189

Seção 8.4 Descarte de Excrementos e Resíduos (WASH)   190

Seção 8.5 Drenagem e Controle Vetorial (WASH)   192

Seção 8.6 Ações de Saúde em Desastres   194

Seção 8.7 Epidemiologia e Vacinações   197

Seção 8.8 USAR e INSARAG   200

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viii
Operações Humanitárias

Lição 9 Logística, Alimentação e Nutrição   206

Seção 9.1 Diferentes Tipos de Desastres e Seus Efeitos na Alimentação e


Nutrição   208

Seção 9.2 Segurança Alimentar — Definições   209

Seção 9.3 Medindo a Segurança Alimentar e o Planejamento   210

Seção 9.4 Transferências de Dinheiro e Voucher e Emprego   215

Seção 9.5 Logística de Desastres   217

Seção 9.6 WFP, Cluster de Log e LRT   225

Seção 9.7 UNHAS   226

Apêndice A: Siglas e abreviaturas   229

Informação sobre o Exame Final de Curso   237

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ix
Operações Humanitárias

Prefácio

Cada desastre ou emergência tem suas particularidades, assim como ocorre com as operações
humanitárias. Compreender a dinâmica de um desastre e todos os atores nele envolvidos é essencial
para fornecer assistência adequada à população afetada e ao governo desse local. Ao longo dos anos,
alguns criticaram a comunidade humanitária pela conduta de certas ações humanitárias. Os profissionais
envolvidos nem sempre puseram em prática as lições aprendidas com as operações dessa natureza
ocorridas anteriormente. Vários documentos e manuais registraram as melhores práticas possíveis,
levando a uma melhor resposta quando aplicadas. Infelizmente, a ação humanitária não é uma ciência
exata e dependerá da capacidade do trabalhador humanitário de se adaptar às situações no terreno.

Este curso não pretende esgotar o assunto, pois seria impossível descrever todos os aspectos de
ajuda humanitária por este meio. É um curso genérico e destina-se a servir como uma introdução
para o tema de ajuda humanitária e outros tópicos relacionados. Sempre que possível ou necessário,
o material de leitura adicional é referenciado, como livros, documentos (incluindo anexos) e sites de
interesse. Os alunos são incentivados a ler tais materiais adicionais para expandir seus conhecimentos.

Como em muitas outras comunidades, a comunidade humanitária possui uma linguagem própria, como
o uso de siglas, de caráter dinâmico. O desenvolvimento contínuo de novos sistemas e métodos dentro dessa
comunidade é comum. Grandes desastres geralmente levam à criação de uma camada adicional de regras
e diretivas, tornando a situação cada vez mais complexa para quem é de fora. Este curso tenta simplificar
esses conceitos tanto quanto possível, enfocando seus aspectos mais importantes para desmistificar esse
ambiente complexo. Ao mesmo tempo, fornece muitas informações práticas sobre os diferentes tipos de
desastres e como interagir com algumas entidades e estruturas frequentemente encontradas em campo.
Sempre que possível, os atores humanitários devem integrar as estruturas de coordenação existentes e/ou
estabelecidas, pois somente a ação coordenada pode alcançar o sucesso. Abordar a população afetada não
como vítimas, mas como parte da solução, requer uma mudança fundamental na mentalidade desses atores,
mas é essencial para o resultado bem-sucedido de uma ação de ajuda. No final, seremos responsabilizados
pelo que fizermos - e pelo que deixarmos de fazer. Ter uma boa compreensão de suas definições e princípios
é o primeiro passo para nos integrarmos essa comunidade humanitária, respeitando-nos uns aos outros e
aos princípios humanitários que sempre devem guiar nossas ações.

Por último, mas não menos importante, gostaria de


agradecer ao Sr. Jesper Lund, chefe da Seção de Apoio à
Coordenação de Campo, e ao Sr. Josef Reiterer, chefe da
Seção de Coordenação Civil-Militar, ambos do Escritório
das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos
Humanitários - Genebra, por seu gentil apoio e por suas
observações construtivas. Por fim, agradeço ao Sr. Lars-
Peter Nissen, CEO da ACAPS, que me permitiu utilizar Assista ao vídeo introdutório deste

seus valiosos recursos, essenciais no desenvolvimento de curso (em inglês): <https://www.


peaceopstraining.org/videos/490/hro-
algumas partes deste curso.
course-introduction/>.

‒ Tenente Coronel René Wagemans, 2021

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x
Operações Humanitárias

Método de Estudo

Este curso individualizado visa dar aos alunos flexibilidade em sua abordagem ao aprendizado.
o as etapas a seguir destinam-se a fornecer motivação e orientação sobre algumas estratégias
possíveis e expectativas mínimas para concluir este curso com sucesso:

• Antes de dar início a seus estudos, primeiro dê uma olhada em todo o material do curso.
Preste atenção nos sumários das lições, de onde se obtém uma boa noção do conteúdo
disponível à medida que você avança.

• O material é lógico e direto. Em vez de memorizar detalhes individuais, tente entender os


conceitos e as perspectivas gerais que se referem ao Sistema das Nações Unidas.

• Crie regras de gerenciamento de tempo.

• Estude o conteúdo das lições e os objetivos do aprendizado. No início de cada lição, oriente-se
pelos principais pontos. Se for possível, leia o material duas vezes para garantir o máximo do
entendimento e da retenção do mesmo, e deixe passar algum tempo entre as leituras.

• Ao concluir uma lição, realize a Verificação de Aprendizagem correspondente. A cada erro,


volte ao material e releia-o. Antes de continuar os estudos, procure saber o que o levou a
cometer aquele erro.

• Depois de completar todas as lições, reserve algum tempo para revisar os principais pontos de
cada uma. Só então, enquanto o material ainda estiver fresco em sua mente, faça de uma só
vez o Exame Final de Curso.

» Acesse a sua Sala de Aula Online visitando


<www.peaceopstraining.org/users/user_login>
virtualmente em qualquer lugar no mundo.
• Seu exame receberá uma nota e se você obtiver 75% ou mais de acertos, receberá um
Certificado de Conclusão. Se obtiver menos de 75%, terá a oportunidade de realizar uma
segunda versão do Exame Final de Curso.

• Observação: Este curso foi traduzido do inglês para o português do Brasil.

Características mais importantes da sua sala de aula on-line »


• Acesso a todos os seus cursos;

• Ambiente de teste seguro para concluir seu treinamento;

• Acesso a recursos adicionais, incluindo cursos auxiliares multimídia;

• Possibilidade de baixar o Certificado de Conclusão de qualquer curso concluído; e

• Fóruns onde você pode discutir temas relevantes com a comunidade do POTI.

INSTITUTO DE TREINAMENTO EM OPERAÇÕES DE PAZ

xi
OPERAÇÕES HUMANITÁRIAS

LIÇÃO

1 Intervenção humanitária

Esta lição é uma introdução


à intervenção humanitária,
começando com definições e
um breve panorama histórico.

© CICV, Biju Boru.

Nesta lição » Objetivos da lição »

Seção 1.1 O que é uma operação de ajuda • Distinguir, compreender e comparar os diferentes
humanitária? termos usados para descrever as operações de
ajuda humanitária.
Seção 1.2 Panorama histórico - da caridade

à intervenção • Compreender e explicar diferentes tipos


de emergências.
Seção 1.3 Diferentes tipos de emergências

e desastres • Compreender e recordar diferentes


princípios humanitários.
Seção 1.4 Princípios Humanitários e

Aspectos Legais • Descrever as considerações legais e o


ambiente operacional.
Seção 1.5 O ambiente operacional em

mudança e suas consequências • Analisar o contexto operacional e compreender os


cursos de ação potenciais para a entrega de itens
Seção 1.6 O princípio de “não causar
de assistência humanitária.
danos”
• Compreender o contexto cultural da
Seção 1.7 Conscientização cultural
população afetada.

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12
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

Um funcionário do Fundo das Nações Unidas para a População (UNFPA) distribui kits de higiene e saúde para meninas adolescentes
em uma escola em Macomia, Moçambique. 9 de julho de 2019. Foto da ONU por Eskinder Debebe.

Introdução

É essencial para quem atua com operações de paz


compreender os princípios orientadores da intervenção
humanitária, bem como seu ambiente operacional,
contexto e histórico-cultural. Os alunos devem estar
cientes de que algumas seções são curtas por dois
motivos principais:
Veja um vídeo de introdução desta
• elas serão discutidas detalhadamente nas
lição em inglês: <https://www.
próximas lições; ou peaceopstraining.org/videos/492/hro-
lesson-1-humanitarian-intervention/>.
• seu conteúdo é muito complexo para ser
explicado a fundo; por isso, os alunos serão
direcionados a buscar mais informações num
documento ou livro adicionalmente a este curso.

13
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

Um membro da equipe do Gabinete de Coordenação dos Assuntos Humanitários (OCHA) discute as necessidades
humanitárias com trabalhadores de uma Organização Não Governamental (ONG) da Líbia em Sallum, na fronteira entre a
Líbia e o Egito. 12 de março de 2011. Foto da ONU por David Ohana.

Seção 1.1 O que é uma operação de ajuda humanitária?


Devido à sua natureza complexa, é difícil fornecer uma definição
única de operação de ajuda humanitária (do inglês, Humanitarian
Relief Operation — HRO); no entanto, uma revisão da literatura militar
e civil revela alguns termos frequentemente utilizados, assim como “Dar dinheiro é
algumas compatibilidades/semelhanças entre eles. uma questão fácil e
» Ajuda em desastres: O Ministério da Defesa do
qualquer um pode
Reino Unido define a ajuda em desastres como “a fazê-lo. Mas decidir
resposta organizada para aliviar os resultados de uma a quem, quanto e
catástrofe. Seus objetivos são: salvar vidas; aliviar quando dá-lo, com
o sofrimento; limitar danos; restaurar os serviços que propósito e
essenciais a um nível que permita às autoridades locais
como, não está ao
lidarem com o problema; e definir as condições para a
alcance de qualquer
recuperação do local1.”
pessoa nem é uma
» Operação de socorro em desastres (do inglês, questão fácil.”
Disaster relief operation ‑ DRO): O Ministério da Defesa
do Reino Unido define um DRO “como uma tarefa militar -Aristóteles
primária e de contribuição para uma resposta de socorro
a desastres. Ela fornece assistência específica para uma
população aflita em território estrangeiro. O Socorro
em Desastres é uma Tarefa Militar específica categorizada

1) Ministério da Defesa do Reino Unido, Publicação Conjunta de Doutrina (JDP) 3-52, Operações de socorro em desastres em território estrangeiro:
a contribuição militar. Disponível em inglês: <https://www.gov.uk/government/uploads/system/uploads/attachment_data/file/574033/doctrine_uk_
dro_jdp_3_52.pdf>.

14
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

como uma Operação de Contingente em Território Estrangeiro


para Orientação Estratégica de Defesa (do inglês, Contingent
Operation Overseas in Defence Strategic Guidance, ou DSG2).”

» Socorro Emergencial é “a ajuda imediata visando à


sobrevivência das vítimas de crises e conflitos violentos. A
maioria das operações de socorro são iniciadas a curto prazo
e têm um curto período de implementação (os objetivos do
projeto geralmente são concluídos em um ano). O principal
objetivo do socorro emergencial é salvar vidas3.”

» A ação humanitária “fornece serviços que salvam vidas e


facilita que pessoas e comunidades afetadas por desastres
naturais e causados pelo homem retornem à normalidade.
Também visa a diminuir o impacto destrutivo de desastres
e emergências complexas. A resposta humanitária é guiada
pelos princípios de humanidade, imparcialidade, neutralidade
e independência, que fornecem uma estrutura comum para as
organizações envolvidas na ação humanitária4.”

» A ação humanitária “compreende assistência, proteção e


defesa em resposta às necessidades humanitárias resultantes
de desastres naturais, conflitos armados ou outras causas,
ou ainda a prontidão para resposta a emergências. Tem
como objetivo salvar vidas e reduzir o sofrimento a curto
prazo, de forma a preservar a dignidade das pessoas e abrir
caminhos para promover a recuperação e a criação de soluções
duradouras para o deslocamento. A ação humanitária é baseada
na premissa de que o sofrimento humano deve ser evitado e
aliviado onde quer que aconteça (referido como o 'imperativo
humanitário5').”

» A ajuda humanitária é geralmente considerada como a ajuda e


as ações destinadas a "salvar vidas, aliviar o sofrimento e manter
a dignidade humana durante e após crises e desastres provocados
pelo homem ou desastres naturais, bem como para prevenir e
fortalecer a preparação para quando tais situações ocorrerem6.”

2) Daragh Murray, Guia dos Profissionais do Direito Internacional dos Direitos Humanos em Conflitos Armados, Dapo Akande, Charles Garraway,
Françoise Hampson, Noam Lubell, Elizabeth Wilmshurst, eds. (Oxford, Reino Unido: Oxford University Press, 2016). Disponível em inglês.
3) ReliefWeb, “Glossário de Termos Humanitários”, 2008. Disponível em inglês: <https://reliefweb.int/report/world/reliefweb-glossary-humanitarian-terms-
enko>.
4) InterAction: InterAction: Uma Voz Unida para a Mudança Global, “Ação Humanitária”.
5) Comitê Permanente Interagências das Nações Unidas, Introdução à Ação Humanitária: Um Breve Guia para Coordenadores Residentes, outubro de
2015, 8. Disponível em inglês: <https://interagencystandingcommittee.org/system/files/rc_guide_31_october_2015_webversion_final.pdf>.
6) Iniciativas de Desenvolvimento, “Definindo a ajuda humanitária”. Disponível em inglês: <https://web.archive.org/web/20171102215158/http://
www.globalhumanitarianassistance.org/data-guides/defining-humanitarian-aid>.

15
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

» A ajuda humanitária é “[um] apoio que visa (…) a salvar


vidas e aliviar o sofrimento de uma população afetada
pela crise. Deve ser prestada de acordo com os princípios
humanitários básicos de humanidade, imparcialidade e
neutralidade, conforme declarado na Resolução 46/182 da
Assembleia Geral. Além disso, a ONU procura fornecer ajuda
humanitária com total respeito à soberania dos Estados7”.

» Intervenção Humanitária é “uma doutrina geralmente


entendida como uma ação coercitiva realizada por Estados
envolvendo o uso de uma força armada em outro Estado sem
o consentimento de seu governo, com ou sem autorização do
Conselho de Segurança da ONU, com o propósito de prevenir
ou travar violações graves e massivas dos direitos humanos ou
do direito internacional humanitário. As operações da ONU no
norte do Iraque e na Somália e a operação da OTAN em Kosovo
foram todas chamadas de intervenção humanitária8”.

» As operações humanitárias são conduzidas para aliviar o


sofrimento humano, especialmente em circunstâncias em que as
autoridades responsáveis da área são incapazes ou não desejam
fornecer um serviço de apoio adequado às populações civis9.

» Resposta de Emergência é “a ação imediata e apropriada


para salvar vidas, garantir proteção e restaurar o bem-estar
dos refugiados10”.

A Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) oferece as seguintes definições:

» Ajuda humanitária: “Como parte de uma operação, o uso de


recursos militares disponíveis para auxiliar ou complementar
os esforços de atores civis responsáveis na área operacional ou
organizações humanitárias civis especializadas no cumprimento
de sua responsabilidade primária de aliviar o sofrimento
humano11.”

7) ReliefWeb, “Glossário de Termos Humanitários”.


8) Gabinete de Coordenação dos Assuntos Humanitários, “Glossário de Proteção de Civis em Conflitos Armados”, agosto de 2003. Disponível em inglês:
<https://www.humanitarianresponse.info/sites/www.humanitarianresponse.info/files/documents/files/OCHA%20Protection%20of%20Civilians%20
in%20armed%20conflict_%20Glossary.pdf>.
9) Gabinete de Coordenação dos Assuntos Humanitários, “Glossário de Proteção de Civis em Conflitos Armados”.
10) Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, Manual para Emergências — Terceira Edição, 2007. Disponível em inglês: <https://
reliefweb.int/report/world/handbook-emergencies-third-edition>.
11) Agência de Normalização da OTAN, “Glossário de Termos e Definições da OTAN”, AAP-06, 2019. Disponível em inglês: <https://www.coemed.org/
files/stanags/05_AAP/AAP-06_2019_EF.pdf>.

16
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

» Operação Humanitária: “Uma operação montada


especificamente para aliviar o sofrimento humano em uma
área onde os atores civis normalmente responsáveis por fazê-lo
estão incapacitados ou não desejam apoiar uma população de
forma adequada12.”

Esses termos e definições diferem, mas também incluem palavras semelhantes, como humanitário,
socorro, assistência, operações, resposta, intervenção e ação. Cada um deles contém assuntos
semelhantes, como:

• A urgência para atuar no atendimento a uma população atingida;

• A assistência orientada por princípios humanitários; e

• Salvar vidas (imperativo humanitário).

Aparentemente, um Gabinete de Direitos Humanos também utiliza esses mesmos assuntos e


terminologia. As organizações militares usam definições ligeiramente diferentes e mais restritivas para
suas abordagens; no entanto, todas elas têm como foco em aliviar o sofrimento humano. As lições 3 e
4 deste curso detalharão melhor essas diferenças.

Seção 1.2 Visão geral histórica — da caridade à intervenção

Visão histórica

A ação humanitária pode ser considerada tão antiga


quanto a humanidade. Suas formas mais simples
começaram com o compartilhamento e o fornecimento
de itens como comida, água, roupas, cuidados de
saúde e abrigo para os necessitados, fossem eles
membros da família ou de uma comunidade ou grupo
maior. A história humana contém muitos exemplos de
atos de caridade, e muitas das religiões do mundo o
praticam de alguma forma, desde as tradições cristãs
e judaicas do “dízimo” ao pilar islâmico de “zakat”.
© CICV, Thomas Glass. Bougainville, aldeia Gagan:
Na era moderna, a simples caridade desenvolveu- Jovens posam segurando folhetos informativos durante

se na prática da filantropia. Originária das palavras um treinamento de cinco dias sobre primeiros socorros
na aldeia da comunidade conduzido por voluntários da
gregas que significam “o amor pela humanidade”,
Sociedade da Cruz Vermelha de Papua Nova Guiné. 25
a filantropia busca cuidar, nutrir, desenvolver e de junho de 2019.

aprimorar o significado de ser humano13. Envolve


quem doa (benfeitores), como doa (valores) e quem recebe e se beneficia do serviço ou dos bens
prestados (beneficiários). As atividades filantrópicas modernas datam do século XVIII, quando surgiram
como novas atividades sociais. Muitas associações voluntárias foram formadas para promover essas
atividades, e elas se tornaram práticas culturais comuns entre benfeitores ricos. Mais tarde, a expansão
da classe média em muitos países adotou a filantropia como uma atividade popular.

12) Agência de Normalização da OTAN. “Glossário de termos e definições da OTAN”.


13) National Philanthropic Trust, “Uma história da filantropia moderna”. Disponível em inglês: <https://www.historyofgiving.org//>.

17
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

O empresário suíço Henry Dunant é considerado o pai da ação humanitária e das organizações
humanitárias modernas. Dunant foi uma das principais lideranças da Primeira Convenção de Genebra
de 1864 e da fundação do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV). Em seu livro de 1862, Un
souvenir de Solférino, Dunant descreveu as atrocidades que testemunhou na Batalha de Solferino de
1859, durante a Segunda Guerra da Independência italiana, que deixou milhares de soldados mortos e
feridos14. No livro, ele desenvolveu várias ideias para o futuro dos conflitos:

• A formação de uma organização neutra para cuidar dos soldados feridos;

• A criação de sociedades permanentes de ajuda voluntária; e

• A adoção de um tratado para proteger os soldados feridos e todos os que se empenham em


ajudá-los.

As ideias de Dunant formariam dois dos pilares do que se tornaria o CICV: imparcialidade na prestação
de cuidados médicos e o princípio de neutralidade na ação médica. Uma conferência constituinte em
outubro de 1863 lançou as bases estatutárias do CICV, que durariam mais de 60 anos. A Convenção
para a Melhoria da Condição dos Feridos nos Exércitos em Campo, comumente conhecida como a
Primeira Convenção de Genebra, adotou essas ideias em suas disposições, e 12 grandes potências
europeias assinaram o acordo em 22 de agosto de 186415.

A destruição causada pela Primeira Guerra Mundial levou à criação da Liga das Nações em 1920.
Com sede em Genebra, essa organização internacional pretendia fornecer um fórum para a resolução
de disputas internacionais. O então presidente dos Estados Unidos, Woodrow Wilson, expôs sua visão
para a Liga em 1918 em sua obra “Quatorze pontos" sobre o futuro da Europa no pós-guerra16”. O
último ponto apelava à criação de um novo tipo de organização internacional dedicada a fomentar a
cooperação internacional, proporcionando segurança aos seus membros e garantindo a paz duradoura.
Essas questões foram importantes para os europeus que sofreram durante quatro anos numa guerra
absoluta que deixou muitos países em ruínas. Os Quatorze Pontos de Wilson se tornaram a base para os
termos da rendição alemã, conforme negociado no Tratado de Versalhes na Conferência de Paz em Paris
Conferência de Paz de Paris em 1919.

Os objetivos da Liga focavam principalmente na prevenção guerra por meio da segurança coletiva
e na resolução de disputas entre países por meio de negociação e diplomacia. Também promoveu o
desarmamento e tentou melhorar o bem-estar global. A Liga tinha três órgãos principais: o Secretariado
o Secretariado. (chefiado pelo Secretário-Geral e com sede em Genebra), o Conselho e a Assembleia
Geral. A Liga também teve várias agências e comissões, incluindo17:

» Organização Internacional do Trabalho (OIT) — Liderada


pelo ex-ministro francês do Armamento Albert Thomas, a
OIT proibiu com sucesso a adição de chumbo em tintas e
pressionou vários países a adotarem a jornada de trabalho
de oito horas por dia e de 48 horas por semana. Também

14) Henry Dunant, Un souvenir de Solférino, Genebra, Comitê Internacional da Cruz Vermelha, 1939. Disponível em inglês: <https://www.icrc.org/eng/
assets/files/publications/icrc-002-0361.pdf>.
15) François Bugnion, “Nascimento de uma ideia: a fundação do Comitê Internacional da Cruz Vermelha e do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do
Crescente Vermelho: de Solferino à Convenção de Genebra original (1859-1864)”, International Review of the Red Cross, vol. 94, No. 888, 2012. Disponível
em inglês: <https://international-review.icrc.org/articles/birth-idea-founding-international-committee-red-cross-and-international-red-cross-and-red>.
16) História dos Estados Unidos, “Os quatorze pontos”. Disponível em inglês: <https://history.state.gov/milestones/1914-1920/fourteen-points>.
17) New World Encyclopedia, “Liga das Nações”. Disponível em inglês: <http://www.newworldencyclopedia.org/p/index.php?title=League_of_Nations>.

18
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

trabalhou para acabar com o trabalho infantil, melhorar a


posição de mulheres no ambiente de trabalho e responsabilizar
os donos de embarcações pelos acidentes com marinheiros. Em
1946, a OIT tornou-se uma agência das Nações Unidas, que se
sucedeu à Liga das Nações.

» Alto Comissariado para Refugiados — Liderado pelo


explorador norueguês Fridtjof Nansen, a Comissão supervisionou
o repatriamento e reassentamento de 400.000 refugiados e
ex-refugiados após a Primeira Guerra Mundial, muitos dos quais
ficaram presos na Rússia. A Comissão também estabeleceu o
denominado “passaporte Nansen” como meio de identificação
dos apátridas. Em 1923, o mandato original do Alto Comissário
para proteger os refugiados russos foi estendido para incluir os
refugiados armênios por meio de assistência material, prevenção
de doenças, fornecimento de alimentos e proteção legal e
política. À medida que o problema dos refugiados crescia, o
mandato da Comissão foi ampliado para incluir assírios, cristãos
caldeus e refugiados turcos.

A Liga tinha 42 membros quando foi fundada em


1920, e mais seis membros se juntaram a ela no
final daquele ano. A Liga atingiu seu maior número
de membros (58) de 1934 a 1935. Apesar do apoio
do presidente Wilson à Liga, o Senado dos Estados
Unidos votou em 1919 pela rejeição do Tratado de
Versalhes e, com ele, a adesão à Liga. Os Estados
Unidos não fizeram parte da organização durante
seu período operacional de 1920 a 1946. Além disso,
16 dos membros fundadores se retiraram da Liga
durante sua existência18.

Embora a Liga das Nações tenha alcançado


alguns sucessos durante seu período de operação,
incluindo a resolução de crises de refugiados e a
melhoria das condições internacionais de trabalho,
ela tinha fraquezas estruturais que acabaram por
limitar sua eficácia como organização internacional.
Uma dessas fraquezas era a dificuldade em fazer Os Estados-Membros assinam o Preâmbulo da Carta das
cumprir suas resoluções. A Liga não tinha uma Nações Unidas para comemorar o seu 75º aniversário. 23
de outubro de 2020. Foto da ONU por Manuel Elías.
força armada própria, mas dependia das grandes
potências para apoiar seus mandatos, o que muitas
vezes relutava em fazer. Da mesma forma, as
18) Escritório das Nações Unidas em Genebra, “Cronologia”. Disponível em inglês: <https://www.unog.
ch/80256EDD006B8954/(httpAssets)/3DA94AAFEB9E8E76C1256F340047BB52/$file/sdn_chronology.pdf>.

19
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

sanções econômicas impostas pela Liga tiveram pouco impacto sobre os países-alvo, uma vez que
esses poderiam simplesmente negociar com Estados não membros. Apesar de seu objetivo de resolver
conflitos internacionais por meio da diplomacia, a Liga foi incapaz de evitar a Segunda Guerra Mundial.
A Liga das Nações realizou sua reunião final em Genebra, em 18 de abril de 194619.

Perto do fim da Segunda Guerra Mundial, as potências aliadas (a União Soviética, o Reino Unido e os
Estados Unidos) se reuniram na Conferência de Yalta para planejar o futuro da segurança internacional.
Os Aliados concordaram em criar um novo organismo internacional — as Nações Unidas — para suceder
a Liga. Muitas das agências da Liga, como a OIT, continuaram a funcionar e, por fim, se afiliaram à ONU.

Os Aliados pretendiam tornar as Nações Unidas mais eficazes do que a Liga, reformando sua
estrutura. Os membros originais da ONU incluíam 51 países e, desde então, cresceu para incluir
193 Estados Membros. Com um número maior de membros, a ONU estabeleceu maior legitimidade
nos assuntos internacionais do que a Liga jamais teve. Os principais países aliados — República da
China, França, Reino Unido, Estados Unidos e URSS — tornaram-se os cinco membros permanentes
do novo Conselho de Segurança. As decisões do Conselho de Segurança são obrigatórias para todos os
membros da ONU, e qualquer um dos membros permanentes pode vetar as resoluções apresentadas
a ele. Enquanto o Conselho da Liga (o precursor do Conselho de Segurança) exigia votos unânimes
para aprovar as resoluções, o Conselho de Segurança exige apenas nove votos “sim”, sem vetos dos
membros permanentes, para aprovar as resoluções.

Da mesma forma que a Liga existente antes dela, a ONU não tem suas próprias forças armadas
permanentes. No entanto, a Organização tem sido mais bem-sucedida do que sua antecessora ao convocar
seus membros a contribuírem com intervenções armadas, conforme ocorrido ao impedir a invasão da
Coreia do Sul pela Coreia do Norte e ao implantar operações de manutenção da paz nos Bálcãs, por
exemplo. Além disso, há outras ferramentas que a ONU pode usar, como sanções econômicas e embargos.

Após a Segunda Guerra Mundial, houve a criação das Nações Unidas e de várias outras agências,
bem como grandes organizações não governamentais (ONGs) focadas em fornecer ajuda humanitária a
todo o mundo. A Lição 2 examinará esses grupos e suas ações com mais detalhes.

Seção 1.3 Diferentes tipos de emergências e desastres


Esta seção se refere a documentos oficiais da ONU a fim de definir com o máximo de precisão
alguns desastres e emergências.

» Desastre:

» “Uma séria interrupção do funcionamento de uma comunidade


ou sociedade envolvendo perdas e impactos humanos,
materiais, econômicos ou ambientais, que excedem a
capacidade da comunidade ou sociedade afetada de lidar com
seus próprios recursos.

19) Susan Pedersen, “De volta à Liga das Nações”, The American Historical Review, vol. 112, No. 4 (outubro de 2007), 1091-1117. Disponível em inglês.

20
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

Comentário: Os desastres são frequentemente descritos como


o resultado da combinação dos seguintes fatores: exposição
a um perigo; condições de vulnerabilidade presentes; e
capacidade ou medidas insuficientes para reduzir ou lidar
com potenciais consequências negativas. Os impactos de
desastres podem incluir a perda de vidas, ferimentos, doenças
e outros efeitos negativos no bem-estar físico, mental e social
humano, juntamente com danos à propriedade, destruição de
ativos, perda de serviços, perturbação social e econômica e
degradação ambiental.”

» “Uma séria interrupção do funcionamento de uma comunidade


ou sociedade envolvendo perdas e impactos humanos,
materiais, econômicos ou ambientais generalizados, que excede
a capacidade da comunidade ou sociedade afetada de lidar com
seus próprios recursos20.

Comentário: Desastres são frequentemente descritos como


resultado da combinação de: a exposição a um perigo; as
condições de vulnerabilidade presentes; e capacidade ou
medidas insuficientes para reduzir ou lidar com as potenciais
consequências negativas. Os impactos de desastres podem
incluir perda de vidas, ferimentos, doenças e outros efeitos
negativos no bem-estar físico, mental e social humano,
juntamente com danos à propriedade, destruição de
ativos, perda de serviços, perturbação social e econômica e
degradação ambiental21”.

Além do impacto físico do fenômeno natural, o contexto social que pode transformar esse fenômeno
em desastre é composto por cinco variáveis: demografia, pobreza, meio ambiente, mecanismos
existentes de prevenção e gestão de riscos e nível de infraestrutura e organizações existentes22.
Essas cinco variáveis podem ter um efeito multiplicador, como foi visto durante a crise no Haiti após o
terremoto de magnitude 7,0 a 15 milhas a sudoeste da capital, Porto Príncipe, em 201023.

A comunidade humanitária distingue principalmente “desastres naturais” de “emergências complexas”.

» Desastres Naturais: “Desastres naturais são eventos


causados por catástrofes naturais que afetam seriamente
a sociedade, economia e/ou infraestrutura de uma região.
Dependendo da vulnerabilidade da população e da capacidade

20) Escritório das Nações Unidas para Redução do Risco de Desastres, “Desastre”. Disponível em inglês: <https://www.undrr.org/terminology>.
21) ONU, 2009 Terminologia UNISDR sobre Redução de Risco de Desastres, (Genebra: UNISDR, maio de 2009). Disponível em inglês: <http://www.
unisdr.org/files/7817_UNISDRTerminologyEnglish.pdf>.
22) Frédéric Thomas, Haïti, L'échec humanitaire: le cas haïtien (Bruxelles, Bélgica: Entraide & Fraternite), 2. Disponível em inglês: <https://www.
entraide.be/IMG/pdf/e_f_thomas_ecran.pdf>.
23) ONU, Relatório das Nações Unidas no Haiti 2010: Situação, Desafios e Perspectivas, 2011. Disponível em inglês: <https://reliefweb.int/sites/
reliefweb.int/files/resources/F9DE84C8F12B844B8525781B0053C3F6-Full_Report.pdf>.

21
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

de resposta local, os desastres naturais apresentarão desafios e


problemas de natureza humanitária. O termo "desastre natural"
é utilizado para facilitar. É importante compreender, no entanto,
que a magnitude das consequências dos desastres naturais
repentinos é um resultado direto da maneira como os indivíduos
e as sociedades se relacionam com as ameaças originadas dos
desastres naturais. A magnitude das consequências é, portanto,
determinada pela ação humana, ou pela ausência dela24.”

» Risco natural: “Processo ou fenômeno natural que pode


causar perda de vidas, ferimentos ou outros impactos à
saúde, danos à propriedade, perda de meios de subsistência e
serviços, perturbação social e econômica ou dano ambiental.

» Comentário: Os riscos naturais são um subconjunto de todos


os riscos existentes. O termo é usado para descrever eventos
de riscos reais, bem como as condições de perigo latentes que
podem dar origem a eventos futuros. Os eventos de risco natural
podem ser caracterizados por sua magnitude ou intensidade,
velocidade de início, duração e área de extensão. Por exemplo,
os terremotos têm curta duração e geralmente afetam uma
região relativamente pequena, enquanto as secas demoram a
se desenvolver e desaparecem, além de normalmente afetarem
grandes regiões. Em alguns casos, os perigos podem estar
associados, como no caso de uma enchente causada por um
furacão ou de um tsunami causado por um terremoto25.”

As fontes às vezes usam a mesma definição para os termos “desastres naturais e tecnológicos” e
“desastres naturais”. O termo “desastres naturais e causados pelo homem” às vezes também é utilizado.
Os desastres tecnológicos podem estar relacionados a desastres provocados pelo homem: um pode
resultar do outro, ou ambos podem ser a consequência direta de um desastre natural (por exemplo,
quando um terremoto causa uma falha técnica que libera a pressão de uma barragem, rompendo-a e
causando um maremoto e enchentes pesadas em uma área grande e densamente povoada). Muitos
desastres naturais já geraram consequências tecnológicas, como no caso do terremoto e do tsunami
que causaram o acidente da usina nuclear de Fukushima em 201126. Cada vez mais, os acidentes de
impacto ambiental significativo são considerados desastres sempre que as autoridades nacionais não
conseguem lidar com eles, especialmente quando afetam centros populacionais.

24) ReliefWeb, “Glossário de termos humanitários”.


25) ONU, Terminologia UNISDR de 2009 sobre Redução do Risco de Desastres.
26) ONU, Assembleia Geral, Declaração sobre a Resposta Internacional à Situação na Central Nuclear de Fukushima Daiichi no Japão, Secretário-Geral da
ONU, 25 de março de 2011. Disponível em inglês: <https://www.un.org/sg/en/content/sg/speeches/2011-03-25/statement-international-response-
situation-fukushima-daiichi-nuclear>.

22
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

O furacão Dorian, de categoria cinco, varreu as ilhas Bahama de Abaco e Grand Bahama em 1 de setembro de 2019. Pelo menos 43
pessoas morreram após a passagem do Dorian, que estagnou nas Bahamas por quase dois dias com ventos de 320 km/h, tornando-
se um dos piores desastres da história do país. Vista de Mudd, bairro majoritariamente habitado por imigrantes haitianos em Marsh
Harbour, Bahamas. 11 de setembro de 2019. Foto da ONU por Mark Garten.

» Emergência Complexa27: “Crise humanitária


multifacetada num país, região ou sociedade onde
há uma quebra total ou considerável de autoridade
resultante de um conflito interno ou externo e que
requer uma resposta internacional multissetorial que
vai além do mandato ou capacidade de qualquer
agência e/ou do programa nacional da ONU em
andamento. Essas emergências têm, em particular, um
efeito devastador sobre crianças e mulheres e exigem
uma gama complexa de respostas.”

O Manual de Campo da Coordenação Civil-Militar da ONU (UN-


CMCoord) usa as seguintes definições, mais curtas e fáceis de usar,
para desastres naturais e emergências complexas: Manual de Campo UN-CMCoord
disponível em inglês: <https://www.
» “Os desastres naturais são eventos causados unocha.org/publication/un-cmcoord-

por catástrofes naturais que afetam gravemente a field-handbook>.

sociedade, a economia e/ou a infraestrutura de uma


região. As consequências humanitárias dependem da
vulnerabilidade das pessoas afetadas e de sua capacidade de
enfrentamento e resposta local.

27) ReliefWeb, “Glossário de termos humanitários”.

23
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

» Uma emergência complexa é uma crise humanitária num país,


região ou sociedade onde há uma quebra total ou considerável
de autoridade resultante de um conflito interno ou externo e que
requer uma resposta internacional que vai além do mandato ou
da capacidade de qualquer Programa de país da ONU28.”

Emergências — Níveis

O processo de Reforma Humanitária de 2005 foi iniciado como uma consequência direta do terremoto
e do tsunami ocorridos no Oceano Índico em 200429, que causaram a morte de mais de 200.000 pessoas30.
O terremoto no Haiti em 2010 e as enchentes no Paquistão reforçaram a necessidade de reformar as
respostas humanitárias multilaterais aos desastres. Assim, o Comité Permanente Interagências (do
inglês, Inter-Agency Standing Committee — IASC) divulgou sua Agenda Transformadora (do inglês,
Transformative Agenda — TA) sobre o assunto em dezembro de 201131. Essa TA teve como objetivo
melhorar a resposta geral a desastres, aproveitando as lições aprendidas em 2010 e superando as
lacunas da reforma humanitária de 200532. Um dos principais resultados da TA foi a criação de novos
sistemas ede uma terminologia relacionada a desastres de grande escala.

Uma das inovações da TA foi a classificação em três “níveis” de emergência. Embora não seja
especificamente definido, a TA considera como uma emergência de nível 1 (L1) aquela em que os
recursos nacionais e internacionais disponíveis no país são suficientes para respondê-la e não requerem
assistência externa. Uma emergência de nível 2 (L2) requer algum apoio de países vizinhos, entidades
regionais e, possivelmente, da sede da agência33. Uma emergência de nível 3 (L3) é uma grande
crise humanitária em todo o sistema desencadeada por um desastre natural ou conflito que requer
mobilização e resposta de todo o sistema. A TA incluiu a classificação L3 como uma forma de fortalecer
a liderança, coordenação e responsabilidade nas respostas interagências a grandes emergências
humanitárias. Originalmente projetada para emergências de início súbito, a classificação L3 agora inclui
emergências de início lento em circunstâncias excepcionais onde a gravidade da situação justifique seu
uso. A Lição 2 examina esse processo com mais detalhes34.

Seção 1.4 Princípios Humanitários e Aspectos Legais

Os princípios humanitários

» “Humanidade: o sofrimento humano deve ser enfrentado onde


quer que seja encontrado. O objetivo da ação humanitária é
proteger a vida e a saúde e garantir o respeito pelo ser humano.

28) Escritório para a Coordenação de Assuntos Humanitários, Manual de Campo UN-CMCoord (v2.0), Genebra, Suíça, OCHA, 2018. Disponível em inglês:
<https://www.unocha.org/publication/un-cmcoord-field-handbook>.
29) Comitê Permanente Interagências, “Agenda Transformadora do IASC”. Disponível em inglês: <https://interagencystandingcommittee.org/iasc-
transformative-agenda>.
30) “Tsunami do Oceano Índico: antes e depois”, BBC News, 25 de dezembro de 2014. Disponível em inglês: <http://www.bbc.com/news/world-asia-30034501>.
31) O IASC é o principal mecanismo de coordenação entre agências de ajuda humanitária. Disponível em inglês: <https://interagencystandingcommittee.org/>.
32) A Lição 2 também explora essa questão.
33) OCHA, UNDAC Field Handbook, 7ª ed., 2018. Disponível em inglês: <https://www.unocha.org/sites/unocha/files/1823826E_web_pages.pdf>.
34) Este curso enfoca as emergências L3, já que geralmente são as mais complexas e envolvem muitos atores e setores.

24
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

» Neutralidade: Os atores humanitários não devem tomar


partido nas hostilidades ou envolver-se em controvérsias de
natureza política, racial, religiosa ou ideológica.

» Imparcialidade: A ação humanitária deve ser realizada


apenas com base na necessidade, dando prioridade aos casos
de angústia mais urgentes e não fazendo distinções baseadas
em nacionalidade, raça, sexo, crença religiosa, classe ou
opiniões políticas.

» Independência: a ação humanitária deve ser autônoma


dos objetivos políticos, econômicos, militares ou outros que
qualquer ator possa ter em relação às áreas onde a ação
humanitária está sendo implementada35.”

Origem

Os quatro princípios humanitários da humanidade, neutralidade, imparcialidade e


independência são a base para toda ação humanitária — seja durante um desastre natural, uma
emergência complexa ou em outros casos36. A ONU endossou todos os quatro princípios em momentos
diferentes. Os três primeiros princípios foram afirmados na resolução 46/182 da Assembleia Geral em
1991 e o quarto princípio na resolução 58/114 da Assembleia Geral em 2003.

Visão geral da 46ª sessão


da Assembleia Geral. 23 de
setembro de 1991. Foto da
ONU por Eskinder Debebe.

35) OCHA, “Quais são os princípios humanitários?” em OCHA on Message: Humanitarian Principles, junho de 2012, 1. Disponível em inglês: <https://
www.unocha.org/sites/dms/Documents/OOM-humanitarianprinciples_eng_June12.pdf>.
36) OCHA, “Quais são os princípios humanitários?”.

25
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

Esses princípios humanitários se originam nos princípios básicos que orientam as atividades do CICV e
das Sociedades Nacionais da Cruz Vermelha/Crescente Vermelho e estão contidos em vários documentos.
O Código de Conduta do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho e das
Organizações Não Governamentais de Apoio em Desastres fornece um conjunto de padrões comuns para
todas as organizações envolvidas em atividades humanitárias37. O Projeto Esfera, um esforço internacional
para estabelecer padrões nas áreas centrais da ajuda humanitária38, elaborou a Carta Humanitária
para afirmar o imperativo humanitário39 e expressar as convicções compartilhadas entre as agências
humanitárias que são universalmente aplicáveis a todos os afetados por desastres ou conflitos40.

Os princípios humanitários são fundamentais para a maioria dos atores humanitários; no entanto, o
número e a diversidade dos atores de resposta aumentaram muito nos últimos anos, os quais, muitas
vezes, possuem diferentes interpretações dos princípios humanitários. Muitos desses atores são ONGs,
empresas de segurança ou de suporte com fins lucrativos, assim como indivíduos ou redes voltados
para negócios com objetivos e culturas diferentes e níveis variados de especialização e experiência em
assuntos humanitários. Isso impõe restrições significativas aos princípios humanitários.

Quando a crise de Darfur começou, em 2003, muitas organizações desafiaram sua neutralidade,
defendendo ativamente questões delicadas de proteção civil, que estavam dentro do claro papel e
da responsabilidade das autoridades sudanesas. Algumas agências fizeram pressão para aumentar o
poder da Operação Híbrida da União Africana e das Nações Unidas no Darfur (MINUAD) por meio de
um mandato mais forte, já que as questões de segurança estavam atrapalhando as operações de
socorro41. Essa ação pública resultou em ameaças (principalmente por parte de autoridades) para que
as agências expulsassem funcionários, o que algumas vezes acabou acontecendo. Alguns trabalhadores
humanitários foram presos e detidos. Os atores humanitários também enfrentaram dificuldades para
renovar a permissão de trabalho dos trabalhadores humanitários, além de longos períodos para a
expedição de vistos humanitários e para a realização de processos alfandegários. As agências envolvidas
em questões políticas e de proteção ou relacionadas a vistos humanitários e liberações alfandegárias
enfrentaram períodos de processamento particularmente longos, que duravam até três meses42.

Pode ser difícil determinar a fronteira entre a neutralidade e o envolvimento público em questões de
controvérsia política. Podem ser interpretadas como declarações políticas ações como defesa pública para
segurança adicional, melhor acesso a determinadas áreas e destaque a responsabilidades de determinados
atores. Esta afirmação é particularmente verdadeira em relação a questões de proteção relacionadas a
um conflito. Embora certas agências humanitárias possam estar dispostas a comprometer sua estrita
neutralidade em casos de situações envolvendo risco de vida a populações afetadas e trabalhadores
humanitários, os atores humanitários devem encontrar um equilíbrio adequado entre a defesa pública e
o princípio humanitário de neutralidade para evitar a percepção de engajamento político ou em questões
militares. Essa forma “nova” ou “pragmática” de neutralidade não é isenta de riscos.
37) CICV, Código de Conduta para o Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho e Organizações Não Governamentais (ONGs)
no Apoio em Desastres. Disponível em inglês: <https://www.icrc.org/eng/assets/files/publications/icrc-002-1067.pdf>.
38) Projeto Esfera, The Sphere Handbook: Carta Humanitária e Padrões Mínimos em Resposta Humanitária, 2018. Disponível em inglês: <https://
spherestandards.org/handbook/editions/>.
39) Essa ação deve ser tomada para prevenir ou aliviar o sofrimento humano decorrente de um desastre ou conflito, e nada deve se sobrepor a
esse princípio.
40) Projeto Esfera, The Sphere Handbook.
41) Instituto de Desenvolvimento Internacional, “Advocacia humanitária em Darfur: o desafio da neutralidade”, HPG Policy Brief 28, outubro de 2007.
Disponível em inglês: <https://odi.org/en/publications/humanitarian-advocacy-in-darfur-the-challenge-of-neutrality/>.
42) Durante a crise de Darfur, um C-130 belga empregado no Programa Mundial de Alimentos sob indicativo da ONU foi detido por vários dias pelas
autoridades sudanesas (de transporte e alfândega) para fiscalização de todas as partes numeradas da aeronave.

26
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

Aspectos legais

Esta seção fornece uma visão geral dos principais documentos legais que contextualizam os
princípios humanitários e as ações humanitárias43.

A Paz da Vestfália

Em 1648, o Sacro Império Romano, o Reino da Espanha, a República Holandesa e outras potências
europeias se reuniram nas cidades de Osnabrück e Münster, localizadas na Vestefália, para assinar uma
série de tratados de paz. Os tratados encerraram as principais guerras religiosas que dividiram a Europa
durante os séculos XVI e XVII e deram início à chamada Paz de Vestfália. Embora os tratados não
tenham restaurado a paz em toda a Europa, eles criaram uma base para a autodeterminação nacional.
Duas ideias emergiram da paz e se tornaram centrais para a ordem mundial que se desenvolveu ao
longo dos séculos subsequentes: respeitar as fronteiras dos Estados soberanos e não interferir em seus
assuntos internos. Esses princípios permanecem em vigor até hoje. Com o tempo, o significado de longo
prazo dos tratados de paz se reduziu a:

• O princípio da soberania dos Estados e o direito fundamental à autodeterminação política;

• O princípio da igualdade (jurídica) entre os Estados; e

• O princípio da não intervenção de um Estado nos assuntos internos de outro Estado.

Muitos novos países se formaram nos séculos XIX e XX. A descolonização ocorrida no século
XX (principalmente após a Segunda Guerra Mundial) criou ainda mais países independentes. A
descolonização espalhou por todo o mundo os princípios vestfalianos, especialmente o conceito de
Estados soberanos, e fez deles a base da lei internacional.

De acordo com a ONU, o direito internacional define as responsabilidades legais dos países em
sua conduta entre si e no tratamento dos indivíduos dentro de suas fronteiras. Abrange uma ampla gama
de questões de interesse internacional, incluindo direitos humanos, desarmamento, crime internacional,
refugiados, migração, problemas de nacionalidade, tratamento de prisioneiros, uso da força e condução
da guerra44. Também regula os bens comuns globais, como meio ambiente, desenvolvimento sustentável,
águas internacionais, espaço exterior, comunicações globais e comércio mundial45.

Conforme observado anteriormente, o direito internacional inclui a responsabilidade do Estado de


proteger sua própria população. O Relatório do Secretário-Geral Implementando a responsabilidade de
proteção afirmou que “cada Estado individualmente tem a responsabilidade de proteger suas populações
do genocídio, de crimes de guerra, da limpeza étnica e de crimes contra a humanidade46”. O não
cumprimento dessas responsabilidades pode levar a uma intervenção humanitária.

No século XX, a comunidade internacional desenvolveu definições para crimes contra a humanidade,
genocídio e crimes de guerra como parte do direito internacional. Os tribunais de Nuremberg e Tóquio
após a Segunda Guerra Mundial usaram essas definições para processar líderes das potências do Eixo
por crimes de guerra, crimes contra a paz e crimes contra a humanidade cometidos durante o conflito.
Na década de 1990, os Tribunais Criminais Internacionais para a ex-Iugoslávia (ICTY) e Ruanda (ICTR)
julgaram crimes cometidos em prazos específicos durante os conflitos nesses países.
43) Para documentos adicionais relevantes, consulte o Sphere Project Handbook, Anexo 1.
44) A Primeira Convenção de Genebra de 1864 é uma das primeiras formulações do direito internacional. Consulte a Seção 1.2.
45) ONU, “Direito Internacional e Justiça”. Disponível em inglês: <https://www.un.org/en/global-issues/international-law-and-justice>.
46) ONU, Implementando a responsabilidade de proteção, Relatório do Secretário-Geral, A / 63/677, 12 de janeiro de 2009.

27
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

Em 1998, 120 Estados adotaram Estatuto de Roma, a base jurídica para a criação do Tribunal Penal
Internacional (TPI) permanente. O TPI é uma organização internacional independente com sede em
Haia e não faz parte do sistema das Nações Unidas. O TPI ouviu vários casos e alguns continuam em
andamento47.

A Declaração Universal dos Direitos do Homem (UDHR) é um documento considerado um marco


na história dos direitos humanos. Representantes de diferentes origens de nacionalidade, jurídicas e
culturais redigiram a Declaração, e a Assembleia Geral a proclamou em Paris, em 10 de dezembro de
1948, em Declaração funciona como um padrão comum de realização para todos os povos e nações.
Estabelece direitos humanos fundamentais que devem ser protegidos universalmente.

O Direito Internacional Humanitário é um conjunto de regras que visam limitar os efeitos dos
conflitos armados por razões humanitárias. Uma parte importante do Direito Internacional Humanitário
está contida nas quatro Convenções de Genebra de 1949 e nos Protocolos Adicionais de 1977
relativos à proteção das vítimas de conflitos armados. Esses documentos se aplicam apenas a conflitos
armados e não cobre tensões internas48.

“Todos têm direito a todos os direitos


e liberdades estabelecidos nesta
Declaração, sem distinção de espécie,
como raça, cor, sexo, idioma, religião,
opinião política ou outra, origem
nacional ou social, propriedade,
nascimento ou outra condição. Além
disso, nenhuma distinção deve ser
feita com base no status político,
jurisdicional ou internacional do país ou
território ao qual uma pessoa pertence,
seja ele independente, de confiança,
não autônomo ou sob qualquer outra
limitação de soberania.”

-Artigo 2

47) Tribunal Penal Internacional, “Situações sob investigação”. Disponível em inglês: <https://www.icc-cpi.int/pages/situations.aspx>.
48) Serviço de Consultoria do CICV sobre Direito Internacional Humanitário, “O que é o Direito Internacional Humanitário?”, julho de 2004. Disponível em
inglês: <https://www.icrc.org/eng/assets/files/other/what_is_ihl.pdf>.

28
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

Seção 1.5 O ambiente operacional em mudança e suas


consequências
Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, o ambiente de operação das organizações humanitárias
mudou. Os trabalhadores humanitários passaram a enfrentar uma ameaça crescente. Vários motivos
explicam isso:

1. A natureza da guerra é cada vez mais irregular. Novos tipos


de atores não estatais — parte étnicos, parte políticos e parte
criminosos — surgiram e às vezes conduziram a descolonização
que se seguiu à Segunda Guerra Mundial. Sua estrutura
de comando e controle costumava ser fraca, com pouca ou
nenhuma disciplina interna. A falta de respeito por símbolos
reconhecidos internacionalmente tornou-se uma questão cada
vez mais preocupante49.

2. O número de organizações humanitárias aumentou e a


percepção da imparcialidade dos humanitários diminuiu.
Enquanto o movimento da Cruz Vermelha anteriormente
dominava a prestação de serviços humanitários em conflitos
armados, mais organizações — algumas mais humanitárias do
que outras — se juntaram ao campo. Alguns não aderiram aos
princípios humanitários (por exemplo, por estarem voltados
para o lucro), colocando em risco a ação humanitária das
agências que aderiram aos princípios.

3. O papel das organizações humanitárias mudou e a percepção de


sua imparcialidade diminuiu. Algumas organizações foram vistas
como estando muito próximas de atores políticos ou militares,
especialmente durante conflitos (armados). Além disso, algumas
organizações contrataram agências de segurança privada,
algumas das quais inclusive portavam armas.

Recentemente, houve um grande desenvolvimento na forma como os humanitários passaram a


conduzir suas ações. Anteriormente, a maioria dos trabalhadores humanitários tinha pouco ou nenhum
conhecimento sobre “trabalho humanitário” quando entravam em campo. A compaixão ou o espírito
aventureiro os compeliram a prestar essa assistência, e muitos aprenderam a operar durante o trabalho.
Hoje, um número crescente de jovens trabalhadores humanitários tem um alto grau de educação
acadêmica e/ou “humanitária”. Novos recursos (ReliefWeb, sites de projetos, etc.) e ferramentas
(manuais, diretivas, etc.) contribuíram para a profissionalização da ação humanitária e do trabalhador
humanitário. Cada nova crise resultava em uma camada adicional de regulamentações e novas diretrizes
para melhorar o sistema, resultando em um maior grau de competência na área.

49) A Lição 5 aborda questões de segurança e proteção devido ao ambiente em mudança.

29
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

Apesar desses desenvolvimentos positivos, a competição entre as organizações humanitárias por


financiamento e visibilidade continua a ser um assunto preocupante. A proliferação de organizações nas
últimas décadas e a luta por financiamento às vezes incitam o comportamento antiético de alguns atores
locais. De certa forma, a ajuda humanitária se tornou um “grande negócio”. Algumas organizações e
agências enfatizam a visibilidade para garantir o dinheiro dos doadores para o próximo ano financeiro,
salvaguardando assim empregos, poder e interesses pessoais. Elas podem gastar dinheiro com pouca
ou nenhuma responsabilidade ou sem alcançar resultados esperados para a população afetada.
Surgiram críticas à chamada "indústria da ajuda", em geral, por sua falta de eficiência, profissionalismo
e coordenação, o que frequentemente resulta em duplicação de esforços e desperdício de recursos50.

Prestação de contas

À luz dessas questões, a prestação de contas tornou-se importante para muitos doadores, tanto
privados quanto financiados pelo Estado. Surgiram padrões profissionais com foco na qualidade da
ação humanitária. Os doadores começaram a responsabilizar as organizações pelo desempenho do
seu pessoal e vincularam diretamente o dinheiro dos doadores à melhoria do sistema de gestão dessa
organização. Isso levou a uma delegação cada vez maior da sede aos gerentes de campo e funcionários
locais, uma vez que eles poderiam avaliar melhor as maneiras de fornecer ajuda. Os doadores
começaram a exigir relatórios regulares — financeiros e outros — de organizações humanitárias que,
de outra forma, corriam o risco de perder os fundos e/ou se tornarem objeto de investigação de fraude.
Os doadores começaram a pressionar as principais partes interessadas, como governos nacionais e
agências da ONU, para cumprir certas políticas e cursos de ação51. Finalmente, os doadores começaram
a se responsabilizar, visando o maior resultado com o menor custo possível. Assim, selecionar o projeto
ou programa “certo” para garantir a máxima eficiência tornou-se cada vez mais importante para evitar
críticas públicas e internas.

Mas o novo enfoque nos resultados teve efeitos colaterais negativos. Isso levou as organizações a
se reestruturarem em um sistema burocrático de redação de propostas, preenchimento de formulários
e relatórios. Isso forçou os gerentes de campo a gastar mais tempo garantindo a conformidade do que
prestando assistência em campo. Outra desvantagem dessa cultura foi o aumento da aversão ao risco
entre os doadores ao se gastar dinheiro. Os doadores queriam que seu dinheiro gerasse os melhores
resultados e ficaram relutantes em gastar em projetos sem um resultado garantido. O risco é inerente
à resposta humanitária. As crises costumam ser caóticas e imprevisíveis, apesar dos avanços nas
ferramentas e metodologia de avaliação. Eliminar o risco geralmente significa limitar um programa a tal
ponto que acabe impactanto os resultados (por exemplo, reduzindo a área afetada, reduzindo a área de
distribuição ou negligenciando um grupo vulnerável específico). Isso pode desencorajar os gerentes a
buscarem o programa mais eficaz por medo de não receber o financiamento necessário.

Embora as organizações humanitárias tenham progredido nas últimas décadas, os trabalhadores


humanitários devem estar cientes de que a responsabilidade continuará sendo um problema para todas
as partes envolvidas na resposta a um desastre: a organização assistencial beneficiária, os doadores,
o governo afetado e a população afetada. A maneira como as organizações elaboram e fornecem ajuda
terá um impacto no ambiente operacional, seja ele um desastre ou um conflito armado.

50) Humanitarian Practice Network, Intercâmbio Humanitário No. 52, outubro de 2011. Disponível em inglês: <https://reliefweb.int/report/world/
humanitarian-exchange-magazine-no-52-feature-humanitarian-accountability>.
51) Rede de Prática Humanitária, Intercâmbio Humanitário, 45.

30
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

“Um programa de ação tem riscos e custos, mas eles são muito menores
do que os riscos e custos de longo prazo de uma inação confortável.”

- John F. Kennedy, presidente dos EUA, 1961-1963

Seção 1.6 O princípio “Não causar danos52”


Muitas organizações e trabalhadores
humanitários usam a expressão
“não causar danos”, mas o que isso
significa? Qual é a sua ligação com as
operações humanitárias? A estudiosa
de desenvolvimento Mary B. Anderson
descreve as responsabilidades que as
agências assistenciais e os membros
da equipe têm ao fornecer assistência
durante conflitos em seu livro Do No
Harm (Não cause danos53).

Anderson escreve, “a ajuda dada


Os mantenedores da paz sul-africanos servindo na Missão de Estabilização
durante o conflito não pode permanecer
da Organização das Nações Unidas na República Democrática do Congo
separada desse conflito54”. Isso se (MONUSCO) fazem parceria com organizações locais para fornecer
aplica a desastres e à forma como cuidados médicos e nutricionais a crianças órfãs e vulneráveis na província
de Kivu do Norte. 2 de março de 2018. Foto da ONU por Michael Ali.
essa ajuda afeta as consequências do
desastre e a população afetada. Este
é um ponto de partida que as organizações humanitárias e os trabalhadores devem reconhecer, não
importa o quão inocente uma ação ou assistência possa parecer.

Imediatamente após uma crise ou desastre, as organizações e os trabalhadores humanitários muitas


vezes encontram reações irracionais e emocionais. Elas vêm de políticos sob pressão, do aumento da
atenção da mídia para o desastre ou da opinião pública que pressiona as autoridades a “fazerem algo”.
Isso não afeta apenas os líderes políticos, mas também se aplica à indústria de ajuda humanitária e às
organizações ansiosas por fornecer assistência — e aquelas que buscam gerar visibilidade. É impossível
tomar uma decisão precipitada e ao mesmo tempo analisar suas implicações ao máximo, medindo seu
impacto e resultado esperado. Manuais, normas, diretrizes e conhecimento institucional podem ajudar as
agências a saber como reagir a certos tipos de desastres, mas as organizações e os trabalhadores devem
ter cuidado para evitar erros na entrega da ajuda, que geralmente ocorrem devidos à falta de análise.

52) O meio ambiente durante e após um desastre natural compartilha muitos paralelos e semelhanças com os conflitos (armados). O conflito obriga
os trabalhadores auxiliares a aprofundarem seus conhecimentos e capacidade analítica sobre a forma como prestam assistência. Os alunos devem
manter isso em mente ao ler esta seção. Para mais informações sobre este assunto importante, consulte: Mary B. Anderson, Não faça mal: como a
ajuda pode apoiar a paz — ou a guerra (Boulder: Lynne Rienner Publishers, 1999).
53) Anderson, Não faça mal.
54) Anderson, Não faça mal, 36.

31
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

O tempo é essencial para responder a desastres, mas as organizações e os trabalhadores humanitários


devem assegurar a análise da situação antes de tudo. A obtenção de informações em primeira mão sobre
a situação no terreno dependerá da capacidade de cada organização e do sistema da ONU de fornecer
informações em tempo real. Nas caóticas fases iniciais, é importante envolver a população afetada
tanto quanto possível; no entanto, isso pode ser difícil. Em muitos casos, as autoridades nacionais ou
locais podem representar a população afetada, e essas autoridades podem ter suas próprias agendas e
interesses (políticos). Infelizmente, toda crise, desastre ou conflito tem grupos ou indivíduos que buscam
se beneficiar e lucrar com a ajuda recebida. Isso é especialmente verdadeiro se as autoridades forem
incapazes de ou não quiserem controlar esses grupos e organizações com fins lucrativos.

Organizações e trabalhadores humanitários devem esclarecer algumas questões essenciais:

• Como a ajuda será distribuída e por quê?

• Quem distribuirá a ajuda e por quê?

• Quem receberá a ajuda e por quê?

• Em que consistirá a ajuda e por quê?

• De onde será distribuída e por quê?

Outra pergunta a ser respondida é como isso afetará os diferentes grupos (vulneráveis) dentro de
uma comunidade afetada. Por exemplo, se nos concentrarmos apenas nas pessoas deslocadas que vivem
em abrigos temporários e não considerarmos aqueles que podem ter buscado refúgio com familiares
ou parentes, criaremos tensões entre esses dois grupos? Organizações e trabalhadores humanitários
podem ajudar as minorias presumindo que são as mais vulneráveis, ignorando o sofrimento dos outros.
O interesse político e a pressão sobre a concessão ou não de ajuda são fatores a que as organizações
e os trabalhadores podem ter que aprender a resistir. Isso pode ser explorado, no entanto, já que
as autoridades podem não querer distribuir ajuda se a população afetada pertencer a uma oposição
política ou a um grupo minoritário.

Outro exemplo de como a ajuda pode realmente prejudicar uma população é o chamado “dinheiro
por trabalho” (do inglês, "cash for work", ou CFW), especialmente se o programa não foi totalmente
analisado e considerado. O CFW é frequentemente usado para grandes projetos de obras públicas ou
comunitárias (por exemplo, limpeza de entulho após um desastre). Ele fornece às famílias uma renda
que elas podem gastar livremente; no entanto, os projetos devem considerar o calendário sazonal
existente para investigar se a atividade CFW pode entrar em conflito com outros compromissos de
trabalho familiar, como agricultura (por exemplo, plantio, colheita) ou migração sazonal (por exemplo,
ajudar os agricultores e proprietários de terras no trabalho sazonal). Deixar de fazer isso pode atrapalhar
as estratégias de sobrevivência e recuperação dos meios de subsistência das pessoas, geralmente
devido à escassez de alimentos durante a próxima temporada55.

O fornecimento de alimentos, em particular, requer uma análise detalhada. A ação atrapalhará


o mercado local ao afetar os preços? Como isso afetará todo o sistema comercial, do agricultor ao
comerciante do mercado? Seria melhor fornecer dinheiro em vez de alimentos para apoiar os mercados
locais se houver comida suficiente disponível localmente? Quais são as consequências de curto e longo
prazo? Oferecer ajuda é um esforço mais complexo do que pode parecer superficialmente.

55) Sarah Bailey e Paul Harvey, “Programação de transferência de renda em emergências”, junho de 2011, Rede de Prática Humanitária. Disponível em
inglês: <http://odihpn.org/resources/cash-transfer-programming-in-emergencies/>.

32
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

A entrega de itens de ajuda humanitária durante o conflito também pode trazer consequências
indesejadas. Os chefes militares locais e as partes em um conflito podem tê-la como alvo. O roubo
desses itens é comum, inclusive em postos de controle (por exemplo, agências humanitárias que pagam
para acessar a área) e em depósitos durante a noite. Outras vezes, esse material é simplesmente
roubado da população local como um “imposto” ou taxa de proteção. Esses recursos roubados podem
ser vendidos e os lucros usados para comprar armas. Dessa forma, a ajuda pode perpetuar um conflito.

Compreender o contexto de um conflito não é fácil. Examinar todas as partes interessadas e atores
pode ajudar a fornecer uma compreensão do contexto. Quem ganha e quem perde? Quem tem o poder?
Como os diferentes atores se relacionam entre si? As facções em conflito não verão a ajuda e sua
entrega como totalmente neutras. As agências assistenciais devem identificar estratégias sobre como
impedir o roubo em seus programas de ajuda. O que funciona em uma área pode não ser eficaz em
outra. Não existe uma solução única.

Existem muitos outros exemplos de como a entrega de itens de ajuda humanitária pode afetar
negativamente o meio ambiente e sua população. As intenções das agências de ajuda humanitária e dos
trabalhadores podem ser nobres, com a humanidade subjacente aos seus princípios básicos. No entanto,
sempre que organizações e trabalhadores fornecem ajuda, eles devem garantir que suas ações não criem
um ambiente insustentável, desestabilizem a população afetada ou criem uma relação de dependência.

Seção 1.7 Conscientização cultural


As organizações e trabalhadores humanitários também devem estar cientes de outra questão
significativa: os aspectos culturais da comunidade e do meio ambiente afetado. As pessoas podem
olhar suas ações por meio de seu próprio padrão de referência, sem considerar outro ponto de vista.
Organizações e trabalhadores humanitários devem estar cientes de que ações que são aceitáveis em
sua sociedade podem ser inaceitáveis em outra. O primeiro contato com uma população afetada e suas
autoridades pode ser um fator decisivo na relação entre as organizações humanitárias e a população.
Consequentemente, os trabalhadores humanitários devem garantir que se comportem de uma maneira
culturalmente aceitável.

Como organizações e trabalhadores humanitários podem gerenciar diferenças culturais? Em seu


livro Les Identités meurtrières, Amin Maalouf descreve a cultura como a soma de duas heranças: uma
vertical, originária de nossos ancestrais (tradição, povo, comunidade, língua materna, religião, etc.)
e outra horizontal, baseada em nosso contexto pessoal (trabalho, moradia, relações, classe social,
educação, formação acadêmica, experiência, etc.56). Temos a tendência de categorizar as pessoas por
meio de ideias pré-concebidas, levando a falsas percepções sobre o “outro”. Se estivermos cientes de
nossas diferenças culturais, podemos compreender melhor um contexto social.

Existem 10 diferenças que os trabalhadores humanitários devem considerar ao analisar diferenças


culturais57:

• Relacionamento com autoridade: quão distantes estão o poder e a autoridade em relação


às pessoas afetadas?

56) Amin Maalouf, Les Identités meurtrières (Paris: Editions Grasset, 1998), 137.
57) Deborah Mancini-Griffoli e André Picot, Negociação Humanitária: Um Manual para Garantir o Acesso, Assistência e Proteção para Civis em Conflitos
Armados, outubro de 2004. Disponível em inglês: <https://www.alnap.org/help-library/humanitarian-negotiation-a-handbook-for-securing-access-
assistance-and-protection-for>.

33
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

A Operação Híbrida da União Africana e


das Nações Unidas no Darfur (MINUAD)
sedia um evento cultural e esportivo em El
Sereif, Darfur do Norte, como parte de sua
campanha “Precisamos de Paz Agora”. 20
de maio de 2014. Foto da ONU por Albert
Gonzalez Farran.

• Relações Homem-Mulher: Quais são os papéis de gênero e quem decide?

• Individualismo e coletivismo: a comunidade é mais coletiva ou individualmente orientada?

• Tolerância à ambiguidade: tudo precisa estar claro desde o início da ação?

• Respeito às regras: precisamos cumpri-las ou as zonas cinzentas são toleradas?

• Tempo: como é percebida a noção de tempo?

• Espaço e lugar: é público ou privado? É acessível a ambos os sexos?

• Comunicação verbal e não verbal: o que pode ser dito? O que deve permanecer não dito?

• Argumento de vendas: Quão fervoroso eu preciso ser como um “vendedor”?

• Negociação: quem define o preço primeiro, vendedor ou comprador (lance)?

Respeitar o código cultural de cortesia costuma ser complicado. O que é aceito em uma cultura
pode ser indelicado em outra. Existem muitas anedotas e melhores práticas do que "fazer e não fazer",
mas os trabalhadores humanitários não devem ter medo de pedir orientação aos funcionários locais
de sua organização. Aparência e comportamento também fazem parte da cultura, e os trabalhadores
humanitários podem não estar imediatamente cientes de alguns destes problemas:

• Estilo de cabelo, decoração corporal e maneira de vestir (algumas cores podem expressar uma
tendência social ou política);

• Usar óculos escuros, piercings ou tatuagens;

• O consumo de álcool com um anfitrião antes de uma reunião; e

• Expressões públicas de raiva e irritação, arrogância e provocação.

Os trabalhadores humanitários muitas vezes questionam até que ponto devem se adaptar às normas
culturais vigentes. Por um lado, imitar a cultura de uma contraparte pode ser visto como um sinal de
respeito; por outro, pode parecer um sinal de tolice58. Os anfitriões locais provavelmente saberão que os
praticantes são diferentes, mas eles oferecerão acomodações de acordo com sua cultura de hospitalidade.
O melhor conselho para os trabalhadores humanitários é ser ele mesmo e usar o bom senso.

58) Mancini-Griffoli e Picot, Negociação Humanitária.

34
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

Questionário de fim de Lição  »

1. O Ministério da Defesa do Reino 4. Os desastres naturais são eventos


Unido define _____ como “a resposta causados por _____.
organizada a aliviar os resultados de
A. erro humano
uma catástrofe. Os objetivos são: salvar
vidas; aliviar Sofrimento; limitar os B. emergências complexas
danos; restaurar serviços essenciais a C. desastres tecnológicos ou provocados pelo
um nível que permita autoridades locais homem sem aspecto natural
para lidar com isso; e defina o condições D. perigos naturais que afetam seriamente a
de recuperação”.
sociedade, economia e/ou infraestrutura de
A. socorro em desastres uma região
B. diferença cultural
C. o princípio “não causar danos” 5. De acordo com o Manual de Campo UN-
CMCoord, uma emergência complexa é
D. uma emergência complexa
uma crise humana em um país, região
ou sociedade onde há uma quebra total
2. Todas as frases a seguir são verdadeiras,
ou considerável de autoridade resultante
EXCETO _____.
de _____ e que requer uma resposta
A. Henry Dunant é o “pai” da ação e das internacional que vai além do mandato
organizações humanitárias modernas ou capacidade de um programa único e/
B. Woodrow Wilson sugeriu a criação de uma
ou em andamento na ONU.

associação de nações em seus Quatorze Pontos A. uma guerra civil

C. a Liga das Nações tinha suas próprias B. um conflito interno ou externo


forças armadas C. uma inquietação interna
D. as potências aliadas concordaram em criar D. movimentos populacionais massivos
um novo órgão para suplantar o papel da Liga
das Nações durante a Conferência de Yalta 6. Quais são os quatro princípios
humanitários?
3. Quais são as cinco variáveis que podem A. Humanidade, neutralidade, soberania,
transformar um fenômeno em desastre? imparcialidade
A. População, riqueza, redução do risco de B. Humanidade, neutralidade, imparcialidade,
desastres, controle de doenças, edifícios altos independência
B. Demografia, pobreza, meio ambiente, C. Humanidade, soberania, imparcialidade,
mecanismos existentes na prevenção e independência
gestão de riscos, nível de infraestrutura e D. Humanidade, neutralidade, imparcialidade,
organizações existentes responsabilidade
C. Crescimento populacional, mão de obra,
serviço de coleta de lixo, serviços de
emergência, nível de infraestrutura e
organizações existentes
D. Controle de natalidade adequado,
alimentação e nutrição, plano de gestão de
resíduos, mecanismo existente na prevenção
de riscos, pobreza

As respostas estão disponíveis na página seguinte.

35
LIÇÃO 1 | Intervenção humanitária

Questionário de fim de Lição  »

7. De acordo com o Relatório do 9. Qual das alternativas a seguir é


Secretário-Geral, “Implementando VERDADEIRA em relação à entrega
a responsabilidade de proteger”, a de itens de ajuda humanitária durante
responsabilidade de um Estado é proteger o conflito?
sua própria população de _____.
A. Roubos podem ser algo comum.
A. genocídios B. Os chefes militares locais e/ou partes em um
B. crimes de guerra conflito podem tê-la como alvo.
C. limpeza étnica e crimes contra a humanidade C. Esses itens podem ser cobrados da
D. assassinato, crimes de guerra, emigração população local como uma forma de
forçada e deslocamento interno odas as “imposto” ou taxa de proteção.
opções anteriores D. Todas as opções anteriores

8. Qual das alternativas a seguir NÃO 10. Nossa cultura é a soma de duas
foi um benefício do aumento da heranças: _____.
responsabilidade do HRO?
A. tradição e educação
A. Isso muitas vezes levou as organizações a se
B. uma vertical, originária de nossos ancestrais,
reestruturarem em um sistema burocrático
e uma horizontal, com base em nosso
de redação de propostas, preenchimento de
contexto pessoal
formulários e relatórios.
C. diferença cultural e adaptabilidade cultural
B. Isso aumentou a capacidade de entregar
D. relacionamentos e tolerância
ajuda em campo.
C. Isso diminuiu os níveis de fraude.
D. Isso aumentou a delegação da sede para
gerentes de campo e funcionários locais,
uma vez que eles poderiam avaliar melhor
as maneiras de fornecer ajuda.

Respostas »
1. A

2. C

3. B

4. D

5. B

6. B

7. D

8. A

9. D

10. B

36
OPERAÇÕES HUMANITÁRIAS

LIÇÃO
Atores em operações de ajuda
2 humanitária e seus mandatos

Esta lição descreve


os diferentes tipos
de organizações que
podem estar presentes
nas operações de ajuda
humanitária e como
elas tuam.

© Foto do CICV, Benjamin Mast.

Nesta lição »
The Role of the United Nations in Global Peace and Secu
Objetivos da lição »

Seção 2.1 Tipos de organizações - O que • Compreenda e diferencie os diferentes tipos de


são ONGs, IGOs e GOs? organizações.

Seção 2.2 Panorama histórico e político • Relembre e explique as principais diferenças entre

Seção 2.3 Movimento Internacional da esses tipos de organizações.


Cruz Vermelha e do Crescente
• Compreenda e liste as principais organizações
Vermelho
citadas e o que elas representam.
Seção 2.4 Gabinete de Coordenação dos
Assuntos Humanitários

Seção 2.5 Comitê Permanente


Interagências

Seção 2.6 Agências da ONU - Uma breve


descrição

Seção 2.7 “Super” ONGs

Seção 2.8 Consórcios de ONGs e o Banco


Mundial

INSTITUTO DE TREINAMENTO EM OPERAÇÕES DE PAZ

37
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

Bazar na seção laosiana do campo de refugiados de Aranyaprathet, na Tailândia. 1º de janeiro de 1978. Foto da ONU por Saw Lwin.

Introdução

Esta lição fornece aos alunos uma visão geral dos


diferentes atores e tipos de organizações envolvidas
em operações de ajuda humanitária. É difícil descrever
todos os atores envolvidos numa operação de ajuda
humanitária. Esta lição enfoca os que são mais relevantes
para este curso e serve como uma introdução sobre
esses atores e organizações. A Lição 4 fornecerá mais Veja um vídeo introdutório desta
lição em inglês: <https://www.
detalhes sobre eles, com exceção do Movimento da Cruz
peaceopstraining.org/videos/491/
Vermelha, e descreverá detalhadamente seus mandatos hro-lesson-2-actors-humanitarian-

e envolvimento numa estrutura geral de coordenação relief-operations-and-their-


mandates/> .
durante desastres.

38
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

Seção 2.1 Tipos de organizações — O que são ONGs, IGOs e GOs?


As ONGs frequentemente fornecem ajuda durante uma crise (humanitária), mas o que são ONGs?
Existem diferentes tipos de ONGs? Como elas se distinguem? Numa revisão da literatura, podem ser
encontradas muitas definições para Organizações Não Governamentais (ONGs):

» “... qualquer grupo sem fins lucrativos de cidadãos voluntários


organizados a nível local, nacional ou internacional1”.

» “... uma organização que tenta para alcançar social ou política mira
mas não é controlada por um governo2”.

» “Setor privado, voluntário (e geralmente sem fins lucrativos e não


sectária) organização que contribui para, ou participa de, cooperação,
projetos, educação., Treinamento ou outra organização humanitária,
progressivo, ou cão de guarda Atividades. Algumas delas são
credenciados da ONU e algumas arrecadam doações para distribuição
e pessoas desfavorecidas ou em dificuldades. As principais no mundo
todo ONGs incluem Associação Internacional de Transporte Aéreo,
Câmara de Comércio Internacional, Transparência International,
Consórcio World Wide Web (W3) e World Wildlife Fund3”.

