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Esse caderno de simulados para Concurso em PDF (com gabarito) foi gerado através do site
Gabarite Concurso. Resolva as questões a seguir:
https://gabariteconcurso.com.br/questoes/55628-questao
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Confúcio levanta um problema sério para qualquer buscador da sabedoria: quais os limites da
dignidade e da paciência? O mestre, por vezes, suportou ofensas atrozes de man eira
inexpugnável; por outras vezes, revoltou-se, de imediato, com certos acontecimentos. Há um
padrão para lidar com os problemas sem perder o controle? E, se existe, qual é?
Nos Diálogos de Confúcio (Lunyu), está escrito que os discípulos de Zixia perguntaram a Zizhang
sobre as relações sociais. Zizhang disse: "O que Zixia vos disse?" Eles responderam: "Zixia disse:
‘Associai-vos ao tipo certo de pessoas; evitai aquelas que não são do tipo certo’”. Zizhang disse:
"Ensinaram-me algo um pouco diferente: um cavalheiro respeita os sábios e tolera os medíocres,
louva os bons e tem compaixão pelos incapazes. Se tenho uma vasta sabedoria, quem eu não
toleraria? Se não tenho uma vasta sabedoria, as pessoas me evitarão. Com base em que deveria
eu evitá-las?".
Em A Justa Medida (Zhong Yong), também se diz: "Se alguém faz dez vezes o que outros fazem
uma vez; se faz cem o que outros fazem dez; se faz mil o que outros fazem cem, essa atitude leva
à sabedoria". Ambos os trechos mostram que o exercício da paciência e da dignidade são práticas
constantes, e seu domínio procede de uma intensa, profunda e dedicada atenção. Elas procedem
do desejo de não buscar o conflito desnecessário, de atentar ao conjunto das possibilidades de
resolução e de ponderar corretamente, sem fazer concessões levianas ou abandonar o que é
correto.
Porém, em situações extremas, não há o que fazer para alterar o curso das coisas: pior, manter -
se numa determinada posição pode mesmo significar um envolvimento – ou compromisso – com a
causa dos problemas. Nessas situações, é melhor dar as costas ao mundo e seguir adiante. Se não
se pode combater o problema frontalmente, e se a arte do indireto não serve para a elucidação
daqueles envolvidos no erro, então, pôr-se a caminho não é covardia ou medo – é apenas a
constatação de que nada pode ser feito, e a dignidade real consiste em conter-se e ausentar-se do
contexto em erro.
No hexagrama 61 do Tratado das Mutações (Yijing), analisa-se a "verdade interior", a
autenticidade realizante, derivada da centralidade do indivíduo. A sexta linha, que conclui o
hexagrama, traz um comentário interessante: "O galo canta para o céu, mas não voa". Isso
significa: podemos denunciar os crimes, mas, se não pudermos voar, se não tivermos o poder e a
autoridade para corrigi-los, acabaremos só criando mais problemas. Portanto, nessas horas, por
mais certos que estivermos, precisamos nos conter e praticar a paciência com dignidade. Tolerar é
uma virtude; comedir-se, uma excelência. A covardia só existe quando alguém pode, de fato,
resolver uma questão, mas se ausenta, seja por medo ou por compromisso. Quando alguém
desconhece a própria força, deve cuidar-se para não confundir humildade com indulgência
perante os erros. A autoridade moral para enfrentar as indignidades é difícil de se obter, e a
paciência é confundida com covardia. Mas o buscador da sabedoria deve ter um compromisso,
antes de tudo, com o que é apropriado e consigo mesmo, não temendo a reprovação alheia. "Sem
princípios comuns é inútil discutir”, afirma Confúcio.
BUENO, André. Dignidade e paciência. Filosofia, ciência e vida. São Paulo: Editora Escala, Ed. 147,
fev., 2019. p. 54-55. [Adaptado].
Considere o trecho:
Isso significa: podemos denunciar os crimes, mas, se não pudermos voar, se não tivermos o poder
e a autoridade para corrigi-los, acabaremos só criando mais problemas.
