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São Paulo
2023
EVELYN ARIANE LAURO
Versão original
Área de Concentração:
Estudos Culturais
Orientador:
Prof. Dr. Rogério Monteiro de Siqueira
São Paulo
2023
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio convencional ou
eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.
Área de Concentração:
Estudos Culturais
Banca Examinadora
Agradeço às amigas e amigos pela paciência, pela escuta, pelas trocas, pelo apoio e
incentivo, pela colaboração, por dedicarem tempo para me ajudar, cada qual a sua maneira, na
tarefa difícil de equilibrar os pratos da vida acadêmica e profissional. Em especial: Camila
Aderaldo, Célia de Almeida, David Costa, Fiorella Bugatti, Lidia Ananda, Ligia Perroni,
Lourdes Silva, Luiza Magalhães, Vilma Campos, e Zé Motta. Tenho a honra e o privilégio de
poder dizer que nunca estive só, e isso tornou a tarefa mais leve e, em muitos momentos,
divertida. Foi um prazer partilhar com vocês mais essa etapa.
Agradeço ao professor Rogério Monteiro por ter sido um orientador-incentivador
empático, paciente e objetivo. Professor, sua postura é pura potência criadora, é a prova de
que é possível produzir em contextos duros sem abrir mão da leveza, do prazer criativo, da
amabilidade e da cortesia. Obrigada por tornar isso possível.
“Gostaria de já deixar registrado aqui que se trata de um partido que
tomo, que não respondo por ninguém, apesar de não me encontrar
de todo despertencida, que não falo por boca nenhuma, apesar de
não ser uma voz sem eco. Divido visões…”
(SILVA, 2019, p. 48)
RESUMO
Pelo desejo de ver ampliada a participação e como exercício de análise das práticas
para a acessibilidade universal, procuro compreender, sobretudo a partir do contexto de sua
reabertura em 2021, que espaço o Museu da Língua Portuguesa garantiu a vozes da
comunidade de pessoas trans. Além disso, analiso os limites da representação e da
participação deste grupo social na programação e nos espaços expositivos do Museu. Para
tanto, apresento o debate sobre inclusão e acessibilidade no campo museológico, no geral, e
indico como isso está posto no Museu da Língua Portuguesa, em específico; discuto o
processo de renovação do papel dos museus no século XXI a partir das demandas sociais que
vem tensionando as instituições a olhar para a questão das identidades e da diversidade social,
no mesmo contexto político que fomenta o fortalecimento de discursos conservadores que
legitimam projetos como o “Escola Sem Partido” e suscitam perseguição ideológica contra
instituições culturais; e, por fim, avalio se, contudo, o Museu conseguiu visibilizar, valorizar
e positivar as memórias das pessoas trans ou se ele cumpre a responsabilidade social de
garantir essa presença “diversa”, mas de forma a reforçar os estereótipos que as mantêm na
invisibilidade e vulnerabilização.
LAURO, Evelyn Ariane. Accessibility and Social Inclusion: The presence of trans people at
the Portuguese Language Museum. 2023. 133 f. Dissertation (Master of Philosophy) - School
of Arts, Sciences and Humanities, University of São Paulo, São Paulo, 2023. Original version.
By the desire to see participation widened and as an exercise of analysis of practices for
universal accessibility, I seek to understand, especially from the context of its reopening in
2021, what space the Portuguese Language Museum has guaranteed to the voices of the
transgender community. In addition, I analyze the limits of representation and participation of
this social group in the programming and exhibition spaces of the Museum. For this, I present
the debate on inclusion and accessibility in the museological field, in general, and I indicate
how this is seen in the Portuguese Language Museum, specifically; I discuss the process of
renewal of the role of museums in the twenty-first century from the social demands that have
been straining institutions to look at the issue of identities and social diversity, in the same
political context that encourages the strengthening of conservative discourses that legitimize
projects such as the "School Without Party" and raise ideological persecution against cultural
institutions; and, finally, I evaluate if, however, the Museum has managed to make visible,
value and positivize the memories of trans people or if it fulfills the social responsibility of
ensuring this "diverse" presence, but in a way that reinforces the stereotypes that keep them in
invisibility and vulnerability.
1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................13
1.1 Uma digressão pessoal.................................................................................................. 17
1.2 O Museu da Língua Portuguesa e a questão trans........................................................ 20
2 ACESSIBILIDADE E INCLUSÃO: ONDE A HISTÓRIA DA LUTA POR
INCLUSÃO E A MUSEOLOGIA SE ENCONTRAM....................................................... 24
2.1. Acessibilidade, inclusão e interseccionalidade na luta pelos direitos humanos do
século XX............................................................................................................................25
2.2. Dos gabinetes de curiosidade à nova definição do ICOM: acessibilidade e inclusão
como desafio para os museus do século XXI..................................................................... 27
2.3. Acessibilidade e inclusão no novo Museu da Língua Portuguesa.............................. 35
3 REPRESENTAÇÃO, SIGNIFICAÇÃO E PODER: MUSEU COMO ESPAÇO DE
MEMÓRIA EM DISPUTA.................................................................................................... 46
3. 1 O Museu e a questão nacional......................................................................................47
3.2 Museu no século XXI: arena de discussão sobre raça, gênero, classe e outros
marcadores de diferença social........................................................................................... 53
3.3 Gênero como lugar perigoso......................................................................................... 60
4 A PRESENÇA TRANS NO MUSEU DA LÍNGUA PORTUGUESA.............................75
4.1 Língua Viva: O terceiro pavimento do Museu, segundo da exposição principal..........78
4.2 Viagens da Língua: O segundo pavimento do Museu, primeiro da exposição principal..
86
4.3 Presença trans nas exposições temporárias e programação virtual...............................91
4.4 Presença trans no quadro funcional do Museu..............................................................96
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................. 98
REFERÊNCIAS.................................................................................................................... 102
ANEXO A – CLIPPING IDBRASIL - MUSEU DA LÍNGUA PORTUGUESA............ 109
13
1 INTRODUÇÃO
Após negar o que lhe foi atribuído ao nascer e decidir expressar o gênero com o qual
se identifica, a pessoa trans1 passa a viver um processo de exclusão sistematizado, no qual a
morte é o limite trágico. Segundo a ONG Internacional Transgender Europe, o Brasil é o país
com o maior número de assassinatos de pessoas trans em todo o mundo. Segundo a
organização, entre outubro de 2020 e setembro de 2021, ocorreram 152 casos no Brasil e 65
no México, país que fica com a segunda posição no ranking. Segundo a pesquisa, ao todo
foram registrados 375 assassinatos de pessoas transgênero pelo mundo nesse período, o que
faz com que o Brasil esteja na liderança pelo décimo terceiro ano consecutivo, sendo
responsável, sozinho, por 40,5% dos casos2. Dados mais atualizados demonstram que o Brasil
se mantém na mesma posição. Segundo relatório publicado pela ANTRA (Associação
Nacional De Travestis e Transexuais do Brasil),
em 2022, tivemos pelo menos 151 pessoas trans mortas, sendo 131 casos de
assassinatos e 20 pessoas trans suicidadas. A mais jovem trans assassinada tinha 15
anos, e vimos um acirramento na patrulha contra crianças e adolescentes trans,
sendo inclusive vítimas de violências dentro do ambiente escolar. E embora haja
uma leve queda em relação a 2021, o perfil das vítimas se manteve o mesmo. Chama
atenção o país figurar novamente como o que mais consome pornografia trans nas
plataformas digitais de conteúdo adulto no mesmo momento em que o Brasil figura
como o país que mais assassinou pessoas trans pelo 14º ano consecutivo (Benevides,
2023, p.06).