» “… Grupo voluntário de indivíduos ou organizações, geralmente


não filiados a nenhum governo, formado para fornecer serviços
ou defender uma política pública. Embora algumas ONGs
sejam corporações com fins lucrativos, a grande maioria são
organizações sem fins lucrativos. Algumas ONGs, especialmente
aquelas localizadas em países autoritários, podem ser criadas
ou controladas por governos. Segundo a maioria das definições,
partidos políticos e organizações criminosas ou violentas de guerrilha
não são considerados ONGs. As questões abordadas pelas ONGs
abrangem uma gama de questões humanas (por exemplo, direitos
humanos, proteção ambiental, socorro em desastres e assistência
ao desenvolvimento), e o escopo de suas atividades pode ser local,
nacional ou internacional4”.

Embora essas definições sejam diferentes, elas possuem alguns pontos em comum. Cada uma delas
descreve as ONGs como organizações privadas, independentes de qualquer governo e, geralmente,
sem fins lucrativos. A próxima seção analisará esses aspectos mais a fundo, descreverá sua tipologia e
mostrará se a definição ainda se aplica. Este curso se baseia na definição fornecida pela OCHA,
embora seja um pouco restritiva.

1) Sociedade Civil das Nações Unidas, “Sociedade Civil”. Disponível em inglês: <https://www.un.org/en/civil-society/page/about-us>.
2) Dicionário Cambridge, “ONG”. Disponível em inglês: <http://dictionary.cambridge.org/dictionary/english/ngo>.
3) Dicionário de Negócios, “Organização não governamental (ONG)”.
4) Margaret P. Karns, “Organização não governamental (ONG)”. Disponível em inglês: <https://www.britannica.com/topic/nongovernmental-
organization#ref799729>.

39
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

» “Organização Não Governamental (ONG): entidade organizada que


é funcionalmente independente de um governo ou Estado e não o
representa. Essa definição é normalmente aplicada a organizações
dedicadas a causas humanitárias e de direitos humanos, algumas das
quais têm status consultivo oficial nas Nações Unidas5”.

A ideia do que é uma ONG não está claramente definida na prática internacional ou no debate
acadêmico6. O termo geralmente se refere a organizações estabelecidas pela iniciativa privada,
formalmente livres de qualquer influência governamental e com o objetivo principal de não obter fins
lucrativos. A resolução 1996/31 do Conselho Econômico e Social (do inglês, Economic and Social Council
— ECOSOC) oferece uma definição mais completa7.

Também há uma distinção entre ONGs operacionais internacionais e ONGs nacionais e locais:

» ONGs nacionais — “… aquelas que operam no país em


desenvolvimento onde estão sediadas, trabalham em várias regiões
subnacionais e não são filiadas a uma ONG internacional8”.

» ONGs locais — “aquelas que operam em uma área subnacional


específica, geograficamente definida, sem afiliação a uma ONG
nacional ou internacional; este agrupamento também pode incluir
organizações com base na comunidade9”.

Outro tipo de organização ativa em operações de ajuda humanitária é a organização internacional


(OI), mais conhecida como organização intergovernamental (OIG).

Um participante da 67ª Conferência do


Departamento de Informação Pública (do
inglês, Department of Public Information
[DPI])/Organização Não Governamental
(ONG) das Nações Unidas usa camisa com
dizer que promove o tema daquele ano: “Nós,
os povos ... juntos encontrando soluções
globais para problemas globais”. 22 de agosto
de 2018. Foto da ONU por Loey Felipe.

5) ReliefWeb, “Glossário de Termos Humanitários”, agosto de 2008, 37. Disponível em inglês: <http://reliefweb.int/sites/reliefweb.int/files/resources/4
F99A3C28EC37D0EC12574A4002E89B4-reliefweb_aug2008.pdf>.
6) Emanuele Rebasti e Luisa Vierucci, “Um Estatuto Jurídico para as ONGs no Direito Internacional Contemporâneo?”. Disponível em inglês: <https://
esil-sedi.eu/wp-content/uploads/2018/04/VierucciRebasti-1.pdf>.
7) ECOSOC, Res. 1996/31, UN Doc. E/1996/L.25. Adotado na 49ª reunião plenária do Conselho em 25 de Julho de 1996. Disponível em inglês: <https://
www.unov.org/documents/NGO/NGO_Resolution_1996_31.pdf >.
8) Assistência Humanitária Global, Relatório de Assistência Humanitária Global 2015. Disponível em inglês: <http://devinit.org/wp-content/
uploads/2015/06/GHA-Report-2015_-Interactive_Online-1.pdf>.
9) Assistência Humanitária Global, Relatório de Assistência Humanitária Global 2015.

40
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

O define União de Associações Internacionais IGOs como10:

• Basear-se em instrumento formal de acordo entre os governos dos Estados-nação;

• Incluir três ou mais Estados-nação como partes do acordo11; e

• Possuir um secretariado permanente executando tarefas contínuas.

O ECOSOC discutiu as IGOs na resolução 288 (X) de 27 de fevereiro de 1950: “Qualquer organização
internacional que não seja estabelecida por um acordo intergovernamental será considerada uma
Organização Não Governamental para os fins desses acordos.”

De acordo com o estudioso de direitos humanos Gabor Rona, IGOs podem variar em tamanho
de três a mais de 190 membros, e sua representação geográfica pode ser universal em escopo (por
exemplo, as Nações Unidas, Organização Internacional para Migração, Fundo Monetário Internacional)
ou regional (por exemplo, Organização dos Estados Americanos, União Africana, Organização para
a Segurança e Cooperação na Europa). Enquanto algumas IGOs visam a atingir um único propósito
(por exemplo, a Organização Mundial da Propriedade Intelectual), outras realizam várias tarefas (por
exemplo, a OTAN). Suas estruturas organizacionais variam e podem variar de simples a altamente
complexas, dependendo de seu tamanho e suas tarefas12. Ao contrário das ONGs, por definição, as IGOs
têm um mandato de governos e desfrutam de certas facilidades de trabalho conhecidas na terminologia
diplomática como “privilégios e imunidades”. O tratado que institui a IGO determinará sua finalidade,
bem como os direitos e deveres de seus membros13.

Este curso usará a definição simplificada de IGO, adaptada pelo Escritório do Alto Comissariado das
Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR):

“Uma organização formada por Estados membros com base em um acordo


intergovernamental. Os exemplos incluem a Organização das Nações Unidas
(ONU), ... a Organização dos Estados Americanos (OEA), a União Europeia (UE) e a
Comunidade de Estados Independentes (CEI) 14.”

Agências federais e outras organizações governamentais com foco humanitário

Cada Estado tem a responsabilidade de fornecer proteção e assistência vital à população afetada
por uma crise. A maioria dos países desenvolveu capacidades de Defesa Civil e/ou Proteção, geralmente
na forma de uma Agência Federal como a Technisches Hilfswerk (THW)15, da Alemanha, ou a Agência
Sueca de Contingências Civis (MSB) 16. Nacionalmente, eles operam num amplo espectro de assistência,
oferecendo desde serviço de ambulância a operações de resgate complexas e perigosas, e podem até
10) União de Associações Internacionais, “Tipos de Organizações Internacional”. Disponível em inglês: <http://www.uia.org/archive/types-organization/cc>.
11) Cientistas políticos J. David Singer e Michael Wallace questionaram essa definição convencional. Em particular, eles argumentam que: “pode-se
objetar, é claro, que as organizações bilaterais não deveriam ser incluídas porque não são "realmente" IGOs, como geralmente as concebemos",
porque resultam de uma forma "contratual", e não de tratados "legislativos". Há dois pontos a serem colocados aqui: um, essa objeção é atendida na
medida em que meros tratados ou pactos são excluídos por outros critérios. Exigimos apenas que o caráter bilateral de uma organização não pode,
por si só, ser motivo de exclusão. Além disso, tal exclusão não apenas deixaria de fora organizações importantes como o Comando de Defesa Aérea
da América do Norte (do inglês, North American Air Defense Command — NORAD), mas também nos forçaria a excluir organizações multilaterais,
como a Comissão do Reno, quando as circunstâncias históricas reduzissem temporariamente o número de membros para dois. ” Veja: J. David Singer
e Michael Wallace, “Organização Internacional no Sistema Global, 1815-1964: Uma Descrição Quantitativa”. Organização Internacional, vol. 24, No.
2, Spring 1970, 239-287.
12) Karen Mingst, “Organização internacional” da Encyclopaedia Britannica. Disponível em inglês: <https://www.britannica.com/topic/international-organization>.
13) Gabor Rona, “O status do CICV: uma classe própria”, 17 de fevereiro de 2004.
14) ReliefWeb, “Glossário de termos humanitários”, 32.
15) Bundesanstalt Technisches Hilfswerk, “Página inicial”. Disponível em inglês: <https://www.thw.de/EN/Homepage/homepage_node.html>.
16) Agência Sueca de Contingências Civis, “Áreas Legislativas”. Disponível em inglês: <https://www.msb.se/en/About-MSB/Legislative-areas/>.

41
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

operar durante desastres naturais ou provocados pelo homem. Algumas dessas agências têm mandatos
de seus governos para operar no exterior no contexto da ajuda internacional em desastres. Um exemplo
comum disso são as equipes de busca e salvamento em meio urbano (do inglês, urban search and
rescue — USAR) implantadas durante os terremotos.

Cada agência tem um escopo diferente de atividades, geralmente relacionadas aos tipos de desastres
encontrados em seus países. Muitas dessas agências trabalham com um grande número de voluntários,
e esses voluntários podem receber um status especial (por exemplo, os voluntários do THW têm um
tipo especial de status de “funcionário público” com um regulamento financeiro específico17). Sempre
que um funcionário participa de um treinamento ou serve em uma missão:

“... os empregadores do setor privado podem apresentar um pedido de reembolso


por todo o período de pagamento contínuo da remuneração, incluindo as suas
contribuições para o sistema de segurança social e regime de pensões. Mediante
solicitação, os empregadores também devem ser reembolsados por qualquer
remuneração que continuem a pagar aos funcionários de acordo com as disposições
legais durante os períodos de incapacidade para o trabalho como resultado de
doença, desde que tal incapacidade para o trabalho seja atribuível ao serviço com a
Agência Federal Alemã de Assistência Técnica (THW) 18.”

Além das agências federais, organizações e


estruturas governamentais específicas também
contribuem para as operações de socorro. Por
exemplo, a Equipe Belga de Primeiros Socorros
e Apoio (do inglês, Belgian First Aid and Support
Team — B-FAST), criada pelo Decreto Real, opera
com o objetivo de fornecer assistência internacional
de socorro apenas durante desastres19. Esta
“estrutura de ajuda" é composta por pessoal
treinado e módulos de intervenção pré-estabelecidos As agências humanitárias no Sudão do Sul realizaram
um evento e apelaram para uma ajuda humanitária de
provenientes de diferentes serviços públicos federais
US$ 1,72 bilhão durante o Lançamento da Resposta
(ministérios), como Interior (bombeiros e proteção Humanitária de 2018. Na foto: Hussein Maar Nyuot,
civil), Saúde (hospitais) e Defesa (transporte aéreo Ministro de Assuntos Humanitários e da Gestão de
Desastres da República do Sudão do Sul. Foto da ONU
e comunicações) sob a custódia das Relações
por Isaac Billy.
Exteriores, que é a autoridade líder que possui um
orçamento específico para treinamento, operações
e investimentos.

A maioria dessas agências ou estruturas governamentais/federais precisa de aprovação


governamental para implantação e, portanto, não cumpre totalmente os princípios humanitários.

17) Lei sobre a Agência Federal Alemã de Assistência Técnica (THW-Gesetz), alterada em 29 de julho de 2009 (Diário da Lei Federal BGBl. I p. 2350).
18) Lei sobre a Agência Federal Alemã de Assistência Técnica (THW-Gesetz).
19) FPS Foreign Affairs, Comércio Exterior e Cooperação para o Desenvolvimento, Negócios Estrangeiros e B-Fast”. Disponível em inglês: <http://b-fast.
be/en/content/fps-foreign-affairs-foreign-trade-and-development-cooperation>.

42
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

Organizações regionais — o grupo europeu de voluntariado

A UE criou o Mecanismo de Proteção Civil para promover a cooperação entre as autoridades


nacionais de proteção civil em toda a Europa, evitar a duplicação dos esforços de ajuda e garantir que
a assistência vá ao encontro das necessidades reais das regiões afetadas. O Mecanismo faz parte da
Direção-Geral de Ajuda Humanitária e Proteção Civil (do inglês, Directorate-General for European Civil
Protection and Humanitarian Aid Operations — DG ECHO) e apresenta o Centro de Coordenação de
Resposta a Emergências (CCRE) como um centro operacional para monitorar emergências em todo o
mundo e coordenar as respostas dos países participantes em caso de desastre. O Capacidade Europeia
de Resposta a Emergências (CERE) consiste em um grupo voluntário de recursos pré-comprometidos
de países que participam do Mecanismo de Proteção Civil da UE para uso em resposta a emergências20.
Esses recursos consistem em módulos pré-estabelecidos21. Até agora, a maioria dos países comprometeu
suas capacidades de resposta já dentro do CERE como parte do grupo voluntário22.

Os países participantes no CERE podem se beneficiar do apoio financeiro da UE para atualizar suas
capacidades de resposta nacional, pagar pelos custos de certificação e treinamento e cobrir até 85%
dos custos relacionados com o transporte de equipes e ativos para uma área de desastre.

O Consenso Europeu de Ajuda Humanitária foi assinado em dezembro de 2007. É o quadro central
que orienta a política de ajuda humanitária da UE, fornecendo uma visão, princípios e uma abordagem
prática comuns. Assegura que as ações desenvolvidas pela DG ECHO respeitem os princípios humanitários
e preste ajuda a quem mais necessita23.

Seção 2.2 Antecedentes históricos e política


De acordo com Abby Stoddard, do Centro de Cooperação Internacional da Universidade de Nova
York, existem três principais vertentes históricas das quais as “super” ONGs evoluíram24:

• Religiosos ou “com base na fé” (o tipo mais antigo);

• o “Dunantista” (batizado em homenagem ao fundador do CICV, Henry Dunant); e

• os “wilsonianos” (em homenagem ao ex-presidente dos Estados Unidos Woodrow Wilson) 25.

As agências religiosas maiores e mais respeitáveis (por exemplo, Catholic Relief Services, World
Vision, Islamic Relief USA, etc.) não fazem proselitismo de forma direta. Elas prestam ajuda baseadas
nos princípios do serviço e da caridade. Sua fé pode influenciar as decisões sobre onde e com quem
trabalhar (por exemplo, realizar parcerias com organizações locais seculares e religiosas), mas sempre
dentro dos valores humanos universais.

20) Operações europeias de proteção civil e ajuda humanitária, “Mecanismo de proteção civil da UE”. Disponível em inglês: <http://ec.europa.eu/echo/
what/civil-protection/mechanism_en>.
21) Para mais informações sobre estes módulos, consulte o “Mapa Diário da DG ECHO”. Disponível em inglês: <https://ec.europa.eu/echo/what/civil-
protection/european-civil-protection-pool_en>.
22) Muitas unidades de resposta já estão registradas; isso inclui equipes de “busca e resgate urbano”, capacidade de evacuação aérea médica especializada,
equipamento de purificação de água, unidades de bombeamento de alta capacidade e equipes de combate a incêndios florestais. Outras capacidades
dos Estados-Membros (contenção de enchentes, laboratórios para emergências ambientais, poluição marinha, entre outras) estão em processo de
registro. Disponível em inglês: <https://civil-protection-humanitarian-aid.ec.europa.eu/what/humanitarian-aid/european-humanitarian-response-
capacity-ehrc_en>.
23) Comissão Europeia, “Consenso Europeu de Ajuda Humanitária”. Disponível em inglês: <http://ec.europa.eu/echo/who/humanitarian-aid-and-civil-
protection/european-consensus_en>.
24) Abby Stoddard, “Humanitarian NGOs: Challenges and Trends”, em Joanna Macrae e Adele Harmer eds., Humanitarian Action and the 'Global War on
Terror': A Review of Trends and Issues, Relatório HPG 14, Londres, Reino Unido, ODI, 2003.
25) Para obter informações adicionais sobre Dunant e Wilson, consulte a Lição 1.

43
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

As agências Dunantistas seguem as idéias e abordagens de Henry Dunant, que ajudou a codificar
os princípios humanitários fundamentais. A Save the Children UK surgiu no final da Primeira Guerra
Mundial para ajudar os órfãos de guerra e proteger os direitos das crianças afetadas pela guerra. Apesar
da legislação no Reino Unido que proíbe a ajuda aos países sob ocupação durante a Segunda Guerra
Mundial, a Oxfam International enviou alimentos para a Grécia ocupada pelos nazistas.

A maioria das ONGs americanas pertence à tradição Wilsoniana e projeta os valores e a influência dos
EUA de acordo com as ambições de Wilson. Elas vêem compatibilidades básicas entre objetivos humanitários
e a política externa dos EUA. As ONGs wilsonianas costumam ter um vínculo estreito com o governo dos
Estados Unidos, e seus funcionários costumam se deslocar entre as instituições do Estado e as ONGs.

Embora as organizações possam pertencer a um dos três grupos tradicionais/históricos descritos, elas
podem ter opiniões diferentes sobre algumas questões. As agências podem ter entendimentos diferentes
de certos princípios humanitários — especialmente durante o conflito. Por exemplo, a abordagem
“classicista” do CICV é muito diferente da posição “solidária” da Médicos Sem Fronteiras (MSF) em
relação ao valor da defesa pública e da ação política, embora ambas tenham raízes na mesma tradição
dunantista. Os classicistas acreditam que a ação humanitária pode e deve ser completamente isolada da
política, enquanto os solidaristas acreditam no uso da ação humanitária como parte de uma estratégia
abrangente. Os solidaristas tentam transformar o conflito defendendo políticas públicas controversas e
tomam o lado de vítimas selecionadas. Se necessário, estão dispostos a distorcer o equilíbrio da alocação
de recursos e “substituir” a soberania. Isso explica por que, durante a fome em Biafra no final dos anos
1960, o Dr. Bernard Kouchner deixou o CICV depois que as autoridades nigerianas negaram o acesso à
área afetada e a organização manteve sua adesão estrita aos princípios de neutralidade e imparcialidade.
Ele decidiu criar com outros integrantes uma nova organização médica — a MSF — em 1971 para acessar
as populações necessitadas e testemunhar abertamente ao público e à mídia o que viram.

Stoddard também descreve outras diferenças entre as ONGs. Um exemplo é a diferença básica entre
o estigma de “humanitarismo desobediente” da MSF e o de “humanitarismo de Estado” wilsoniano da
maioria das ONGs americanas. Outra diferença envolve o financiamento e as relações entre ONGs e
governos (doadores). Muitas das principais ONGs dos EUA dependem do apoio do governo dos EUA para
grande parte de seus fundos. A maioria das ONGs dunantistas tem uma política clara sobre o assunto e só
aceita uma porcentagem do financiamento público e recusa o financiamento de governos que participem
de um conflito que possa comprometer a neutralidade da ONG. As técnicas de arrecadação de fundos
também refletem as diferenças entre a MSF e outras ONGs europeias, por um lado, e as ONGs dos
Estados Unidos, por outro. O primeiro grupo possui um sistema de financiamento privado com mala
direta e doações por cartão de crédito como fonte confiável de financiamento independente sempre que
há um recurso relacionado a uma crise internacional específica. Este não é tanto o caso da população dos
Estados Unidos, onde as doações de caridade tendem a se concentrar mais em questões internas26.

As ONGs humanitárias têm que servir a interesses diferentes, o que pode criar tensões e desafios
potenciais (muitas vezes em uma base moral) na execução de seus programas27. Esses interesses incluem:

• As necessidades e interesses dos beneficiários (ou seja, pessoas necessitadas);

• Os desejos dos doadores; e

• O interesse da organização em sobreviver e crescer.


26) Stoddard, “ONGs Humanitárias: Desafios e Tendências”.
27) Stoddard, “ONGs Humanitárias: Desafios e Tendências”.

44
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

Esses três conjuntos de interesses frequentemente competem entre si, e encontrar um equilíbrio
adequado às vezes é mais fácil na teoria do que na prática.

Seção 2.3 Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do


Crescente Vermelho
Enquanto a Lição 1 apresentou a história e a fundação do Movimento Internacional da Cruz
Vermelha, esta lição examina essa organização específica com mais detalhes. O CICV é uma ONG ou
uma OIG? Para muitos, a resposta pode não ser clara. Na verdade, não é nem um nem outro, mas
alguns argumentam que está mais próxima de uma IGO. Gabor Rona, ex-diretor jurídico internacional
da Human Rights First, apresenta uma visão geral do CICV e sugere que ele possui “uma classe própria”.
Rona diz que o CICV tem uma “natureza híbrida”:

“Como uma associação privada formada sob o Código Civil Suíço, sua existência
não é por si só ordenada pelos governos. No entanto, suas funções e atividades
— fornecer proteção e assistência às vítimas de conflito — são ordenadas pela
comunidade internacional de Estados e fundamentadas no direito internacional,
especificamente nas Convenções de Genebra, que estão entre os tratados mais
amplamente ratificados no mundo28”.

Como qualquer IGO, o CICV é reconhecido


como tendo uma “personalidade jurídica
internacional” ou status próprio. “Goza
de instalações de trabalho (privilégios e
imunidades) comparáveis às das Nações
Unidas, suas agências e outras organizações
intergovernamentais. Exemplos dessas
instalações incluem isenção de impostos
e taxas alfandegárias, inviolabilidade de
instalações e documentos e imunidade de
processo judicial29.”

O CICV é uma parte independente do


Movimento Internacional da Cruz Vermelha © CICV, Camila Almeida. Ceará, Fortaleza: Em um esforço para
combater a pandemia de COVID-19, o CICV ajuda as comunidades
e do Crescente Vermelho, que também inclui
afetadas pela violência doando kits de higiene a um parceiro local,
a Federação Internacional das Sociedades da que supervisionará a distribuição. 2 de abril de 2020.
Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho e
as diferentes Sociedades Nacionais. O CICV é uma organização privada estabelecida de acordo com a
legislação suíça, reconhecida como assunto de direito internacional30. Como o CICV é um componente
do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho, os Estados participam de seu
órgão deliberativo supremo, a Conferência Internacional31.

28) Gabor Rona, “O status do CICV: uma classe própria”, 17 de fevereiro de 2004.
29) Rona, “O status do CICV: uma classe própria”.
30) Ingrid Rossi, “Status Legal das Organizações Não Governamentais em Direito Internacional”, dissertação de doutorado, Katholieke Universiteit
Leuven, 2009. Disponível em inglês: <https://lirias.kuleuven.be/bitstream/123456789/249936/1/Rossi.pdf>.
31) Rossi, “Estatuto Legal das Organizações Não Governamentais no Direito Internacional”.

45
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

O CICV mantém relações diplomáticas com Estados e IGOs e concluiu acordos de sede com mais
de 60 Estados para facilitar a ação independente dos delegados do CICV e do próprio CICV. “Eles
reconhecem a personalidade jurídica internacional e a capacidade jurídica do CICV nos diferentes
países, bem como sua imunidade de processo e execução legal, concedendo ao CICV um status análogo
ao das OIGs32”.

É importante enfatizar a base legal de qualquer ação realizada pelo CICV:

• “As quatro Convenções de Genebra e o Protocolo Adicional I conferem ao CICV um mandato


específico para agir em caso de conflito armado internacional. Em particular, o CICV tem o
direito de visitar prisioneiros de guerra e civis internados. As Convenções também dão ao CICV
um amplo direito de iniciativa.

• Em conflitos armados não internacionais, o CICV goza do direito de iniciativa humanitária


reconhecido pela comunidade internacional e consagrado no Artigo 3 comuns às quatro
Convenções de Genebra.

• Em caso de distúrbios e tensões internas, e em qualquer outra situação que justifique a ação
humanitária, o CICV também goza do direito de iniciativa, que é reconhecido nos Estatutos do
Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho. Assim, onde o Direito
Internacional Humanitário não se aplica, o CICV pode oferecer seus serviços aos governos sem
que essa oferta constitua uma interferência nos assuntos internos do Estado em questão33”.

Como afirmado anteriormente, o Movimento também consiste na Federação Internacional das


Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho (do inglês, International Federation of Societies
of the Red Cross and the Red Crescent — IFRC). Henry Davison, presidente do Comitê Americano da
Cruz Vermelha para a Guerra, fundou o Movimento em 1919, em Paris, após a Primeira Guerra Mundial.
Davison inicialmente propôs formar uma federação de Sociedades Nacionais. Durante a guerra, muitas
das atividades das Sociedades Nacionais se concentraram em prisioneiros de guerra e combatentes. O
vasto alcance geográfico da guerra demonstrou a necessidade de uma cooperação mais estreita entre
as Sociedades Nacionais da Cruz Vermelha. A nova organização recebeu primeiro o nome de Liga das
Sociedades da Cruz Vermelha; mudou em outubro de 1983 para Liga da Cruz Vermelha e Sociedades do
Crescente Vermelho e, finalmente, tornou-se IFRC em novembro de 1991.

A principal diferença entre a IFRC e o CICV é o contexto em que operam. O CICV atua durante
conflitos, enquanto a FICV atua durante desastres naturais (por exemplo, terremotos, inundações,
secas). A IFRC trabalha em parceria com as Sociedades Nacionais dos países afetados. No âmbito da
gestão de desastres, a IFRC busca apoiar e construir capacidades locais, comunitárias e da Sociedade
Nacional por meio de34:

• Fortalecimento da resiliência familiar, comunitária e nacional e redução do risco de desastre;

• Garantia da eficácia e eficiência preparo para desastres e resposta; e

• Facilitação de recuperação durável e sustentável compatível com o desenvolvimento.

Para garantir apoio financeiro imediato na resposta emergencial a desastres, a IFRC usa um Fundo
de Emergência para Assistência a Catástrofes (do inglês, Disaster Relief Emergency Fund — DREF)

32) Rossi, “Estatuto Legal das Organizações Não Governamentais no Direito Internacional”.
33) CICV, “O mandato e a missão do CICV”. Disponível de: <https://www.icrc.org/pt/o-mandato-e-missao-do-cicv>.
34) IFRC, “Cruz Vermelha e Crescente Vermelho, uma abordagem direcionada e específica”.

46
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

estabelecido em 1985. A IFRC também usa Unidades de Resposta a Emergências (UREs), que são equipes
de especialistas técnicos treinados para apoio imediato às Sociedades Nacionais durante um desastre.
Sua intervenção na resposta imediata a desastres é baseada no uso de conjuntos pré-estabelecidos de
equipamentos padronizados (módulos), incluindo Logística, TI e Telecomunicações, Água e Saneamento,
Cuidados Básicos de Saúde, Hospital de Referência, Hospital de Implantação Rápida e Acampamento de
Base e Alívio35. Além disso, a IFRC pode enviar suas Equipes de Coordenação de Avaliação em Campo
(do inglês, Field Assessment Coordination Teams — FACT), compostas por gerentes experientes de
desastres da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho. Essas equipes apoiam as Sociedades Nacionais e
os escritórios de campo da FICV e constituem uma parte importante das ferramentas globais de resposta
a emergências da FICV. Elas geralmente estão entre as primeiras a fornecer dados sobre uma área
afetada e sua população.

Para apoiar sua resposta a desastres e auxiliar de forma eficiente, a IFRC desenvolveu um serviço
de logística global (do inglês, global logistics service — GLS), que inclui36:

• Gestão de GLS na sede do secretariado de Genebra;

• Unidades logísticas zonais em Kuala Lumpur, Panamá e Nairobi;

• Um escritório de GLS em Dubai;

• Um centro de logística em Las Palmas, nas Ilhas Canárias; e

• Um sistema logístico implantado em nível operacional em todo o mundo.

As 190 Sociedades Nacionais da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho são atores importantes
durante crises e desastres37. Eles pertencem à categoria de primeiros socorros quando ocorre um
desastre. Cada Sociedade Nacional é composta por voluntários (muitos deles da própria comunidade)
e funcionários que fornecem uma ampla variedade de serviços. As Sociedades Nacionais apóiam as
autoridades públicas em seus próprios países como auxiliares humanitários independentes do
governo. A grande rede de Sociedades Nacionais, seu conhecimento local, experiência e acesso direto
às comunidades permitem que elas reajam rapidamente em tempos de crise. As Sociedades Nacionais
também desempenham um papel importante em garantir que os programas de cuidado, prevenção e
preparação sejam realizados diariamente. Essa presença local e sua abordagem com base na comunidade
dão à Cruz Vermelha e ao Crescente Vermelho uma vantagem distinta durante desastres e conflitos.

Seção 2.4 Gabinete de Coordenação dos Assuntos Humanitários

História

A reação internacional ao terremoto de 1988 na Armênia foi bastante caótica. Em resposta, a


Assembleia Geral das Nações Unidas adotou a resolução 46/182 em dezembro de 1991, que delineou
uma estrutura para a ajuda humanitária e 12 princípios orientadores, incluindo aqueles relacionados
com as responsabilidades e autoridades dos Estados38. A resolução teve como objetivo “fortalecer a
resposta das Nações Unidas a emergências complexas e desastres naturais, melhorando a eficácia geral
das operações humanitárias no campo39”.
35) IFRC, “Rapid Response Personnel”. Disponível em inglês: <https://go.ifrc.org/deployments/catalogue/health>.
36) IFRC, “Nossa estrutura global”. Disponível em inglês: <https://www.ifrc.org/people-and-structures>.
37) IFRC, “National Societies”. Disponível em inglês: <https://www.ifrc.org/national-societies>.
38) Resolução 46/182 da Assembleia Geral (19 de dezembro de 1991). Disponível em inglês: <http://undocs.org/a/46/182>.
39) OCHA, “Quem Somos”. Disponível em inglês: <https://www.unocha.org/about-us/who-we-are>.

47
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

A resolução também criou o cargo de alto nível de Coordenador de Ajuda de Emergência (do inglês,
Emergency Relief Coordinator — ERC). Esta nova posição combinou funções separadas em um único
ponto focal da ONU:

• As funções desempenhadas pelos representantes do Secretário-Geral em emergências graves


e complexas; e

• As funções de desastre desempenhadas pela Organização de Ajuda em Desastres das Nações Unidas.

Logo após a adoção da resolução, a ONU formou o Departamento de Assuntos Humanitários (do
inglês, Department of Humanitarian Affairs ‑ DHA) e designou o ERC como Secretário-Geral Adjunto
para Assuntos Humanitários, com escritórios em Nova York e Genebra, para fornecer apoio institucional.

Em 1998, o DHA foi reorganizado no Gabinete de Coordenação dos Assuntos Humanitários (do
inglês, Office for the Coordination of Humanitarian Affairs — OCHA). Seu mandato se expandiu com
a inclusão da coordenação de resposta humanitária, desenvolvimento de políticas e defesa humanitária.
O OCHA faz parte do Secretariado da ONU, garantindo uma resposta coerente às emergências dentro de
um determinado quadro40. O OCHA desempenha a sua função de coordenação principalmente através
do IASC, que é presidido pelo ERC41.

A missão da OCHA é:

• “Mobilizar e coordenar ações humanitárias eficazes e baseadas em princípios em parceria com


atores nacionais e internacionais, a fim de aliviar o sofrimento humano em desastres e emergências;

• Advogar pelos direitos das pessoas necessitadas;

• Promover preparo e prevenção; e

• Facilitar soluções sustentáveis42.”

Inundações severas causadas por chuvas torrenciais


ao longo de oito dias consecutivos e o consequente
rompimento das margens do rio deixaram milhares
de pessoas desabrigadas e sem abastecimento de
alimentos no nordeste da República Democrática
do Congo. Dungu, localizado a apenas algumas
centenas de quilômetros da fronteira com Uganda,
fica na confluência dos rios Dungu, Uele e Kibali. A
população afetada de Dungu, incluindo a mulher na
foto, lentamente começa a retornar para suas casas
devastadas à medida que a água começa a baixar.
14º de novembro de 2012. Foto da ONU por Sylvain
Liechti.

40) Veja a Lição 4.


41) Veja a Lição 2.
42) OCHA, “Quem Somos”.

48
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

Seção 2.5 Comitê Permanente Interagências43


A Resolução 46/182 também criou o Comitê Permanente Interagências (do inglês, Inter-Agency
Standing Committee — IASC), o Processo Consolidado de Recursos e o Fundo Central de Resposta a
Emergências, que juntos formam os principais mecanismos e ferramentas de coordenação do ERC.
Os participantes são parceiros humanitários, desde agências, fundos e programas das Nações Unidas
até o Movimento da Cruz Vermelha e ONGs. O IASC permite a tomada de decisões entre agências
em resposta a emergências complexas. Essas respostas incluem avaliações de necessidades, apelos
consolidados, arranjos de coordenação de campo e o desenvolvimento de políticas humanitárias.

Sob a liderança do ERC, “o IASC desenvolve políticas humanitárias, concorda com uma divisão clara
de responsabilidades para os vários aspectos da assistência humanitária, identifica e aborda as lacunas
na resposta e defende a aplicação eficaz dos princípios humanitários44”.

No que diz respeito à adesão ao IASC, o termo "operacional" é definido como tendo as seguintes
características:

• Prestação de assistência humanitária (proteção ou ajuda material); e

• Implantação de pessoal para ajudar as populações afetadas com necessidades imediatas.

O objetivo geral do IASC é a


coordenação inclusiva. Ele mantém
um número relativamente limitado de
membros para garantir a funcionalidade
e o foco. A associação está sujeita
a uma revisão contínua, e a adesão
de novos membros é analisada caso
a caso. Na verdade, os membros
do IASC são os chefes das agências
operacionais da ONU (ou seja, o
Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento [PNUD], o Fundo O ex-secretário-geral Kofi Annan se reúne com os diretores do Comité
das Nações Unidas para a Infância [do Permanente Interagências para discutir a coordenação mais eficaz da
assistência humanitária aos países do sul da Ásia afetados pelo tsunami no
inglês, United Nations International
Oceano Índico. 30 de dezembro de 2004. Foto da ONU por Evan Schneider.
Children’s Emergency Fund — UNICEF],
o Alto Comissariado das Nações Unidas
para os Refugiados [ACNUR], o Programa Mundial de Alimentos [PMA], a Organização para a Alimentação
e Agricultura [do inglês, Food and Agriculture Organization — FAO], a Organização Mundial da Saúde
[OMS], o Programa das Nações Unidas para os Estabelecimentos Humanos [do inglês, United Nations
Human Settlement Programme — UN-Habitat], OCHA) ou seus representantes designados. Além disso,
a Organização Internacional para as Migrações (OIM), o CICV, a FICV, o Escritório do Alto Comissariado
das Nações Unidas para os Direitos Humanos (do inglês, Office of the United Nations High Commissioner
for Human Rights — OHCHR), o Fundo das Nações Unidas para a População (do inglês, United Nations
Population Fund — UNFPA), o Relator Especial sobre os Direitos Humanos dos Deslocados Internos e o Banco

43) IASC, “Bem-vindo ao IASC”. Disponível em inglês: <https://interagencystandingcommittee.org/>.


44) IASC, “IASC”. Disponível em inglês: <https://interagencystandingcommittee.org/iasc>.

49
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

Mundial tem um convite permanente. Os consórcios de ONGs do Conselho Internacional de Entidades


Beneficentes (do inglês, International Council of Voluntary Agencies — ICVA), da InterAction e do Comitê
Diretivo para a Resposta Humanitária (do inglês, Steering Committee for Humanitarian Response — SCHR)
também são convidados a comparecer em caráter permanente.

Seção 2.6 Agências da ONU — Uma breve descrição45

Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados46

A ONU estabeleceu a Organização Internacional de Refugiados (OIR) logo após sua própria fundação
em 1945. Ela foi incumbida de proteger os grupos de refugiados reconhecidos pela Liga das Nações,
além de uma categoria adicional — os 21 milhões de refugiados espalhados por toda a Europa após
a Segunda Guerra Mundial. Inicialmente, o objetivo principal do OIR era a repatriação. No entanto,
a escalada política para a Guerra Fria levou o OIR a se concentrar no reassentamento daqueles que
tinham objeções válidas para voltar para casa. O ACNUR substituiu a OIR em 195147.

O ACNUR é governado pela Assembleia Geral da ONU e pelo ECOSOC, e o ano de 1950 define seu
mandato48. Embora o ACNUR tenha sido originalmente criado para ser uma organização temporária,
em 2003, a Assembleia Geral estendeu seu mandato, removendo sua limitação de tempo “até que o
problema dos refugiados fosse resolvido”.

Um funcionário do ACNUR prepara kits para serem distribuídos aos repatriados. Os kits incluem lonas de plástico, cobertor, galão e
sabonete. 1º de outubro de 1999. Foto da ONU por M. Kobayashi.

45) Esta lição não descreve todas as agências (ONU) e outros atores importantes (ONGs, etc.), mas fornece uma descrição sucinta de certas organizações.
A Lição 4 oferece informações operacionais adicionais.
46) ACNUR Brasil, “Página na internet”. Disponível de: <https://www.acnur.org/portugues/>.
47) ACNUR, “Manual de Gestão de Operações para Parceiros do ACNUR”, fevereiro de 2003, 4. Disponível em inglês: <http://refugeestudies.org/UNHCR/
UNHCR.%20Mandate%20and%20the%20Organization.pdf>.
48) ACNUR, Estatuto do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, 14 de dezembro de 1950. Disponível em inglês: <http://
www.unhcr.org/3b66c39e1.html>.

50
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

O mandato do ACNUR define seu papel operacional:

“[Ele] engloba total responsabilidade e prestação de contas à comunidade


internacional e aos refugiados por todos os aspectos do ciclo de vida completo da
situação de um refugiado — desde o alerta precoce e o planejamento de contingência
para proteção e assistência dos refugiados, até a realização de soluções duradouras
para a situação dos refugiados e outras pessoas que preocupam o Alto Comissariado,
incluindo repatriados e pessoas deslocadas internamente49.”

Seu mandato abrange50:

• Refugiados e requerentes de asilo;

• Repatriados;

• Apátridas; e

• Deslocados internamente.

O Alto Comissário é responsável pela direção e controle do ACNUR. Mais de 17.324 funcionários
nacionais e internacionais do ACNUR trabalham em 135 países, e a maioria das suas operações ocorrem
no campo. Alguns escritórios regionais fazem a ligação entre os escritórios no exterior e a sede51.

As emergências nas quais o ACNUR atuou nos últimos anos incluem52:

• Emergência da República Democrática do Congo (RDC)53: O conflito na República


Democrática do Congo deslocou cerca de 5 milhões de pessoas entre 2017 e 2019. A maioria
estava nas regiões de Kasai, Tanganyika, Ituri e Kivu. Centenas de milhares fugiram para Angola,
Zâmbia e outros países vizinhos. Em fevereiro de 2020, havia mais de 918.000 refugiados
e requerentes de asilo da RDC hospedados em países africanos e 5,01 milhões de pessoas
deslocadas dentro da RDC. Havia quase 524.000 refugiados e 3.188 requerentes de asilo na
RDC em janeiro de 2020.

• Emergência na Síria54: Mais de 5,6 milhões de pessoas fugiram da Síria desde 2011, cruzando
para o Líbano, Turquia, Jordânia e outras nações. Mais de 11 milhões de pessoas na Síria
precisam de assistência humanitária, incluindo cerca de 4,65 milhões que estão em extrema
necessidade devido à convergência de vulnerabilidades55.

• Emergência Tigray na Etiópia56: “Uma crise humanitária em grande escala está se


desenrolando à medida que milhares de refugiados fogem dos combates em andamento na
região de Tigray, na Etiópia, para buscar segurança no leste do Sudão. Desde que a violência
começou no início de novembro de 2020, os refugiados chegaram a pontos fronteiriços remotos
que levam horas para chegar das cidades mais próximas do Sudão.” Em novembro de 2020,

49) ACNUR, “Um Manual de Gestão de Operações para Parceiros do ACNUR”.


50) Divisão de Proteção Internacional do ACNUR, Nota sobre o Mandato do Alto Comissariado para Refugiados e seu Gabinete, outubro de 2013.
Disponível em inglês: <http://www.refworld.org/docid/5268c9474.html>.
51) Uma visão geral de seus principais resultados e atividades pode ser encontrada em “Visão Geral das Figuras”. Ver: Alto Comissariado das Nações
Unidas para os Refugiados, “Visão Geral das Figuras”. Disponível em inglês: <http://www.unhcr.org/figures-at-a-glance.html>.
52) ACNUR, “Visão Geral das Figuras”.
53) ACNUR, “Emergência da RD Congo”, março de 2020. Disponível em inglês: <https://www.unhcr.org/en-us/dr-congo-emergency.html>.
54) ACNUR, “Emergência Síria”, abril de 2018. Disponível em inglês: <https://www.unhcr.org/en-us/syria-emergency.html>.
55) ACNUR, “República Árabe Síria”, 2021. Disponível em inglês: <https://reporting.unhcr.org/node/2530>.
56) ACNUR, “Emergência Tigray na Etiópia”, novembro de 2020. Disponível em inglês: <https://www.unhcr.org/en-us/ethiopia-tigray-emergency.html>.

51
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

45.449 refugiados da região de Tigray, na Etiópia, haviam fugido para o Sudão. Havia 100.000
deslocados internos na região de Tigray antes da crise em curso.

• Emergência no Iraque57: milhões de iraquianos fugiram de suas casas após décadas de


conflito. Em maio de 2018, 2,1 milhões de pessoas foram deslocadas dentro do Iraque e mais
de 360.000 foram deslocadas em assentamentos informais, incluindo prédios inacabados e
abandonados.

• Deslocamento na América Central58: O número de refugiados e solicitantes de refúgio do


norte da América Central aumentou dramaticamente nos últimos cinco anos. O agravamento do
crime e da violência é responsável por grande parte do aumento, juntamente com instituições
frágeis e desigualdades crescentes. Na Nicarágua, a perseguição política e as violações dos
direitos humanos têm impulsionado um novo deslocamento em grande escala. Existem mais
de 102.000 nicaraguenses que buscaram proteção internacional em todo o mundo e mais de
318.000 deslocados internos em Honduras e El Salvador.

• Surto de coronavírus59: A pandemia de coronavírus (COVID-19) põe em perigo todos no


mundo, incluindo refugiados e outras pessoas deslocadas por conflito ou perseguição. O ACNUR
está fornecendo serviços de saúde, água, saneamento e higiene para proteger refugiados e
pessoas deslocadas e trabalhando com governos para garantir que aqueles forçados a fugir
sejam incluídos nos planos de resposta à COVID-19. Em agosto de 2020, 134 países de
acolhimento de refugiados relataram transmissão local de COVID-19.

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento60

O PNUD foi formado em 1965 por meio da fusão do Programa Ampliado de Assistência Técnica das
Nações Unidas e do Fundo Especial das Nações Unidas61. O Programa opera em cerca de 170 países e
territórios e tem como objetivo alcançar a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades e da
exclusão social. Oferece aos países assistência para desenvolver políticas, habilidades de liderança,
habilidades de parceria e capacidades institucionais, ao mesmo tempo em que cria resiliência para sustentar
os resultados do desenvolvimento. O foco principal do PNUD é o desenvolvimento, particularmente em três
áreas:

• Desenvolvimento sustentável;

• Governança democrática e construção da paz; e

• Resiliência ao clima e desastres.

Em cada representação nacional, o Representante Residente do PNUD normalmente também atua


como Coordenador Residente (do inglês, Resident Coordinator — RC) das atividades de desenvolvimento
do sistema das Nações Unidas como um todo62.

57) ACNUR, “Emergência no Iraque”, maio de 2018. Disponível em inglês: <https://www.unhcr.org/en-us/iraq-emergency.html>.


58) ACNUR, “Deslocamento na América Central”. Disponível em inglês: <https://www.unhcr.org/en-us/displacement-in-central-america.html>.
59) ACNUR, “Surto de coronavírus”, agosto de 2020. Disponível em inglês: <https://www.unhcr.org/en-us/coronavirus-covid-19.html>.
60) PNUD, “Página inicial”. Disponível em inglês: <http://www.undp.org/content/undp/en/home/>.
61) PNUD, “Sobre nós”. Disponível em inglês: <https://www.undp.org/content/undp/en/home/about-us.html#being>.
62) A Lição 4 examinará sua função especial de coordenação.

52
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

Fundação das Nações Unidas para a Infância

A ONU formou a UNICEF em 1946, após


a Segunda Guerra Mundial, para fornecer
alimentos, roupas e cuidados sanitários a crianças
que enfrentavam fome e doenças. A Assembleia
Geral da ONU estendeu indefinidamente o
mandato do UNICEF em 1953, tornando-a parte
permanente da ONU63. Em 1959, a Assembleia
Geral da ONU adotou a Declaração dos Direitos
da Criança, que definiu internacionalmente os
direitos das crianças à proteção, educação,
saúde, abrigo e boa nutrição. A Assembleia
Geral adotou a Convenção sobre os Direitos
da Criança em 1989. Ela entrou em vigor em
setembro de 1990, e as nações que a adotaram
foram obrigadas pelo direito internacional a
reconhecer os direitos das crianças. É o tratado
de direitos humanos mais amplo e rapidamente
aceito da história, com 196 países signatários64.

A UNICEF está sediada em Nova York, mas


opera em 190 países por meio de programas
nacionais e comitês nacionais. Cerca de 85 Trabalhadores carregam suprimentos médicos de emergência

por cento dos cargos da organização estão em um helicóptero da ONU para transporte e distribuição às
vítimas de cólera durante a epidemia no Haiti. 16º de novembro
localizados no campo. O plano estratégico de
de 2020. Foto da ONU: UNICEF/Marco Dormino.
médio prazo do UNICEF para 2014–2017 define
suas áreas prioritárias65:

• Toda criança sobrevive e prospera;

• Toda criança aprende;

• Every child is protected from violence and exploitation;

• Toda criança vive em um ambiente seguro e limpo; e

• Toda criança tem uma chance equitativa na vida.

A UNICEF administra programas de saúde, nutrição, educação, água e saneamento, meio ambiente,
proteção infantil, questões de gênero e desenvolvimento, entre outros campos de importância para as

63) A UNICEF foi estabelecida pela Assembleia Geral (Resolução GA 57 (I) (1946)) para fornecer assistência de emergência a crianças em países
devastados pela guerra após a Segunda Guerra Mundial. Por GA res. 417 (V) (1950), a Assembleia Geral da ONU encarregou-se de atender às
necessidades das crianças nos países em desenvolvimento. A Resolução GA 802 (VIII) (1953) estendeu o mandato do UNICEF indefinidamente, com
ênfase em programas que dão benefícios de longo prazo a crianças em todos os lugares, especialmente aqueles em países em desenvolvimento, e
mudou o nome da organização para Fundo das Nações Unidas para a Infância, mas manteve a sigla UNICEF. O Fundo também continuou a prestar
socorro e reabilitação em emergências. Veja: “Conselho dos Chefes Executivos para Coordenação do Sistema das Nações Unidas”. Disponível em
inglês: <https://www.itu.int/net4/wsis/ungis/Members/1149>.
64) UNICEF, “Sobre a UNICEF”. Disponível em inglês: <https://www.unicef.org/about/who/index_history.html>.
65) UNICEF, O Plano Estratégico do UNICEF 2018-2021: Resumo Executivo, janeiro de 2018. Disponível em inglês: <https://www.unicef.org/media/48126/
file/UNICEF_Strategic_Plan_2018-2021-ENG.pdf>.

53
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

crianças, em coordenação com governos, comunidades locais e outras organizações de ajuda em países
em desenvolvimento.

Programa Mundial de Alimentos

Em 1961, a FAO propôs a criação de um programa multilateral de ajuda alimentar experimental. Sete
meses depois, a FAO e a Assembleia Geral da ONU aprovaram resoluções paralelas para estabelecer o PMA
em uma base experimental de três anos. Em 1965, a resolução 1714 (XVI) da Assembleia Geral renovou
o PMA de forma contínua "enquanto os alimentos multilaterais forem considerados viáveis e desejáveis66”.

Em dezembro de 1994, o órgão dirigente do PMA adotou a Declaração sobre a Missão do PMA. A
Declaração sobre a Missão é consistente com o mandato do PMA, reflete o princípio de universalidade e
afirma que o PMA continuará a:

• “utilizar a ajuda alimentar para apoiar o desenvolvimento econômico e social;

• atender às necessidades de refugiados e outras necessidades alimentares de emergência, além


do apoio logístico associado; e

• promover a segurança alimentar mundial de acordo com as recomendações das Nações Unidas
e da FAO.

As principais políticas e estratégias que governam as atividades do PMA são fornecer ajuda
alimentar para:

• salvar vidas em refugiados e outras situações de emergência;

• melhorar a nutrição e a qualidade de vida das pessoas mais vulneráveis em momentos críticos
de suas vidas; e

• ajudar a construir ativos e promover a autossuficiência de pessoas e comunidades pobres,


especialmente por meio de programas de trabalho intensivo67.”

O Plano Estratégico do PMA para 2014-2017 fornece a estrutura para suas operações e estabelece
quatro objetivos:

• “Salvar vidas e proteger meios de subsistência em emergências;

• Apoiar a segurança alimentar e nutricional e (re)construir meios de subsistência em ambientes


frágeis e emergências posteriores;

• Reduzir o risco e permitir que as pessoas, comunidades e países atendam às suas próprias
necessidades alimentares e nutricionais; e

• Reduzir a desnutrição e interromper o ciclo intergeracional da fome68.”

Organização Mundial da Saúde

A constituição da Organização Mundial da Saúde (OMS) foi assinada em 22 de julho de 1946


pelos representantes de 61 Estados e entrou em vigor em 7 de abril de 1948, que agora é conhecido e
comemorado anualmente como o Dia Mundial da Saúde.

66) Resolução 1714 (XVI) da Assembleia Geral (19 de dezembro de 1961). Disponível em inglês: <https://digitallibrary.un.org/record/204613?ln=en>.
67) PMA, ACNUR, Desnutrição em Situações de Refugiados Prolongados: Uma Estratégia Global, 2006. Disponível em inglês: <https://www.unhcr.
org/45fe62642.pdf>.
68) PMA, “Plano Estratégico 2014-2017”, 2013. Disponível em inglês: <https://docs.wfp.org/api/documents/WFP-0000037842/download/>.

54
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

A OMS é a autoridade diretora e coordenadora da saúde internacional no sistema das Nações Unidas.
Seus especialistas produzem diretrizes e padrões de saúde, promovem a pesquisa em saúde e ajudam
os países a abordarem questões de saúde pública; também apoiam e promovem a pesquisa em saúde.
A OMS agrupa 194 Estados Membros em seis regiões, cada uma com um escritório regional69. Por meio
da OMS, os governos enfrentam em conjunto os problemas globais de saúde e melhoram o bem-estar
das pessoas. Uma das maiores conquistas da organização foi a erradicação global da varíola em 1979.

Os principais objetivos da OMS são:

• “fornecer liderança em questões críticas para a saúde e engajar em parcerias onde uma ação
conjunta é necessária;

• montar a agenda de pesquisa e estimular a produção, tradução e disseminação de conhecimento


valioso;

• estabelecer normas e padrões e promover e monitorar sua implementação;

• articular opções de políticas éticas e baseadas em evidências;

• fornece apoio técnico, catalisar mudanças e construir capacidade institucional sustentável; e

• monitorar a situação de saúde e avaliar as tendências de saúde70.”

As áreas de atuação da OMS são:

• Sistemas de saúde;

• Doenças não comunicáveis;

• Promoção da saúde ao longo da vida;

• Doenças transmissíveis;

• Preparação, vigilância e resposta; e

• Serviços corporativos71.

Organização Internacional para as Migrações

A Organização Internacional para as Migrações


(OIM) foi criada em dezembro de 1951 como Comitê
Intergovernamental para as Migrações Europeias.
Após as emendas feitas à sua constituição em 1989, a
organização se reformou como Organização Internacional
para as Migrações72. A OIM tem 173 Estados Membros73.

A IOM promove a migração humana e ordenada,


fornecendo serviços e conselhos a governos e migrantes. Cenas da Ilha de Abaco, Bahamas, após o furacão
Dorian. Os residentes locais de Coopers Town,
A OIM atua em quatro grandes áreas de gestão de
na Ilha de Abaco, recebem lonas da Organização
migração: Internacional para Migração (OIM). Foto da ONU por
Mark Garten. 1º de novembro de 2014.
69) OMS, “Escritórios regionais da OMS”. Disponível em inglês: <http://who.int/
about/regions/en/>.
70) OMS, “O que fazemos”. Disponível em inglês: <http://www.who.int/about/what-we-do/en/>.
71) OMS, “O que fazemos”.
72) OIM, “Constituição e Textos Básicos dos Órgãos Diretores”. Disponível em inglês: <https://www.iom.int/constitution-and-basic-texts-governing-bodies>.
73) OIM, “Membros e Observadores”. Disponível em inglês: <https://www.iom.int/members-and-observers>.

55
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

• Migração e desenvolvimento;

• Facilitação da migração;

• Regulação da migração; e

• Migração forçada.

O Departamento de Operações e Emergências da OIM é responsável por supervisionar suas


atividades relacionadas ao reassentamento, movimentação, logística, preparação e resposta em crises
de migração e emergências humanitárias por meio de recuperação e cenários de transição.

Seção 2.7 “Super” ONGs

Save the Children

Em 1919, Eglantyne Jebb estabeleceu o Fundo Save the Children para alimentar crianças que
passavam fome após a Primeira Guerra Mundial. A Liga das Nações adotou a Carta de Jebb sobre os
direitos da criança em 1924. Durante a Segunda Guerra Mundial, a Save the Children trabalhou para
proteger as crianças diretamente afetadas pelo conflito. A organização continua operando em regiões
afetadas por conflitos em todo o mundo. O Save the Children se esforça para criar um mundo no qual
todas as crianças tenham direito à sobrevivência, proteção, desenvolvimento e participação. Sua missão é
inspirar avanços na forma como o mundo trata as crianças e alcançar mudanças imediatas e duradouras
em suas vidas74.

As principais áreas de trabalho da organização são:

• Saúde e nutrição (por exemplo, campanhas de vacinação);

• Educação (por exemplo, promoção da aprendizagem);

• Proteção à Criança (por exemplo, proteção contra abuso sexual);

• Governança dos direitos da criança (por exemplo, sistema de direitos da criança);

• Advocacia (por exemplo, influenciar políticas e ações de governos); e

• Pobreza infantil (por exemplo, tirar famílias da pobreza).

Save the Children é co-líder do cluster com o UNICEF do Global Education Cluster (ver Lição 4)75. Em
2019, as receitas combinadas da Save the Children totalizaram US$ 2,2 bilhões e atingiram diretamente
mais de 38,7 milhões de crianças em 117 países76.

Médicos Sem Fronteiras

O Médicos Sem Fronteiras (MSF) é um movimento mundial de 24 associações independentes


agrupadas em associações nacionais e regionais. As associações estão vinculadas a cinco diretorias
operacionais que gerenciam os programas de assistência humanitária de MSF. Outras unidades, incluindo
centros de abastecimento e unidades médicas, dão suporte às suas atividades77.

74) Save the Children, “About Us”. Disponível em inglês: <https://www.savethechildren.net/about-us>.


75) Save the Children e UNICEF, “Co-Lead Letter”. Disponível em inglês: <https://i.stci.uk/sites/default/files/libraries/UNICEF%20and%20Save%20
the%20Children%20Education%20Cluster%20Co-lead%20Letter.pdf>.
76) Salve as Crianças, “Responsabilidade”. Disponível em inglês:: <https://www.savethechildren.net/about-us/accountability>.
77) MSF, “Página inicial”. Disponível em inglês: <http://www.msf.org/>.

56
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

Conforme descrito em seu regulamento, os princípios do MSF não se alinham exatamente com os
princípios humanitários:

“Os princípios de imparcialidade e neutralidade não são sinônimos de silêncio. Quando o


MSF testemunha atos extremos de violência contra indivíduos ou grupos, a organização
pode falar publicamente. Podemos procurar chamar a atenção para a necessidade
extrema e o sofrimento inaceitável quando o acesso a cuidados médicos que salvam
vidas é impedido, quando as instalações médicas estão sob ameaça, quando as crises
são negligenciadas ou quando a prestação de ajuda é inadequada ou sofre abuso78.”

O MSF oferece assistência médica humanitária a vítimas de conflitos, desastres naturais, epidemias
e exclusão de assistência médica. Sua atuação inclui assistência médica, realização de cirurgias,
combate a epidemias, reabilitação e administração de hospitais e clínicas, realização de campanhas
de vacinação, operação de centros de nutrição, prestação de cuidados de saúde mental, prestação de
ajuda humanitária, instalação de sistemas de saneamento, fornecimento de água potável e distribuição
de alívio para ajudar a sobrevivência79.

Seção 2.8 Consórcios de ONGs e o Banco Mundial

Comitê Diretivo para a Resposta Humanitária80

Fundada em 1972, o SCHR é uma aliança voluntária de nove das principais organizações humanitárias
globais81. Essas organizações compartilham um objetivo e trabalham juntas para melhorar a qualidade,
eficácia, responsabilidade e impacto dos esforços de ajuda para as pessoas afetadas por uma crise.
O grupo informal foi estabelecido para melhorar a coordenação a nível internacional. O SCHR foi o
patrocinador original do Código de Conduta de 1998 para o Movimento Internacional da Cruz Vermelha
e do Crescente Vermelho e ONGs de Ajuda em Desastres, que definiu padrões éticos para organizações
envolvidas no trabalho humanitário. A SCHR e a InterAction lançaram o Projeto Sphere em 1997 para
definir padrões mínimos em áreas centrais de assistência humanitária. O SCHR é uma das organizações
convidadas de forma permanente para o IASC.

Sua visão e missão são:

“Desejamos e promovemos ativamente um mundo no qual as comunidades locais,


a sociedade civil, os governos e as instituições regionais possam responder com
eficácia às emergências humanitárias, com base em princípios humanitários
universalmente aceitos. Como organizações humanitárias internacionais líderes,
colocamos as pessoas afetadas por desastres no centro de nossas respostas.
Nosso imperativo é salvar vidas, reduzir o sofrimento humano e preservar a
dignidade humana82.”

78) MSF, “A Carta de MSF”. Disponível em inglês: <https://www.msf.org/msf-charter>.


79) Mais informações sobre MSF e suas atividades estão disponíveis em seu Relatório de Atividades Internacionais 2015 (em inglês): <https://www.
msf.org/sites/msf.org/files/international_activity_report_2015_en_2nd_ed_0.pdf>.
80) Comitê Diretor para a Resposta Humanitária, “Página inicial”. Disponível em inglês: <http://www.schr.info/>.
81) CICV, FICV, CARE, Caritas, Federação Luterana Mundial, OXFAM Internacional, Visão Mundial, ACT Alliance e Save the Children.
82) Comitê Diretor para a Resposta Humanitária, “Quem Somos”. Disponível em inglês: <http://www.schr.info/about/>.

57
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

InterAction

InterAction é uma organização formada por uma aliança de 180 ONGs em todo o mundo, com sede
em Washington, DC83. A organização trabalha com populações pobres e vulneráveis em todo o mundo
e visa a tornar o mundo um lugar mais pacífico, justo e próspero. A InterAction também é convidada
permanente do IASC.

Organizações Voluntárias de Cooperação em Emergências84

A Organizações de Voluntariado de Cooperação em Emergências (do inglês, Voluntary


Organisations in Cooperation in Emergencies — VOICE) é uma rede que representa 85 ONGs europeias
ativas em todo o mundo na causa da ajuda humanitária. Ao contrário de seus membros, a VOICE não
opera por conta própria. A VOICE é o principal interlocutor das ONGs com a UE em matéria de ajuda de
emergência e redução do risco de desastres, e promove os valores das ONGs humanitárias.

O Banco Mundial85

Estabelecido em 1944, o Banco Mundial é uma fonte vital de assistência técnica e financeira para
os países em desenvolvimento de todo o mundo. Não é um banco tradicional, mas sim uma parceria
única para reduzir a pobreza e apoiar o desenvolvimento. O Grupo Banco Mundial é composto por cinco
instituições administrados por países membros. Está envolvida na reconstrução e reabilitação após
desastres86. O Banco Mundial é um dos convidados permanentes do IASC.

O Grupo Banco Mundial definiu dois objetivos para o mundo alcançar até 2030:

• Acabar com a pobreza extrema diminuindo a porcentagem de pessoas que vivem com menos de
US $ 1,90 por dia para não mais de 3 por cento; e

• Promover a prosperidade compartilhada, incentivando o crescimento da renda dos 40 por cento


mais pobres de todos os países.

83) InterAction: A United Voice for Global Change, “Pagina inicial”. Disponível em inglês: <https://www.interaction.org/>.
84) Organizações Voluntárias de Cooperação em Emergências, “Pagina inicial”. Disponível em inglês: <http://www.ngovoice.org/>.
85) Banco Mundial no Brasil, “Página inicial”. Disponível de: <https://www.worldbank.org/pt/country/brazil>.
86) Banco Mundial, “Página inicial”.

58
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

Questionário de fim de Lição  »

1. Uma ONG é uma entidade organizada 4. A seguinte afirmação é VERDADEIRA ou


que é funcionalmente independente FALSA? A IFRC atua durante os conflitos.
e não representa um governo ou
A. Verdadeira
Estado. Isso é normalmente aplicado
a organizações dedicadas a/à _____, B. Falsa
várias das quais têm status consultivo
oficial nas Nações Unidas. 5. Em 1998, o DHA foi reorganizado como
OCHA. Seu mandato foi ampliado para
A. uma vitória militar incluir _____.
B. causas humanitárias e de direitos humanos
A. a coordenação da resposta humanitária
C. propagação da democracia
B. o desenvolvimento de políticas
D. lucro
C. a advocacia humanitária
D. Todas as opções anteriores
2. Qual das seguintes afirmações é
verdadeira?
6. A missão do OCHA é _____.
A. Agências “Dunantistas” seguem as ideias e
A. espalhar a democracia internacionalmente
abordagens de Henry Dunant, que ajudou
B. facilitar
a codificar os princípios humanitários
C. demonstrar
fundamentais
D. defender os direitos das pessoas
B. A maioria das ONGs americanas pertence
necessitadas
à tradição “Wilsoniana” e projeta valores
e influência dos EUA de acordo com as
7. Qual das seguintes afirmações é
ambições de Wilson. verdadeira?
C. Os “classicistas” acreditam que a ação
A. O mandato do ACNUR concentra-se nos
humanitária pode e deve ser completamente
migrantes.
isolada da política, enquanto os “solidaristas”
B. O Representante Residente do PNUD
acreditam no uso da ação humanitária como
normalmente atua como o RC de atividades
parte de uma estratégia abrangente.
de desenvolvimento para o sistema das
D. Todas as opções anteriores
Nações Unidas como um todo.

3. Qual das declarações abaixo sobre o C. A UNICEF foi fundada em 1974.


status do CICV é FALSA? D. O PMA organiza campanhas anuais contra

A. É uma associação privada formada sob o a praga de gafanhotos para aumentar a

abrigo do Código Civil Suíço. produção de alimentos.

B. Suas funções e atividades — fornecer


8. As áreas de trabalho da Organização
proteção e assistência às vítimas de Mundial da Saúde incluem _____.
conflito — são ordenadas pela comunidade
A. sistemas de saúde
internacional de Estados e baseiam-se no
B. doenças não transmissíveis e transmissíveis
direito internacional.
C. preparação, vigilância e resposta
C. É uma parte dependente do Movimento
D. Todas as opções anteriores
Internacional da Cruz Vermelha e do
Crescente Vermelho
D. É reconhecido por ter uma "personalidade
jurídica internacional" ou um estatuto próprio

As respostas estão disponíveis na página seguinte.

59
LIÇÃO 2 | Atores em operações de ajuda humanitária e seus mandatos

Questionário de fim de Lição  »

9. As principais áreas de trabalho da Save 10. Qual afirmação abaixo é FALSA?


the Children incluem _____.
A. O Banco Mundial é um dos convidados
A. saúde e nutrição permanentes do IASC.
B. educação B. A VOICE é uma organização voluntária dos
C. pobreza infantil EUA para emergências que representa mais
D. Todas as opções anteriores de 180 ONGs.
C. A SCHR e a InterAction são organizações
guarda-chuva que representam várias ONGs.
D. O Banco Mundial está envolvido na
reconstrução e reabilitação após desastres.

Respostas »
1. B

2. D

3. C

4. B. Falsa

5. D

6. D

7. B

8. D

9. D

10.B

60
OPERAÇÕES HUMANITÁRIAS

LIÇÃO
Os militares e os
3 trabalhadores humanitários

Esta lição descreve o


papel específico dos
militares das Operações
de Ajuda Humanitária,
incluindo o envolvimento
militar em desastres e
conflitos armados.

Foto da ONU por JC Mcllwaine.

Nesta lição » Objetivos da lição »

Seção 3.1 O que é uma Cooperação Civil-Militar? • Compreender as diferenças entre CIMIC e UN-

Seção 3.2 O que é Coordenação Civil-Militar? CMCoord.

Seção 3.3 Os militares versus os trabalhadores • Compreender e explicar as semelhanças


de ajuda humanitária – e diferenças entre os atores militares e
incompatibilidade ou oportunidade?
humanitários.
Seção 3.4 Militares Nacionais versus Militares
• Compreender e relembrar diferenças fundamentais
Internacionais
dos princípios humanitários e sua interpretação
Seção 3.5 Os Princípios Militares e Humanitários
pelos militares.
– “O que uma palavra significa?”

Seção 3.6 Oslo, MCDA e diretrizes específicas do


• Descrever os diferentes tipos de orientações.

país - um breve panorama • Compreender e medir a “opção de último recurso”,


Seção 3.7 Diferentes Tipos de Assistência e bem como a utilização do FMA.
Opções de Último Recurso
• Compreender e avaliar os desafios em torno do
Seção 3.8 Adequação de FMAs implantados e
espaço humanitário.
risco potencial

Seção 3.9 Desafios nos espaços militares e


humanitários

INSTITUTO DE TREINAMENTO EM OPERAÇÕES DE PAZ

61
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

A Força Interina das Nações Unidas no Líbano (FINUL) enviou uma equipe da Reserva do Comandante da Força para avaliar a
magnitude da explosão de 4 de agosto de 2020 no porto de Beirute. 5 de agosto de 2020. Foto da ONU por Pasqual Gorriz.

Introdução1

Nas últimas décadas, os atores militares aumentaram


seu envolvimento como atores “globais” durante as
crises, incluindo desastres. O envolvimento de atores
militares no socorro a desastres causou tensão entre o
componente militar e os agentes humanitários. Diversas
diretrizes e melhores práticas surgiram para esclarecer
Assista a uma introdução em vídeo
suas posições e atitudes. Mesmo com essas diretrizes,
desta lição em inglês: <https://
diferenças fundamentais entre os atores militares www.peaceopstraining.org/
e humanitários permanecem devido à natureza de videos/493/hro-lesson-3-military-
and-hro/> .
seus respectivos mandatos. Esta lição tenta encontrar
respostas sobre como os atores militares e humanitários
podem interagir melhor uns com os outros, se assim
desejarem ou se for necessário.

1) Alguns aspectos, como a “coordenação”, serão discutidos mais detalhadamente


na Lição 4. Os alunos que quiserem aprender mais sobre a Coordenação Civil-
Militar devem revisar o curso do Instituto de Treinamento em Operações de
Paz, Coordenação Civil-Militar em Operações de Paz (CIMIC).

62
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

Seção 3.1 O que é uma Cooperação Civil-Militar?


O fim da Guerra Fria e a desintegração do Pacto de Varsóvia mudaram o contexto político e militar
global, deixando os exércitos com muitos equipamentos militares de que não precisavam mais. Alguns
líderes políticos e militares buscaram oportunidades para justificar a manutenção de todas as suas
forças armadas, ou pelo menos parte delas. Embora muitos países apoiassem operações humanitárias
de boa vontade, pelo menos parcialmente, tais operações também apresentavam oportunidades de
usar forças armadas nacionais e seus equipamentos. Eles procuravam por novas missões para seus
exércitos e as encontraram ao prestar assistência no âmbito de operações de socorro em desastres.

A Cooperação Civil-Militar (do inglês, Civil-Military Cooperation — CIMIC) há muito faz parte das
operações militares. Alguns países a consideram como “assuntos civis” ou usam outros termos para
descrever o relacionamento entre militares e civis2.

Muitos comandantes militares viram o socorro ao desastre como uma oportunidade de utilizar suas
unidades de engenharia e logística e equipamentos para fins civis-militares, de forma a possibilitar a
reconstrução e a reabilitação dos locais atingidos. Embora parte de seu compromisso viesse de um
esforço para ajudar a população afetada, outra parte se concentrou em como obter o consentimento
da população para a missão militar em andamento na esperança (legítima) de que essas atividades
melhorassem a segurança e o ambiente de tropas implantadas.

Em geral, a CIMIC consiste em duas abordagens: a de “empurrar impulsionado pela oferta” e a


de “puxar impulsionado pela demanda”. A primeira abordagem também é conhecida como “conquistar
corações e mentes” e incorpora atividades de obtenção de consentimento para garantir o sucesso
de uma operação de paz. Conquistar a boa vontade da população para proteger as forças no local,
manter o moral da equipe ao fornecer todos os tipos de assistência e gerar uma imagem positiva no
seu país de origem são os principais motores dessa abordagem, e os políticos podem explorá-la para
fins de construção de imagem. A segunda abordagem concentra-se mais na intervenção (assistência
humanitária) e no preenchimento da escassez de cobertura humanitária. As seções subsequentes
expandirão essa ideia.

A Doutrina de Cooperação Civil-Militar da OTAN define a CIMIC como:

“A coordenação e cooperação, em apoio à missão, entre o Comandante da OTAN


e os atores civis, incluindo a população nacional e as autoridades locais, bem como
organizações e agências internacionais, nacionais e não governamentais3.”

É importante observar que as ações da CIMIC são realizadas “em apoio à missão”. Essas ações
são condicionais e podem cessar sempre que as partes no conflito ou parte da população deixarem
de cooperar. Os atores humanitários não devem esquecer que as unidades militares se movem e os
projetos podem não estar em andamento4.

2) A terminologia do Departamento de Defesa dos EUA se refere a assuntos civis como atividades que “(1) melhoram o relacionamento entre as forças
militares e as autoridades civis em áreas onde as forças militares estão presentes; e (2) envolvem a aplicação de habilidades funcionais especializadas
em assuntos civis, em áreas normalmente de responsabilidade do governo civil, para melhorar a condução de operações civis-militares". Veja também
assuntos civis; operações civis-militares. (JP 3-57).
3) OTAN, Doutrina de Cooperação Civil-Militar da OTAN, junho de 2003. Disponível em inglês: <http://www.nato.int/ims/docu/ajp-9.pdf>.
4) Informações adicionais sobre a CIMIC estão disponíveis na Doutrina de Cooperação Civil-Militar da OTAN (do inglês, Civil-Military Co-operation
Doctrine). Outras organizações militares (EUA, UE, ONU, etc.) utilizam definições diferentes para a CIMIC.

63
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

Seção 3.2 O que é a Coordenação Civil-Militar?


De acordo com o Manual de Campo UN-CMCoord, “UN-CMCoord é o diálogo essencial e a interação
entre atores civis e militares em emergências humanitárias que é necessário para proteger e promover
os princípios humanitários, evitar a competição, minimizar a inconsistência e, quando apropriado,
buscar objetivos comuns. As estratégias básicas variam da cooperação à coexistência. A coordenação é
uma responsabilidade compartilhada facilitada pela ligação e o treinamento comum5.”

O manual discute cinco tarefas da Coordenação Civil-Militar (CMCoord):

1. “Estabelecer e manter o diálogo com


as forças militares.

2. Estabelecer um mecanismo de
intercâmbio de informações e ações
humanitárias entre as forças militares
e outros grupos armados.

3. Auxiliar nas negociações em


áreas críticas de interação militar-
humanitária.

4. Apoiar o desenvolvimento e a
disseminação de orientação específica As forças de paz que servem na Missão de Estabilização
de determinado contexto para Integrada Multidimensional da ONU no Mali (MINUSMA)
realizaram atividades de cooperação civil-militar com a
a interação entre a comunidade
comunidade local em Gao. 12 de julho de 2017. Foto da
humanitária e os militares. ONU por Harandane Dicko.

5. Monitorar a atividade das forças


militares e garantir um impacto positivo nas comunidades
humanitárias6.”

Seção 3.3 Militares versus Trabalhadores de Ajuda Humanitária —


Incompatibilidade ou Oportunidade?
Na guerra no Afeganistão, ocorreu um aumento no número de militares (principalmente de forças
especiais) disfarçados de agentes humanitários, armados ou operando nos mesmos tipos de veículos
usados por agências/organizações humanitárias. Isso causou inúmeras reclamações de organizações
humanitárias a comandantes militares, lembrando-os da separação estrita entre militares e pessoal
humanitário sob o DIH. De acordo com o DIH, os militares não são considerados atores humanitários,
mesmo que cumpram ou apoiem tarefas humanitárias. Os mesmos argumentos se aplicam aos agentes
humanitários, mas a chance de isso acontecer é remota. Essa chamada “distorção de limites” continua
sendo um problema em muitos conflitos armados em andamento, gerando tensões e preconceito. Mas
como os militares e os trabalhadores humanitários veem a si mesmos em termos de suas qualidades

5) OCHA, Coordenação Civil-Militar Humanitária (UN-CMCoord). Disponível em inglês: <https://www.unocha.org/es/themes/humanitarian-civil-military-


coordination>.
6) As seções subsequentes desta lição e a Lição 4 desenvolverão alguns desses pontos. Esta definição difere de outras definições de CIMIC.

64
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

profissionais e pessoais? Os agentes humanitários e militares podem se ver de maneiras semelhantes.


No entanto, ambos os lados podem não estar cientes dessas percepções compartilhadas. Sempre que
possível e apropriado, os militares e trabalhadores humanitários devem utilizar essas semelhanças para
estabelecer um diálogo e interagir uns com os outros.

As organizações militares e humanitárias têm estruturas diferentes. Algumas das principais


diferenças incluem estrutura, operações e processo, entre outras:

• Em termos de estrutura, os militares são organizados hierarquicamente, com maior


responsabilidade atribuída ao posto mais alto. As organizações humanitárias são estruturadas
de forma mais horizontal, com muitas responsabilidades atribuídas a funcionários (jovens) no
campo.

• Os militares operam sob ordens e em fileiras fechadas, enquanto os agentes humanitários


favorecem a abertura e a discussão.

• As operações militares são baseadas em planejamento, treinamento e rotações pré-arranjadas,


enquanto as humanitárias têm maior probabilidade de operar em uma base ad hoc.

• Os militares operam principalmente a "curto prazo" com um prazo de encerramento e


transferência, enquanto os humanitários trabalham a longo prazo — eles geralmente operam
em um país muito antes de uma crise — e procuram estabelecer relacionamentos sustentáveis
com a população afetada.

• Os humanitários enfatizam o processo, a inclusão e a adaptabilidade, enquanto os militares


trabalham de acordo com seus regulamentos e procedimentos operacionais padrão (do inglês,
Standard Operating Procedures — SOPs).

• Em geral, os militares não precisam de arrecadação de fundos, enquanto o financiamento pode


ser um desafio para os trabalhadores humanitários e para a implementação de seus projetos
no campo.

Possíveis mecanismos de ligação

Dependendo do contexto, os trabalhadores humanitários podem estabelecer ligação com os militares


de diferentes maneiras, que vão desde a cooperação até a coexistência. Durante o terremoto e o tsunami
do Oceano Índico de 2004, militares e trabalhadores humanitários estabeleceram uma estrutura de
coordenação comum em U'Tapao, Tailândia, onde ocuparam o mesmo complexo e compartilharam o
mesmo espaço de trabalho, ferramentas e informações (ou seja, cooperação total). Em um contexto
relacionado a conflito, a cooperação total pode não ser possível. Nesses casos, os humanitários podem
não querer serem vistos junto com os militares de forma a não comprometer a missão por meio de
uma percepção de falta de neutralidade e/ou imparcialidade. A troca de informações também pode ser
um desafio. Nesse caso, a CMCoord (Coordenação Civil-Militar Humanitária) pode atuar como terceiro
ou interlocutor por meio de um pessoal especialmente treinado para a tarefa de estabelecer contato
(direto) entre os trabalhadores humanitários e os militares. A vantagem de usar oficiais da CMCoord
é que eles entendem a linguagem e os sistemas tanto dos trabalhadores humanitários quanto dos
militares. Muitos oficiais da CMCoord têm experiência militar e, portanto, têm um bom conhecimento da
cultura militar, o que pode ser desafiador para os civis.