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Na linguagem utilizada no trecho,
https://gabariteconcurso.com.br/questoes/55629-questao
Não faz muito que temos esta nova TV com controle remoto, mas devo dizer que se trata agora de
um instrumento sem o qual eu não saberia viver. Passo os dias sentado na velha poltrona,
mudando de um canal para outro — uma tarefa que antes exigia certa movimentação, mas que
agora ficou muito fácil. Estou num canal, não gosto — zap, mudo para outro. Não gosto de novo —
zap, mudo de novo. Eu gostaria de ganhar em dólar num mês o número de vezes que você troca
de canal em uma hora, diz minha mãe. Trata-se de uma pretensão fantasiosa, mas pelo menos
indica disposição para o humor, admirável nessa mulher.
Sofre, minha mãe. Sempre sofreu: infância carente, pai cruel etc. Mas o seu sofrimento aumentou
muito quando meu pai a deixou. Já faz tempo; foi logo depois que nasci, e estou agora com treze
anos. Uma idade em que se vê muita televisão, e em que se muda de canal constantemente,
ainda que minha mãe ache isso um absurdo. Da tela, uma moça sorridente pergunta se o caro
telespectador já conhece certo novo sabão em pó. Não conheço nem quero conhecer, de modo
que — zap — mudo de canal. “Não me abandone, Mariana, não me abandone!” Abandono, sim.
Não tenho o menor remorso, em se tratando de novelas: zap, e agora é um desenho, que eu já vi
duzentas vezes, e — zap — um homem falando. Um homem, abraçado à guitarra elétrica, fala a
uma entrevistadora. É um roqueiro. Aliás, é o que está dizendo, que é um roqueiro, que sempre foi
e sempre será um roqueiro. Tal veemência se justifica, porque ele não parece um roqueiro. É meio
velho, tem cabelos grisalhos, rugas, falta-lhe um dente. É o meu pai.
É sobre mim que fala. Você tem um filho, não tem?, pergunta a apresentadora, e ele, meio
constrangido — situação pouco admissível para um roqueiro de verdade —, diz que sim, que tem
um filho, só que não o vê há muito tempo. Hesita um pouco e acrescenta: você sabe, eu tinha de
fazer uma opção, era a família ou o rock.
A entrevistadora, porém, insiste (é chata, ela): mas o seu filho gosta de rock? Que você saiba, seu
filho gosta de rock? Ele se mexe na cadeira; o microfone, preso à desbotada camisa, roça-lhe o
peito, produzindo um desagradável e bem audível rascar. Sua angústia é compreensível; aí está,
num programa local e de baixíssima audiência — e ainda tem de passar pelo vexame de uma
pergunta que o embaraça e à qual não sabe responder. E então ele me olha. Vocês dirão que não,
que é para a câmera que ele olha; aparentemente é isso, aparentemente ele está olhando para a
câmera, como lhe disseram para fazer; mas na realidade é a mim que ele olha, sabe que em
algum lugar, diante de uma tevê, estou a fitar seu rosto atormentado, as lágrimas me correndo
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pelo rosto; e no meu olhar ele procura a resposta à pergunta da apresentadora: você gosta de
rock? Você gosta de mim? Você me perdoa? — mas aí comete um erro, um engano mortal:
insensivelmente, automaticamente, seus dedos começam a dedilhar as cordas da guitarra, é o
vício do velho roqueiro, do qual ele não pode se livrar nunca, nunca. Seu rosto se ilumina —
refletores que se acendem? — e ele vai dizer que sim, que seu filho ama o rock tanto quanto ele,
mas nesse momento zap — aciono o controle remoto e ele some.
Moacyr Scliar, “Zap”, in: Os cem melhores contos brasileiros do século. Sel. de Ítalo Moriconi. Rio
de Janeiro: Objetiva, 2000, pág. 555. Adaptado.
https://gabariteconcurso.com.br/questoes/55630-questao
6º Tive a primeira crise de enxaqueca aos 12 anos – e depois veio outra, e outra. A princípio, não
sabia o que era. Meus pais achavam que eu era só hipersensível à gripe, problema que eles
esperavam e eu dava como certo que ia superar. Adolescente motivada e dedicadíssima,
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acreditava que todas as portas estavam abertas para mim, em termos de carreira: astronauta,
médica, a primeira presidente mulher.