1
Redução da palavra transgênero. Termo guarda-chuva que se refere aos indivíduos que não se identificam com
o gênero que lhe foi atribuído ao nascer. (ANTRA - Associação Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil).
2
Os dados da pesquisa estão disponíveis em: <https://transrespect.org/en/tmm-update-tdor-2021/>. Acesso em
21 de fevereiro de 2022.
14
desses fatores faz com que 90% dessas pessoas sobrevivam de empregos informais, sobretudo
da prostituição3 - onde também constroem suas redes de sociabilidade e solidariedade -,
quadro agravado no contexto de pandemia4.
Neste contexto, assim como acontece com outras minorias sociais, historicamente, as
narrativas sobre essa parcela da sociedade foram construídas a partir do olhar e da prática
discursiva exteriores à sua comunidade de pertencimento. Isso produz uma determinada
imagem no imaginário coletivo, distorcida, por vezes romantizada, patologizada e/ou
criminalizada, alimentando estereótipos ou criando um novo padrão e, consequentemente, um
novo círculo de exclusão àquela parcela da comunidade que não o corresponda. Apontando
para essa realidade, Juliana Perucchi, no prefácio do livro Transfeminismo: Teorias e
Práticas, reagindo aos trabalhos de Judith Butler, nos diz que "as pessoas que não têm
oportunidade de representar a si mesmas correm um grande risco de serem vistas como menos
3
Dados disponíveis em:
Transrespect versus Transphobia Worldwide. TVT TMM Update: Trans day of remembrace 2021. Disponível
em: <relatc3b3rio-mapa-dos-assassinatos-2017-antra.pdf>. Acesso em 21 de fevereiro de 2022.
4
Pesquisa recente desenvolvida pela Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo
demonstra o agravamento da situação no contexto atual. Disponível em:
<https://www.cnnbrasil.com.br/business/seis-em-cada-10-pessoas-lgbtqia-perderam-renda-ou-emprego-na-pande
mia/>. Acesso em 21 de fevereiro de 2022.
15
humanas, de serem tratadas como menos humanas, ou mesmo, de nem serem vistas"
(PERUCCHI, In: JESUS, 2004, p. 13).
Debatendo essa questão no campo das artes, Helena Vieira5, na mesa de debate As
Artes e Artistas Trans: Uma Reflexão Sobre Representatividade em evento organizado por
[SSEX BBOX] e Itaú Cultural6, aponta que a população trans, seguindo a tendência dos que
vivem em todas as outras esferas da sociabilidade humana, vive a exclusão na arte. Na opinião
dela, a ideia de inclusão praticada é, em esmagadora maioria dos casos, uma proposta de
representatividade precária. Precária porque indica a existência dessas pessoas, mas não
permite que elas participem de forma a transformar suas próprias realidades. Precária quando
a pessoa trans é representada na novela por um ator ou uma atriz cisgênero, precária quando a
pintura, a música, a poesia trazem a imagem do corpo trans não produzida por quem carrega
essa corporeidade. Precária quando exclui as pessoas trans do processo de criação da
representação e que não contribui com a transposição da barreira que impede que essas
pessoas transitem pelos espaços de produção e de circulação da arte. E, neste sentido, a
construção de representabilidade agiria contra os mecanismos artificiais de inclusão; a
auto-representação teria como efeito a construção de um discurso plural que garantiria a essas
pessoas o direito de falar sobre si mesmas, de produzir discurso sobre si que condiga com
suas experiências reais, de fazer circular maior diversidade narrativa.
5
Helena Vieira é travesti, artista, educadora e pesquisadora de Teoria Queer. Escritora, dramaturga, consultora
(tendo sido inclusive consultora para a novela global A Força do Querer), palestrante, tem o campo das
representações como uma de suas áreas de pesquisa. Seu currículo profissional pode ser consultado em:
Currículo de Helena Vieira.Disponível em:
<https://mapacultural.secult.ce.gov.br/files/agent/34974/curr%C3%ADculo_helena_vieira.pdf>. Consultado em:
19 de março de 2022.
6
VIEIRA, Helena. As artes e artistas trans: uma reflexão sobre representatividade. In: Todos os Gêneros:
Circuito [SSEX BBOX]. Itaú Cultural: São Paulo, 2017.
16
ensinaram a associar toda a África às misérias de todas as ordens; assim como nos ensinaram
a sentir pena e orgulho das pessoas com deficiência, como grandes exemplos de superação; e
nos ensinaram a associar pessoas trans, sobretudo mulhers transgênero e travestis, ao crime e
à prostituição e, consequententemente, às Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST). Basta
uma pesquisa rápida a partir da palavra “travesti” nos sites de busca para entender a lógica de
criação e reprodução de história única discutida por Chimamanda. O que teremos como
resultado é, majoritariamente, notícias sobre homicídios onde a pessoa trans é a vítima, na
maioria das vezes com requintes de crueldade; crimes de menor gravidade onde a pessoa trans
é a executora; e material pornográfico. Nas palavras de Chimamanda: “É assim que se cria
uma história única: mostre um povo como uma coisa, uma coisa só sem parar, e é isso que
esse povo se torna” (2019, p. 22). E aqui Chimamanda e a pesquisadora indiana Gayatri
Chakravorty Spivak, para quem o sujeito subalterno é, também, efeito do discurso (SPIVAK:
2010), parecem concordar. No entanto, Chimamanda nos lembra que a vulnerabilização não é
a história única de ninguém.
A perspectiva discursiva na elaboração de identidades é objeto de análise dos Estudos
Culturais há muitos anos. No clássico estudo sobre representação, Orientalismo: O Oriente
como invenção do Ocidente, publicado pela primeira vez em 1978, Edward Said, observa que
é preciso praticar certo pensamento crítico para romper com a lógica que inventa, com
eficácia assassina, identidades coletivas a partir da relação entre saber e poder. Na perspectiva
dele, o conhecimento sobre o objeto, essa forma de representação a partir da autoridade
erudita e científica, se torna o próprio objeto e, numa relação desigual de forças, a autoridade
silencia o outro por ela criado, falando por ele, produzindo e reiterando relações de
dominação (SAID, 2003, pp. 63 - 74).