65
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

Implantação em tempo
Peacetime Deployment Peacekeeping
Manutenção da paz Peace Enforcement
Imposição da paz Combat
Combate
de paz

Cooperação
Cooperation Cooperação
Cooperation Coexistence
Coexistência

Co-Location
Co-locação Liaison Exchange
Intercâmbio de Ligação LiaisondeVisits
Visitas ligação Interlocutor
Interlocutor

HUM HUM HUM HUM

LO
MIL LO

LO UN-CMCoord

MIL LO

MIL MIL

Compartilhamento de informações

Sempre que possível, deve haver a troca de informações entre trabalhadores humanitários e
militares. O tipo de troca de informações muitas vezes dependerá do contexto existente, desde um
contexto puramente humanitário (por exemplo, um desastre natural) a uma situação de conflito em
que algumas informações podem ser confidenciais ou apenas parcialmente liberadas a terceiros (por
exemplo, trabalhadores humanitários). Com os militares, o compartilhamento de informações é realizado
principalmente com base na “necessidade de saber”, mas poderia ser mais apropriado utilizar uma
abordagem baseada numa “necessidade de compartilhar”. Devido ao seu impacto direto ou indireto nas
populações afetadas e nos trabalhadores humanitários, a maioria aceita que as seguintes informações
devam ser compartilhadas:

• Informações de segurança (por exemplo, sobre áreas perigosas onde atividades armadas
possam ameaçar atividades humanitárias, áreas infestadas de minas identificadas, etc.).

• Locais humanitários (por exemplo, para evitar ações militares nesses locais tanto quanto possível
e para que os militares planejem atividades de proteção específicas para essa área, etc.);

• Atividades humanitárias (por exemplo, para não perturbar ou dificultar as ações humanitárias
em andamento);

• Atividades de ação contraminas (por exemplo, áreas onde essas atividades ocorrem e seu
impacto potencial nas ações humanitárias em andamento);

• Movimentos populacionais (por exemplo, quando e onde ocorrerão e seu impacto nas atividades
militares potenciais, planejadas ou em andamento);

66
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

• Atividades de socorro aos militares (por exemplo, áreas que os trabalhadores humanitários
devem evitar para não serem confundidos com os participantes dessas atividades); e

• Informações pós-ataque (por exemplo, onde restos de munição usadas durante ataques
recentes podem estar localizados, etc.).

Deve ficar claro que o ramo de inteligência de uma unidade militar eventualmente receberá todas
as informações fornecidas aos militares. Os oficiais da CIMIC sabem que a coleta de informações pode
prejudicar o relacionamento entre aqueles que originalmente receberam essas informações e a fonte.
Os trabalhadores humanitários devem reconhecer que podem receber informações contendo dados
específicos e detalhados para identificar um vazamento que poderia comprometer contatos futuros
entre o ator humanitário e a fonte. O mesmo se aplica aos oficiais da CIMIC quando conversam com
atores locais no terreno.

Abordagem abrangente e trabalhadores humanitários como multiplicadores de força

Conforme declarado anteriormente, certas organizações wilsonianas estão intimamente ligadas ao


governo dos Estados Unidos e podem estar mais dispostas a aceitarem certas influências. Na Conferência
Nacional de Política Externa para Líderes de Organizações Não Governamentais, o ex-Secretário de
Estado dos EUA Colin Powell afirmou:

“A própria natureza do mundo do século [vinte e um] ... torna a cooperação entre o
governo e as ONGs não apenas altamente desejável, mas absolutamente essencial e
necessária. Mais do que nunca, governos e organizações intergovernamentais devem
trabalhar em parceria com ONGs para que problemas urgentes sejam resolvidos de
forma eficaz. … Falo sério quanto a garantir que tenhamos o melhor relacionamento
possível com as ONGs, que são um multiplicador de força para nós, uma parte tão
importante de nossa equipe de combate7.”

Há uma tendência de “instrumentalizar” as organizações humanitárias no governo, apresentando


a seguinte questão: onde as ONGs traçam a linha divisória entre sua organização e o governo? Para
a maioria das ONGs, isso permanece claro. Se eles se considerarem multiplicadores de forças para os
políticos e a política externa, colocando em risco sua independência para agir, e descobrirem que a
ajuda que fornecem está sendo usada contra as pessoas que desejam ajudar, eles se retirarão.

A OTAN reintroduziu a expressão “abordagem abrangente” (do inglês, comprehensive approach —


CA) (também chamada de “gestão abrangente de crises”) em 2008, durante as guerras no Afeganistão
e no Iraque. Uma CA visa criar uma estrutura por meio da qual os esforços civis e militares locais,
nacionais e internacionais se complementem para alcançar a estabilidade de longo prazo. A intervenção
militar pode estabilizar uma situação de crise ou conflito a curto prazo, mas raramente garantirá um
Estado em pleno funcionamento com o estado de direito. O Seminário de Helsinque descreveu uma
CA como o desejo de “alcançar melhores resultados para resolver uma crise integrando as dimensões
política, de segurança, estado de direito, direitos humanos e humanitária das missões internacionais8”.

7) Colin Powell, “Comentários à Conferência Nacional de Política Externa para Líderes de Organizações Não Governamentais”, 26 de outubro de 2001.
Disponível em inglês: <https://2001-2009.state.gov/secretary/former/powell/remarks/2001/5762.htm>.
8) Kristiina Rintakoski e Mikko Autti, eds., “Publicação do Seminário sobre Abordagem Abrangente: Tendências, Desafios e Possibilidades para Cooperação na
Prevenção e Gestão de Crises”, Seminário de Abordagem Abrangente, Seminário 17, Helsinque, Finlândia, junho de 2008. Disponível em inglês: <https://
www.defmin.fi/files/1316/Comprehensive_Approach_-_Trends_Challenges_and_Possibilities_for_Cooperation_in_Crisis_Prevention_and_Management.pdf>.

67
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

De acordo com o analista estratégico Julian Lindley-French, a:

“Abordagem abrangente é a geração e aplicação de segurança, governança e


serviços de desenvolvimento, experiência, estruturas e recursos ao longo do tempo
e a distância em parceria com nações anfitriãs, regiões anfitriãs, governos aliados e
parceiros e instituições parceiras, governamentais e não governamentais9.”

As organizações humanitárias estão dispostas a entrar nessa CA? Os esforços militares em colaborar
com as ONGs podem não ser realistas, mesmo quando os militares entendem as objeções das ONGs em
se tornarem parte de um conflito, especialmente se o objetivo da colaboração for complementar o “poder
brando” da ONG com o “poder duro” dos militares. O desenvolvimento de uma visão compartilhada e
uma estrutura estratégica comum é a principal preocupação ao responder a uma crise. Colocar os
agentes humanitários junto com os militares e outros atores (por exemplo, as partes em um conflito em
andamento) em torno da mesma mesa para discutir uma CA pode ser demais para muitas agências. As
partes devem compreender o modus operandi umas das outras, construir uma cultura de confiança e
envolver as autoridades locais desde o início, dando-lhes a propriedade da CA, antes que as organizações
humanitárias estejam dispostas a aderir de alguma forma a essa abordagem.

O caso de uma força ocupante em um país


apresenta um cenário especial. De acordo com as
Convenções de Genebra, as forças de ocupação são
legalmente obrigadas a fornecer socorro e ajuda à
reconstrução do país ocupado. Em muitos casos,
essa força militar de ocupação terá total controle
dos recursos disponíveis e definirá os parâmetros
do esforço de socorro e reconstrução, o que pode
alienar algumas agências se aderirem aos princípios
humanitários. No caso da ocupação do Iraque, Forças de paz peruanas com a Missão de Estabilização das
Nações Unidas no Haiti (MINUSTAH) e os EUA Oficiais do
o centro de operações humanitárias foi dirigido
Exército fazem a segurança de um ponto de distribuição do
pelo Pentágono dos Estados Unidos e não por Programa Mundial de Alimentos da ONU, em coordenação
organizações humanitárias. com a GOAL, uma agência humanitária internacional, em
Porto Príncipe, Haiti. 5 de fevereiro de 2010. Foto da ONU
É essencial que os militares e trabalhadores por Sophia Paris.
humanitários encontrem seus pontos comuns e
estabeleçam um diálogo entre si. Compreender o outro lado pode muitas vezes ser o início de um
relacionamento confiável.

Seção 3.4 Militares nacionais versus militares internacionais


A (não) participação do exército nacional no UN-CMCoord é um assunto confuso. Os militares
nacionais fazem parte da primeira camada nacional de resposta. Eles consistem principalmente em
forças armadas nacionais, estruturas paramilitares e forças de fronteira, alfandegárias e de segurança.
A percepção da população sobre todas ou parte dessas forças (por exemplo, sua credibilidade) pode
impactar significativamente a cooperação com atores internacionais humanitários e militares.

9) Julian Lindley-French, "Operacionalizando a Abordagem Abrangente", Atlantic Council Issue Brief, 1. Disponível em inglês: <https://www.files.ethz.
ch/isn/117263/ComprehensiveApproach_SAGIssueBrief.PDF>.

68
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

Os militares internacionais consistem em operações de manutenção da paz da ONU, operações


regionais de manutenção da paz ou militares estrangeiros estacionados no país/região ou com um
acordo militar bilateral. Às vezes, também incluem a Polícia da ONU, empresas de segurança privada e
outros atores.

Na maioria das circunstâncias, o CMCoord da ONU aborda os aspectos internacionais, mas os


humanitários não devem subestimar as capacidades nacionais, especialmente em países onde o auxílio
em desastres e a coordenação fazem parte do mandato conferido aos militares nacionais. Além disso,
os militares nacionais serão fundamentais para recepcionar a chegada dos militares internacionais na
maioria dos casos.

Os trabalhadores humanitários também devem considerar as relações entre os atores civis nacionais
e internacionais, o que pode ajudar a determinar onde reside o poder de tomada de decisão.

Seção 3.5 Os Princípios Militares e Humanitários — “O que uma


palavra significa?”
A Lição 1 abordou algumas definições comuns dos princípios humanitários. Esta lição oferece um
exame mais detalhado das definições mais comuns desses princípios segundo os militares.

Três princípios básicos orientam a manutenção da paz da ONU10:

• Consentimento entre as partes;

• Imparcialidade; e

• O não uso da força exceto em legítima defesa e em defesa do mandato.

A imparcialidade é entendida como um objetivo do mandato e requer uma execução


consistente — independentemente da provocação ou do desafio. Imparcialidade não significa inação
ou negligência em violações.

“Os mantenedores da paz da ONU devem ser imparciais em suas negociações com
as partes em conflito, mas não neutros na execução de seu mandato, ou seja, eles
devem buscar ativamente a implementação de seu mandato, mesmo que isso vá
contra os interesses de uma ou mais partes11.”

Os termos “neutralidade” e “imparcialidade” são usados de formas diferentes na manutenção da


paz e na ação humanitária. Na manutenção da paz, neutralidade significa não intervenção (não agir),
enquanto imparcialidade significa não lealdade a qualquer parte ou partes. No contexto humanitário,
imparcialidade significa não discriminação com base em raça, sexo, credo, religião, etc., enquanto
neutralidade significa não tomar partido no conflito (ver tabela abaixo).

Atores Tipo Neutralidade Imparcialidade


Militares Manutenção da paz Não intervenção Não-fidelidade
Humanitário Ação humanitária Não-fidelidade Não discriminação

10) OCHA, Manual de Campo UN-CMCoord (v2.0), 97. Disponível em inglês: <https://www.unocha.org/publication/un-cmcoord-field-handbook>.
11) UC Jha e K. Ratnabali, A Lei dos Conflitos Armados: Uma Introdução. Delhi, Índia, Vij Books India Pvt Ltd, 2017.

69
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

Imparcialidade — “… se a força é usada contra uma parte em particular, deve ser apenas por
causa do que essa parte está fazendo (ou não) em relação ao mandato, e não por quem ela é.

Imparcialidade não deve ser confundida com neutralidade. Fazer isso limita a
flexibilidade e o potencial para exercer a iniciativa; também promove a passividade
e, consequentemente, limita o desenvolvimento da missão. A imparcialidade, talvez
melhor descrita como imparcialidade baseada em princípios, requer um certo grau de
[julgamento] contra um conjunto de princípios, ou o mandato, ou ambos, enquanto a
noção de neutralidade não. A condução das [Operações de Apoio à Paz (PSOs)] será
imparcial para as partes, mas nunca neutra na execução da missão12.”

Os comandantes enfrentarão a luta constante para gerenciar a percepção de imparcialidade. Deixar de


manter a imparcialidade pode facilmente empoderar uma das partes sobre a outra. Portanto, os militares
devem agir com transparência para sustentar a percepção de imparcialidade, mesmo que algumas partes
no conflito ou a população afetada possam ter outra visão. Por exemplo, uma Força de Apoio à Paz (do
inglês, Peace Support Force — PSF) pode ser responsável por proteger civis em uma área que também
inclui forças de segurança nacional. Quaisquer que sejam as intenções do PSF, mesmo que obrigatório, tal
colaboração ou colocalização pode ser percebida como parcial por outras partes em conflito.

As forças de paz da Zâmbia atuam na Missão de Estabilização Integrada Multidimensional das Nações Unidas na República Centro-
Africana (MINUSCA) no nordeste da República Centro-Africana desde junho de 2019. Aqui estão quatro soldados de paz da Zâmbia
conversando com a população local durante uma patrulha na área para proteger os civis. 5 de fevereiro de 2020. Foto da ONU por
Hervé Serefio.

12) OTAN, Operações de Apoio à Paz AJP-3.4.1, julho de 2001, 3-2. Disponível em inglês: <https://info.publicintelligence.net/NATO-PeaceSupport.pdf>.

70
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

As regras de engajamento (do inglês, Rules of Engagement — ROEs) definem como o pessoal
do PSF deve se comportar e reagir. Elas “são diretrizes que delineiam as circunstâncias e limitações
sob as quais a força pode ser usada. As ROEs refletirão restrições legais e políticas, mas não podem
limitar o exercício de autodefesa ou inibir a capacidade de um comandante de tomar todas as medidas
necessárias para proteger sua força13”.

Embora os militares e os trabalhadores humanitários usem definições diferentes para os princípios


humanitários, eles buscam os mesmos objetivos; ambos reagirão contra a parte que se opõe ao
mandato, independentemente de quem sejam, e ambos não são neutros na execução do seu mandato
ou missão.

Seção 3.6 Oslo, MCDA e Diretrizes específicas do país — Um breve


panorama
As Diretrizes de Oslo fornecem orientação sobre o uso de recursos militares e de defesa civil
estrangeiros no socorro a desastres, especificamente, no desdobramento de meios de defesa civil-
militar (do inglês, military-civil defence assets — MCDA14), que são mais comumente conhecidos
como recursos militares estrangeiros (do inglês, foreign military assets — FMA15). As diretrizes foram
estabelecidas em 1994 e revisadas em 2007, e o IASC e várias organizações da ONU as endossaram.
Elas não são vinculativas, mas amplamente aceitas e descrevem ações e atividades potenciais para o
país que fornece os MCDA, os países de trânsito e o país receptor. A comunidade humanitária solicita
MCDA e baseia a solicitação em vários conceitos-chave16:

• Último recurso;

• Complementaridade;

• Sem custos (para a nação receptora);

• Sem armamentos (os militares devem vir desarmados e usando uniforme militar nacional e
respeitar o código de conduta humanitária);

• Distinção (deve haver uma distinção clara entre as unidades de MCDA e outras unidades
militares envolvidas em outras missões);

• Evitar dependência em MCDA/FMA;

• Limitação em tempo e escala; e

• Controle Civil17.

13) OTAN, Operações de Apoio à Paz AJP-3.4.1, 3-5.


14) Conforme definido pelas Diretrizes de Oslo: “Os MCDA compreendem pessoal, equipamento, suprimentos e serviços de socorro fornecidos por
organizações militares e de defesa civil estrangeiras para a Assistência Internacional para Resposta a Desastres [do inglês, International Disaster
Relief Assistance — IDRA]. Além disso, uma organização de defesa civil é qualquer organização que, sob o controle de um governo, desempenha as
funções enumeradas no parágrafo 61 do Protocolo Adicional I às Convenções de Genebra de 1949. Quando essas forças estão sob o controle da ONU,
são chamadas de UN MCDA.”
15) OCHA, Diretrizes de Oslo, Diretrizes sobre o Uso de Ativos Militares e de Defesa Civil Estrangeiros no Socorro em Desastres, Revisão 1.1, novembro
de 2007, 7.
16) A Lição 4 aborda esse tema mais detalhadamente.
17) Consulte a Seção 3.7 para obter detalhes sobre os conceitos de último recurso, complementaridade, evitar dependência em MCDA/FMA, limitação em
tempo e escala e Controle Civil.

71
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

Diretrizes de MCDA para Emergências Complexas

O IASC endossou essas diretrizes não vinculativas em 2003. Em 2006, foi lançada uma versão
revisada que orientava o uso de FMA — incondicional e baseado apenas em necessidades — em
emergências complexas. O documento discute o impacto de FMA no ambiente operacional.

Além dos três princípios humanitários de humanidade, neutralidade e imparcialidade, a ONU


acrescentou um quarto: a soberania. As Nações Unidas procuram prestar assistência humanitária com
total respeito à soberania dos Estados.

“A soberania, integridade territorial e unidade nacional dos Estados devem ser


plenamente respeitadas de acordo com a Carta das Nações Unidas. Nesse contexto,
a assistência humanitária deve ser fornecida com o consentimento do país afetado e,
em princípio, com base em um recurso do país afetado18.”

“[O] Estado afetado tem o direito de recusar o uso dos UN MCDA ou de outros
recursos militares e de defesa civil pelas agências humanitárias da ONU, conforme o
caso19.”

Como afirmado anteriormente, o Estado afetado é responsável pela segurança dos trabalhadores
humanitários. Isso também serve para:

“UN MCDA operando em apoio às atividades humanitárias da ONU da mesma


maneira que proveriam segurança a outro pessoal ou recursos humanitários da ONU.
UN MCDA devem ter pelo menos a mesma liberdade de movimento, imunidades,
privilégios e isenções concedidos às agências humanitárias da ONU ao trabalhar
no apoio a essas atividades, incluindo quando estão em rota e retornando às suas
unidades ou estações20.”

Se as forças militares que fornecem assistência indireta ou missões de apoio à infraestrutura


requerem armas para sua segurança e/ou proteção de seu equipamento, elas devem operar sob estritas
Regras de Engajamento baseadas no Direito Internacional dos Conflitos Armados (DICA).

Em princípio, as forças militares (exceto UN MCDA) que realizam missões de assistência não
recebem proteção especial, nem estão autorizadas a exibir os emblemas das agências humanitárias
da ONU que apoiam. A implantação de MCDA normalmente estará sujeita a um Acordo de Estatuto de
Forças (do inglês, Status of Forces Agreement — SOFA), que detalha a estrutura legal e o status do
pessoal de MCDA envolvido na ação/missão.

Os princípios-chave das Diretrizes de MCDA para Emergências Complexas são os mesmos das
Diretrizes de Oslo, mas com várias considerações adicionais, tais como21:

• Hierarquia de tarefas (apoio militar centrado na ajuda indireta e no apoio à infraestrutura;


assistência direta apenas como opção de último recurso);

• Compartilhamento de informações;

18) IASC, Diretrizes Civis-Militares e Referência para Emergências Complexas, 2008, 49. Disponível em inglês: <https://reliefweb.int/report/world/civil-
military-guidelines-reference-complex-emergencies>.
19) IASC, Diretrizes Civis-Militares e Referência para Emergências Complexas, 61.
20) IASC, Diretrizes Civis-Militares e Referência para Emergências Complexas, 61.
21) Consulte o Manual de Campo UN-CMCoord (v2.0).

72
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

• Requisito de ligação;

• Último recurso (existe um grande risco de


percepção da ajuda humanitária22); e

• Não causar danos (efeitos positivos imediatos


devem ser cuidadosamente equilibrados com
potenciais efeitos negativos de longo prazo).

As emergências em grande escala envolvendo


muitos atores militares requerem “diretrizes
específicas de cada país” para fornecer orientação e
esclarecimento adicionais e garantir uma interação
coerente entre os atores humanitários e militares23.
Soldados de paz servindo com a MINUSCA escoltam um
A Seção de Coordenação Civil-Militar do OCHA (do
comboio de caminhões que transportam mercadorias na
inglês, Civil-Military Coordination Section — CMCS) fronteira da República Centro-Africana com Camarões
ou o oficial do CMCoord em apoio (conselheiro) à através do corredor Bangui-Douala. 9 de maio de 2017.
Foto da ONU por Hervé Serefio.
comunidade humanitária podem estabelecer essas
diretrizes. Isso pode resultar na criação de SOPs e
diretivas adicionais, bem como de uma plataforma de coordenação comum24.

O documento do IASC “Uso de escoltas militares ou armadas para comboios humanitários” fornece
diretrizes adicionais não vinculativas que os profissionais devem consultar quando envolvidos em tais
operações25. Se e como as escoltas armadas ou militares são realizadas derivará do seu mandato e essa
informação será traduzida em ROEs26.

O uso de escolta armada é uma ação militar complexa que deve ser analisada em todos os seus
detalhes para identificar potenciais danos e consequências. Os profissionais devem reconhecer as
diferenças entre os militares nacionais e internacionais (tanto da ONU quanto de terceiros). Eles devem
se perguntar se a proteção militar ou armada para comboios humanitários é o curso de ação apropriado.
Existem outras alternativas ou essa é a última opção27? Como a associação com atores militares
comprometeria a imparcialidade das organizações humanitárias? Quais são as consequências de não se
usar escoltas armadas ou militares para comboios humanitários? Em muitos casos, o uso de escoltas
armadas tem consequências negativas, conforme mostrado nas diretrizes:

• “A cooperação com uma força militar externa, incluindo a cooperação com uma força com
mandato da ONU, pode levar os atores locais a associarem as organizações humanitárias aos
objetivos políticos e militares dessa força.

22) Consulte a Seção 3.7 para obter mais informações.


23) Por exemplo, consulte: OCHA, "Orientação sobre o uso de meios militares e de defesa civil estrangeiros (MCDA) Tufão Haiyan (Yolanda), Filipinas", 12
de novembro de 2013. Disponível em inglês: <https://www.cmdrcoe.org/download.php?id=121>.
24) Para obter informações adicionais, consulte a Lição 4.
25) IASC, “Uso de escoltas militares ou armadas para comboios humanitários”, 14 de setembro de 2001. Disponível em inglês: <https://reliefweb.int/
report/world/use-military-or-armed-escorts-humanitarian-convoys>.
26) “Qualquer proteção esperada de um componente militar de uma operação de paz da ONU para comboios humanitários deve ser consistente com o
mandato de operação de paz da ONU conforme estabelecido pelo Conselho”. IASC, “Uso de escoltas militares ou armadas para comboios humanitários”.
27) Consulte a Seção 3.7 para obter detalhes adicionais.

73
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

• A cooperação com escoltas armadas ou militares que não têm capacidade para prevalecer em
caso de ataque e manter as rotas abertas para novos comboios pode tornar um comboio ou rota
de comboio mais vulnerável do que sem escolta.

• A dependência do apoio de uma força militar ou armada, estrangeira ou local, muitas vezes
torna impossível operar sem essa força.

• A cooperação com um beligerante pode tornar impossível ou inseguro operar em território


controlado por outro beligerante, a menos que haja um acordo de transferência na fronteira28.”

De acordo com as diretrizes, existem seis princípios operacionais gerais em relação ao uso de todos
os meios militares em apoio às operações humanitárias:

• “As decisões de aceitar recursos militares devem ser tomadas por organizações humanitárias,
não por autoridades políticas, e com base apenas em critérios humanitários.

• Os recursos militares devem ser solicitados apenas onde não houver alternativa civil comparável
e apenas o uso de recursos militares pode atender a uma necessidade humanitária crítica. O
recurso militar deve, portanto, ser único em natureza ou oportunidade de desdobramento, e
seu uso deve ser o último recurso.

• Uma operação humanitária com recursos militares deve manter sua natureza e caráter civil.
A operação deve permanecer sob a autoridade e controle geral da organização humanitária
responsável por aquela operação, quaisquer que sejam os arranjos de comando específicos para
o próprio recurso militar. Na medida do possível, o recurso militar deve operar desarmado e ter
aparência civil.

• Os países que fornecem pessoal militar para apoiar as operações humanitárias devem garantir
que respeitam o código de conduta e os princípios da organização humanitária responsável por
esse destacamento.

• Deve-se evitar o envolvimento em larga escala de militares na entrega direta de assistência


humanitária.

• Qualquer uso de meios militares deve assegurar que a operação humanitária mantenha seu
caráter internacional e multilateral29.”

A questão da sustentabilidade é outro fator a ser considerado ao usar comboios armados. O que
acontece se o elemento de segurança não estiver disponível ou a situação de segurança se deteriorar
a tal ponto que a suspensão — ou mesmo a retirada — sejam as únicas soluções possíveis? A pressão
política para manter os comboios em condições de risco inaceitavelmente alto raramente é uma maneira
eficaz de atender às necessidades humanitárias e é mais frequentemente vista como uma desculpa para
não abordar as causas profundas de uma crise humanitária.

A comunidade humanitária deve realizar o processo de negociação como uma ação coletiva, e isso
deve resultar em um acordo que detalha as responsabilidades e o modo de operação de todas as partes.

28) IASC, “Uso de escoltas militares ou armadas para comboios humanitários”, 82.
29) IASC, “Uso de escoltas militares ou armadas para comboios humanitários”, 82.

74
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

Seção 3.7 Diferentes tipos de assistência e opções de último


recurso
Em geral, os militares internacionais podem realizar três tipos de assistência em operações de ajuda
humanitária:

• Assistência direta;

• Assistência indireta; e

• Suporte de infraestrutura.

O tipo de conduta que realizam depende principalmente da situação no terreno para definir qual é a
mais adequada para apoiar a ação humanitária. A tabela a seguir mostra a relação (o que pode e o que
não pode ser feito) entre os tipos de assistência e as diferentes missões militares possíveis.

De acordo com o Manual de Campo UN-CMCoord, a assistência direta é a distribuição de bens


e serviços pessoalmente (por exemplo, distribuição de alimentos para a população afetada). Os
trabalhadores humanitários devem ter muito cuidado ao fornecer este tipo de apoio durante as operações
de socorro. Embora os militares possam considerar este o tipo de assistência mais gratificante para a
população afetada, ela também acarreta alguns riscos. Os soldados podem ter que transitar da função de
distribuidor de itens de ajuda humanitária para uma comunidade, estabelecendo bons relacionamentos,
para uma função mais militar nessa mesma comunidade, devido a mudanças na segurança do ambiente
local. Como isso pode afetar o soldado e sua atitude em relação a “sua” missão30?

Availability
A disponibilidade and impartialitydas
e a imparcialidade of forces
forçasdecreases
diminuem

Missão de militares
Mission of military Peace & Security
Atividades de paz e Activities
segurança
Peaceful
Pacífico Peacekeeping
Manutenção da Imposição da
Combat
Combate
Humanitarian Tasks Peace Enforcement
Tarefas Humanitárias paz paz

Direct
Direto Maybe
Talvez Maybe
Talvez Não
No Não
No

Indireto
Indirect Sim
Yes Talvez
Maybe Talvez
Maybe Não
No

Infrastructure
Suporte de
Sim
Yes Sim
Yes Talvez
Maybe Talvez
Maybe
infraestrutura
Support

Visibility ofda
A visibilidade task decreases
tarefa diminui Manual de Campo UN-CMCoord (v1.0), Seção OCHA CMCoord, 104. Disponível em
inglês: <https://reliefweb.int/report/world/un-cmcoord-field-handbook-v10> .

30) Seção OCHA CMCoord, o Manual de Campo UN-CMCoord (v2.0), 76.

75
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

» A assistência indireta é “pelo menos uma etapa removida


da população” e envolve atividades como o transporte de
itens de ajuda ou pessoal humanitário (por exemplo, um
meio de transporte logístico militar carregado com pacotes de
alimentos) 31.

» O suporte de infraestrutura envolve o fornecimento


de "serviços gerais que facilitam o socorro, mas não são
necessariamente visíveis, ou apenas utilizados para o benefício
da população afetada — como consertando infraestrutura,
operando aeródromos, fornecendo informações meteorológicas,
garantindo acesso a redes de comunicação, etc.” (por exemplo,
unidade de engenharia militar consertando uma ponte em
uma estrada de abastecimento principal também usada por
comboios humanitários32).

Se os militares estrangeiros devem ou não estar envolvidos na assistência humanitária dependerá


de um pedido da comunidade humanitária e nunca deve ser uma iniciativa dos próprios militares33. Se
os militares devem estar envolvidos em tarefas humanitárias, devem fazê-lo apenas como um "último
recurso", o que significa que:

• “uma capacidade específica ou requisito de meio que não pode ser atendido com recursos civis
disponíveis foi identificado” (por exemplo, eles são os únicos que podem fornecer helicópteros
para acessar áreas remotas afetadas para fornecer socorro) 34;

• “os recursos militares e de defesa civil estrangeiros ajudariam a cumprir o requisito e forneceriam
vantagens exclusivas em termos de capacidade, disponibilidade e oportunidade” (por exemplo,
salvam vidas e são fornecidos em curtíssimo prazo35); e

• “recursos militares e de defesa civil estrangeiros complementariam as capacidades civis36.”

A tarefa deve permanecer de caráter civil e sob autoridade civil, mas os comandantes militares
devem permanecer no comando de seus meios desdobrados. Os trabalhadores humanitários não devem
confundir a opção de último recurso com:

• Socorristas (isto é, o exército nacional);

• Acordos bilaterais envolvendo (por exemplo) o exército vizinho; e

• Conceito de Abordagem de Cluster do IASC de “Provedor de último recurso37”.

Os militares estrangeiros devem ser envolvidos pelo menor tempo possível. Sempre que uma
alternativa civil estiver disponível, ela deve ser utilizada para a tarefa. Visto que o fornecimento de FMA
é geralmente gratuito, algumas agências e organizações tendem a usar esses ativos pelo maior tempo

31) OCHA CMCoord Section, Manual de Campo UN-CMCoord (v2.0).


32) OCHA CMCoord Section, Manual de Campo UN-CMCoord (v2.0).
33) A Lição 4 abordará esse tema mais detalhadamente.
34) OCHA/ESB/CMCS, Recursos militares e de defesa civil estrangeiros em apoio a operações de emergência humanitária, abril de 2012, 1. Disponível em
inglês: <https://www.unocha.org/sites/dms/Documents/Last%20Resort%20Pamphlet%20-%20FINAL%20April%202012_5.3.pdf>.
35) OCHA/ESB/CMCS, Recursos militares e de defesa civil estrangeiros em apoio a operações de emergência humanitária, 1.
36) OCHA/ESB/CMCS, Recursos militares e de defesa civil estrangeiros em apoio a operações de emergência humanitária, 1.
37) A Lição 4 aborda esse tema mais detalhadamente.

76
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

possível. Nesse caso, o país corre o risco de se tornar muito dependente de militares estrangeiros para
a execução de uma ação humanitária. Na maioria dos casos, as autoridades nacionais do país afetado
indicam quando os FMAs devem deixar o país.

Seção 3.8 Adequação de FMAs implantados e risco potencial


A idoneidade das FMA durante uma catástrofe é um assunto à parte. Como visto anteriormente,
alguns FMAs são essenciais para ajudar as comunidades humanitárias (por exemplo, helicópteros),
como visto durante o terremoto e o tsunami do Oceano Índico de 2004, e o tufão Haiyan em 2013. Os
trabalhadores humanitários e suas organizações muitas vezes enfrentam desafios para acessar a área
e a população afetada, e os FMA se tornam a única opção viável devido à indisponibilidade de recursos
civis semelhantes. Os praticantes devem se preparar adequadamente para tais missões, especialmente
quando se tratar de “assistência direta”. Por exemplo: ao descarregar um helicóptero, uma organização
planejará a recepção desse material no solo para manter as pessoas afastadas da aeronave pairando
ou pousando?

Rações e hospitais militares de campanha

Os princípios de “não causar danos” também devem prevalecer e nortear a entrega de refeições
prontas (mais conhecidas como rações) como alternativa à alimentação, e também o uso de hospitais
militares de campanha para o tratamento de civis feridos. Rações são porções alimentares individuais,
mas podem não ser adequadas para a distribuição em resposta a um desastre. Seu conteúdo
e embalagem podem ser diferentes dependendo da cultura do exército estrangeiro fornecedor, e o
contexto da área e da população afetada devem ser levados em consideração ao utilizá-las. A culinária
local os alimentos a que a população afetada está acostumada devem ser levados em consideração.
A maioria das populações afetadas prepara suas refeições para uma família, e não individualmente. O
conteúdo da ração pode não corresponder aos gostos locais. Em muitos casos, a embalagem da ração
não traz as instruções para preparação no idioma local. Além disso, esquentar as rações pode ser
perigoso se as instruções não forem seguidas de forma apropriada ou se crianças tentarem fazê-lo de
forma inadequada.

Os hospitais militares de campanha se concentram geralmente em cirurgias resultantes da guerra


e não no trauma específico encontrado após desastres naturais. Eles não possuem necessariamente
todos os especialistas médicos (por exemplo, pediatras, ginecologistas, etc.), a menos que o hospital
esteja preparado especificamente para emergências típicas de desastres. O conceito de “não causar
danos” também se aplica a hospitais militares de campanha. Os médicos precisam considerar os efeitos
dessa assistência, fazendo perguntas como: Por quanto tempo este hospital de campo existirá? O que
acontecerá com os pacientes em tratamento depois que o hospital for desativado? Os pacientes podem
ser transferidos para outras instalações médicas que garantam qualidade semelhante? Como será feita
a transferência de pacientes e as consultas de acompanhamento? Como o apoio médico militar afetará
a capacidade local existente? Seria melhor reforçar e apoiar a capacidade médica local existente para
evitar o colapso do sistema após a retirada dos militares? O apoio nunca deve ser insustentável para as
autoridades de saúde locais.

77
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

Militares da Jamaica ajudam a construir unidades de armazenamento para o Programa Mundial de Alimentos no porto de Marsh
Harbour depois que o furacão Dorian, de categoria cinco, varreu as ilhas Bahamas de Abaco e Grand Bahama. 12 de setembro de
2019. Foto da ONU por OCHA/Mark Garten.

Seção 3.9 Desafios nos espaços militares e humanitários


O que é espaço humanitário? A frase não tem uma definição comum. De acordo com a OCHA, “o
espaço humanitário refere-se a um ambiente operacional que permite aos atores humanitários fornecer
assistência e serviços de acordo com os princípios humanitários e em conformidade com o Direito
Internacional Humanitário38”.

De acordo com o Overseas Development Institute, os entendimentos mais comuns do espaço


humanitário incluem:

• “o acesso físico que as agências internacionais de ajuda e seus parceiros têm às populações
necessitadas;

• a capacidade das agências assistenciais tem de aderir aos princípios fundamentais da ação
humanitária;

• a natureza do 'ambiente operacional' em que trabalham, especialmente as condições de


segurança; e

• a capacidade das próprias populações de "ter acesso à assistência e proteção necessárias para
salvar vidas39”.

38) Instituto de Desenvolvimento Ultramarino do Grupo de Política Humanitária “Espaço Humanitário: Resumo da Reunião de Conceitos, Definições e
Usos”, 20 de outubro de 2010, 1. Disponível em inglês: <https://reliefweb.int/report/world/humanitarian-space-concept-definitions-and-uses>.
39) Instituto de Desenvolvimento Ultramarino do Grupo de Política Humanitária “Espaço Humanitário: Resumo da Reunião de Conceitos, Definições e
Usos”, 1.

78
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

Em seu artigo “Encolhendo o Espaço Humanitário? Tendências e perspectivas em segurança e


acesso”, afirmam os pesquisadores de assuntos internacionais Don Hubert e Cynthia Brassard-Boudreau:

“As avaliações da existência de espaço humanitário diferem substancialmente com


base na perspectiva de organizações particulares e nos critérios específicos que
elas escolheram adotar. Não fica totalmente claro, portanto, que ‘as necessidades
humanitárias podem ser colocadas em foco e abordadas de forma prática por meio
de uma compreensão mais clara do' espaço humanitário40’.”

Sarah Collinson e Samir Elhawary, pesquisadores do Overseas Development Institute (ODI), criticam
a forma como as principais agências internacionais usam o termo “espaço humanitário”. De acordo
com Collinson e Elhawary, as agências internacionais na verdade o entendem por espaço de agência
— espaço no qual a ONU e as principais ONGs podem operar como quiserem — desconsiderando que
a situação pode ser muito diferente para outros atores que fazem um trabalho humanitário ou para a
população local em risco41.

Alguns argumentam que o espaço humanitário deve ser visto de quatro ângulos diferentes:

“Espaço humanitário como espaço de agência: a agência humanitária está


no centro desta definição, com o espaço humanitário delineando a capacidade da
agência de operar livremente e atender às necessidades humanitárias de acordo com
os princípios da ação humanitária42.”

“Espaço humanitário como espaço da comunidade afetada: a comunidade


afetada está no centro desta definição, com o espaço humanitário delineando sua
capacidade de defender seus direitos à assistência e proteção. A agência humanitária
ainda é essencial; no entanto, reconhece o papel que outros atores desempenham,
incluindo a própria comunidade afetada, no atendimento às necessidades
humanitárias43.”

“Espaço humanitário como direito internacional humanitário: o espaço


humanitário é análogo ao respeito ao direito internacional humanitário segundo esta
definição e, portanto, concentra-se nas ações das partes em conflito com relação
a suas responsabilidades em cumprir a lei. Isso inclui suas responsabilidades de
atender às necessidades humanitárias ou permitir que organizações humanitárias
imparciais forneçam socorro e proteção aos civis44.”

40) Don Hubert e Cynthia Brassard-Boudreau, “Encolher o espaço humanitário? Tendências e Perspectivas sobre Segurança e Acesso”, The Journal of
Humanitarian Assistance, 24 de novembro de 2010.
41) IRIN, “O mito e a mística do espaço humanitário”, 2 de maio de 2012. Disponível em inglês: <http://www.irinnews.org/news/2012/05/02/myth-and-
mystique-humanitarian-space>.
42) Congresso Humanitário de Viena, “O que é Espaço Humanitário?”. Disponível em inglês: <http://www.humanitariancongress.at/humanitarian-space>.
43) Congresso Humanitário de Viena, “O que é Espaço Humanitário?”.
44) Congresso Humanitário de Viena, “O que é Espaço Humanitário?”.

79
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

“Espaço humanitário como arena política, militar e jurídica complexa: a


definição ... destaca o contexto em que a ação humanitária ocorre. Ele destaca a
natureza altamente política da tarefa que as agências humanitárias procuram realizar e
que as necessidades humanitárias (e seu alívio) são um produto da interação dinâmica e
complexa de atores políticos, militares e legais, interesses, instituições e processos45.”

Para fins práticos (e reconhecendo sua incompletude), este curso define o espaço humanitário como:

» O ambiente operacional seguro necessário para que os atores


humanitários operem de acordo com os princípios humanitários para
acessar a população necessitada, livre de qualquer pressão externa; e

» O espaço dado à população afetada para acessar seus direitos e receber


proteção e assistência respeitando sua dignidade humana.

Desafios para os militares

Durante o conflito armado, os militares


compartilham o mesmo espaço geográfico com as
agências humanitárias. Esse espaço compartilhado
costuma ser fonte de atrito e frustração para a
comunidade humanitária. As fronteiras nas quais
todos trabalham e as funções e responsabilidades
de outros atores no campo de batalha podem se
tornar cada vez mais complexas, especialmente
em relação ao papel dos militares na entrega de
assistência humanitária, incorporando operações
humanitárias em estratégias de contra-insurgência
ou integrando ação humanitária em missões da ONU
de multimandatos46.

Em 1997, General Charles C. Krulak, o


comandante do Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA,
desenvolveu a ideia de uma "guerra de três blocos"
Trinta e cinco soldados do Reino Unido chegam a Juba
para descrever o que ele previu que seria o típico para se juntarem ao contingente britânico da Missão das
campo de batalha do século XXI: Nações Unidas na República do Sudão do Sul (MINUSS). 2
de maio de 2017. Foto da ONU por Isaac Billy.
“Será um campo de batalha assimétrico.
… Em um momento, nossos membros
do serviço estarão alimentando e vestindo os refugiados deslocados, fornecendo
assistência humanitária. No próximo momento, eles estarão mantendo duas
tribos guerreiras separadas — conduzindo operações de manutenção da paz — e,
finalmente, eles estarão lutando uma batalha altamente letal de média intensidade
45) Congresso Humanitário de Viena, “O que é Espaço Humanitário?”.
46) Hubert e Brassard-Boudreau, “Encolher o espaço humanitário? Tendências e Perspectivas sobre Segurança e Acesso”.

80
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

— tudo no mesmo dia, tudo dentro de três quarteirões da cidade. Será o que
chamamos de ‘guerra de três blocos47’.”

A visão de Krulak era realista ou não? Alguns teatros se parecem com partes do que Krulak
descreveu. Ao analisar sua ideia de “guerra em três blocos”, podemos visualizar os desafios que as
ações militares causarão quando os militares precisarem considerar o espaço e a ação humanitária.
Garantir o espaço humanitário será um quebra-cabeça cada vez mais desafiador para os comandantes
militares. Não é uma desculpa, mas os agentes humanitários devem estar cientes desses desafios
e reconhecer que essas situações táticas no terreno podem impossibilitar a garantia de um espaço
humanitário global. Além disso, essas situações táticas tornarão muito difícil para a população civil e as
partes beligerantes distinguir as atividades militares (isto é, comboios) para fins humanitários daquelas
desdobradas para operações de combate ofensivas.

47) Joseph J. Collins, “Afeganistão: Vencer uma Guerra de Três Blocos”, The Journal of Conflict Studies Vol. 24, nº 2 (2004). Disponível em: <https://
journals.lib.unb.ca/index.php/jcs/article/view/204/361>.

81
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

Questionário de fim de Lição  »

1. Em relação à CIMIC OTAN, qual 4. Os militares nacionais fazem parte da


afirmação é FALSA? primeira camada nacional de resposta
durante uma crise. Eles consistem
A. As ações de CIMIC são realizadas em apoio
principalmente em _____.
à missão.
A. forças armadas nacionais
B. Conquistar a boa vontade da população para
B. estruturas paramilitares
melhor proteger as forças no terreno nunca
é aceitável. C. fronteira e alfândega e forças de segurança

C. Essas ações são condicionais e podem cessar D. Todas as opções anteriores

sempre que as partes no conflito e/ou parte


5. Os termos neutralidade e imparcialidade
da população deixarem de cooperar.
são usados de forma diferente
D. Os agentes humanitários não devem na manutenção da paz e na ação
esquecer que as unidades militares se humanitária. Qual das seguintes
movem e os projetos podem não estar em afirmações é FALSA?
andamento. A. Na manutenção da paz, neutralidade
significa não intervenção (não agir).
2. De acordo com o Manual de Campo UN-
B. Na manutenção da paz, imparcialidade
CMCoord, “UN-CMCoord é o(a) _____
entre os atores civis e militares em significa não fidelidade.
emergências humanitárias”. C. No contexto humanitário, neutralidade
significa não discriminação com base em
A. cooperação e ação essenciais
raça, sexo, credo, religião, etc.
B. diálogo e interação essenciais
D. No contexto humanitário, imparcialidade
C. diálogo e compreensão essenciais
significa não discriminação com base em
D. cooperação e compreensão essenciais
raça, sexo, credo, religião, etc.

3. Qual das afirmações abaixo é FALSA?


6. Qual dos seguintes NÃO é um dos
A. As ONGs devem ser usadas como conceitos-chave sobre o qual a
multiplicadores de força e nunca se opor a comunidade humanitária baseia as
serem coordenadas pelos militares. solicitações de MCDA?
B. Uma CA visa a criar uma estrutura através A. Último recurso
da qual os esforços civis e militares locais, B. Limitação em tempo e escala
nacionais e internacionais se complementem C. Complementaridade
para alcançar a estabilidade de longo prazo. D. O custo será cobrado pela nação receptora
C. Na manutenção da paz, neutralidade
significa não intervenção (não agir),
enquanto imparcialidade significa não
lealdade a qualquer parte ou partes.
D. De acordo com as Convenções de Genebra,
as forças de ocupação são legalmente
obrigadas a fornecer socorro e ajuda à
reconstrução do país ocupado.

As respostas estão disponíveis na página seguinte.

82
LIÇÃO 3 | Os militares e os trabalhadores humanitários

Questionário de fim de Lição  »

7. Qual afirmação sobre os diferentes tipos 9. Qual dos seguintes NÃO é um dos
de assistência é FALSA? razões pelas quais os MREs não são
considerados adequado para distribuição
A. A assistência direta é a distribuição de bens
durante desastres Porque _____.
e serviços pessoalmente.
A. seu conteúdo e embalagem podem ser
B. Embora os militares possam considerar a
diferentes dependendo da cultura do
assistência direta com o tipo de assistência
fornecedor exército estrangeiro
mais gratificante para a população afetada,
B. eles são muito caros
ela também acarreta alguns riscos.
C. o conteúdo de MR Es pode não corresponder
C. A assistência direta é o melhor tipo de
com gostos locais
assistência para fornecer em resposta a
um desastre porque não tem efeitos D. em muitos casos, as instruções para

colaterais negativos. preparar um MR E não são escritos no


idioma local
D. Os soldados podem ter que transitar da função
de distribuidor de itens de ajuda humanitária
10. O espaço humanitário pode ser
para uma comunidade, estabelecendo bons parcialmente definido como o _____
relacionamentos, para uma função mais operacional ambiente necessário para
militar nessa mesma comunidade, devido a a ajuda humanitária atores para operar
mudanças na segurança do ambiente local. de acordo com o _____ princípios para
acessar a população em necessidade,
8. Qual das alternativas a seguir NÃO faz livre de qualquer pressão externa.
parte da definição de “opção de último A. hostil; humanitário
recurso”?
B. seguro; humanitário
A. Quando uma capacidade específica ou requisito C. seguro; militares
de recurso que não pode ser cumprido com
D. difícil; organizacional
recursos civis disponíveis é identificado.
B. Recursos militares e de defesa civil
estrangeiros ajudariam a atender aos
requisitos e forneceriam vantagens
exclusivas em termos de capacidade,
disponibilidade e oportunidade.
C. O item só pode ser adquirido em
mercados locais.
D. Recursos militares e de defesa civil
estrangeiros complementariam as
capacidades civis.

Respostas »
1. B

2. B

3. A

4. D

5. C

6. D

7. C

8. C

9. B

10. B

83
OPERAÇÕES HUMANITÁRIAS

LIÇÃO
Mecanismo de Coordenação
4 Humanitária

Esta lição aborda um


dos principais aspectos
de uma operação de
ajuda humanitária — a
coordenação.

Foto da ONU por Eskinder Debebe.

Nesta lição » Objetivos da lição »

Seção 4.1 O que é “Coordenação”? – Uma • Compreender e explicar o que é coordenação, bem
atividade desafiadora como os desafios à coordenação.

Seção 4.2 O IASC e a Abordagem de • Compreender e descrever os diferentes atores/


Cluster órgãos envolvidos na coordenação.

Seção 4.3 RC/HC, UNCT e HCT • Compreender e descrever o conceito UNDAC


e OSOCC.
Seção 4.4 OCHA e ERC
• Distinguir os diferentes modelos de coordenação
Seção 4.5 UNDAC e o Conceito OSOCC
durante uma missão integrada da ONU.
Seção 4.6 Missões Integradas da ONU e
• Compreender e explicar a Coordenação Civil-Militar.
Percepção de Coordenação
• Explicar e descrever os diferentes aspectos
Seção 4.7 Disposições de Coordenação Civil-
relacionados ao financiamento humanitário.
Militar durante Desastres Naturais

Seção 4.8 Financiamento Humanitário

INSTITUTO DE TREINAMENTO EM OPERAÇÕES DE PAZ

84
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

Depois de permanecerem por vários anos na Missão das Nações Unidas no Sudão do Sul, local de proteção de civis (do
inglês, protection of civilians - POC) em Juba, 13 deslocados internos, a maioria formada por mulheres e crianças, retornaram
voluntariamente aos parentes que esperavam em sua cidade natal, Malakal. 25 de fevereiro de 2020. Foto da ONU por Isaac Billy.

Introdução

Esta lição descreve o que é coordenação e


como os diferentes órgãos/atores a aplicam. A
coordenação é uma parte essencial de uma HRO
de sucesso. Infelizmente, nas últimas décadas,
foram testemunhados muitos exemplos de HROs
malsucedidas. Grande parte da culpa por isso pode
Assista a uma introdução em
ser atribuída à má coordenação e à falta de vontade
vídeo desta lição em inglês:
de aplicar regras e lógica sólidas. Os trabalhadores <https://www.peaceopstraining.

humanitários podem não estar cientes dos muitos org/videos/494/hro-lesson-


4-humanitarian-coordination-
desafios para alcançar esse nível de coordenação.
mechanism/> .
Alguns desafios estão relacionados ao contexto; outros
são mais pessoais para os indivíduos coordenadores.
Os humanitários podem aprender certos aspectos
da coordenação por meio da educação formal, mas
esses métodos nunca excederão a experiência prática.
Atitude, gerenciamento de reuniões e habilidades de

85
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

negociação (ou “soft skills”) são alguns dos aspectos mais bem aprendidos através da prática. Esta lição
concentra-se nos atores e órgãos descritos anteriormente e como eles estão envolvidos na coordenação
de uma operação. Esta lição também examina as missões integradas da ONU e o financiamento
humanitário e apresenta os tópicos discutidos na Lição 6.

Seção 4.1 O Que é “Coordenação”? — Uma Atividade Desafiadora


O teórico organizacional Thomas Malone descreve a coordenação como “o ato de trabalhar em
conjunto1”. De acordo com o manual de Avaliação e Coordenação pelas Nações Unidas para situações de
Catástrofe (do inglês, United Nations Disaster Assessment and Coordination — UNDAC), a coordenação
pode ser definida “como ações intencionais para harmonizar as respostas individuais a fim de maximizar
o impacto e obter sinergia – uma situação em que o efeito geral é maior que a soma das partes2.”

A coordenação pode ser o aspecto mais desafiador da resposta a uma


emergência devido à situação caótica logo após um desastre. Grandes “A união é um
emergências podem desencadear um grande fluxo de prestadores de começo. Manter-
assistência humanitária, com as autoridades nacionais muitas vezes se juntos é
sobrecarregadas pelos eventos. Muito dependerá da preparação das
um progresso.
autoridades do país afetado ao lidar com grandes desastres (emergências).
Trabalhar em
Mesmo em países desenvolvidos, no entanto, a implementação de práticas
conjunto é sucesso.”
escritas às pressas se torna um desafio devido à falta de familiaridade com
as “atividades de coordenação” necessárias ou à falta de estruturas de ‒Henry Ford
coordenação (viáveis). As próprias autoridades podem ser afetadas pelo
desastre ou estar entre as vítimas.

A ausência de coordenação muitas vezes pode levar a uma assistência inadequada à população
afetada; uso ineficiente de recursos; duplicação de esforços; demora na identificação de lacunas e
gargalos; reações lentas a mudanças de condições; e frustração crescente entre trabalhadores
humanitários, autoridades e sobreviventes. Em seu livro L’échec humanitaire : le cas haïtien, o
cientista político Frédéric Thomas descreveu o terremoto de 2010 no Haiti e os fatores que dificultaram
a coordenação na resposta ao desastre, que incluíam o interesse pessoal de certas organizações de
ajuda em manter seus programas e a presença de demasiadas agências internacionais no terreno3.
Outro desafio para a coordenação foi o complexo sistema de clusters implementado, relativamente
isolado da realidade haitiana (ou seja, estrutura, idioma, cultura etc.). O fato de algumas agências de
ajuda terem orçamentos maiores do que um ministério do governo equivalente mostra a discrepância
entre os recursos disponíveis para organizações de ajuda em comparação com os disponíveis para as
autoridades nacionais.

O que exatamente dificulta a coordenação eficiente? Os trabalhadores humanitários devem estar


cientes das diferentes barreiras que a coordenação enfrenta. De acordo com o manual de campo do
UNDAC, elas incluem, principalmente4:

1) Thomas W. Malone, “Para uma teoria interdisciplinar da coordenação”. DSpace@MIT, 1991, 37-45. Disponível em inglês: <https://dspace.mit.edu/
handle/1721.1/2356> .
2) OCHA, Manual de Campo UNDAC, 6ª ed., 2013. Disponível em inglês: <https://www.unocha.org/sites/unocha/files/dms/Documents/UNDAC%20
Handbook_interactive.pdf>.
3) Frédéric Thomas, Haiti, L’échec humanitaire : le cas haïtien, Bruxelles, Bélgica, Entraide & Fraternite, 2. Disponível em inglês: <https://www.entraide.
be/IMG/pdf/e_f_thomas_ecran.pdf> .
4) A lista a seguir foi extraída diretamente do manual de campo do UNDAC.

86
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

• “A percepção de que a coordenação limitará a autonomia e de que a liberdade de tomar decisões


e executar programas conforme desejado será restrita;

• Muitos tomadores de decisão ou muitas organizações envolvidas, o que complicará o processo e


tornará o consenso, ou pelo menos o acordo, muito difícil de ser alcançado;

• Diferentes expectativas ou crenças sobre o que é importante, prioridade ou a coisa ‘certa’ a se


fazer em determinada situação;

• Falta de recursos para dedicar à coordenação ou coordenação, vistos como de baixa prioridade
devido ao tempo e recursos limitados;

• Autoridade limitada de tomada de decisão ‘baseada em campo’, de modo que nenhuma decisão
possa ser tomada sem a aprovação da sede, resultando em atrasos ou anulação de um acordo;

• Rotatividade de pessoal onde o novo pessoal não tem compromisso com a coordenação ou
desconhece os acordos de coordenação;

• Ações unilaterais que ignoram os mecanismos de coordenação estabelecidos do órgão de


coordenação, seja por doadores ou organizações membros;

• Liderança de coordenação ineficaz ou inadequada no nível local e/ou de agrupamento, por


exemplo, quando o órgão de coordenação exerce liderança autocrática e impõe decisões a
outros sem um processo transparente de envolvimento, ou está muito preocupado com o devido
processo e incapaz de avançar e tomar decisões; e

• “um processo de coordenação que não está funcionando bem, tem objetivos pouco claros e é
visto como perda de tempo sem benefícios óbvios para os participantes5.”

As seções subsequentes abordarão algumas


dessas barreiras e as ferramentas existentes para
combatê-las. A ação de coordenação ocorrerá
prioritariamente por meio de reuniões. Gestão de
reuniões, preparação adequada e uma agenda clara
(incluindo informações relativas ao tempo) são alguns
dos pontos-chave que levam ao sucesso. As pessoas
que representam uma organização designada para
desempenhar a atividade de coordenação, seja como
líder ou participante, devem ter alguma experiência
com essas habilidades. Infelizmente, essas Uma visão do painel virtual de alto nível sobre “Melhorar
a eficácia humanitária por meio de novas tecnologias
habilidades não levam em conta certos aspectos
e inovação: oportunidades e desafios” do Segmento
culturais. Por exemplo, algumas culturas valorizam de Assuntos Humanitários do Conselho Econômico e

mais a palavra falada do que os relatórios escritos, o Social (ECOSOC). Asha Mohammed, Secretária Geral da
Sociedade da Cruz Vermelha do Quênia, fala durante a
que geralmente leva a longas discussões sem levar a
reunião. 11 de junho de 2020. Foto da ONU por Loey Filipe.
uma declaração ou conclusão claras.

5) OCHA, Manual de Campo da UNDAC.

87
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

Seção 4.2 IASC e a Abordagem de Cluster


A reforma humanitária global ocorreu após o terremoto e tsunami de 2004 no oceano índico,
resultando no estabelecimento, em 2005, da abordagem de cluster. Antes de 2004, algumas agências
foram designadas para liderar certas atividades, como distribuição de alimentos pelo PMA ou promoção
da saúde pela OMS, enquanto outros setores ou áreas de atividades não eram claramente determinados.
A comunidade humanitária viu a falta de organizações globais responsáveis como um déficit no esforço
geral de coordenação, levando à ineficiência e à assistência inadequada às populações afetadas. A
abordagem de cluster garante uma liderança clara, previsibilidade e responsabilidade na resposta
internacional “às emergências humanitárias … esclarecendo a divisão [do trabalho] entre as organizações
… e definindo melhor seus papéis e responsabilidades nos diferentes setores de resposta6”. Durante uma
emergência, o IASC designará um coordenador especial conhecido como Coordenador Humanitário (do
inglês, Humanitarian Coordinator — HC) para coordenar todo o esforço e assistência humanitária. O ERC
faz a declaração de uma emergência L3 em consulta com os diretores do ISAC dentro de 48 horas após
o início de uma crise.

No total, os esforços de reforma identificaram 11 setores de atividades, e o IASC designou agências


globais líderes de cluster para cobrir atividades que vão da prevenção à reconstrução7.
Saúde
OMS
Segurança
Alimentar Logística
FAO & WPF WPF

Nutrição
Telecomunicações UNICEF
de Emergência
PNUD
Prevenção

tr u ç ã o
Educação Coordenação
UNICEF & de Ajuda Proteção
Save the Humanitária e ACNUR
Children de Emergência
Rec
o ns

Abrigo de
Recuperação
Emergência
Antecipada
ACNUR &
Miti

PNUD
IFRC
o
açã
ga

er
çã

up
o

Gestão e
ec

Saneamento,
Cooperação
Água e
R
ACNUR & OIM
Pr Higiene
ep UNICEF
ar ta
açã p os
o Re s
D esastre

6) Andrea de Guttry, Marco Gestri e Gabriella Venturini, eds., International Disaster Response Law, Haia, Holanda, TMC Asser Press, 2012, 502.
7) Para fins de ensino, a Save the Children foi designada como co-líder junto com a UNICEF. O papel especial da IFRC como organizador em vez de líder do
agrupamento precisa ser entendido, pois a IFRC “não pode aceitar responsabilidade além daquelas definidas em suas constituições e políticas. Portanto,
não pode se comprometer a ser provedora de último recurso ou se responsabilizar pelo sistema da ONU, incluindo o ERC e o RC/HC.” “O ACNUR
é a agência líder do cluster em nível global. No entanto, no nível do país, em situações de desastre ou emergências complexas sem deslocamento
significativo, as três agências mandatadas para proteção (ACNUR, UNICEF e ACNUDH) consultarão de perto e, sob a liderança geral do CR ou HC,
decidirão qual agência entre as três assumirá o papel de agência líder do cluster para proteção no país.” Veja: IASC, Introduction to Humanitarian
Action: A Brief Guide for Resident Coordinators, outubro de 2015, 15. Disponível em inglês: <https://interagencystandingcommittee.org/system/files/
rc_guide_31_october_2015_webversion_final.pdf>.

88
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

Os clusters globais servem como um recurso que pode aconselhar padrões globais, políticas, boas
práticas, suporte operacional e treinamento. Diferentes organizações podem receber responsabilidades
em nível nacional e global. O mesmo vale para o nível de país e o nível de campo, dependendo
dos atores especializados no terreno e/ou parceiros de implementação. O líder do cluster em cada
nível é responsável por coordenar todas as atividades relacionadas ao setor dentro de sua área de
responsabilidade em estreita cooperação com o nível nacional de autoridade correspondente. Ao fazê-
lo, são distribuídos todos os atores igualmente por toda a área afetada, em vez de se concentrarem
apenas nas áreas mais visíveis ou atraentes.

O grupo global de coordenação de clusters se reúne regularmente em Genebra e Roma para apoiar
a coordenação de clusters e inter-clusters em nível de país. O gráfico a seguir mostra os clusters globais
e suas agências líderes de cluster:

Setor ou área de atividade Agência líder de cluster global


Agricultura FAO
Coordenação/gestão do acampamento: ACNUR
• Deslocamento relacionado ao conflito OIM
• Deslocamento relacionado a desastres
Recuperação antecipada PNUD
Educação UNICEF/Save the Children Alliance
Abrigos de emergência: ACNUR
• Relacionado a conflitos IFRC (Convocador)
• Relacionado a desastres
Telecomunicações de emergência OCHA/PAM
Saúde OMS
Logística PAM
Nutrição UNICEF
Proteção ACNUR
Água, saneamento e higiene (WASH) UNICEF
Comida PAM
Refugiados ACNUR

Agências em alguns setores ou áreas de atividade podem diferenciar situações como relacionadas
a conflitos ou relacionadas a desastres. Nesses casos, existem duas agências diferentes que podem ser
consideradas líderes do cluster.

Algumas áreas globais podem ser subdivididas em subáreas menores, como mostra a tabela abaixo,
que descreve o grupo de proteção liderado pelo ACNUR:

Área de responsabilidade Agência de ponto focal


Proteção infantil UNICEF
Violência baseada no gênero UNFPA/UNICEF
Habitação, terra e propriedade UN-Habitat
Ação contra minas UNMAS
Estado de direito e justiça PNUD/ACNUDH

89
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

A Equipe Humanitária do País (do inglês, Humanitarian Country Team — HCT) decide se deve
solicitar a ativação do sistema de cluster se uma necessidade específica de resposta a emergências não
for atendida, causando uma lacuna de coordenação. O HCT fará então uma proposta ao ERC e o IASC
discutirá a proposta. A decisão de ativar um ou mais clusters será tomada dentro de 24 horas após o
ERC ter transmitido a solicitação inicial (proposta) ao líder global de cluster para aprovação.

Existe uma situação única em relação aos refugiados em que o ACNUR é mandatado para liderar a
resposta aos refugiados, incluindo a coordenação entre agências, planejamento de contingência, resposta,
mobilização de recursos e busca de soluções duradouras. A nota conjunta ACNUR-OCHA sobre situações
mistas: coordenação na prática foi estabelecida para “situações mistas”, em que refugiados e deslocados
internos recebem assistência8. Ele define os papéis e responsabilidades do representante do ACNUR e do
HC, e a interação prática da coordenação do IASC e os arranjos de coordenação de refugiados do ACNUR.
Isso garante que a coordenação seja simplificada, complementar e mutuamente reforçada.

Apesar das lições aprendidas com o terremoto de 2010 no Haiti e as inundações no Paquistão,
alguns desafios permaneceram em certos aspectos da resposta humanitária internacional. Nesse
sentido, o IASC fez ajustes, que deram origem à Agenda Transformativa (AT). Um dos principais
resultados da AT foi um sistema para classificar desastres como nível 1, 2 ou 3 com base em sua
escala, complexidade, urgência, capacidade e risco de reputação. Os três pilares da AT são liderança,
coordenação e responsabilidade. A agenda foi usada para:

• Criação de um sistema para implantação de funcionários seniores experientes para fornecer


liderança (Mecanismo de Reação Rápida Entre Agências [do inglês, Inter-Agency Rapid Reaction
Mechanism — IARRM]);

• Liderança empoderada de HC e outros líderes dentro da comunidade HCT (reforço das


capacidades de liderança), garantindo que a arquitetura de coordenação funcione bem;

• Melhor planejamento estratégico em nível de país (contribuição de clusters e como);

• Maior responsabilização do HC e dos membros do HCT; e

• Mecanismos de coordenação simplificados adaptados aos requisitos operacionais e ao contexto


para facilitar a entrega.

Seção 4.3 RC/HC, UNCT e HCT


Na maioria dos países com presença do sistema da ONU, a coordenação geral das atividades da ONU
cabe principalmente ao Coordenador Residente da ONU (do inglês, Resident Coordinator — RC). O RC é o
representante designado do secretário-geral e muitas vezes o representante do país do PNUD, e a posição do
RC é a mesma de um embaixador. Como parte da preparação para uma crise ou imediatamente após uma,
o RC é responsável por decidir sobre a arquitetura de coordenação mais adequada para os respondentes
internacionais, levando em consideração o contexto, os recursos disponíveis e os mecanismos existentes
após consultar as autoridades nacionais e em atores humanitários do país. Idealmente, a arquitetura
de coordenação para respondentes internacionais deve complementar as estruturas nacionais (e locais)
existentes, com papéis, responsabilidades e linhas de relatórios claros, em vez de criar sistemas separados

8) ACNUR e OCHA, “Nota conjunta ACNUR — OCHA sobre situações mistas — Coordenação na prática”. Disponível em inglês: <https://www.
humanitarianresponse.info/fr/programme-cycle/space/document/joint-unhcr-ocha-note-mixed-situations-coordination-practice>.

90
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

ou paralelos. A estrutura de coordenação deve permitir uma transição suave para as autoridades e estruturas
nacionais ao longo do tempo, incluindo a transferência de responsabilidades para as autoridades nacionais
e/ou parceiros de desenvolvimento à medida que a situação passa de emergência para recuperação.

O RC lidera a Equipe Nacional da ONU (UNCT), que é composta por todos os chefes das agências da
ONU presentes no país mais a OIM. Em caso de emergência, as agências operacionais não pertencentes
à ONU reforçarão/expandirão o UNCT para se tornar HCT, que então liderará o esforço de ajuda
humanitária sob a liderança do HC. O ERC e o IASC atribuirão o HC9. Para emergências menores (L2), o
RC geralmente se torna o HC. No caso de uma emergência L3, a atribuição do HC normalmente vem de
um grupo especial de pessoas altamente qualificadas.

O HC (ou RC se um HC não tiver sido designado) preside o HCT. O HCT é responsável pela coordenação
estratégica e tomada de decisões de preparação e resposta internacional. É uma equipe, não simplesmente
uma reunião. O HCT consiste em um número limitado de diretores nacionais de organizações operacionalmente
relevantes da ONU e não-ONU (nacionais e internacionais) para permitir a tomada de decisão eficaz; o
CR/HC pode estabelecer um fórum separado para garantir o compartilhamento de informações com a
comunidade humanitária mais ampla10.

Qual é a diferença? HCT versus UNCT

“O HCT aborda questões humanitárias


estratégicas da comunidade
humanitária mais ampla (ONU e não-
ONU), enquanto a equipe nacional das
Nações Unidas (UNCT) se concentra nos
programas de desenvolvimento da ONU.
(…) não se deve presumir que todos os O secretário-geral António Guterres (em pé) discursa em

membros do UNCT sejam membros do uma reunião com funcionários da ONU e representantes
da equipe nacional no Supercampo da Missão de
HCT. A UNCT e a HCT coexistem; eles Estabilização Integrada Multidimensional das Nações
não substituem uma à outra. O CR (e Unidas no Mali (MINUSMA) em Mopti. 30 de maio de

HC se designado) é responsável por 2018. Foto da ONU por Marco Dormino.

garantir a complementaridade entre as


duas entidades. Em países onde não há emergência humanitária, HCTs podem
ser estabelecidos para coordenar a preparação11.”

A importância do HCT deve ser enfatizada. Trabalha em estreita colaboração com os ministérios
relevantes e definirá a estratégia de resposta, incluindo a ativação de clusters e o uso de FMA. Conforme
descrito anteriormente, a análise da situação do HCT pode levar a um pedido através do RC/HC para
a ativação de clusters (adicionais). Caso sejam necessários bens específicos que (ainda) não estejam
disponíveis no mercado civil, o HCT pode propor ao HC a solicitação do uso de FMA, incluindo assistência
militar direta, mas nas condições citadas na Lição 3. O HCT deve transmitir o uso do FMA ao governo
do país afetado, que decidirá sobre sua aceitação e condições. Alguns HCTs também decidiram incluir
representantes dos principais ministérios de assistência.
9) Componentes do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho podem participar do HCT.
10) IASC, Introdução aos Assuntos Humanitários, outubro de 2015, 14. Disponível em inglês: <https://interagencystandingcommittee.org/system/files/
rc_guide_31_october_2015_webversion_final.pdf> .
11) IASC, Introdução aos Assuntos Humanitários, 14.

91
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

No nível de campo e em consulta com o HCT e o ERC, o HC/RC é responsável por designar as
agências líderes de grupos para todos os principais setores de resposta humanitária. O HCT (nível
estratégico) lidera “o trabalho do grupo de coordenação inter-cluster (nível operacional), clusters e outras
estruturas, se estabelecidas12”. Conforme descrito pelo OCHA, “no nível operacional, a coordenação
entre clusters geralmente ocorre dentro da estrutura de um fórum/grupo de coordenação entre clusters
(no nível do coordenador de cluster13)”. O grupo de coordenação inter-cluster serve a dois propósitos:
facilitar a comunicação e atuar como um canal para questões técnicas e estratégicas transversais entre
os clusters e o HCT14. O OCHA preside este grupo.

“Para cada cluster, uma organização (referida como ‘agência líder do cluster’) é
formalmente designada para liderar e coordenar a experiência técnica e servir como
provedor de último recurso, que é um compromisso da agência líder do cluster de
convocar todos os parceiros humanitários para abordar lacunas críticas na resposta
e, se isso falhar, comprometer-se a preencher a lacuna (ou defender recursos ou
acesso para fazê-lo15)”.

Seção 4.4 OCHA e ERC


De acordo com o OCHA:

“O Secretário-Geral Adjunto e Coordenador de Assistência de Emergência (USG/ERC)


é responsável pela supervisão de todas as emergências que requerem assistência
humanitária das Nações Unidas. Ele também atua como o ponto focal central para
atividades de socorro governamentais, intergovernamentais e não governamentais16”.

Conforme descrito na Lição 2, o ERC lidera o IASC. Em países afetados por desastres ou conflitos,
“o ERC pode nomear um HC para garantir que os esforços de resposta sejam bem-organizados17”. O
ERC também desempenha um papel importante na defesa de questões humanitárias e na pressão pelo
acesso e proteção humanitária, especialmente em emergências complexas. Além disso, o ERC lidera o
OCHA e tem um papel importante a desempenhar em matéria de coordenação.

O OCHA trabalha para apoiar ações humanitárias eficazes e baseadas em princípios, salvar vidas e
reduzir o sofrimento. O OCHA funciona como:

“... o secretariado para mecanismos críticos de coordenação interagências, como o


Comitê Permanente Interagências (IASC); ferramentas de resposta rápida, como o
sistema de avaliação e coordenação de desastres das Nações Unidas (UNDAC); e o Grupo
Consultivo Internacional de Busca e Resgate (INSARAG). O OCHA também promove uma
interação eficiente entre atores civis e militares em operações humanitárias, preenche
lacunas na gestão de emergências ambientais e mapeia os estoques globais de ajuda de
emergência em nome de toda a comunidade humanitária18.”

12) IASC, Introdução aos Assuntos Humanitários, 14.


13) OCHA, “Liderança de Coordenação Humanitária”. Disponível em inglês: <https://www.unocha.org/our-work/coordination/humanitarian-coordination-
leadership>.
14) IASC, Introdução aos Assuntos Humanitários, 14.
15) IASC, Introdução aos Assuntos Humanitários, 14.
16) OCHA, “O Secretário-Geral Adjunto e Coordenador de Assistência de Emergência”. Disponível em inglês: <https://www.unocha.org/about-us/ocha-leadership>.
17) OCHA, “O Secretário-Geral Adjunto e Coordenador de Assistência de Emergência”.
18) OCHA, “Coordenação”. Disponível em inglês: <https://www.unocha.org/our-work/coordination>.

92
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

O OCHA tem duas sedes e nove escritórios regionais, bem como vários escritórios de campo19. O
OCHA também possui um serviço digital especializado chamado ReliefWeb, que é a principal fonte de
informações humanitárias sobre crises e desastres globais. O ReliefWeb fornece informações confiáveis e
oportunas de fontes confiáveis, como relatórios, mapas e infográficos, permitindo que os trabalhadores
humanitários tomem decisões informadas e planejem respostas eficazes20.

A figura abaixo mostra uma visão geral de todos os principais atores envolvidos na resposta e como
eles se conectam. Idealmente, esse tipo de mapeamento de atores também deve incluir a estrutura de
coordenação existente:

Resposta a desastres naturais

Responsabilidade primária de Ativos


Primary Responsibility
ajudar to assist Foreign Military
Militares e de
and Civil
Government Cruz
RedVermelha
Governo Defesa Civil Cross
Defense Assets
Estrangeiros
Mobilize national resources (MCDA)
Mobilizar recursos nacionais Solicitar
Request (MCDA)
assistência
international
ONGs
Int’l
internacional
assistance internacionais
NGOs
Organização
Nacional de Gestão
National Disaster
OCHA/Coordenador
Cruz
Management OCHA/Humanitarian
National de Desastres
Organization (NDMO) Humanitário
Vermelha Coordinator
Ministérios
Ministries (NDMO)
Red Cross
Nacional Mobilizar/coordenar
Mobilize/coordinate with
com parceiros
partners
Equipe(s)
UNDAC do
ONGs
NGOs UNDAC
Team(s)
Militares
Military
UN da
Agências
Governos
Donor Agencies
ONU
doadores
governments
Grupos
Civil da Affected
População
Sociedade
Society afetada
Groups
population
Civil Secretaria
INSARAGdo INSARAG
Secretariat

Equipes
USAR Parceiros
Standbyde
USAR
Teams espera
Partners

Desastre natural
Natural Disaster Meios de
Media
RESPOSTA comunicação
RESPOSTA
NATIONAL RESPONSE INTERNATIONAL RESPONSE
INTERNACIONAL
NACIONAL
Seção 4.5 UNDAC e o conceito OSOCC
A UNDAC foi criada em 1993 e projetada para ajudar a ONU e os governos de países afetados por
desastres durante a primeira fase de uma emergência de início súbito21. Inicialmente criado para prestar
assistência em caso de terremotos, o sistema foi posteriormente expandido para cobrir outros tipos de
desastres. A UNDAC também auxilia na coordenação da ajuda internacional recebida em nível nacional
e/ou no local da emergência. As equipes da UNDAC podem atuar em curto prazo (12 a 48 horas) em
qualquer lugar do mundo. As equipes são mobilizadas a pedido do RC ou HC das Nações Unidas ou do
19) OCHA, “Mundo: Presença OCHA 2015”. Disponível em inglês: <http://reliefweb.int/map/world/world-ocha-presence-2015-may-2015>.
20) A Lição 6 examinará isso com mais detalhes.
21) OCHA, “Coordenação”.

93
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

governo afetado, e a UNDAC as fornece gratuitamente ao país afetado pelo desastre. A UNDAC é a
ferramenta de resposta rápida/primeira do OCHA (máximo de três a quatro semanas) e pode se tornar
a base de um escritório de campo do OCHA.

As equipes da UNDAC consistem em gerentes de emergência treinados e experientes de organizações


da ONU e não-ONU ou organizações governamentais. Eles têm o status de especialista da ONU em missão
e dependem diretamente da Seção de Resposta a Emergências (do inglês, Emergency Response Section —
ERS), Seção de Apoio à Resposta (do inglês, Response Support Branch — RSB), divisão de coordenação,
OCHA Genebra. A composição da equipe pode variar e dependerá do tipo e categoria de emergência. Desde
a sua última reforma, a implantação para emergências em grande escala é feita “sem arrependimentos”,
destacando até 25 membros da equipe e equipe de suporte.

Quando necessário, uma equipe da UNDAC irá, na maioria dos casos, estabelecer um Centro de
Coordenação e Operação No Local (do inglês, On-Site Operations Coordination Centre — OSOCC) de acordo
com as diretrizes do OSOCC22. Um OSOCC assemelha-se a uma plataforma de coordenação (não a um posto
de comando) e ponto único de entrada para organizações humanitárias, e tem três objetivos principais:

1. Funcionar como uma interface entre os respondentes


internacionais e o governo do país afetado.

2. Fornecer um sistema para coordenar e facilitar as atividades


dos esforços de socorro internacional em um local de
desastre — notadamente após um terremoto — onde a
coordenação de muitas equipes internacionais da usar é
fundamental para garantir esforços de resgate ideais.

3. Fornecer uma plataforma para cooperação, coordenação e gestão


da informação entre as agências humanitárias internacionais.

Uma visão da destruição em massa em Marsh Harbour, na Ilha Abaco, após o furacão Dorian, um furacão de categoria cinco, que varreu
as ilhas Bahama de Abaco e Grand Bahama em 1º de setembro de 2019. 11 de setembro de 2019. Foto da ONU por OCHA/Mark Garten.

22) OCHA, Diretrizes do Centro de Coordenação de Operações no Local (OSOCC) 2018, julho de 2018. Disponível em inglês: <https://reliefweb.int/sites/
reliefweb.int/files/resources/2018%20OSOCC%20Guidelines.pdf>.

