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ISSN: 1415-6393
luiz.flores@univali.br
Universidade do Vale do Itajaí
Brasil
TURISMO COMUNITÁRIO
Uma perspectiva ética e educativa de desenvolvimento
Guilherme P. de Araújo 1
araujo600@yahoo.com.br
1
Bacharel em Ciências Sociais – Universidade Federal de Santa Catarina. Licenciado em Sociologia - Universidade Federal de
Santa Catarina. Mestre em Agroecossistemas - Universidade Federal de Santa Catarina. Vínculo Institucional atual: Fundação
de Apoio ao Desenvolvimento Rural Sustentável do Estado de Santa Catarina.
2
Engenheira Agrônoma – Universidade Federal de Santa Catariana. Mestre em Geografia - Universidade Federal de Santa
Catariana. Vínculo Institucional atual: Associação Acolhida na Colônia.
Guilherme P. de Araújo, Daniele Lima Gelbcke
RESUMO
O presente artigo focaliza o Turismo Comunitário, em uma abordagem baseada no
Desenvolvimento Territorial Sustentável e suas possibilidades em áreas degradadas em
termos socioprodutivos. Sugere-se que este enfoque fornece subsídios à consolidação
gradual de um estilo de desenvolvimento ético capaz de contrabalançar os efeitos da crise
socioambiental. Nesse sentido, o objetivo deste trabalho é discutir as perspectivas do
turismo comunitário no quadro do “mau desenvolvimento”, onde a hegemonia da economia
capitalista induz padrões de consumo que reforçam as diferenças sociais e econômicas,
diminuem a diversidade cultural, dificultam as iniciativas endógenas e se apropriam dos
recursos naturais. A partir da apresentação de duas experiências - uma com agricultores
das encostas da Serra Geral e outra com comunidades de pescadores tradicionais da Lagoa
de Ibiraquera, ambos os casos em SC -, delineiam-se as principais entraves e perspectivas
do turismo comunitário, destacando-se: a necessidade de apoio e cooperação com outros
setores sociais; o esforço conjunto entre poder público, instituições de ensino e pesquisa e
sociedade civil; além de uma mudança paradigmática nos níveis da economia, da política,
da educação, da ciência e da tecnologia, ou seja, uma mudança relativa à sociedade de
consumo.
Palavras-chave: Turismo Comunitário; Desenvolvimento Territorial Sustentável; Ética do
Desenvolvimento.
ABSTRACT
This article focuses on Community Tourism, in an approach based on Sustainable Territorial
Development and its possibilities in degraded areas, in socioproductive terms. It suggests
that this approach provides subsidies for the gradual consolidation of a style of ethical
development that is capable of offsetting the effects of the socioenvironmental crisis.
Accordingly, the objective of this work is to discuss the prospects of Community Tourism in
the framework of "bad development", where the hegemony of the capitalist economy induces
patterns of consumption that reinforce the social and economic differences, decrease the
cultural diversity, make endogenous initiatives difficult, and exploit the natural resources.
Based on a presentation of two experiences - one with farmers of the slopes of Serra Geral
and the other with communities of traditional fishermen of the Ibiraquera Lagoon, both in
Santa Catarina - it outlines the main obstacles and prospects of Communitary Tourism,
highlighting: the need for support and cooperation with other social sectors; a joint effort by
the public authorities, educational and research institutions, and civil society; and a change
of paradigm in the level of the economy, politics, education, science and technology, i.e. a
change in relation to the consumer society.
Key words: Community Tourism; Sustainable Territorial Development; Ethics of the
Development
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RESUMEN
El presente artículo enfoca el Turismo Comunitario con un abordaje basado en el Desarrollo
Territorial Sostenible y sus posibilidades en áreas degradadas en términos socioproductivos.
Se sugiere que este enfoque proporciona subsidios a la consolidación gradual de un estilo
de desarrollo ético capaz de compensar los efectos de la crisis socioambiental. En ese
sentido, el objetivo de este trabajo es debatir las perspectivas del turismo comunitario en el
marco del “mal desarrollo”, donde la hegemonía de la economía capitalista induce modelos
de consumo que refuerzan las diferencias sociales y económicas, disminuyen la diversidad
cultural, dificultan las iniciativas endógenas y se apropian de los recursos naturales. A partir
de la presentación de dos experiencias - una con agricultores de las laderas de la Serra
Geral y otra con comunidades de pescadores tradicionales de la Laguna de Ibiraquera,
ambos casos en Santa Catarina -, se delinean las principales trabas y perspectivas del
turismo comunitario, destacándose: la necesidad de apoyo y cooperación con otros sectores
sociales; el esfuerzo conjunto entre poder público, instituciones de enseñanza e
investigación y sociedad civil; además de un cambio paradigmático en los niveles de la
economía, de la política, de la educación, de la ciencia y de la tecnología, o sea un cambio
relativo a la sociedad de consumo.