Antes mesmo de Said, Frantz Fanon, em 1952, publicou sua recusada tese de
doutorado em psiquiatria sobre os efeitos da estrutura colonial nas pessoas negras, na
perspectiva das subjetividades. Num processo análogo ao descrito por Said, e mais tarde por
Spivak e Chimamanda, Fanon denuncia à sua época que “aquilo que é chamado de alma negra
é uma construção do branco” e aponta para a necessidade da desalienação a que esse processo
colocou o negro, de “epidermização” de uma inferioridade em relação ao branco (FANON,
2020, p. 28) .
Os três estudos clássicos e a perspectiva contemporânea de Chimamanda denunciaram
e atualizam a denúncia de que identidades são criadas e reiteradas por estruturas dominadoras
(a mulher, a mulher indiana, a mulher negra, o Oriente, o oriental, o homem negro, o
17
antilhano, etc.) e que só o rompimento com o silêncio a que foram submetidos os grupos
subalternizados, só com a circulação de contranarrativas, será capaz de reequilibrar a balança
de poder. Como Observa Eni Punccinelli Orlandi (2017, p. 55),
símbolos imperiais para entender como aquela parcela do território passou a se reconhecer
como brasileira. Mais uma vez, a identidade.
No campo da museologia, uma questão me incomodou por anos: Desde quando tive
contato com o debate sobre lugares de memórias difíceis e memória traumática,
imediatamente formei uma lista mental de lugares com tais características e dentre eles, ao
menos na minha concepção, estava o Museu da Imigração do Estado de São Paulo. Tamanha
foi minha surpresa ao perceber que a bibliografia a respeito não o analisava a partir desta
perspectiva. Eu acreditava ser consenso que a experiência migratória se relaciona intimamente
com dor, com trauma e, consequentemente, produz memórias difíceis.
No entanto, algo seguia me incomodando: Por que, em pleno século XXI, nossos
museus ainda têm dificuldade, ou se negam a tratar de aspectos violentos da história? Como
ainda são reproduzidos discursos que negam lugar de fala para as camadas oprimidas? Se elas
pudessem ocupar discursivamente esses lugares, a violência não apareceria?
Fui contratada pelo Museu da Língua Portuguesa para ser articuladora social, uma
novidade no campo. Explico melhor mais abaixo, mas vale dizer que a missão do cargo é
garantir acesso qualificado de todos os públicos, com foco em ações no território onde o
Museu está inserido. Os trabalhos começaram, em dezembro de 2020, e percebo, de saída, que
uma das expectativas da gestão da instituição foi a estruturação da política interna no que diz
respeito à diversidade social e cultural, sobretudo no que tange raça, classe, gênero,
habilidades físicas e mentais. Na primeira visita ao Museu, me deparo com uma grande
instalação composta por personagens negras, deficientes, indígenas, crianças, velhas, gordas,
travestis. Tinha coisa boa ali. Percebo, de saída, uma presença marcante de pessoas trans, o
que era novidade pra mim, que percorro o campo museológico há quase duas décadas.
Considerando que,
através de imagens e objetos, visando fabricar uma imagem ideal da realidade e suas
dimensões. Logo, ao analisarmos exposições museológicas e as representações nelas
recorrentes, é necessário entender a construção destas representações como um
processo histórico, buscando compreender também, a abordagem baseada nas
imagens oficialmente construídas, e consequentes inclusões e exclusões realizadas
(CUNHA, 2008, pp. 158-9),
propomos, então, sob a perspectiva dos Estudos Culturais, da Museologia e da História, por
meio da análise de discurso e da pesquisa exploratória e descritiva, um olhar crítico para a
instituição de forma a expor os limites da representação e da participação deste grupo social.
Dos Estudos Culturais, adoto a análise e a crítica das representações sociais hegemônicas; da
Museologia, o arcabouço teórico no que diz respeito à relação entre a sociedade e este modelo
de equipamento e suas transformações ao longo da história recente; e da História, a
metodologia de acesso, gestão e interpretação de fontes para a ancoragem da análise das
representações como processos históricos.
2022; documentar a história recente do Museu da Língua Portuguesa nessa nova etapa de
operação; mas, sobretudo, reforçar o coro de que inclusão é ação, somando energia aos
debates que apontam para a importância da presença dos sujeitos subalternizados nos espaços
discursivos como ferramenta para a superação de desigualdades e pela garantia de direitos
políticos, sociais e culturais numa perspectiva macro, tomando como referência a inclusão de
pessoas trans no Museu da Língua Portuguesa.
7
Ela se refere aos artigos Orientação Sexual na Identidade de Gênero a Partir da Crítica da Heterossexualidade
e Cisgeneridade Como Norma, de Beatriz Bagali, e Orientações Sobre Identidade de Gênero: Conceitos e
Termos - Guia Técnico Sobre Pessoas Transexuais, Travestis e Demais Transgêneros, Para Formadores de
Opinião, de Jaqueline Gomes de Jesus.
24
tenha espaço de expressão equânime, o totem firma um compromisso com o público e marca,
num discurso de acolhimento, o papel social que a instituição quer ocupar, o de museu
inclusivo. No entanto, se compromisso indica ação para o futuro, marcar inclusão e
acessibilidade como compromissos institucionais aponta para o fato de que há muito por ser
realizado. Neste sentido, a própria presença do texto indica que o binômio acessibilidade e
inclusão ainda é projeto e não realidade das instituições do tipo museu, e que aquela que ousa
percorrer esse caminho é, de alguma forma, exceção e merece ser destacada das demais.
Isso posto, o presente capítulo tem por objetivo localizar o debate sobre inclusão e
acessibilidade no campo museológico, no geral, e expor como isso está posto no Museu da
Língua Portuguesa, em específico. Para tanto, se faz necessário antes resgatar o contexto em
que o problema se torna um movimento social de impacto global. É por aí que começaremos.
Ainda tomando Sassaki (2007) como referência, entendemos que desde a década de
1960, o caldo de luta por inclusão e defesa de direitos civis da pessoa com deficiência é
engrossado pela resistência à política do apartheid. Tendo os anos de 1980 como ponto
nevrálgico, as revindicações das pessoas com deficiência precisaram ser postas no contexto de
libertação, uma vez que as lutas pela libertação do povo negro produziram como uma de suas
consequências o aumento significativo no número de pessoas com deficiência na África do
Sul. Essa relação entre as lutas pelos direitos civis das pessoas com deficiência e a lutas pelos
direitos civis dos negros colocou em perspectiva que os obstáculos para a plena participação
atravessavam a realidade de diversos grupos sociais e que, portanto, precisavam ser encarados
interseccionalmente. Assim, o racismo, o sexismo, o colonialismo e o capacitismo passaram a
ser reconhecidos como fundantes das estruturas atitudinais das múltiplas formas de exclusão
social. Neste sentido, Santos (2009) e Morais (2013), defendem que todo processo de luta que
se dá no campo social se relaciona à luta por inclusão.