94
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

Ligação
Gestão
Segurança

Células de
Situação Apoiar Operações Coordenação, por
exemplo, USAR,
EMT, CMCoord
Avaliação e Análise Administração Logística
Outras equipes/
Relativo a meio elementos de
Gerenciamento de TIC ambiente resposta, por
informações exemplo, clusters
Relativo a meio
Meios de Instalações ambiente
comunicação

Após a chegada, a UNDAC (ou a primeira equipe USAR classificada pelo Grupo Internacional de
Busca e Resgate [do inglês, International Search and Rescue Advisory Group — INSARAG]) estabelecerá
um centro de recepção/partida (RDC) no ponto de entrada23. Na maioria dos casos, este será o aeroporto
designado, mas também pode ser um porto marítimo, um ponto de passagem de fronteira terrestre ou
uma combinação. O objetivo é fornecer uma interface entre a assistência internacional recebida, o governo
e o primeiro registro de todas as equipes recebidas. O OSOCC atuará como uma plataforma de interface
e coordenação com a Autoridade Nacional de Gerenciamento de Desastres (do inglês, National Disaster
Management Authority — NDMA) e orientará as equipes de entrada sobre onde implantar. Especialistas
que cobrem áreas mais especializadas de gerenciamento de emergências (por exemplo, meio ambiente,
acidentes industriais, etc.) Podem reforçar as equipes do UNDAC. Eles também podem receber apoio de
parceiros associados fornecendo apoio geral (Parceria Humanitária Internacional [do inglês, International
Humanitarian Partnership — IHP] com acampamento base24) ou especializado (MapAction25, Assessment
Capacities Project [ACAPS26], Télécommunication Sans Frontières, etc.).

Em relação ao RDC, há uma diferença significativa no apoio inicial dependendo se a UNDAC for implantada
em resposta a um terremoto ou outro tipo de desastre. Durante um terremoto, as equipes usar classificadas
pelo INSARAG serão as primeiras a chegar ao país afetado. Eles são totalmente autossustentáveis (tenda,
gerador de energia, Tecnologia de Comunicação da Informação [TCI], alimentos, água, etc.) De uma
equipe da UNDAC para assumir funções de RDC. Sua principal tarefa é facilitar a chegada das equipes
de entrada, fornecendo-lhes as primeiras informações sobre a situação e facilitando o apoio logístico (por
exemplo, transporte, combustível, madeira, etc.) Para o posterior deslocamento das equipes de entrada
para a área afetada. Parte da tarefa do RDC inclui uma estreita cooperação com as autoridades e serviços
aeroportuários, o que pode se tornar muito desafiador se o próprio aeroporto for danificado pelo desastre.
É de extrema importância explicar o papel do RDC às autoridades (do aeroporto) para obter seu apoio para
um processamento tranquilo das organizações de socorro que chegam.

23) INSARAG, “Página inicial”. Disponível em inglês: <http://www.insarag.org/>.


24) IHP, “Página inicial”. Disponível em inglês: <http://www.ihp.nu/>.
25) MapAction, “Página inicial”. Disponível em inglês: <https://mapaction.org/>.
26) ACAPS, “Página inicial”. Disponível em inglês: <https://www.acaps.org/>.

95
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

Governo Equipe Nacional


nacional Humanitária da
ONU RC/HC

Grupo de
Coordenação
Inter-Cluster

Líder da Equipe
UNDAC

Autoridade Equipes
Local de Internacionais de
Gerenciamento Resgate e Socorro
de Emergências
(LEMA)

No caso de um desastre que não seja um terremoto, a UNDAC enfrentará desafios maiores. A UNDAC
dependerá principalmente do que eles trouxerem e da disponibilidade de equipes de suporte, sejam IHP ou
outras. Em princípio, a equipe de suporte e a UNDAC devem chegar mais ou menos ao mesmo tempo. A
UNDAC criará um RDC o mais rápido possível, marcado por uma bandeira azul da ONU com a inscrição “centro
de recepção/partida”. Como a administração no aeroporto (ponto de entrada) pode não estar operacional
devido às circunstâncias caóticas do desastre e/ou à falta de capacidade das autoridades nacionais, todas as
equipes que chegam devem se registrar para que a UNDAC e o governo nacional saibam quem está no país27.
Na pior das hipóteses, o RDC será pouco mais do que uma mesa e cadeiras com uma bandeira28.

OSOCC

Manuseio
Aircraftde aeronaves
Handling

Gestão de aeroportos
Airport Management Gerenciamento
RDC Management
de RDC
Imigração
Immigration

Alfândega
Customs

Segurança
Logística de Administração
RDC
Security RDC Logistics
RDC de RDC
Administration
Militares
Military

Controle de Tráfego Aéreo/


Air/Ground Traffic Control
Terrestre

Manuseio deHandling
Aircraft aeronaves Manuseio deHandling
Aircraft aeronaves Manuseio
Aircraftde aeronaves
Handling

27) Em muitos casos, o registro no RDC e/ou OSOCC será imposto pelas autoridades nacionais e pode ter impacto no suporte adicional (por exemplo,
condição básica para suporte do Log Cluster, se estabelecido).
28) Informações mais detalhadas sobre o funcionamento de um OSOCC e RDC podem ser encontradas nas Diretrizes do OSOCC.

96
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

As atividades principais da UNDAC dependerão da escala e da natureza do desastre/situação, mas


podem ser resumidas da seguinte forma:

• Apoiar e facilitar o trabalho do governo afetado, RC/HC e HCT na coordenação da assistência


internacional;

• Apoiar a equipe sênior do OCHA;

• Estabelecer e executar o OSOCC/RDC;

• Apoiar a criação ou fortalecer o sistema de coordenação nacional para a coordenação


internacional;

• Fornecer experiência em metodologia coordenada de avaliação e pesquisa e identificar riscos


ambientais secundários;

• Fortalecer a gestão de desastres e as atividades de resposta humanitária;

• Apoiar relatórios, informações públicas e gerenciamento de informações;

• Apoiar a gestão de segurança e proteção;

• Fornecer funções de ligação (CMCoord, etc.);

• Fornecer gerenciamento de equipes de suporte técnico, incluindo atividades de TCI; e

• Administrar a equipe da UNDAC e desenvolver uma estratégia de transferência e saída.

Essas atividades principais serão refletidas em seus Termos De Referência (TDR) e serão adotadas
na chegada em comum acordo com o CR/HC. A UNDAC deve fornecer liderança, se necessário, e
ser visto como um “prestador de serviços” para todos os atores envolvidos no esforço de socorro a
desastres, incluindo as autoridades nacionais. Alguns serviços que a UNDAC pode fornecer são:

• Briefing sobre a situação, necessidades, prioridades, operações, etc.;

• Identificação das contrapartes nacionais e como estabelecer uma ligação regular com elas;

• Informações sobre os procedimentos locais de alfândega, imigração e acesso às áreas afetadas;

• Facilitação de apoio administrativo para reuniões, preparação de agenda, escolha de local, etc.;

• Fornecimento de produtos de gestão de informação (e.g., mapas, 3W29, contatos, rastreio de


mercadorias, etc.);

• Coordenação de assuntos logísticos/administrativos, incluindo transporte, combustível, água,


base de operação, armazenagem, etc.;

• Orientação sobre questões culturais, segurança e proteção e mídia; e

• Fornecimento de solução de TIC.

O sistema UNDAC tem fortes raízes na gestão de desastres, que são importantes durante a fase
de salvamento – principalmente nos níveis tático e operacional. A UNDAC opera de acordo com um
conjunto de padrões (valores fundamentais) e metodologia.

Imediatamente após um desastre, as estruturas de coordenação humanitária não incluem atores e


abordagens de gestão de desastres. É aí que a UNDAC intervém para fornecer a interface entre “gestão
de desastres” e “coordenação humanitária”. Ambos os termos podem ser definidos da seguinte forma:

29) 3W: Who is doing What Where (Quem está fazendo o quê onde). Veja a Lição 6; “3W – O que estamos procurando?”.

97
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

TheO Humanitarian
Modelo de Coordenação Humanitária
Coordination Model

Secretário-Geral
UN Secretary- Política
Policy
Presidência
Presidency
da ONU
General

Governos Nível estratégico


Strategic level
Donor Governments ERC
doadores
Planejamento
Planning and
Primeiro Ministro e Coordenação
Coordination
Coordenador
Prime Minister
Humanitarian
Ministérios de Linha
Line Ministries
Humanitário
Coordinator
Nível estratégico
Operational level

Centro de Operações
Civil-Military Operations
Embaixador
Ambassador OCHA (UNDAC) Civil-Militar (CMOC)
Centre (CMOC)

Grupo de Grupo
ShelterdeCluster
Abrigo Outras
Health Cluster
integridade Cluster Logístico
Logistics Cluster GrupoCluster
WASH WASH Others

Operações e
Operations and
Implementação
Implementation
ONGs
NGOs ONGs
NGOs ONGs
NGOs ONGs
NGOs

Nível
Tacticaltático
level

» “O gerenciamento de desastres, também conhecido como


gerenciamento de emergências, pode ser definido como a
organização e gerenciamento de recursos e responsabilidades
para abordar todos os aspectos de emergências, em particular,
preparação, resposta e etapas iniciais de recuperação. Isso
envolve planos e arranjos institucionais para engajar e
orientar o esforço de governos, não governamentais, agências
voluntárias e privadas de forma abrangente e coordenada para
responder a todo o espectro de necessidades emergenciais. [...]

» A coordenação humanitária pode ser definida como uma


forma abrangente e baseada em princípios de gerenciar a
prestação de assistência humanitária por meio de planejamento
estratégico, formulação de políticas e facilitação da cooperação
e tomada de decisão consensual30”.

O papel da UNDAC pode ser identificado dentro das estruturas tradicionais de gerenciamento de
crises de tomada de decisão de três níveis: tomada de decisão estratégica, coordenação operacional de
nível médio e coordenação tática direta de recursos no local.

30) OCHA, Manual de Campo da UNDAC.

98
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

Gestão
Disasterde Desastres Coordenação
Management Humanitária
Humanitarian Coordination

Gestão deof
Management
Gestão por
Management by
Recursos
Resources princípios
Principles

Otimização do uso dos recursos Estabelecimento


Establishment de estrutura
of framework and
Optimizing
disponíveisthepara
use garantir
of available
o e padrões para participação
standards for participation in the
resources
máximo detoimpacto
ensure através
maximum do na prestação de assistência
delivery of humanitarian
impact through thedeestablishment
estabelecimento prioridades humanitária
assistance
ofpara
priorities for response
as atividades activities
de resposta

Relação entre gestão de desastres e coordenação humanitária

Célula de coordenação usar

O lançamento das diretrizes OSOCC em 2014 criou várias novas células, uma das quais é a Célula
de Coordenação da USAR (do inglês, USAR Coordination Cell — UCC). Esta célula é parte integrante
da função de operações em caso de terremotos. Juntamente com o NDMA, planejará e dirigirá todas
as atividades da usar (nacionais e internacionais) nas áreas afetadas31. Funcionários experientes da
usar comandam esta célula e dividirão a zona afetada em setores numerados. Dependendo da escala
do terremoto e do número de equipes usar implantadas, cada área receberá uma equipe usar líder do
setor.

As equipes internacionais da usar podem ser do tamanho de uma equipe média (+/-45) ou pesada
(+/- 80). As diretrizes INSARAG definem sua estrutura, mas podem variar32. Algumas equipes têm
uma capacidade específica, como defesa Química, Biológica, Radiológica e Nuclear (QBRN), que se
envolveria em áreas onde as ameaças QBRN são mais prováveis (por exemplo, hospitais, lojas com
produtos químicos, etc.). Todas as equipes certificadas atuam de acordo com as diretrizes e utilizarão a
plataforma virtual OSOCC (VO) no ReliefWeb. A plataforma VO é uma plataforma online de intercâmbio
e coordenação de informações sobre desastres restrita a gestores de desastres em todo o mundo (por
exemplo, governos e organizações de resposta). Durante a resposta a um desastre, o OCHA Genebra/
RSB administrará este site e listará todas as equipes ativadas, suas especialidades e seu status real,
bem como todas as informações relevantes relacionadas ao desastre. Uma vez implantado, o UCC
acompanhará cada equipe e começará a planejar sua implantação no setor designado em estreita
coordenação com o NDMA, que definirá as prioridades.
31) Na maioria dos casos, a UCC limitar-se-á a coordenar as equipas internacionais, mas as equipes nacionais devem ser traçadas em mapas para evitar a
duplicação de esforços.
32) As Diretrizes INSARAG são um conjunto de diretrizes composto por três volumes: Política, Preparação e Guia de Campo Operacional e de Resposta.

99
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

Todas as equipes da usar treinam de acordo com as diretrizes e possuem capacidades técnicas
iguais, com algumas diferenças entre médio e pesado. Para receber a certificação INSARAG, toda
equipe deve passar por uma classificação externa seguida de uma reclassificação a cada cinco anos
para comprovar seu nível operacional. Após entrar em contato com o OSOCC (UCC) e ao chegar na área
afetada, cada Equipe Monta sua Base de Operação (BOO) a partir da qual irá operar. Duas vezes por dia,
o OSOCC organizará uma reunião de líderes de equipe da usar presidida pelo NDMA e pelo coordenador
da função da operação. Dependendo do tamanho da área afetada e da disponibilidade de transporte,
apenas as equipes da usar lideradas pelo setor podem estar presentes. Em geral, as atividades do usar
são normalmente planejadas para durar sete dias, mas podem ser estendidas a pedido das autoridades.
As autoridades nacionais declararão o fim de todas as atividades da usar. Algumas equipes da usar
podem permanecer no país e ajudar nas atividades de avaliação estrutural. A maioria das equipes da
usar será reimplantada de volta para casa o mais rápido possível.

Um grande desafio, observado durante os terremotos


no Haiti em 2010 e no Nepal em 2015, é o gargalo para
voar para o país. Após um terremoto, o aeroporto (capital)
pode não ter capacidade para absorver o alto fluxo de
meios aéreos e equipes de socorro que chegam, o que pode
levar rapidamente ao congestionamento e ao fechamento
temporário do aeroporto. Em muitos casos, os aeroportos
próximos ao epicentro (principalmente os regionais) não estão
preparados para receber esse fluxo maciço de assistência. Os
funcionários do aeroporto ficam rapidamente sobrecarregados
e a capacidade de descarga e armazenamento é limitada
ou até mesmo destruída. Levar as equipes do aeroporto ao
setor designado pode ser outra dificuldade, dependendo da
disponibilidade de capacidade de transporte e combustível e Uma mãe e seu filho recém-nascido usufruem
do programa “Mãe e Criança em Boa Saúde”,
das acessibilidades rodoviárias da área afetada. As primeiras
criado pela Organização Mundial da Saúde
48-72 horas são cruciais para encontrar sobreviventes, o que (OMS) em cooperação com a Organização
aumentará a pressão sobre as equipes da usar. Pan-Americana da Saúde (OPAS), o Ministério
da Saúde e População do Haiti e o governo do
Canadá. 5 de novembro de 2010. Foto da ONU
Célula de coordenação da equipe médica de
por Victoria Hazou.
emergência

Após o terremoto de 2010 no Haiti e o deslocamento descoordenado de equipes médicas, a Organização


Panamericana da Saúde (OPAS) e a OMS criaram um grupo de trabalho para gerenciar melhor as Equipes
Médicas de Emergência (do inglês, Emergency Medical Teams ‑ EMTs) que chegam. O grupo de trabalho
teve como objetivo padronizar as equipes médicas e suas capacidades de forma semelhante ao INSARAG.
O grupo também produziu diretrizes com procedimentos a serem seguidos, exigindo que cada EMT atenda
a certos padrões e adquira um número de registro do estado afetado antes da implantação para fornecer
assistência médica33. Semelhante ao UCC, um Célula de Coordenação da Equipe Médica de Emergência
(do inglês, Emergency Medical Team Coordination Cell ‑ EMTCC) será estabelecido dentro das autoridades
nacionais de saúde para coordenar a implantação de EMTs.

33) OMS, “Equipes médicas de emergência”. Disponível em: <https://www.who.int/emergencies/partners/emergency-medical-teams>.

100
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

a Integrada
nç da
s e O
Dois pés para dentro »

N
Pr

U
Este modelo estrutural será usado em um PNUD
UNDP Missão
Mission
cenário pós-conflito estável. Nesse UNICEF
UNICEF
cenário, a crise humanitária já passou e ACNUR
DSRSG/RC/HC1

há pouca ou nenhuma percepção de ser


UNHCR
PAM
parte do conflito. Fora da posição de três WFP OCHA2
OMS
cabeças do DSRSG/HC/RC, a função HC WHO
pode ser eliminada.

Integrada
n ça da Dois pés para fora »
se O
Esse modelo será usado quando uma missão
e
Pr

política ou de manutenção da paz da ONU


U

UNDP
for implantada em situações de alta
PNUD
UNICEF
Missão
Mission instabilidade (conflito persistente e
UNICEF
UNHCR generalizado, falta de um processo de
ACNUR
WFP paz crível ou onde a força de paz não seja
OMS
WHO amplamente aceita e/ou spoilers significativos
OCHA
OCHA estejam ativos). O HC e o OCHA permanecerão
RC/HC
totalmente separados da estrutura da missão, a
fim de preservar a independência e a neutralidade
de seu trabalho humanitário.

Integrada
Um pé dentro, um pé fora » nça da
e se O
Essa forma de integração estrutural é
Pr

aplicada a missões de paz ou políticas que


U

UNDP
PNUD Missão
são implantadas em países que emergem Mission
UNICEF
de crises onde há um processo político UNICEF
UNHCR
ACNUR
relativamente estável, spoilers mínimos
e a importância da ação humanitária está
WFP
PMA DSRSG/RC/HC

diminuindo. Envolve um posto combinado OMS


WHO
DSRSG/RC/HC dentro da missão com uma OCHA
OCHA
presença da OCHA claramente identificada
fora da estrutura da missão.

101
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

Seção 4.6 Missões Integradas da ONU e Percepção de


Coordenação
Esta seção destaca brevemente alguns aspectos relacionados às missões integradas da ONU.
Informações adicionais sobre este assunto podem ser encontradas no curso POTI Coordenação Civil-
Militar em operações de paz.

De acordo com as diretrizes do processo de planejamento de missões integradas, uma missão


integrada é uma missão “na qual há uma visão compartilhada entre todos os atores da ONU quanto
ao objetivo estratégico da presença da ONU em nível de país34”. Isso significa que todos os atores da
ONU — negros e azuis35 — estão trabalhando juntos e no âmbito das atividades de consolidação da
paz. A política de avaliação e planejamento integrado define “presença integrada da ONU” como “a
configuração do sistema da ONU em todas as situações de conflito e pós-conflito em que a ONU tem
uma equipe de país e uma operação de paz multidimensional36 ou missão/escritório político especial,
independentemente de essa presença ser estruturalmente integrada37”. Embora a integração estratégica
possa parecer uma abordagem lógica para garantir uma política mais coerente para todos os atores da
ONU, parece que, para muitos atores não pertencentes à ONU, a integração estrutural está se tornando
um problema sobre a prestação imparcial de assistência.

Muitas organizações, incluindo agências da ONU, têm sentimentos contraditórios quando as agências
da ONU se tornam parte de uma integração estrutural com a ONU e outras forças militares. Eles podem
sentir que sua ação humanitária pode ser influenciada por prioridades políticas e/ou militares, ou
que essa integração estrutural sob uma única linha de gestão pode criar a percepção de estar muito
envolvido com alguns atores do conflito, incluindo o estado. De acordo com algumas organizações, esta
percepção levou a um aumento do sentimento de insegurança, o que, em alguns casos, resultou no
direcionamento direto dos trabalhadores humanitários38. Embora não haja provas concretas disso, isso
não pode ser descartado — as percepções podem muitas vezes ser tendenciosas.

Especialmente em situações de conflito em que o estado é parte do conflito, a coordenação


humanitária pode precisar acontecer com um envolvimento limitado do estado – independentemente de
o estado controlar ou não o território. O tipo de crise e a escala e complexidade da resposta determinarão
os mecanismos de coordenação, sua duração e sua localização (nacional, subnacional etc.). É importante
que os CRS simplifiquem a estrutura de coordenação para permitir que os respondentes se concentrem
em atender as pessoas afetadas em vez de participar de reuniões. Três mecanismos principais foram
desenvolvidos como parte da arquitetura humanitária internacional para fortalecer a transparência, a
prestação de contas e a cooperação entre agências39.

34) Nações Unidas, Princípios e Diretrizes das Operações de Manutenção da Paz das Nações Unidas, 2008, 53. Disponível em inglês: <https://
peacekeeping.un.org/sites/default/files/capstone_eng_0.pdf>.
35) “Black UN” refere-se às forças militares da ONU com etiquetas pretas em veículos brancos, enquanto “Blue UN” refere-se às agências humanitárias
com etiquetas azuis em veículos brancos.
36) Uma operação de paz multidimensional é uma missão de paz que compreende uma combinação de componentes militares, policiais e civis substantivos
trabalhando juntos para implementar um mandato do Conselho de Segurança.
37) Nações Unidas, Política de Avaliação e Planejamento Integrados, 2013. Disponível em inglês: <https://unsdg.un.org/resources/un-policy-integrated-
assessment-and-planning>.
38) Emilie Combaz, “O impacto das missões integradas nas operações humanitárias”, GSDRC, 5 de julho de 2013. Disponível em inglês: <http://www.
gsdrc.org/docs/open/hdq939.pdf>.
39) OCHA, “OCHA on Message: Integration Structural Arrangements”, abril de 2010. Disponível em inglês: <https://www.unocha.org/sites/dms/
Documents/OOM_Integration_English.pdf>.

102
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

A função de três cabeças do DRSG/RC/HC pode causar problemas. Martin Barber, ex-diretor do
serviço de ação contraminas da ONU, afirma que o HC não deve fazer parte de uma missão integrada,
pois pode se tornar difícil cumprir dentro da estrutura integrada se o conflito recomeçar40. As missões
integradas devem ser estritamente limitadas a situações de pós-conflito. Em sua nota de política
humanitária “missões integradas da ONU e ação humanitária”, a Oxfam afirma que “a ação humanitária
normalmente deve permanecer estruturalmente separada dos componentes políticos ou de manutenção
da paz de uma missão integrada41”.

Seção 4.7 Disposições de Coordenação Civil-Militar Durante


Desastres Naturais
A Lição 3 descreveu a interação potencial entre os militares e os humanitários. A presença e
disponibilidade do FMA e a forma como os humanitários o utilizam podem ser cruciais para preencher
as lacunas existentes – especialmente durante os primeiros dias de um desastre. Além das diretrizes
específicas de cada país e certamente durante emergências de grande escala, os humanitários e militares
precisarão estabelecer uma estrutura de coordenação para otimizar e organizar o uso das FMA. Essa
estrutura de coordenação pode assumir a forma de um Centro de Coordenação de Operações Humanitário-
Militar (do inglês, Humanitarian-Military Operation Coordination Centre — HuMOCC), servindo como uma
câmara de compensação para todas as solicitações de FMA provenientes de organizações humanitárias.
Em muitos casos, a elaboração de pops será a maneira mais adequada de agilizar todas as solicitações e
esclarecer como as FMA apoiarão as atividades humanitárias e em que condições (administração, arranjos
de descarga no local, tempo necessário, etc.). Uma pergunta comum é: quem determinará as prioridades
no tipo de mercadoria a ser transportada/expedida? O HCT é responsável pela priorização e deve também
orientar a atribuição das FMA.

Algumas capacidades militares que podem ser solicitadas incluem:

• Logística — transporte (aéreo, terrestre ou marítimo), gestão, armazenagem, mecânica, etc.;

• Engenharia — reparação de infraestruturas (por exemplo, estradas e pontes, aeroporto e porto


marítimo, etc.), operações de limpeza de estradas, etc.;

• Telecomunicações (por exemplo, voz e dados baseados em satélite);

• Troca de informações — informações de avaliação, geomapeamento (por exemplo, acessibilidade


rodoviária após um desastre por tipo de veículo), prioridades em relação aos serviços e locais,
gargalos, lacunas, etc.; e

• Saúde — evacuação médica, capacidade médica específica (por exemplo, um navio-hospital), etc.

Conforme mencionado na Lição 3, as forças militares e as FMA podem estar disponíveis apenas por
um período limitado. É importante desenvolver uma estratégia de saída e transição desde o início.

Normalmente, haverá um indivíduo na equipe da UNDAC qualificado pelo CMCoord. Este membro
da equipe deve coordenar o mais rápido possível com os militares internacionais e nacionais para
determinar se já existem procedimentos no uso de MCDA ou FMA. Outro potencial ator do FMA é o
cluster logístico, liderado pelo PMA. As questões de transporte podem ser a parte mais desafiadora.

40) Martin Barber, Cegos pela humanidade: por dentro das operações humanitárias da ONU, New York, New York, IB Tauris & Co Ltd, 2015.
41) Oxfam International, “UN Integrated Missions and Humanitarian Action”, agosto de 2014, 4. Disponível em inglês: <https://www.oxfam.org/sites/
www.oxfam.org/files/file_attachments/story/oi_hum_policy_integrated_missions_august2014.pdf>.

103
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

Idealmente, o NDMA do estado afetado deveria liderar o HuMOCC. Um HuMOCC visa entregar
alguns serviços específicos, incluindo42:

• Fornecer um mecanismo de coordenação previsível e eficaz no terreno;

• Evitar o estabelecimento de plataformas de Coordenação Civil-Militar ad hoc ou imediatas que


criem duplicação e confusão;

• Facilitar o acesso aos resultados da avaliação, incluindo prioridades, necessidades e requisitos


(por exemplo, o uso de meios militares);

• Ajudar a estabelecer um sistema baseado em necessidades para combinar os requisitos com


meios militares apropriados;

• Aconselhar sobre as FMA apropriadas a serem implantadas no estado afetado e locais prioritários;

• Ajudar a criar uma consciência situacional comum entre todos os atores que respondem ao
desastre de forma coerente e sistemática;

• Facilitar o compartilhamento eficaz e consistente de informações entre atores humanitários e


militares;

• Sensibilizar as organizações humanitárias e os atores militares para a função do CMCoord;

• Melhorar a compreensão mútua das operações e requisitos;

• Desenvolver uma estratégia de saída para redução de ativos militares;

• Garantir a cobertura geográfica de oficiais treinados da CMCoord (incluindo linguagem adequada


e conhecimento técnico); e

• Advogar por treinamento institucionalizado pré-desastres e desenvolvimento de doutrina entre


as forças militares destacadas na resposta a desastres. Se o tempo permitir, isso pode incluir
orientações e briefings no CMCoord.

Seção 4.8 Financiamento Humanitário43


O financiamento e os fundos humanitários também são elementos-chave na HRO. Sem o
financiamento necessário, as operações são impossíveis de realizar. Embora existam outros tipos de
mecanismos de financiamento, esta lição se concentra nas ferramentas de financiamento relacionadas
ao IFRC e ao OCHA.

A IFRC organiza instrumentos financeiros para responder a desastres principalmente por meio de
apelos de emergência ou Fundos de Emergência para Ajuda em Desastres (DREFS44). Apelações de
emergência podem ser emitidas a pedido de uma sociedade nacional membro dentro de horas após
uma grande emergência ou desastre (geralmente como uma apelação preliminar e sujeita a revisão45).
O apelo articula a resposta planejada da federação internacional a uma situação de emergência com
necessidades significativas de assistência internacional. O recurso de emergência será revisado com uma
primeira atualização emitida dentro de 30 dias do lançamento do recurso. Para emergências de pequena

42) OCHA, Manual de Campo UN-CMCoord (v2.0), Genebra, Suíça, OCHA, 121. Disponível em inglês: <https://www.unocha.org/sites/unocha/files/%5BE-
Version%5D%20UNCMCoord%20Field%20Handbook%202.0%20%282018%29.pdf>.
43) OCHA, “Isso é OCHA”. Disponível em inglês: <https://reliefweb.int/report/world/ocha-2015> .
44) IFRC, “Fundo de Emergência para Assistência a Catástrofes (DREF)”. Disponível em inglês: <https://www.ifrc.org/disaster-response-emergency-
fund-dref>.
45) IFRC, “Fundo de Emergência para Assistência a Catástrofes (DREF)”.

104
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

escala, um DREF pode ser ativado para iniciar uma operação de emergência. A IFRC estabeleceu
DREFs pela primeira vez em 1985 para garantir a disponibilidade de apoio financeiro imediato para a
resposta de emergência da cruz vermelha e do crescente vermelho a um desastre em andamento. As
alocações podem estar disponíveis em 24 horas e podem ser feitas na forma de empréstimos iniciais
(para desastres de grande escala), doações (para operações de socorro de emergência em pequena
escala) ou atividades de preparação no caso de um desastre iminente. As autoridades analisam as
solicitações de alocações de DREF caso a caso.

O OCHA organiza “esforços para planejar ações


humanitárias, obter financiamento e monitorar o
progresso após desastres repentinos e durante
crises prolongadas46”. Os pedidos de financiamento
baseiam-se numa avaliação exaustiva das
necessidades. Eles são apoiados por planos de
resposta estratégica que descrevem a resposta
humanitária comum e apresentam o caso de
assistência usando evidências convincentes. Uma
O secretário-geral António Guterres tece comentários
das ferramentas de financiamento é conhecida como sobre o evento de doação de alto nível do Fundo

Fundo Central de Resposta a Emergências (do Central de Resposta a Emergências (do inglês, Central
Emergency Response Fund - CERF). O evento foi uma
inglês, Central Emergency Response Fund – CERF).
oportunidade para destacar as realizações do Fundo,
Em 2006, a assembleia geral da ONU lançou o anunciar promessas para 2021 e garantir que o nível

CERF, um fundo humanitário, “para permitir uma de financiamento do CERF continue em direção à meta
expandida de US$ 1 bilhão, conforme endossado pela
assistência humanitária mais oportuna e confiável
Assembleia Geral. 8 de dezembro de 2020. Foto da ONU
às pessoas afetadas por desastres naturais e por Evan Schneider.

conflitos armados47”. Seus objetivos são:

• Incentivar ações e respostas precoces para reduzir a perda de vidas;

• Melhorar a resposta a requisitos de tempo crítico; e

• Fortalecer os elementos-chave da resposta humanitária em crises de subfinanciamento.

Os fundos de resposta rápida do CERF podem ajudar a diminuir a inconsistência e os atrasos que
as organizações humanitárias podem enfrentar com contribuições voluntárias. Esses fundos apoiam
atividades humanitárias que salvam vidas durante os estágios iniciais de crises de início súbito. Os fundos
também podem ser usados para responder a requisitos urgentes ou uma deterioração significativa em
uma emergência existente48. Fornecer fundos de resposta rápida é um exercício de campo pelo qual:

• “O RC/HC recomenda o uso do CERF e identifica as necessidades prioritárias para salvar vidas
consultando a equipe Humanitária do País (HCT) [;]

• O RC/HC apresenta um pacote de propostas com base nas necessidades avaliadas [;]

• O ERC aprova as candidaturas [; e]

• A ONU desembolsa fundos para agências elegíveis49.”

46) OCHA, “Isso é OCHA”, 10.


47) OCHA, “Fundo Central de Resposta a Emergências 2016-2020 - OCHA”, Relatório MENA. Londres: Albawaba Ltd., 2016.
48) CERF da ONU, “Resposta Rápida”. Disponível em inglês: <https://cerf.un.org/apply-for-a-grant/rapid-response> .
49) CERF da ONU, “Resposta Rápida”.

105
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

Partes dos fundos de resposta rápida do CERF serão usadas no Flash Appeal (FA) ou plano de
resposta inicial, que é uma ferramenta para estruturar uma resposta humanitária coordenada para
os primeiros três a seis meses de uma emergência. O HC, em consulta com as partes interessadas,
aciona e emite o FA dentro de uma semana após uma emergência. A FA fornece uma visão geral
concisa das necessidades urgentes para salvar vidas e pode incluir projetos de recuperação que podem
ser implementados dentro do prazo do recurso. O FA é baseado na metodologia Multi-Cluster Initial
Rapid Assessment (MIRA) e será finalizado em um Plano de Resposta Estratégica (do inglês, strategic
response plan — SRP) um mês após o início da emergência.

O CERF coleta doações de governos, fundações, empresas, instituições de caridade e indivíduos,


em um único fundo com uma meta anual de US$ 1 bilhão50. O OCHA administra três tipos de fundos
agrupados: CERF, Fundos Humanitários Comuns (do inglês, common humanitarian funds — CHFs) e
Fundos de Resposta a Emergências (do inglês, Emergency Response Funds — ERFs).

• A mobilização de fundos pode levar tempo. O CERF aborda este problema através de bolsas de
resposta rápida, que podem ser aprovadas em menos de 48 horas após a decisão do ERC. O
CERF fornece financiamento inicial no início de uma crise humanitária e apoio a emergências
subfinanciadas em todo o mundo.

• Os CHFS fornecem financiamento baseado no país previsível para necessidades humanitárias


críticas durante emergências prolongadas de grande escala. Os CHFS variam em tamanho de
US$ 50 milhões a US$ 150 milhões.

• Os ERFS fornecem financiamento inicial para fornecer ajuda essencial e cobrir necessidades
urgentes na resposta a emergências de início súbito. As ongs recebem a maior parte dos fundos.
Os ERFS variam em tamanho de US$ 2 milhões a US$ 5 milhões.

• O CERF tem uma facilidade de US$ 30 milhões. Empréstimos de até um ano são concedidos
com base na indicação de que o financiamento dos doadores está próximo.

O serviço de monitorização financeira (do inglês, financial tracking service — FTS) registra todos os
financiamentos relatados por doadores e organizações receptoras. O FTS é um banco de dados global
em tempo real de toda a ajuda humanitária relatada gerenciada pelo OCHA.

50) CERF da ONU, “Quem Somos”. Disponível em inglês: <https://cerf.un.org/about-us/who-we-are> .

106
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

Questionário de fim de Lição  »

1. A ausência de coordenação muitas 5. Qual das seguintes descrições da UNDAC


vezes pode levar a qual dos seguintes é FALSA?
problemas?
A. As equipes da UNDAC podem atuar em
A. Assistência inadequada à população afetada curto prazo (12-48 horas) em qualquer
B. Uso ineficiente de recursos lugar do mundo.
C. Duplicação de esforços B. A UNDAC fornece equipes para o país
D. Todas as opções anteriores afetado pelo desastre gratuitamente.
C. As equipes são mobilizadas a pedido do
2. A abordagem de cluster garante _____
coordenador humanitário ou residente das
claras na resposta internacional a
Nações Unidas ou do governo afetado.
emergências humanitárias, esclarecendo
a divisão do trabalho entre as D. As equipes da UNDAC não dependem
organizações e definindo melhor seus diretamente da ERS/RSB/OCHA Genebra.
papéis e responsabilidades dentro dos
diferentes setores de resposta. 6. Qual das afirmações sobre os três
objetivos principais de um OSOCC é
A. liderança, responsabilidade e prestação de
FALSA?
contas
A. Funciona como uma interface entre os
B. liderança, previsibilidade e responsabilidade
respondentes internacionais e o governo do
C. responsabilidade, previsibilidade e prestação
país afetado.
de contas
B. Fornece um sistema para coordenar e
D. liderança, previsibilidade e responsabilidade
facilitar as atividades de esforços de socorro

3. O _____ decide se deve solicitar a internacional em um local de desastre


ativação do sistema de cluster caso — notadamente após um terremoto —
uma necessidade específica de resposta onde a coordenação de muitas equipes
a emergências não seja atendida, internacionais da usar é fundamental para
causando uma lacuna de coordenação.
garantir esforços de resgate ideais.
A. HCT C. Fornece uma plataforma para cooperação,
B. RC/HC coordenação e gerenciamento de
C. ERC informações entre agências humanitárias
D. governo nacional internacionais.
D. Fornecer uma estrutura de comando e
4. Qual das seguintes afirmações é FALSA?
controle para os militares para evitar a
A. A UNCT e a HCT coexistem; eles não duplicação de esforços.
substituem uma à outra.
B. Em países onde não há emergência
humanitária, HCTs podem ser estabelecidos
para coordenar a fase de preparação.
C. Pode-se supor que todos os membros da
UNCT se tornam membros da HCT.
D. O HCT aborda questões humanitárias
estratégicas da comunidade humanitária
mais ampla.

As respostas estão disponíveis na página seguinte.

107
LIÇÃO 4 | Mecanismo de Coordenação Humanitária

Questionário de fim de Lição  »

7. A coordenação humanitária pode ser 9. Qual dos seguintes NÃO é um dos


definida como uma forma abrangente e três principais mecanismos que foram
baseada em princípios de administrar desenvolvidos como parte da arquitetura
a prestação de assistência humanitária humanitária internacional para fortalecer
por meio de planejamento _____, a transparência, a responsabilidade e a
formulação de políticas e facilitação cooperação entre agências?
da cooperação e tomada de decisão
A. Dois pés dentro: modelo estrutural em um
consensual?
cenário pós-conflito estável.
A. tático
B. Dois pés dentro: modelo estrutural em
B. estratégico situação de alta instabilidade.
C. operacional C. Um pé dentro, um pé fora: implantado
D. técnico em países que saem da crise onde há um
processo político relativamente estável.
8. O OSOCC virtual (VO) _____.
D. Dois pés fora: implantado em situação de
A. É uma plataforma online de intercâmbio e
alta instabilidade.
coordenação de informações sobre desastres
restrita a gerentes de desastres em todo 10. Idealmente, quem deveria liderar um
o mundo (governos e organizações de HuMOCC?
resposta) A. O comandante militar
B. É administrado pelo OCHA Genebra/ERS/RSB B. O líder da equipe do UNDAC
durante a resposta a um desastre C. O oficial UN-CMCoord
C. Listará todas as equipes de intervenção D. O NDMA do estado afetado
ativadas, suas especialidades e seu status real
D. Todas as opções anteriores

Respostas »
1. D

2. B

3. A

4. C

5. D

6. D

7. B

8. D

9. B

10. D

108
OPERAÇÕES HUMANITÁRIAS

LIÇÃO

5 Questões Transversais

Esta lição fornece uma


visão geral das questões
transversais aplicáveis em
todas as áreas de uma
operação humanitária e
nos diferentes setores
envolvidos.

Foto da ONU por Pasqual Gorriz.

Nesta lição » Objetivos da lição »

Seção 5.1 Populações Afetadas • Distinguir os diferentes tipos de populações


- Diferentes Tipos e afetadas durante uma crise.
Definições
• Compreender os princípios básicos de gênero e
Seção 5.2 Questões de Gênero e seu impacto potencial.
Grupos Vulneráveis
• Compreender os princípios da proteção,
Seção 5.3 Proteção especialmente de crianças.

Seção 5.4 Segurança e Proteção • Distinguir as diferentes implicações dos aspectos


de segurança e proteção das organizações de
Seção 5.5 Gerenciamento de restos
ajuda humanitária.
mortais durante um

desastre • Compreender as implicações da gestão de restos


humanos durante um desastre.

INSTITUTO DE TREINAMENTO EM OPERAÇÕES DE PAZ

109
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

Uma aeronave do Programa Mundial de Alimentos lança sacos de suprimentos. 21 de outubro de 2015. Foto da ONU por Isaac Billy.

Introdução

Esta lição fornece informações sobre o que fazer


e o que não fazer no contexto de uma operação
humanitária.

As populações afetadas por um desastre precisam


de apoio para salvar vidas na primeira etapa da
resposta, pois suas comunidades e meio ambiente
Assista a uma introdução em vídeo
podem ter sido destruídos ou fortemente deslocados. desta em inglês: <https://www.

Os esforços de resposta começarão imediatamente peaceopstraining.org/videos/495/


hro-lesson-5-cross-cutting-
após o desastre, e a abordagem e a coordenação do
issues/>.
cluster farão parte dessa resposta. Um certo número
de tópicos são questões transversais (como gênero,
proteção, etc.) e são aplicáveis em todos os clusters
desde o início, começando com a avaliação das
necessidades. Para serem eficazes, as organizações e

110
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

os agrupamentos têm de incluir estas questões transversais nos seus programas; caso contrário, certos
grupos da população afetada podem não ter representação no esforço geral de resposta. Os tópicos
desenvolvidos nesta lição cobrirão informações sobre aspectos do esforço de resposta que muitas vezes
são negligenciados. Esta lição inclui discussões sobre segurança e proteção – ambas vitais para o
ambiente em que algumas organizações devem operar – e os desafios que isso envolve, bem como
a gestão de restos mortais humanos, que é uma realidade frequentemente esquecida em desastres
com fatalidades em massa. A gestão da segurança e proteção e o tratamento dos restos mortais em
determinados domínios também podem ter uma dimensão transversal. Algumas seções se sobrepõem
e os trabalhadores humanitários podem encontrar assuntos semelhantes de formas ligeiramente
diferentes. O objetivo principal desta lição é enfatizar alguns desses assuntos e suas interligações.

Seção 5.1 Populações Afetadas — Diferentes Tipos e Definições

Introdução (“Nihil novi sub sole1”)

A migração sempre existiu. Em muitos casos, as condições de vida difíceis, muitas vezes associadas
à grave escassez de alimentos e à fome, foram as principais causas da migração. As pessoas migraram
em busca de melhores oportunidades em outros lugares além de suas casas. A colonização europeia em
todo o mundo também desencadeou a migração. As reformas após a Revolução Francesa destinadas a
acabar com o feudalismo e dar mais poder aos cidadãos falharam parcialmente, com pouca ou nenhuma
melhoria das condições de vida. A Revolução Industrial e seus efeitos socioeconômicos, as guerras
europeias e a construção da nação, a Grande Fome da Irlanda, a perseguição religiosa, a tirania política
e a falta de mobilidade social levaram à pobreza e ao sofrimento generalizados. Além disso, taxas de
natalidade mais altas devido ao melhor conhecimento médico levaram ao aumento da população em
algumas áreas, o que tornou mais difícil a possibilidade de propriedade da terra e uma subsistência digna.
As consequências foram fluxos migratórios maciços — principalmente para o Novo Mundo — em busca
de melhores oportunidades econômicas e um padrão de vida mais alto, liberdade de religião e expressão
e um sistema político democrático. No século XIX, muitos imigrantes irlandeses e alemães vieram para a
América do Norte, enquanto outros imigrantes se mudaram para Argentina, Brasil e Austrália2.

No século XX, a primeira e a segunda guerras mundiais levaram à migração e deslocamento em


massa e estimularam a criação de muitas agências humanitárias da ONU. Mais recentemente, as guerras
no Afeganistão, Iraque e República Árabe Síria causaram migração (às vezes forçada) ou deslocamento
de milhões de pessoas. Além disso, a instabilidade política, o alto crescimento populacional, o fraco
desenvolvimento econômico e a injustiça social em muitos países africanos criaram uma segunda
onda contínua de migração/deslocamento para a Europa através do Mar Mediterrâneo. Nesses casos,
a migração está associada ao enorme sofrimento humano e à exploração realizada por organizações
criminosas, e cria desafios para muitos países anfitriões e suas populações. A forma como esses países
podem integrar esses migrantes e a vontade dos próprios migrantes de se integrarem ao país de
acolhimento apresentarão desafios nas próximas décadas.

1) “Não há nada de novo debaixo do sol”, (latim – Vulgata).


2) Samuel L. Baily e Eduardo José Míguez, Migração em massa para a América Latina Moderna, Rowman & Littlefield, 2003, xiv.

111
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

De acordo com estatísticas do ACNUR3, 2019 registrou as maiores taxas de movimento forçado ou
deslocamento começaram em4 Ao falar sobre movimento forçado ou deslocamento, os humanitários
devem distinguir entre diferentes tipos de grupos populacionais afetados com base na natureza de
seu deslocamento forçado (por exemplo, desastre, conflito armado, etc.). É importante ser capaz de
distinguir o seu estatuto, uma vez que diferentes estatutos conferem aos migrantes direitos diferentes.
Alguns desses grupos podem ser mais vulneráveis do que outros. Também é importante analisar sua
vulnerabilidade e a situação pré-deslocamento. Esta lição descreve brevemente os diferentes tipos de
populações afetadas que os humanitários podem encontrar.

Migração e Deslocamento

Em muitos casos, usamos termos como migração, migração forçada, deslocamento forçado, entre
outros. Eles são iguais, ou existem algumas diferenças entre esses termos?

» Deslocamento é “o movimento forçado de pessoas de sua localidade


ou ambiente e atividades ocupacionais5”. A razão mais comum
para isso é o conflito armado, mas outros fatores como desastres
naturais, fome e más condições econômicas também podem causar
deslocamento. Até mesmo programas de desenvolvimento podem
ser a causa de deslocamento/deslocamento forçado de pessoas e
comunidades inteiras (por exemplo, construção de uma barragem
hidrelétrica). Na maioria dos casos, o empobrecimento é o principal
resultado do deslocamento.

» A migração é “a travessia da fronteira de uma unidade política ou


administrativa por um determinado período de tempo mínimo. Inclui o
movimento de refugiados, pessoas deslocadas, pessoas desenraizadas
e migrantes econômicos6”.

Existem diferenças entre migração interna e internacional:

• A migração interna envolve pessoas que se deslocam de uma área de um país para outra área
dentro do mesmo país.

• A migração internacional é uma realocação territorial de pessoas entre Estados.

O turismo e a transferência organizada de refugiados dos Estados de origem para refúgios seguros
são duas formas de realocação excluídas desta definição ampla.

Refugiados, migrantes, requerentes de asilo e retornados

» Refugiados são “pessoas que estão fora de seu país de origem por
motivos de temida perseguição, conflito, violência generalizada ou
outras circunstâncias que tenham perturbado seriamente a ordem

3) ACNUR, “Figuras em relance”. Disponível em inglês: <http://www.unhcr.org/figures-at-a-glance.html>.


4) ACNUR, Tendências Globais: Deslocamento Forçado em 2019, 18 de junho de 2020. Disponível em inglês: <https://www.unhcr.org/5ee200e37.pdf>.
5) UNESCO, “Glossário”. Disponível em inglês: <http://uis.unesco.org/en/glossary>.
6) UNESCO, “Glossário”.

112
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

pública e, como resultado, requeiram proteção internacional7”. A


definição de refugiado consta na Convenção e Protocolo Relativo
ao Estatuto dos Refugiados de 1951 e instrumentos regionais de
refugiados, bem como no Estatuto do Alto Comissariado para os
Refugiados8.

O Protocolo Relativo ao Estatuto dos Refugiados de 1967 atualizou a definição anterior, refinando-a
para descrever uma pessoa que:

• Está fora da sua país de nacionalidade ou residência habitual;

• Tem um medo fundado de perseguição por causa de sua raça, sexualidade, religião, nacionalidade,
filiação num determinado social ou opinião políticos; e

• Não pode ou não quer receber proteção desse país, ou voltar para lá, por medo de perseguição.

Migrante ‒ Embora “migrante internacional” não tenha uma definição legal formal,
muitas fontes consideram um migrante internacional como uma pessoa “que
muda de país de residência habitual, independentemente do motivo da migração
ou do status legal. Geralmente, distingue-se entre migração de curta duração ou
temporária, abrangendo movimentos com duração entre três e 12 meses, e migração
de longa duração ou permanente, referente a uma mudança de país de residência
com duração de um ano ou mais9.”

Membros da delegação do Conselho de Segurança visitam o campo de refugiados de Kutupalong em Cox’s Bazar, Bangladesh. O
campo era o maior assentamento de refugiados do mundo na época da foto, abrigando cerca de 600.000 refugiados. 29 de abril de
2018. Foto da ONU por Caroline Gluck.

7) Sobre grandes movimentos de refugiados e migrantes, “Definições”. Disponível em inglês: <http://refugeesmigrants.un.org/definitions>.


8) Convenção e Protocolo Relativo ao Estatuto dos Refugiados, Artigo I, Seção A(2), 1951. Disponível em inglês: <https://www.unhcr.org/en-us/1951-
refugee-convention.html>.
9) Sobre grandes movimentos de refugiados e migrantes, “Definições”.

113
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

O Relator Especial da Comissão de Direitos Humanos propôs a seguinte definição para “migrantes10”:

• “As pessoas que se encontram fora do território do Estado de que são nacionais ou cidadãos,
não estão sujeitas à sua proteção legal e se encontram no território de outro Estado;

• As pessoas que não gozem do reconhecimento jurídico geral dos direitos inerentes à concessão
pelo Estado de acolhimento do estatuto de refugiado, naturalizado ou equiparado;

• Pessoas que não gozem de proteção jurídica geral de seus direitos fundamentais em virtude de
acordos diplomáticos, vistos ou outros acordos”.

» Os requerentes de asilo são pessoas que viajam através das


fronteiras para proteção, mas que podem não cumprir os critérios
rigorosos incluídos na Convenção e Protocolo Relativo ao Estatuto dos
Refugiados de 1951. O termo “requerente de asilo” descreve:

“…alguém que solicitou proteção como refugiado e está aguardando a determinação


de seu status. Refugiado é o termo usado para descrever uma pessoa que já recebeu
proteção. Os requerentes de asilo podem tornar-se refugiados se a autoridade local
de imigração ou de refugiados os considerar adequados à definição internacional de
refugiado.

A definição de requerente de asilo pode variar de país para país, dependendo das leis de cada
Estado. No entanto, na maioria dos países, os termos “requerente de asilo”/”asilado” e “refugiado”
diferem apenas em relação ao local onde um indivíduo pede proteção. Enquanto um requerente de asilo
pede proteção depois de chegar ao país de acolhimento, um refugiado pede proteção e recebe esse
status de proteção fora do país de acolhimento11.”

» “Os repatriados são refugiados que regressam voluntariamente ao


seu país de origem e que deixam formalmente de ser refugiados assim
que cruzam a fronteira. A Assembleia Geral da ONU encarregou o
ACNUR de proteger e ajudar os retornados, tanto durante a viagem
quanto uma vez de volta ao país de origem, e facilitar a busca de
soluções duradouras para seus problemas12.”

» Um apátrida é uma pessoa “que não é considerada nacional por


nenhum país13”. A Declaração Universal dos Direitos do Homem
(DUDH) afirma que toda pessoa tem direito a uma nacionalidade e
ninguém deve ser arbitrariamente privado de sua nacionalidade ou do
direito de mudar de nacionalidade.

10) Comissão de Direitos Humanos, E/CN.4/RES/1999/44, 27 de abril de 1999. Disponível em: <http://ap.ohchr.org/documents/alldocs.aspx?doc_id=4660>.
11) UNESCO, “Glossário”.
12) ACNUR, Manual para Emergências, 3ª ed., 2007, 18. Disponível em inglês: <https://emergency.unhcr.org/>.
13) ACNUR, Manual para Emergências, 18.

114
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

» A definição de pessoas deslocadas


internamente (PDIs) mais comumente
usada vem dos Princípios Orientadores
das Nações Unidas sobre Deslocação
Interna. Os Princípios Orientadores
definem os deslocados internos como
“pessoas ou grupos de pessoas que
foram forçadas ou obrigadas a fugir
ou a deixar suas casas ou locais de
residência habitual, em particular
como resultado ou para evitar os
efeitos de conflitos armados, situações
de violência generalizada, violações
de direitos humanos ou desastres
naturais ou causados pelo homem,
e que não cruzaram uma fronteira
internacionalmente reconhecida14”.

“As medidas para ajudar os deslocados internos


são amplamente semelhantes às usadas para os PDIs timorenses esperam para embarcar no navio que
refugiados. No entanto, os deslocados internos os levará para casa em Díli, Timor Leste. 1 de outubro
de 1999. Foto da ONU por ACNUR/M. Kobayashi.
permanecem em seu próprio país, e são as leis
nacionais desse Estado que fornecem a estrutura
para sua proteção e direitos, em vez de instrumentos jurídicos internacionais específicos. Instrumentos
universais de direitos humanos” sempre se aplicam a deslocados internos15.

» DPRE é um acrônimo típico da OTAN que significa Deslocados e


Refugiados16. Neste caso, não é feita distinção entre ambas as entidades.

Em casos como a crise de Darfur, as organizações encontraram os mesmos grupos de pessoas


afetadas fugindo de suas casas. Alguns cruzaram sua fronteira nacional e entraram no Chade, tornando-
se refugiados, enquanto outros permaneceram dentro de seu país como deslocados internos, o que foi
bastante desafiador para as organizações humanitárias que trabalhavam em ambos os lados17.

Seção 5.2 Questões de Gênero e Grupos Vulneráveis


O termo “gênero” refere-se às diferenças socialmente construídas entre mulheres e homens ao
longo de seus ciclos de vida18. Ele pode determinar os papéis, poder e recursos para mulheres e homens
em qualquer cultura, o que pode mudar ao longo do tempo. Em muitas sociedades (principalmente
dominadas por homens), gênero é sinônimo de empoderamento das mulheres e pode, portanto, parecer

14) ACNUR, “Perguntas e respostas sobre deslocados internos”. Disponível em inglês: <http://www.ohchr.org/EN/Issues/IDPersons/Pages/Issues.aspx>.
15) ACNUR, Manual para Emergências, 42.
16) Maior Juan A. Pina, “DPRE: os fatos”, SFOR Informer Online, 12 de abril de 2000. Disponível em inglês: <http://www.nato.int/Sfor/indexinf/85/dpre/
t000414i.htm>.
17) Grande conflito armado em Darfur na região de Sudão que começou em fevereiro de 2003 e terminou com o acordo de cessar-fogo em fevereiro de 2010.
18) IASC e ACNUR, Manual de Gênero do IASC em Ação Humanitária, dezembro de 2006. Disponível em inglês: <http://www.unhcr.org/protection/
women/50f91c999/iasc-gender-handbook-humanitarian-action.html>.

115
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

ir contra as normas culturais. Em essência,


“empoderamento” implica uma mudança
nas relações de poder que faz com que um
determinado grupo social tenha baixo status
social ou sofra injustiça sistemática19. Gênero
é sobre igualdade entre mulheres e homens.
Isso “não significa que mulheres e homens
sejam iguais, mas que seu gozo de direitos,
oportunidades e chances de vida não são
governados ou limitados pelo” gênero20.

Ao desenvolver políticas, programas ou


atividades, os trabalhadores humanitários
A Comandante Carla Monteiro de Castro Araujo, Oficial de
devem tentar adotar uma abordagem Advocacia de Gênero da Missão de Estabilização Integrada
baseada em direitos usando o DIH para Multidimensional das Nações Unidas na República Centro-Africana
(MINUSCA), fala com membros da comunidade local em Mbomou,
determinar desigualdades e injustiças e
República Centro-Africana. 18 de maio de 2020. Foto da ONU por
focar nessas desigualdades para identificar Hervé Serefio.
a melhor maneira de intervir. Durante os
desastres, cada um dos principais grupos de
gênero (meninas, meninos, mulheres e homens) tem requisitos específicos que precisam de atenção
adequada. É fundamental analisar a questão de gênero em todos os seus detalhes de acordo com os
direitos de cada grupo para ter uma compreensão clara da dinâmica existente entre esses grupos.

Violência baseada em gênero durante emergências (desastres)

A violência baseada em gênero (VBG), particularmente a violência sexual, é uma questão de


proteção séria e com risco de vida. VBG “é um termo abrangente para qualquer ato prejudicial que é
perpetrado contra a vontade de uma pessoa e que se baseia em diferenças socialmente atribuídas (ou
seja, gênero)… Inclui atos que infligem dano ou sofrimento físico, sexual ou mental, ameaças de tais
atos, coerção e outras privações de liberdade. Esses atos podem ocorrer em público ou no privado21.”

De acordo com a Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente


Vermelho, os fatores que podem aumentar as taxas de VBG durante um desastre incluem22:

• O enfraquecimento dos mecanismos de proteção comunitária e institucional;

• Interrupção dos serviços e da vida comunitária;

• Destruição de infraestrutura; separação de famílias;

• Deslocamento; e

• Acesso limitado à justiça e aos serviços de saúde.

19) IASC e ACNUR, Manual de Gênero do IASC em Ação Humanitária.


20) MercyCorps, “BRIDGE & Gender Mainstreaming, um guia para a equipe do programa”. Disponível em inglês: <https://www.mercycorps.org/research-
resources/bridge-gender-mainstreaming-guide>.
21) IASC e ACNUR, Manual de Gênero do IASC em Ação Humanitária, fevereiro de 2018. Disponível em inglês: <https://interagencystandingcommittee.
org/system/files/2018-iasc_gender_handbook_for_humanitarian_action_eng_0.pdf>.
22) Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho e da Cruz Vermelha Irlandesa, “Folha de Informações sobre
Violência Baseada no Gênero em Desastres”, 30 de março de 2018. Disponível em inglês: <https://reliefweb.int/report/world/gender-based-violence-
disasters-information-sheet>.

116
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

A VBG frequentemente visa mulheres e meninas, especialmente durante emergências complexas e


desastres naturais. De acordo com o ACNUR, “a violência sexual é o tipo mais imediato e perigoso de
violência de gênero” no estágio inicial de uma emergência, quando instituições como a polícia e outras
autoridades policiais são muito fracas ou interrompida23. O recrutamento forçado de meninos também
é um fenômeno comumente observado, especialmente durante um conflito armado envolvendo atores
não estatais. A VBG pode assumir outras formas, como práticas tradicionais prejudiciais (por exemplo,
mutilação genital feminina, casamento precoce forçado, crimes de honra, etc.) e violência doméstica.
No rescaldo de desastres naturais, a gravidade e a incidência da violência doméstica geralmente
aumentam. Atores humanitários e outros no campo devem reconhecer esse desenvolvimento típico,
que pode exigir intervenção/ação imediata. A VBG é uma violação dos direitos humanos universais.

Devido à sua natureza pessoal, as incidências de VBG – particularmente violência sexual – são
amplamente subnotificadas. As vítimas raramente falam do incidente por várias razões, incluindo auto
culpa, medo de represálias e crescente desconfiança das autoridades. A reação dos familiares da vítima,
que pode incluir culpabilização, estigmatização e até rejeição das vítimas, são outros motivos para não
denunciarem esses atos violentos. O estigma e a rejeição podem ser especialmente graves quando as
vítimas falam ou relatam o incidente.

Durante os conflitos na região dos Grandes Lagos da África, muitos atores estatais e não estatais
usaram o estupro como arma – principalmente contra outros grupos étnicos para perturbar o tecido
social de uma determinada comunidade. Os perpetradores também usaram o HIV como arma de
guerra. Juntamente com a extrema violência dos atos sexuais perpetrados, infligiu graves traumas em
suas vítimas, causando graves e duradouros problemas de saúde, incluindo morte por lesões ou até
suicídio. Além disso, ocorreram outras consequências para a saúde, como gravidez indesejada, aborto
autoinduzido inseguro e infanticídio, bem como infecções sexualmente transmissíveis (incluindo HIV/
AIDS), deixando as vítimas com trauma psicológico extremo.

Gênero é uma questão transversal que deve ser abordada desde o início de um esforço para ajudar as
populações afetadas por desastres. Sempre que possível, os humanitários devem procurar um consultor
de gênero, pois as questões de gênero têm ramificações em diferentes setores. Um conselheiro de
gênero deve ser visto como um facilitador no processo de gênero e não como a parte responsável
por todas as atividades relacionadas ao gênero e aspectos da resposta. Para que os trabalhadores
humanitários sejam eficazes, eles devem garantir que o gênero como um tópico seja representado em
todos os níveis – dentro das autoridades governamentais (como tomadores de decisão) e organizações
humanitárias envolvidas – para aumentar a conscientização pública suficiente. Todos os programas
devem alocar recursos humanos e financeiros suficientes para uma integração efetiva de gênero.

Ter uma boa compreensão dos dados desagregados por sexo ajudará os humanitários a entender
melhor os desafios ao estabelecer programas, ajudando a identificar certos indicadores vinculados aos
diferentes grupos identificados dentro de uma comunidade. Como regra geral e sempre que planejar
um programa de assistência a uma população afetada, uma das primeiras ações que os trabalhadores
humanitários devem tomar é garantir que os beneficiários contribuam para o estabelecimento
de programas. As organizações muitas vezes veem isso como um fardo que retarda o processo de
assistência e sua execução. O envolvimento próximo e direto da população afetada (beneficiários) é

23) ACNUR, Diretrizes para Intervenções de Violência Baseada em Gênero em Contextos Humanitários, Enfocando a Prevenção e Resposta à Violência
Sexual em Emergências, setembro de 2005, 1. Disponível em inglês: <http://www.unhcr.org/453492294.pdf>.

117
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

a melhor maneira de garantir a eficiência e o resultado esperado de um programa/ação de socorro.


Envolver a população afetada desde o início e ao longo de todo o processo (desenho, implementação,
monitoramento e avaliação) minimiza o risco de exclusão de determinados grupos. Reconhecer e
compreender a dinâmica de poder existente entre todos os grupos identificados pode ajudar os atores
humanitários a fornecerem uma resposta mais eficaz. Em muitos casos, os trabalhadores humanitários
são muito tendenciosos em sua percepção de certas situações e podem concentrar a assistência em
tópicos irrelevantes ou de baixa prioridade. Por fim, envolver diretamente a população afetada pode
devolver parte da dignidade que perdeu durante a crise, pois ela se verá como parte da solução para
sua situação.

Para entender a situação dentro de uma comunidade afetada, os atores humanitários precisam
primeiro analisar todos os dados desagregados por sexo. Nos casos em que o conflito armado é a
causa do movimento forçado, podem surgir problemas específicos. A maioria dos movimentos forçados
termina em acampamentos montados às pressas (a menos que outras instalações de abrigo já estejam
instaladas). A ausência de homens e meninos pode indicar que sua ausência se deve ao medo de
inscrição forçada entre os diferentes atores (principalmente não estatais) de um conflito. A pressão
social pode ser muito alta para eles no campo, pois sempre há o medo de que os recrutadores possam
forçá-los a se juntarem a um dos partidos. Ao se esconderem, tornam-se alvos vulneráveis sem acesso
a serviços básicos como comida, água potável e assistência médica. Outra consequência da ausência
de homens é que muitas famílias serão lideradas por mulheres e não terão acesso a certos tipos de
assistência humanitária. Essas famílias podem ser extremamente vulneráveis se os humanitários não
adaptarem uma solução de assistência a essas populações – uma razão adicional para bons dados e
avaliação aprofundada.

A inclusão da população afetada ao longo de todo o processo garante que rumores infundados não
se espalhem e as pessoas sejam informadas sobre toda assistência planejada. Isso também garante
uma melhor prestação de assistência. Sempre que os atores humanitários envolvem a população
afetada, eles devem ser cautelosos para não criar expectativas falsas ou irrealistas. Durante a fase
de avaliação, algumas pessoas contatadas podem não querer se associar a esta parte do processo por
medo do que diriam ou como os outros as verão. Independentemente disso, bons dados ajudarão a
identificar todos os grupos vulneráveis (mulheres, homens, idosos, deficientes, viúvas, etc.) dentro
de uma comunidade afetada e fornecer-lhes uma representação igualitária e equilibrada em termos
de gênero. Essa abordagem voltada para a comunidade deve ser o ponto de partida e garantirá a
apropriação e a participação necessárias no processo, o que pode levar a uma maior sustentabilidade
da ação em andamento. O envolvimento da população afetada não pode ocorrer sem planejamento.
Isso depende de alguma transferência de conhecimento e treinamento dos representantes para ser o
mais eficaz possível. O envolvimento da população afetada também pode funcionar como uma forma
de estabelecer uma primeira estrutura de coordenação no local. Além disso, incluir a população afetada
será o primeiro passo para fortalecer a responsabilidade e o desempenho dos atores humanitários no
terreno e contribuir para a capacitação de todos os parceiros locais envolvidos.

118
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

Seção 5.3 Proteção


O direito à proteção e segurança está enraizado na DUDH de 1948. Segurança e proteção são as
principais questões de preocupação durante desastres e conflitos armados. O Estado é responsável
pela proteção de todos os cidadãos, incluindo todas as pessoas que vivem sob sua jurisdição. Alguns
grupos de pessoas são mais vulneráveis que outros e devem receber atenção específica. Como proteção
e assistência são os dois principais pilares de toda ação humanitária, a proteção será considerada em
cada ação como uma área específica de preocupação e é outro tema transversal.

O Projeto Sphere distingue quatro “Princípios de Proteção” básicos relacionados a toda ação
humanitária:

“1. Melhorar a segurança, a dignidade e os direitos das pessoas e evitar


expô-las a danos.

2. Assegurar o acesso das pessoas à assistência de acordo com a


necessidade e sem discriminação.

3. Ajudar as pessoas a se recuperarem dos efeitos físicos e psicológicos


da ameaça ou violência real, coerção ou privação deliberada.

4. Ajudar as pessoas a reivindicarem seus direitos24.”

Conforme declarado na Lição 4, o ACNUR como “Grupo de Proteção Global” concentra-se


principalmente nas seguintes áreas de preocupação: proteção infantil; VBG; habitação, terra e
propriedade; ação de minas; e a justiça e o estado de direito. Esta seção concentra-se principalmente
nos aspectos gerais de proteção com atenção específica à proteção da criança25.

O Batalhão do Sri Lanka da


Missão de Estabilização das
Nações Unidas no Haiti oferece
segurança em um ponto de
distribuição de alimentos em
Léogâne, Haiti. A distribuição
foi coordenada pelo Programa
Alimentar Mundial da ONU e
pela Agência para Cooperação
Técnica e Desenvolvimento de
forma conjunta. 20 de janeiro
de 2010. Foto da ONU por
Sophia Paris.

24) The Sphere Project, The Sphere Handbook: Carta Humanitária e Padrões Mínimos em Resposta Humanitária, 4ª ed. (Genebra: Sphere Association,
2018).
25) Para obter informações adicionais sobre ação contraminas, consulte o curso POTI Ação contra minas e gerenciamento de risco de explosão: impacto
humanitário, aspectos técnicos e iniciativas globais.

119
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

Princípios de proteção

A Lição 1 examinou os efeitos que algumas das ações de atores humanitários podem ter na situação
atual, incluindo a questão da proteção da população afetada por desastres. É importante analisar o
contexto e procurar as consequências negativas de certas ações e como elas podem afetar a
segurança. Os trabalhadores humanitários devem analisar o tipo de assistência que prestam e se
isso pode comprometer seu nível real de segurança. O fornecimento de bens pode convidar outros
(estranhos) a participarem à força ou tributar a população afetada para receber assistência. A forma
como os humanitários distribuem a assistência também pode ter um impacto direto na segurança dos
beneficiários. Durante a crise de 2008 em Gonaives, Haiti, após os furacões Gustav, Hanna e Ike, o PMA
estabeleceu pontos de distribuição de alimentos com proteção fornecida pela MINUSTAH, incluindo as
principais rotas de chegada/partida, pois grupos armados ou indivíduos estavam roubando a assistência
dos beneficiários enquanto voltavam para casa26.

O gerenciamento de informações confidenciais sobre dados relacionados à proteção deve ser feito
com cuidado por aqueles atores que têm um mandato de proteção e recursos humanos qualificados
suficientes. As informações sobre abusos devem ser tratadas com cuidado, pois podem ter impacto em
outras regiões – especialmente se autoridades nacionais ou atores não estatais estiverem envolvidos.

O acesso à assistência imparcial é outro princípio de proteção do qual os atores humanitários


devem estar cientes. Sempre que espaços seguros forem necessários, eles devem garantir que as
populações possam acessar com segurança essa assistência. Medidas específicas podem ter que ser
tomadas para alcançar isso para os grupos mais vulneráveis (por exemplo, vítimas de abusos, pessoas
com deficiência, etc.).

Proteger as pessoas dos danos físicos e psicológicos decorrentes da violência e coerção


é responsabilidade do Estado27. No entanto, todas as organizações humanitárias devem considerar
monitorar e relatar violações graves de direitos como parte de suas responsabilidades. Além disso, a
defesa dos direitos da população afetada pode ajudar a minimizar as ameaças potenciais. Em geral,
as pessoas são livres para se locomover, e não deve haver restrições ao movimento, a menos que
haja sérias razões de segurança ou saúde que possam levar a evacuações – principalmente, se não
houver outra maneira de fornecer assistência adequada ou garantir proteção efetiva. Criar um ambiente
seguro é o primeiro passo para poder fornecer ajuda adequada tanto à população afetada quanto aos
trabalhadores de ajuda humanitária.

Em muitos casos, os atores humanitários esquecem que a população afetada também tem direitos.
Garantir que esses direitos sejam respeitados é principalmente da responsabilidade das autoridades
nacionais. Sempre que possível, os trabalhadores humanitários devem apoiar a população afetada na
afirmação de seus direitos, tendo em mente a situação local e como as autoridades nacionais podem
reagir para evitar a criação de riscos adicionais. Um problema comumente encontrado é a perda de
documentos oficiais (por exemplo, certidões de nascimento, certidões de casamento, passaportes, etc.).
A propriedade da terra é especialmente difícil de provar quando a documentação é perdida. Em alguns
países, o título e a propriedade da terra são apenas vagamente documentados ou não documentados.

26) Veja também a Lição 9.


27) Ver: Declaração sobre o Direito e Responsabilidade dos Indivíduos, Grupos e Órgãos da Sociedade de Promover e Proteger os Direitos Humanos
e Liberdades Fundamentais Universalmente Reconhecidos, Artigo 2. Assembléia Geral, Distr.GENERALA/RES/53/144 8 de março de 1999, 53/144.
Disponível em inglês: <http://www.ohchr.org/Documents/Issues/Defenders/Declaration/declaration.pdf>.

120
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

Muitos desastres destroem registros de terras e apagam fronteiras, dificultando a comprovação da


propriedade e do título da terra28. Em alguns casos, os moradores nunca adquiriram oficialmente a
terra, e sua presença foi tolerada não oficialmente por gerações. Sistemas de posse de terra inseguros,
desiguais e opacos levam muitos a viver em áreas marginais e propensas a riscos sem a infraestrutura
necessária para resistir às ameaças naturais ditadas pela geografia e pelo clima29. Uma das razões
pelas quais as pessoas sem propriedade segura da terra muitas vezes se recusam a se mudarem de
suas terras ou casas durante uma crise é o medo de perder suas propriedades enquanto estiverem em
acampamentos de abrigo de transição. Durante o terremoto e o tsunami de 2004 no Oceano Índico,
muitos conflitos surgiram entre os habitantes das áreas costeiras afetadas que queriam retornar e
reconstruir suas casas e os incorporadores/promotores de construção que aproveitaram a oportunidade
para reaproveitar as áreas para usos mais rentáveis, como o turismo. A perda de documentos oficiais
de propriedade “complica significativamente os esforços de reconstrução e reabilitação, pois... é difícil
identificar proprietários e usuários legítimos na ausência de provas documentais30”. Portanto, é essencial
que o governo reconstrua e restaure o sistema de administração da terra e comece a compensar a
perda de propriedade.

Proteção infantil31

Conforme descrito anteriormente, a proteção da criança é uma das questões dentro do cluster de
proteção que requer atenção especial como uma questão transversal. As crianças estão entre os grupos
mais vulneráveis durante desastres e conflitos armados e requerem ação urgente.

O Grupo de Trabalho de Proteção à Criança define a proteção à criança como “a prevenção e


a resposta ao abuso, negligência, exploração e violência contra crianças32”. O Direito Internacional
Humanitário fornece a estrutura legal para a proteção da criança.

Para cada ação ou programa, os humanitários precisam primeiro entender a situação e a questão da
proteção infantil. É importante estabelecer os dados de linha de base adequados e a desagregação dos
dados. Os dados de linha de base revelarão o estado da situação antes da crise e a desagregação dos
dados detalhará os diferentes grupos em uma área específica ou tipo de assentamento. Para crianças e
adultos, os trabalhadores humanitários trabalham principalmente com três faixas etárias, desagregadas
por gênero: 0-5 anos, 6-12 anos e 13-17 anos. Para idades acima desses grupos, os dados devem ser
desmembrados em faixas etárias de 10 anos.

Como mencionado anteriormente, os humanitários devem estar atentos a certas formas de violência
contra crianças (principalmente durante conflitos armados, mas também durante desastres), como
recrutamento para grupos armados, assassinatos e mutilações, sequestros, violência sexual, ataques a
escolas e hospitais e negação de acesso humanitário.

Durante desastres e conflitos armados, as crianças enfrentam riscos adicionais causados por
28) Oli Brown e Alex Crawford, “Abordando a propriedade da terra após desastres naturais, uma pesquisa da agência”, Winnipeg, Manitoba,
International Institute for Sustainable Development, julho de 2006. Disponível em inglês: <https://www.humanitarianlibrary.org/sites/default/
files/2014/02/20120420-brown-addressinglandownership.pdf>.
29) Banco Interamericano de Desenvolvimento, “Reduzindo a Vulnerabilidade a Desastres Naturais”, maio de 1999.
30) Oli Brown e Alex Crawford, “Abordando a propriedade da terra após desastres naturais, uma pesquisa da agência”.
31) Grupo de Trabalho de Proteção à Criança do Grupo de Proteção Global, “Padrões Mínimos para Proteção à Criança em Ação Humanitária”, 2012.
Disponível em inglês: <https://www.refworld.org/pdfid/5211dc124.pdf>; Aliança para a Proteção da Criança em Ação Humanitária, Padrões Mínimos
para Proteção da Criança em Ação Humanitária, 2019. Disponível em inglês: <https://spherestandards.org/wp-content/uploads/CPMS-EN.pdf>.
32) Grupo de Trabalho de Proteção à Criança do Grupo de Proteção Global, “Padrões Mínimos para Proteção à Criança em Ação Humanitária”.

121
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

Crianças-soldados foram libertadas por meio de um programa de desarmamento, desmobilização e reintegração na cidade de Pibor, no
Sudão do Sul. A Missão das Nações Unidas no Sudão do Sul, a UNICEF e o Comitê Nacional de DDR do Sudão do Sul se uniram para
conseguir a liberação. 17 de maio de 2018. Foto da ONU por Nektarios Markogiannis.

infraestrutura danificada, arame farpado, entulho, lixo contendo resíduos perigosos ou o deslocamento
repentino de animais selvagens devido a inundações intensas. Armas e resíduos explosivos de guerra
(ERG) também apresentam riscos adicionais para as crianças, principalmente devido ao desconhecimento
de seu perigo enquanto brincam.

Outra forma bem conhecida de violência contra crianças é o abuso sexual. Devido ao seu
desenvolvimento físico, as meninas entre 10 e 19 anos são um grupo especialmente vulnerável. De
acordo com o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (ONUSIDA), as pessoas com
deficiência — sejam físicas ou mentais — provavelmente sofrerão agressão ou abuso sexual durante a
vida33. De preferência, pessoal treinado deve lidar com o manejo clínico da violência sexual.

Durante o conflito armado, os meninos podem ser forçados a se alistar nas forças armadas ou
em grupos armados. Essas crianças-soldados tornaram-se um problema significativo durante várias
intervenções da ONU34 na África na década de 1990 por causa da adesão forçada altamente ilegal e
criminosa de crianças35, combinada com o cometimento forçado de atos violentos contra a família e a
comunidade, levando a graves consequências físicas e emocionais. Muitas dessas crianças-soldados
estavam sob a influência (forçada) de drogas, o que as tornava extremamente perigosas e imprevisíveis.

33) ONUSIDA, OMS e OHCHR, “Resumo da Política de Deficiência e HIV”, abril de 2009. Disponível em inglês: <http://www.iddcconsortium.net/wp-
content/uploads/2019/11/2012-HIV-TG-IDDC-Policy-Briefing-on-HIV-AIDS-and-Disability.pdf>.
34) Claudio Gramizzi e outros, “Dossier documentaire: enfants soldats, armes légères et conflits en Afrique. Les actions de la coopération au développement
de l'Union européenne et de la Belgique”, março de 2003. Disponível em inglês: <http://archive.grip.org/fr/siteweb/dev_df89e59b.asp.html>.
35) UNICEF, “Os Princípios, Princípios e Diretrizes de Paris sobre Crianças Associadas a Forças Armadas ou Grupos Armados”, fevereiro de 2007. Disponível
em inglês: <https://www.refworld.org/docid/465198442.html>.

122
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

O processo de desarmamento, desmobilização e reintegração (DDR) pós-conflito deve dar atenção


especial às crianças-soldados e crianças que foram forçadas a servir em grupos armados como espiões
ou informantes, como carregadores ou para fins sexuais.