Palabras clave: Turismo Comunitario; Desarrollo Territorial Sostenible; Ética del Desarrollo.
1 INTRODUÇÃO
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2 METODOLOGIA
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Nas últimas décadas o setor turístico experimentou uma vertiginosa expansão global,
chegando a ser considerado a maior “indústria” da economia mundial. A ampliação
geográfica do setor respondeu a processos distintos como: réplica às novas demandas de
mercado; como estratégia de desenvolvimento local; e, sobretudo, para liberar e integrar
mercados regionais (MOLINA, 2003).
Embora o seu papel na economia mundial seja considerável, é importante relativizar
o discurso sobre o turismo e não superestimar seu potencial para o desenvolvimento local.
Não são raros os exemplos de regiões onde o turismo não dinamizou a economia das áreas
pobres nem distribuiu riqueza. Ao contrário, serviu como estratégia de acumulação
monetária em detrimento das necessidades básicas dos trabalhadores locais, transformando
o espaço local em mercadoria global.
Segundo Coriolano (2003), o turismo globalizado, voltado aos mega-
empreendimentos que chegam aos países considerados em desenvolvimento, segue
modelos concentradores de capital, e está associado à exclusão socioeconômica, à
desvalorização das culturas nativas e à geração de impactos negativos em relação à base
dos recursos naturais e sociais dos núcleos onde se instala. O resultado é que populações
que no passado possuíam estilos de vida adaptados ao padrão de produção e consumo em
escala humana, a partir da implementação da atividade turística em suas localidades são
introduzidas em um padrão econômico exótico, no qual elas não são mais as protagonistas
do desenvolvimento. Em suma, existe uma tendência de que a atividade turística se aproprie
dos espaços e seus recursos naturais e culturais, transformando-os em atrativos, em
produtos (OURIQUES, 2003).
O problema que se apresenta atualmente é como esta atividade econômica se insere
nas propostas de desenvolvimento territorial sustentável e, se ela é capaz, através de um
enfoque menos economicista e mais educativo, de promover melhor retorno social,
econômico e ambiental para as populações locais.
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algumas experiências regionais deve-se, à densidade das relações entre os atores locais
que têm papel determinante na competitividade das atividades econômicas. Segundo
Desjardins (1999), a competitividade na economia global corresponde ao atendimento de
certas condições locais específicas, que não se reduzem à disponibilidade de fatores de
produção sujeitos ao mercado global. O capital humano desponta como uma fonte do
crescimento endógeno que se produz através da ação-coletiva.
Com isso a noção de território torna-se mais complexa e adquire outros significados.
Pecqueur (2004, p. 5) distingue duas acepções conceituais: o território dado e o construído.
O primeiro diz respeito:
O segundo:
(...) ao resultado de um processo de construção pelos atores. O território
não é postulado, é constatado a posteriori. Significa dizer que o território
construído não existe em todo lugar; podemos encontrar espaços
dominados pelas leis exógenas da localização e que não são territórios.
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experiências melhor sucedidas são aquelas que funcionam em rede. Por exemplo, a Prainha
do Canto Verde, no Ceará, conectada a uma rede latina americana de Turismo Comunitário;
a Acolhida na Colônia, que surgiu através da criação da Associação dos Agricultores
Ecológicos das Encostas da Serra Geral (AGRECO); e a Lagoa de Ibiraquera, experiência
esta que se consolidou através de um Fórum de Agenda 21 que congrega diversos setores
da sociedade.
Nosso entendimento é que o Turismo Comunitário tende a emergir da mobilização da
sociedade civil organizada, i.é, de maneira endógena, sem querer dizer com isso que não
haja espaço para apoios e parcerias externas, pois é este mais um aspecto das
experiências consideradas exitosas. As experiências apresentadas na seqüência deste
artigo são resultados de dinâmicas sociais. Nelas o turismo surgiu como um produto, e não
como um fim e si mesmo. O objetivo do turismo passa a ser o fomento de sistemas
produtivos integrando setores da economia tradicional, como forma de garantir a autonomia
das comunidades frente às oscilações do mercado mundial.
4 ESTUDO DE CASOS
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Estado. No decorrer dos últimos dois anos vêm sendo realizadas reuniões no âmbito do
grupo de turismo, com o intuito de ajustar a experiência à região. Houve algumas ocasiões
de acolhimento comunitário nos moldes proposto pelo projeto. As mesmas indicaram a
potencialidade local em termos de recursos humanos e naturais, para a viabilização de uma
estratégia de Turismo Comunitário.
Outro indicativo da viabilidade desta proposta é a existência de uma série de
instituições que se acredita poderem integrar um arranjo institucional regional voltado à
implementação de um sistema socioprodutivo integrado, tendo o turismo como vetor
estruturante, viabilizando, dessa forma, uma opção sustentável e ética de desenvolvimento
frente ao modelo turístico atual.