No início da década de 90, a inclusão visava apenas as pessoas com deficiência que
foram (são, serão) rejeitadas, excluídas, segregadas e parcialmente integradas por
motivo de deficiência. Mas, a partir de 2000, o paradigma inclusivo ampliou o seu
público-alvo, recebendo também as pessoas sem deficiência que estivessem em
situação de rejeição, exclusão, segregação e integração parcial (SASSAKI;
MORAIS, 2021, p. 23).
Isso explica, ao menos em parte, o porquê de, mesmo que, como nos lembra Viviane
Sarraf, “os benefícios alcançados pela luta das pessoas com deficiência privilegiaram outras
parcelas da população socialmente excluídas como afro-descendentes, homossexuais e
27
O processo histórico que levou ao despertar das instituições museológicas para esse
desafio é o que pretendemos expor abaixo.
Neste sentido, considerando o papel social do museu, o que se espera com uma
política de acessibilidade é que a instituição corrobore para a consolidação do paradigma que
28
reconhece a diversidade epistêmica mundial, e que contribua para que ela se reflita em seu
interior, de maneira universal e não apenas focada na programação associada às efemérides,
onde tradicionalmente a diversidade ocupa espaço temporário. Esta postura - de encarar o seu
universal particular, ou seja, de pensar as suas políticas de acessibilidade para todos os seus
públicos, internos e externos-, caminha em paralelo com os debates que propõem a revisão de
uma história universal, canônica, característica dos museus modernos. Ao adotar uma política
que pretenda eliminar as barreiras atitudinais e ampliar o conceito de acesso, conforme
exposto ao longo dessa pesquisa, o museu também legitima as muitas outras histórias que
foram e ainda são negligenciadas pela epistemologia dominante.
Conforme nos aponta Viviane Sarraf, “os museus e instituições culturais, desde a
segunda metade do século XX, movem esforços para afirmar seu caráter de agente de
desenvolvimento social negando sua ligação de origem com as elites e com o poder, por meio
do trabalho centrado no indivíduo e nas comunidades” (2008, p. 11), e , o objetivo deste
capítulo é justamente percorrer, de forma sucinta, esse percurso que leva do colecionismo
colonialista ao museu social.
Para o caso brasileiro, inaugurada em 1818 com a criação do Museu Nacional no Rio
de Janeiro, é importante apontar que a prática preservacionista segue a tendência europeia e,
29
Até aqui, museu era entendido como espaço do intocável, no que reconhecemos como
Museologia Tradicional, o que perdurou até meados dos anos de 1960. A revolução cultural
de 1968 reverbera nos museus primeiro enquanto pressão pela sua superação/destruição em
nome da valorização da cultura popular, depois como movimento por sua renovação, de forma
a fazer com que a instituição do tipo museu responda às demandas da sociedade (DEBORD,
1997). Contexto que leva o museu a se converterem em espaço de contestação (RESENDE,
2002). Como resultado, o objeto passa a dividir espaço com o humano, colocando o público
no centro do paradigma museológico, contexto no qual é reconhecido o caráter (e a
responsabilidade) educativo do museu. É a Nova Museologia.
Essa nova perspectiva em relação ao papel dos museus abre caminho para a
Sociomuseologia, que, nas décadas de 1970 e 80, inaugura os debates sobre sustentabilidade,
igualdade e diversidade em museus; e para a Museologia Social, que, a partir da década de
1990, defende que o museu é, e tem que ser, um equipamento a serviço da sociedade
contemporânea.9 Nas palavras de Primo,
8
Esse debate foi apresentado anteriormente em: Lauro, E. A., & Menezes, M. A. (2021). O Museu da Imigração
do Estado de São Paulo e as memórias de violência. Museologia &Amp;Interdisciplinaridade, 10(20), 267–283.
Recuperado de https://periodicos.unb.br/index.php/museologia/article/view/36422
9
Neste sentido, a museologia conta com marcos temporais/ documentos de referência na mudança do estatuto
social dos museus:
• Carta do Rio de Janeiro (1958) – Influência dos conceitos de Paulo Freire para defesa do papel e compromisso
educativos dos museus;
• Declaração de Santiago do Chile (1972) – criação dos conceitos de Museu Integral (museu comprometido com
as questões sociais de seu tempo), Ecomuseus e Museus Comunitários (relacionados a territórios e
comprometidos com o desenvolvimento social),
• Código de Ética do ICOM (1974) – Museus a serviço da sociedade e de
seu desenvolvimento;
• Declaração de Quebec e criação do MINOM – Movimento Internacional
pela Nova Museologia (1984);
• Declaração de Caracas (1992) – Focada na realidade latino-americana, aponta museu como meio de
comunicação integrado à comunidade;
• Declaração de MINOM - Rio de Janeiro (2013) - Reafirma princípios da Museologia Social, o direito à
diferença e a autonomias dos museus em favorecimento aos movimentos sociais;
• Recomendação da Unesco à Promoção dos Museus e das coleções, da sua Diversidade e do seu Papel na
Sociedades (2015).
30
O ICOM é uma organização não governamental com sede em Paris criada em 1946,
no contexto de efervescência dos debates relacionados ao bem estar e aos direitos humanos,
no qual se incluem os movimentos pelos direitos das pessoas com deficiência e de outras
minorias, como exposto acima. Segundo o site com ICOM Brasil, o Conselho
mantém relações formais com a UNESCO, executando parte de seu programa para
museus, tendo status consultivo no Conselho Econômico e Social da ONU.
Executivo, integrado por membros eleitos nas Assembleias que se realizam nas
Conferências Gerais. Seu Conselho Consultivo é integrado por representantes dos
Comitês Nacionais, dos Comitês Internacionais e das Organizações Regionais. Os
afiliados participam de atividades de 117 Comitês Nacionais e 31 Comitês
Internacionais. Participam ainda do ICOM 15 associações internacionais afiliadas.
A primeira ação concreta para mudar a definição oficial de museu ocorreu entre 1998
e 2001. Com a colaboração de profissionais de diversos países, os debates em torno da
questão produziram, apenas em 2006, uma nova definição, que inclui o público e seu caráter
diverso: “Um museu é uma instituição permanente, sem fins lucrativos, a serviço da
sociedade e de seu desenvolvimento, aberta ao público, que adquire, conserva, pesquisa,
divulga e expõe, para fins de estudo, educação e lazer, testemunhos materiais e imateriais dos
povos e seu ambiente”.(ICOM, 2006, p.06. In: SARRAF, op. cit, p. 63). Essa definição entrou
em vigor em 2007 e esteve vigente até o ano de 2022.
estes desenvolvam plenamente sua função atribuída no século XXI pelo ICOM – a
de se transformar em agentes de desenvolvimento social (SARRAF, idem).
O fim da segunda década do século XX indicou que a definição de 2006 não mais
respondia à realidade que o museu partilhava com as sociedades, e, neste sentido, a 24ª
Conferência Geral do ICOM, em 2016, teve com um dos principais debates a necessidade de
atualizá-la, respondendo aos novos desafios do mundo contemporâneo. Nesta ocasião, foi
instituído o comitê MDPP (Standing Committee for Museum Definition, Prospects and
Potentials) para a condução dos trabalhos10. A expectativa era que na conferência geral
realizada em Kyoto, em setembro de 2019, fosse consensuada uma nova e ampliada definição
de museu.