7º Foi só no primeiro ano em Yale que tive minha enxaqueca diagnosticada, quando também me
toquei de que não ia superá-la. As portas começaram a se fechar. O fato de ter que passar dias
seguidos sem poder me levantar parecia eliminar a possibilidade de carreira em uma profissão da
qual dependiam vidas – ou seja, a medicina cirúrgica estava fora de questão. Também desconfiei
que as enxaquecas crônicas atrapalhariam uma candidata à presidência muito antes de as dores
de cabeça de Michele Bachmann se tornarem manchete. Optei então pelo jornalismo.
8º Já faz mais de 20 anos que a enxaqueca ocupa um espaço central, ainda que indesejável, na
minha vida, meio como a irmã detestável que eu nunca tive. Ela também ajudou a moldar a
pessoa em que me tornei. E não só me ajudou a desenvolver uma tolerância bem alta à dor, como
a aperfeiçoar a técnica do vômito em jato. E, agora que me deparo com a perspectiva quase
inimaginável de me livrar da dor para sempre, começo a perceber que nem consigo imaginar a
vida sem ela.
9º A possibilidade do surgimento de um remédio “prodígio” gera emoções conflitantes por várias
razões. Para começar que, se tivesse sido inventado antes, eu poderia ter me tornado astronauta.
E se a solução é realmente tão simples – olha, seu organismo gera esse tal de peptídeo em
demasia, está aqui o remédio para inibir a produção –, fica difícil entender por que demorou tanto
para ser inventado.
10º A cura também representaria um novo fardo. Dizer que fiz o melhor que pude “apesar da
enxaqueca” livra a minha cara por tudo aquilo que não fiz, tipo tornar-me a primeira mulher na
presidência. Se esse medicamento funcionar, nada vai me impedir de fazer coisas excepcionais –
e, ao mesmo tempo, acabará com a desculpa para não as realizar.
11º Por outro lado, e se foi a enxaqueca que me ajudou a conquistar tudo o que consegui até
agora? Scott Sonenshein, professor da Faculdade de Administração Jones da Universidade Rice,
afirma que conseguimos realizar mais quando nossos recursos (no meu caso, a saúde) são
limitados do que quando são abundantes. “As restrições podem ser motivação para desenvoltura,
para a criatividade, estímulo para uma solução melhor dos problemas”, escreve ele em seu
livro, Stretch.
12º É fato que, graças à enxaqueca, aprendi muita coisa interessante e útil – como fazer todos os
meus trabalhos antes do prazo, para o caso de a dor de cabeça atacar na última hora. Fazer as
coisas apesar dela quando absolutamente necessário – e a pegar leve comigo mesma no resto do
tempo. Aprendi a pedir ajuda quando precisava. Será que a ausência da enxaqueca me fará
menos responsável, menos diligente? Ou fará com que eu me dedique em dobro, sabendo que não
vou acabar tendo uma dor paralisante se me esforçar demais? Tenho muitas perguntas em
relação a essa possível versão futura de mim mesma. (E uma para a Nasa: qual é o limite de idade
para o treinamento dos astronautas?)
13º É claro que, se uma crise de identidade é o preço para acabar com a dor debilitante no meu
cérebro, pagarei com muito prazer. Passei décadas sonhando com uma cura, geralmente deitada
no quarto escuro, com um saco de ervilhas congeladas contra o rosto. A surpresa é eu sentir
qualquer resquício de nostalgia em relação a esses tempos – mas percebo agora que uma parte
de mim sentirá saudades.
LATSON, Jennifer
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historia-deamor-23178050 Acessado em 16/03/2019.