O trabalho infantil constitui outra questão de proteção, especialmente se as crianças foram vítimas
de trabalho forçado ou escravo ou foram usadas em conflitos armados como soldados, para exploração
sexual, ou foram expostas a trabalhos perigosos que afetam sua saúde e segurança. A Convenção
nº 182 da OIT define as “piores formas de trabalho infantil36”. Os trabalhadores humanitários devem
estar atentos à exploração infantil após desastres, pois assistência econômica ou programas podem
forçá-las a deixar a escola — especialmente quando elas já podem estar atuando como cuidadores
(por exemplo, cuidando de familiares idosos ou adultos doentes). Na estrutura do princípio “não causar
danos”, os atores humanitários devem entender todas as barreiras, como desigualdade de gênero,
geografia, grupos excluídos, deveres de cuidado infantil e perda de renda. O sistema de monitoramento
deve capturar todos os impactos — esperados e inesperados –— na segurança e no bem-estar de
uma criança. Podem surgir problemas se um programa não estiver alinhado com os regulamentos
nacionais sobre a idade mínima para o trabalho, especialmente se a lei nacional sobre trabalho infantil
não corresponder à lei internacional.

Crianças desacompanhadas e separadas são outra categoria vulnerável. Durante desastres e


conflitos armados, as crianças podem ser separadas de seus pais e famílias. O movimento populacional
pode separar as crianças de suas famílias. A falta de alimentos e outros bens primários podem forçar os
cuidadores a abandonarem as crianças. Sempre que pretendem prestar assistência específica a essas
crianças abandonadas ou separadas, os trabalhadores humanitários devem estar cientes de que as
famílias podem abandonar as crianças propositalmente na esperança de que recebam mais e melhor
assistência em outro lugar. Um banco de dados de Rastreamento e Reunificação Familiar é o primeiro
passo para reunir os membros da família.

Seção 5.4 Segurança e Proteção


Embora não sejam questões transversais, segurança e proteção continuam sendo tópicos específicos
relacionados a todos os atores no campo, especialmente os atores humanitários. Por sua natureza, o
desastre geralmente resulta em questões de segurança e proteção que podem impactar não apenas a
população afetada, mas também aqueles que prestam assistência. Nos últimos anos, símbolos e regras
comumente estabelecidas em relação à ajuda humanitária foram erodidos, colocando em risco muitas
atividades de socorro em andamento e trabalhadores de ajuda humanitária. Esta seção discute os
desafios de segurança e proteção durante desastres e destaca os mecanismos de segurança existentes.

“Tempo de reflexão”

Um bom ponto de partida para refletir sobre o assunto é o artigo “Tempo de reflexão” escrito por
Killian Kleinschmidt, ex-diretor do campo de refugiados de Zaatari, na Jordânia37.

36) OIT, “Convenções e Recomendações da OIT sobre trabalho infantil”. Disponível em inglês: <http://www.ilo.org/ipec/facts/ILOconventionsonchildlabour/
lang--en/index.htm>.
37) Kilian Kleinschmidt, “Momento de reflexão”, Refugees Vol. 4 Nº 121, 2000, 13. Disponível em inglês: <http://www.unhcr.org/3b69138b2.pdf>.

123
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

De acordo com Kleinschmidt, existe uma mentalidade específica entre os trabalhadores humanitários
que inclui aceitar riscos e querer estar na linha de frente. Alguns trabalhadores de ajuda humanitária
são viciados nesse tipo de ambiente, com um tipo extremo sendo os “viciados em desastres”. Embora
precisemos de trabalhadores de ajuda humanitária dispostos a assumir riscos calculados, muitos
simplesmente se acostumaram a um grau cada vez maior e inaceitável de risco no campo.

O artigo descreve
o crescente desrespeito
Iémen
Países com mais ataques
Mali
a trabalhadores
aos símbolos e bandeiras
República Centro
humanitários
(por exemplo, ONU, Cruz Africana

Vermelha, etc.) e valores Afeganistão

ligados a eles. Há múltiplas


RDC
razões para isto. O
Sudão do Sul
infrator pode desconhecer
o significado desses Síria

símbolos devido à falta de


educação ou idade jovem
Bombardeio Corporal Sequestro Estupro/agressão Tiros Explosivos Desconhecido
(por exemplo, crianças- aéreo sexual

soldados). O desrespeito
também pode ser deliberado por diferentes razões, como a percepção de que os trabalhadores humanitários
estão associados a uma das partes de um conflito. Cada vez mais, as organizações humanitárias estão se
tornando alvos, e o dilema resultante exige “andar na linha tênue entre ajudar os necessitados e evitar expor
as equipes de campo a riscos inaceitáveis38”.

As organizações humanitárias há muito negligenciam o investimento em segurança por diferentes


razões. Sempre que necessário, a segurança deve fazer parte de cada projeto e ter uma linha de crédito
separada em cada plano financeiro. A segurança também deve incluir treinamento e não se limitar ao
equipamento. Estabelecer um sistema de segurança confiável em cada organização com especialistas
adequados no assunto de segurança é crucial para a resposta geral.

Estatísticas

Sempre haverá discussões sobre como os fatos e os números são coletados e comparados. No
entanto, tendências mais amplas nos desenvolvimentos de campo às vezes são mais importantes do
que números exatos.

Em seu relatório anual, o Aid Worker Security Database (AWSD) traça uma visão geral das
principais causas das ameaças aos trabalhadores humanitários39. O número de ataques a trabalhadores
humanitários aumentou significativamente nos últimos anos, paralelamente a um aumento do número de
vítimas. Embora os acidentes rodoviários e de trânsito ainda sejam a principal causa de mortes entre os
trabalhadores de ajuda humanitária, tem havido um número crescente de “ataques rodoviários”. Como
os trabalhadores humanitários passam a maior parte do tempo na estrada executando suas missões,
eles se tornam alvos fáceis para emboscadas e ataques. O mapeamento de incidentes (mapeamento

38) Kleinschmidt, “Tempo de reflexão”.


39) Abby Stoddard, Paul Harvey, Monica Czwarno e Meriah-Jo Breckenridge, Relatório de segurança dos trabalhadores humanitários 2020: enfrentando
ameaças aos trabalhadores humanitários de saúde na era das epidemias, Banco de dados de segurança dos trabalhadores humanitários, Resultados
humanitários, agosto de 2020. Disponível em inglês: <https://www.humanitarianoutcomes.org/AWSR2020>.

124
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

de onde ocorreram os incidentes) e o


compartilhamento dessas informações
com outras agências e organizações
é importante. O número de ataques
está frequentemente ligado a crises
em curso no país envolvido. Não
esqueça que as vítimas nacionais
também devem ser contadas – não
apenas os trabalhadores humanitários
internacionais.

Como mencionado anteriormente,


a nação anfitriã tem a responsabilidade
Um comboio de forças de proteção da Missão das Nações Unidas no Sudão
primária de garantir a segurança dos
do Sul, juntamente com membros do Mecanismo de Monitoramento do
trabalhadores de ajuda humanitária. Acordo de Segurança Transicional de Cessar-fogo, visitou o local onde seis

Durante uma crise em que as próprias trabalhadores humanitários foram mortos em 25 de março, a cerca de 53 km
da capital, Juba. 28 de março de 2017. Foto da ONU por Isaac Billy.
autoridades nacionais foram vítimas,
muitas vezes não é razoável esperar
que a polícia ou o exército garantam a segurança em todos os lugares. Em áreas onde a autoridade
nacional recuou e atores não estatais estão no controle, pode ser difícil e desafiador para os trabalhadores
humanitários prosseguir com suas missões.

O Sistema de Nível de Segurança da ONU

Desde janeiro de 2011, o Sistema de Gerenciamento de Segurança das Nações Unidas adotou o
novo Sistema de Nível de Segurança (do inglês, Security Level System — SLS). Antes disso, a ONU
trabalhava com fases, que tinham a desvantagem de ter apenas abrangência nacional – mesmo que
apenas uma pequena área ou uma única cidade fosse afetada. O principal problema surgiu quando uma
fase de segurança teve que ser aumentada, o que muitas vezes obrigou as agências a interromper seus
programas em todo o país.

O novo SLS foi desenvolvido para ser mais flexível e “para avaliar a segurança através de um
processo estruturado baseado em ameaças (causas humanas deliberadas) como conflitos armados,
terrorismo, crime e agitação civil e perigos (eventos acidentais naturais ou causados pelo homem)
que são examinados e ponderados para chegar a um nível de segurança apropriado que existe em um
ambiente geográfico específico. O nível de segurança indica o grau de perigo que existe na área ou
local definido em uma escala de 1, menos perigoso, a 6, mais perigoso. A força do SLS é que ele se
encaixa no front end do modelo de gerenciamento de riscos de segurança sem desencadear decisões
de gerenciamento administrativo que possam prejudicar a entrega do [programa] 40.” Aplica-se apenas
a agências e organizações da ONU com um memorando de entendimento (do inglês, memorandum of
understanding — MOU) com o Departamento de Segurança e Proteção das Nações Unidas (do inglês,
United Nations Department of Safety and Security — UNDSS).

O funcionário mais graduado nos países ou áreas com presença da ONU é normalmente designado
como Oficial Designado (do inglês, Designated Official — DO) para Segurança. O DO se reporta “ao

40) Conselho de Chefes Executivos do Sistema das Nações Unidas para Coordenação, “Gestão do Sistema de Segurança”.

125
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

Secretário-Geral, por meio do Secretário-Geral Adjunto de Segurança e Proteção, pela segurança do


pessoal empregado pelas organizações do sistema das Nações Unidas e seus dependentes reconhecidos
em todo o país ou área designada. O DO é responsável por garantir que a meta do sistema de gestão
de segurança das Nações Unidas seja cumprida na estação de serviço41.” Uma Equipe de Gerenciamento
de Segurança (do inglês, Security Management Team — SMT) e um Conselheiro Chefe de Segurança
do UNDSS auxiliarão o DO. O SMT é composto por oficiais de segurança de diferentes agências da
ONU e quaisquer membros adicionais capazes de contribuir para a gestão de segurança e proteção.
Estabelecem e aconselham o DO sobre o nível de segurança a aplicar e as medidas adequadas a tomar
de acordo com o nível aplicado. Cada estação de serviço desenvolverá Padrões Mínimos de Segurança
Operacional (do inglês, Minimum Operating Security Standards — MOSS) específicos42.

Mais informações sobre o sistema de segurança da ONU estão disponíveis por meio da ferramenta
de aprendizado da ONU “Segurança Básica no Campo II”, que é obrigatória para todo o pessoal da ONU
em campo, bem como para todo o pessoal pertencente a agências com um MOU com UNDSS.

Gerenciamento de riscos

O Gerenciamento de Riscos faz parte do dever que as organizações e agências de assistência


têm para com seus funcionários. Todas as organizações que operam em campo devem desenvolver
políticas de segurança, incluindo procedimentos e treinamento para incidentes críticos. Uma vez em
campo, a pedra angular da segurança geral de uma organização será seu plano de segurança43. Este
plano é um documento vivo e deve ser revisto periodicamente ou pelo menos sempre que ocorrer
um incidente/acidente. O pessoal nacional e internacional que trabalha em conjunto deve escrevê-lo.
Agências e organizações devem estar cientes de que seu plano de segurança pode ter impacto em
outras organizações (por exemplo, se uma agência usa guardas armados ou está disposta a pagar
subornos em postos de controle, enquanto outras não).

A principal diferença entre safety e security (em português, os dois recebem a mesma designação
— segurança) é que safety está relacionada a incidentes causados pela natureza (por exemplo, uma
avalanche) ou circunstâncias não violentas (por exemplo, incêndio, acidentes rodoviários) e a doenças,
ferimentos e morte resultantes de condições médicas ou locais de trabalho negligentes. diretrizes
e procedimentos de segurança. Security indica a proteção do pessoal assistencial e dos ativos das
agências assistenciais contra a violência. Em geral, risco é definido como ameaça combinada com
vulnerabilidade44. Existem três maneiras de reduzir o risco:

• Remover ou diminuir a própria ameaça;

• Reduzir a exposição à ameaça; e

• Tomar medidas para garantir que, quando confrontado com a ameaça, o impacto seja limitado.

41) CEB/Rede de Recursos Humanos, “Sistema de Gerenciamento de Segurança das Nações Unidas, Informações sobre Gerenciamento de Segurança e
Benefícios Relacionados à Segurança Disponíveis no Sistema Comum das Nações Unidas para Oficiais Profissionais Nacionais e Membros do Pessoal
de Serviços Gerais”, 4.
42) “Sistema de Gestão de Segurança das Nações Unidas”.
43) ODI/Rede de Práticas Humanitárias (HPN), “Gerenciamento de Segurança Operacional em Ambientes Violentos, Revisão de Boas Práticas 8”, dezembro
de 2010, 14. Disponível em inglês: <http://odihpn.org/wp-content/uploads/2010/11/GPR_8_revised2.pdf>.
44) O risco pode ser entendido em relação ao conceito de dano futuro. A ameaça deve ser vista como um perigo para você, sua organização ou sua
propriedade. Vulnerabilidade é o seu nível de exposição a uma ameaça específica e refere-se à possibilidade ou probabilidade de encontrar uma
determinada ameaça.

126
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

Os trabalhadores humanitários geralmente não têm muitas maneiras de impactar a ameaça (por
exemplo, condições das estradas), mas podem reduzir a vulnerabilidade (por exemplo, dirigir devagar,
usar cinto de segurança etc.). O risco mudará com as intervenções de gestão. Como regra, todos os
atores humanitários precisam pensar na segurança.

Uma parte importante na execução de um programa é identificar o limite de risco aceitável que
os atores humanitários estão dispostos a aceitar. O Manual de Gerenciamento de Riscos de Segurança
(do inglês, Security Response Management — SRM) do Sistema de Gerenciamento de Segurança das
Nações Unidas inclui uma tabela de análise de risco para ajudar os tomadores de decisão a determinar
um nível de risco correspondente associado a um evento específico45. Conforme declarado na Revisão
de Boas Práticas 8, um guia sobre práticas de gerenciamento de segurança de agências assistenciais,
os modelos de avaliação de risco podem variar em complexidade e nível de detalhes de agência para
agência, e o que pode ser aceitável para uma mas não para outras. Não existe um modelo único.

Tabela de análise de Impact


risco Insignificante Menor Moderado Forte Crítico

Probabilidade Muito provável Baixo Médio Alto Muito alto Inaceitável


Provável Baixo Médio Alto Alto Muito alto
Moderadamente
Muito baixo Baixo Médio Alto Alto
provável
Improvável Muito baixo Baixo Baixo Médio Médio
Muito improvável Muito baixo Muito baixo Muito baixo Baixo Baixo

Compreender o contexto geral e específico da área é essencial. Outra ferramenta útil é o


mapeamento de atores. Realizar o mapeamento de atores é identificar todas as partes interessadas
e atores potenciais e como eles estão vinculados para visualizar seu relacionamento46. Especialmente
durante os conflitos, entender o comportamento de atores estatais e não estatais (por exemplo, grupos
armados) será útil para determinar a melhor maneira de executar um programa. Para agências e
organizações humanitárias, sua presença em uma área de conflito pode constituir uma ameaça. As
partes em um conflito podem ameaçar agências assistenciais — direta ou indiretamente — quando
atuam em áreas que contribuem para o esforço de guerra (por exemplo, áreas de mineração). Muito
também dependerá da percepção de uma organização e do quanto as partes aceitam sua missão ou
mandato. Sempre que uma situação se deteriora, pode ter impacto na segurança das agências da ONU
no SLS. Algumas situações podem forçar as agências de ajuda a interromper todas as atividades ou até
mesmo se retirar da área ou país.

Compreender a decisão de uma organização de parar e se retirar primeiro requer uma compreensão
da diferença entre “mandato” e “missão47”. Os mandatos se originam de uma fonte externa (por exemplo,
o ACNUR tem um mandato dado pelos Estados Membros para trabalhar com refugiados), enquanto uma
missão é mais uma declaração autoatribuída que reflete os valores da organização. Com um mandato,
há uma expectativa de que a organização deve ficar. Com uma missão, há mais flexibilidade, e a
questão de ficar vai depender principalmente da tolerância da organização ao risco. Na estrutura de

45) Sistema de Gerenciamento de Segurança das Nações Unidas, Manual de Gerenciamento de Riscos de Segurança (SRM), 11 de dezembro de 2015, 5.
46) ODI/HPN, “Gerenciamento de Segurança Operacional em Ambientes Violentos, Revisão de Boas Práticas 8”, 33.
47) ODI/HPN, “Gerenciamento de Segurança Operacional em Ambientes Violentos, Revisão de Boas Práticas 8”, 35.

127
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

seu gerenciamento de risco de segurança, cada agência assistencial deve desenvolver “cenários de pior
caso” lidando com ameaças potenciais. Para algumas ameaças, como situações de sequestro e reféns,
as equipes de gerenciamento de incidentes críticos podem ser obrigadas a interagir com o governo
anfitrião e os sequestradores.

Algumas organizações podem considerar o uso de proteção armada. Essa continua sendo uma
questão controversa para os trabalhadores humanitários, pois pode prejudicar a imagem da organização
e suas atividades. Sempre que a opção de proteção armada estiver disponível, os atores humanitários
devem determinar se o limiar de risco aceitável já foi ultrapassado. A compatibilidade ética da ação
humanitária e do uso da força permanece problemática e deve ser considerada apenas uma opção
de último recurso. Além disso, não deve ser vista como proteção apenas para os trabalhadores
humanitários, mas também para a população afetada. Em alguns casos, o uso de proteção armada pode
prejudicar a percepção de neutralidade de uma organização. O governo anfitrião às vezes pode tentar
impor essa proteção armada em sua obrigação sob o DIH. No entanto, as agências não podem ser
forçadas a aceitar isso como uma questão de princípio. As agências de ajuda humanitária devem estar
cientes de como a recusa de proteção armada pode afetá-las e devem consultar outras agências antes
de tomar qualquer decisão. Dentro do sistema da ONU, o DO, com a assistência do SMT, pode solicitar
serviços de segurança armada locais ou internacionais fornecidos por empresas de segurança privada
sempre que os registros de Análise de Risco de Segurança justificarem ameaças e o uso de forças de
segurança da nação anfitriã não for preferível ou viável. O Secretário-Geral Adjunto de Segurança e
Proteção deve aprovar o pedido48.

Seção 5.5 Gerenciamento de restos mortais durante um desastre


Esta seção se concentra em desastres
naturais, embora a maioria dos tópicos discutidos
possa se aplicar a situações de conflito armado.

Grandes desastres (por exemplo, terremotos,


inundações, tsunamis, etc.) podem resultar em
um grande número de vítimas (mortos, feridos
ou desaparecidos). Imediatamente após um
desastre, o principal foco humanitário está
nos sobreviventes (incluindo os feridos). A
assistência em caso de desastre concentra-se no
apoio aos sobreviventes e no fornecimento de No oitavo aniversário do terremoto mortal que atingiu o
Haiti em 12 de janeiro de 2010, a Missão das Nações Unidas
toda a assistência médica necessária aos feridos.
para o Apoio à Justiça no Haiti entregou uma coroa de flores
Os humanitários às vezes esquecem que aqueles durante uma cerimônia em Porto Príncipe para prestar
que prestam assistência logo após o desastre homenagem à memória dos haitianos, colegas da ONU, e
voluntários nacionais e internacionais que perderam a vida
enfrentarão a situação no terreno, incluindo
no terremoto. 12 de janeiro de 2018. Foto da ONU por
quaisquer restos humanos ou animais. Mesmo Leonora Baumann.

48) UNDSS, “Sistema de Gerenciamento de Segurança das Nações Unidas, Manual de Operações de Gerenciamento de Segurança”, novembro de 2012.
Disponível em inglês: <http://www.ohchr.org/Documents/Issues/Mercenaries/WG/StudyPMSC/GuidelinesOnUseOfArmedSecurityServices.pdf>.

128
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

que o país afetado tenha um plano adequado de preparação e resposta a desastres, alguns eventos vão
além de sua capacidade de lidar com a situação e gestão dos restos mortais. Casos como o terremoto
de 2010 no Haiti podem sobrecarregar as organizações. Em um cenário de pior caso como este, onde
a capital foi atingida, deixando instituições fracas ou inexistentes e incapacidade de resposta nacional,
ações apropriadas em relação aos restos humanos podem ser impossíveis de gerenciar e resultar no
enterro em massa como a única solução viável (ordenada pelo autoridades nacionais).

Tal reação pode ocorrer quando as autoridades enfrentam um alto número de mortos e há muitos
outros fatores a serem considerados. O número de mortos provavelmente aumentará à medida que
mais corpos forem encontrados e alguns dos feridos sucumbirem aos ferimentos.

Considerações de saúde e mitos sobre cadáveres49

Existe uma crença comum de que os restos, sejam humanos ou animais, são responsáveis pelo
surto de doenças e causam ameaças à saúde pública. Essas crenças – algumas com raízes históricas ou
religiosas, outras baseadas em superstições – podem apresentar obstáculos para as autoridades lidarem
com um grande número de mortes, o que poderia colocá-las sob pressão e resultar em enterros em
massa. Alguns argumentos apoiam a eliminação rápida de restos mortais por razões mais psicológicas
e sociais (por exemplo, o cheiro de restos em decomposição, animais necrófagos, etc.). Sempre que
possível, no entanto, os humanitários também devem levar em conta considerações legais (por exemplo,
identificação das vítimas) e socioculturais (por exemplo, ritos funerários, luto, etc.).

Permanências em um desastre natural em uma área não endêmica (uma região geográfica onde
uma determinada doença não é prevalente) são um resultado direto desse desastre e do trauma que
ele infligiu. A maioria das bactérias e vírus em um corpo morre rapidamente, mas alguns vírus (por
exemplo, HIV) podem sobreviver em um corpo por um período considerável de tempo (dias ou mesmo
semanas) e em temperaturas tão baixas quanto 2°C50. Outras doenças como a tuberculose ainda
apresentam riscos, especialmente durante uma autópsia ou manuseio do corpo quando o ar sai do trato
respiratório. Durante a crise da Doença do Vírus Ebola na África Ocidental, o contato desprotegido com
fluidos corporais de um paciente infectado ou morto resultou na transmissão da doença. A combinação
de contato desprotegido e rituais funerários tradicionais (desprotegidos) causou um surto maciço na
população. Campanhas de informação sobre uma doença devem ser feitas com cuidado, como mostrado
durante a crise de ebola em Wome (Guiné), onde profissionais de saúde e um jornalista foram atacados
durante viagens para aumentar a conscientização sobre o vírus51.

Em um documento publicado em 2002, a OMS declarou: “Os corpos humanos mortos ou em


decomposição geralmente não criam um sério risco à saúde, a menos que sejam fontes poluentes de
água potável com matéria fecal, ou estejam infectados com peste ou tifo, caso em que eles podem estar
infestados de pulgas ou piolhos que espalham essas doenças52.” O mesmo vale para restos de animais,
mas pode haver risco para humanos com a presença de agentes específicos e a contaminação da água

49) Organização Pan-Americana da Saúde e OMS, “Gestão de Corpos Mortos em Situações de Desastres, Série de Manuais e Diretrizes de Desastres,
N°5”, 2004.
50) Deniz Demiryürek, Alp Bayramoğlu e Şemsettin Ustaçelebi, “Agentes infecciosos em cadáveres humanos fixos: Uma breve revisão e diretrizes
sugeridas”, The Anatomical Record, vol. 269, nº 4, agosto de 2002, 196.
51) BBC, “Surto de ebola: equipe de saúde da Guiné morta”, 19 de setembro de 2014. Disponível em inglês: <http://www.bbc.com/news/world-
africa-29256443>.
52) Ben Wisner e John Adams (eds.), Saúde ambiental em emergências e desastres: um guia prático, Genebra, Suíça, Organização Mundial da Saúde,
2002, 198.

129
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

por fezes e descarga de lesões. Há uma relação em ambos os casos: corpos em decomposição e fontes
poluídas de água potável. Há, portanto, interesse em retirar corpos/cadáveres o quanto antes dessas
áreas. Na maioria dos casos, a ameaça à saúde pública após um desastre natural se deve a áreas
superlotadas (como acampamentos) com medidas de saneamento e higiene precárias, infraestrutura
inadequada (incluindo coleta de lixo), falta de água potável, etc. A presença de vetores de transmissão,
como moscas, pulgas e roedores, podem facilmente transmitir microrganismos causadores de epidemias.
Se as autoridades não tomarem as devidas precauções, podem ocorrer surtos de doenças.

A remoção de restos de animais é menos problemática, embora possa consumir grandes


quantidades de recursos potencialmente escassos, como combustível ou madeira destinada a cozinhar,
se as autoridades decidirem queimar ou cremar os restos mortais. É mais problemático descartar restos
humanos, pois as autoridades devem levar em consideração questões socioculturais.

Aspectos socioculturais e psicológicos a serem considerados

Cada sociedade, cultura e religião tem práticas para lidar com o desaparecimento ou perda de
um ente querido. Elas expressam reações a essa perda de diferentes maneiras, e é importante que
as pessoas sejam capazes de passar por sua própria fase ou processo de luto. Normalmente, não há
problemas para identificar, recuperar e enterrar o falecido de acordo com os costumes locais e rituais
fúnebres. Na esteira de um desastre natural, no entanto, a situação é diferente. Os cadáveres podem
ser físicos ou tecnicamente impossíveis de recuperar. Às vezes, as autoridades ordenam a limpeza de
ruas e espaços públicos para restabelecer o tráfego sem perder tempo procurando restos mortais.
Em muitos casos, as autoridades não têm um plano de gestão de resíduos detalhando onde evacuar
os escombros contendo potenciais restos humanos e animais com segurança, o que pode causar
problemas de segurança adicionais. Existem também aspectos legais relativos aos restos mortais que
não são recuperados e/ou identificados. A identificação e a necessidade de atestar uma morte (ou
seja, aspectos legais do patrimônio e outros procedimentos civis) podem ser impossíveis devido à
magnitude e extensão da devastação; a falta de pessoal forense, especialistas médicos e jurídicos e
tecnologia; e infraestrutura inadequada ou insuficiente para preservar os restos mortais. Autoridades
e atores humanitários devem procurar alternativas como contêineres e caminhões frigoríficos, outras
instalações de refrigeração existentes e agentes funerários. A maioria das instalações de resfriamento
exigirá eletricidade, que pode não estar disponível ou pode ser fortemente interrompida devido ao
desastre. No caso de sepultamento em massa, não haverá identificação e recuperação possível.

Sempre que possível, as autoridades devem tentar recuperar e preservar os restos mortais, mesmo
que isso signifique que devem proceder ao sepultamento temporário com pouca identificação (por
exemplo, fotos para reconhecimento visual, identificação do local onde o corpo foi encontrado etc.) e
registro e terminar o processo e transferir os restos humanos para a família mais tarde. Durante os
desastres com fatalidades em massa, as autoridades locais muitas vezes estão entre as vítimas, e a
falta de pessoal qualificado e autorizado para executar as operações de recuperação é um fato a ser
levado em consideração. Felizmente, recursos técnicos e científicos modernos, como a análise de DNA,
permitem um melhor gerenciamento de fatalidades em massa, embora a um custo.

Em muitos casos, não poder enterrar os mortos pode levar a possíveis problemas psicológicos e
a um processo de luto inacabado. A família poderia ficar com dúvidas não resolvidas sobre o súbito
desaparecimento de um familiar ou amigo. A forma como as pessoas reagem e lidam com a morte

130
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

© CICV, Renato Pajuelo. La Mar, Oronccoy: Retorno dos restos mortais de pessoas desaparecidas. Após mais de 30 anos, esta aldeia
foi reabilitada e permitiu que 64 pessoas desaparecidas fossem enterradas com dignidade. Cerca de 40 delas foram enterrados sem
identificação. Essa operação foi organizada em colaboração com as autoridades locais e o CICV. 30 de agosto de 2019.

dependerá da cultura local e da religião praticada. Outros fatores que influenciam essa reação incluem
experiências passadas; sejam eles jovens ou velhos, homens ou mulheres; ou se pertencem a grupos
vulneráveis como idosos, deficientes, excluídos ou crianças. As crianças são particularmente vulneráveis
e podem desenvolver rapidamente reações pós-traumáticas, razão pela qual é importante reconstituir
o sistema escolar o mais rápido possível para ajudar as crianças a expressar seus traumas psicológicos
vivenciados. Os papéis dentro de uma família podem mudar. As mulheres de repente assumem o
papel de chefes de família, ou os homens têm que cuidar dos filhos — desafios que exigirão tempo
de adaptação. Outro momento crítico ocorre quando as famílias são notificadas do desaparecimento
ou morte de um familiar ou solicitadas a identificar um cadáver. Isso pode resultar em fortes reações
por parte do(s) familiar(es) afetado(s), e, por isso, deve ser feito por pessoal especialmente treinado,
levando em consideração o atendimento psicológico específico destinado aos familiares.

A magnitude do desastre e o alto número de mortes também podem afetar e sobrecarregar as


primeiras equipes de resposta a emergências. Sejam profissionais ou voluntários, alguns sofrerão
de distúrbios psicológicos por diferentes motivos, como a condição dos restos mortais, a exposição
prolongada a experiências traumáticas ou as condições de vida e a carga de trabalho extrema. Cada
equipe de socorro deve usar um sistema de camaradagem ou sistema de controle social para identificar
os sintomas e reagir adequadamente. As autoridades ou organizações que enviam as primeiras equipes

131
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

de resposta a emergências devem ter procedimentos operacionais sobre como lidar com esses casos.
Depois que a equipe de socorro termina o trabalho e volta para casa, os cuidados posteriores profissionais
são essenciais para garantir que as pessoas possam retornar a uma vida normal.

Conclusão

A distinção entre áreas endêmicas e não endêmicas é fundamental. Embora ambas possam resultar em
números elevados de óbitos, há uma diferença significativa quanto à forma de manejo dos restos mortais.

Em geral, os trabalhadores humanitários devem ter cuidado ao gerenciar os restos mortais e devem
observar certos padrões de higiene para evitar se tornarem transmissores de doenças. Somente pessoal
ou equipes bem treinadas devem ter essas responsabilidades (por exemplo, a crise de EVD).

As autoridades devem evitar usar argumentos de saúde pública para proceder à eliminação rápida
dos restos mortais através da utilização de valas comuns. Esse tipo de decisão negligencia os aspectos
psicológicos da população afetada. As autoridades devem sempre tentar recuperar e identificar os
cadáveres; fazer isso é importante para que os familiares iniciem seus processos de luto enterrando o
falecido de acordo com sua religião, costumes locais e/ou lei.

A prestação de cuidados de saúde mental a todos os grupos vulneráveis identificados faz parte
da superação desta situação em que as pessoas nem sempre sabem conviver com o trauma que
vivenciaram. Também deve incluir todas as equipes de primeira resposta a emergências.

Gerenciar restos mortais é parte da resposta a desastres. As organizações humanitárias devem


preparar seus funcionários para possíveis fatalidades, incluindo em suas fileiras. As organizações devem
ter um sistema de apoio e recursos adequados de saúde mental para os funcionários afetados.

132
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

Questionário de fim de Lição  »

1. Qual das seguintes afirmações é FALSA? 3. De acordo com a Tabela de Análise de


Risco, se um evento tem probabilidade
A. O deslocamento é o movimento forçado de
moderada de acontecer com um impacto
pessoas de sua localidade ou ambiente e
severo, qual é o seu risco nível?
atividades ocupacionais.
A. Baixo
B. A migração é a travessia da fronteira de uma
B. Médio
unidade política ou administrativa por um
C. Alto
determinado período mínimo de tempo.
D. Inaceitável
C. Refugiados são pessoas que estão fora de
seu país de origem por motivos de temida
4. Bons dados ajudarão a identificar
perseguição, conflito, violência generalizada ou todos os grupos vulneráveis (por
outras circunstâncias que tenham perturbado exemplo, mulheres, homens, idosos,
gravemente a ordem pública e, como deficientes, viúvas, etc.) dentro de
resultado, requeiram proteção internacional. uma comunidade afetada e fornecer-
lhes uma representação igualitária e
D. Os repatriados são refugiados que foram
equilibrada em termos de gênero. Essa
forçados a regressar ao seu país de origem abordagem voltada para a comunidade
e que deixam formalmente de ser refugiados deve ser o ponto de partida e garantirá a
assim que cruzam a fronteira. propriedade e a participação necessárias
no processo, o que potencialmente
2. Qual das afirmações é FALSA? levará a um aumento no(a) _____ da
ação em andamento.
A. Os requerentes de asilo são pessoas que
viajam através das fronteiras para proteção, A. desenvolvimento

mas que podem não cumprir os critérios B. sustentabilidade


estritos incluídos na Convenção de 1951 e no C. prosseguimento
Protocolo Relativo ao Estatuto dos Refugiados. D. apoio, suporte
B. O termo “requerente de asilo” descreve alguém
que solicitou proteção como refugiado e está 5. Uma das razões pelas quais as pessoas
sem propriedade segura da terra muitas
aguardando a determinação de seu status.
vezes se recusam a se mudar de suas
“Refugiado” é o termo usado para descrever terras ou casas durante um desastre é
uma pessoa que já recebeu proteção. _____.
C. A definição de “asilo” é universalmente A. porque o desastre ocorre muito rapidamente
reconhecida e a mesma em todos os países.
B. o medo de perderem suas terras e casas
D. Os requerentes de asilo podem tornar-se
enquanto estiverem em acampamentos de
refugiados se a autoridade local de imigração
abrigo transitórios
ou de refugiados os considerar adequados à
C. porque o governo lhes disse para se abrigar
definição internacional de refugiado.
no local
D. porque outros parentes podem visitá-los

As respostas estão disponíveis na página seguinte.

133
LIÇÃO 5 | Questões Transversais

Questionário de fim de Lição  »

6. Pessoas com deficiências – sejam 9. Qual das seguintes afirmações sobre o


físicas ou mentais — provavelmente manejo de restos humanos é FALSA?
experimentarão _____ durante suas
A. Ações apropriadas em relação aos restos
vidas, especialmente durante desastres.
humanos podem ser impossíveis de
A. sucesso gerenciar e resultar no enterro em massa
B. altos riscos de ataques de animais selvagens como a única solução viável (ordenada pelas
C. agressão ou abuso sexual autoridades nacionais).
D. Nenhum desses B. As autoridades devem sempre proceder ao
enterro em massa.
7. Qual dos seguintes NÃO é um dos
C. No caso de enterro em massa, não haverá
Princípios de Proteção identificados pelo
Projeto Sphere? identificação e recuperação possível, o que
pode levar a um luto não resolvido que impede
A. Garantir o acesso das pessoas ao
um luto saudável e deixa os enlutados com
armamento.
questões e problemas não resolvidos.
B. Evite expor as pessoas a mais danos como
D. A magnitude do desastre e o alto número
resultado de suas ações.
de restos a serem tratados também podem
C. Proteger as pessoas de danos físicos e
afetar e sobrecarregar as primeiras equipes
psicológicos decorrentes de violência e
de resposta a emergências.
coerção.
D. Ajudar as pessoas a reivindicarem seus 10. Em geral, risco é definido como _____
direitos, acessarem os recursos disponíveis e combinado com _____.
se recuperarem dos efeitos do abuso. A. ameaça, vulnerabilidade
B. perigo, vulnerabilidade
8. Qual das opções a seguir é uma maneira
de reduzir o risco? C. ameaça, resposta
D. desastre natural, resposta
A. Removendo ou diminuindo a ameaça em si
B. Reduzindo a exposição à ameaça
C. Tomar medidas para garantir que, quando
confrontado com a ameaça, o impacto
seja limitado
D. Todas as opções anteriores

Respostas »
1. D

2. C

3. C

4. B

5. B

6. C

7. A

8. D

9. B

10.A

134
OPERAÇÕES HUMANITÁRIAS

LIÇÃO

6 Avaliação

Para entender uma


situação e determinar a
resposta apropriada para
ela, os trabalhadores
humanitários devem
coletar dados.

Foto da ONU por Francesca Mold.

Nesta lição » Objetivos da lição »


Seção 6.1 Visão geral e introdução à avaliação • Entender e demonstrar a complexidade do
Seção 6.2 Desafios processo de avaliação MIRA.

Seção 6.3 Tipos de Avaliação • Discutir e explicar por que a avaliação deve ser
Seção 6.4 MIRA feita por pessoal especialmente treinado.
Seção 6.5 O Ciclo de IM
• Descrever a importância da revisão de dados
Seção 6.6 A Estrutura Analítica MIRA secundários e alguns dos atores envolvidos.
Seção 6.7 Seleção do Local e Amostragem
Proposital
• Analisar e descrever o ciclo de gestão da informação.

Seção 6.8 Técnicas de Coleta de Dados • Descrever a seleção do local e a amostragem

Seção 6.9 Etapas de Análise intencional.

Seção 6.10 Plano de Avaliação e Organização de • Explicar as diferentes técnicas de coleta de dados
Visitas de Campo
e etapas de análise.
Seção 6.11 Relatórios
• Discutir o plano de avaliação e como organizar
Seção 6.12 ACAPS e GEGA
uma viagem de campo.
Seção 6.13 O Projeto Esfera

Seção 6.14 MapAction


• Ilustrar os problemas de relatórios e como os Sphere
Standards afetarão nossas atividades de avaliação.
Seção 6.15 Mídia e Mídias Sociais
INSTITUTO DE TREINAMENTO EM OPERAÇÕES DE PAZ

135
LIÇÃO 6 | Avaliação

Tendas para deslocados internos que se refugiaram perto das instalações da MINUSS em Pibor como resultado de conflitos
intercomunitários no estado de Jonglei. 6 de março de 2020. Foto da ONU por Isaac Billy.

Introdução

As lições anteriores enfatizaram que a ajuda


humanitária deve refletir as necessidades da população
afetada. Para entender uma situação e determinar
a resposta apropriada para ela, os trabalhadores
humanitários devem usar uma forma de coleta de
dados. Eles podem fazê-la na forma de avaliações,
Veja um vídeo de introdução desta
que se ligam a outro tópico intimamente relacionado a
lição em inglês: <https://www.
isso: o gerenciamento de informações (GI). Esta lição peaceopstraining.org/videos/496/

descreve como o GI e a avaliação ajudam a determinar hro-lesson-6-assessment/>.

as necessidades ao produzir um quadro operacional


geral. Esta lição também usa a metodologia refletida
no documento IASC Multi-Cluster Initial Rapid
Assessment (MIRA). Outros documentos relevantes
como o Assessment Capacities Project (ACAPS) “Good
Enough Guide” e os Sphere Standards complementam
esta lição.

136
LIÇÃO 6 | Avaliação

Seção 6.1 Visão geral e introdução à avaliação


Muito tem sido escrito nos últimos anos sobre a racionalização das ações relacionadas à avaliação. No
passado, agências e organizações humanitárias usavam suas próprias diretrizes e manuais sobre como executar
avaliações em campo. Isso muitas vezes levou ao que é conhecido como “fadiga de avaliação”: agências da
ONU e ONGs que circulam na área afetada fazem essencialmente as mesmas perguntas enquanto a população
afetada aguarda a chegada de assistência. Depois, um dos principais desafios é sobre como comparar os
resultados corretamente — “maçãs com maçãs” e não “maçãs com laranjas” – e determinar prioridades.
Que critérios devem ser usados para determinar as prioridades e fornecer à comunidade doadora pedidos
coerentes de financiamento? O IASC liderou a criação de uma Força-Tarefa de Avaliação de Necessidades (do
inglês, Needs Assessment Task Force — NATF) com o objetivo de finalizar uma metodologia padronizada
sobre como realizar avaliações. Em 2012, foi lançada uma versão final do MIRA, com uma versão revisada
lançada em 2015 para incluir as lições aprendidas com as aplicações em novas emergências1.

Outros documentos importantes sobre este assunto incluem o ACAPS “Good Enough Guide to Needs
Assessment” (GEGA) 2, as “Diretrizes para avaliação em emergências” IFRC3 e os Sphere Standards.

Seção 6.2 Desafios


O que é avaliação? Para responder a isso, primeiro
temos que entender o que é gestão da informação e o
papel da avaliação nesse processo.

• A GI é um componente-chave da coordenação
no apoio à tomada de decisões, fornecendo
informações precisas prontamente, no formato
apropriado e com a precisão necessária para
aqueles que precisam. A gestão da informação é
um processo contínuo4.

• A avaliação é a atividade de “entrada de dados


de necessidades” do processo de MI e consiste
em coletar e processar dados de diferentes
fontes usando diferentes técnicas. Ao realizar
avaliações, tentamos entender a situação, seus
problemas (fontes e consequências) e se é
necessária ou não uma intervenção. O objetivo Uma equipe de avaliação da MINUSS visita

geral é auxiliar o governo e o HCT do país afetado Kuda, no Sudão do Sul, para avaliar a situação
humanitária e de segurança na área. 26 de
em sua tomada de decisão.
setembro de 2016. Foto da ONU por Isaac Billy.

• As avaliações são processos e não simplesmente


viagens para coleta de dados. O restante da lição desenvolve melhor esse conceito.

1) Resposta Humanitária, “Guia de Avaliação Rápida Inicial Multissetorial”, julho de 2015. Disponível em inglês: <https://www.humanitarianresponse.
info/en/programme-cycle/space/document/multi-sector-initial-rapid-assessment-guidance-revision-july-2015>.
2) ACAPS, “Avaliação de Necessidades Humanitárias, O Guia Bom o Suficiente”, (Rugby, Reino Unido, Emergency Capacity Building Project (ECB) e
Practical Action Publishing, 2014).
3) IFRC, “Diretrizes para avaliação em emergências”, março de 2008. Disponível em inglês: <https://www.icrc.org/eng/assets/files/publications/icrc-
002-118009.pdf>.
4) Para obter mais informações, consulte a Seção 6.5.

137
LIÇÃO 6 | Avaliação

Como as consequências imediatas de um desastre podem ser bastante caóticas, e a necessidade de


decisões importantes de resposta é crítica em relação a tempo, os humanitários devem estar cientes de
que enfrentam desafios potenciais, incluindo:

• Disponibilidade limitada de informações sobre o desastre;

• Restrições quanto à coleta de dados devido aos recursos humanos e financeiros disponíveis;

• O acesso a algumas áreas afetadas podem ser problemático e/ou impossível;

• Conflito ou má compreensão da situação devido a dados incompletos ou ausentes;

• Situações de desenvolvimento rápido que tornam os dados rapidamente obsoletos; e

• Alta demanda por informações sobre novas situações.

Observe que a avaliação requer pessoal treinado que compreenda todo o processo, incluindo: a
preparação de uma missão de avaliação e seus objetivos, a coleta e a análise de dados e a produção
de relatórios.

Seção 6.3 Tipos de Avaliação


O principal objetivo da avaliação é identificar vulnerabilidades e capacidades. A maneira como isso
ocorre depende do tipo da avaliação. O Manual de Campo do UNDAC distingue três tipos de avaliação de
acordo com o nível de coordenação entre as organizações:

» Avaliações coordenadas “são aquelas planejadas e realizadas


em parceria por atores humanitários e cujos resultados são
compartilhados com a comunidade humanitária mais ampla
para identificar as necessidades das populações afetadas. Essa
avaliação varia de avaliações conjuntas inter- e intragrupos/
setoriais a avaliações harmonizadas de uma única agência5.”

» Avaliações harmonizadas “ocorrem quando as agências


coletam, processam e analisam dados separadamente, mas
quando os dados coletados são suficientemente comparáveis
(devido ao uso de conjuntos de dados operacionais comuns,
indicadores-chave e sincronização geográfica e temporal) para
serem compilados em um único banco de dados e usados em
uma análise compartilhada6”.

» Avaliações conjuntas “ocorrem quando a coleta,


processamento e análise de dados formam um único processo
entre agências dentro e entre clusters/setores e levam à
produção de um único relatório. Isso às vezes é chamado de
‘avaliação comum7’.”

5) ACNUR, “Kit de Ferramentas de Gestão de Informação de Emergência”, 39. Disponível em inglês: <https://im.unhcr.org/imtoolkit/>.
6) Susan van Duijl, “Assessment Analysis & Coordination, Presentation to IAWG”, 19 de outubro de 2012, 3.
7) Van Duijl, “Análise e Coordenação de Avaliação, Apresentação ao IAWG”, 3.

138
LIÇÃO 6 | Avaliação

Avaliações Coordenadas
Coordinated Assessments
Descoordenadas Harmonizado Conjunto
• Uncoordinated
Múltiplas avaliações
(coordenado) (coordenado)
Harmonized (coordinated) Joint (coordinated)
• Múltiplas metodologias • Múltiplas avaliações com • Formulário de avaliação
Multiple assessments  Multiple assessments with  Common assessment form
indicadores comuns comum
• Múltiplos relatórios
Multiple methodologies
common indicators
 Common methodology
• Várias metodologias • Metodologia comum
• Não compartilhado
Multiple reports
Various interoperable
 Common report
interoperáveis
methodologies • Relatório comum
 sistematicamente
Not systematically shared
• Relatórios únicos
Single or multiple ou
reports
múltiplos

Maior coordenação
Increased coordination
Os trabalhadores humanitários devem observar as seguintes regras gerais:

• Examinar as capacidades existentes (por exemplo, mecanismos de enfrentamento, capacidades


nacionais e locais) e não apenas as necessidades;

• Desenvolver dados populacionais desagregados (por exemplo, por sexo, idade, diversidade) por
área geográfica (afetada);

• Distinguir entre a situação pré-crise (ou seja, necessidades crônicas) e o impacto relacionado
à crise para diferenciar o que é normal para aquele local e o que ocorreu devido ao desastre;

• Triangular os achados para reduzir ou eliminar o viés, pois os avaliadores devido à sua formação
profissional, cultural e pessoal podem ver as coisas de forma diferente;

• Ter cuidado ao fazer suposições, pois experiências em outros lugares podem não ser o caso aqui
e agora;

• Estar ciente das percepções da comunidade e não criar falsas expectativas ao questionar a
população afetada;

• Considerar que as populações podem ficar frustradas devido às agências fazerem as mesmas
perguntas aos afetados repetidamente (fadiga de avaliação) ou devido à inação da comunidade
internacional;

• Manter o gerenciamento básico de informações e certificar-se de que as informações coletadas


sejam referenciadas geográfica e temporalmente;

• Analisar os perigos e riscos secundários potenciais (por exemplo, ambientais, infraestrutura,


etc.); e

• Considerar a confidencialidade e o consentimento ao usar e compartilhar dados coletados, pois


pode haver algumas preocupações relacionadas a segurança.

Diferentes tipos de avaliação ao longo do tempo são mostrados no gráfico a seguir. No início de
uma crise, quando a pressão é alta, a avaliação será “rápida e suja” devido a limitações de tempo

139
LIÇÃO 6 | Avaliação

e disponibilidade de pessoal treinado e outros recursos para executar/apoiar as avaliações. Essas


avaliações se preocupam com o quadro geral. Em uma fase posterior do desastre, os atores humanitários
poderão realizar uma avaliação mais aprofundada, aumentando seu nível de precisão.

Avaliações Coordenadas
accuracy
acurácia Precision and accuracy increase over time

In-depth - comprehensive
Aprofundado –
abrangente
and confirmatory
Amostragem
Representative sampling
representativa
Rápido
Rapid - – objetivo
targeted ande
Precisioneand

explicativo
explanatory
Amostragem intencional
Initial - –“quick
Inicial andedirty”
“rápido Purposive sampling
Precisão

and explanatory
sujo” e explicativo
Amostragem de
Convenience sampling
conveniência

Fase
Phase11 Fase
Phase22 Fase
Phase33

Tempo e custo
Time and cost

Seção 6.4 MIRA


Conforme descrito anteriormente, o desenvolvimento do MIRA foi um marco. Pela primeira vez,
agências e outras organizações concordaram com uma metodologia e um processo comuns para realizar
avaliações. O MIRA é usado principalmente durante um desastre natural para informar as decisões no
nível estratégico e orienta o HC/RC e o HCT em suas tomadas de decisão para responder à emergência.

O processo MIRA foi dividido em diferentes fases, conforme mostrado no gráfico abaixo. Esta lição
concentra-se principalmente na fase 1 (avaliação inicial) e na fase 2 (coleta e análise conjunta de dados).

A fase de avaliação 1 (dia 0-3) idealmente deve ser iniciada pelo governo, mas o HC/RC e o HCT
também podem iniciá-la de forma independente. Durante a fase 2, as avaliações de campo ocorrerão
visitando as áreas afetadas e realizando entrevistas com a população afetada.
Linha do Pré-crise Crise 3 dias 2 semanas 4 semanas 6 meses
tempo
Timeline Pre-crisis Crisis event 3 days 2 weeks 4 weeks 6 months

Fase
Crisisde Crise
Phase Fase
Phase00 Fase
Phase11 Fase
Phase 22 Fase
Phase 33 Fase
Phase 44

Preparação para
Assessment 2ª revisão de Avaliação conjunta: Avaliações setoriais
Início 2ry data review Joint assessment:
Atividade
Activity avaliação
preparedness Sudden
súbito
dados Coleta de dados
Primary data collection
Detailed harmonized
harmonizadas sectoral
detalhadas,
onset assessments, monitoring, etc.
primários monitoramento, etc.

MIRA Análise relatório Visão geral das


Adopted Situation MIRA Humanitarian
Saída
Output adotado
MIRA
da
analysis MIRA
report
necessidades
needs overview
situação humanitárias

Para fins humanitários, existem dois tipos de dados: dados secundários e primários. Dados
secundários são todos os dados pré-crise e em crise disponíveis (por exemplo, dados históricos, planos

140
LIÇÃO 6 | Avaliação

de contingência, dados de desastres anteriores, lições aprendidas e relatórios, primeiros relatórios de


outros em crise, etc.). Dados primários referem-se a dados coletados em primeira mão durante a
crise (por exemplo, diretamente do campo) por meio de visitas e entrevistas, discussões em grupo e
observação direta. Os dados primários permitirão que os atores preencham as lacunas de informação
enquanto revisam os dados secundários.

A avaliação fornece mais detalhes ao longo do


Assessment
tempo provides more detail over time
das informações

Individual
Individual
Depth of information

Doméstico
Household
Profundidade

Comunidade/Grupo
Community/Group

Comunidade
Community

Fase
Phase11 Fase
Phase22 Fase
Phase33

Tempo e cost
Time and custo

Seção 6.5 O ciclo de GI


O ciclo de GI consiste em quatro etapas: coleta de dados, processamento de dados (coleção,
estruturação), análise de dados (avaliação) e disseminação de produtos de GI (por exemplo, mapas,
relatórios etc.). O ciclo é contínuo.

Coleção
Collection

Em
Decisão
Decision Disseminação
Dissemination Processing
processamento

Análise
Analysis

Contínuo de Management
Information Gerenciamento
deContinuum
Informações

Ele começa com uma coleta sistemática de dados (quantitativos e/ou qualitativos). Isso envolve uma
ampla gama de fontes. A coleta oportuna de dados e os instrumentos de coleta de dados apropriados

141
LIÇÃO 6 | Avaliação

reduzirão a probabilidade de erro, mas podem ser desafiadores devido ao ambiente operacional no qual
a coleta de dados deve ocorrer. A coleta de dados precisa e oportuna levará a8:

• Priorização de necessidades;

• Alocação eficiente de recursos;

• Resposta mais rápida levando a potenciais intervenções que salvam vidas;

• Melhor análise de risco; e

• Duplicação limitada em resposta.

Para serem eficientes, os atores humanitários precisam saber quais dados coletar e onde acessar
as informações (dados secundários e/ou primários). Não faz sentido coletar tudo; portanto, a elaboração
de um bom plano será essencial.

O agrupamento de dados (processamento) é a segunda etapa do ciclo. Uma vez que os dados
chegarão por meio de diferentes formatos e métodos, os humanitários devem configurar uma estrutura
para colocar/processar dados no arquivo correto. Os dados coletados devem ser comparáveis para
permitir uma análise significativa. Uma estrutura adequada também facilitará a recuperação de dados.
Como novos dados chegarão todos os dias, os atores humanitários devem ter um plano para gerenciar
os arquivos e mantê-los atualizados. Sem um plano, há um grande risco de que conjuntos de dados
incompletos possam ser compartilhados.

Depois de coletar os dados, os atores humanitários precisam analisá-los, verificando primeiro a


confiabilidade da fonte e a credibilidade da informação. A tabela abaixo mostra os diferentes níveis
de classificação mais comumente usados por vários atores ao redor do mundo9:

Confiabilidade da Fonte Credibilidade dos dados


A. Totalmente confiável 1. Confirmado por outras fontes
B. Geralmente confiável 2. Provavelmente Verdadeiro
C. Bastante confiável 3. Possivelmente Verdadeiro
D. Geralmente não confiável 4. Duvidoso
E. Não confiável 5. Improvável
F. A confiabilidade não pode ser julgada 6. A verdade não pode ser julgada

Em primeiro lugar, identifique a fonte e avalie sua confiabilidade. Lembre-se de que a fonte pode
querer direcionar o coletor em uma determinada direção. A credibilidade dos dados tem tudo a ver
com verificação cruzada ou triangulação dos mesmos dados com outras fontes. A triangulação ajuda
a identificar potenciais contradições e inconsistências. Tente recuperar a fonte original e, se houver
apenas uma, considere a confiabilidade dessa fonte.

Adequação e adequação dos dados são dois outros aspectos a serem levados em consideração.
Dados adequados para uma consulta podem não ser úteis para outra. Se os dados forem inadequados
devido à sua imprecisão, o avaliador não deve usá-los. Finalmente, os atores humanitários precisam
validar seus métodos de coleta (por exemplo, método qualitativo versus quantitativo, método de
amostragem, etc.).

8) Escritório para a Coordenação de Assuntos Humanitários, Avaliação e Coordenação de Desastres das Nações Unidas, Manual de Campo do UNDAC, 7ª
ed., 2018, Capítulo I, “Avaliação e Análise (A&A)”.
9) Para obter mais informações sobre a descrição de cada classificação, consulte: OCHA, Manual de Campo UNDAC, capítulo F, página 5-6/20.

142
LIÇÃO 6 | Avaliação

O próximo passo transforma os dados em informação comparando e contextualizando os dados:


“entender o que os dados dizem (análise) e determinar o que os dados significam (interpretação)10”.
Os humanitários podem ter que equilibrar dilemas, especialmente quando encontram resultados
inesperados ou se as autoridades não concordam com os resultados. Esta fase interpreta as informações
entendendo as causas ou aplicando padrões, usando a experiência (que pode ser tendenciosa),
analisando a área ou grupo(s) populacional(s) mais afetado(s), analisando as principais prioridades e
cenários potenciais, etc. Essa fase também é quando os atores identificam lacunas de informações e
requisitos para coleta de dados adicionais (contínuo). Esta fase do ciclo de GI concentra-se no produto
exigido dos atores humanitários e nos detalhes necessários dependendo dos potenciais “clientes” — o
público-alvo (por exemplo, agências da ONU, ONGs, equipes de socorro que chegam, mídia, doadores,
autoridades, HC, HCT, etc.).

Quem/O quê: Quem é


Who/What: Who is
afetado? Quais grupos? O
affected? Which
que significa
groups? Whatser afetado?
does it
Quais
mean setores? Quais
to be affected?
questões? Diretamente
Which sectors? Which
issues?
ou Directly or
indiretamente?
indirectly? Newly
Recentemente vulnerável
vulnerable
ou or already
já vulnerável?
vulnerable?

Quantos:
How Many:Números totais da
Total affected
population afetada,
população figures, breakdown
desagregação
by geographic
por area, breakdown
área geográfica, desagregação
» Quem
Who aresão
the os by group,
por grupo,breakdown by sector.
desagregação por ator.
maisaffected?
most afetados?

» Where
Onde are the
estão
as áreas
most mais
affected
afetadas?
areas?
» Quais
What aresão
theos
setores
most mais
affected
afetados?
sectors?
» O que
What fazer a
to do
Onde: Quais áreas seguir?
next?
Where: What
geográficas
geographicalsão afetadas
areas are
pelo desastre
affected by the disaster?

How Much:
Quanto: QuãoHowruim
bad is the situation?
é a situação? Quão
How severe is the
severo é o impacto?
impact?

(Fig: O que estamos procurando?) Adapted from the ACAPS UN Assessment Course, Revinge
Nov 2012 (source ACAPS).

Por último, durante a fase de divulgação, o avaliador apresenta as conclusões e recomendações da


forma mais adequada. Ao trabalhar em “modo de desastre”, os atores humanitários devem estar cientes
de que a disseminação de informações será um desafio no início de uma crise devido à falta de sistemas
de comunicação adequados. Antes de divulgar as conclusões, os avaliadores às vezes precisam receber

10) ACAPS, “Resumo Técnico: Comparado a quê? Pensamento analítico e avaliação de necessidades”, agosto de 2013. Disponível de: <http://www.alnap.
org/resource/11439.aspx>.

143
LIÇÃO 6 | Avaliação

autorização de autoridades superiores, pois alguns dados podem não corresponder a decisões anteriores
(sobre desenvolvimentos). Algumas análises podem resultar em descobertas que são “delicadas” ou sensíveis.

A divulgação da informação pode ocorrer através de plataformas online, sites especializados,


reuniões, relatórios, quadros de avisos, briefing packs, escaninhos, ou quaisquer outros meios de
distribuição/comunicação disponíveis. A visualização de informações muitas vezes torna os documentos
atraentes e fáceis de usar.

Como a situação no terreno pode mudar rapidamente, os dados também podem. É impossível coletar
todos os dados; alguns dos dados necessários podem ainda não existir ou serão difíceis de encontrar/recuperar.
Os avaliadores devem saber quando interromper a coleta de dados, garantindo que não estejam usando
muitos recursos para resultados insuficientes. O mesmo vale para o compartilhamento de informações. Os
avaliadores não podem esperar até que todas as informações estejam disponíveis antes de redigir e enviar um
relatório, porque será tarde demais. Além disso, o documento não pode ser muito longo ou pode não ser lido.

A “teoria da rosquinha11”

A coleta de dados é como uma rosquinha com o buraco no meio representando os dados ausentes.
A falta de dados também é uma informação importante. O buraco geralmente representa a área mais
afetada de um desastre que não é capaz de enviar os dados/informações necessários devido a danos
excessivos aos sistemas de comunicação existentes.

Seção 6.6 A Estrutura Analítica MIRA


Como mencionado anteriormente, o MIRA é um tipo de avaliação coordenada. Ele usa uma estrutura
analítica que orienta todo o processo e avaliação de GI. A estrutura agrupa quatro temas em duas áreas
centrais: impacto da crise e ambiente operacional.

Impacto da Crise Ambiente Operacional


1. Escopo e escala 2. Condições da 3. Capacidades e 4. Acesso
da crise população afetada resposta humanitário
condutores da crise

secundários
efeitos primários e

fatores subjacentes

humanitárias
necessidades

vulnerabilidades e riscos

e perdas
principais infraestruturas
interrupção física das

nacionais e locais
capacidades e respostas

resposta
internacionais e
capacidades

população afetada
enfrentamento da
mecanismos de

afetada
socorro à população
acesso de atores de

afetada à assistência
acesso da população

físicas
segurança e restrições

Restrições
Perfil Humanitário Gravidade da Crise Lacunas na resposta
Operacionais
Evolução provável
Necessidades Humanitárias Prioritárias
Esta seção explicará brevemente o “escopo e escala da crise”, pois seu entendimento requer
informações adicionais12.

11) HelpAge International, “Metodologia de avaliação de necessidades iniciais da HelpAge International”, 6.


12) IASC, “Orientação de Avaliação Rápida Inicial Multissetorial”, Anexo 2.

144
LIÇÃO 6 | Avaliação

» Um driver é uma variável explicativa central (por exemplo,


fatores ambientais, sociopolíticos, climáticos e econômicos) que
se considera ter uma influência determinante sobre a direção
que o futuro (curto, médio e longo prazo) tomará.

» Os drivers se dividem em quatro tópicos principais:

• Gravidade atual da situação humanitária;

• Possíveis riscos e oportunidades futuros de acordo com o tipo de desastre;

• Resiliência e vulnerabilidade das populações afetadas; e

• Capacidade de resposta no país (nacional ou internacional).

» A seleção final de drivers é baseada nos fatores que são mais


prováveis de ocorrer (possível, provável e quase certo) e que
provavelmente terão um impacto importante ou maior na
situação.

Probabilida- Impacto/consequências
de Insignificante Menor Moderado Importante Principal
Quase certo

Provável

Possível

Improvável

Cru

» Efeitos primários e secundários: destruição em massa de


infraestrutura causada pelo desastre (primário); potencial surto
de doenças devido à falta de água potável e à diminuição das
condições de higiene (secundário).

» Fatores subjacentes: condições pré-existentes da crise (por


exemplo, ambientais, socioeconômicas, demográficas, de
governança, etc.).

Toda avaliação, incluindo o MIRA, enfrenta riscos, como:

• Falha em obter a adesão dos principais atores; e

• Engajamento de muitos atores, sobrecarregando o mecanismo de coordenação e potencialmente


inviabilizando o processo.

Análise de dados secundários: Imediatamente após uma crise, os dados secundários serão a
principal fonte de informação para a avaliação inicial, pois a maioria dos atores ainda não terá chegado
à população afetada para coletar dados em primeira mão sobre a situação no terreno13. Essa revisão e

13) Uma exceção poderia ser feita com as Equipes de Coordenação de Avaliação de Campo da IFRC (FACT) que, no caso de uma rede bem desenvolvida,
podem fornecer informações sobre a situação nas áreas afetadas onde membros treinados da FACT estão implantados.

145
LIÇÃO 6 | Avaliação

análise de dados secundários geralmente serão feitas pelo OCHA Geneva/CASS14 nas primeiras 48-72
horas (fase 1) e devem ser concluídas pela equipe do UNDAC para se tornar a Análise de Situação (do
inglês, Situation Analysis — SA) 15. A perícia analítica é fundamental neste caso, e pessoal experiente
com conhecimento de emergências e antecedentes do país deve realizar a análise de dados. Isso
beneficiará o HC/RC e o HCT para formular uma estratégia que descreva os principais pontos de ação e
estratégia de resposta a seguir em relação à resposta a desastres em andamento. O IASC distingue dois
tipos de informações secundárias:

» “Informações secundárias pré-crise

• Fornece informações básicas à medida que identifica problemas, vulnerabilidades e riscos


pré-existentes;

• Os dados históricos ajudam a identificar


padrões nas necessidades prioritárias.
Intervenções anteriores fornecem
evidências sobre como diferentes grupos
podem ser afetados de forma diferente;

• Fornece uma linha de base para


avaliar o impacto do desastre e ajuda
a diferenciar entre o impacto da crise
e as necessidades pré-existentes ou
crônicas.”

» “Informações secundárias em crise


A Divisão de Assuntos Civis da MINUSS visita o campo
• Fornece uma compreensão dos efeitos de gado Gun, perto de Rumbek, no Estado dos Lagos
do Sudão do Sul, para facilitar uma terceira rodada
da crise atual e, quando comparada com
de reuniões de resolução de conflitos para grupos da
as informações pré-crise, ajuda a avaliar região que estão em conflito entre si desde 2007. Um
o impacto do desastre16.” membro da seção Ruop do clã Agar da tribo Dinka
fornece feedback sobre as consultas e sugere itens para
Os atores humanitários precisam estar cientes reuniões futuras. 21 de abril de 2015. Foto da ONU por
de que os dados secundários podem não fornecer JC Mcllwaine.

as informações específicas que estão procurando


e certamente não dentro do prazo, escala ou nível de detalhe corretos. Em alguns casos, os dados
secundários podem ser muito antigos ou não mais relevantes. Dados secundários adicionais fornecerão
dados sem descrever como foram coletados e processados, o que pode ser enganoso quanto à sua
precisão.

Ao usar o MIRA, existem duas categorias principais de análise: características geográficas e grupos
populacionais17:

14) Seção de Apoio à Avaliação Coordenada pertencente ao Ramo de Apoio ao Programa (do inglês, Programme Support Branch — PSB).
15) A maioria das agências seguirá o mesmo processo para o setor pelo qual são responsáveis.
16) IASC, “Orientação de Avaliação Rápida Inicial Multissetorial”.
17) IASC, “Orientação de Avaliação Rápida Inicial Multissetorial”.

146
LIÇÃO 6 | Avaliação

Características geográficas Segmentos da população ou características do


grupo
Área administrativa (ou seja, província A vs. Grupos afetados (ou seja, deslocados internos/
província B) residentes afetados)
Grupos vulneráveis (ou seja, idosos, pessoas com
Ambiente (ou seja, urbano/rural, litoral/
deficiência, grupos socialmente marginalizados,
interior)
mulheres/adolescentes/meninas chefes de família)
Distância (ou seja, distância até a trilha da
Grupos socioeconômicos (ou seja, agricultores/
tempestade, zona de conflito ou epicentro do
assalariados, grupos religiosos e étnicos)
terremoto)
Composto (ou seja, áreas geográficas com
alta densidade populacional dentro de 50 Sexo e idade (ou seja, crianças pequenas,
km do epicentro do terremoto versus outras adolescentes, adultos e idosos)
áreas geográficas)

Tenha em mente que o número de categorias deve se adequar à coleta de dados existente e à
capacidade analítica para evitar sobrecarregar a coleta de dados e a amostragem com desagregação
excessiva. Na maioria dos casos, os avaliadores se limitam a duas ou três categorias, conforme mostra
a tabela abaixo18.

Informações de nível
Sector/Cluster LeveldeInformation
setor/cluster

Ambiente urbano
Urban setting Ambiente rural
Rural setting

Deslocados Residentes
Affected Deslocados Residentes
Affected
IDPs
internos
IDPs
internos Afetados
Afetados
Residents Residents

Homem
Male Mulher
Female Homem
Male Mulher
Female Homem
Male Mulher
Female Homem
Male Mulher
Female

Coleta de dados primários: Da análise de dados secundários vem um plano de análise que
se concentra nos dados ausentes da revisão de dados secundários para desenvolver uma imagem
completa da situação. Os avaliadores revisam e adaptam o design do MIRA detalhando quais dados
coletar e onde acessá-los. Eles precisam refinar os objetivos e as necessidades de informação, mas os
avaliadores devem estar cientes de que provavelmente não conseguirão atender a todas as necessidades
de informação de todas as partes, portanto, será necessário um consenso. É importante sentar-se com
todos os atores e partes interessadas envolvidos no processo de avaliação para garantir que o plano
de avaliação inclua os objetivos e escopos mais importantes e garantir a adesão suficiente de todos os
parceiros de avaliação. Além disso, alguns parâmetros contextuais importantes devem ser levados em
consideração, como:

• Restrições de tempo versus nível de detalhes nos dados (unidade de amostragem);

• Vida útil das informações coletadas versus tipo e frequência de atualizações de relatórios;

18) IASC, “Orientação de Avaliação Rápida Inicial Multissetorial”.

147
LIÇÃO 6 | Avaliação

• Informações disponíveis (ou seja, sistema de monitoramento existente) versus influência no


escopo da coleta de dados primários; e

• Capacidades e recursos de avaliação existentes versus a complexidade dos questionários,


o número de locais de avaliação e a unidade de amostragem (ou seja, avaliação em nível
geográfico ou nível de grupo afetado), etc.

• Lembre-se das três armadilhas mais comuns para avaliação19:

• Sobrecarga de informações;

• Falha na entrega das informações prontamente; e

• Desperdício de recursos.

Seção 6.7 Seleção do Local e Amostragem Proposital


Esta seção fornece algumas orientações sobre a seleção de locais e técnicas de amostragem durante
a fase 2 de uma avaliação. A seleção do local dependerá principalmente do contexto e objetivos da
avaliação de campo.

As seções anteriores explicaram algumas restrições e desafios para a avaliação e o fato de que
os avaliadores precisam se concentrar nas informações ausentes na revisão de dados secundários.
Os dados ausentes devem ser “bons o suficiente” e relevantes sem sobrecarga de informações
desnecessárias. Somente avaliações iniciais e rápidas poderão fornecer esses dados. A unidade de
amostragem recomendada será o nível da comunidade (avaliação do nível da comunidade [do inglês,
community-level assessment — CLA]). Cada amostra precisa ser representativa e será um corte
transversal em diversos grupos afetados (PDIs, comunidades anfitriãs, etc.), localizados em áreas
geográficas representativas selecionadas. Em outras palavras, os avaliadores precisam definir quais
grupos são importantes a ponto de serem considerados e a quais localidades pertencem a qual grupo20.
Amostragens aleatórias e estatisticamente representativas são impossíveis de serem conduzidas sob as
restrições de tempo e informação. Na amostragem intencional, os avaliadores recolhem amostras com
um propósito direcionado a um ou mais grupos predefinidos específicos21.

Observar as características do grupo permite distinguir entre características sociais e culturais (residência,
etnia, religião, idade, sexo, etc.) e homogeneidade versus heterogeneidade dos grupos afetados (pessoas
deslocadas internamente que vivem em acampamentos, população anfitriã, população afetada, etc.).

Conforme indicado anteriormente, os avaliadores não poderão realizar uma abordagem científica
completa (ótima) para a amostragem e seleção do local. Esta lição fornece alguns princípios-chave e
recomendações sobre locais e métodos de amostragem. Em relação ao número de sites, não há uma
resposta única, apesar dessa questão crítica. O número de locais dependerá da equipe disponível, apoio
logístico, tempo, distribuição geográfica da área afetada e heterogeneidade/homogeneidade da população.

Além disso, a diversidade da região e os grupos-alvo a serem visitados também determinarão o


número de locais a visitar. Os locais mais afetados ou áreas de fácil acesso não devem ser os únicos
locais selecionados. Caso um local não seja acessível e, portanto, não possa ser visitado, a equipe deve
aplicar um conjunto predefinido de regras sobre como substituí-lo por outro local.

19) The Sphere Project e ACAPS, “Esfera Descompactada, Esfera para Avaliações”, fevereiro de 2014.
20) ACAPS, “Technical Brief: Propositive sampling and site selection in Phase 2”, outubro de 2011.
21) ACAPS, “Resumo Técnico”.

148
LIÇÃO 6 | Avaliação

Quanto mais locais selecionados, maior será o atraso no fornecimento de dados. Visitar menos
locais permite mais tempo em cada local e geralmente garante melhor qualidade de dados. Quando
um padrão é detectado, há pouco benefício em continuar. Na prática, poucas situações exigirão mais
de 30 locais para amostragem intencional. Na maioria dos casos, 15 a 20 locais de avaliação serão
suficientes22. Se a área afetada for geograficamente grande, os avaliadores podem considerar o uso de
uma unidade de amostragem mais alta, como municipal ou comuna.

Códigos P: Este é um código de referência exclusivo para identificar um assentamento específico


que supera a ortografia variante e problemas semelhantes. Esquemas de código P são criados em nível
interagências em algumas agências humanitárias23.

Embora a avaliação possa fornecer informações críticas sobre áreas e necessidades, os avaliadores
não podem extrapolar quantitativamente os achados da amostragem intencional para a população de
interesse mais ampla da qual a amostra veio. Para ilustrar, considere o exemplo declarado no resumo
técnico da ACAPS:

• “Os resultados da avaliação rápida por amostragem intencional mostram que 63% dos locais
avaliados não têm acesso a unidades de saúde;

• Fontes governamentais confiáveis afirmam que, no total, 100.000 pessoas são afetadas pela crise;

• Não é possível afirmar que 63.000 pessoas não têm acesso a unidades de saúde24”.

Uma avaliação mais aprofundada fornecerá amostras populacionais mais representativas.

Na amostragem intencional, os avaliadores colhem amostras com um propósito em mente e


selecionam grupos de acordo com sua própria escolha. Os avaliadores devem certificar-se de que o
entrevistado atende aos critérios para estar na amostra. Não fazer isso pode dar muito peso a subgrupos
da população que são mais facilmente acessíveis.

Algumas perguntas de orientação para a seleção de locais incluem25:

Pergunta Pergunta focal


• Quais áreas são geralmente as mais vulneráveis?
Onde está o maior impacto do desastre? • Quais áreas foram relatadas como as mais afeta-
das?
Onde está a maior necessidade? • Quais áreas têm menos capacidade?
• Quais áreas estão recebendo menos assistência?
Qual é a menor assistência recebida? • Quais áreas já estão recebendo apoio de outras
agências?
• Em quais áreas sua organização já tem capacidade?
Em qual local você pode ter mais impacto? • Em quais áreas você pode desenvolver capacidade
ou iniciar um novo trabalho?

Um estudo de caso interessante aparece no Anexo 1 do Resumo Técnico (do inglês, Technical Brief‑
TB) da ACAPS — Amostragem intencional e seleção do local. Os alunos são incentivados a ler o anexo
do TB26.

22) ACAPS, “Resumo Técnico”.


23) MapAction, “Guia de campo para mapeamento humanitário”, 2ª ed., julho de 2011. Disponível em inglês: <https://reliefweb.int/report/world/field-
guide-humanitarian-mapping-second-edition>.
24) MapAction, “Guia de Campo para Mapeamento Humanitário”, 24.
25) ACAPS, “O Guia Bom o Suficiente”.
26) ACAPS, “Resumo Técnico”.

149
LIÇÃO 6 | Avaliação

Seção 6.8 Técnicas de Coleta de Dados


O MIRA distingue três tipos diferentes de técnicas de coleta de dados primários: observação direta
(do inglês, direct observation — DO), entrevistas com informantes-chave (do inglês, key informant
interviews — KIIs) e discussões em grupo comunitário (do inglês, community group discussions
— CGD). A execução de algumas dessas técnicas requer autorização da população afetada ou de seus
representantes. Como regra geral, a avaliação deve ser anunciada e conduzida com total transparência.

» DO: Este método tem duas maneiras de observar:

• De forma estruturada (os observadores sabem o que estão procurando). Nesse caso,
os avaliadores estabelecem um checklist com coisas a serem procuradas, algo específico
(comportamento; um evento; um objeto ou algo que não está ali, que está perdido, ou
deveria estar ali); e

• De uma forma não estruturada (apenas olhando o que quer que aconteça).

DO não é estático. Os observadores devem andar e ver, cheirar, ouvir e, se possível, tocar. Eles
devem ir a todos os locais onde possam observar coisas como pontos de água, mercados, latrinas,
casas de chá, unidades de saúde, locais religiosos, etc. Quais são as condições físicas e atividades
das pessoas? Como elas se relacionam? Como vivem? A vantagem do DO está na rápida coleta de
informações — ele fornece apenas um breve parecer.

» KII pode ser uma conversa ou entrevista estruturada ou


não estruturada. A entrevista é baseada em um questionário
sobre tópicos específicos. A seleção do KII é crítica, precisa
ser relevante e deve ser capaz de responder às perguntas. A
concepção deficiente do questionário é muitas vezes a razão
pela qual surgem problemas durante as avaliações. Existem
dois tipos de entrevistas: semiestruturadas e estruturadas.

A Divisão de Assuntos Civis da MINUSS visita


o campo de gado Gun, perto de Rumbek, no
Estado dos Lagos do Sudão do Sul, para facilitar
uma terceira rodada de reuniões de resolução
de conflitos para grupos da região que estão em
conflito entre si desde 2007. Um membro da
seção Ruop do clã Agar da tribo Dinka fornece
feedback sobre as consultas e sugere itens para
reuniões futuras. 21 de abril de 2015. Foto da
ONU por JC Mcllwaine.

150
LIÇÃO 6 | Avaliação

Uma entrevista semiestruturada usa listas de verificação de perguntas abertas para estimular
discussões sobre um assunto específico. A análise dessas perguntas pode ser trabalhosa devido à
variedade/amplitude de perguntas possíveis, mas permite que os avaliadores resumam as respostas em
torno dos pontos principais.

Uma entrevista estruturada usa questionários sobre assuntos específicos selecionados. Isso
garante que todas as entrevistas abordem os mesmos assuntos da mesma maneira. A agregação e
comparação serão feitas de forma muito mais fácil e precisa. Somente pessoas com a experiência e
os conhecimentos necessários devem elaborar questionários. Isso muitas vezes requer treinamento
específico.