Entre 2016 e 2019, o MDPP promoveu uma série de encontros e oficinas ao redor do
mundo para estimular e colher propostas de uma nova definição. O ICOM Brasil
apoiou a realização de três oficinas (em São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador) e
desenvolveu uma plataforma pública de consulta ao campo museal sobre a nova
definição.
O trabalho realizado pelo MDPP teve como resultado cinco propostas de nova
definição, apresentadas ao Comitê Executivo do ICOM Internacional (...). A
Conferência ICOM Kyoto reuniu aproximadamente 4.500 profissionais de museus
de 115 países e, a partir de ampla discussão e encaminhamentos, decidiu-se pela
necessidade de prorrogação dos debates.
Em 2020, foi então constituído um novo grupo de trabalho - o ICOM Define - que
desenvolveu nova metodologia de trabalho para redação da proposta de definição de
museu a ser submetida a votação na Conferência Geral de 2022, em Praga. A
metodologia é baseada em 4 rodadas de consultas, divididas em 11 etapas11, com
duração de 18 meses, de dezembro de 2020 a maio de 2022 (ICOM, 2021).
Em consulta pública para eleição dos conceitos propostos pela comunidade museal
para a composição da nova definição, com participação de grupos de trabalhos e comitês da
África, Estados Árabes, Ásia Pacífico, Europa, América Latina e América do Norte, o ICOM
Define, considerando a maior incidência (termos mencionados por 30% ou mais dos
10
O relatório da conferência pode ser consultado em:
<https://icom.museum/wp-content/uploads/2018/07/icom.museum/wp-content/uploads/2018/07/ICOMs-Resoluti
ons_2016_Eng.pdf>.
11
A saber:
1. Lançamento da metodologia com webinário (10/12/20)
2. Consulta 1: Comitês enviam relatórios pós-Kyoto (dez-jan/21)
3. Consulta 2: palavras-chave e conceitos (jan-abr/21)
4. Análise quantitativa e qualitativa da consulta 2 (abr-jun/21)
5. Publicação dos resultados da consulta 2 (jun-jul/21)
6. Consulta 3: revisão das palavras-chave e conceitos (jul-set/21)
7. Análise de dados da consulta 3 (abr-jun/21)
8. Redação de 14 propostas pelo ICOM Define (nov-dez/21)
9. Seleção e fusão para a publicação de 5 propostas (fev/22)
10. Consulta 4: escolha entre as propostas publicadas (fev-abr/22)
11. Relatório final do ICOM-Define (abr-mai/22)
Etapa final: Votação final na Assembleia Geral Extraordinária em Praga, em agosto de 2022.
33
Esses dados apontam para os valores que são importantes para cada grupo social.
Exemplo disso é o fato de os termos decolonial e antifacista só serem propostos pelo GT
brasileiro e, por tanto, não entraram na lista para a etapa seguinte de consulta. Em entrevista
concedida para essa pesquisa, Vilma Campos, membro do GT Nova Definição de Museu do
ICOM Brasil declara que, em sua perspectiva,
Essa é uma pauta do novo mundo, né. Todas as palavras relacionadas a essa
mudança vieram das listas da América Latina e África. A Europa segue querendo
pensar o museu como sempre pensou. E aí a gente está discutindo uma nova
definição 50 anos depois da mesa de Santiago, propondo de novo coisas que já
estavam colocadas lá, se não expressamente pelo menos anunciadas (CAMPOS,
2022)14.
A relativa distância conceitual entre os distintos grupos sociais que participaram das
consultas públicas que tiveram por finalidade levantar termos e palavras-chaves que
12
Todo o trabalho desenvolvido no bojo da nova definição de museu pode ser acompanhado em:
<https://www.icom.org.br/?page_id=2173>.
13
Fiz parte da equipe do GT Nova Definição de Museu do ICOM Brasil. Embora parte dos dados aqui
apresentados tenham como origem a sistematização interna do GT e notas pessoais, todos eles já são públicos e
estão disponíveis tanto no site principal do ICOM, como no site do ICOM Brasil
Em:: https://icom.museum/en/resources/standards-guidelines/museum-definition e
https://www.icom.org.br/?page_id=2173
14
Vide nota 4.
34
Segundo a newsletter número 24 ICOM Brasil, por 487 votos favoráveis, 23 contrários
e 17 abstenções, a comunidade internacional reunida em Praga aprovou como Nova Definição
de Museu o texto que segue transcrito abaixo:
Um museu é uma instituição permanente, sem fins lucrativos, ao serviço da
sociedade, que pesquisa, coleciona, conserva, interpreta e expõe o patrimônio
material e imaterial. Os museus, abertos ao público, acessíveis e inclusivos,
fomentam a diversidade e a sustentabilidade. Os museus funcionam e comunicam
ética, profissionalmente e, com a participação das comunidades, proporcionam
experiências diversas para educação, fruição, reflexão e partilha de conhecimento15
(ICOM Brasil, 2022).
15
É importante lembrar que essa é uma tradução preliminarmente aprovada pelos países lusófonos que seguem
em diálogo com os Comitês Nacionais do Icom em língua portuguesa por uma tradução oficial.
35
Para Brulon, uma nova definição serve ao ICOM para definir seus próprios membros
(quem dialoga com os princípios expressos na definição), mas também tem uma dimensão
normativa, prescritiva e imaginativa em relação às práticas no campo de museus. Sendo o
único órgão global para a museologia e para os profissionais da área, quando propõe uma
nova definição está inspirando e orientando toda a cadeia (Idem). Nesta perspectiva,
sustentabilidade, inclusão, diversidade e participação das comunidades foram termos
introduzidos, por meio das consultas, no novo texto e apresentam um novo desafio para os
museus: Fazer com que reflitam a prática e os valores das instituições.
O novo Museu da Língua Portuguesa foi implantado no bojo dos debates dessa nova
definição. Considerando que sua gestão é também parte da equipe que presidiu e dirigiu o
ICOM Brasil16 durante todo o período em que se debateu e se trabalhou coletivamente por ela,
podemos entendê-lo como parte e fruto de um processo de revisão do papel social dos
museus. O quanto isso reverbera em suas práticas é o que veremos abaixo.
20
Processo documentado pelo projeto de tombamento do Conjunto Arquitetônico e Paisagístico no Bairro da Luz
na Coordenação Geral de Pesquisa e Documentação do Arquivo Central do IPHAN - Seção Rio de Janeiro.
Processo de tombamento número 1463-T-00, do ano 2000.