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Outro aspecto associado ao abuso das telas e ao próprio excesso de peso é a má qualidade do
sono. Sem horários estabelecidos para dormir e acordar, muitas crianças descansam pouco ou
mal, situação propícia a desregular hormônios que controlam a fome e a saciedade e o
desenvolvimento do corpo. Tem mais: sono ruim gera cansaço, baixo rendimento escolar e
problemas emocionais. E aí chegamos a outro ponto crítico: a obesidade não compromete só a
saúde física, prejudica também o bem-estar mental e social.
“Algo que os pacientes trazem muito é a questão do preconceito. As crianças acima do peso são
humilhadas e responsabilizadas por seu problema”, repara a médica Maria Edna de Melo,
presidente da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica
(Abeso). Com a campanha “Obesidade, Eu Trato com Respeito”, a entidade procura esclarecer,
por exemplo, que recriminar a criança funciona apenas como fonte de estresse. “Obesidade
precisa de tratamento, não existe um botão de liga e desliga”, afirma Maria Edna.
Não é incomum, nesse contexto, que na convivência diária pais e cuidadores deixem de notar que
o pequeno está ganhando peso demais. Daí a necessidade de prestar atenção e acompanhar de
perto com o pediatra. Até porque, uma vez instalada a obesidade, mais difícil fica reverter o
quadro. “Sem uma atuação em conjunto, que envolva uma equipe interdisciplinar, a família e a
escola, não há como resolver”, avalia a educadora física Vera Lúcia Perino Barbosa, presidente do
Instituto Movere, em São Paulo.
Paula Desgualdo Revista Saúde é Vital. São Paulo: Editora Abril, setembro de 2018. (adaptado)
https://gabariteconcurso.com.br/questoes/55632-questao
De repente, do nada, uma preocupação surge na sua cabeça. Você começa a pensar naquilo,
imagina mil possibilidades, tenta prever o que pode ou não acontecer. Então a mente acelera e
começa a dar voltas em torno de si mesma: repete muitas e muitas vezes os mesmos cenários,
plausíveis ou absurdos, num ciclo impossível de interromper. Quando você percebe, ficou a noite
inteira em claro.
Todo mundo já passou por algo assim. A ansiedade faz parte da vida moderna. Sua forma
patológica, o transtorno de ansiedade, é a segunda doença mental mais comum no planeta:
segundo dados da OMS, 264 milhões de pessoas sofrem desse mal – 14,9% a mais do que dez
anos atrás. E o Brasil é o centro mundial do problema: 9,3% da população tem transtorno de
ansiedade, quase o triplo da média internacional (3,5%). Na cidade de São Paulo, um estudo feito
pela USP chegou a números ainda mais impressionantes: nada menos que 19,9% das pessoas têm
a doença. Por ano, são vendidos 26,8 milhões de caixas do ansiolítico Rivotril (e demais remédios
à base de clonazepan) no Brasil, segundo dados da empresa IQVIA, que audita o mercado
farmacêutico. Seu consumo teve um crescimento de quase 300% na última década (em 2010, os
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brasileiros compraram aproximadamente 10 milhões de caixas desse remédio).
Nunca estivemos tão ansiosos – e, como você talvez já tenha percebido, isso não está nos fazendo
bem. Mas a ansiedade pura e simples não é um transtorno. É uma estratégia bem-sucedida, que
há centenas de milhares de anos tem garantido nossa sobrevivência.
A gênese da ansiedade
Na savana africana, com suas grandes planícies, poucas árvores e muita vida animal, os humanos
viviam vulneráveis ao ataque dos leões, leopardos, cobras e hienas. Se não fossem comidos por
predadores, nossos antepassados tinham que se preocupar com outra ameaça: fome. A comida
era incerta, pois eles dependiam da sorte na coleta e na caça.
Uma das estratégias de sobrevivência foi viver em grupos. Mas a vida comunitária trouxe novos
problemas. Era preciso fazer força para ser aceito pelo grupo, e não acabar marginalizado ou
mesmo expulso dele. O convívio também levava a disputas, geralmente resolvidas por meio da
violência: pesquisas arqueológicas revelaram que os primeiros grupos humanos tinham altíssimas
taxas de homicídio: 15% das pessoas morriam assassinadas.