Como regra geral, as entrevistas devem ocorrer em um ambiente seguro. O facilitador deve ter
em mente que alguns dados podem ser sensíveis e deve garantir o anonimato dos dados coletados.
A presença de representantes de autoridades do Estado ou outros terceiros durante uma entrevista
pode ser um obstáculo para receber respostas corretas e completas. Isso pode criar viés induzido pelo
respondente, que, conforme declarado no resumo técnico, pode levar a:

• Memória falha;

• Exagero e desonestidade;

• Falha em responder às perguntas de forma honesta ou transparente (isso pode acontecer se


as perguntas não forem bem compreendidas ou se a interação com o entrevistado não for
desenvolvida ou gerenciada suficientemente);

• Incompreensão do objetivo da entrevista;

• Influência dos grupos na entrevista (a presença de outras pessoas pode tentar o entrevistado a
responder de tal forma que lhe dê credibilidade aos olhos dos observadores); e

• Viés de cortesia (muitas vezes com base cultural, os entrevistados podem responder pelo que
acham que o entrevistador quer ouvir).

A forma como o entrevistador conduz o questionamento pode ter um impacto sobre o entrevistado.
Além disso e tanto quanto possível, o KII deve ser feito por uma pessoa do mesmo sexo (incluindo o
intérprete, se necessário) como sujeito para respeitar a aceitação/adequação cultural.

O número de locais e o número de questionários não estão relacionados. Dentro de um local, os


avaliadores podem ter vários grupos de interesse, e um questionário deve ser preenchido para cada um
dos grupos definidos.

» Um CGD é uma entrevista de um pequeno grupo populacional


que compartilha certas características (por exemplo, idade, sexo,
grupo étnico, etc.) para obter informações sobre condições,
situações, experiência ou percepção por meio da interação do
grupo. Como o conhecimento do idioma da missão pode não
ser garantido, pode ser preferível o uso de um facilitador nativo
para conduzir a entrevista em vez de um intérprete. Pode ser útil
planejar que um anotador registre o que é dito.

151
LIÇÃO 6 | Avaliação

Segue-se um exemplo de recolha de dados numa categoria WASH > abastecimento de água > PDIs
> província X > Distrito Z > local Y:

» KIIs:
• Menos de 5 litros/dia/pessoa disponível;
• Nenhum ponto de água seguro alternativo disponível; e
• Aumento de casos de diarreia aquosa relatados

» DO:
• >3 horas de fila no único ponto de água;
• Capacidade limitada de armazenamento de água no nível HH; e
• Proximidade da rede de esgoto em relação ao ponto de água

» Revisão de dados secundários:


• As chuvas continuarão e os riscos de contaminação devem aumentar; e
• A descoberta é consistente com outros relatórios da mesma área e grupo

Seção 6.9 Etapas de Análise

Descrever
Describe Explicar
Explain Interpretar
Interpret Previsão
Forecast

Quem, o quê, onde, Por quê? O que isto O que acontece


Who, what, where, What does it What happens
quando, como? Why? significa? depois?
when, how? mean? next?

» Resumir e » Determinar por » Atribuir significado » Identificar riscos


 consolidar
Summarizemedidas
and  que determinadas
Determine why  aos dados
Attach e avaliar
meaning to as  novos
Identifyenew
emergentes.
and
ouconsolidate relevant
observações particular conditions
condições são data and evaluate
evidências. emerging risks.
measures or are observed. evidence. » Antecipar a provável
relevantes. observadas.  Anticipate likely
observations.
 Give plausible » Contextualizar
 Contextualize evolução ao longo
evolution over time do
» Agregar
Aggregatedados
data to » Dar um for
context contexto
how and padrões/tendências
patterns/trends to tempo
(short-,(curto,
medium-,médio
and
para
allowpermitir
patterns and plausível de como
why conditions are e para compreendê-los.
understand them. e long-term).
longo prazo).
o trends
surgimento
to emerge. por que as condições
changing.
»Identificar as
Identify the most » Desenvolver cenários.
Develop scenarios.
de padrões e estão mudando.
 Compare temporal  Explore immediate descobertas
important and mais
tendências.
and geographical » Explorar
causes ofas causas
situation importantes e
relevant findings.
data spanning
» Comparar dados across dimensions
imediatas da situação  relevantes.
Determine the
different social such as access,
temporais e em dimensões degree of uncertainty
groups, sex, and age. availability, and » Determinar o grau
geográficos como acesso, on the findings.
quality. de incerteza sobre os
abrangendo disponibilidade e Previsão
resultados. Forecast
diferentes grupos qualidade.
sociais, sexo e Escala de significância, gravidade and
e tendências
idade.
Significance scale, severity, trends
Identificar
Identifiesrelacionamento, correlação, causas
relationship, correlation, e efeitos
causes, and effects
Generalizar tendências
Generalizes trends

Resumir e validar
Summarize anddados
validate data

A coleta e análise de dados é um processo iterativo. Os avaliadores comparam e contrastam os


novos dados com os antigos para confirmar ou contradizer padrões e tendências.

Em sua análise, os avaliadores tentarão quantificar visualmente os dados coletados por meio de
medidas. São quantidades que estão sendo calculadas ou estimadas. Durante as avaliações, os avaliadores
devem usar três medidas essenciais. Algumas medidas estão vinculadas a limites globais que podem ser
encontrados nos Padrões Sphere indicando gravidade (por exemplo, desnutrição aguda grave [do inglês,
severe acute malnutrition — SAM] ou taxa bruta de mortalidade [do inglês, crude mortality rate ‑ CMR]).

152
LIÇÃO 6 | Avaliação

Nível de gravidade » Escala de gravidade (por exemplo, 1 a 5)

Situação
normal Saudável Desconforto Alto nível de Danos Morte
sofrimento irreversíveis à
saúde

Situação Situação
normal catastrófica
Situação
catastrófica

Número de pessoas afetadas por um problema específico

Nenhum Poucos Alguns Vários Todos

Nível de confiabilidade das informações


DNK Confiável Bastante Geralmente Não
confiável confiável confiável

Existem três tipos de análise:

» Análise conjunta: Uma vez que os mesmos dados podem


ser interpretados de maneiras diferentes por especialistas
com diferentes conhecimentos e áreas focais, os resultados de
uma avaliação de necessidades humanitárias são analisados
coletivamente por diferentes partes interessadas.

» Análise de nível de setor: Isso envolve todas as etapas de


análise dentro de um setor conduzidas por uma equipe de
setor/grupo seguindo a estrutura analítica do MIRA.

» Análise intersetorial: Dados, informações e conhecimentos


intra e intersetoriais são compartilhados e consolidados de forma
estruturada, identificando questões transversais e permitindo um
entendimento comum da situação para identificar prioridades em
necessidades, grupos e áreas geográficas.

153
LIÇÃO 6 | Avaliação

Seção 6.10 Plano de Avaliação e Organização de Visitas de Campo


O pessoal treinado deve planejar e executar todos os detalhes de uma avaliação, pois a garantia
de qualidade é fundamental para a avaliação das necessidades. Cada passo deve ser bem planejado e
gerenciado. Os agentes humanitários precisam desenvolver um plano de avaliação, incluindo a maneira
como gerenciarão os dados. Eles devem reconhecer que a comunidade humanitária desenvolveu
padrões e diretrizes que garantem um certo grau de controle de qualidade. Alguns desses padrões
são os Padrões Esfera. Eles fornecem conselhos sobre como acessar setores específicos, que serão
discutidos com mais detalhes posteriormente nesta lição.

Existem diferentes tipos de planos de redação e estruturação. O objetivo principal é fazer as


perguntas certas. Os atores humanitários devem estar cientes de que nem todos sabem tudo sobre
avaliações. Em muitos casos, haverá necessidade de treinamento adicional. Certifique-se de que todos
na equipe entendam a avaliação da mesma maneira. O plano deve conter, pelo menos, os seguintes
cinco elementos27:

» Objetivos (quais são seus termos de referência?);

» Escopo (que dados você precisa coletar?);

» Metodologia (como você coletará seus dados?);

» Análise (como você analisará seus dados e apresentará suas


descobertas?); e

» Recursos (de que apoio a equipe de avaliação precisa?).

• Planos de segurança, transporte e comunicação, incluindo evacuação médica;

• Logística: hospedagem, alimentação, suporte técnico/mecânico;

• Caixa e administração;

• Vistos e autorizações de viagem;

• Seguro para membros da equipe nacional e internacional; e

• Equipamentos (individuais, coletivos, por veículo, etc.).

Seção 6.11 Relatórios


Antes de divulgar informações, você deve escrever as descobertas. Uma boa reportagem é uma arte,
e nem todos têm esse talento. Os relatórios devem ser escritos de acordo com os padrões da agência/
organização. Cada organização tem sua própria linguagem, assim como a comunidade humanitária.
Infelizmente, a terminologia existente nem sempre é usada da maneira correta, o que às vezes gera confusão
na hora de descrever as situações. Sempre que possível, use glossários e definições padrão existentes. Esta
seção destaca brevemente algumas boas práticas e palavras a serem evitadas nos relatórios.

Um bom relatório começa com uma descrição da situação e das necessidades humanitárias seguidas
pelo que foi feito até agora (o que foi entregue até agora ou está em preparação para ser recebido).

27) ACAPS, Avaliação de Necessidades Humanitárias.

154
LIÇÃO 6 | Avaliação

Em seguida, concentra-se nas lacunas e restrições


(o que ainda é necessário/falta). Para ser completo,
o relatório deve citar fontes para que os atores
humanitários possam cruzar e recuperar informações
de diferentes relatórios para comparar as descobertas
e descobrir semelhanças ou diferenças nos dados.

Como regra geral para relatórios completos, pode


ser útil explicar as descobertas compartilhando o
processo de análise. O que pode ser óbvio para você
pode não ser para os outros. Evidências apoiarão sua
A Polícia da ONU (UNPOL) da MINUSS visita muitos
afirmação. Para isso, podemos utilizar o modelo RER,
locais ao redor de Kuajok e em outros lugares no estado
que consiste em28: de Warrap para se reunir com as autoridades policiais
locais. As reuniões permitem que os oficiais da UNPOL
• Reivindicação: uma afirmação ou conclusão
avaliem e relatem a situação geral na área. 2 de julho
que responde à pergunta ou problema de 2015. Foto da ONU por JC McIlwaine.

original;

• Evidência: dados que suportam a alegação (os dados precisam ser apropriados e suficientes); e

• Raciocínio: uma justificativa que conecta a evidência à alegação mostrando por que os dados
contam como evidência usando princípios apropriados e suficientes.

A maneira como certas coisas são relatadas pode levar à confusão. Os atores humanitários devem
garantir que os leitores compreendam as limitações dos dados coletados e da análise produzida e não
usem mal os resultados. Se houver incertezas, elas devem ser mencionadas claramente. O TB lista vários
pontos interessantes a serem lembrados ao relatar incertezas, especialmente se elas influenciarem os
conselhos estratégicos fornecidos, envolverem controvérsias entre as partes interessadas ou se escolhas
e suposições carregadas de valor entrarem em conflito com os pontos de vista e interesses das partes
interessadas29.

O mesmo TB também fornece exemplos de como as incertezas podem ser expressas em relatórios:

• “Texto de incerteza como: provável, provavelmente, incerto [;]

• Verbos auxiliares como: poder, parecer [;]

• Declarações que indicam o status do estudo, tais como: achados preliminares, como primeira
aproximação, são necessárias mais pesquisas, com base nos insights atuais [;]

• Declarações sobre o consenso científico sobre uma alegação, tais como: há uma confiança
considerável em [reivindicação], muitos especialistas do setor consideram [reivindicação], é
amplamente aceito que [reivindicação] [;]

• Construções 'se – então': se podemos assumir [suposição], então [reivindicação] [; e]

• Construções com conjunções: porém, embora [enunciado], porém [incerteza]30”.

Além disso, algumas terminologias apresentam desafios para os redatores de relatórios de situação.

28) Eric Brunsell, “Designing Science Inquiry: Claim+Evidency+Rasoning=Explanation”, Edutopia, setembro de 2012. Disponível em inglês: <http://
www.edutopia.org/blog/science-inquiry-claim-evidence-reasoning-eric-brunsell>.
29) ACAPS, “Quão certo você está? Julgando a qualidade e usabilidade dos dados coletados durante avaliações rápidas de necessidades”, agosto de 2013.
Disponível em inglês: <https://www.acaps.org/how-sure-are-you-judging-quality-and-usability-data-collected-during-rapid-needs-assessments>.
30) ACAPS, “Quão certo você está? Julgando a qualidade e usabilidade dos dados coletados durante avaliações rápidas de necessidades”, 20.

155
LIÇÃO 6 | Avaliação

Os seguintes termos são comuns para relatórios do OCHA:

• “Afetadas: Todas as pessoas impactadas por uma crise [;]

• Pessoas necessitadas: Pessoas afetadas que precisam de assistência [;]

• Alvos: Todas as pessoas que um cluster ou setor está tentando alcançar com assistência [;]

• Alcançadas: Pessoas que receberam algum tipo de assistência de um cluster [;]

• Cobertas: Pessoas que receberam assistência suficiente para cobrir suas necessidades 'por um
longo período de tempo' (de acordo com um padrão como SPHERE) [;]

• Lacuna: Necessidade não atendida do beneficiário (melhor expressa em termos de pessoas


ainda necessitadas em vez de bens ainda não entregues). O gap é determinado pela seguinte
equação: necessidades menos resposta é igual ao gap (NR=G) [; e]

• Restrição: Um problema que está impedindo que uma atividade de resposta ocorra”.

Os agentes humanitários devem evitar usar palavras como “danificado”, “afetado” ou “estimado”
sem qualquer referência a escalas ou contexto. O mesmo vale para palavras como “alto”, “baixo” e
“ruim”. Em vez disso, use descrições (por exemplo, a OIM informa que 15.887 das 21.000 pessoas que
se estima terem sido deslocadas estão agora em campos).

Seção 6.12 ACAPS e GEGA

“O Projeto de Capacidades de Avaliação (do inglês, Assessment


Capacities Project — ACAPS) é um dos atores globais de
avaliação cujo objetivo é fortalecer as capacidades de avaliação
de necessidades globais, regionais e nacionais, com o objetivo
final de fornecer uma base sólida de evidências para a tomada
de decisões de emergência, levando a uma melhor resposta. O
ACAPS colabora com uma rede de parceiros e apoia o trabalho
do IASC Needs Assessment Task Force (NATF)31”.

Um dos produtos desenvolvidos pela ACAPS é o Good Enough Guide to Needs Assessment, escrito
para avaliadores de campo com pouca ou nenhuma experiência em avaliação. O GEGA descreve várias
técnicas e ferramentas de avaliação. A Direção-Geral da Ajuda Humanitária e da Protecção Civil da
Comissão da UE aceitou-o como um guia de referência oficial32.

Seção 6.13 O Projeto Esfera


Em 1997, um grupo de ONGs e o Movimento da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho iniciaram
o Projeto Esfera com o objetivo de desenvolver um conjunto de padrões mínimos universais em áreas
centrais da resposta humanitária. Naquela época, diferentes agências e organizações usavam seus próprios
padrões, que muitas vezes não eram compatíveis dentro do mesmo setor/assunto. O Sphere Handbook foi
desenvolvido com o objetivo de melhorar a qualidade da resposta humanitária em situações de desastre
e conflito. Também se concentra em aumentar a responsabilidade do sistema humanitário para com as
pessoas afetadas por desastres, muitas vezes esquecidas durante as ações humanitárias. Apesar do fato de

31) O Projeto Sphere e ACAPS, “Esfera para Avaliações”.


32) Os leitores podem se inscrever na lista de discussão da ACAPS para receber as últimas notícias sobre novos produtos e recursos, atualizações
trimestrais e fotos e visões gerais semanais.

156
LIÇÃO 6 | Avaliação

que muitas organizações têm seus próprios padrões, o Sphere foi globalmente aceito como o documento de
referência para padrões mínimos universais. Esse manual está atualmente em sua quarta edição (2018) 33.

“Sphere for Assessments”, um documento produzido pelo Sphere Project, estabelece uma ligação
entre o Sphere Handbook e a avaliação e como ambos interagem entre si e a outros padrões de
avaliação como o MIRA34. Existem padrões básicos e padrões mínimos. Eles são de natureza qualitativa
e especificam os níveis mínimos a serem alcançados na resposta humanitária em quatro áreas técnicas:

• Padrões mínimos de abastecimento de água, saneamento e promoção da higiene (do inglês,


Water, Sanitation, and Hygiene — WASH);

• Padrões mínimos de segurança alimentar e nutricional;

• Padrões mínimos de abrigo, assentamento e itens não alimentares; e

• Padrões mínimos na ação em saúde.

Os Padrões Fundamentais e os padrões mínimos estão vinculados a ações-chave, indicadores-chave


e notas de orientação35:

» Ações-chave: atividades e insumos sugeridos para ajudar a


cumprir os padrões (por exemplo, distribuir alimentos antes da
data de validade ou bem dentro da data de validade).

» Indicadores-chave: sinais que mostram se um padrão foi


alcançado. Estão diretamente relacionados com as normas
mínimas e não com as ações-chave.

» Notas de orientação: pontos específicos a serem


considerados ao aplicar padrões mínimos, ações-chave e
indicadores-chave em diferentes situações.

Carta
Humanitarian Ação-chave
Key Actions
Humanitária
Charter
Padrões
Fundamentais
Core e
Standards and
Indicadores-chave
Key Indicators
Padrões Mínimos
Minimum Standards
Princípios
Protectionde
Notas de
Proteção
Principles Guidance Notes
orientaçao

O manual contém listas de verificação de avaliação de necessidades no final de cada padrão


mínimo. Oferece suporte prático para a elaboração de avaliações e fornece orientação para garantir uma
avaliação de qualidade que respeite as capacidades, vozes e segurança da população afetada (princípios
de proteção). O manual contém elementos-chave para apoiar o MIRA, pois ajudará a determinar se os
padrões mínimos foram alcançados ou não. Devido às informações detalhadas que contém, ajudará a
identificar lacunas humanitárias e como superá-las36.

33) Para mais informações, visite: <https://spherestandards.org/wp-content/uploads/Sphere-Handbook-2018-BRPortuguese.pdf>.


34) Para mais informações, visite: <https://spherestandards.org/resources/?lang=portuguese>.
35) The Sphere Project, The Sphere Handbook: Carta Humanitária e Padrões Mínimos em Resposta Humanitária, 4ª ed. (Genebra: Sphere Association,
2018).
36) Os alunos são incentivados a consultar o Sphere Handbook para se familiarizarem com o conteúdo.

157
LIÇÃO 6 | Avaliação

Seção 6.14 MapAction37


A MapAction é uma ONG do Reino Unido que opera desde 2003. Ele fornece informações vitais
na forma de mapas de dados coletados em cenas de desastres, que são cruciais para a tomada
de decisões informadas. Opera durante todo o ano e pode transportar um grupo voluntário de
profissionais de sistemas de informação geográfica (SIG) especialmente treinados em resposta a
desastres. A MapAction é um parceiro stand-by do OCHA/UNDAC e, em caso de mobilização, integrará
o OSOCC como “parte” da equipe do UNDAC. A MapAction é especializada no mapeamento de dados
e informações de mensagens instantâneas.

Seção 6.15 Mídia e Mídias Sociais


Sempre que ocorre um desastre, a mídia estará lá cobrindo-o. Como visto no passado, a mídia
pode influenciar na tomada de decisões políticas (por exemplo, o terremoto e tsunami na Indonésia de
2004), no envio de ajuda e na prestação de assistência, especialmente quando o desastre tem grande
presença na mídia/caráter visível. Em seu livro L'échec humanitaire : le cas haïtien38, Fréderic Thomas
afirmou que “não existem humanitários sem meios de comunicação de massa”, enfatizando o fato de
que há uma reciprocidade entre a mídia e as organizações humanitárias. Ambos precisam um do outro.
Não se esqueça de que a mídia também é uma fonte de informação que os humanitários devem (com
precauções) não negligenciar.

A mídia social há muito entrou na “arena humanitária” como fonte de dados e informações. Ela
contém ferramentas baseadas na Internet (Twitter, Facebook, etc.) usadas para publicar, compartilhar e
discutir informações. Essas ferramentas fornecem novos métodos de comunicação e compartilhamento
de informações e são cada vez mais utilizadas durante os desastres. O OCHA já usa ferramentas de
mídia social como parte da estratégia geral de comunicação em caso de emergência. O desenvolvimento
adicional no uso dessas diferentes plataformas para coleta de informações está em andamento. Alguns
padrões detectados durante um desastre (localizações geográficas dos usuários) podem fornecer um
primeiro vislumbre da situação no terreno.

Para recuperar dados secundários (bancos de dados/indicadores), consulte os seguintes sites:

• UNFPA (dados demográficos [em inglês]): <http://www.unfpa.org/fr>

• Serviço de Estatística da ONU/base de dados (em inglês): <https://data.un.org/>

• Banco de dados internacional de desastres (em inglês): <http://www.emdat.be/country_profile/


index.html>

• Organização Mundial da Saúde: <https://www.who.int/pt/home>

• UNICEF (estatísticas [em inglês]): <https://data.unicef.org/>

• Banco Mundial (indicadores [em inglês]): <http://data.worldbank.org/indicator>

• Relatórios de Desenvolvimento Humano (em inglês): <http://www.hdr.undp.org/en>

• Perfis de País ELDIS (em inglês): <https://www.eldis.org/countries>

• Livro de informações da CIA (em inglês): <https://www.cia.gov/the-world-factbook>

37) Para mais informações (em inglês), visite: <http://mapaction.org/>.


38) Frédéric Thomas, Haiti, L'échec humanitaire : le cas haïtien Bruxelles, Bélgica, Entraide & Fraternite, 2. Disponível em inglês: <https://www.entraide.
be/IMG/pdf/e_f_thomas_ecran.pdf>.

158
LIÇÃO 6 | Avaliação

Questionário de fim de Lição  »

1. Fadiga de avaliação significa _____. 5. Qual das opções a seguir NÃO é uma
das etapas do ciclo de mensagens
A. estar cansado de fazer avaliações
instantâneas?
B. estar entediado realizando avaliações
A. Coleta de dados
C. que agências da ONU e ONGs que navegam
B. Desenho de dados
na área afetada fazem essencialmente as
C. Análise de dados
mesmas perguntas enquanto a população
afetada aguarda a chegada da assistência D. Disseminação

D. coletar dados por si só


6. Quais são os três tipos de avaliação?

2. O GI é um componente chave de(o) A. Coordenada, harmonizada, conjunta


_____ em apoio a(à) _____. B. Total, parcial, final
A. coleta de dados, tomada de decisão C. Completa, incompleta, em andamento
B. coordenação, tomada de decisão D. Vermelho, verde, azul
C. processo, coleta de dados
7. Embora a avaliação possa fornecer
D. tomada de decisão, coordenação
informações críticas sobre áreas e
necessidades, os avaliadores não podem
3. Qual das seguintes afirmações sobre
_____ resultados de amostragem
avaliações conjuntas é FALSA?
intencional para a população de
A. Elas ocorrem quando a coleta, interesse mais ampla da qual a amostra
processamento e análise de dados formam veio.
um único processo A. comparar
B. Conduzem à produção de um único relatório B. eliminar
C. Levam à produção de vários relatórios em C. extrapolar quantitativamente
todas as agências D. adicionar
D. Ocorrem entre agências, dentro e entre
clusters/setores 8. Qual das alternativas a seguir NÃO é
uma técnica de coleta de dados discutida
4. Qual das seguintes afirmações sobre nesta lição?
dados secundários é FALSA? A. Observação indireta
A. Todos os dados pré-crise e em crise estão B. Observação direta
disponíveis C. Entrevista com o informante-chave
B. Incluem dados históricos D. Discussão em grupos da comunidade
C. São dados de campo coletados em primeira
mão durante a crise por meio de visitas e
entrevistas
D. Incluem planos de contingência e primeiros
relatórios em crise por outros

As respostas estão disponíveis na página seguinte.

159
LIÇÃO 6 | Avaliação

Questionário de fim de Lição  »

9. A coleta e análise de dados é um 10. O modelo CER consiste em ___.


processo iterativo. Qual das seguintes
A. Reclamações, Avaliação, Devolução
é a ordem correta das quatro etapas de
análise? B. Cuidado, Evidência, Raciocínio
C. Curiosidade, Eventualidade, Razão
A. Prever, descrever, explicar, interpretar
D. Reivindicação, Evidência, Raciocínio
B. Descrever, explicar, interpretar, prever
C. Explicar, interpretar, prever, descrever
D. Interpretar, prever, descrever, explicar

Respostas »
1. C

2. B

3. C

4. C

5. B

6. A

7. C

8. A

9. B

10.D

160
OPERAÇÕES HUMANITÁRIAS

LIÇÃO Impacto de desastres no

7 setor de abrigos e itens não


alimentares

Um efeito comum dos


piores desastres é o
deslocamento em massa
da população afetada.

© CICV, Biju Boro.

Nesta lição » Objetivos da lição »

Seção 7.1 Abrigo - A Diferença entre Conflito • Explicar a relação entre demografia, meio
Armado e Desastres Naturais ambiente e desastre.

Seção 7.2 Desenvolvimentos Demográficos e • Descrever os diferentes efeitos dos desastres e as


Desastres consequências que trazem para abrigos.

Seção 7.3 Desastres - Fatos e Números • Descrever os diferentes tipos de assentamentos


transitórios e suas vulnerabilidades.
Seção 7.4 Impacto Físico de Terremotos
• Ilustrar alguns desafios ligados aos diferentes
Seção 7.5 Impacto Físico de Inundações
tipos de abrigos.
Seção 7.6 Impacto Físico de Ciclones
• Analisar o planejamento do acampamento e
Tropicais
questões relacionadas com a gestão.
Seção 7.7 Opções de Assentamento
• Lembrar os padrões elementares de abrigos.
Transitório
• Descrever itens não alimentares e seus desafios.
Seção 7.8 Planejamento de Abrigos

Seção 7.9 Padrões de Abrigos

Seção 7.10 Itens Não Alimentares


INSTITUTO DE TREINAMENTO EM OPERAÇÕES DE PAZ

161
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

© CICV, Mamadou Diawoye Dia. Mopti: Deslocamento das populações de Djenné causado por conflitos entre comunidades e
inundações. 8 de outubro de 2018.

Introdução

Esta lição descreve primeiro alguns fenômenos


naturais e seus efeitos sobre os abrigos antes
de examinar os diferentes tipos de assentamentos
de transição que os agentes humanitários podem
encontrar como resultado de um desastre. A questão
do “abrigo” vem junto com a dos os “itens não
Veja um vídeo de introdução desta
alimentícios”. Sem ser muito técnica, esta lição explica
lição em inglês: <https://www.
algumas regras gerais sobre os diferentes tipos de peaceopstraining.org/videos/497/
assentamento. Alguns deles, como os acampamentos, hro-lesson-7-disaster-impact-
and-shelter-and-non-food-items-
são mais provavelmente encontrados como resultado
sector/>.
de conflitos armados.

O que começa como uma solução temporária


rapidamente pode se tornar permanente, o que
impõe desafios às autoridades e órgãos/organizações
envolvidas. Esta lição mais técnica fornece aos
alunos informações específicas sobre abrigo e itens

162
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

não alimentares para explicar melhor algumas implicações e porque certas ações devem ou não ser
tomadas. Os alunos podem obter informações sobre abrigos e itens não alimentares por meio do uso
dos Padrões da Sphere sempre que apropriado.

Seção 7.1 Abrigo — A Diferença entre Conflito Armado e Desastres


Naturais
Em 2020, as autoridades contaram quase 26 milhões de refugiados em todo o mundo – metade
deles com menos de 18 anos1. As estimativas indicam que até 79,5 milhões de pessoas em todo o
mundo foram forçadas a deixar suas casas. O direito ao abrigo (moradia adequada) está incorporado
em vários documentos legais internacionais e está entrelaçado com o direito de viver em segurança,
paz e dignidade. É da responsabilidade das autoridades nacionais estabelecer todas as condições
para tal, incluindo o regresso dessas pessoas. A natureza complexa e fluida de alguns deslocamentos
é frequentemente o maior desafio que as organizações enfrentam para determinar uma resposta
adequada – certamente durante conflitos armados. Por exemplo, o campo de refugiados de Zaatari, na
Jordânia, começou inicialmente com capacidade para 15.000, mas tornou-se uma grande cidade com
cerca de 80.000 refugiados2.

Um desastre natural pode ser ainda mais imprevisível, pois pode acontecer sem aviso prévio,
criando necessidades imediatas dependendo do alcance e magnitude de seus efeitos sobre a população
e o meio ambiente. O abrigo é uma das necessidades prioritárias nesta situação3.

Seção 7.2 Desenvolvimentos Demográficos e Desastres


Nos últimos anos, a rápida urbanização levou ao desenvolvimento descontrolado das maiores
cidades do mundo, principalmente nos países em desenvolvimento. Algumas estimativas sugerem que
metade da população mundial agora vive em áreas urbanas. Muitas dessas megacidades, muitas vezes
pouco desenvolvidas devido à falta de padrões de urbanização e controle do desenvolvimento urbano,
são particularmente vulneráveis e propensas a muitos tipos de perigos. Muitas delas também estão
localizadas em zonas de terremotos ou situadas perto da costa.

De acordo com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), metade da população
global vive a 60 km do mar e três quartos de todas as grandes cidades estão localizadas na costa4.
Populações em rápido crescimento exercem uma pressão significativa sobre o meio ambiente. Fatores
como desmatamento; danos à vegetação costeira, recifes de coral e outros ecossistemas costeiros;
e a exploração dos recursos naturais tornam essas áreas urbanas mais vulneráveis a tempestades e
desastres naturais.

Das três fases de um desastre (emergência, recuperação e reabilitação), a fase de emergência


é provavelmente a mais crítica, pois trata da sobrevivência. Na maioria dos casos, o abrigo será a
principal questão a ser abordada. Nesta fase, a resposta é fornecer proteção à população afetada para
reduzir ainda mais os danos causados pelos efeitos secundários do desastre.

1) ACNUR, “Figuras em um relance”, 2020. Disponível em inglês: <http://www.unhcr.org/uk/figures-at-a-glance.html>.


2) ACNUR, “Ficha informativa do campo de refugiados de Zaatari”, janeiro de 2020. Disponível em inglês: <https://reliefweb.int/report/jordan/zaatari-
refugee-camp-factsheet-january-2020>.
3) As Lições 8 e 9 discutem outras necessidades durante situações de crise.
4) ACNUR, “Cidades e Áreas Costeiras”.

163
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

Seção 7.3 Desastres — Fatos e Números

Detalhamento das perdas econômicas registradas (em Detalhamento das perdas econômicas registradas
dólar americano) por tipo de desastre (2000–2019) (em dólar americano) por continente (2000–2019
Temperaturas extremas, deslizamentos Oceania
Incêndios florestais de terra, atividades vulcânicas, 3% (US$ 82 bilhões) África
3% (US$ 93 bilhões) movimentos em massa 1% (US$ 27 bilhões)
Secas 2% (US$ 63 bilhões) Europa
4% (US$ 128 bilhões) 9% (US$ 27 bilhões)

Terremotos
21% (US$ 636 bilhões)
Ásia
43% (US$ 1,26 bilhão)

Inundações Tempestades
22% (US$ 651 bilhões) 47% (US$ 1,39 bilhão) Américas
45% (US$ 1,32 bilhão)

Números nesta página baseados em Custo humano de desastres: Uma visão geral dos últimos 20 anos (UNDRR/CRED).

Entre 2000 e 2019, a maioria dos desastres em todo o mundo foram inundações (44 por cento) ou
relacionados a tempestades (28 por cento) ou terremotos (8 por cento). As inundações foram o tipo de
desastre mais comum, com 3.254 ocorrências5.

Em 2019, os desastres causaram 24,9 milhões de novos deslocamentos. Treze milhões deles
foram causados por tempestades, 10 milhões por inundações e 922.500 por terremotos. A maioria dos
deslocamentos induzidos por desastres ocorreu na Ásia6. Eventos geofísicos (terremotos, tsunamis e
atividade vulcânica) representaram 9% de todos os desastres entre 2000 e 2019. De acordo com um relatório
da Nações Unidas para a Redução do Risco de Desastres (do inglês, United Nations Office for Disaster
Risk Reduction — UNDRR) de
Número total de pessoas afetadas
2020, “o número de desastres pelo tipo de desastre (2000–2019) Temperaturas extremas,
por ano e a distribuição de deslizamentos de terra, atividades
Terremotos vulcânicas, incêndios florestais
subgrupos de desastres 3% (118 milhões) 3% (109 milhões)

permaneceram relativamente
estáveis entre o ano de 2000 e
Inundações
2019, com uma média de 367
41% (1,65 bilhão)
Tempestades
eventos registrados por ano7”. 18% (727 milhões)

Há pouca diferença
nas principais necessidades
imediatas para os três principais Secas
35% (1,43 bilhão)
tipos de desastres8. As
porcentagens das necessidades
(não confundir com destruição)
são mais ou menos iguais em relação ao abrigo (18–20 por cento) para os três principais tipos de desastres.

5) UNDRR, Centro de Pesquisa em Epidemiologia de Desastres, Custo humano de desastres: Uma visão geral dos últimos 20 anos. Disponível em inglês:
<https://www.undrr.org/media/48008/download>.
6) OCHA, “Visão Geral Humanitária Global 2021”, 2021. Disponível em inglês: <https://reliefweb.int/sites/reliefweb.int/files/resources/GHO2021_EN.pdf>.
7) UNDRR, Centro de Pesquisa em Epidemiologia de Desastres, Custo humano de desastres: Uma visão geral dos últimos 20 anos.
8) Nações Unidas para a Redução do Risco de Desastres (UNDRR), “2015 Desastres em Números”. Disponível em inglês: <http://www.unisdr.org/
files/47804_2015disastertrendsinfographic.pdf>.

164
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

Seção 7.4 Impacto Físico de Terremotos

Todos os outros
Transporte
WASH Terremotos $ 55 milhões

Abrigo Ciclones $ 80 milhões


Saúde
Inundações $ 113 milhões
Comida

O impacto físico dos terremotos depende da intensidade do tremor do solo e da qualidade da


engenharia das estruturas. O tipo de construção muitas vezes está diretamente relacionado ao impacto
de um terremoto. Alguns terremotos no Japão têm pouco ou nenhum efeito em edifícios altos graças
às normas de construção (à prova de terremotos). Em outros países, os terremotos destruíram cidades
inteiras devido à falta dessas normas de construção. Países em desenvolvimento e bairros pobres que
não possuem altos padrões de construção podem sofrer mais com os efeitos físicos de um terremoto.
Casas de construções tradicionais (por exemplo, alvenaria não reforçada) podem quebrar e desmoronar
facilmente, como foi o caso do terremoto Bam de 2003 no Irã.

A composição do solo é outro fator que afeta o nível de devastação. O impacto físico de um desastre
será menor se os edifícios forem construídos em rocha sólida, que tende a receber menos danos.
Rochas e sedimentos não consolidados tendem a aumentar a amplitude e a duração das ondas sísmicas
do terremoto e aumentarão o potencial de danos9. Os efeitos de um terremoto são mais concentrados
geograficamente, mas a composição do solo pode ser a razão pela qual uma onda sísmica pode
danificar a infraestrutura longe do epicentro. A destruição causada pelo terremoto, que cria uma grande
quantidade de escombros, geralmente é mais grave do que outros tipos de desastres. Mais de 75%
das mortes por terremotos são causadas por tremores. Os grupos mais vulneráveis (ou seja, idosos,
mulheres e crianças) têm taxas de mortalidade mais altas. Os terremotos causaram a maioria das
mortes de todos os tipos de desastres entre 2000 e 2019: 721.318 mortes, ou 58% de todas as mortes
causadas por desastres nesse período10.

Os maremotos, uma variante dos terremotos, são frequentemente seguidos por tsunamis que
causam destruição generalizada e morte, como o terremoto e tsunami do Oceano Índico de 2004. Eles
também podem ter outros efeitos, como o terremoto e o tsunami de Tohoku em 2011 no Japão, que
provocou um colapso na Usina Nuclear de Fukushima Daiichi, causando um desastre ambiental.

Os cientistas usam a escala Mercalli e a escala Richter (do inglês, Richter Scale - RS) para
medir terremotos. A escala Mercalli descreve a intensidade de um terremoto com base em seus efeitos,
enquanto a escala Richter descreve a magnitude do terremoto medindo as ondas sísmicas observados
que causam o terremoto. A escala Richter tem uma abordagem mais científica e é mais utilizada. As
duas escalas têm diferentes aplicações e técnicas de medição. A escala Mercalli é linear, enquanto a
escala Richter é logarítmica (ou seja, um terremoto de magnitude cinco é 10 vezes mais intenso que um
terremoto de magnitude quatro).

9) ACAPS, “Folha de Resumo de Desastres, Terremotos”. Disponível em inglês: <https://www.acaps.org/disaster-summary-sheet-earthquakes>.


10) UNDRR, Custo humano de desastres.

165
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

Mercalli Richter
Medidas Os efeitos causados pelo terremoto A energia liberada pelo terremoto
Ferramenta de Observação Sismógrafo
medida
Cálculo Quantificado a partir da observação Escala logarítmica de base 10 obtida
do efeito na superfície da Terra, pelo cálculo do logaritmo da amplitude
humanos, objetos e estruturas feitas das ondas
pelo homem
Escala I (não sentida) a XII (destruição total) De 2,0 a 10,0+ (nunca detectado).
Um terremoto de 3,0 é 10 vezes mais
forte que um terremoto de 2,0.
Consistência Varia dependendo da distância do Varia em diferentes distâncias do
epicentro epicentro, mas um valor é dado para o
terremoto como um todo

A tabela abaixo descreve a observação de um terremoto de acordo com a escala Mercalli11.

Escala Mercalli Escala Impacto de acordo com a Escala Mercalli


Richter
Intensidade Magnitude
III 4,2 Assemelhando-se a vibrações causadas por tráfego intenso.
4 4,5 Sentido por pessoas andando; balanço de objetos independentes.
Pratos, janelas e portas chacoalham. As paredes rangem. Carros
estacionados balançam.
V 4,8 Acordam pessoas e sinos tocam.
VI 5,4 As árvores balançam; alguns danos por capotamento e queda de
objetos.
VII 6,1 As pessoas têm dificuldade em ficar de pé. Gesso e tijolos podem
rachar e cair. Danos consideráveis a edifícios mal construídos.
VIII 6,5 Paredes, chaminés e galhos de árvores quebram e caem. Alguns
edifícios mal construídos podem desmoronar. Estruturas altas
podem torcer e cair.
IX 6,9 O chão começa a rachar e os canos se quebram. Edifícios bem
construídos consideravelmente danificados.
X 7,3 O chão racha. A água espirra nas margens dos rios. Trilhos de
estrada de ferro dobram.
XI 8,1 Rodovias, ferrovias, pontes e dutos subterrâneos são destruídos. A
maioria dos edifícios desmorona. Grandes rachaduras aparecem no
solo.
XII >8,1 Destruição de edifícios e sistemas de transporte. Quase tudo é
destruído. A superfície do solo se move em ondas. O chão fica
coberto de rachaduras e buracos.

Durante os terremotos, o acesso às áreas e populações afetadas pode ser difícil devido a danos à
infraestrutura de transporte (por exemplo, estradas e pontes). Em particular, os sistemas/infraestrutura
de comunicação podem ser fortemente afetados. Incêndio (devido a linhas de energia derrubadas,
dutos de gás natural quebrados, etc.) e tremores são os principais riscos secundários. Deslizamentos
de terra e liquefação do solo são outros efeitos de um terremoto. Apesar dos riscos secundários, as
pessoas muitas vezes querem ficar perto de suas casas e preferem dormir ao ar livre, temendo os
efeitos de novos tremores.

11) ACAPS, “Folha de Resumo de Desastres, Terremotos”. Os alunos que queiram saber mais sobre as recomendações de segurança devem ler o Anexo I
da ACAPS “Folha de Resumo de Desastres, Terremotos”.

166
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

A reconstrução de casas severamente danificadas ou desmoronadas pode levar muito tempo. Em


muitos casos, o que resta deve ser completamente demolido e os escombros removidos, o que é um
processo demorado. A reconstrução também levará tempo, dependendo das capacidades financeiras e
outras, tanto em áreas desenvolvidas como em desenvolvimento. Em áreas urbanas com alta demanda
habitacional, problemas de terra e propriedade geralmente surgem após terremotos, o que pode causar
atrasos adicionais. Os envolvidos na resposta humanitária devem tentar evitar a reconstrução de
vulnerabilidades anteriores (por exemplo, normas técnicas de construção insuficientes, etc.). Após um
desastre, as autoridades geralmente tendem a aumentar o nível de resistência ao desastre impondo
padrões mais altos. Alguns desses padrões tendem a ser inacessíveis para muitos, especialmente a
parte mais pobre da população urbana. A reconstrução pode se tornar problemática se a assistência
chegar apenas a uma pequena parcela dessas famílias afetadas.

Em alguns casos, como no terremoto de Bam em 2004, as autoridades tentaram realocar a


população afetada para acampamentos de abrigo de transição construídos fora da cidade destruída,
mas obtiveram pouco sucesso. Em geral, os agentes humanitários não devem deslocar ou reassentar
as comunidades afetadas, a menos que isso seja indispensável para evitar riscos de perigos físicos. A
realocação ou reassentamento realizado de forma não alinhada com a cultura local pode ter um impacto
social que a população afetada não está disposta a aceitar.

Em alguns casos, grande parte da população pode não retornar à área afetada. O terremoto e
tsunami de Tohoku e o derretimento de Fukushima deslocaram um total de 386.739 pessoas. Em março
de 2012, um ano após o desastre, o número de deslocados ainda era de 344.290. Isso indica que a
maioria dos desalojados ainda não havia retornado para suas casas ou foram reassentados em abrigos
permanentes12. A desconfiança nas informações fornecidas pelas autoridades sobre a contaminação
existente pode ter sido o motivo pelo qual as pessoas não retornaram.

Seção 7.5 Impacto Físico das Inundações


As inundações são as mais frequentes de todas as catástrofes e causam o maior sofrimento e
perdas humanas. Em geral, as inundações afetam uma área geográfica mais ampla do que outros
desastres. Na maioria das vezes, chuvas fortes causam grandes inundações. Outra causa são as breves
chuvas torrenciais, que muitas vezes causam inundações repentinas. As chuvas de monção afetam
certas regiões do mundo todos os anos. Por exemplo, a enchente de 2010 no Paquistão cobriu uma
área tão grande quanto a Itália ao longo de várias semanas, começando no norte, perto do Himalaia, e
terminando na Baía de Bengala.

As inundações também podem causar a perda de colheitas, sementes e gado, bem como danos
estruturais (por exemplo, pontes destruídas, estradas destruídas, etc.). Eles podem mudar as paisagens e
acessar algumas áreas pode ser um desafio quando a água recua. Deslizamentos de terra podem acontecer
devido ao solo saturado. Substâncias tóxicas podem ser lavadas, liberando seu conteúdo. Em áreas de
(antigo) conflito, as inundações podem lavar minas terrestres e afetar áreas desmatadas e não desmatadas.

O nível de água atingido, a violência (volume), a velocidade das correntes e a área geográfica
abrangida caracterizarão a destruição causada pelas inundações. Muito dependerá da qualidade e do
design da infraestrutura existente. O número de lesões dependerá se a inundação ocorre de forma lenta

12) Reiko Hasegawa, “Evacuação de desastres do desastre do tsunami de 2011 no Japão e do acidente nuclear de Fukushima”, maio de 2013. Disponível
em inglês: <https://www.iddri.org/fr/publications-et-evenements/etude/disaster-evacuation-japans-2011-tsunami-disaster-and-fukushima>.

167
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

ou rápida. Por exemplo, uma inundação repentina provavelmente causará mais ferimentos do que uma
inundação de desenvolvimento lento13.

Uma característica das inundações é o deslocamento em massa da população em um curto período,


bem como operações intensivas de evacuação e resgate14.

O impacto nos abrigos durante as inundações pode variar dependendo do nível da água e da
duração da inundação. Algumas pessoas tentarão permanecer em suas casas por diferentes motivos
(como medo de roubo ou saque). A limpeza e a reparação de edifícios podem começar quando a água
baixa e as pessoas regressam às suas casas para avaliar os danos. A distribuição de ferramentas e
equipamentos adequados será essencial para iniciar as operações de socorro. Eventos futuros, como o
inverno ou a estação chuvosa, terão um impacto considerável nos abrigos.

Seção 7.6 Impacto Físico de Ciclones Tropicais


Existem diferentes nomes específicos dependendo da região para fortes ciclones tropicais (por
exemplo, furacão, ciclone e tufão). O gráfico abaixo mostra um resumo das classificações utilizadas
pelos centros oficiais de alerta em todo o mundo.

Classificações de ciclones tropicais (os ventos duram em média 10 minutos)


Escala Ventos N Oceano SW Oceano Austrália SW NW Pacific NW Pacific NE do
Beaufort sustentados Índico IMD Índico MF BOM Pacífico JMA JTWC Pacífico e N
por 10 FMS do Atlântico
minutos NHC e CPHC
(nós)
0-6 <28 Depressão Perturbação Baixa Depressão Depressão Depressão Depressão
Tropical Tropical tropical tropical tropical tropical
7 28-29 Depressão Depressão
30-33 profunda Tempestade Tempestade
8-9 34-47 Tempestade Tempestade Ciclone Ciclone Tempestade tropical tropical
Ciclônica Tropical Tropical tropical tropical
Moderada (1)
10 48-55 Forte Tempestade Ciclone Tempestade
11 56-63 Tempestade Tropical Tropical Tropical Tufão Furacão (1)
Ciclônica Severa (2) Severa
12 64-72 Tempestade Ciclone Ciclone Tufão
73-85 Ciclônica tropical Tropical Furacão (2)
Muito Severo
Severa (3)
86-89 Ciclone Furacão
90-99 Ciclone Tropical Maior (3)
Tropical Severo
100-106 Furacão
Intenso (4)
Maior (4)
107-114 Ciclone
115-119 Ciclone Tropical Super tufão
Tropical Severo
>120 Tempestade Furacão
Muito (5)
Super Maior (5)
Ciclônica Intenso

13) As Lições 8 e 9 descrevem os impactos em outros setores.


14) Os alunos que queiram saber mais sobre as recomendações de segurança devem ler o Anexo II (Recomendações de segurança) da ACAPS “Folha de
Resumo de Desastres, Inundações”.

168
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

Seis fatores parecem ser necessários


para formar um ciclone tropical:

1. São necessárias temperaturas da


água de pelo menos 26,5°C até uma
profundidade de pelo menos 50m.

2. O resfriamento rápido com altura


permite a liberação do calor de
condensação que alimenta um ciclone
tropical.

3. Alta umidade é necessária,


especialmente na troposfera baixa
a média; quando há muita umidade
na atmosfera, as condições são mais
favoráveis para o desenvolvimento de
distúrbios.

4. São necessárias baixas quantidades


de cisalhamento do vento, pois o alto
cisalhamento prejudica a circulação da
tempestade.

5. A presença de um sistema próximo


da superfície, organizado e rotativo
caracterizado por spin (vorticidade) Vista dos edifícios afetados pelos ciclones na cidade da Beira. A
e fluxo de entrada de baixo nível cidade ainda está se recuperando do impacto dos dois ciclones.
Esta imagem faz parte de uma série de fotografias realizadas nos
(convergência).
dias que antecederam a chegada do Secretário-Geral António
Guterres a Moçambique. O Sr. Guterres visitou o país para fazer
6. Os ciclones tropicais geralmente um balanço dos esforços de recuperação nas áreas impactadas
precisam se formar a mais de 555 km pelos ciclones Idai e Kenneth, que atingiram o país com apenas
algumas semanas de intervalo em março e abril de 2019. 7 de
(345 milhas) ou 5 graus de latitude
julho de 2019. Foto da ONU por Eskinder Debebe.
longe do equador15.

Tipo Categoria Pressão (mb) Ventos (nós) Ventos (mph) Cor da linha
Depressão DT --- <34 <39 Verde
Tempestade TS --- 34-63 39-73 Amarelo
tropical
Furacão 1 >980 64-82 74-95 vermelho
Furacão 2 965-980 83-95 96-110 Luz vermelha
Furacão 3 945-965 96-112 111-130 Magenta
Furacão 4 920-945 113-135 131-155 Magenta claro
Furacão 5 <920 >135 >155 Branco

15) Pijushkanti Saha, Climatologia Moderna (Nova Delhi, Índia, Allied Publishers Pvt. Ltda., 2012), 139.

169
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

A escala de vento de furacões Saffir-Simpson é provavelmente o método mais conhecido para


medir a força dos ciclones tropicais. As cores das linhas são usadas para mapeamento. Em geral, os
meteorologistas podem prever esses tipos de ciclones tropicais até 72 horas antes de ocorrerem, mas
não podem prever sua força exata ou onde eles ocorrerão. Chuvas fortes normalmente precedem esses
tipos de tempestades. O vento vai soprar a água da superfície. Ao entrar na área costeira, pode atingir
alturas de 4m – a chamada “marcha de tempestade”. As inundações podem ser extensas (até 40 km
para o interior) e têm grande potencial destrutivo em áreas costeiras de baixa altitude e densamente
povoadas. A velocidade do vento é o outro fator que leva a danos substanciais e perda de vidas, pois
traça um caminho de destruição sobre a terra.

As tempestades tropicais podem devastar áreas inteiras, danificando infraestruturas e edifícios.


Muitos ferimentos e mortes resultam de detritos voadores, tornando-se projéteis perigosos, como sinais
de trânsito, telhados e outros itens pequenos e grandes.

Em áreas com baixo padrão de construção, as casas feitas de materiais leves, incluindo aquelas com
estrutura de madeira e cobertas com chapas de papelão ondulado, raramente resistem aos ventos de
uma tempestade. Detritos voadores podem causar grandes danos estruturais. A maré da tempestade
muitas vezes terá um efeito igualmente destrutivo em pequenas casas. Muitas pessoas têm a tendência
de ficar nas partes mais baixas de suas casas, por acharem ser um local mais seguro, e se surpreendem
com o súbito afluxo de água. Esta é uma das principais causas de afogamento durante as tempestades.
Em muitos casos, as pessoas não evacuam, apesar dos alertas antecipados, para proteger suas casas
de saqueadores. A destruição de infraestrutura individual e coletiva é tipicamente muito mais extensa
com ciclones tropicais do que com inundações. Devido à maré da tempestade, algumas áreas costeiras
podem permanecer inundadas por várias semanas, impossibilitando que os habitantes limpem ou
consertem suas casas16.

Seção 7.7 Opções de Assentamento Transitório


De acordo com Tom Corsellis e Antonella Vitale, fundadores do Shelter Centre, uma organização
suíça sem fins lucrativos focada em assentamentos transitórios e reconstrução, existem seis opções
de assentamentos transitórios17. As famílias deslocadas muitas vezes alternam essas opções ao longo
de seu deslocamento. Algumas opções são mais prováveis de acontecer como resultado de um conflito
armado, mas alguns elementos delas também podem se aplicar a situações de desastres naturais. Além
disso, existem três assentamentos dispersos e três agrupados.

De acordo com Corsellis e Vitale, assentamentos dispersos (famílias de acolhimento, auto-


assentamento rural e auto-assentamento urbano) são muitas vezes preferíveis porque:

• São mais sensíveis às necessidades de mudança (mais escolhas, melhores relações com as
comunidades locais);

• Oferecem um melhor uso das estratégias de enfrentamento existentes;

• Proporcionar melhores oportunidades de desenvolvimento;

16) Os alunos que desejarem saber mais sobre as recomendações de segurança devem ler o Anexo III (Recomendações de segurança) da “Folha de
resumo de desastres, ciclones tropicais” da ACAPS.
17) Tom Corsellis e Antonella Vitale, Assentamento Transitório – População Deslocada, (Cambridge, Reino Unido, projeto de abrigo da Universidade
de Cambridge, 2005). Disponível em inglês: <http://www.ifrc.org/PageFiles/95884/D.01.06.%20Transitional%20Settlement%20Displaced%20
Populations_%20OXFAMfam%20and%20Shelter%20Centre.pdf>.

170
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

O ACNUR e seus parceiros abriram uma nova área de assentamento no distrito de Arua, no norte de Uganda, em fevereiro de
2017 para receber milhares de refugiados que chegam do Sudão do Sul. O novo assentamento Imvepi foi inaugurado depois que o
assentamento Palorinya, no distrito de Moyo, inaugurado em dezembro de 2016, atingiu rapidamente sua capacidade de acolhimento
de 135.000 refugiados. 20 de junho de 2017. Foto da ONU por Mark Garten.

• Podem ser mais rentáveis para as comunidades assistenciais; e

• Reduzem o potencial de tensão e conflito entre os deslocados e a população anfitriã e exigem


menos recursos naturais (por exemplo, combustível, madeira).

No entanto, assentamentos dispersos podem enfrentar problemas relacionados à proteção e


segurança, como:

• O assentamento está muito próximo da área de fronteira existente ou da linha de frente de um


conflito;

• A população anfitriã é de um grupo étnico ou político diferente;

• É mais difícil registrar os participantes e estimar os números da população;

• O acesso físico é limitado, afetando a assistência potencial (dificuldades logísticas);

• Há menos acesso a serviços essenciais que exigem mais recursos (comunidade de ajuda,
autoridades locais); e

• Às vezes, há menos segurança e estabilidade se estiver muito disperso.

Corsellis e Vitale afirmam que assentamentos agrupados (centros coletivos, acampamentos auto-
estabelecidos e acampamentos planejados) só devem ocorrer se um ou mais dos seguintes critérios
forem encontrados:

• Não há possibilidade de integrar as pessoas deslocadas devido à ausência de comunidades


locais no único local disponível para assentamento transitório;

• Os custos do apoio emergencial (ou seja, político, social e financeiro) e de longo prazo são
muito altos, conforme estimativas;

171
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

• Não há tempo suficiente para fornecer infraestrutura devido à urgência;

• A população local é hostil ou não aceita a integração de uma população deslocada;

• O governo anfitrião não está disposto, por razões políticas ou de segurança, a permitir
assentamentos dispersos;

• Há competição por recursos locais insuficientes (por exemplo, água, combustível, madeira)
resultantes de assentamentos dispersos;

• Há uma assistência significativamente maior à população deslocada do que à população local


(por exemplo, distribuição de alimentos, assistência médica, etc.); e

• O ambiente é frágil e, portanto, é melhor manter a população deslocada em assentamentos


agrupados (melhor gestão dos recursos naturais).

As liquidações agrupadas também podem enfrentar um certo número de riscos, como:

• Risco de segurança por se tornar um alvo claro, especialmente se localizado muito próximo à
fronteira ou linha de frente;

• Impacto ambiental negativo (por exemplo, desmatamento, erosão do solo) sobre os recursos
locais existentes (risco de recursos naturais serem colhidos além dos limites sustentáveis da
área);

• Segregação da população deslocada e local e risco de potencial tensão ou conflito;

• Aumento da dependência e perda de habilidades da população deslocada a longo prazo; e

• O investimento inicial de capital pode ser alto sem qualquer certeza sobre a duração do
deslocamento.

A auto-assentamento (4) ou o assentamento planejado (2) também estarão disponíveis.

A comunidade assistencial apoia principalmente o assentamento planejado, já que o auto-


assentamento muitas vezes apresenta vários problemas. A maioria dos argumentos são os mesmos
apresentados para os grupos de assentamentos dispersos:

• A maioria dos problemas está relacionada à infraestrutura e serviços necessários para apoiar a
população deslocada, o que pode se tornar problemático a longo prazo; e

• As autoridades devem garantir que a população deslocada seja realocada para uma área
aproximadamente do mesmo tamanho da área de vida anterior e também devem levar em
consideração as tensões étnicas e políticas.

As comunidades de ajuda humanitária preferem apoiar assentamentos planejados, embora tenham


alguns inconvenientes, como:

• Oferecer menos apoio aos mecanismos de sobrevivência da família e menos flexibilidade para
garantir a subsistência;

• Fornecer capacidade de absorção limitada em caso de grande afluxo devido ao custo e tempo
necessários para configurar uma instalação planejada; e

• Potencialmente duplicar os serviços existentes para a população local de forma insustentável.

172
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

O assentamento disperso com famílias anfitriãs é uma opção durante desastres naturais. Em
muitos casos, vem da reação humana natural de buscar abrigo com parentes e amigos. As famílias
anfitriãs podem ser parentes, amigos ou até mesmo estranhos. Pode ser dentro da mesma casa do
anfitrião ou em estrutura diferente, com ou sem pagamento, etc. A duração do período de hospedagem
e o estresse potencial (social, financeiro) que pode causar ao longo do tempo serão pontos cruciais a
serem considerados. Os agentes humanitários devem estar cientes de que esta opção tem um certo
número de vulnerabilidades:

• Risco de ataque externo às famílias de acolhimento/hospedagem;

• Abuso físico ou sexual, ou exploração financeira (hospedando ou sendo hospedado);

• Rejeição ou violência entre anfitrião e hospedado ao longo do tempo;

• Recursos naturais insuficientes e desorganização da gestão desses recursos levando à violência


ou ao término do acolhimento; e

• Acesso mais difícil a diferentes tipos de serviços, como serviços comunitários apoiados por
ajuda, cuidados de saúde, ajuda distribuída, etc.

Qualquer apoio prestado à população deslocada nunca deve elevar os padrões de vida dessa além
dos da população local. As famílias anfitriãs provavelmente podem sofrer tanto quanto as hospedadas,
pois compartilharão os escassos recursos que possuem com os membros da família hospedada, e
também precisarão de assistência para sobreviver.

Outra opção de assentamento disperso é o auto-assentamento rural18. Este é o caso quando o


assentamento ocorre em uma área rural que é de propriedade coletiva e não privada. Muitos problemas
enfrentados pelo auto-assentamento rural são os mesmos que enfrentam as famílias anfitriãs. Em
alguns casos, a proximidade cria uma interdependência entre os deslocados e as populações locais.
A pressão social e cultural pode se tornar um fator e levar a população deslocada a se comportar de
acordo com os costumes e tradições locais, abrindo mão de (partes) de sua própria identidade.

O auto-assentamento urbano é outra opção. Segundo Corsellis e Vitale, trata-se de “populações


deslocadas de meio urbano que podem decidir se estabelecer em uma cidade ocupando propriedades ou
terras não reivindicadas, ou se estabelecer informalmente19”. Esse tipo de assentamento informal nem
sempre é legal, e muitas vezes os assentados evitam intencionalmente o contato com as autoridades
locais. A existência potencial de um problema de propriedade pode levar as agências de ajuda a consultar
as autoridades sobre as estratégias a serem usadas para fornecer apoio, independentemente do tipo
de propriedade. Assim como outras formas de assentamentos, o auto-assentamento urbano disperso
apresenta um conjunto de vulnerabilidades comuns, tais como:

• Dificuldade de atualização para atender aos padrões de resposta humanitária;

• O acesso a certos serviços comunitários apoiados por ajuda e ajuda distribuída será mais difícil,
especialmente para grupos vulneráveis; e

• Dificuldade em encontrar água e pastagens para o gado, bem como terras agrícolas adequadas.

A categoria agrupada de assentamento consiste em duas opções: centros coletivos e


acampamentos planejados.

18) Corsellis e Vitale, Acordo de Transição.


19) Corsellis e Vitale, Acordo de Transição, 95.

173
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

Os centros coletivos não devem ser considerados para acomodação de longo prazo, a menos que
possam fornecer o apoio necessário. Em muitos casos, o governo local pode oferecer um certo número
de instalações de propriedade do governo, como centros comunitários ou escolas, ou requisitar certas
infraestruturas de propriedade privada (por exemplo, armazéns, hotéis, etc.). Os agentes humanitários
precisam considerar as seguintes questões para esta opção20:

• Quão apropriada é a instalação ou estrutura para hospedar pessoas deslocadas?

• Qual é a duração potencial e quando a instalação terá que retornar ao seu uso anterior?

• Quem é o dono?

• Qual é a natureza do acesso, serviços e utilidades e em que condições foram deixados?

Durante desastres naturais, as pessoas podem ocupar prédios como escolas ou armazéns
espontaneamente sem coordenação prévia com as autoridades. Após um desastre, as pessoas procuram
abrigo para se protegerem. Muitos desses abrigos não fornecem requisitos essenciais, como instalações
sanitárias e de cozinha suficientes. Eles podem ficar superlotados rapidamente, levando a problemas de
privacidade, higiene e saúde.

Em algum momento, as autoridades ordenarão que os ocupantes deixem as instalações do governo


(como escolas) para que possam reabrir21 e ajudar a sociedade a voltar à normalidade22. Restaurar as
instalações às suas funções iniciais leva tempo e exigirá um bom planejamento e recursos suficientes, e
as pessoas precisarão ser realocadas.

Embora os centros coletivos facilitem a assistência das agências, alguns riscos relacionados
à segurança, proteção e doenças ainda exigirão controle de vetores e promoção da higiene. Os
planejadores devem considerar os custos de
manutenção associados ao uso de centros
coletivos. Também é provável que haja
uma alta proporção de idosos e indivíduos
sem família vivendo nessas instalações. O
registro de todos os ocupantes pode ser
difícil, pois algumas pessoas podem sair do
centro durante o dia para procurar trabalho
ou fazer seus negócios diários. Portanto,
pode ser difícil para as agências de ajuda
fornecer assistência sem a ajuda de líderes
comunitários.

A última opção é de auto-


Alunos em uma sala de aula no assentamento Imvepi no distrito
assentamentos agrupados em
de Arua, norte de Uganda. 19 de junho de 2017. Foto da ONU por
acampamentos. Há uma distinção entre Mark Garten.

acampamentos planejados e não planejados.


Corsellis e Vitale definem os acampamentos planejados como “lugares onde as populações deslocadas

20) Corsellis e Vitale, Acordo de Transição, 95.


21) A reabertura das escolas é uma fase importante para a recuperação das crianças após um evento traumático, como um desastre natural, especialmente
quando causou perda pessoal de familiares ou perturbou gravemente suas vidas.
22) Às vezes, as autoridades nacionais tomam decisões sem consultar as autoridades locais e não conhecem a situação local, sobrecarregando as
autoridades locais na busca de alternativas adequadas/aceitáveis.

174
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

encontram acomodação em locais construídos para esse propósito e onde uma infraestrutura completa
de serviços é fornecida, incluindo abastecimento de água, distribuição de alimentos, distribuição de
itens não alimentares, educação e assistência médica, geralmente exclusivamente para a população do
local23.”

Os acampamentos geralmente são estabelecidos antes da chegada das organizações de ajuda ao


campo. As populações deslocadas preferem-nos por seu componente social (viver em grupos). Se os
acampamentos não forem planejados, no entanto, muitas vezes eles devem ser realocados por razões de
segurança e proteção. Acampamentos não planejados são muitas vezes o resultado de acampamentos
planejados insuficientes combinados com um súbito afluxo maciço de pessoas deslocadas. Quando
acampamentos não planejados resultam de conflitos armados, eles são vulneráveis a todos os tipos
de ameaças de segurança externas (como facções em guerra) e internas (por exemplo, combatentes
ocultos entre a população civil24). O gerenciamento desses acampamentos — especialmente os não
planejados — pode ser desafiador.

No caso de questões relacionadas a conflitos armados, o ACNUR será a agência líder. O ACNUR
considera os acampamentos planejados como uma opção de último recurso25. Ela negociará questões de
posse de terra com o governo anfitrião, bem como questões de proteção. O planejamento e contingência
do programa serão ações-chave para avaliar a capacidade e viabilidade dos acampamentos e sua
eventual construção. Eles também avaliarão se os acampamentos auto-instalados são viáveis para as
populações deslocadas, especialmente em áreas específicas de preocupação, bem como a composição
étnica e religiosa potencial. Também será importante monitorar os fluxos e o registro. As autoridades
precisam identificar os centros de recepção para registrar/rastrear todas as novas chegadas. Também é
comum observar qualquer rotatividade da população, bem como a composição demográfica em função
da situação em curso (por exemplo, alistamento forçado, atividades econômicas, etc.).

A questão da gestão do acampamento não deve ser subestimada. Ela requer o trabalho de
profissionais com o auxílio de comitês estabelecidos. A gestão dos acampamentos pode mudar ao
longo do tempo. Uma organização pode ser responsável pela construção e outra pelo desenvolvimento,
manutenção e administração do acampamento. Montar o acampamento é uma atividade complexa. O
planejamento de todas as instalações (por exemplo, armazenamento/distribuição de água e alimentos,
saneamento, gestão de resíduos, etc.), expansão potencial e aquisição de materiais e equipamentos
pode ser bem difícil. Atender aos padrões internacionais ao mesmo tempo em que analisa os perigos
potenciais, incluindo a degradação ambiental, será extremamente desafiador.

A relação entre as populações deslocadas e locais também terá impacto na gestão dos acampamentos,
aplicando-se os mesmos princípios descritos para outros tipos de assentamentos.

Considerações sociais associadas a acampamentos planejados como abrigos

Como mencionado anteriormente, existem potenciais impactos sociais sobre as populações


hospedeiras e hospedadas relacionadas ao assentamento de transição. O tipo de instalação de abrigo
produz efeitos econômicos, culturais e psicológicos nas populações. A duração é outro fator. A incerteza
do tempo que as pessoas permanecerão nessas condições de vida provavelmente tem o impacto social

23) Corsellis e Vitale, Acordo de Transição, 124.


24) Veja a Lição 5.
25) Corsellis e Vitale, Acordo de Transição.

175
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

mais importante. Expectativas irreais geradas na população afetada de voltar para casa e receber
informações enganosas sobre o tempo de reconstrução podem criar frustração e tensão. A reconstrução
de casas pode se tornar uma questão de longo prazo e dependerá das capacidades financeiras disponíveis
(por exemplo, governo, doadores, etc.). Como o geógrafo Daniel Abrahams descreveu: “Em muitos
casos [,] os abrigos são usados muito além do período de tempo inicialmente planejado26”.

A vida útil projetada do abrigo temporário varia de acordo com o tipo usado (ou seja, tendas,
semipermanentes, etc.). Em muitos casos, espera-se que as estruturas de abrigos temporários se deteriorem
com o tempo, dependendo de sua qualidade e ambiente (por exemplo, clima, poluição, etc.). Apesar da
existência de padrões comuns, durante a crise do terremoto de 2010 no Haiti, Abraham observou:

“... um ‘efeito loteria’ na construção equitativa de abrigos


temporários: No rescaldo do terremoto no Haiti, quando um
alto fluxo de organizações de ajuda e recursos financeiros
sobrecarregaram uma abordagem estruturada e coordenada
para a distribuição de abrigos, uma desigualdade significativa
na provisão de abrigos foi observada: comunidades atendidas
por organizações com recursos bem financiados para a provisão
de abrigos de alta qualidade receberam abrigos [excelentes],
enquanto outras comunidades que eram atendidas por
organizações com menos recursos financeiros receberam
abrigos muito mais básicos. Na prática, essas últimas
comunidades exigiram rapidamente melhorias e a provisão
de abrigos de qualidade comparável aos recebidos pelas
comunidades vizinhas. Situações comparáveis parecem ser
particularmente prevalentes nos casos em que organizações de
ajuda e partes interessadas não experientes chegam e grandes
quantias de dinheiro e ajuda estão inicialmente disponíveis, por
exemplo, após mega desastres27”.

Este exemplo demonstra a complexidade da coordenação e da aplicação de padrões comuns de acordo


com as diretrizes do governo nacional. Se não forem feitas corretamente, pode ser contraproducente
para a comunidade humanitária.

Seção 7.8 Planejamento de Abrigo


A construção do assentamento transitório/abrigo temporário deve ser planejada em detalhes. Dependendo
do contexto, haverá dois atores principais envolvidos como agências principais: no caso de conflito armado,
o ACNUR será a agência principal, enquanto no caso de desastres naturais, a Federação Internacional das
Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho (IFRC) assumirá a liderança. Conforme descrito
anteriormente, a população afetada provavelmente tentará ficar o maior tempo possível dentro ou perto de
suas casas e poderá ignorar as ordens de evacuação. Muito depende dos riscos secundários (por exemplo,
segurança e proteção) presentes — e eles podem ser muitos. A provisão de abrigo temporário deve ser

26) Thomas Abeling e Hugh Deeming, “Projeto Mass Shelter Capability (MASC)”, 2015, 33. Disponível em inglês: <https://www.researchgate.net/
publication/282183801_Mass_Shelter_Capability_Literature_Review>.
27) Abeling e Deeming, “Capacidade de Abrigo em Massa”, 35.

176
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

feita de forma sistemática e controlada, e a


coordenação pode se tornar um desafio. No
âmbito da redução do risco de desastres, o
estabelecimento de planos de contingência
que envolvam todos os níveis de governança
deve ser uma prioridade, especialmente para
regiões propensas a desastres naturais. Os
planejadores devem desenvolver diferentes
cenários, mas não devem se limitar apenas à
fase de planejamento.

Após um desastre, as autoridades devem


desenvolver opções para assentamentos
agrupados e desagrupados para antecipar o
movimento em massa da população. Nos casos
em que a população local permanecerá em
suas casas (desagrupada), será prioritário
fornecer kits de limpeza e reparos e distribuir Lidando com Desastres: Refugiados e Deslocados no Sudeste
materiais e equipamentos. Embora esta pareça Asiático. Vista do campo de refugiados de Pulau Bidong, na
Malásia. Na época em que a foto foi tirada, este campo tinha cerca
ser uma opção favorável, as necessidades da
de 36.000 refugiados vietnamitas. 1 de agosto de 1979. Foto da
população não devem ser subestimadas. Pode ONU por John Isaac.
levar tempo – talvez semanas – até que o
material de reparo adequado esteja disponível. Além disso, certas condições devem ser atendidas para
iniciar a limpeza e o reparo (por exemplo, após uma inundação, a água deve retroceder completamente e
as condições devem se estabilizar). As operações de limpeza geral são uma das atividades prioritárias que
as autoridades precisam organizar após um desastre antes que os indivíduos possam iniciar suas próprias
atividades de limpeza. Essas operações individuais de limpeza em pequena escala andam de mãos dadas
com um plano geral de gerenciamento de resíduos desenvolvido. As autoridades devem identificar locais
de despejo adequados e seguros, bem como planejar equipamentos pesados e transporte para evacuar
os resíduos. Nos países em desenvolvimento, onde os recursos são escassos, isso muitas vezes será um
desafio, pois pode levar tempo para enviar equipamentos pesados. A acessibilidade da assistência durante
a emergência terá um impacto considerável nas condições de vida da população afetada e contribuirá para
a sua recuperação precoce.

Em casos de movimento em massa, as autoridades devem identificar locais de construção


adequados para assentamentos transitórios agrupados. Um levantamento adequado de locais potenciais
(oportunidades e restrições), incluindo análise de risco, será o ponto de partida. Se a população local evita
certas áreas, provavelmente há uma razão para isso. Alguns locais podem ser tóxicos ou poluídos. A área
circundante precisa ser pesquisada para o risco potencial de poluição residual. Além disso, as autoridades
devem analisar a topografia e o clima (incluindo padrões de vento e chuva). Durante a estação fria, a
maioria das atividades diárias ocorrerá em ambientes fechados, o que exigirá mais espaço. As variações
sazonais existentes podem ter um impacto considerável no tipo e custo do abrigo. As autoridades devem
evitar áreas com declives instáveis ou íngremes, áreas propensas a deslizamentos e avalanches e áreas
em planícies aluviais. O impacto potencial de doenças transmitidas por vetores também deve ser levado

177
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

em consideração na seleção do local. Os abrigos devem ter espaço suficiente entre eles para limitar o risco
de incêndio. Em geral, acampamentos grandes exigirão equipes de combate a incêndios com recursos
adequados, incluindo pontos de água suficientes. Ao projetar um acampamento, os planejadores devem
usar técnicas para tornar os abrigos mais seguros, especialmente após um terremoto, para garantir que
os ocupantes tenham a chance de escapar de um abrigo antes que ele desmorone28.

Especialistas no assunto devem estar envolvidos na fase de planejamento de acordos transitórios. O


planejamento de assentamentos agrupados raramente conseguirá se ater ao plano inicial, principalmente
em relação ao número de ocupantes. O terremoto de 2010 no Haiti demonstrou que os acampamentos
planejados devem considerar um efeito de tampão para evitar a superlotação caso o número de
deslocados em busca de abrigo exceda as premissas do planejamento.

O ACNUR estabeleceu definições de agrupamentos dentro dos campos para esclarecer certos termos29:

Prazo Número
Família 4–6 pessoas
Comunidade = 16 famílias 80 pessoas
Bloco = 16 comunidades 1.250 pessoas
Setor = 4 blocos 5.000 pessoas
Módulo de acampamento = 4 setores 20.000 pessoas

Um campo de trânsito é estabelecido na fronteira Líbia-Tunísia para os milhares de refugiados que fugiram dos distúrbios em curso na
Líbia. A ONU e suas agências estão prestando assistência aos refugiados, incluindo tendas para abrigo do Alto Comissariado das Nações
Unidas para os Refugiados (ACNUR). 6 de março de 2011. Foto da ONU por OCHA/David Ohana.

28) Corsellis e Vitale, Acordo de Transição.


29) Corsellis e Vitale, Acordo de Transição, 379.

178
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

Seção 7.9 Padrões de Abrigo


Atender aos padrões internacionais será um dos muitos desafios que os agentes humanitários
enfrentarão ao estabelecer abrigos de transição. As agências líderes de cluster têm certos requisitos
que são padrões reconhecidos internacionalmente. Segundo o ACNUR, a área mínima recomendada
para locais de refugiados é de 30m2 por pessoa30. Isso inclui estradas, trilhas e saneamento, mas
não jardins para atividades agrícolas. Como a construção pode levar algum tempo, os planejadores
devem incluir a presença de um pequeno jardim se as condições permitirem (por exemplo, clima, água,
sementes, etc.). Isso traz o espaço total necessário por pessoa para um mínimo de 45m2.

Durante a fase de emergência, os acampamentos devem fornecer um abrigo mínimo de 3,5 m2


por pessoa em climas tropicais quentes, excluindo instalações de cozinha ou cozinhas (assumindo que
o cozimento será feito ao ar livre). Em climas frios ou situações urbanas, os acampamentos devem
fornecer 4,5–5,5 m2 por pessoa, incluindo cozinha e instalações de banho31. As Lições 8 e 9 abordam
padrões adicionais sobre outros setores relevantes e de ajuda em desastres.

Abrigos de transição geralmente vêm em três tipos: coberturas plásticas, tendas e abrigos pré-
fabricados. As folhas de plástico são frequentemente o primeiro componente do abrigo distribuído.
São usadas principalmente para reparar telhados e janelas, mas pode ser um componente básico para
tendas. O esqueleto de suporte para este tipo de abrigo geralmente vem da floresta circundante. Isso
pode ter um impacto significativo no ambiente local. Em muitos casos, a distribuição de barracas é
a forma mais rápida de abrigar e proteger as pessoas, e a maioria dos tipos corresponde aos padrões
humanitários. Infelizmente, pesquisas descobriram que muitas tendas não são da mesma qualidade e
diferem de acordo com o fabricante, apesar de estarem em conformidade com as normas internacionais.
A vida útil de uma barraca depende do clima e pode levar de dois a três anos. As barracas são difíceis de
aquecer em climas mais frios e exigem muito combustível (geralmente querosene ou madeira), que tem
um certo custo. No calor, as barracas devem ser cobertas com outra braçadeira externa para sombrear
e proteger as barracas de baixo.

A importação de abrigos pré-fabricados geralmente não é uma opção adequada e deve


ser evitada. Há muitas razões para evitar essa opção, como alto custo unitário e longos tempos de
produção e envio. A razão mais importante é que raramente correspondem às realidades ambientais. A
construção de abrigos semipermanentes deve ser feita na área afetada com a assistência e contribuição
das autoridades locais e da população afetada. A pré-fabricação local de componentes de abrigos pode
ser benéfica em algumas circunstâncias, pois pode acelerar o processo de construção e ter um custo
menor; no entanto, podem ser difíceis de reparar se forem utilizados determinados materiais que não
são comuns à população local32.

O Anexo I inclui uma descrição das normas de qualidade para equipamentos de abrigos. Os alunos
devem também reler algumas das normas do ACNUR no Manual da Sphere33.

30) Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, Manual para Emergências, 3ª ed. (Genebra, ACNUR, 2007). Disponível em inglês: <http://
reliefweb.int/report/world/handbook-emergencies-third-edition>.
31) ACNUR, Manual para Emergências.
32) OIM, “Diretrizes de Abrigo Transitórios”, Genebra, Suíça, Centro de Abrigo, 2012. Disponível em inglês: <https://www.iom.int/files/live/sites/iom/
files/What-We-Do/docs/Transitional-Shelter-Guidelines.pdf>.
33) The Sphere Project, The Sphere Handbook: Carta Humanitária e Padrões Mínimos em Resposta Humanitária, 2011. Disponível em inglês: <http://
www.sphereproject.org/handbook/>.