21
Talvez não caiba aqui gastar energia para discorrer sobre o interesse que o Museu desperta na comunidade de
países lusófonos, mas também não é possível defender seu papel de importância no campo da museologia
internacional sem considerar essa relação. Por tanto, para ilustrar a questão, vale mencionar que mesmo com o
Museu fechado para a sua recuperação, traçou parcerias importantes em países africanos onde se fala português,
que culminou, por exemplo, na exposição itinerante A Língua Portuguesa em Nós. Numa parceria entre o
Museu, o Itamaraty e o Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), a exposição passou por Cabo Verde,
Angola e Moçambique. O projeto foi amplamente divulgado na imprensa, mas, informações podem ser
acessadas em:
<http://redebrasilcultural.itamaraty.gov.br/publicacoes/1117-exposicao-do-museu-da-lingua-portuguesa-retrata-a-
historia-e-a-diversidade-do-idioma-em-cabo-verde-angola-e-mocambique>.
Outro dado digno de nota é a presença de autoridades de países lusófonos, entre eles os presidentes de Cabo
Verde e Portugal, na cerimônia de reinauguração do Museu, evento do qual as autoridades que representam o
governo federal brasileiro não participaram. O evento foi amplamente coberto pela imprensa, mas, informações
podem ser acessadas em:
<https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2021-07/museu-da-lingua-portuguesa-e-reaberto-com-presenca-d
e-autoridades>.
37
digitais. No entanto, em dezembro de 2015, pouco antes de completar dez anos de operação, o
edifício sofreu um segundo incêndio, interrompendo as atividades do Museu. Segundo dados
de mensuração disponíveis no site da instituição, nesses primeiros anos, o Museu da Língua
Portuguesa recebeu cerca de 30 exposições temporárias, contabilizou cerca de 4 milhões de
visitantes e acumulou 12 prêmios22. Após cinco anos e meio fechado, recuperado pelas
mesmas instituições que o criaram, o Museu volta à operação em julho de 202123.
Um museu de grande projeção reabrindo no contexto atual (de pandemia mundial e
governo conservador) encontra desafios imensos, sem dúvidas. Um museu de tal dimensão é
também território acirrado de disputas políticas, no campo material e no campo simbólico.
Haja vista as disputas entre os governos federal e estadual no protagonismo de sua
reconstrução e as polêmicas que se tem criado nas redes sociais e no campo jornalístico em
torno do como a instituição tem se colocado em relação à linguagem neutra no que diz
22
A lista completa e maiores informações sobre os prêmios concedidos ao Museu da Língua Portuguesa pode ser
acessada em: <https://www.museudalinguaportuguesa.org.br/premio/>.
De forma sucinta, a lista é a que segue:
Prêmios
2006
- Prêmio Pritzker para Paulo Mendes da Rocha (Prêmio considerado o Nobel da arquitetura. Antes de Paulo
Mendes da Rocha, Niemeyer foi o único brasileiro a receber a mesma premiação);
- Prêmio da Fundação Luso-Brasileira, na categoria Cultura e Ciências;
-Troféu do Departamento de Museus e Centros CUlturais do Iphan, por sua contribuição ao campo museológico
brasileiro;
- Diploma de reconhecimento da Unesco como melhor projeto na área de Comunicação e Informação;
- Destaque do Ano SMACNA (Sistema de Refrigeração);
2007
- Prêmio Novidade do Ano do Guia Brasil Quatro Rodas;
- Lighting Awards International Association of Lighting Designers de Nova York, na categoria Melhor Projeto de
Iluminação;
2011
- 1º Lugar do Prêmio Darcy Ribeiro (pelo IBRAM), concedido ao projetos de educação Dengo;
2012
- Prêmio O Melhor do Brasil, na categoria Museu, concedido pela Revista Viagem e Turismo;
2013
- Prêmio Melhor Seleção de Atração Cultural, "Traveller's Choice 2013", da Revista TripAdvisor;
2014
- Certificado de Excelência TripAdvisor e eleito u dos melhores museus do Brasil e da América do Sul;
- 3º Lugar no V Prêmio Ibero-Americano de Educação em Museus com o programa Estação Educativa;
23
Informações sobre a primeira fase do Museu, sobre o restauro e a reabertura podem ser acessadas
em <https://www.museudalinguaportuguesa.org.br>.
38
Neste sentido, o Museu da Língua Portuguesa conta com uma série de importantes
recursos de acessibilidade, conforme descrito pela tabela abaixo.
RECURSOS DE ACESSIBILIDADE
2. Piso tátil
3. Maquete tátil
24
O debate sobre a linguagem neutra tem tomado espaço nas mídias no ano de 2021, e o MLP tem se tornado
palco importante para a questão. No dia 12 de julho de 2021, o Museu publicou em uma de suas redes sociais, o
Twitter, uma mensagem que apresentava a nova marca e convidava o público a visitar as novas instalações. A
postagem dizia: “Nesta nova fase do MLP, a vírgula – uma pausa ligeira, respiro – representa o recomeço de um
espaço aberto à reflexão, inclusão e um chamamento para todas, todos e todes os falantes, ou não, do nosso
idioma: venham, voltamos!” (disponível em:
<https://twitter.com/MuseudaLingua/status/1414704318800875520>. Isso foi o suficiente para, após um
comentário de desaprovação de Mário Frias, então secretário especial da Cultura, produzir uma onda de
perseguição digital que ocupou todas as redes sociais do Museu e parte significativa da mídia, o que vale um
estudo à parte. Trataremos melhor a questão no próximo capítulo.
39
8. Doze diretórios curatoriais: Totem que apresenta ao público um texto curatorial que o
módulo expositivo, videoguia em Libras-Português (Manifesto poético Nosso Corpo
Nossa Língua de autoria do Slam do Corpo) , QR-Code que leva ao App, e um jogo
sensorial ou objeto/obra tátil.
No entanto, embora não seja esse o foco da pesquisa, vale apontar algumas notáveis
fragilidades no que diz respeito ao sistema de acessibilidade do Museu da Língua Portuguesa.
Isso para dizer que, embora haja um conjunto de leis que, graças às lutas dos movimentos
sociais, garantem “o direito de ir e vir com qualidade de vida a todos os cidadãos,
independente de suas características físicas e sensoriais” (CARLETTO; CAMBIAGHI, p. 23)
- o que teoricamente faria com que as medidas para a universalização do acesso não
dependessem da “boa vontade” de profissionais, gestores, artistas e/ou curadores -, a falta de
fiscalização e de políticas institucionais sólidas dá a possibilidade de não cumprimento das
determinações em sua totalidade. Ao contrário, assistimos constantes embates institucionais e
tensionamentos sociais para a garantia mínima de direitos. Assim sendo, a falta de recursos
financeiros e as dificuldades de adaptação física em bens tombados pelos órgãos de
patrimônio são só outras dificuldades que, por vezes, são somadas às barreiras atitudinais,
legitimando a inexistência ou insuficiência de recursos de acessibilidade nas instituições.