Em suma, a vida era dura. E as pessoas que tiveram mais êxito em sobreviver e gerar
descendentes, passando seus genes adiante, foram as mais capazes de antecipar as ameaças de
predadores, fome, rejeição do grupo e violência. Ou seja, os mais ansiosos.
Hoje, é rara a pessoa que precise proteger-se de cobras e leões. Graças a seu intelecto, o ser
humano transformou o mundo. Dominamos predadores, vencemos doenças, produzimos até mais
comida do que o necessário e criamos leis para controlar e conter a violência (hoje, os homicídios
são responsáveis por 0,005% das mortes no mundo). A vida nunca foi tão confortável, pacífica e
próspera. Mas a ansiedade não desapareceu. Temos novas preocupações – o assaltante no
trânsito, as contas de casa, a manutenção do emprego, a solidão, a quantidade de curtidas nas
redes sociais etc. O mundo mudou, mas os medos não desapareceram; se transformaram.
Ansiedade e medo são intimamente ligados – ambos são estados aversivos engatilhados por uma
ameaça. Mas o medo é provocado por um estímulo imediato, aqui e agora, como um assaltante
armado. Já a ansiedade emerge diante de uma ameaça futura, que poderá ou não se concretizar –
como aqueles pensamentos que vêm à cabeça ao andar numa rua escura de madrugada. Se o
medo prepara o corpo para agir imediatamente, a ansiedade nos motiva a evitar a ameaça futura,
fazer preparações para ela ou agir para que não ocorra. O que pode acontecer se eu andar numa
rua vazia e mal iluminada, de madrugada? Há algum canto de onde pode aparecer um assaltante?
Se surgir alguém devo sair correndo? Essa antecipação de consequências envolve o córtex pré-
frontal – a região mais desenvolvida do cérebro humano.
“É provavelmente impossível sentir medo sem também sentir-se ansioso”, afirma o neurocientista
americano Joseph LeDoux, autor do livro Anxious(não lançado no Brasil). Afinal, basta ter medo de
uma coisa para começar a se preocupar com as consequências dela. “Ver uma pessoa com uma
arma induz ao sentimento de medo. Mas a preocupação ou ansiedade rapidamente toma a
dianteira, quando você passa a imaginar o que aquela pessoa vai fazer”, diz LeDoux. Da mesma
forma, quando você está ansioso e vai caminhar em uma rua escura, pode sentir medo com algo
que passaria batido – como uma sombra ou o barulho de um galho quebrando.
Nossas mentes são propensas à ansiedade. Ela nos trouxe até aqui porque, no grau certo, é
benéfica. Mas certas características da vida nas cidades parecem ter dado um curto-circuito nesse
mecanismo.
Reportagem de Maurício Horta Revista Superinteressante. São Paulo: Abril, edição 399, fevereiro
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de 2019. (adaptado)
https://gabariteconcurso.com.br/questoes/55633-questao
a) Se a linguagem era figurada no início, acata-se que as palavras ultrapassavam seu sentido
comum.
b) Munido de instrumentos pontiagudos, o homem primitivo esculpia as letras nas pedras e
formava vocábulos.
c) Com a criação de alfabetos, a comunicação evoluiu, visto que se tornou mais exata e
simplificada.
d) Pode-se substituir a expressão “a cerca de” por “sobre”, sem perda do sentido original.
https://gabariteconcurso.com.br/questoes/55634-questao
O professor Pardal gostava muito do Huguinho, do Zezinho e do Luizinho e queria fazê-los felizes.
Inventou, então, brinquedos que os fariam felizes para sempre, brinquedos que davam certo
sempre: uma pipa que voava sempre, um peão que rodava sempre e um taco de beisebol que
acertava sempre na bola. Os três patinhos ficaram felicíssimos ao receber os presentes e se
puseram logo a brincar com seus brinquedos que funcionavam sempre.