179
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

Seção 7.10 Itens Não Alimentares


A provisão de abrigo durante a fase de emergência é incompleta sem a entrega de material
adicional, conhecido como itens não alimentares. A OIM define itens não alimentares (do inglês,
non-food items — NFI) como “bens e suprimentos básicos necessários para permitir que as famílias
atendam às necessidades de higiene pessoal, preparem e comam alimentos, forneçam conforto térmico
e construam, mantenham ou consertem abrigos34”.

A maioria das famílias deslocadas perde tudo em um desastre e precisa de novos itens pessoais,
como roupas, materiais de higiene, utensílios domésticos em geral, instalações de armazenamento
e muito mais. Os itens necessários dependerão do clima e da região. Os itens comuns entregues às
pessoas deslocadas incluem utensílios de cozinha, conjuntos de aquecimento, cobertores, galões
dobráveis, baldes, colchões ou camas, lonas, etc. Ao enviar as barracas, as organizações de socorro
devem estar atentas a esses conjuntos suplementares, estejam ou não incluídos no pedido inicial. As
autoridades não devem subestimar os problemas de transporte devido ao volume de alguns desses
itens. O transporte de itens por via aérea pode se tornar extremamente caro, e os agentes humanitários
devem considerar aquisições alternativas, como por meio do mercado local, em algumas circunstâncias.
Os NFIs são componentes essenciais dos requisitos de abrigo, e os planejadores devem verificar sua
compatibilidade cultural e aceitação antes da entrega. Os planejadores devem analisar o impacto
potencial da compra desses itens em mercados locais (por exemplo, preços versus disponibilidade). Em
casos de compras em grande escala, o impacto pode ser significativo.

Os humanitários devem desencorajar o fornecimento de roupas por meio de campanhas de coleta,


a menos que seja feito por organizações especializadas. A maioria das roupas coletadas é culturalmente
inaceitável e não atende às necessidades da população afetada. Mesmo quando feito por voluntários sem
custo, o transporte de roupas coletadas pode ser mais caro do que o valor residual das roupas enviadas.
As autoridades devem dar preferência à compra de roupas no mercado local/regional, garantindo sua
aceitabilidade cultural. O mesmo vale para os colchões. Como são volumosos, os agentes humanitários
devem tentar adquiri-los no local.

Fogões e aquecedores são outros itens críticos que podem ter consequências na saúde e na
segurança. O valor energético dos diferentes tipos de combustíveis pode variar, assim como o impacto
ambiental ou financeiro. Alguns combustíveis, como o querosene, precisam de espaços bem ventilados.
Além disso, as autoridades devem considerar as práticas locais existentes. A cozinha comunitária,
embora mais eficiente em termos de combustível, pode não ser culturalmente aceitável35.

34) OIM, “Diretrizes de Abrigo Transitórios”.


35) Os alunos podem consultar os Sphere Standards para saber mais sobre os utensílios para cozinhar e comer.

180
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

Questionário de fim de Lição  »

1. Qual das seguintes afirmações é FALSA? 4. Qual das seguintes afirmações é FALSA?
A. Os continentes mais afetados por desastres A. O nível de água atingido, a violência
são Ásia e Américas. (volume), a velocidade das correntes e a
B. A região da Ásia-Pacífico continua sendo a área geográfica abrangida caracterizarão a
região mais propensa a desastres do mundo. destruição causada pelas inundações.

C. Em termos de setores para os três principais B. As inundações também podem causar


tipos de desastres, existem grandes diferenças a perda de colheitas, sementes e gado,
nas principais necessidades imediatas. bem como danos estruturais (pontes

D. Metade da população mundial vive a 60 km desmoronadas, estradas destruídas, etc.).

do mar. C. Uma característica das inundações é o


deslocamento em massa da população em
2. Qual das seguintes afirmações é FALSA? um curto período, bem como operações
A. O impacto físico dos terremotos depende da intensivas de evacuação e resgate.
intensidade do tremor do solo e da qualidade D. As inundações são o tipo menos frequente
da engenharia das estruturas. de desastre natural.
B. O impacto físico de um desastre será menor
se os edifícios forem construídos em rocha 5. A escala de ventos de furacões Saffir-
Simpson é provavelmente o método
sólida, que tende a receber menos danos.
mais conhecido para medir a força dos
C. Rochas e sedimentos não consolidados ciclones tropicais. As cores das linhas
tendem a diminuir a amplitude e a duração são usadas para mapeamento. Em geral,
das ondas sísmicas e, portanto, diminuirão o os meteorologistas podem prever esses
potencial de danos. tipos de ciclones tropicais até ____
horas antes de ocorrerem, mas não
D. A escala Mercalli descreve a intensidade
podem prever exatamente sua força
de um terremoto com base em seus exata ou onde eles ocorrerão.
efeitos observados.
A. 24

3. Qual das seguintes afirmações é FALSA? B. 36


C. 48
A. Incêndio (devido a linhas de energia
derrubadas, tubulações de gás natural D. 72

quebradas, etc.) e tremores secundários são


6. Após um desastre, as pessoas procuram
os principais riscos secundários.
abrigo para se protegerem. Muitos
B. Em áreas urbanas com alta demanda desses abrigos não fornecem requisitos
habitacional, problemas de terra e propriedade essenciais, como instalações sanitárias e
geralmente surgem após os terremotos. de cozinha suficientes. Eles podem ficar
superlotados rapidamente, levando a
C. Mais de 75 por cento das mortes por
problemas de _____.
terremotos são causadas por tremores.
A. higiene
D. Em geral, devemos sempre deslocar ou
B. saúde
reassentar as comunidades afetadas, pois é
indispensável evitar riscos de perigos físicos. C. privacidade
D. Todas as opções anteriores

As respostas estão disponíveis na página seguinte.

181
LIÇÃO 7 | Impacto de desastres no setor de abrigos e itens não alimentares

Questionário de fim de Lição  »

7. Assentamentos dispersos são muitas 9. Qual dos seguintes NÃO é um padrão de


vezes preferíveis porque _____. abrigo normal?
A. são mais responsivos às necessidades em A. Os acampamentos devem fornecer um
curso (mais escolhas, melhor relacionamento abrigo mínimo de 3,5 m2 por pessoa
com as comunidades locais) em climas tropicais quentes, excluindo
B. podem ser mais rentáveis para as instalações de cozinha ou cozinhas.
comunidades assistenciais B. A área mínima recomendada para locais de
C. reduzem o potencial de tensão e conflito refugiados é de 30m2 por pessoa.
entre os deslocados e a população anfitriã e C. Em climas frios ou situação urbana, os
são menos exigentes em recursos naturais acampamentos devem fornecer 4,5-5,5 m2
(por exemplo, combustível, madeira) por pessoa, incluindo cozinha e instalações
D. Todas as opções anteriores de banho.
D. Um acampamento não deve ter mais de
8. O ACNUR considera os acampamentos 10.000 pessoas.
planejados como _____.
A. uma solução aceitável 10. Os NFIs são componentes essenciais dos
B. uma opção de último recurso
requisitos do abrigo, e seu(s)/sua(s)
_____ devem ser verificados antes da
C. totalmente inaceitável
entrega.
D. a melhor solução
A. preço e valor
B. compatibilidade cultural e aceitação
C. transporte
D. aquisição

Respostas »
1. C

2. C

3. D

4. D

5. D

6. D

7. D

8. B

9. D

10.B

182
OPERAÇÕES HUMANITÁRIAS

LIÇÃO
Impacto de Desastres, WASH
8 e o Setor de Saúde

Os agentes humanitários
devem abordar os principais
problemas de higiene o
mais rápido possível para
evitar surtos de doenças
em um ambiente que foi
fortemente afetado
por desastres.

Foto da ONU por Harandane Dicko.

Nesta lição » Objetivos da lição »

Seção 8.1 Diferentes tipos de desastres e • Descrever os diferentes efeitos dos desastres e
seus efeitos no WASH suas consequências sobre o WASH.

Seção 8.2 Diferentes tipos de desastres e • Descrever os diferentes efeitos dos desastres e
seus efeitos na saúde suas consequências na saúde.

Seção 8.3 Abastecimento de Água e • Ilustrar os desafios no domínio do abastecimento


Promoção de Higiene (WASH) de água, higiene e eliminação de excrementos
e resíduos.
Seção 8.4 Descarte de Excrementos e

Resíduos (WASH) • Avaliar a drenagem e o controle de vetores com a


montagem de abrigos.
Seção 8.5 Drenagem e Controle Vetorial

(WASH) • Recordar e descrever a ligação entre WASH e


saúde e os diferentes tipos de abrigo.
Seção 8.6 Ações de Saúde em Desastres
• Reconhecer e avaliar os fatores de risco e o
Seção 8.7 Epidemiologia e Vacinações
surgimento de determinadas doenças.

Seção 8.8 USAR e INSARAG • Explique o que são EMT e USAR e como
eles operam.

INSTITUTO DE TREINAMENTO EM OPERAÇÕES DE PAZ

183
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) fornece tendas para conter o surto de cólera no Haiti. Um homem monta as
tendas do UNICEF no bairro de Cité Soleil, em Porto Príncipe. 16 de novembro de 2010. Foto da ONU por UNICEF/Marco Dormino.

Introdução

Abordar o abastecimento de Água, Saneamento


e Higiene (WASH) é essencial após a maioria dos
desastres, pois essas questões são as origens primárias
de muitos problemas de saúde na população afetada.

Esta lição destaca algumas questões técnicas


para enfatizar que os setores estão interconectados e Veja um vídeo de introdução desta
conhecimentos específicos são necessários para ajudar lição em inglês: <https://www.
peaceopstraining.org/videos/498/
a resolver certos problemas. A lição também descreve
hro-lesson-8-disaster-impact-and-
os últimos desenvolvimentos em relação às Equipes wash-and-health-sector/>.
Médicas de Emergência (EMTs), pois elas estão entre
as primeiras a responder em muitos desastres. Sempre
que um terremoto ocorre, as Equipes de busca e
salvamento em meio urbano (USAR) são as primeiras
a responder. A lição termina explorando alguns dos
princípios básicos das equipes USAR. A lição também
cita documentos adicionais e sites de interesse para os
alunos lerem por conta própria1.
1) Incentivamos que os alunos verifiquem as informações incluídas nos
Padrões Esfera.

184
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

Seção 8.1 Diferentes tipos de desastres e seus efeitos sobre


o WASH

Terremotos

A maioria dos sobreviventes de terremotos (85–95 por cento) são encontrados por parentes,
vizinhos, amigos ou serviços de emergência locais. Quando as condições de aprisionamento são boas –
um aprisionamento no qual há um vazio relativamente grande onde os sobreviventes podem membros
e acessar água – a chance de sobrevivência aumenta2. Em casos extraordinários, as vítimas podem ser
encontradas vivas após vários dias nos escombros, mas as pessoas geralmente não sobrevivem mais
do que dois dias nessas condições. A última seção desta lição aborda algumas questões específicas da
USAR para fornecer informações adicionais sobre como as equipes da USAR operam.

Garantir o acesso à água potável também está entre as prioridades para a população afetada. A
água é essencial para a sobrevivência de seres humanos e animais. As pessoas podem sobreviver por
dias sem comer, mas não sem beber água. Dependendo da magnitude do terremoto e da qualidade da
infraestrutura de distribuição de água existente, a área afetada pode sofrer uma interrupção total ou
parcial do sistema de distribuição. A destruição de infraestrutura ou interrupção de eletricidade também
afeta a disponibilidade de água. As tubulações de água restantes em funcionamento podem não garantir
a potabilidade sem riscos de contaminação. Reparar e restabelecer o abastecimento de água dependerá
principalmente da capacidade das autoridades locais.

A contaminação do sistema de distribuição de água pode ter uma origem diferente. Como
outras infraestruturas, um terremoto pode interromper parcial ou totalmente o sistema de esgoto.
Vazamentos ou destruição no sistema de esgoto podem contaminar as fontes de água, bem como o
sistema de abastecimento. Fossas sépticas quebradas, tanques de combustível ou outras instalações de
armazenamento subterrâneo podem contaminar as águas subterrâneas. A contaminação química das
fontes de água devido a danos nas instalações de armazenamento industrial é outro problema potencial.
Os resíduos (industriais) existentes também podem contaminar as águas subterrâneas. Em alguns
casos, os terremotos podem alterar a superfície da terra, tornando algumas áreas mais vulneráveis
a inundações durante chuvas fortes. Além disso, a contaminação e os derramamentos nem sempre
podem ser detectados imediatamente. A necessidade de água potável também é essencial para evitar
surtos de doenças, portanto, a manutenção de sistemas de distribuição de água de qualidade será uma
prioridade para as equipes de resposta a desastres.

Inundações

Na maioria dos casos, a chuva forte (água doce) causa inundações, mas a água salgada também.
Ambos os tipos de inundações apresentam problemas específicos. A água doce contém sólidos em
suspensão, deixando para trás uma camada de lama e solo quando recua. Fossas sépticas, latrinas
públicas e outras instalações de armazenamento subterrâneo podem transbordar, dispersando seu
conteúdo, incluindo produtos/resíduos tóxicos, e contaminar as águas subterrâneas ou outras fontes
potenciais de água. Instalações de armazenamento no solo inundadas contendo substâncias tóxicas
podem ser destruídas e corpos ou carcaças em decomposição podem contaminar as fontes de água. As
pessoas também podem despejar resíduos na água ou perto dela, o que pode contaminá-la.

2) Consulte a Lição 2 para obter mais informações sobre a síndrome do esmagamento.

185
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

As inundações repentinas são uma forma específica e particularmente comum de inundação em


áreas montanhosas e desérticas. Elas podem acontecer repentinamente devido a chuvas extremamente
fortes e rápida acumulação e liberação de água de escoamento em um curto período. Durante uma
enchente repentina, pequenos riachos tornam-se rios selvagens, arrastando infraestrutura, incluindo
casas, margens de rios e pontes, e causando destruição e interrupção de fontes de água e sistemas de
distribuição. As instalações de armazenamento no solo contendo substâncias/resíduos tóxicos podem
ser lavadas, causando contaminação de potenciais fontes de água e alimentos.

No rescaldo de tais catástrofes, a gestão de resíduos desafiará as autoridades, especialmente a


gestão de resíduos perigosos. Detritos e lama podem encher, destruir e obstruir poços ou contaminar
fontes de água de superfície. O acesso pode ser dificultado devido à infraestrutura bloqueada ou
danificada, dificultando a distribuição de água e outros tipos de distribuição durante a fase de alívio.

Chuvas fortes (de monção) podem saturar o solo e produzir lama e deslizamentos de terra com o
mesmo efeito destrutivo que as inundações repentinas. O desmatamento pode aumentar a erosão do
solo. O aumento da concentração da população em certas áreas pode exacerbar o desmatamento. A
chuva pode desenvolver padrões de drenagem incontroláveis, alterando a paisagem ao longo do tempo.
O aumento do escoamento de sedimentos e a infiltração da água da chuva no solo podem provocar
lama/deslizamentos de terra, destruindo tudo em seu caminho.

O Dartmouth Flood Observatory divide as inundações em três classes3:

• “Classe 1: grandes eventos de inundação: danos significativos a estruturas ou agricultura;


fatalidades; e/ou intervalo relatado de 1-2 décadas desde o último evento semelhante.”

• “Classe 1.5: eventos muito grandes: com intervalo de recorrência estimado superior a 2
décadas, mas inferior a 100 anos, afetando uma grande região geográfica (> 5.000 km²).”

• “Classe 2: eventos extremos: com intervalo de recorrência estimado maior que 100 anos.”

Ciclones tropicais

Os ciclones tropicais têm um impacto na água potável semelhante ao causado pelas inundações4.
Um desastre relacionado é uma maré de tempestade. Ventos fortes acumulam água e a empurram
como uma parede em direção ao litoral em alta velocidade. O perfil da costa, as ondas e a maré
no momento da chegada do ciclone tropical influenciarão a força da onda. Como as chuvas fortes
geralmente precedem os ciclones tropicais, os níveis dos rios podem subir, potencialmente agravando o
nível total da água. As ondas de tempestade podem chegar a 4m e inundar áreas costeiras e interiores
mais baixas com água salgada do oceano. Além de seu impacto destrutivo na infraestrutura e número
potencialmente alto de fatalidades, a inundação de água salgada pode contaminar fontes de água
superficiais e subterrâneas. A limpeza e desinfecção de fontes de água de superfície e poços pode levar
muito tempo, dependendo do perfil da paisagem/superfície.

Infraestrutura de saneamento danificada, falta de água potável e disponibilidade limitada de itens


básicos de higiene podem causar problemas de saúde, especialmente entre mulheres e crianças.

3) ACAPS, “Folha de Resumo de Desastres, Inundações”, Anexo I. Disponível em inglês: <https://www.acaps.org/disaster-summary-sheet-floods>.


4) National Hurricane Center e Central Pacific Hurricane Center, “Visão geral da onda de tempestade”. Disponível em inglês: <https://www.nhc.noaa.
gov/surge/> .

186
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

Seção 8.2 Diferentes tipos de desastres e seus efeitos na saúde

Terremotos

O número de vítimas que requerem tratamento de saúde extensivo logo após um terremoto pode
ser alto, e lesões graves são frequentes. Estas geralmente incluem um alto nível de fraturas, feridas de
trauma contuso e “síndrome do esmagamento”. Os Institutos Nacionais de Saúde dos EUA definem a
síndrome do esmagamento da seguinte maneira:

“Também chamada
de rabdomiólise,
[síndrome do
esmagamento]
envolve uma série
de alterações
metabólicas
produzidas devido
a uma lesão
dos músculos
esqueléticos de tal
gravidade que causa
uma interrupção
da integridade
Equipes de busca e resgate brasileiras e chinesas trabalham nos escombros da sede da
celular e liberação
missão das Nações Unidas em Porto Príncipe, Haiti, desmoronada por um poderoso e
de seu conteúdo na mortal terremoto. 16 de julho de 2010. Foto da ONU por Logan Abassi.
circulação5”.

O esmagamento do tecido muscular produz diferentes substâncias tóxicas que podem levar
a problemas renais e insuficiência renal após algum tempo. Se as vítimas presas com membros
bloqueados forem libertadas dos escombros sem tratamento prévio (ou seja, tratamento intravenoso
antes do resgate), as substâncias intracelulares tóxicas acumuladas podem ser liberadas no ambiente
extracelular causando insuficiência renal, que pode ser fatal. A síndrome do esmagamento é a causa
mais comum de morte em sobreviventes de terremotos6. Se possível e disponível, a hemodiálise (um
procedimento que filtra resíduos, sais e fluidos do sangue quando os rins não são mais capazes de
cumprir essa função) após a extração é o tratamento mais frequentemente aplicado para a síndrome
do esmagamento. Infelizmente, esses tratamentos nem sempre estão disponíveis. A disponibilidade de
fluido intravenoso pode ser outro problema, dependendo do número de vítimas extraídas.

Vítimas presas que têm a chance de mover seus membros e acessar a água têm a melhor chance de
sobrevivência se encontradas a tempo. Nos casos em que as equipes da USAR não podem remover as
vítimas devido a membros esmagados ou porque estão bloqueados por detritos, a amputação do membro
pode ser a única opção restante. Esta é uma intervenção arriscada e deve ser uma opção de último recurso.

5) Coronel S. Rajagopalan, “Lesões por esmagamento e a síndrome do esmagamento”, Medical Journal Armed Forces India, vol. 66, nº 4, outubro de
2010. Disponível em inglês: <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4919827/> .
6) Mehmet Sukru Sever e Raymond Vanholder, “Gestão de vítimas da síndrome de esmagamento após desastres”, Rambam Maimondies Medical Journal,
vol. 2, Edição 2, abril de 2011. Disponível em inglês: <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3678930/>.

187
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

Os terremotos são caracterizados por um alto número de pessoas feridas. Muitas vezes faltam
instalações médicas para tratar as vítimas, pois a maioria delas não é projetada para emergências
de grande escala. As estruturas de saúde restantes podem ficar superlotadas rapidamente. A própria
equipe médica pode ser vítima, limitando ainda mais sua capacidade. A rápida implantação de EMTs
é tão importante quanto a implantação de equipes qualificadas/certificadas de USAR. As seções
subsequentes descreverão brevemente ambos os componentes. A prevenção e o controle de doenças
transmissíveis estão entre as prioridades de saúde. Além disso, os problemas psicossociais não devem
ser subestimados, pois também podem afetar a situação de saúde da população.

Inundações

Durante as inundações, a maioria dos problemas de saúde decorrem do abastecimento de água,


saneamento ou questões de higiene, e a ausência de água potável é a principal razão dos problemas de
saúde e higiene encontrados pela população afetada. Uma quantidade suficiente de água potável será
essencial na resposta a uma inundação.

Dois tipos de doenças são comuns após desastres: as transmitidas pela água e as transmitidas por
vetores. As doenças transmitidas pela água incluem cólera, febre tifoide, doenças diarreicas, hepatite
e gastroenterite – todas elas frequentemente se originam da água contaminada. Doenças causadas
por vetores são transmitidas por organismos vivos (geralmente insetos sugadores de sangue) para
outros organismos vivos, incluindo humanos7. As áreas alagadas muitas vezes apresentam condições
favoráveis para a sobrevivência ou reprodução de certos vetores (por exemplo, mosquitos, que podem
transmitir malária, dengue, etc.) e organismos patogênicos8.

Quando as inundações causam grandes movimentos/deslocamentos populacionais seguidos por


assentamentos transitórios superlotados, o risco de surtos de doenças transmissíveis, como sarampo
e meningite, aumenta. Dormir em pisos frios e molhados pode levar a infecções respiratórias agudas
(IRA). Outras doenças não epidêmicas transmitidas pela água podem se espalhar pelo contato direto
com a água poluída e levar a infecções, dermatites e outras doenças de pele.

Infelizmente, as inundações também podem deslocar alguns animais, especialmente répteis. Cobras
(e às vezes crocodilos) podem aparecer após inundações em áreas que não são seus habitats normais.
Durante as inundações, as cobras tendem a se esconder em terrenos mais altos, que podem incluir casas
e árvores. As picadas de cobra estão entre as lesões comumente observadas durante as inundações.
Se não forem tratadas, algumas mordidas podem causar ferimentos graves ou até mesmo a morte. A
Médicos Sem Fronteiras (MSF) informa que cerca de 125.000 pessoas morrem anualmente de picadas
de cobra, e cerca de 400.000 sofrem de invalidez ou desfiguração. A maioria dessas vítimas não têm
acesso a tratamento médico adequado, e as crianças que vivem em áreas rurais estão especialmente
em risco9.

7) Organização Mundial da Saúde, “Doenças transmitidas por vetores”. Disponível em inglês: <http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs387/en/> .
8) “Um organismo patogênico é um organismo capaz de causar doenças em seu hospedeiro. Um patógeno humano é capaz de causar doenças em
humanos (por exemplo, Salmonella).” Veja: Global Food Safety Resource, “Organismos Patogênicos”. Disponível de: <http://globalfoodsafetyresource.
com/pathogenic-organisms/> .
9) Médicos Sem Fronteiras, “Picada de cobra: uma emergência de saúde pública negligenciada”, junho de 2016. Disponível em inglês: <https://www.
doctorswithoutborders.org/what-we-do/news-stories/news/snakebite-neglected-public-health-emergency> .

188
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

Ciclones tropicais

As lesões físicas são a principal causa de morte e a principal causa de morbidade após os ciclones
tropicais10. Lacerações (ou seja, feridas rasgadas ou irregulares) ocorrem principalmente durante a
fase de limpeza. Traumas contusos e perfurações são outras lesões comuns e geralmente causadas por
detritos voadores e espalhados pelo vento ou casas em colapso. Doenças transmitidas pela água e por
vetores também podem aparecer na sequência de ciclones tropicais.

Seção 8.3 Abastecimento de Água e Higiene (WASH)


Garantir o acesso à água está entre as principais prioridades de resposta a muitos desastres. O
acesso à água potável segura trará consequências para a saúde logo após qualquer desastre. Nos
casos em que as fontes de água foram contaminadas ou destruídas, as autoridades precisam identificar
fontes alternativas seguras rapidamente. Em alguns casos, partes do sistema de abastecimento de água
existente podem estar intactas e seguras para distribuição e consumo. Em muitos casos, no entanto,
os socorristas precisarão trazer sistemas de purificação para produzir a quantidade necessária de água
potável. Produzir água é um problema, mas distribuí-la é outro desafio. Se não houver acompanhamento
do sistema de distribuição, a produção será interrompida depois que o último tanque de armazenamento
de água estiver cheio. As autoridades devem planejar como distribuir a água para a população afetada,
incluindo o estabelecimento de um ponto de distribuição, e fornecer às pessoas os meios para transportar
água do ponto de distribuição até suas casas11. Este ponto pode ser fixo ou móvel (por exemplo, por
meio de caminhões pipa), ou pode ser uma combinação de ambos. No local de produção de água,
deverão ser instaladas torneiras para que a
população local adquira o seu abastecimento
de água potável. Como a produção geralmente
é maior do que o consumo, caminhões-pipa ou
outros métodos seguros de transporte de água
podem ser usados para distribuição móvel.

Os agentes humanitários devem estar


cientes de que a proximidade de um ponto de
distribuição de água de uma residência pode
afetar o consumo. Quanto maior a proximidade,
maior a probabilidade de uma pessoa
afetada consumir água potável. Os pontos de
distribuição devem ser seguros, uma vez que
Uma visão de uma campanha de descontaminação em andamento
as mulheres e as meninas são muitas vezes as
de locais públicos no distrito de Bamako em resposta ao surto de
encarregadas de coletar água. Os respondentes COVID-19 no Mali. A campanha é uma operação conjunta entre
devem trabalhar em prol da igualdade de acesso a Missão de Estabilização Integrada Multidimensional das Nações
Unidas no Mali (MINUSMA) e a Direção Geral de Saúde e Proteção
e distribuição, independentemente de gênero,
Civil no Grand Marché de Bamako e arredores. 4 de abril de 2020.
etnia e status de afetado ou anfitrião12. Foto da ONU por Harandane Dicko.

10) ACAPS, “Folha de Resumo de Desastres, Inundações”, Anexo I.


11) De acordo com O Manual da Esfera, cada domicílio deve ter dois recipientes coletores de água limpa de 10 a 20 litros: um para armazenamento e
outro para transporte.
12) O Projeto Esfera, O Manual da Esfera. Disponível de: <https://spherestandards.org/wp-content/uploads/Sphere-Handbook-2018-BRPortuguese.
pdf>. Os alunos devem verificar os Padrões Esfera em relação às necessidades básicas de água para sobrevivência, bem como o número máximo de
pessoas por fonte de água.

189
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

Desinfetantes apropriados, como cloro, e amostragem diária de água, podem garantir a qualidade da
água. A amostragem no ponto de distribuição é necessária, pois pode ocorrer recontam inação durante
a coleta, armazenamento e extração. Infelizmente, o cloro pode dar à água um sabor desagradável, que
pode desestimular o consumo da população afetada. As organizações produtoras de água potável devem
observar se a população utiliza a água produzida. Os respondentes devem antecipar a necessidade de
uma promoção de higiene adequada se houver o risco de as pessoas preferirem beber água insegura. As
autoridades devem desenvolver um plano de segurança hídrica de acordo com os padrões internacionais
(OMS, UNICEF) e incluir todas as etapas necessárias para garantir a produção e distribuição apropriadas
(ou seja, da fonte ao consumidor13).

A promoção da higiene é uma atividade-chave de saúde que os planejadores devem buscar


por meio da mobilização da comunidade. Deve envolver as comunidades locais para garantir sua
aceitabilidade entre a população afetada, pois algumas questões podem ser socialmente, culturalmente
ou religiosamente sensíveis. O Projeto Sphere afirma que a promoção da higiene “inclui o fornecimento
de materiais e instalações essenciais14”.

Sempre que possível, os agentes humanitários devem buscar a aprovação da população afetada
antes de distribuir os itens. Mal-entendidos podem facilmente levar à rejeição. As autoridades devem
desenvolver um plano para a distribuição de kits de higiene. A comunidade afetada deve fornecer
informações sobre instalações adequadas de lavagem e banho para garantir a segurança. As mulheres
devem ser consultadas, especialmente se for necessário integrar as instalações.

Seção 8.4 Descarte de Excrementos e Resíduos (WASH)


Os desastres muitas vezes danificam ou destroem esgotos, latrinas e instalações semelhantes.
Esta é a causa da maior parte da poluição da água e das doenças relacionadas com os excrementos.
Após uma inundação, a defecação pode se tornar um problema significativo se as autoridades não
tomarem medidas diretas. A marcação das zonas de latrina apropriadas na fase inicial é o primeiro
passo para evitar a contaminação potencial das fontes de água. Latrinas e fossas de imersão (ou
seja, fossas que permitem a liberação gradual de líquido no solo) não devem estar perto de nenhuma
fonte de água subterrânea (a uma distância mínima de 30m) e acima do lençol freático (1,5m) para
evitar a contaminação da água15. As zonas de latrinas podem ser um problema em acampamentos
não planejados ou outros tipos de assentamentos transitórios quando não há um plano adequado de
gestão de eliminação de excrementos. Ao desenvolver tal plano, as autoridades devem envolver todos
os grupos da população afetada, que precisa entender por que esse plano é vital. Os promotores de
higiene podem incentivar o descarte seguro de excrementos e o uso de banheiros, o que pode ser
incomum na cultura local. A disposição final do lodo também deve fazer parte do plano geral.

A construção de banheiros deve levar em conta o tipo de desastre e quaisquer especificidades


culturais (ou seja, design). As autoridades não devem esquecer as questões de segurança, pois as
latrinas podem ser instaladas longe dos abrigos. Se eles estiverem muito longe do local do abrigo e
não forem protegidos por guardas e luzes suficientes, a população afetada pode não usá-los. Mulheres

13) UNICEF e Global Water Partnership, “WASH Desenvolvimento Resiliente ao Clima”, 2014. Disponível em inglês: <https://www.gwp.org/globalassets/global/
about-gwp/publications/unicef-gwp/gwp_unicef_strategic_framework_web_artwork.pdf>. Os alunos devem verificar os Padrões da Esfera em relação às
quantidades mínimas de água para instituições e outros usos.
14) Os alunos devem verificar os Padrões da Esfera em relação ao número de promotores de higiene/mobilizadores comunitários.
15) O Projeto Esfera, O Manual da Esfera: Carta humanitária e padrões mínimos em resposta humanitária, 4ª ed. (Genebra: Sphere Association, 2018),
padrão de gerenciamento de excretas 3.1, 115.

190
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

e meninas podem se tornar vítimas de estupro ou outros tipos de agressão sexual em latrinas não
seguras. Os banheiros também devem ser acessíveis a outros grupos da população afetada, como
idosos ou pessoas com mobilidade limitada. As autoridades também devem desenvolver planos para o
descarte especial de materiais de higiene menstrual das mulheres. A água para se limpar depois de usar
os banheiros também deve estar disponível. Qualquer água residual deve ser coletada de forma a evitar
a contaminação e minimizar a proliferação de moscas e mosquitos.

Sempre que possível, os socorristas devem dar prioridade à construção de banheiros familiares
em vez de banheiros públicos. Os banheiros familiares têm a vantagem de fazer com que as pessoas
se sintam responsáveis por sua conservação e manutenção, e limpá-los passará a fazer parte das
tarefas domésticas. A meta geral deve ser um banheiro para cada 20 pessoas16. No início da resposta
a um desastre, esse número pode chegar a um banheiro para cada 50 pessoas. Os planos de abrigos
temporários devem incluir espaço suficiente para construir banheiros familiares.

As crianças pequenas têm necessidades específicas nessa área. As infecções relacionadas aos
excrementos tendem a ser maiores entre elas, e a lavagem das mãos após a limpeza de uma criança,
bem como a eliminação segura das fezes dos bebês, continuam sendo essenciais17.

O descarte de resíduos sólidos é outro problema relacionado à potencial contaminação da fonte de água.
Os desastres criam uma grande quantidade de resíduos e as autoridades podem ficar sobrecarregadas
com a quantidade de detritos a serem removidos. O manuseio e descarte de resíduos sólidos orgânicos
e perigosos podem representar riscos à saúde pública. Isso pode facilmente tornar um local uma área de
reprodução de vetores de doenças ou poluir as águas superficiais e subterrâneas. Os agentes humanitários
não devem esquecer que o lixo pode representar uma fonte de renda para certos grupos que ganham a vida
coletando materiais e objetos recicláveis de lixões. Tais atividades correm o risco de disseminar doenças
infecciosas, e depósitos de lixo seguros devem ser organizados, caso ainda não existam. Os locais precisam
ser cercados para evitar acidentes. Apenas os trabalhadores da eliminação de resíduos que tenham algum
conhecimento sobre a eliminação de resíduos devem ter acesso aos locais. Os trabalhadores devem ter
equipamentos mecânicos suficientes e adequados para garantir o manuseio seguro de qualquer resíduo.

O lixo hospitalar deve receber atenção especial, pois requer tratamento específico e contém
quantidades significativas de materiais contaminados (por exemplo, agulhas usadas, curativos, panos
manchados de sangue, etc.). Sempre que possível, os socorristas devem usar caixas de segurança, bem
como enterrar o material no local ou realizar a incineração de resíduos. Se os resíduos forem enterrados
no local, devem ser cobertos por uma camada de terra para evitar a presença de roedores e moscas.

A população local deve aceitar qualquer plano de gestão de resíduos para que ele seja bem-sucedido.
Muitos planos desenvolvidos antes dos desastres falham porque as autoridades não conseguem
organizar a coleta de lixo e resíduos em horários aceitáveis. Isso muitas vezes força a população local
a usar lixões alternativos, bloqueando os canais de drenagem e causando inundações durante chuvas
fortes e águas superficiais estagnadas e poluídas. No rescaldo de um desastre, as autoridades devem
convencer a população local da necessidade de aplicar um plano de gestão de resíduos para evitar
problemas de saúde. As organizações devem pressionar as autoridades a estabelecer tal plano e devem
ajudar a mobilizar recursos técnicos suficientes para coletar lixo e detritos.

16) O Projeto Esfera, O Manual da Esfera, Excreta management standard 3.2, 120.
17) O Projeto Esfera, O Manual da Esfera, Excreta management standard 3.2, 120.

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LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

Em alguns conflitos armados (por exemplo, na Bósnia-Herzegovina), os beligerantes usaram o lixo


como arma. Partes em conflito o jogaram em aldeias abandonadas por grupos étnicos minoritários para
desencorajar o retorno dos habitantes originais. As organizações — militares e civis — devem investigar
os locais de despejo usados pelo agente local de eliminação de resíduos, especialmente se for parte de
um acordo assinado.

Seção 8.5 Drenagem e Controle Vetorial (WASH)


Após muitos desastres, os socorristas devem reparar as obras de drenagem para evitar o acúmulo de
águas superficiais que podem espalhar doenças. Isso pode ser problemático em torno dos assentamentos
se não for considerado durante o planejamento do local. Águas residuais, banheiros com vazamentos
e esgotos são fontes potenciais de contaminação. Adicionar água da chuva ou de inundação a águas
pluviais pode agravar e complicar a situação geral. A drenagem adequada em grande escala é essencial,
e as autoridades devem planejá-la desde as primeiras fases da resposta, levando em consideração a
situação geográfica específica do local.

Nos países em desenvolvimento, os humanitários frequentemente encontram áreas de assentamentos


informais onde a drenagem adequada de águas pluviais, águas cinzas e esgotos é problemática. A
construção descontrolada, a densidade de casas e a presença de pequenos becos entre as casas muitas
vezes deixam pouco espaço para um sistema de drenagem. Os agentes humanitários devem ter um
bom conhecimento dos recursos hídricos potenciais para fornecer um sistema de drenagem adequado.
Após desastres naturais, isso pode se tornar problemático e levar a efeitos desastrosos.

Um menino carrega jarros de água em sua bicicleta na cidade de Malakal, no Sudão do Sul. Os moradores utilizam um ponto de água
potável que abastece uma população crescente. Os casos de doença diarreica foram reduzidos na cidade de Malakal devido ao novo
abastecimento de água potável. 21 de outubro de 2019. Foto da ONU por Isaac Billy.

192
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

As autoridades devem garantir que os pontos de água tenham drenagem adequada e eficaz. Sem
isso, eles podem facilmente se transformar em locais lamacentos. Os planejadores devem prestar
atenção especial à erosão e analisar seus efeitos na drenagem. Se necessário, eles podem precisar
adotar um plano de drenagem, especialmente quando a erosão pode afetar banheiros e esgotos,
causar danos estruturais ou potencialmente contaminar uma fonte de água. Sempre que possível, os
humanitários devem evitar misturar águas residuais domésticas com excrementos humanos, pois isso
será classificado como esgoto e dificultará o tratamento18. Se as condições do solo permitirem, as
autoridades devem dar preferência ao descarte de águas residuais no local (por exemplo, poços de
imersão) em vez de canais abertos, que geralmente obstruem e são difíceis de manter.

O controle de vetores de doenças faz parte do esforço para diminuir os riscos à saúde, assim como
todas as questões anteriores relacionadas a WASH. Existem medidas simples e eficazes para prevenir a
propagação de certas doenças, uma vez que os agentes humanitários sabem como a doença e seu vetor
interagem com a população. A tabela abaixo mostra alguns vetores e as doenças que eles carregam19:

Vetor Doença
Mosquitos Malária, febre amarela, dengue, febre hemorrágica
Moscas Transmissão de doenças diarreicas
Moscas que mordem, percevejos, pulgas Tifo murino, sarna, praga
Carrapatos Febre maculosa
Piolhos de humanos Tifo e febre recorrente
Ratos e camundongos Leptospirose, dracunculus (verme da Guiné),
salmonelose; hospedeiros de outros vetores como
pulgas
Pulgas Febre de Lassa, peste e outras infecções

Os agentes humanitários devem avaliar o risco potencial da doença e procurar evidências clínicas
antes de decidir sobre qualquer intervenção. Diferentes fatores podem influenciar certos riscos, como20:

• Doença endêmica (ou seja, existente na área afetada antes do desastre) ou não endêmica;

• Situação de imunização da população;

• Exposição Potencial;

• Estresse nutricional e outros estresses;

• Tipo de patógeno e prevalência (em vetores e humanos); e

• Espécies e números vetoriais.

A resposta a um desastre geralmente requer a presença de especialistas como epidemiologistas.


Para serem eficazes, os agentes humanitários devem garantir que atinjam o vetor correto da doença com
o método certo. Existem diferentes medidas de proteção para ajudar a reduzir o risco de propagação
de doenças. Materiais tratados com inseticida (como mosquiteiros impregnados com inseticida), boa
higiene pessoal e lavagem regular de roupas e lençóis são medidas de proteção eficazes. Embora possam
ser difíceis de realizar em alguns ambientes de desastres, residências limpas, descarte adequado de
resíduos e armazenamento de alimentos são medidas igualmente importantes.

18) O Projeto Esfera, O Manual da Esfera, Padrão de gestão de excrementos 3.3: Acesso e uso de banheiros, Indicadores-chave, 116.
19) O Projeto Esfera, O Manual da Esfera, Ed. 2011, 131.
20) O Projeto Esfera, O Manual da Esfera, Ed. 2011, 122.

193
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

As autoridades devem prestar atenção especial aos possíveis locais de reprodução de vetores. Dados
históricos podem ajudar os agentes humanitários a entender a situação. As autoridades e a população
local podem fornecer dados sobre certos padrões de doenças e locais de reprodução. Os respondentes
podem precisar adotar medidas de controle de vetores químicos para erradicar os vetores identificados.
Sempre que usar controles químicos, os agentes humanitários precisam garantir que a população afetada
esteja ciente dos produtos químicos e dos riscos que eles representam. Os produtos químicos devem
ser usados de acordo com os regulamentos e protocolos internacionais publicados pela OMS. Deve-se
também lembrar que alguns vetores podem se tornar resistentes às medidas de controle químico. Eficácia
e segurança são as duas principais preocupações sempre que produtos químicos são usados.

Seção 8.6 Ações de Saúde em Desastres


O acesso aos cuidados de saúde será essencial após os desastres, pois o impacto na saúde pode
ser direto (como uma lesão) ou indireto (como doenças infecciosas). O objetivo é reduzir a mortalidade
e a morbidade. Os principais indicadores de saúde para esta questão são a taxa bruta de mortalidade
(CMR) e a taxa de mortalidade de menores de cinco anos (do inglês, under-five mortality rate - U5MR21).
A CMR é “a taxa de morte em toda a população, incluindo mulheres e homens, e todas as idades” e é
geralmente determinada pela divisão do número de mortes por 10.000 pessoas por dia (óbitos/10.000
pessoas/dia). U5MR é “a taxa de mortalidade entre crianças abaixo de 5 anos de idade na população22”.

Durante os terremotos, há um alto risco de que as instalações médicas sejam danificadas ou


destruídas. Muito dependerá dos padrões de construção aplicados, do tipo de construção e da magnitude
do tremor. As unidades de saúde podem enfrentar dificuldades para lidar com um grande número de
pessoas feridas. Outros desastres, como inundações repentinas ou tsunamis, provavelmente deixarão
muitos mortos, mas poucos feridos, enquanto os ciclones tropicais podem causar muitas mortes e
muitos feridos, muitas vezes devido a detritos espalhados pelo vento. Muitos fatores podem afetar os
padrões de mortalidade e morbidade. Como as informações nos estágios iniciais de um desastre podem
estar incompletas, as autoridades podem ter que decidir sobre questões importantes de saúde pública
sem dados relevantes disponíveis. Isso pode ser contraproducente nos casos em que as autoridades
realizam ações de emergência, como vacinações em massa, sem indicações médicas justificadas.

A OMS oferece as seguintes definições para importantes tópicos relacionados à saúde23:

• “Saúde: o estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de
doença ou enfermidade”.

• “Serviço de saúde: qualquer serviço (isto é, não limitado a serviços médicos ou clínicos)
destinado a contribuir para a melhoria da saúde ou para o diagnóstico, tratamento e reabilitação
de pessoas doentes”.

• “Sistema de saúde: (i) todas as atividades cuja finalidade principal é promover, restaurar e/
ou manter a saúde; (ii) as pessoas, instituições e recursos, organizados em conjunto de acordo
com as políticas estabelecidas, para melhorar a saúde da população que atendem, respondendo
às expectativas legítimas das pessoas e protegendo-as contra o custo da doença por meio de
uma variedade de atividades cuja intenção primária é melhorar a saúde”.
21) O Projeto Esfera, O Manual da Esfera, Ed. 2011, 292.
22) O Projeto Esfera, O Manual da Esfera, Ed. 2011, 356.
23) OMS, “Glossário de Fortalecimento dos Sistemas de Saúde”. Disponível em inglês: <https://cdn.who.int/media/docs/default-source/documents/
health-systems-strengthening-glossary.pdf> .

194
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

A prestação de serviços de saúde é apenas um dos


muitos esforços de socorro realizados por agentes da área
médica. Em “Classificação e padrões mínimos para equipes
médicas estrangeiras em desastres de início súbito24”, a OMS
definiu um conjunto de regras e regulamentos, processos,
métodos e definições para a resposta médica após um
desastre25. O terremoto de 2010 no Haiti demonstrou
que a resposta médica a um desastre incluiria diferentes
equipes que variam em composição e força – às vezes com
capacidades, métodos e padrões éticos duvidosos. Esse
evento desencadeou a criação de um grupo de trabalho
para definir a responsabilidade pela qualidade dos serviços
médicos durante os desastres com base em um conjunto
de padrões para garantir uma resposta mais previsível,
eficaz e coordenada. Seu objetivo final era fazer com que
os EMTs pré-registrados em nível global atendessem aos
padrões acordados internacionalmente.

As resoluções da Assembleia Geral 46/182 e Uma vista aérea da vasta destruição da costa
48/57 incumbiram as Autoridades Nacionais de Saúde do Sri Lanka entre as cidades de Hambantota e
Trincomalee causada pelo tsunami do Oceano
(geralmente o Ministério da Saúde) e a Autoridade Nacional
Índico. 8 de janeiro de 2005. Foto da ONU por
de Gestão de Emergências (do inglês, National Emergency Evan Schneider.
Management Authority — NEMA) de solicitar assistência
médica estrangeira e registrar, autorizar e monitorar essas equipes. O Grupo de Trabalho do Global
Health Cluster sobre EMTs lançou duas iniciativas complementares: estabelecer critérios de classificação
funcional e padrões mínimos de prestação de serviços para EMTs implantados e desenvolver diretrizes
para registro e monitoramento de EMTs pelas autoridades nacionais26. A ideia de apoiar as autoridades
nacionais nem sempre foi bem-sucedida em emergências anteriores de grande escala, particularmente
o terremoto e tsunami no Oceano Índico em 2004 e o terremoto no Haiti em 2010. Após um desastre,
o governo solicitante deve declarar quais tipos de EMTs e quantos deles são necessários. Embora as
equipes de implantação de paramédicos devam se registrar antes da partida, algumas equipes não
registradas e não anunciadas provavelmente chegarão após um desastre27. Essas equipes devem ser
rastreadas no ponto de entrada, o que exige um sistema de coordenação estabelecido pelas autoridades
nacionais com a assistência da Célula de Coordenação da Equipe Médica de Emergência (EMTCC).
As autoridades podem recusar a entrada de equipes médicas no país se não atenderem aos padrões
internacionais. O procedimento de registro também inclui uma lista de todo o pessoal médico e suas
qualificações. Uma vez aprovada, a equipe receberá um número de identificação oficial, permitindo
que seus membros atuem de acordo com sua capacidade cadastrada (nível 1 a 3). Ao longo de toda a

24) O termo “equipes médicas estrangeiras” foi alterado para “equipe médica de emergência” ou EMT.
25) OMS, “Classificação e padrões mínimos para equipes médicas estrangeiras em desastres de início súbito”, 2013. Disponível em inglês: <http://www.
who.int/hac/global_health_cluster/fmt_guidelines_september2013.pdf>.
26) OMS, “Registro e Monitoramento de Equipes Médicas Estrangeiras Chegando no Rescaldo de Desastres de Início Súbito Primeira versão”, abril de
2013. Disponível em inglês: <http://www.who.int/hac/global_health_cluster/fmt_registering_and_monitoring_april2013.pdf>.
27) O OSOCC (VO) virtual é a plataforma mais adequada para cadastrar equipes e manter uma visão geral. Diretrizes (específicas do país ou não)
provavelmente serão publicadas no VO. Durante a crise do Nepal, o VO declarou claramente quando não era necessário mais suporte médico (EMTs),
solicitando que todas as equipes que ainda não haviam chegado se retirassem.

195
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

missão, os EMTs devem relatar suas atividades de acordo com os regulamentos ou diretrizes nacionais e
internacionais. O objetivo é estabelecer um sistema global de registro de EMTs de acordo com níveis pré-
definidos e capacidades semelhantes ao modelo do Grupo Internacional de Busca e Resgate (INSARAG)
de equipes certificadas da USAR.

Sempre que os humanitários se mobilizam, eles devem garantir que não estabeleçam serviços
alternativos ou paralelos que as autoridades nacionais de saúde não possam sustentar quando os
humanitários deixarem o país. Em vez disso, eles devem reforçar quaisquer instalações médicas ainda
operacionais e operar em apoio a elas. A Sphere identifica as seguintes necessidades essenciais de
saúde (indicadores-chave):

• “Uma unidade básica de saúde/10.000 habitantes (unidades básicas de saúde são unidades
básicas de saúde onde são oferecidos serviços gerais de saúde)”;

• “Um centro de saúde/50.000 pessoas”;

• “Um hospital distrital ou rural/250.000 pessoas)”; e

• “>10 leitos de internação e maternidade/10.000 pessoas28”.

A Sphere também identifica necessidades essenciais de recursos humanos disponíveis, incluindo


médicos, enfermeiros, parteiras e agentes comunitários de saúde29.

Os planejadores devem considerar uma proporção adequada de pessoal médico masculino e


feminino ao se deslocar para áreas culturalmente ou religiosamente sensíveis para garantir o acesso à
população afetada e grupos marginalizados/minoritários.

Suprimentos médicos e medicamentos são componentes essenciais da assistência médica. Com


o tempo, a OMS e outras organizações criaram kits médicos pré-embalados padrões, o Emergency
Health Kit 2006 (IEHK 2006), para uso por organizações de ajuda30. Os kits estão disponíveis em curto
prazo para atender às necessidades prioritárias de saúde. Um kit fornece medicamentos e dispositivos
médicos para 10.000 pessoas por aproximadamente três meses. A OMS também desenvolveu várias
unidades suplementares ao kit, incluindo um kit de malária.

Certos medicamentos podem estar sujeitos a regulamentações específicas ou proibidos em alguns


países. As organizações devem verificar o status desses medicamentos antes de implantá-los. As
organizações médicas geralmente devem registrar todos os medicamentos e outros consumíveis trazidos
e entregues no país junto às autoridades nacionais. Isso também pode ajudar a revelar padrões de
consumo e ajudar a fins de reabastecimento. As organizações devem aceitar doações de medicamentos
somente se as doações seguirem diretrizes reconhecidas internacionalmente31.

Alguns medicamentos, como as vacinas, requerem uma cadeia de frio para garantir sua
preservação. As cadeias de frio são “a manutenção da refrigeração de itens (especialmente vacinas)
desde seu ponto de origem no fabricante até o transporte, descarga, distribuição e armazenamento
refrigerado no local onde serão utilizados32”. Em algumas áreas, isso pode exigir uma logística adaptada
(por exemplo, transporte, geladeiras, geradores elétricos etc.), principalmente no campo.

28) O Projeto Esfera, O Manual da Esfera, 299-300.


29) O Projeto Esfera, O Manual da Esfera, 303.
30) OMS, “The Interagency Emergency Health Kit 2011”, dezembro de 2015. Disponível em inglês: <https://apps.who.int/iris/handle/10665/44663>.
31) O Projeto Esfera, O Manual da Esfera, 305.
32) The Free Dictionary de Farlex, “Cadeia fria”. Disponível em inglês: <http://medical-dictionary.thefreedictionary.com/cold+chain>.

196
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

Muitos desastres causam vítimas em massa e requerem procedimentos de gestão específicos que podem
não estar disponíveis imediatamente. Os socorristas humanitários podem precisar instituir procedimentos
de triagem, incluindo categorizar os pacientes de acordo com a gravidade de seus ferimentos e priorizar o
tratamento. Pacientes com lesões com risco de vida podem não receber prioridade, pois suas chances de
sobrevivência podem ser baixas, retirando recursos daqueles com lesões mais sobreviventes. A realização
de primeiros socorros incluindo o sistema ABC (ou seja, vias aéreas, respiração e circulação) e tratamento
de feridas nas primeiras horas após uma lesão pode prevenir infecção e mortalidade. No entanto, a regra
da “hora de ouro” pode não ser possível seguir na maioria dos desastres33. Pacientes com feridas sujas
devem receber vacinas contra o tétano, se disponíveis.

Seção 8.7 Epidemiologia


e Vacinações
Os desastres muitas vezes têm altas
taxas de morbidade e mortalidade como
consequências diretas ou indiretas. Os
primeiros três dias após um desastre
costumam ver o pico de mortalidade
e lesões. Dependendo do impacto do
desastre nas instalações médicas e
dos tipos de lesões, as chances de
sobrevivência podem ser baixas. As
epidemias pós-desastre também podem
ter impacto nas taxas de mortalidade.
Muitas crises desenvolvem condições
específicas que favorecem o surgimento
de doenças transmissíveis ou infecciosas. Moradores locais de Butembo, uma cidade no norte de Kivu,

A rapidez com que os socorristas detectam recebem vacinas contra o Ebola dentro de um complexo da
Organização Mundial da Saúde. 3 de agosto de 2019. Foto da ONU
esses surtos e tomam medidas geralmente
por Martine Perret.
determinará sua gravidade.

Os dados históricos e de base são importantes para determinar se uma doença é endêmica ou
epidêmica ao cruzar um certo limiar de infecção (ou seja, um nível de ocorrência que, se ultrapassado,
desencadeia a declaração de epidemia).

Epidemiologia é o estudo de “como a doença se espalha e pode ser controlada34”. Ele não apenas
descreve o risco de doença, mas também explora uma associação causal entre certos fatores de risco e
a doença. De acordo com Francesco Checchi, professor de epidemiologia da London School of Hygiene
& Tropical Medicine, uma “declaração epidemiológica sempre se referirá implícita ou explicitamente
a um período específico, grupo de pessoas e local ou contexto35”. As doenças infecciosas podem ter

33) O período de tempo - geralmente cerca de uma hora — após a chegada de uma vítima de trauma a uma unidade de saúde, durante o qual a equipe de
gerenciamento pode ter um impacto positivo no resultado do paciente (ou seja, solicitar exames diagnósticos apropriados e iniciar o tratamento, seja
cirúrgico ou observação contínua). “Golden hour”, o Dicionário Livre de Farlex. Disponível em inglês: <https://medical-dictionary.thefreedictionary.
com/golden+hour> .
34) Merriam-Webster, “Epidemiologia”. Disponível em inglês: <http://www.merriam-webster.com/dictionary/epidemiology>.
35) Francesco Checchi e outros, “Saúde pública em populações afetadas por crises: Um guia prático para tomadores de decisão”, HPN No. 61 (dezembro de
2007). Disponível em inglês: <https://odihpn.org/resources/public-health-in-crisis-affected-populations-a-practical-guide-for-decision-makers/> .

197
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

diferentes meios de transmissão, como gotículas aéreas ou transmissão fecal-oral, transmissão viral,
transmissão bacteriana ou transmissão por parasitas. Os fatores de risco também podem variar e podem
incluir pobreza, condições ambientais desafiadoras, saneamento precário, pertencer a uma faixa etária
vulnerável, predisposição genética, viver em um acampamento, etc. Segundo Checchi, alguns riscos
são responsáveis pela grande maioria das doenças que levam à morbimortalidade, entre eles36:

Fator de risco Resultado


Superlotação Alta densidade populacional aumenta o contato
entre casos infecciosos e pessoas suscetíveis;
vantajosa para vacinação, mas alta cobertura a ser
alcançada pelo menos 45m² de área de superfície
por pessoa (Sphere)
Abrigo inadequado Clima quente: doenças desidratantes (cólera, [etc.])
Clima frio: IRA e outras doenças respiratórias
Ingestão insuficiente de nutrientes Pode levar à desnutrição (ou alimentação infantil
incorreta) e enfraquecer um sistema imunológico
comprometido
Cobertura vacinal insuficiente Aumento do risco de infecção devido à cobertura
vacinal reduzida ou inexistente (recém-nascidos
e crianças, especialmente, precisam de vacinação
contra o sarampo o mais rápido possível)
Infecções fecais-orais levando a doenças
Más condições de água, saneamento e higiene diarreicas, febre tifoide, a maioria dos vermes
intestinais, hepatite, poliomielite
Alta exposição e proliferação de vetores de Quatro propriedades dos vetores influenciam o
doenças controle de doenças:
• Números de vetores por ser humano
• Frequência com que um vetor pica humanos
• Eficiência da transmissão ou aquisição da
infecção durante as mordidas
• Os vetores de tempo permanecem vivos e
infecciosos
Falta ou atraso no tratamento O tratamento oportuno pode diminuir as taxas de
mortalidade e tornar desnecessários tratamentos
específicos

Algumas causas específicas requerem informações adicionais. As doenças diarreicas estão entre
as causas mais imediatas de morte. De acordo com MSF, os pacientes infectados pela cólera podem
perder até 20 litros de fluido corporal devido a vômitos e diarreia, causando desidratação aguda e
potencialmente a morte37. Após cinco dias de incubação, a bactéria produz uma toxina que cria uma
quantidade anormalmente alta de fluido corporal nos intestinos e impede a absorção de líquidos pelo
organismo. O tratamento com sais de reidratação oral (SRO) e fluidos intravenosos são medidas urgentes
para tratar a doença e podem salvar vidas se fornecidos a tempo. A desidratação pode ser fatal em poucas
horas, especialmente se o paciente já estiver fraco. A cólera afeta mais frequentemente as crianças, mas
também pode afetar os adultos. Durante um surto de cólera, os socorristas devem estabelecer centros de
tratamento especiais com precauções de segurança específicas e medidas de higiene completas38.

36) Checchi e outros, “Saúde pública em populações afetadas por crises”.


37) MSF, “Cólera”, novembro de 2016. Francês disponível em: <http://msf-azg.be/fr/theme/chol%C3%A9ra>.
38) Para mais informações (em inglês), visite: <https://medicalguidelines.msf.org/viewport/CHOL/english/6-1-cholera-treatment-centres-ctc-25296944.html>.

198
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

Outra doença que requer atenção específica é a Doença do Vírus Ebola (do inglês, Ebola Virus
Disease – EVD). A África Ocidental experimentou um grave surto de EVD em 2014, e os países afetados
estabeleceram centros de tratamento especial e criaram campanhas informativas para combater a
propagação do vírus e tratar aqueles que foram infectados39. O ebola é um vírus que é transmitido
através do contato direto com sangue, secreções corporais, órgãos e pessoas infectadas. Durante o
surto de 2014, o vírus muitas vezes se espalhou para os membros da família daqueles que sucumbiram
ao Ebola enquanto limpavam os restos mortais de um parente em preparação para um funeral. O
ebola geralmente começa com sintomas semelhantes aos da gripe e é difícil distinguir de doenças mais
comuns. Segundo a OMS, os primeiros sintomas do Ebola:

“... são o início súbito de febre, fadiga, dores musculares, dor de


cabeça e dor de garganta. Seguem-se vómitos, diarreia, erupção
cutânea, sintomas de insuficiência renal e hepática e, em alguns
casos, hemorragias internas e externas (por exemplo, exsudação das
gengivas, sangue nas fezes) ... Pode ser difícil distinguir a EVD de
outras doenças infecciosas, como malária, febre tifoide e meningite. A
confirmação de que os sintomas são causados pela infecção pelo vírus
Ebola precisa de investigações adicionais40”.

Uma doença adicional que requer atenção específica é a doença do coronavírus (COVID-19), que
a Organização Mundial da Saúde declarou como pandemia em 2020. Embora os efeitos da pandemia
tenham sido sentidos em todos os lugares, a UNICEF identificou a doença do coronavírus como
sendo especialmente destrutiva em áreas de conflito, exacerbando a pobreza e a desigualdade e
sobrecarregando os sistemas sociais e de saúde em lugares como RDC, nordeste da Nigéria, Sahel
Central, Sudão do Sul e Iêmen41. Segundo a OMS:

“A maioria das pessoas infectadas com o vírus COVID-19 apresentará


doença respiratória leve a moderada e se recuperará sem precisar
de tratamento especial. Os idosos e aqueles com problemas médicos
subjacentes, como doenças cardiovasculares, diabetes, doenças
respiratórias crônicas e câncer, são mais propensos a desenvolver doenças
graves. A melhor maneira de prevenir e retardar a transmissão é estar
bem-informado sobre o vírus da COVID-19, a doença que ele causa e
como ele se espalha. Proteja a si mesmo e aos outros da infecção lavando
as mãos ou usando álcool gel com frequência e sem tocar no rosto42.”

39) Para mais informações (em inglês), visite: <http://www.msf.org/en/diseases/ebola>.


40) OMS, “Doença do vírus Ebola”, fevereiro de 2021. Disponível em inglês: <http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs103/en/>.
41) UNICEF, “COVID-19 e conflito: uma combinação mortal”, 30 de dezembro de 2020. Disponível em inglês: <https://www.unicef.org/coronavirus/covid-
19-and-conflict-deadly-combination>.
42) OMS, “Coronavírus”. Disponível em inglês: <https://www.who.int/health-topics/coronavirus>.

199
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

Seção 8.8 USAR e INSARAG


Esta seção final descreve brevemente alguns princípios básicos sobre como as equipes da USAR operam43.

Conforme descrito na Lição 4, o USAR integra o Centro de Coordenação e Operação On-Site (OSOCC)
com uma célula de coordenação específica (a Célula de Coordenação USAR [UCC]). Esta célula auxilia as
autoridades locais de gerenciamento de emergências (do inglês, local emergency management authority
— LEMA) com planejamento sistemático e designação de equipes USAR implantadas com base nos dados
populacionais disponíveis e na situação geográfica da área afetada. Se não for feito pelo LEMA, o UCC
irá dividir a área afetada em diferentes setores numerados de acordo com os procedimentos padrão do
INSARAG e atribuir/alocar equipes para cada um dos setores identificados. Se mais de uma equipe USAR
cobrir um setor, uma equipe líder da USAR será o “coordenador do setor”. Isso também reduzirá o alcance
do controle e possibilitará uma coordenação mais suave no nível do UCC. A atribuição de uma equipe a
um setor dependerá da chegada da equipe e de suas capacidades específicas (por exemplo, NBQR). As
equipes numerarão seu local de trabalho após concluir uma avaliação de sua área de responsabilidade.
As equipes realizam atividades de busca primeiro com caninos (ou seja, busca de superfície) e/ou outros
recursos técnicos, como dispositivos de busca acústica ou visual/câmera. Se a equipe encontrar uma vítima
viva, eles iniciarão uma operação de resgate. Isso pode levar horas dependendo dos desafios técnicos,
equipamentos disponíveis, construção e local (acessibilidade). Um número crescente de operações de
resgate usa robôs terrestres e aéreos para ajudar na recuperação de vítimas. Embora tenham grandes
desvantagens (por exemplo, falta de mobilidade por controle remoto devido à perda de sinal, velocidade
limitada, dificuldade em atravessar obstáculos, etc.), em um futuro próximo, os robôs poderão fornecer
suporte técnico importante por meio de uma combinação de sensores de detecção, software e hardware
específico adaptado aos espaços confinados e condições de entulho44.

A tabela a seguir explica brevemente os cinco tipos diferentes de busca e salvamento de avaliação
(do inglês, assessment search and rescue — ASR)45:

Níveis Descrições Definição e Propósito Realizado por


de quem/quando
ASR
1 Avaliação de Levantamento preliminar da área afetada ou designada para LEMA; membros
área ampla fins de: da equipe do
• Determinar o escopo e a magnitude do incidente; OCOCC e UNDAC
em sua chegada;
• Identificar escopo, localização e tipos de danos;
Equipes USAR.
• Estimar as necessidades urgentes de recursos;
• Elaboração de um plano de setorização;
• Estabelecimento de prioridades;
• Identificação de perigos gerais;
• Identificação de problemas de infraestrutura; e
• Identificar potenciais locais de bases de operações.

43) Para mais informações (em inglês), visite: <https://www.insarag.org/methodology/insarag-guidelines/> e o Guia de Campo Operacional.
44) Para mais informações sobre robótica (em inglês), visite: <https://cordis.europa.eu/project/id/285417>.
45) Para mais informações (em inglês), visite: <https://www.insarag.org/methodology/insarag-guidelines/> .

200
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

Geralmente realizada por veículo, helicóptero, embarcação


aquática, a pé ou a partir de relatórios de terceiros (por
exemplo, o LEMA), essa avaliação é uma verificação visual
inicial e rápida da área danificada ou designada. As equipes
que realizam esse nível de avaliação devem permanecer
móveis, não se envolver em operações de resgate e relatar
os resultados o mais rápido possível.
2 Avaliação O objetivo principal é identificar locais específicos e De preferência
de Triagem viáveis de resgate dentro do setor alocado para permitir a feito logo depois
do Local de priorização da atribuição e fazer um plano de ação. da Avaliação
Trabalho • Precisa ser uma avaliação rápida, mas metódica; de Área Ampla
de Nível 1 e
• O objetivo é avaliar todo o setor em tempo hábil;
o mais rápido
• O Formulário de Triagem do Local de Trabalho deve ser possível após o
usado para coletar as informações essenciais nesta fase; estabelecimento
• As informações da população e das equipes de resposta dos setores. Feito
locais são muitas vezes valiosas e devem ser buscadas pelas equipes do
durante a avaliação; LEMA e/ou USAR.
• Os resgates geralmente não são realizados durante este
nível, a menos que surja uma oportunidade inesperada; e
• Se forem encontradas vítimas vivas, a decisão sobre
a permanência da Equipe de Avaliação para iniciar o
resgate ou realizar a avaliação dependerá da situação e
do briefing recebido pela equipe.
Uma Avaliação ASR Nível 2 pode ser repetida mais tarde,
se necessário.
3 Busca e A Busca e Resgate Rápido geralmente se aplica nos Equipe(s) USAR
resgate estágios iniciais de um evento de grande escala, quando designada(s)
rápidos um número relativamente pequeno de equipes está para o respectivo
disponível em comparação com o número de locais que lado; Seleções
exigem busca e resgate. Isso é realizado nos estágios nacionais do
iniciais com um progresso bastante rápido no local de LEMA.
trabalho designado para maximizar as oportunidades de
salvar vidas.
4 Busca e Este é o trabalho de SAR que deve identificar, localizar e Equipe(s) média
resgate resgatar o pequeno número de sobreviventes fortemente e pesada da
completo presos ou enterrados que os socorristas, recursos do USAR.
LEMA ou operações ASR Nível 3 não conseguiram. Envolve
uma busca minuciosa em todos os espaços onde possa
haver sobreviventes envolvendo toda a gama de recursos
USAR, geralmente em um local de trabalho.
5 Busca e Geralmente significa operações realizadas em um local LEMA, às vezes
resgate de de trabalho para recuperar as vítimas falecidas. Uma junto com
cobertura pesquisa completa em todo o local para localizar as equipes da USAR
total vítimas vivas e falecidas. Duas opções de aplicação: após a fase de
remoção completa de camadas de estruturas colapsadas resgate.
ou desobstrução cômodo a cômodo de estruturas não
colapsadas.

201
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

A seleção do local de trabalho dependerá da possibilidade de resgatar sobreviventes. Um


organograma de decisão (conforme indicado nas diretrizes do INSARAG) ajudará a identificar a chance
de encontrar sobreviventes em um local. Alguns fatores incluem:

Fator Definição
Espaço vazio grande Um espaço vazio grande é grande o suficiente para uma pessoa rastejar.
As chances de sobrevivência de uma vítima são maiores em grandes
vazios do que em pequenos vazios. Grande é um termo relativo (ou seja,
um espaço vazio grande para uma criança será menor do que um espaço
vazio grande para um adulto).
Espaço vazio Pequeno Um espaço vazio pequeno fornece pouco espaço para uma pessoa se
mover, e ela deve ficar imóvel enquanto espera por ajuda. Em espaços
vazios pequenos, as chances de lesões são maiores, pois as pessoas
presas no interior têm menos espaço para evitar a queda de objetos e o
colapso de elementos estruturais.
Estável Neste contexto, estável refere-se a uma estrutura colapsada onde não é
necessário (ou não é possível) um escoramento de segurança específico
antes das operações de resgate. A operação se concentra diretamente na
busca e salvamento.
Instável Uma estrutura instável deve ser estabilizada por escoramento ou outras
medidas antes que as operações diretas de busca e resgate possam
começar. Isso atrasará a operação.
Acesso O acesso aos espaços vazios é julgado pelo tempo estimado para chegar às
vítimas ou espaços vazios prioritários. A estimativa é baseada na dificuldade
das operações (ou seja, material de construção, equipamentos utilizados,
tamanho da equipe, quantidade de trabalho necessária para penetrar no
prédio, etc.).

O sistema de marcação durante as atividades do USAR é um sistema comum, acordado


internacionalmente, conforme descrito nas diretrizes do INSARAG. Indica que tipo de busca foi realizada,
por quem e quando, e o que foi encontrado. Em alguns casos, outro tipo (nível superior) de ASR pode
seguir a busca. Em última análise, a autoridade local deve aprovar as descobertas e decidir se considera
o local “limpo”.

Sempre que uma equipe encontra uma vítima viva, ela envia um Formulário de Extricação da
Vítima que detalha todas as informações necessárias. O fluxo de gerenciamento de informações deve
ser mantido durante todas as operações do USAR com o UCC. Ele mostra o que as equipes alcançaram
e também fornece às autoridades/UCC padrões específicos sobre onde encontraram sobreviventes.
Situações espetaculares geralmente não são esperados após desastres. A sobrevivência dependerá de
muitos fatores. As atividades da USAR são demoradas, mas indispensáveis para o bem-estar moral
da população afetada. Entre sete e 10 dias, as operações normalmente terminam, mas apenas as
autoridades nacionais podem tomar essa decisão.

A equipe médica da USAR é parte integrante da equipe da USAR. Ele analisa não apenas o
atendimento de emergência e o bem-estar dos membros da equipe do USAR, mas também os cães de
busca e as vítimas encontradas durante as operações do USAR (se permitido pela autoridade nacional
de saúde). A equipe coordena com o OSOCC/Health Cluster para recuperar:

• A disponibilidade de recursos médicos locais e internacionais;

• Os procedimentos médicos locais existentes em caso de transferência de vítimas, transporte de

202
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

vítimas ou gestão de fatalidades, bem como eliminação de resíduos médicos; e

• Métodos existentes de comunicação regular com as autoridades de saúde locais e sua própria
equipe, como:

» Fornecer informações médicas para o processo de tomada


de decisão/planejamento da equipe USAR;

» Promover práticas seguras de saúde e higiene (Base de


Operações [do inglês, Base of Operations — BoO] e locais
de trabalho) por meio da coordenação com as funções de
segurança, materiais perigosos e logística;

» Fornecer monitoramento contínuo da saúde e cuidados


médicos aos membros da equipe USAR (incluindo cães); e

» Fornecer atendimento médico de emergência às vítimas


presas como parte integrante da função de resgate e para
garantir a remoção segura do paciente.

203
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

Questionário de fim de Lição  »

1. Qual das seguintes afirmações é FALSA? 4. Qual das afirmações é FALSA?


A. Em casos extraordinários, as vítimas podem A. Os promotores de higiene podem incentivar
ser encontradas vivas após vários dias nos a eliminação segura de excrementos e o uso
escombros, mas as pessoas geralmente não de banheiros.
sobrevivem por mais de dois dias nessas B. Mulheres e meninas podem se tornar vítimas
condições. de estupro ou outros tipos de agressão
B. O desmatamento pode aumentar a erosão sexual em latrinas não seguras.
do solo. C. Em geral, a meta deve ser um banheiro para
C. As ondas de tempestade podem chegar a 4 cada 50 pessoas.
m e inundar áreas costeiras mais baixas com D. Apenas aqueles que trabalham na
água doce por uma longa distância. eliminação de resíduos que tenham algum
D. Vazamentos ou destruição no sistema de conhecimento na atividade devem ter acesso
esgoto podem contaminar as fontes de água, aos locais de desastre.
bem como o sistema de abastecimento.
5. Sempre que possível, os humanitários
2. Qual das afirmações é FALSA? devem evitar misturar _____ com
excremento humano, pois isso será
A. Doenças transmitidas por vetores,
classificado como esgoto e dificultará o
como cólera, febre tifoide, doenças tratamento da água.
diarreicas, hepatite e gastroenterite
A. água potável
são frequentemente observadas como
B. águas residuais domésticas
consequências da água contaminada e do
C. água salgada
consumo de água potável insegura.
D. água com gás
B. Síndrome de esmagamento é a causa mais
frequente de mortalidade em sobreviventes 6. Outros desastres, como inundações
de terremotos. repentinas ou tsunamis, provavelmente
C. Quando as inundações causam grande deixarão _____ mortos, mas ____
movimento/deslocamento populacional feridos, enquanto os ciclones tropicais
podem causar _____ mortes e _____
seguido por assentamentos transitórios
feridos, geralmente por detritos
superlotados, o risco de surtos de
espalhados pelo vento.
doenças transmissíveis, como sarampo e
A. muitos, poucos, muitas, muitos
meningite, aumenta.
B. poucos, muitos, muitas, muitos
D. Lesões físicas são a principal causa de morte
C. muitos, muitos, poucas, muitos
e a principal causa de morbidade após
D. muitos, muitos, muitas, poucos
ciclones tropicais.

3. Latrinas e fossas de imersão não devem 7. As cadeias de frio são a manutenção


estar perto de nenhuma fonte de água de _____ de itens (especialmente
subterrânea (a uma distância mínima vacinas) desde seu ponto de origem
de _____) e acima do lençol freático no fabricante até seu transporte,
(_____) para evitar a contaminação da descarga, distribuição e armazenamento
água. refrigerado no local onde serão usados.
A. preservação
A. 10 m, 1 m
B. elevação
B. 20 m, 1 m
C. refrigeração
C. 30 m, 1,5 m
D. qualidade
D. >50 m; >5 m

As respostas estão disponíveis na página seguinte.

204
LIÇÃO 8 | Impacto de Desastres, WASH e o Setor de Saúde

Questionário de fim de Lição  »

8. Uma declaração epidemiológica sempre 10. As atividades de USAR são demoradas,


se referirá implícita ou explicitamente a mas são indispensáveis para o bem-estar
um período específico, _____, lugar ou moral da população afetada. Entre sete
contexto. e 10 dias, as operações normalmente
terminam, mas apenas _____ pode
A. mulheres e meninas
tomar essa decisão.
B. crianças
A. o líder da equipe UNDAC
C. grupo minoritário
B. o UCC
D. grupo de pessoas
C. o HC/RC
9. _____ está(ão) entre as causas mais D. autoridades nacionais
imediatas de morte.
A. A insuficiência renal aguda
B. As doenças diarreicas
C. A hepatite
D. As doenças causadas por vermes intestinais

Respostas »
1. C

2. A

3. C

4. C

5. B

6. A

7. C

8. D

9. B

10.D

205
OPERAÇÕES HUMANITÁRIAS

LIÇÃO
Logística, Alimentação e
9 Nutrição

Esta lição final discute os


efeitos dos desastres na
alimentação e nutrição, com
base nos outros setores
desenvolvidos nas Lições 7 e 8.

Foto da ONU por Ari Gaitanis.

Nesta lição » Objetivos da lição »

Seção 9.1 Diferentes tipos de desastres e • Descrever os diferentes efeitos dos desastres e
seus efeitos na alimentação e suas consequências na alimentação e nutrição.
nutrição
• Explicar as definições relacionadas à segurança
Seção 9.2 Segurança Alimentar - alimentar e como medi-la.
Definições
• Recuperar informações relacionadas à alimentação
Seção 9.3 Medindo a Segurança Alimentar e nutrição no Sphere Handbook.
e Planejamento
• Explicar o diagrama da cadeia humanitária

Seção 9.4 Transferências de Dinheiro e de suprimentos.

Voucher e Emprego • Explicar o que são Log Cluster, LRT e UNHAS.

Seção 9.5 Logística de Desastres

Seção 9.6 WFP, Cluster de Log e LRT

Seção 9.7 UNHAS

INSTITUTO DE TREINAMENTO EM OPERAÇÕES DE PAZ

206
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

Como parte da Resposta de Emergência ao Ebola na RDC, o Programa Mundial de Alimentos ajuda a conter a doença, fornecendo
alimentos para sobreviventes e pessoas que possam ser portadoras do vírus. Pacotes de alimentos entregues semanalmente pelo PMA
e seus parceiros permitem que os portadores do vírus fiquem em casa enquanto são tratados sem a necessidade de sair para comprar
comida. 14 de agosto de 2019. Foto da ONU por Martine Perret.

Introdução

A logística é um aspecto fundamental — mas


muitas vezes esquecido — de todas as ações de socorro
e deve fazer parte de um processo de planejamento
detalhado. Ter os recursos financeiros necessários é
uma coisa, mas organizar a logística e a distribuição
final da ajuda à população afetada é o que permite
Veja um vídeo de introdução desta
que essas operações funcionem. Uma razão pela qual
lição em inglês: <https://www.
alimentos, nutrição e logística são colocados em um peaceopstraining.org/videos/499/

só grupo é o status do PMA de Agência Líder Global de hro-lesson-9-logistics-food-and-


nutrition/>.
Grupos para Alimentos e Logística. Como os desastres
afetam a alimentação e a nutrição, influenciarão
também significativamente uma crise em andamento.