PONTOS DE ATENÇÃO
A rota tátil é incompleta e não se comunica com a rota da CPTM (na estação) e nem
com a da prefeitura (nas calçadas)
Maquete tátil está encostada na parede, impedindo acesso total da pessoa cega
A sinalização tátil e braille não é de fácil localização para o público cego e está
disponível em pouca quantidade, e não cobre todo o conteúdo da exposição
Com descrição dos espaços e obras táteis, textos, imagens, áudios e vídeos apenas para
a navegação nos idiomas orais disponíveis. Audiodescrição apenas para navegação em
português. A navegação em libras dá acesso ao conteúdo que já está disponível na
exposição nesse idioma, servindo apenas para um acesso mais individualizado. A
audiodescrição disponível pelo web app apenas em português não cobre todas as
experiências da exposição de longa duração
Existem hoje no mundo cerca de 7 mil línguas distintas entre si, cada qual com a sua sonoridade e o seu modo
de organizar as palavras em sentenças. Desconhecemos a origem de toda essa diversidade. Elas teriam surgido
a partir de uma única língua ancestral ou teriam se desenvolvido de forma independente, em diferentes partes
do planeta? Qualquer que tenha sido sua origem, sabemos que nenhuma língua é superior ou inferior a outra.
Cada uma delas permite que seus falantes se expressem sobre qualquer assunto e em qualquer situação. Cada
língua também é única, pois representa uma maneira singular de ver o mundo. Os estudiosos reuniram essas
milhares de línguas em 263 grupos, que chamaram de “famílias”, de acordo com suas semelhanças e
afinidades estruturais. No entanto, existe uma centena de línguas isoladas, que não se encaixam em nenhum
grupo. Há ainda muitos mistérios a desvendar sobre as línguas do mundo.
Transcrição do Vídeo-Libras:
Olá, nós somos a Érika e o Léo. Algumas línguas nascem e outras morrem. E muitas estão constantemente
resistindo. Hoje, no mundo, contamos cerca de sete mil línguas existentes, dentre elas, a Língua Brasileira de
Sinais e a Língua Portuguesa. Esta instalação é como uma "floresta de sons", pois traz a experiência sonora
de diversas línguas no mundo. Em cada coluna, um narrador apresenta a sua língua dizendo: "No mundo
existem 7 mil línguas, e eu falo português”. Ou iorubá, ou chinês, ou francês. Na sequência, esse mesmo
25
Conteúdo disponível no aplicativo do Museu. Disponível em:
<https://app.mlp.org.br/experiencia/15>. Acesso em 05 de fevereiro de 2022.
41
narrador diz, na sua língua, um trecho de livro, ou uma poesia, música, receita, algo que tenha algum
significado afetivo para ele ou ela. Agora, o Léo vai apresentar uma poesia para vocês. Nosso corpo, nossa
língua!
Os jogos e obras táteis são dispositivos de mediação. Sem a presença de uma pessoa
mediadora, a experiência tátil fica comprometida. O que significa que o visitante perde
autonomia
Excesso de estímulos sonoros e visuais, podendo tornar a experiência não segura para
quem está no espectro autista e outros públicos sensíveis, como bebês
o bairro do Bom Retiro foi considerado o mais cool do Brasil e o 25º do mundo pela
revista britânica Time Out, que o definiu como "atualmente passando por um
processo de renascimento e renovado interesse: restaurantes familiares encontram
fazedores de zines, novas baladas nascem perto de museus. Como a própria São
Paulo, o Bom Retiro nunca para de mudar, e é isso que faz dele um lugar especial".
Na visão do IDBrasil, o Museu da Língua Portuguesa deve protagonizar essa
mudança, sendo ponto de integração entre as várias comunidades de imigrantes que
se estabeleceram no bairro, assim como aglutinador das várias outras instituições
culturais e iniciativas de economia criativa presentes no local. Desta forma, a
Organização Social trabalhará para que o Museu se torne um hub de economia
criativa, com projetos ligados à Literatura, Arte e Tecnologia, com forte impacto no
cenário da região, com engajamento de diversos parceiros locais (...).
Para atingir tais objetivos, o IDBrasil criou para o Museu da Língua Portuguesa o
programa de articulação social. Hierarquicamente ligado à diretoria executiva e atuando junto
à diretoria técnica, a articulação tem como missão promover acesso qualificado de todos os
públicos ao Museu com foco no território no qual ele habita. Por acesso qualificado
entende-se a participação macro, em toda a cadeia de operações do museu, e não apenas
enquanto público consumidor das ações de programação. Numa perspectiva de integração
42
O Projeto Porto Maravilha, assim como o Projeto Nova Luz, teve como premissa a
refuncionalização de áreas com grande potencial turístico, mas historicamente degradadas
como resultado do abandono pelas frações ricas da população e dos poderes públicos e
densamente ocupadas pelas camadas populares. Os dois projetos são responsáveis por um
agudo processo de gentrificação. Com o objetivo de promover uma nova dinâmica urbana,
produziram impactos socialmente negativos “como deslocamentos de antigos moradores tanto
por remoções compulsórias quanto por pressões oriundas do elevado aumento do preço da
terra na área” (NASCIMENTO, 2019, p. 46). Nesta perspectiva, assim como o restauro da
Estação da Luz e a implantação do Museu da Língua Portuguesa, os Museus Mar e do
Amanhã são parte desses projetos e lidam com problemas sociais congêneres. Ambas
instituições apostaram em medidas também congêneres para lidar com os desafios do
relacionamento entre os museus e o território que ocupam. Assim, o MAR e o Museu do
Amanhã criaram cada qual o seu Programa de Vizinhos (Vizinhos do Mar e o Programa de
Vizinhos do Amanhã, respectivamente).
A articulação social no MLP atua em, pelo menos, quatro frentes de trabalho27:
26
O relatório de gestão da instituição pode ser consultado na área de Transparência de seu site por
meio do link: <https://museudeartedorio.org.br/gestao/transparencia/>. Último acesso: 06 de
fevereiro de 2022.
27
As ações da articulação social podem ser verificadas nos Relatórios de Prestação de Contas do
Museu da Língua Portuguesa disponíveis em:
<https://www.museudalinguaportuguesa.org.br/gestao/transparencia/>.
44
O que não significa, evidentemente, que isso se dá de forma neutra e sem disputas. Os
acontecimentos recentes em torno do uso da linguagem neutra no Museu, já mencionados,
dão a tônica do quanto a inserção de novas perspectivas históricas alimentam debates
acirrados. Museu, enquanto espaço de memória, é historicamente um campo de disputas
narrativas. Esse é o tema abordado no próximo capítulo.
46
Cada sociedade, a partir de seus marcos culturais específicos, elabora seu próprio
conjunto de sentidos simbólicos para as memórias, suas próprias estruturas e estratégias
discursivas. Ainda que essa elaboração seja marca de um determinado tempo e espaço,
algumas perduram na longa duração da história, e o museu, a exemplo, tem ocupado lugar
primordial nas relações entre narrativa, representação, significação e poder há pelo menos
dois séculos. O que não significa que não houve mudanças significativas na forma dos
47
Todavia, para que tenhamos elementos para refletir sobre a dimensão da transformação
do paradigma museológico, que viabiliza os debates contemporâneos acerca da inclusão de
novos agentes discursivos, dentre os quais estão as pessoas trans, é preciso resgatar o
paradigma que alçou à condição de autoridade discursiva a instituição do tipo museu: O
Estado-nação.