Nesse sentido, podemos enfatizar a atuação de diversas ONGs com destacada
atuação política e ambiental; experiências exitosas em Agroecologia, culminando na
construção do Mercado do Produtor, onde produtos da agricultura familiar são vendidos
diretamente ao consumidor; a formação de lideranças engajadas; a criação de um mosaico
de Unidades de Conservação, haja vista a consolidação da Área de Preservação Ambiental
da Baleia Franca e a implementação de uma Reserva Extrativista (RESEX) e uma Reserva
de Desenvolvimento Sustentável (RDS), todas caracterizadas como instrumentos
institucionais que permitem a gestão comunitária dos recursos locais; a implementação do
Projeto Observatório do Litoral, o qual estabelece uma parceria com os Ministérios Públicos
Federal e Estadual; o apoio científico da Universidade Federal de Santa Catarina; o Projeto
Baleia Franca, que vem realizando estudos relativos ao comportamento da Baleia Franca,
preservando e valorizando a história e identidade cultural do litoral centro-sul; e, finalmente,
a proposta de expansão rumo ao litoral Centro-Sul da rede de agroturismo ecológico
Associação Acolhida na Colônia.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Para Sachs (2007b), a crença keynesiana no progresso técnico-científico não se justifica mais, pois o crescimento econômico,
a elevação da taxa de investimento, dado o nível de automatização da produção, não gera mais emprego; o homem é cada vez
mais dispensável ao processo produtivo. Assim, nas sociedades modernas “a exclusão passou a liderar, superando a
exploração (...) os ricos já não precisam mais dos pobres”. Não é verdade que a distribuição desigual dos frutos do progresso
tecnológico e econômico resulta da escassez, mas sim da má organização social e política. Assim, a idéia de mau
desenvolvimento sinaliza que um quadro de miséria e exclusão social é perfeitamente compatível com o crescimento da
economia; o que o autor pretende destacar é que crescimento e desenvolvimento não são sinônimos.
ii
A partir dos anos 1980, estudos mostraram a existência de regiões dotadas de particularidades em sua dinâmica de
desenvolvimento, como são os casos dos distritos industriais italianos, arranjos produtivos locais e clusters (PORTER, 1998,
RAUD, 1999).
iii
O turismo de massa é aquele desenvolvido, geralmente, de forma sazonal, que procura obter a maior rentabilidade no menor
tempo possível, privatizando os lucros de curto e médio prazo e socializando os danos sócios ambientais em longo prazo.
Geralmente ele acontece em regiões com forte apelo paisagístico. No Brasil, caracteriza-se pelo apelo sol-e-mar (SAMPAIO,
2005). Nesta modalidade turística a comunidade, geralmente pouco qualificada profissionalmente, é utilizada como mão-de-
obra barata, ocupando postos de trabalho com pouco prestígio sócio econômico (ARAÙJO, 2006, 2008).
iv
Os recursos específicos são o pivô de diferenciação de um território. Eles surgem somente no momento em que os atores
combinam suas estratégias para resolverem um problema inédito. Não são comensuráveis, não podem ser expressos em
preços e não são transferíveis. Resultam de uma longa história, de uma acumulação de memória, de uma aprendizagem
cognitiva coletiva. Assim, são produtos de um território “revelado”, i.é, sua produção resulta de costumes, de uma cultura
elaborada num espaço de proximidade geográfica e institucionalizada a partir de uma forma de troca distante da troca
mercadológica, embora sua natureza não seja incompatível, mas complementar ao mercado.
v
Cesta de bens é “uma combinação complexa de diversos elementos que revelam a existência de “ecossistemas societários”,
nos quais se coordenam inicialmente elementos de proximidade geográfica e, em seguida, de proximidade organizacional”
(PECQUEUR, 2006 p.87).
vi
O Caderno de Normas da Acolhida define várias normas que devem ser respeitadas pelos associados, e que dizem respeito
a hospedagem, alimentação, segurança e produção, garantido a qualidade dos produtos e serviços oferecidos. A mais
desafiadora delas é a conversão da produção agrícola convencional para orgânica, pelo menos no que diz respeito a
alimentação servida aos turistas.
vii
Ela conta com uma área de aproximadamente 900 ha, localizada nos municípios de Imbituba e Garopaba, no litoral Sul de
Santa Catarina, compreende a micro-bacia hidrográfica da L.I, abriga um conjunto de oito pequenas comunidades, com uma
população estimada em 5.000 pessoas. Trata-se de uma região diversificada em termos paisagísticos, contendo dunas,
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vegetação de restinga, planícies costeiras e uma pequena mancha de Mata Atlântica em estágio secundário de regeneração.
Situa-se cerca de 20 km ao sul do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro e está inserida na Área de Proteção Ambiental (APA)
da Baleia Franca.
viii
Os recursos de propriedade comum não podem ser divididos entre consumidores separadamente. Normalmente, quando
acontece o uso individual, resulta na subtração da possibilidade de uso por outros, uma vez que o uso individual do recurso
afeta as chances potenciais dos demais usuários.
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