Mas a alegria durou pouco. Veio logo o enfado. Porque não existe nada mais sem graça que um
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brinquedo que dá certo sempre. Brinquedo, para ser brinquedo, tem de ser um desafio. Um
brinquedo é um objeto que, olhando para mim, me diz: “Veja se você pode comigo!”. O brinquedo
me põe à prova. Testa as minhas habilidades. Qual é a graça de armar um quebra-cabeça de 24
peças? Pode ser desafio para uma criança de 3 anos, mas não para mim. Já um quebra-cabeça de
500 peças é um desafio. Eu quero juntar as suas peças! Para isso, sou capaz de gastar meus
olhos, meu tempo, minha inteligência, meu sono.
Qualquer coisa pode ser um brinquedo. Não é preciso que seja comprado em lojas. Na verdade,
muitos dos brinquedos que se vendem em lojas não são brinquedos precisamente por não
oferecerem desafio algum.
Que desafio existe numa boneca que fala quando se aperta a sua barriga? Que desafio existe num
carrinho que anda ao se apertar um botão? Como os brinquedos do professor Pardal, eles logo
perdem a graça. Mas um cabo de vassoura vira um brinquedo se ele faz um desafio: “Vamos,
equilibre-me em sua testa!”. Quando era menino, eu e meus amigos fazíamos competições para
saber quem era capaz de equilibrar um cabo de vassoura na testa por mais tempo. O mesmo
acontece com uma corda no momento em que ela deixa de ser coisa para se amarrar e passa a
ser coisa de se pular.
Laranjas podem ser brinquedos? Meu pai era um mestre em descascar laranjas sem arrebentar a
casca e sem ferir a fruta. Para o meu pai, a laranja e o canivete eram brinquedos. Eu olhava para
ele e tinha inveja. Assim, tratei de aprender. E ainda hoje, quando vou descascar uma laranja, ela
vira brinquedo nas minhas mãos ao me desafiar: “Vamos ver se você é capaz de tirar a minha
casca sem me ferir e sem deixar que ela arrebente”.
Há brinquedos que são desafios ao seu corpo, à sua força, à sua habilidade, à sua paciência. E há
brinquedos que são desafios à inteligência. A inteligência gosta de brincar. Brincando, ela salta e
fica mais inteligente ainda. Brinquedo é tônico para a inteligência. Mas se ela tem de fazer coisas
que não são desafio, ela fica preguiçosa e emburrecida.
Todo conhecimento científico começa com um desafio: um enigma a ser decifrado! A natureza
desafia: “Veja se você me decifra!”. E aí os olhos e a inteligência do cientista se põem a trabalhar
para decifrar o enigma. Assim aconteceu com Johannes Kepler (15711630), cuja inteligência
brincava com o movimento dos planetas. Assim aconteceu com Galileu Galilei (1564-1642), que,
ao observar a natureza, tinha a suspeita de que ela falava uma linguagem que ele não entendia.
Pôs-se, então, a observar e a pensar (ciência se faz com essas duas coisas, olho e cérebro!) até
que decifrou o enigma: a natureza fala a linguagem da matemática! E até hoje os cientistas
continuam a brincar o mesmo brinquedo descoberto por Galileu.
Aconteceu assim também com um monge chamado Gregor Johann Mendel (1882-1962). No seu
mosteiro havia uma horta onde cresciam ervilhas. Os outros monges, vendo as ervilhas,
pensavam em sopa. Mas Mendel percebeu que elas escondiam um segredo. E ele tanto fez que
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acabou por descobrir o segredo que nos revelou o incrível mundo da genética. E não é esse
mesmo jogo que faz a criança que está começando a aprender a ler? Ela olha para as letras-
ervilhas e tenta decifrar a palavra que elas formam. Tudo é brinquedo!
Rubem Alves
https://institutorubemalves.org.br/wp-content/uploads/2018/08/2002.12.17.pdf
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BANDEIRA, M. Estrela da vida inteira: poesias reunidas. Rio de Janeiro: José Olympio, 1980.
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