207
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

Seção 9.1 Diferentes Tipos de Desastres e Seus Efeitos na


Alimentação e Nutrição

Terremotos

Lições anteriores descreveram os efeitos que os terremotos podem causar em uma população, bem
como fatores agravantes. Dependendo de sua magnitude, um terremoto pode danificar gravemente
a infraestrutura existente (por exemplo, de estradas, pontes, ferrovias etc.) e causar interrupções no
fornecimento ou distribuição de alimentos e itens não alimentares. A forma como isso afeta a população
depende de vários fatores. Um terremoto afetará diretamente a maioria das populações urbanas,
particularmente as mais pobres. O armazenamento de alimentos é limitado em um ambiente urbano.
Em muitos casos, as pessoas nessas condições compram e preparam alimentos diariamente com o
dinheiro disponível. Os pobres geralmente têm pouca ou nenhuma capacidade de armazenar alimentos
por períodos mais longos. A destruição de infraestrutura e equipamentos não apenas aumenta a
interrupção da produção de alimentos, mas também afeta diretamente a sua distribuição, levando à
escassez imediata. Os mercados não recebem novos suprimentos por um determinado período, o que
diminui a disponibilidade de alimentos, e o transporte de alimentos pode se tornar problemático devido à
infraestrutura danificada. Além disso, o preço dos alimentos básicos pode aumentar. Esse aumento pode
ocorrer devido a vários motivos, como a incapacidade dos agricultores de entregar alimentos básicos no
mercado, perda ou lesão de membros da família e da força de trabalho e menos possibilidades de colher
e coletar alimentos.

Inundações

Como as inundações geralmente afetam uma área geográfica mais ampla do que outros tipos de
desastres, seus efeitos sobre a alimentação e a nutrição podem ser maiores. As inundações podem
danificar ou destruir colheitas e gado, sementes e ferramentas. As inundações podem afetar a produção
e distribuição de alimentos de forma semelhante aos terremotos, criando escassez de alimentos e
aumentando os preços dos alimentos básicos. Mesmo quando a água recua, pode levar muito tempo
até que a terra esteja apta para a produção agrícola devido à presença de água salgada, lama, resíduos
etc. Os agentes humanitários não devem subestimar os efeitos que a perda de gado pode ter nas
populações afetadas. Em muitos países em desenvolvimento, o gado é uma espécie de seguro de vida,
atuando como uma reserva em tempos difíceis que pode ser vendida para garantir alguma renda para
comprar necessidades. A perda de gado pode ser uma perda econômica significativa que pode afetar a
independência de uma família ou as chances de sobrevivência.

Ciclones tropicais

Muitos dos efeitos causados pelas inundações são aplicáveis aos ciclones tropicais1. Ventos fortes
podem destruir plantações inteiras, como bananas e cocos. A água que inunda as terras agrícolas
também pode destruir colheitas ou estoques de sementes, levando à escassez de alimentos. Essa
destruição pode diminuir a demanda por mão de obra durante a época de colheita, privando agricultores
e trabalhadores sazonais de renda. Nas áreas costeiras, os ciclones podem afetar a pesca, danificando
ou destruindo os barcos de pesca. Isso resulta em uma perda de renda e produção de alimentos.
1) ACAPS, “Folha de Resumo de Desastres, Ciclones Tropicais”. Disponível em inglês: <https://www.acaps.org/disaster-summary-sheet-tropical-cyclones> .

208
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

A Seção de Desarmamento,
Desmobilização e Reintegração
da Missão Multidimensional
Integrada de Estabilização das
Nações Unidas no Mali contribuiu
para o fortalecimento da
segurança alimentar na vila de
Tarabangou. O apoio tem sido
dado pela MINUSMA na forma
de financiamento para financiar
uma cooperativa de agricultores e
para a reabilitação e paisagismo
de uma área de 30 hectares,
fornecendo frutas e legumes
para os moradores. 13 de março
de 2017. Foto da ONU por
Harandane Dicko.

Seção 9.2 Segurança Alimentar — Definições


Antes de examinar outros aspectos da alimentação e nutrição, vários termos precisam ser
esclarecidos. Lembre-se, a Declaração Universal dos Direitos do Homem garante o direito à alimentação.

O que significa a expressão “segurança alimentar”? Daniel Maxwell, que lidera o programa de
pesquisa sobre segurança alimentar e meios de subsistência em emergências complexas no Centro
Internacional Feinstein da Universidade Tufts, argumenta que segurança alimentar significa que
“todos têm acesso físico e econômico a alimentos seguros e nutritivos suficientes para atender às suas
necessidades dietéticas. Necessidades e preferências alimentares para uma vida ativa e saudável2”. As
pessoas às vezes usam “fome” para indicar insegurança alimentar. Maxwell define a fome como uma
“sensação desconfortável ou dolorosa causada pela falta de comida3”. De acordo com Sphere, nutrição
é um termo amplo que se refere a “processos envolvidos na alimentação, digestão e utilização de
alimentos pelo corpo para crescimento e desenvolvimento, reprodução, atividade física e manutenção
da saúde”. A desnutrição deve ser pensada em termos de uma nutrição inferior ao desejável. A
desnutrição pode ter causas complexas (por exemplo, doença, ingestão inadequada de alimentos,
pobreza, situação de WASH precária etc.). A inanição é “uma questão de algumas pessoas não terem
comida suficiente, e não uma questão de não haver comida suficiente4”. É contra a Convenção de
Genebra matar civis de fome como método de guerra e atacar, destruir, remover ou inutilizar alimentos,
áreas agrícolas para a produção de alimentos, colheitas, gado, instalações e suprimentos de água
potável e obras de irrigação. A insegurança alimentar não pode limitar-se apenas aos problemas de
abastecimento.

A fome é um resultado influenciado pelo acesso aos alimentos, incluindo produção, comércio e
transferências. Conforme descrito por Maxwell, a fome é difícil de definir exatamente, mas muitas

2) Daniel Maxwell e outros, “Intervenções de segurança alimentar de emergência”, HPN Good Practice Review, No. 10, dezembro de 2008. Veja
também: Daniel Maxwell e outros, “Intervenções de segurança alimentar de emergência”, junho de 2011. Disponível em inglês: <https://odihpn.org/
publication/emergency-food-security-interventions/>.
3) Maxwell et al, “Intervenções de segurança alimentar de emergência”.
4) Maxwell et al, “Intervenções de segurança alimentar de emergência”.

209
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

vezes é um processo (político) que pode ser manipulado deliberadamente, especialmente em tempos
de conflito armado. Paul Howe e Stephen Devereux, do Instituto de Estudos de Desenvolvimento
da Universidade de Sussex, definem a fome “em termos de gravidade e magnitude de uma crise,
baseando-se fortemente em medidas de desnutrição e mortalidade5”. Vulnerabilidade é o nível de
exposição a um perigo (por exemplo, seca) e a capacidade de lidar com ele, que na maioria dos casos
é difícil de medir.

Também devemos distinguir entre insegurança alimentar “crônica” e “transitória”. Segundo Maxwell,
“a insegurança alimentar crônica tende a estar associada a deficiências ou vulnerabilidades estruturais,
enquanto a insegurança alimentar transitória é geralmente resultado de choques e flutuações temporárias6”.
A insegurança alimentar sazonal ou cíclica é outro aspecto temporal da insegurança alimentar, mas pode
ser prevista através de padrões cíclicos conhecidos de acesso inadequado aos alimentos.

Seção 9.3 Medindo a Segurança Alimentar e o Planejamento


Os três pilares da segurança alimentar são disponibilidade, acesso e utilização. O acesso aos
alimentos é um indicador especialmente bom para uso durante crises. De acordo com Maxwell, existem
quatro principais determinantes da segurança alimentar7:

• “Suficiência — acesso a uma quantidade suficiente de alimentos para atender às necessidades


energéticas”;

• “Diversidade — acesso a diferentes tipos de alimentos para atender às necessidades básicas de


nutrientes”;

• “Dimensão psicológica relacionada à privação, escolha restrita ou ansiedade em relação à


comida”; e

• “Aceitabilidade social e cultural dos padrões de consumo.”

Fome
Famine “Political”
Processo process
“político”

Falhas de disponibilidade Falhas de acesso a


Failures of food availability Failures of access to food Falha deofresponsabilidade
Failures e response
accountability and resposta
de alimentos alimentos

Vulnerabilidade
Vulnerability
Fome famine
“Old” “velha” Fome famine
“New” “nova”

• Produção
Production

Availability
Disponibilidade • Food prices
Preços dos alimentos
 Trade, food stock
• Comércio, estoque de alimentos

 Purchasing power
• Poder de compra
Segurança
Food  Capacity to
Access Produção
Production Troca
Trade Transferências
Transfers
Acesso • Capacidade de
Security
alimentar
produce
produzir

 Ability to use food


• Capacidade de usar os
they have
alimentos que se tem
Utilization
Utilização
 Biological ability to
• Capacidade biológica de digerir
digest

5) Stephen Devereux e Paul Howe, “Escalas de Intensidade e Magnitude da Fome: Uma Proposta para uma Definição Instrumental de Fome”, Disasters,
vol. 28, nº 4, janeiro de 2005.
6) Maxwell et al, “Intervenções de segurança alimentar de emergência”.
7) Maxwell et al, “Intervenções de segurança alimentar de emergência”.

210
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

Outro método para os agentes humanitários determinarem o acesso é fazer perguntas simples como “o
que as pessoas farão se não tiverem comida suficiente ou dinheiro suficiente para comprar comida?” Essas
ações (conhecidas como comportamentos de enfrentamento) são medidas por frequência e gravidade por
meio do Coping Strategies Index (CSI). Os comportamentos de enfrentamento podem incluir8:

• Alteração da ingestão alimentar (por exemplo, substituição de alimentos, busca de opções de


alimentos mais baratos);

• Aumentar a quantidade de alimentos disponíveis (por exemplo, pedir emprestado, comprar a


crédito etc.);

• Reduzir o número de pessoas para alimentar (por exemplo, enviar crianças para outras pessoas,
migração de curto prazo); e

• Racionamento de alimentos ou gerenciamento de déficit (por exemplo, corte de refeições etc.).

Outro método para medir a segurança alimentar é examinar o estado nutricional da população
afetada em áreas com indicadores bem conhecidos. Existem cinco medidas antropométricas do estado
nutricional, das quais três são relevantes em situações de emergência:

» Peso por altura: este é um bom indicador de problemas de


curto prazo de fome ou epidemias;

» Peso para idade: raramente é usado porque é difícil de


interpretar (dados de idade podem ser difíceis de adquirir); e

» Circunferência do braço médio (do inglês, mid-upper


arm circumference — MUAC): tecnicamente para todas as
idades, esta é uma estimativa rápida de perda de peso em uma
população, mas deve ser específica para a idade quando usada.

Outra medida potencial é o índice de massa corporal (IMC). Ele é usado para todas as idades para
determinar perdas ou ganhos de peso a curto prazo e é aplicado principalmente a adultos. Para que
os agentes humanitários façam julgamentos sólidos sobre a situação de segurança alimentar em uma
determinada área, eles devem usar indicadores diferentes, pois um indicador não fornecerá dados
suficientes para alocar alimentos de forma imparcial. A ferramenta de Classificação Integrada de Fase
(CIF) é uma tabela de referência de vários indicadores, incluindo CMR, desnutrição aguda, nanismo,
acesso/disponibilidade de alimentos, diversidade alimentar, doenças, acesso/disponibilidade de água,
perigos etc., para ajudar a alcançar isso9.

Determinar a resposta adequada a uma crise de segurança alimentar ainda é um problema. Os


atores humanitários podem identificar rapidamente os objetivos de uma resposta rápida, mas discordar
sobre os meios para alcançá-los. Christopher Barrett, Professor de Economia Aplicada e Gestão da
Universidade de Cornell, e Daniel Maxwell sugerem que a análise seja feita primeiro fazendo perguntas
específicas sobre mercados e disponibilidade de alimentos antes de tomar qualquer ação. A importação
rápida de alimentos devido a dados incompletos ou ausentes pode destruir ou desregulamentar

8) Maxwell et al, “Intervenções de segurança alimentar de emergência”.


9) Ver: Organização para Alimentação e Agricultura, Manual Técnico de Classificação Integrada da Fase de Segurança Alimentar Versão 1.1, Roma,
2008, Apêndice 1. Disponível em inglês: <http://www.fao.org/docrep/010/i0275e/i0275e.pdf>.

211
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

completamente o mercado local e o tecido econômico de uma área afetada. Quando os mercados locais
estão funcionando, Barrett e Maxwell sugerem dar às pessoas dinheiro para comprar os alimentos de
que precisam no mercado local ou fornecer empregos aos destinatários-alvo em vez de ajuda alimentar.
Se não houver alimentos disponíveis nas proximidades para cobrir a escassez de alimentos, os agentes
humanitários podem fornecer ajuda alimentar com base em compras locais por meio de transações
triangulares para apoiar a economia local. A ajuda alimentar por meio de remessas transoceânicas deve
ser usada apenas como último recurso na resposta a crises de segurança alimentar10.

A resposta humanitária a uma crise de segurança alimentar deve estar alinhada com o princípio
“não causar danos” e causar o menor dano possível aos meios de subsistência das pessoas. Conforme
discutido na Lição 6, uma resposta apropriada é baseada na familiaridade com os dados e condições de
linha de base (a situação pré-desastre), na compreensão da dinâmica da situação de mercado existente
e na análise do impacto potencial da intervenção humanitária11.

Snapshot: Guerra Civil na Síria »


A Guerra Civil na Síria eclodiu em 2011. No início
de 2012, havia se espalhado para a província
de Aleppo. Aleppo - a maior cidade da Síria -
desde então se dividiu entre uma seção ocidental
controlada pelo regime e uma seção oriental
controlada pela oposição. Mais de 40% das famílias
em Aleppo sofreram com o consumo inadequado
de alimentos, que está muito acima da taxa média
de 28% para áreas acessíveis no país. O acesso
© CICV, Teun Anthony Voeten. Aleppo: Habitantes limpam
das famílias a alimentos, água, remédios e outros
os escombros depois que um foguete caiu em um prédio de
suprimentos básicos foi extremamente limitado na apartamentos e causou grandes danos. 20 de abril de 2013.
parte leste da cidade após julho de 2016, quando
todas as rotas de acesso humanitário foram cortadas. As forças da oposição deixaram a cidade
após negociações em dezembro de 2016, mas o cerco em curso da cidade e a interrupção da
cadeia de suprimentos colocaram uma enorme pressão sobre as famílias. Os preços dos alimentos
dispararam e o preço de uma cesta diária de alimentos custava 71% mais em Aleppo do que
em Damasco. A maioria dos alimentos não estava disponível ou estava disponível apenas em
quantidades limitadas no mercado negro. A maioria das famílias consumia em média uma ou duas
refeições por dia. A diversidade alimentar melhorou gradualmente para a maioria das famílias,
apesar do número limitado de refeições por dia, mas permaneceu baixa para os moradores mais
pobres, que não tinham acesso a remessas.i

i) PAM, “Síria, Boletim mVAM 7: setembro de 2016”, setembro de 2016. Disponível em inglês: <https://reliefweb.int/report/syrian-arab-republic/syria-mvam-bulletin-7-september-
2016-eastern-aleppo-city-distress>.

10) Cristóvão B. Barret e Daniel Maxwell, Ajuda alimentar após cinquenta anos: reformulando seu papel (Londres: Routledge, 2005).
11) O Anexo L (resultado pretendido e aplicações) e o Anexo M (vantagens e desvantagens) contêm uma visão geral das intervenções potenciais. Os
alunos devem comparar as duas tabelas.

212
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

É importante que o programa de resposta se concentre


naqueles que mais precisam de alimentos. Isso significa
que os agentes humanitários devem garantir que não
excluam grupos de pessoas que não veem. As famílias
anfitriãs podem ter que compartilhar as poucas provisões
de alimentos que têm com outros membros da família ou
amigos deslocados, e em breve poderão ficar sem comida.
A identificação de todos os beneficiários, incluindo grupos
minoritários (por exemplo, doentes, cuidadores, idosos,
famílias únicas etc.), continua a ser importante. Os agentes
Militares da Jamaica ajudam a construir unidades de
humanitários também devem incluir maneiras de evitar
armazenamento do Programa Mundial de Alimentos
que as pessoas se tornem dependentes da distribuição de no porto de Marsh Harbour depois que o furacão

alimentos. Sempre que a situação permitir, devem procurar Dorian, de categoria cinco, varreu as ilhas Bahama
de Abaco e Grand Bahama em 1º de setembro de
métodos alternativos de assistência. Alguns grupos (por
2019. 12 de setembro de 2019. Foto da ONU por
exemplo, crianças, mulheres grávidas ou lactantes) podem OCHA/Mark Garten.

necessitar de alimentação suplementar além da distribuição


normal de alimentos. As necessidades nutricionais para as pessoas podem variar e dependerão do que
estiver disponível. Se os trabalhadores humanitários souberem quais outros alimentos estão disponíveis,
podem projetar um sistema de entrega de alimentos para compensar as necessidades nutricionais ausentes,
preenchendo as lacunas de nutrientes. Por outro lado, se os trabalhadores humanitários não souberem quais
alimentos estão disponíveis, eles projetarão uma cesta de alimentos para fornecer um conteúdo equilibrado
de nutrientes. A dificuldade será distinguir entre diferentes grupos com diferentes requisitos. Deve-se
estar ciente de que o uso dessas diferentes escalas de ração pode causar tensões entre as comunidades
vizinhas. Sempre que organizar a distribuição de alimentos, deve-se garantir a preservação da dignidade
dos destinatários e contribuir para a segurança alimentar.

Os agentes humanitários devem coordenar com a população afetada a adequação e aceitabilidade


dos alimentos sempre que possível. Os trabalhadores de ajuda alimentar devem determinar se o seu
plano de entrega de alimentos é aceitável e consistente com as tradições religiosas e culturais da
área. Existem tabus alimentares para mulheres grávidas ou lactantes? Os trabalhadores humanitários
também precisam examinar condimentos culturalmente importantes e alimentos essenciais como
parte dos hábitos alimentares diários normais da população afetada (por exemplo, temperos, chá,
etc.). O tipo de alimento entregue na resposta deve levar em consideração a capacidade da população
afetada de preparar e armazenar alimentos. O desastre pode ter afetado as instalações de cozinha, e
os humanitários precisam garantir que as pessoas possam preparar suas refeições. As necessidades
de água e a avaliação de combustível ajudarão a determinar se a ajuda alimentar é apropriada. Os
humanitários podem ter que procurar outros tipos de alimentos para reduzir o tempo de cozimento e
o combustível necessário. O leite, por exemplo, tem requisitos específicos quando entregue em uma
resposta humanitária12.

A ajuda alimentar deve ser adequada ao consumo humano de acordo com os padrões do Codex
Alimentarius relativos à qualidade, embalagem, rotulagem e “adequação à finalidade” (por exemplo,
os alimentos podem ser adequados ao consumo humano, mas não adequados à finalidade devido ao
12) Os alunos podem examinar os Sphere Standards (2018) e obter informações sobre “Alimentação de bebês e crianças pequenas em emergências”
(IYCF-E), 185-192.

213
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

formato da embalagem13). A embalagem de alimentos deve permitir a distribuição direta sem medição
ou reembalagem adicionais. Os rótulos não devem conter mensagens com motivação política ou
religiosa. Os rótulos dos alimentos embalados devem estar em um idioma apropriado, indicando a data
de produção, origem, data de validade e detalhes do teor de nutrientes14. O controle de qualidade deve
ocorrer por amostragem. Os trabalhadores humanitários devem solicitar certificados fitossanitários (por
exemplo, sanitários sobre pragas e patógenos de plantas) e outros documentos de inspeção quando
os alimentos são comprados ou importados. Os trabalhadores humanitários devem prestar atenção
especial às condições de armazenamento dos alimentos.

A distribuição de alimentos está entre as operações mais desafiadoras para os humanitários e, se


não for adequada, pode levar a possíveis problemas de segurança tanto para os distribuidores quanto
para os destinatários. Uma boa comunicação/informação entre agências e destinatários é essencial.
Assim que possível, os respondentes devem registrar novamente as famílias, prestando atenção especial
aos grupos vulneráveis, pois podem ter dificuldades para se registrar. Na fase inicial de uma resposta
a desastres, no entanto, o registro pode não ser possível. A segmentação é outra parte importante da
preparação de uma distribuição. As autoridades devem atribuir a tarefa de selecionar os agentes-alvo
com base em sua imparcialidade, capacidade e responsabilidade. A equipe local (especialmente as
mulheres) deve ser usada tanto quanto possível, porque é a mais provável de entender a situação atual.

Os trabalhadores humanitários devem distribuir rações secas, que podem ser conservadas e
transportadas, como tipo de alimento sempre que possível. As rações úmidas (por exemplo, refeições
cozidas ou alimentos prontos para consumo) podem ser distribuídas durante a fase inicial de emergência
quando as pessoas estão em movimento ou quando o transporte de alimentos seria muito perigoso do
ponto de vista da segurança.

Os destinatários podem variar de um portador de cartão de racionamento individual ou familiar a


um representante ou líder tradicional, embora os trabalhadores humanitários devam prestar atenção
a possíveis abusos por parte dos líderes. A situação no terreno determinará qual método/destinatário
será a melhor opção para distribuição. Os humanitários devem ter em mente que isso pode mudar
com o tempo.

A frequência de distribuição deve ser guiada pelo que um receptor pode levar para casa em relação
ao peso e volume. Também pode ser a consequência de considerações ambientais. As autoridades
devem escolher cuidadosamente os pontos de distribuição (do inglês, Distribution Point ‑ DP). Eles
devem estar seguros e evitar cruzar postos militares ou armados. De acordo com a Sphere, a distância
a pé dos DPs para alimentos secos não deve ser superior a um dia (e apenas durante o dia). As
autoridades também precisam considerar os principais fatores de segurança ao selecionar um local. A
supervisão e distribuição só devem ser feitas por pessoal treinado.

Os humanitários devem garantir que suas ações (principalmente entrega de alimentos) não irão
alimentar ou agravar o conflito. A comida é um item valioso, e é sempre possível que seja desviado
pelos combatentes. As pessoas que recebem alimentos podem ser forçadas a pagar um imposto sobre
isso ou ter que compartilhar sua ração com militares, Estados ou atores não estatais para compensação.

13) Programa Alimentar Mundial e Organização para Agricultura e Alimentação (FAO), Codex Alimentarius, 3ª ed. (Roma, 2006).
14) Os alunos devem ter em mente que as datas de validade se referem à segurança alimentar, enquanto as datas “melhor para consumo até” se referem
à qualidade dos alimentos.

214
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

Snapshot: Haiti »
A distribuição de alimentos tornou-se uma questão
urgente no Haiti depois de três furacões – Gustav,
Hanna e Ike – que atingiram o país com cerca de
uma semana de intervalo um do outro em 2008.
Com a ajuda do batalhão argentino da MINUSTAH,
o PMA identificou diferentes pontos de distribuição
dentro de Gonaives e coletou dados sobre o número
de domicílios/pessoas que vivem nas áreas afetadas Membros do batalhão argentino da Missão de Estabilização
das Nações Unidas no Haiti oferecem segurança enquanto
e ao redor. A localização dos pontos de distribuição
trabalhadores descarregam água e alimentos doados
foi discutida com os militares argentinos, pois eles pelo Programa Mundial de Alimentos para assistência
prestariam serviços de escolta e segurança no local. humanitária às vítimas da tempestade tropical Hanna. 8 de
setembro de 2008. Foto da ONU por Logan Abassi.
As autoridades identificaram uma rota adequada
das instalações de armazenamento para os pontos de distribuição com pouca ou nenhuma chance
de os caminhões ficarem bloqueados ou presos. As autoridades também escolheram os locais
de distribuição com base em sua capacidade de permitir o descarregamento e a distribuição de
ajuda com total segurança. Um pequeno incidente teria sido suficiente para arruinar o esforço de
distribuição controlada, especialmente quando as pessoas precisavam desesperadamente de comida
e água. No entanto, os líderes comunitários locais foram consultados para ajudar a organizar a
distribuição e planejar a distribuição interna e o controle de multidões.ii

ii) René Wagemans, líder da equipe do UNDAC, durante a crise do furacão em Gonaives, Memórias Pessoais.

Seção 9.4 Transferências de Dinheiro e Voucher e Emprego


Os agentes humanitários devem primeiro examinar quais outras soluções para crises de segurança
alimentar existem dependendo do mercado local e dos mecanismos de enfrentamento da população local.
Além da assistência em espécie, podem fornecer subsídios em dinheiro a indivíduos e famílias. O dinheiro
tem a vantagem de que os destinatários podem usá-lo para outras necessidades além da alimentação, o
que dá flexibilidade à população afetada. Isso pode ter um impacto positivo na economia local.

Os agentes humanitários devem estar cientes do fato de que o dinheiro também pode apresentar
alguns riscos e pode contribuir para a inflação ou ser usado para fins como abuso de álcool ou tabaco15.

As transferências de dinheiro podem ocorrer em todas as fases de um desastre. De acordo com


Maxwell, as doações em dinheiro devem ocorrer em um contexto pacífico, com mercados e sistemas
bancários fortes e onde há pouca insegurança e corrupção. Os subsídios em dinheiro dependerão dos
objetivos de um programa e podem variar de programa para programa. Eles podem ser condicionais
ou incondicionais para atender a uma série de necessidades, o que pode dar aos destinatários um
maior senso de dignidade. Aumentar o poder de compra das famílias também é um passo importante
para melhorar as atividades econômicas locais. O monitoramento e a avaliação das transferências de
dinheiro feitas pelas agências devem distinguir entre processo e desenho, e contexto e impacto16. As
agências implementadoras devem monitorar os seguintes pontos:
15) Programa Alimentar Mundial, Manual de Dinheiro e Vouchers, 2ª ed. (Roma: Programa Alimentar Mundial, 2014), 27.
16) Ver: Maxwell e outros, “Intervenções de segurança alimentar de emergência”.

215
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

• Como os destinatários usam dinheiro;

• Onde as pessoas compram seus principais bens e quão acessíveis são os mercados;

• O impacto do dinheiro nos preços;

• Se as pessoas recebem a quantia certa de dinheiro e onde podem gastá-lo com segurança; e

• Qual é a combinação apropriada de assistência em dinheiro e em espécie.

A seção de Redução da
Violência Comunitária da
MINUSTAH empregou
1.345 moradores locais
em um programa de
trabalho em dinheiro nos
subúrbios montanhosos
de Porto Príncipe,
construindo paredes
de pedra e plantando
vegetação como formas
de salvar terras aráveis
e evitar inundações em
áreas mais baixas. 3 de
maio de 2012. Foto da
ONU por Logan Abassi.

Os vouchers são outra opção para programas de ajuda e podem dar aos beneficiários acesso
a uma gama específica e predefinida de bens ou serviços (os chamados vouchers baseados em
mercadoria ou valor). Os vouchers dão às agências mais controle sobre o que os destinatários podem
comprar, o que pode diminuir o medo de uso inadequado. Os vouchers são usados quando o dinheiro é
inviável ou inadequado. No entanto, como dinheiro, vouchers também apresentam alguns problemas de
organização (por exemplo, impressão de vouchers, localização de comerciantes que aceitam vouchers,
localização/configuração de sistemas de distribuição de vouchers, etc.). Os vouchers têm uma vantagem
na identificação do que os beneficiários compram, pois os comerciantes identificados podem informar
às agências se os vouchers atendem às necessidades reais dos beneficiários. Os humanitários devem
estar cientes de que a distribuição de vouchers pode levar a uma concorrência insalubre entre os
fornecedores. Os vouchers exigem regulamentação e planejamento, mas podem ser estigmatizantes.

Dinheiro por trabalho (vulgo “emprego”) é geralmente o sistema mais usado de intervenções
em dinheiro durante emergências. Os destinatários realizam atividades específicas que exigem trabalho
físico em troca de dinheiro. O objetivo principal é essencialmente o mesmo das transferências em dinheiro
e vouchers: permitir que as pessoas façam suas próprias escolhas de compra de necessidades para se
recuperar de uma emergência. A atividade laboral solicitada deve ser “uma parte necessária e significativa
da resposta de emergência17”. Os humanitários devem garantir que os programas não perturbem os
meios normais de renda por meio de atividades tradicionais (por exemplo, pessoas que trabalham para
agricultores como força de trabalho sazonal durante o período de colheita), especialmente se os salários

17) Maxwell et al, “Intervenções de segurança alimentar de emergência”.

216
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

forem mais altos do que para essas atividades tradicionais. Isso poderia facilmente resultar em escassez
de alimentos porque as colheitas poderiam não ser colhidas devido à falta de trabalhadores sazonais. O
princípio “não causar danos” se aplica, e as autoridades devem fazer uma análise aprofundada da situação
local. A consulta de calendários de safras para a região/país afetado também pode ser útil.

De acordo com a Sphere, os programas devem evitar a “comida por trabalho” como pagamento para
operações logísticas, como descarga de caminhões, mão de obra em armazéns ou trabalho em pontos de
distribuição. Se os pagamentos de alimentos devem ser usados (por exemplo, devido à falta de dinheiro),
esses valores de alimentos precisam ser integrados ao valor originalmente planejado para distribuição.

Sri Lanka
Sri Lanka
Calendário de colheitas
Crop Calendar (*alimento principal)
(*major foodcrop)

Milho e Arroz*
Maize and Rice*
(Segunda Yala)
(Second Yala)

Milho
Maize (Main Yala)
(Principal Yala)

Arroz
Rice (Main Maha)
(Principal Maha)

J F M A M J J A S O N D
Lean period
Período magro

Growing
Crescendo

Sowing
Semeando

Harvesting
Colhendo

Seção 9.5 Logística de Desastres


O que é logística? Não existe uma verdadeira definição acordada. O Manual de Campo da UNDAC
inclui uma definição usada por Anisya Thomas e Mitsuko Mizushima, cofundadora e diretora de
logística, respectivamente, do Fritz Institute, que definiram logística como “o processo de planejar,
implementar e controlar o fluxo eficiente e econômico e armazenamento de bens e materiais, bem
como informações relacionadas, desde o ponto de origem até o ponto de consumo com o objetivo de
atender às necessidades do beneficiário final18”.

De acordo com o Guia Operacional de Logística (LOG), “uma visão bastante aceita no setor humanitário
é: Logística = Suprimento + Gestão de Materiais + Distribuição19”. A logística é frequentemente
confundida com “gestão da cadeia de suprimentos”, e os humanitários devem entender a diferença entre
18) Anisya Thomas e Mitsuko Mizushima, “Treinamento em logística: necessidade ou luxo?” FMR Nº 22. Disponível em inglês: <https://www.fmreview.
org/education-emergencies/thomas-mizushima> .
19) O LOG foi desenvolvido por representantes de uma ampla gama de organizações humanitárias e fornece uma coleção de informações como melhores
práticas, modelos, diretrizes e procedimentos operacionais padrão para os logísticos que operam no campo. Para obter mais informações, consulte:
WFP Logistics Cluster, Guia Operacional de Logística (LOG).

217
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

elas. A logística é uma atividade do processo de ponta a ponta do gerenciamento da cadeia de suprimentos.
O gerenciamento da cadeia de suprimentos envolve o gerenciamento de materiais, informações e fluxos
financeiros em uma rede composta por fornecedores, fabricantes, distribuidores e clientes20.

Embora as cadeias de suprimentos humanitárias sejam essencialmente as mesmas que as


comerciais, existem algumas diferenças significativas — principalmente devido à natureza imprevisível
de um desastre:

• “demanda imprevisível em termos de tempo, localização geográfica, tipo de mercadoria,


quantidade de mercadoria;

• lead time curto e demanda repentina por grandes quantidades de uma ampla variedade de
produtos e serviços;

• altos riscos humanitários em relação aos prazos em face de uma mídia global sofisticada e a
alta atenção antecipada dos doadores;

• falta de recursos iniciais em termos de oferta, tecnologia, capacidade e financiamento.”

Avaliação and
Assessment e
Planejamento
Planning

Monitoramento
Monitoring and
Compras
Procurement
eEvaluation
avaliação

Distribuições
Distribution Cadeia de Suprimentos
Humanitarian Supply Chain
Armazémand
Warehouse e
Estoque
Inventory
Humanitários

Alfândega
Customs Transporte
Transport

Gestão
Fleet de
Cadeia fria
Cold Chain
Frotas
Management

A avaliação é essencial para entender o impacto de um desastre no meio ambiente e na população


e como os serviços logísticos devem operar. Segundo a LOG, “a avaliação logística de emergência é o
processo de coleta, análise e divulgação de dados e informações relacionadas à logística em relação ao
impacto de um desastre21”. Os dados e informações relacionados à logística podem incluir:

• Números e cifras referentes à população afetada;

• Planos de distribuição;

• Onde acessar os materiais necessários; energia elétrica, instalações hidrelétricas e infraestrutura


de água/esgoto; aviação civil, aeroportos, aeronaves alternativas, portos marítimos e ferrovias;
e armazenagem;

• Acessibilidade de estradas e pontes e pontos de transferência e passagens de fronteira terrestre;

20) Cluster de Logística do PMA, Guia Operacional de Logística (LOG).


21) Cluster de Logística do PMA, Guia Operacional de Logística (LOG).

218
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

• Capacidade de transporte local;

• Comunicações; e

• Capacidade de coordenação.

A logística não deve ser considerada como uma atividade independente. Os humanitários devem
integrar totalmente o planejamento logístico ao processo geral de planejamento para garantir a
prestação de serviços de qualidade que contribuam para intervenções bem coordenadas, eficazes e
eficientes. O envolvimento ativo de gerentes de programa, parceiros, fornecedores, transportadores e
equipe de logística em todos os níveis é vital para bons resultados. Fatores a serem considerados no
desenvolvimento de um bom plano de logística incluem22:

• Disponibilidade de recursos financeiros • Doadores, outros.


• Disponibilidade da equipe • Pessoal: horários para recrutamento
local; considerações de RH; e
• Treinamento: cronograma para indução e
qualquer treinamento especializado.
• Ferramentas de gerenciamento de • Todas as informações necessárias para
informações planejar, gerenciar e relatar; e
• Planos de contingência existentes,
resultados de Avaliações Rápidas,
Avaliações de Capacidade Logística.

• Infraestrutura externa disponível • Parceiros, agências.


• Estoques e movimentos • Cronograma de movimentação para
atender aos requisitos do programa;
• Pré-posicionamento das necessidades de
estoques materiais e operacionais;
• Planeamento de armazém: tabela
com localização das instalações de
armazenamento, capacidades, produção
planeada, níveis de stock planeados; e
• Instalações e gestão de armazéns.

• Informações de transporte disponíveis • Operações portuárias, incluindo


em equipamentos/operações de
movimentação;
• Operações aeroportuárias, incluindo
equipamentos/operações de manuseio;
• Tabela mostrando rotas, modos,
tempo de viagem, capacidade, taxa
de transferência planejada, notas (por
exemplo, ações para reduzir gargalos e
melhorar a eficiência);
• Transporte rodoviário: utilização e gestão
de frotas comerciais e governamentais e
outras frotas de socorro;
• Transporte de água; e
• Combustível e manutenção para unidades
de transporte.

22) Cluster de Logística do PMA, Guia Operacional de Logística (LOG).

219
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

• Distribuição, monitoramento e avaliação • Plano e recursos para implantação da


distribuição;
• Plano e recursos para implementação
do monitoramento do desempenho da
cadeia de suprimentos; e
• Plano e recursos para avaliação da cadeia
de suprimentos.
• Acordos de segurança
• Saída estratégica • O planejamento da estratégia de
saída deve começar desde o início do
programa/projeto.

A aquisição é uma parte essencial da logística. A LOG define como “o processo de identificação e
obtenção de bens e serviços. Inclui sourcing, compra e abrange todas as atividades desde a identificação
de potenciais fornecedores até a entrega do fornecedor aos usuários ou beneficiários23”. O Procurement
atende a três níveis de usuários24.

Existem três princípios importantes de aquisição de logística humanitária a serem respeitados:

• Transparência — todas as fases do processo de aquisição são documentadas de forma justa


e precisa (isso contribuirá para relações comerciais sólidas e confiáveis com os fornecedores).

• Prestação de contas — prestação de contas aos doadores que podem exigir que certas regras
(diretrizes dos doadores) sejam seguidas ao usar o dinheiro que forneceram25.

• Eficiência e custo-benefício — atender aos seis direitos de fornecimento: preço, tempo


certo, quantidade certa, serviços de qualidade, entrega nos locais necessários e da fonte mais
econômica (terá impacto direto nas operações).

O fornecimento é o próximo passo. É um processo de trabalho intensivo envolvendo cotações


e licitações quando o mercado aberto é usado. Segue-se a avaliação de propostas e adjudicação de
contratos a fornecedores. Depois disso, o próximo passo é fazer pedidos de bens ou serviços com o
fornecedor ou estabelecer contratos para fornecedores. Após o processamento dos pedidos, entrega e
pagamento finalize o processo de sourcing26.

Identificação de necessidades
Needs Identification

Desastre
Disaster Necessidade de Especificar
Specify
Avaliação
Assessment Needs identification Plano
Plan
identificação

Supplier management Origem das necessidades,


Needs Source, concessão
awarding, and placing orders e
Gestão de fornecedores
pedidos
Review and Fazer a Evaluate and
Rever Expedite
Agilizar a delivery
entrega Place order Avaliar e premiar Source
Fonte
acte agir encomenda awarding

23) Cluster de Logística do PMA, Guia Operacional de Logística (LOG).


24) Cluster de Logística do PMA, Guia Operacional de Logística (LOG).
25) Diretrizes da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID): Requisitos de Administração de Regulamentos de Subsídios;
Orientações ECHO: convenção de subvenção, condições gerais das convenções de subvenção, orientações para a convenção, acordo-quadro de
parceria; LOG Anexo 1: guia de formulário único, formulário único para ação de ajuda humanitária, fichas técnicas, diretrizes financeiras, regras e
procedimentos aplicáveis no âmbito; LOG Anexo 4, Novo Regulamento Consolidado de Ajuda Humanitária.
26) LOG O Anexo O apresenta uma visão geral.

220
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

A gestão do transporte em emergências/desastres é uma tarefa complexa que depende da natureza


do desastre e deve ser feita por especialistas. Em muitos casos, envolve múltiplas partes interessadas
e combina transporte internacional e nacional por meio de diferentes meios de transporte (rodoviário,
ferroviário, aéreo e marítimo). Para movimentos internacionais, os humanitários geralmente precisam
contar com prestadores de serviços comuns, como:

• Transitários27;

• Agentes de compensação; e

• Serviços de inspeção.

O LOG lista alguns critérios para seleção de prestadores de serviços, que também demonstram a
complexidade das movimentações:

• “Licenciado pelo governo para realizar as formalidades de desembaraço aduaneiro e atualizado sobre
mudanças nos requisitos alfandegários;

• Oferecer uma ampla variedade de serviços para limitar a necessidade de múltiplas empresas (por
exemplo, frete marítimo e aéreo, reembalagem de materiais danificados etc.);

• Possuir ou ter acesso a um armazém alfandegado para proteger e controlar as remessas em trânsito;

• Possuir frota de caminhões para transporte terrestre e ter acesso a veículos especializados quando
necessário, como caminhões porta-contêineres, carretas rebaixadas, caminhões-tanque etc.;

• Ter pessoal treinado, competente, experiente e confiável;

• Ter um registro comprovado de confiabilidade, precisão e pontualidade, conforme verificado por


referências de outros grupos que usaram seus serviços;

• São flexíveis na sua disponibilidade a curto prazo, também fora do horário de expediente e nos
feriados;

• Ter uma reputação estabelecida e estar no mercado há vários anos;

• Ter influência no mercado de transporte, junto às autoridades portuárias etc.;

• Têm experiência em lidar com sucesso com acordos de isenção de impostos para organizações
humanitárias;

• Ter um escritório na zona portuária ou nas proximidades;

• Ter experiência na verificação de mercadorias que chegam ao porto: operações de descarga,


armazenamento e carregamento, verificação de pesos e inspeção de embalagens de embarque
quanto a danos visíveis;

• Ter experiência na contratação de porteiros e estivadores para movimentação de cargas;

• Ter pelo menos uma rede regional de âmbito nacional – e de preferência multinacional; e

• Use a tecnologia de forma eficaz, incluindo um bom sistema de telecomunicações e, preferencialmente,


um sistema de rastreamento informatizado que permita a visibilidade de onde as remessas estão em
um determinado momento28.”

27) “Um transitário pode prestar serviços tanto nos aeroportos de partida como nos de chegada, mas em caso de emergência, estes serviços não estão
necessariamente disponíveis nos aeroportos de chegada (aeroportos de entrada).”
28) Cluster de Logística do PMA, Guia Operacional de Logística (LOG).

221
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

Outras partes relacionadas envolvidas em movimentos incluem:

• Oficiais da Alfândega;

• Autoridades portuárias;

• Despachantes aduaneiros; e

• Estivadores.

Os programas devem usar intermediários


como transitários ou despachantes para lidar
com movimentos internacionais. Movimentos
internacionais requerem uma compreensão básica
das funções de outros provedores de serviços
terceirizados envolvidos. Alguns desses terceiros
podem ser empresas privadas ou organizações
estatais29.

Todas as importações ou exportações de


mercadorias estão sujeitas a regulamentos
alfandegários. Informar as agências de socorro
e todas as outras organizações e atores sobre
os regulamentos alfandegários é essencial para
Trabalhadores do Programa Alimentar Mundial carregam
acelerar a chegada de mercadorias de socorro.
alimentos a serem distribuídos à cidade de Fond Verrettes,
O OSOCC Virtual é o primeiro passo para fazer às vítimas das inundações que devastaram o sudeste do

isso. Durante as respostas de emergência, as Haiti. 2 de junho de 2004. Foto da ONU por Evan Schneider.

organizações humanitárias às vezes estão em


vantagem, pois a ONU deve fazer acordos apropriados com os governos para facilitar o acesso rápido aos
suprimentos de emergência. O Log Cluster tentará aproveitar essas vantagens. Alguns dos problemas
encontrados durante as operações de socorro podem incluir30:

• Procedimentos alfandegários complicados que causam atrasos e congestionamentos em um


porto de entrada, afetam o tempo de retorno de navios alimentadores e vagões ferroviários e
afetam o fluxo de mercadorias;

• Requisitos administrativos complexos e pouco transparentes, muitas vezes relativos à


documentação; e

• Altos custos para o processamento de informações comerciais.

Em todo o mundo, as administrações aduaneiras aplicam essencialmente os mesmos procedimentos e


processos. A velocidade de liberação depende em grande parte de quais controles são necessários e do grau
em que a tecnologia da informação e comunicação se aplica31. A compreensão completa de todas as diretrizes
e requisitos alfandegários ajudará os logísticos a facilitar a importação e exportação de mercadorias. Existe
um equívoco comum de que os bens/materiais isentos estão isentos de formalidades alfandegárias.

29) Uma matriz de comparação para diferentes modos de transporte mostrando diferentes critérios está disponível no LOG Anexo P.
30) Cluster de Logística do PMA, Guia Operacional de Logística (LOG).
31) Cluster de Logística do PMA, Guia Operacional de Logística (LOG).

222
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

“A decisão de isentar as mercadorias importadas para um


território para fins humanitários, do pagamento de direitos e
outros impostos, é de inteira responsabilidade das autoridades
do país. Se um item ou mercadoria específica doada pode ser
importada para um país sem qualquer pagamento de impostos
depende da decisão do governo local sobre:

» política nacional de importação de ajuda humanitária;

» bens qualificados sob essa política; e

» atores com status de isenção de impostos.

É essencial que os doadores e as organizações decisórias na


origem estejam cientes da implicação dos impostos nos custos
operacionais32”.

“O departamento de alfândega, ministério relevante ou


Ministério das Finanças pode não qualificar todas as entidades
como ‘de interesse público’ ou ‘caridade’ e conceder o privilégio
de isenção de impostos. As organizações humanitárias que
lidam com contrapartes locais devem certificar-se de que a
contraparte local que recebe as mercadorias:

» é uma entidade duty-free cadastrada (pedido e documentação


feita com antecedência);

» é aquele que cuida da solicitação e apresentação dos


Certificados de Isenção e da obtenção dos documentos para
cada remessa que comprove perante as Autoridades Aduaneiras
que não há pagamento de direitos ou impostos aduaneiros33”.

Os humanitários devem estar cientes de que certos itens, como medicamentos e equipamentos de
comunicação, podem exigir certificação e autorização específicas. Durante desastres, os socorristas
podem usar o Acordo Modelo OCHA como uma legislatura ad hoc relacionada a costumes para
referência34. O Comitê Técnico Permanente aprovou este modelo em 1996 como resultado de um
projeto entre o OCHA e a Organização Mundial das Alfândegas (OMA). Delineia a qualidade técnica
reconhecida (definições claras e cláusulas simples) e estabelece um quadro geral de colaboração e
condições específicas práticas e úteis relativas a:

• Direitos, impostos ou taxas;

• Estado livre;

32) Cluster de Logística do PMA, Guia Operacional de Logística (LOG).


33) Cluster de Logística do PMA, Guia Operacional de Logística (LOG).
34) OCHA, “Acordo Modelo”, 8 de agosto de 2011. Disponível em inglês: <https://reliefweb.int/report/bhutan/signing-model-agreement-customs-
facilitation-humanitarian-assistance> .

223
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

• Simplificação da papelada;

• Entrada e exportação;

• Facilitação de processos;

• Apresentação de autorização de pré-chegada; e

• Desembaraço aduaneiro, o processo de obtenção de permissão das Autoridades Aduaneiras


para trazer mercadorias/materiais/produtos específicos para um país.

As relações estreitas com as autoridades nacionais são essenciais na realização de operações


logísticas porque se destinam a outras áreas de trabalho de socorro. Acordos sobre transporte, ativos de
telecomunicações, planos de viagem e outras questões são importantes e serão discutidos oportunamente.

O armazenamento de bens de socorro é outra etapa da cadeia logística. No passado, foi um


desafio para as organizações que lidam com logística. O influxo repentino de itens de socorro e a
disponibilidade limitada de capacidade de armazenamento no local de chegada (às vezes devido à
extensão da destruição) são fatores que influenciarão a cadeia de suprimentos. Alguns casos podem
exigir a criação de armazéns temporários. Essa é principalmente a tarefa do Log Cluster ou de outras
agências, como o Depósito de Resposta Humanitária das Nações Unidas (do inglês, United Nations
Humanitarian Response Depot — UNHRD35), o WFP ou outros, solicitando um número suficiente de
unidades de armazenamento móvel (do inglês, mobile storage units — MSUs36). O gerenciamento de
armazém é outra tarefa essencial que envolve o gerenciamento dos níveis de estoque, controle de
estoque e movimentação de todos os itens de entrada e saída. O estoque representa um grande custo
para a cadeia de suprimentos humanitária e inclui o custo de transporte das mercadorias, o custo de
gerenciamento das mercadorias (ou seja, mão de obra, fumigação, reembalagem etc.) e a manutenção
das mercadorias em armazéns.

Quando o Log Cluster é ativado, ele usará o Relief Item Tracking Application (RITA) para rastrear
informações sobre itens de alívio que transitam por sua cadeia de suprimentos comum. A empresa de
logística alemã DHL é um player global em logística e possui um “Aid, Relief & Humanitarian Service”.
A DHL é um parceiro associado do OCHA e pode implantar Equipes de Resposta a Desastres (do inglês,
Disaster Response Teams) mediante solicitação para fornecer suporte logístico no local nos aeroportos
afetados após um desastre natural. As DRTs são especializadas em armazenagem e todas as questões
relacionadas à logística aérea. O rastreamento de mercadorias é essencial em todas as fases da resposta
a um desastre e evita que itens se percam.

A gestão da frota de transporte é um aspecto crucial da logística. Os especialistas devem


supervisionar vários transportes e atividades relacionadas ao transporte. Isso inclui veículos envolvidos
na movimentação de mercadorias ou pessoal, bem como todos os tipos de equipamentos, como
geradores e equipamentos de manuseio de armazéns. O objetivo de um gerenciamento de frota eficaz
é reduzir e minimizar os custos gerais por meio da utilização máxima e econômica dos recursos. As
políticas organizacionais e os requisitos dos doadores afetarão a administração e a gestão financeira
da frota. Algumas organizações restringem veículos a projetos específicos, enquanto outras utilizam
pools de veículos para atender a vários projetos. As políticas de direção também podem variar, desde

35) UNHRD, Revisão Semestral 2015, Roma, Itália, 2015. Disponível em inglês: <https://unhrd.org/sites/default/files/publications/midyearreview_
medium.pdf> .
36) NRS Relief, “Rex Hall – MSU 10,0 x 24m”, 9 de novembro de 2016. Disponível em inglês: <http://www.nrsrelief.com/products/mobile-warehouse-10-24m/>.

224
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

confiar em um motorista dedicado da organização até ter funcionários dirigindo os veículos. Todos os
usuários devem cumprir os requisitos de seguro e responsabilidade do veículo, pois a desobediência
pode ter consequências pessoais. A disponibilidade de um número suficiente de veículos pode ser
crítica na fase de arranque no início de uma crise. Os tipos adequados de ativos de transporte são
essenciais. O transporte de mercadorias é uma combinação de carga útil e volume. O planejamento
de manutenção pode ter impacto na disponibilidade. Sempre que possível, os veículos devem receber
manutenção preventiva, mas isso exige bens complementares para os motoristas. Todas as atividades
de manutenção geralmente devem ser documentadas.

A cadeia de distribuição é “o movimento de um produto ou serviço desde o ponto de compra até


o momento em que é entregue ao usuário/consumidor final37”. No contexto humanitário, a distribuição
é vista a partir de três perspectivas:

• “Do ponto de compra ao ponto de uso final (comumente usado em desastres repentinos no set)”;

• “De hub para hub ou hub para usuário final (dentro de uma organização para locais estratégicos
para movimentação posterior)”; e

• “Ponto de entrega da organização aos beneficiários ou organizações parceiras que realizam a


distribuição”.

Seção 9.6 WFP, Cluster de Log e LRT


A Lição 2 descreveu como um cluster é ativado. O RC/HC, com o auxílio do HCT, solicitará a ativação
do Log Cluster. Uma Equipe de Resposta Logística (do inglês, Logistics Response Team — LRT) avaliará
a situação no terreno e determinará se a ativação é necessária e/ou qual suporte logístico pode ser
necessário no país. O LRT geralmente iniciará as operações do Log Cluster uma vez ativado. Apesar do
status do WFP como guardião do Log Cluster, o LRT pode incluir membros de diferentes organizações
com experiência em logística, bem como funcionários da Global Logistics Cluster Support Cell em Roma.
Não há associação formal ao Cluster de Logística.

O Cluster Logístico é um prestador de serviços para a comunidade humanitária. Será responsável


pela coordenação e IM no setor logístico e preencherá lacunas na capacidade logística e atuará como
provedor de último recurso.

De acordo com seu Relatório Anual de 2019, o Cluster de Logística realizou operações de campo
em Bangladesh, Camarões, República Centro-Africana, República Democrática do Congo, Haiti,
Iraque, Líbia, Malawi, Moçambique, Nigéria, Sudão do Sul, Síria, Venezuela, Iêmen e Zimbábue. Ao
longo dessas operações, o Cluster de Logística apoiou 715 organizações, incluindo ONGs nacionais e
internacionais, agências governamentais, agências da ONU e outras organizações da sociedade civil. Ele
facilitou a entrega de 32.246 toneladas métricas de suprimentos de socorro, entregues por 52 comboios
humanitários interagências coordenados por estrada e rio38. Sempre que o MCDA é implantado em
uma resposta de emergência, o Cluster Logístico tem, em estreita cooperação com o OCHA (UNDAC e
CMCS), um papel de coordenação. Isso ocorre porque muitas vezes eles são o elo entre as organizações
humanitárias e os militares para o envio e transporte de itens de socorro. Conforme descrito na Lição
3, as solicitações de transporte podem ir para qualquer site (Civ-Mil). A não coordenação dessas

37) Cluster de Logística do PMA, Guia Operacional de Logística (LOG).


38) Cluster Logístico, Relatório Anual do Cluster Logístico 2019, 2020. Disponível em inglês: <https://logcluster.org/annualreport/2019/> .

225
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

solicitações levará a uma duplicação de esforços, perda de Humanitarian


Prioridades Humanitárias

tempo e recursos potencialmente escassos39. Priorities

Seção 9.7 UNHAS40


Autoridades de
Civil Aviation
Aviação Civil
Authorities

O Serviço Aéreo Humanitário das Nações Unidas (do Solicitações de slot


Slot Requests

Célula de
inglês, United Nations Humanitarian Air Service — UNHAS) é Air Coordination
Representante
 ACC
Coordenação do ACC
Representative

um prestador de serviços comum à comunidade humanitária. Cell (ACC)  Air Traffic Control
Controle de Tráfego
Aéreo
Aéreo
Alocação de slot
Slot Allocation Strategic Hub
Ela representa 80% das atividades principais da WFP Aviation, Centro Estratégico

fornecendo serviços aéreos seguros, confiáveis e econômicos


Controle
“para os locais mais remotos e desafiadores do mundo, muitas Air Repre-
de Tráfego sentante
Traffic
ACC
Rep.
Control do ACC
Aéreo
vezes sob condições de segurança precárias, onde não há
Aeródromo de
Armazém de trânsito
Ground Handling Destination Airfield Despacho
Dispatch
transporte de superfície seguro ou opções viáveis de aviação
destino

comercial. acessível41.” A UNHAS é o único serviço aéreo


Armazém de trânsito
Transit Warehouse
humanitário acessível a todas as entidades humanitárias.

O relacionamento da UNHAS com a agência líder do Fiadores


Consignees

Cluster de Logística é de apoio. É gerido pelo PAM. “A UNHAS


é uma ferramenta da Agência Líder do Cluster Logístico e das
organizações participantes do Cluster Logístico. No entanto, a UNHAS não se reporta ao Cluster de Logística.
Uma vez que uma UNHAS individual esteja estabelecida em campo, o HC/RC estabelecerá um Comitê de
Grupo de Usuários (do inglês, Users’ Group Committee — UGC) no país composto por representantes de
ONGs e organizações do Sistema ONU para fornecer orientação sobre a gestão dos serviços aéreos. O CR/
HC geralmente atua como seu presidente42. As operações da UNHAS são lançadas por solicitações do HCT ou
do HC ao PAM.

Um tipo específico de operação aérea logística é o “airdrop” de (principalmente) biscoitos de alta


energia (do inglês, high-energy biscuits — HEB) sobre áreas fortemente afetadas por secas ou enchentes e
inacessíveis a todos os outros meios de transporte existentes. O lançamento aéreo libera caixas de papelão
pré-embaladas cheias de HEB sobre uma zona de lançamento (do inglês, drop zone ‑ DZ) a uma determinada
altitude (quanto maior a altitude, maior será a disseminação de HEB no solo). Uma vez liberado da aeronave,
o vento rasga as caixas de papelão liberando o HEB. Esta operação requer uma boa preparação no terreno
para garantir a recolha e distribuição equitativa de HEB. Esse tipo de operação é feito principalmente por
aeronaves C-130 ou AN-12 e é tecnicamente difícil, exigindo pilotos especializados e habilidosos43. Este tipo
de operação também pode distribuir outros tipos de alimentos. No entanto, os resultados dos lançamentos
aéreos são difíceis de medir e devem ser considerados uma opção de último recurso.

39) Os alunos devem visitar o site do Log Cluster para se familiarizar com as informações disponíveis relacionadas a uma crise em andamento ou
nova, bem como com o LOG. Os alunos encontrarão documentos relacionados com um sistema de filtragem que pode ajudá-los na coleta de
dados secundários. Para cada crise, os alunos podem encontrar documentos importantes como Conceito de Operações, instantâneos, visão geral da
operação, mapas detalhados, atualizações de situações, formulários e orientações, procedimentos alfandegários e detalhes de contato. Para ilustrar
o conteúdo sobre desastres recentes, os alunos devem ler CONOPS sobre o furacão Matthew.
40) PAM, “Serviço Aéreo Humanitário da ONU”. Disponível em inglês: <https://www.wfp.org/unhas> .
41) Mais informações sobre operações aéreas podem ser encontradas em: World Food Program Logistics Cluster, Guia Operacional de Logística (LOG), Air
Operations. Disponível em inglês: <http://dlca.logcluster.org/display/LOG/Air+Operations>.
42) Cluster de Logística do PMA, Guia Operacional de Logística (LOG), Operações Aéreas.
43) Para obter mais informações, consulte: Peter Giugni, “O que você precisa saber sobre lançamentos aéreos humanitários”, 13 de abril de 2016.
Disponível em inglês: <http://intercrossblog.icrc.org/blog/what-you-need-to-know-about-humanitarian-airdrops>.

226
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

Questionário de fim de Lição  »

1. Um terremoto afetará diretamente 4. Os três pilares em que se baseia a


a maioria do(s)/(as) _____, segurança alimentar são _____.
particularmente os mais pobres.
A. acesso, quantidade e utilidade
A. populações rurais B. acesso, preço e benefício
B. pessoal da ONU C. quantidade, disponibilidade e localização
C. missões militares D. disponibilidade, acesso e utilização
D. populações urbanas
5. Qual das seguintes alternativas possíveis
2. Qual das seguintes afirmações é FALSA? para entrega de alimentos em caso de
desastre deve ser evitada?
A. Como as inundações geralmente afetam uma
área geográfica mais ampla do que outros A. Dinheiro

tipos de desastres, seus efeitos podem ser B. Vouchers


maiores na alimentação e nutrição. C. Dinheiro por trabalho
B. A perda de gado pode ser uma perda D. Comida por trabalho
econômica significativa que pode afetar a
independência de uma família ou as suas 6. Uma visão frequentemente aceita no
setor humanitário é _____.
chances de sobrevivência.
A. Logística = Alfândega + Abastecimento +
C. Quando a água recua, a água salgada
Distribuição
e a lama terão um impacto positivo na
fertilidade das terras agrícolas. B. Logística = Gestão da Cadeia de
Suprimentos + Armazenagem + Distribuição
D. A destruição dos ciclones tropicais pode
diminuir a demanda por mão de obra durante C. Logística = Suprimentos + Gestão de

a época de colheita, privando agricultores e Materiais + Distribuição

trabalhadores sazonais de renda. D. Logística = Alfândega + Armazenagem +


Transporte
3. Qual das seguintes afirmações é FALSA?
7. Qual dos seguintes NÃO é um dos três
A. A fome é uma questão de não haver comida
princípios importantes da aquisição de
suficiente e não uma questão de algumas
logística humanitária?
pessoas não terem comida suficiente.
A. Transparência
B. A fome é uma sensação desconfortável ou
B. Especificidade
dolorosa causada pela falta de alimentos.
C. Prestação de contas
C. A desnutrição deve ser pensada em termos
D. Eficiência e custo-benefício
de uma nutrição inferior ao desejável.
D. A fome é um resultado influenciado pelo
acesso a alimentos, incluindo produção,
comércio e transferências.

As respostas estão disponíveis na página seguinte.

227
LIÇÃO 9 | Logística, Alimentação e Nutrição

Questionário de fim de Lição  »

8. Qual das seguintes afirmações é FALSA? 9. Apesar do status do PAM como guardião
do _____, o _____ pode incluir
A. A decisão de isentar as mercadorias
membros de diferentes organizações
importadas para um território para
com experiência em logística, bem
fins humanitários, do pagamento de como funcionários da Célula de Apoio ao
direitos e outros impostos, é de inteira Cluster de Logística Global em Roma.
responsabilidade das autoridades do país. A. Cluster de log, LRT
B. Procedimentos alfandegários complicados B. resposta, LRT
podem causar atrasos e congestionamentos
C. Cluster de Logs, HCT
em um porto de entrada e afetar o tempo de
D. USRT, IASC
retorno de navios alimentadores e vagões
ferroviários, além de afetar o fluxo de 10. A UNHAS é o único _____ humanitário
mercadorias. acessível a todas as entidades
C. Existe um equívoco comum de que os humanitárias.
bens/materiais isentos estão isentos de A. serviço aéreo
formalidades alfandegárias. B. serviço ferroviário
D. Certos itens, como medicamentos e C. serviço de transporte marítimo
equipamentos de comunicação, nunca D. coordenador de Logistica
exigirão certificação e autorização específicas
se trazidos pelo Log Cluster.

Respostas »
1. D

2. C

3. A

4. D

5. D

6. C

7. B

8. D

9. A

10. A

228
OPERAÇÕES HUMANITÁRIAS

Apêndice A: Siglas e abreviaturas

ACAPS Assessment Capacities Project

ACNUR Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados

ASR busca e salvamento de avaliação (do inglês, assessment search and


rescue)

AT Agenda Transformativa

AWSD Aid Worker Security Database

B-FAST Equipe Belga de Primeiros Socorros e Apoio (do inglês, Belgian First
Aid and Support Team)

BoO Base de Operações (do inglês, Base of Operations)

CA abordagem abrangente (do inglês, comprehensive approach)

CCRE Centro de Coordenação de Resposta a Emergência

CERE Capacidade Europeia de Resposta a Emergências

CERF Fundo Central de Resposta a Emergências (do inglês, Central


Emergency Response Fund)

CGD discussões em grupo comunitário (do inglês, community group


discussions)

CHFs Fundos Humanitários Comuns (do inglês, common humanitarian funds)

CICV Comitê Internacional da Cruz Vermelha

CIF Classificação Integrada de Fase

CIMIC Cooperação Civil-Militar (do inglês, Civil-Military Cooperation)

CEI Comunidade de Estados Independentes

CLA nível da comunidade (do inglês, community-level assessment)

CMCoord Coordenação Civil-Militar (do inglês, Civil-Military Coordination)

CMCS Seção de Coordenação Civil-Militar (do inglês, Civil-Military


Coordination Section)

CMOC Centro de Operações Civil-Militar (do inglês, Civil-Military Operations


Centre)

CMR taxa bruta de mortalidade (do inglês, crude mortality rate)

CSI Coping Strategies Index

DDR desarmamento, desmobilização e reintegração

DG ECHO Direção-Geral de Ajuda Humanitária e Proteção Civil (do inglês,


Directorate-General for European Civil Protection and Humanitarian
Aid Operations)

DHA Departamento de Assuntos Humanitários (do inglês, Department of


Humanitarian Affairs)

INSTITUTO DE TREINAMENTO EM OPERAÇÕES DE PAZ

229
OPERAÇÕES HUMANITÁRIAS

DICA Direito Internacional dos Conflitos Armados

DO observação direta (do inglês, direct observation)

DO Oficial Designado (do inglês, Designated Official)

DP pontos de distribuição (do inglês, Distribution Point)

DPI Departamento de Informação Pública (do inglês, Department of Public


Information)

DREF Fundo de Emergência para Assistência a Catástrofes (do inglês,


Disaster Relief Emergency Fund)

DRO operação de socorro em desastres (do inglês, disaster relief operation)

DSG Orientação Estratégica de Defesa (do inglês, Defence Strategic


Guidance)

DUDH Declaração Universal dos Direitos do Homem

DZ zona de lançamento (do inglês, drop zone)

ECB Emergency Capacity Building

ECOSOC Conselho Econômico e Social (do inglês, Economic and Social Council)

EMTCC Célula de Coordenação da Equipe Médica de Emergência (do inglês,


Emergency Medical Team Coordination Cell)

EMTs Equipes Médicas de Emergência (do inglês, Emergency Medical Teams)

ERC Coordenador de Ajuda de Emergência (do inglês, Emergency Relief


Coordinator)

ERFs Fundos de Resposta a Emergências (do inglês, Emergency Response


Funds)

ERS Seção de Resposta a Emergências (do inglês, Emergency Response


Section)

ERG explosivos remanescentes de guerra

EVD Doença do Vírus Ebola (do inglês, Ebola Virus Disease)

FA Flash Appeal

FACT Equipes de Coordenação de Avaliação de Campo (do inglês, Field


Assessment Coordination Team)

FAO Organização para a Alimentação e Agricultura (do inglês, Food and


Agriculture Organization)

FINUL Força Interina das Nações Unidas no Líbano

FMA recursos militares estrangeiros (do inglês, foreign military assets)

FTS serviço de monitorização financeira (do inglês, financial tracking


service)

INSTITUTO DE TREINAMENTO EM OPERAÇÕES DE PAZ

230
OPERAÇÕES HUMANITÁRIAS

GEGA “Good Enough Guide to Needs Assessment”

GI gerenciamento de informações

SIG sistema de informação geográfica

GLS serviço de logística global (do inglês, global logistics service)

HC Coordenador Humanitário (do inglês, Humanitarian Coordinator)

HCT Equipe Humanitária do País (do inglês, Humanitarian Country Team)

HEB biscoitos de alta energia (do inglês, high-energy biscuits)

HPN Rede de Práticas Humanitárias (do inglês, Humanitarian Partnership


Network)

HRO operação de ajuda humanitária (do inglês, Humanitarian Relief


Operation)

HuMOCC Centro de Coordenação de Operações Humanitário-Militar (do inglês,


Humanitarian-Military Operation Coordination Centre)

IARRM Mecanismo de Reação Rápida Entre Agências (do inglês, Inter-Agency


Rapid Reaction Mechanism)

IASC Comité Permanente Interagências (do inglês, Inter-Agency Standing


Committee)

TPI Tribunal Penal Internacional

ICVA Conselho Internacional de Entidades Beneficentes (do inglês,


International Council of Voluntary Agencies)

IDRA Assistência Internacional para Resposta a Desastres (do inglês,


International Disaster Relief Assistance)

IEHK 2006 Emergency Health Kit 2006

IFRC Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e do


Crescente Vermelho (do inglês, International Federation of Societies of
the Red Cross and the Red Crescent)

IHP Parceria Humanitária Internacional (do inglês, International


Humanitarian Partnership)

IMC índice de massa corporal

INSARAG Grupo Consultivo Internacional de Busca e Resgate (do inglês,


International Search and Rescue Advisory Group)

IRA infecções respiratórias agudas

KII entrevistas com informantes-chave (do inglês, key informant


interviews)

LEMA autoridades locais de gerenciamento de emergências (do inglês, local


emergency management authority)

INSTITUTO DE TREINAMENTO EM OPERAÇÕES DE PAZ

231
OPERAÇÕES HUMANITÁRIAS

LOG Guia Operacional de Logística (do inglês, Logistics Operational Guide)

LRT Equipe de Resposta Logística (do inglês, Logistics Response Team)

MASC Projeto Mass Shelter Capability (do inglês, Mass Shelter Capability
Project)

MCDA meios de defesa civil-militar (do inglês, military-civil defence assets)

MINUAD Operação Híbrida da União Africana e das Nações Unidas no Darfur

MINUSCA Missão de Estabilização Integrada Multidimensional das Nações Unidas


na República Centro-Africana

MINUSMA Missão de Estabilização Integrada Multidimensional da ONU do Mali

MINUSTAH Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti

MIRA Multi-Cluster Initial Rapid Assessment

MONUSCO Missão de Estabilização da Organização das Nações Unidas na


República Democrática do Congo

MOSS Padrões Mínimos de Segurança Operacional (do inglês, Minimum


Operating Security Standards)

MOU memorando de entendimento (do inglês, memorandum of


understanding)

MSB Agência Sueca de Contingências Civis

MSF Médicos Sem Fronteiras

MSUs unidades de armazenamento móvel (do inglês, mobile storage units)

MUAC circunferência do braço médio (do inglês, mid-upper arm


circumference)

NATF Força-Tarefa de Avaliação de Necessidades (do inglês, Needs


Assessment Task Force)

NDMA Autoridade Nacional de Gerenciamento de Desastres (do inglês,


National Disaster Management Authority)

NDMO Organização Nacional de Gestão de Desastres (do inglês, National


Disaster Management Organization)

NEMA Autoridade Nacional de Gestão de Emergências (do inglês, National


Emergency Management Authority)

NFI itens não alimentares (do inglês, non-food items)

OCHA Gabinete de Coordenação dos Assuntos Humanitários (do inglês,


Office for the Coordination of Humanitarian Affairs)

ODI Overseas Development Institute

OEA Organização dos Estados Americanos

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232
OPERAÇÕES HUMANITÁRIAS

OHCHR Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos


Humanos (do inglês, Office of the United Nations High Commissioner
for Human Rights)

OI organização internacional

OIG organização intergovernamental

OIM Organização Internacional para as Migrações

OIR Organização Internacional de Refugiados

OIT Organização Internacional do Trabalho

OMA Organização Mundial das Alfândegas

OMS Organização Mundial da Saúde

ONU Organização das Nações Unidas

OPAS Organização Pan-Americana da Saúde

ONG Organização Não Governamental

OSOCC Centro de Coordenação e Operação No Local (do inglês, On-Site


Operations Coordination Centre)

OTAN Organização do Tratado do Atlântico Norte

PDIs pessoas deslocadas internamente

PMA Programa Mundial de Alimentos

PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

PNUMA Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente

POC proteção de civis (do inglês, protection of civilians)

PSB Ramo de Apoio ao Programa (do inglês, Programme Support Branch)

PSF Força de Apoio à Paz (do inglês, Peace Support Force)

PSOs Operações de Apoio à Paz (do inglês, Peace Support Operations)

QBRN Química, Biológica, Radiológica e Nuclear

RC Coordenador Residente (do inglês, Resident Coordinator)

RDC centro de recepção/partida (do inglês, Reception/Departure Centre)

RDC República Democrática do Congo

RITA Relief Item Tracking Application

ROEs regras de engajamento (do inglês, Rules of Engagement)

RS escala Richter (do inglês, Richter Scale)

RSB Seção de Apoio à Resposta (do inglês, Response Support Branch)

INSTITUTO DE TREINAMENTO EM OPERAÇÕES DE PAZ

233
OPERAÇÕES HUMANITÁRIAS

SA Análise de Situação (do inglês, Situation Analysis)

SAM desnutrição aguda grave (do inglês, severe acute malnutrition)

SCHR Comitê Diretivo para a Resposta Humanitária (do inglês, Steering


Committee for Humanitarian Response)

SLS Sistema de Nível de Segurança (do inglês, Security Level System)

SMT Equipe de Gerenciamento de Segurança (do inglês, Security


Management Team)

SOFA Acordo de Estatuto de Forças (do inglês, Status of Forces Agreement)

SOPs regulamentos e procedimentos operacionais padrão (do inglês,


Standard Operating Procedures)

SRM Gerenciamento de Riscos de Segurança (do inglês, Security Response


Management)

SRO sais de reidratação oral

SRP Plano de Resposta Estratégica (do inglês, strategic response plan)

TB Resumo Técnico (do inglês, Technical Brief)

TDR Termos De Referência

THW Technisches Hilfswerk

TCI Tecnologia de Comunicação da Informação

U5MR taxa de mortalidade de menores de cinco anos (do inglês, under-five


mortality rate)

UCC Célula de Coordenação da USAR (do inglês, USAR Coordination Cell)

UE União Europeia

UGC Comitê de Grupo de Usuários (do inglês, Users’ Group Committee)

UN-Habitat Programa das Nações Unidas para os Estabelecimentos Humanos (do


inglês, United Nations Human Settlement Programme)

ONUSIDA Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS

UNDAC Avaliação e Coordenação pelas Nações Unidas para situações de


Catástrofe (do inglês, United Nations Disaster Assessment and
Coordination)

INSTITUTO DE TREINAMENTO EM OPERAÇÕES DE PAZ

234
OPERAÇÕES HUMANITÁRIAS

UNDRR Nações Unidas para a Redução do Risco de Desastres (do inglês,


United Nations Office for Disaster Risk Reduction)

UNDSS Departamento de Segurança e Proteção das Nações Unidas (do inglês,


United Nations Department of Safety and Security)

UNFPA Fundo das Nações Unidas para a População (do inglês, United Nations
Population Fund)

UNHAS Serviço Aéreo Humanitário das Nações Unidas (do inglês, United
Nations Humanitarian Air Service)

UNHRD Depósito de Resposta Humanitária das Nações Unidas (do inglês,


United Nations Humanitarian Response Depot)

UNICEF Fundo das Nações Unidas para a Infância (do inglês, United Nations
International Children’s Emergency Fund)

UNISDR Nações Unidas para a Redução do Risco de Desastres (do inglês,


United Nations Office for Disaster Risk Reduction)

MINUSS Missão das Nações Unidas na República do Sudão do Sul

UNPOL Polícia da ONU

UREs Unidades de Resposta a Emergências

USAID Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (do


inglês, United States Agency for International Development)

USAR busca e salvamento em meio urbano (do inglês, urban search and
rescue)

USG/ERC Secretário-Geral Adjunto/Coordenador de Assistência de Emergência


(do inglês, Under-Secretary-General/Emergency Relief Coordinator)

VBG violência baseada em gênero

VO virtual OSOCC

VOICE Organizações de Voluntariado de Cooperação em Emergências (do


inglês, Voluntary Organisations in Cooperation in Emergencies)

WASH Agua, Saneamento e Higiene (do inglês, Water, Sanitation, and


Hygiene)

INSTITUTO DE TREINAMENTO EM OPERAÇÕES DE PAZ

235
OPERAÇÕES HUMANITÁRIAS

Sobre o autor: Tenente Coronel René Wagemans (Retired), Exército belga

O tenente-coronel René Wagemans (aposentado) começou sua carreira no Exército belga em 1977,
onde serviu como chefe do Setor de Resposta a Crises Humanitárias (OF-4) do Estado-Maior.

Aposentou-se em 2014 e atuou como reservista no mesmo cargo até 2019. Em sua carreira,
Wagemans participou de várias missões de manutenção/imposição da paz em funções de Estado-
Maior e Comando. Como representante do Exército e membro da equipa belga de suporte e primeiros
socorros, participou de várias operações de ajuda humanitária, sendo a mais recente a ocorrida após o
tufão Haiyan em 2013. É membro do UNDAC desde 2005, tendo atuado como membro e líder de equipe
em vários desastres. Entre 2011 e 2019, Wagemans foi palestrante, facilitador e coach de vários cursos
do UN-OCHA, bem como de cursos relacionados ao Mecanismo Europeu de Proteção Civil.

INSTITUTO DE TREINAMENTO EM OPERAÇÕES DE PAZ

236
OPERAÇÕES HUMANITÁRIAS

Informação sobre o Exame Final de Curso

Formato das questões

O Exame Final de Curso tem 50 questões. São questões de múltipla escolha, marcadas como A, B,
C ou D. Você deve escolher apenas uma resposta como a resposta correta. O exame aborda o conteúdo
de todas as lições do curso e pode incluir as informações dos anexos. Apenas o conteúdo de vídeo
não é incluído.

» Acesse o exame na sala de aula on-line (Online


Classroom) visitando <www.peaceopstraining.org/
users/courses/>. Após acesso, clique no título deste
curso. Depois de chegar à página do curso, clique no
botão vermelho “Start Exam”.

Limite de tempo para completar o Exame Final de Curso

Não há um limite de tempo para concluir o exame; isso permite ao(à) aluno(a) ler e analisar as
questões com cuidado e consultar o material do curso. Ademais, se o(a) aluno(a) não puder concluir o
exame em uma única sessão, ele(a) poderá salvá-lo e regressar para o ponto em que parou sem que
seu teste seja corrigido, clicando no botão de “Save”, localizado no final da tela, próximo ao botão de
“Submit my answers”. Ao concluir o exame, o aluno deverá clicar no botão de “Submit my answers”.

Nota mínima para a conclusão do curso com sucesso

Nota mínima para a conclusão do curso: 75 por cento é a nota mínima a ser obtida para que o curso
seja concluído com sucesso. Obtendo a pontuação mínima, você receberá um Certificado de Conclusão
eletrônico. Se obtiver pontuação inferior a 75 por cento, você será informado de que recebeu uma nota
insuficiente. Você receberá uma versão alternativa do Exame Final de Curso, que poderá ser concluído
quando se sentir pronto. Caso obtenha sucesso na realização da segunda versão do exame, você
receberá um Certificado de Conclusão eletrônico. Caso falhe pela segunda vez, você será informado e
desmatriculado do curso.

Dê continuidade a sua experiência de treinamento com o POTI »


• Visite <https://www.peaceopstraining.org/courses> para acesso à lista de todos os cursos
atuais.

• Se uma categoria particular de estudo lhe interessar (como a dos direitos humanos, da
logística, ou dos estudos militares, por exemplo), considere o programa de pós certificação,
disponível em seis áreas de especialização. Veja mais informações sobre esses programas
em <https://www.peaceopstraining.org/specializedtraining-certificates>.

• Mantenha-se conectado/a visitando a página da nossa comunidade, comunique-se com


outros alunos pelas mídias sociais e compartilhe fotos das suas missões. Visite <www.
peaceopstraining.org/community> para mais informações. Depois de passar no exame, o
seu nome também será exibido no Quadro de Honra.

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