Neste capítulo, partimos, então, da relação entre museu e a questão nacional para
resgatar o papel de origem das instituições de salvaguarda patrimonial, que foi o de
consolidação de discursos hegemônicos. E, num exercício de digressão, chegamos ao museu
do século XXI, que tem se colocado cada dia mais aberto às identidades coletivas e à
diversidade social, atuando, inclusive, como plataforma para o contraponto à história oficial.
Todavia, no contexto histórico de criação de projetos como o “Escola sem Partido”, de
perseguições e interdições às temáticas relacionadas a gênero e sexualidade, fechamos o
capítulo apontando para os limites dessa abertura, demonstrando o quanto gênero, no que diz
respeito às identidades e expressões, ainda é um lugar discursivo perigoso, que inclusive tem
produzido impacto direto nas dinâmicas no Museu da Língua Portuguesa que, timidamente,
experimentou se comunicar com seu público fazendo uso de linguagem neutra e
imediatamente passou a protagonizar uma contenda em escala nacional.
A despeito das diversas interpretações sobre a formação dos estados nacionais, um ponto
tem relativo consenso: trata-se de um fenômeno moderno, recente. Os pesquisadores tendem a
concordar que, embora o termo tenha origens mais remotas, é no fim da Idade Moderna que a
ideia de nação ganha o caráter que conhecemos. Guerra e Chiaramonte chamam de moderno o
período revolucionário, o século XVIII e, com outros autores, partilham da percepção que o
28
Entendendo a requalificação de museus como processo de atualização dos programas e ações museológicas
que se dá de forma periódica com a finalidade de redesenhar e repactuar valores sociais, patrimoniais e
ambientais, reconectando laços entre equipamento e sociedade ou reforçando-os a partir do alinhamento com
novas agendas e demandas sociais. Isso se dá por meio da reelaborações de documentos norteadores (como o
plano museológico, projeto educativo, política de salvaguarda, plano de trabalho, plano de metas, atualização de
contrato de gestão, etc), da revisão do plano de gestão de acervo e da atualização de exposições de longa
duração, dentre outras medidas.
48
conceito de nação - tal como o reconhecemos hoje - é originário dos tempos da Revolução
Francesa (GUERRA, In:JANCSÓ, 2003, p.35; CHIARAMONTE, In:JANCSÓ, 2003, p. 73).
Nesse sentido, pode-se entender como Estado nacional aquele que deixa de responder aos
padrões tradicionais do Antigo Regime, ainda que, na prática, a relação não seja de todo rompida
com este modelo (PAMPLONA; STUVEN, 2010, p. 13).
José Carlos Chiaramonte (CHIARAMONTE, In: JANCSÓ, 2003, pp. 61 – 92), a luz
destes estudos, defende que o termo nação passa ao longo de sua história por três momentos: até
fins do século XVI apresenta sentido étnico; durante os séculos XVII e XVIII sentido político e,
num terceiro momento, paralelo ao Romantismo, há a junção de ambos, fazendo com que se
entenda a nação como “referência a grupos humanos unidos por sua homogeneidade étnica e (...)
[ou] grupo humano unido por sua circunscrição política” (CHIARAMONTE. Op. Cit. p. 82).
Antônio Manuel Hespanha nos alerta que, até o século XVIII, o termo era usado como sinônimo
de lugar de nascimento, onde se tem um pedaço de terra (ou seja, de caráter individual) e passa, a
partir de então, fazer alusão ao Estado, à comunidade da Constituição e das Leis (portanto, de
caráter coletivo e contratual) (HESPANHA. In:JANCSÓ, 2003. p. 96 – 100). O que definiria,
portanto, um indivíduo como membro da nação é o sentimento de pertença a ela e o que a
determina é a existência de um grupo de indivíduos que a reconheça, que aceite o pacto social
proposto. Se isto é verdade, como se dá este processo de reconhecimento?
De forma sucinta podemos entender que para Hobsbawm, as nações modernas, ainda que
na maioria dos casos tenham sido originadas a partir do século XVIII, sendo, portanto, parte da
história recente da humanidade, tentam afirmar ser o oposto disto, forjando uma continuidade
histórica, um vínculo que as ligam a um passado longínquo baseando-se em invenções (de
49
Ainda que, em termos gerais, fiquem claras as diferenças que distinguem as duas
correntes, Hobsbawm e Anderson concordam que a existência da nação depende da projeção
mental dos indivíduos. Neste mesmo sentido caminham muitos outros estudiosos da questão,
como é o caso da Márcia D’Aléssio que defende que o fenômeno identitário se dá a partir da
identificação de pessoas a grupos que desempenham, entre si, a função de proteção [do grupo, do
Estado nacional] ( D'ALESSIO, 2007, v. I, p. 199-204 ). Ou seja, a legitimação de uma unidade
política nacional moderna depende da elaboração da representação simbólica, do imaginário e,
nas palavras de Antônio Manuel Hespanha:
Como nos alerta Sandra Jatahy Pasavento, “nação” e “identidade” são conceitos que
pertenciam à esfera do político e passaram a se integrar de maneira indissolúvel à dimensão
50
cultural da sociedade (PESAVENTO, 2009, p. 574.). Assim, fica fácil compreender a urgência
das ações políticas sobre o imaginário das populações se considerarmos que, ao se
pretenderem modernos, na concepção Europeia ocidental, os Estados tinham como premissa
a soberania popular. Dessa forma, passou-se cada vez mais a depender da legitimação social
para a manutenção da unidade e da própria existência do Estado, conforme nos lembra Adduci
(2000, p.33) e Meneses (1993, pp. 09-10).
A Europa do século XIX vivia o que René Rémond chamou de “O movimento das
Nacionalidades” (REMOND, 1974, p. 149), e que Benedict Anderson conclamou como
“Imperialismo e Nacionalismo Oficial” (ANDERSON, 2008, p. 171). Para Rémond, a
característica comum dos “diversos” nacionalismos é a participação dos intelectuais em seu
processo de criação. Segundo ele, “o movimento das nacionalidades no século XIX foi em
parte obra dos intelectuais, graças aos escritores que contribuem para o renascer do
sentimento nacional” (REMOND, op. cit, p. 50), ideia também defendida por Benedict
Anderson em Comunidades Imaginadas. No entanto, José Murilo de Carvalho defende que,
ainda que o imaginário social seja constituído a partir de tradições, mitos, rituais, símbolos e
do discurso intelectual, este último estará sempre em situação de desvantagem por ser
“inacessível a um público com baixo nível de educação formal” (CARVALHO, 1990, p.10).
Para Hespanha, a solução encontrada pelos novos Estados foi “a promoção de uma educação
pública homogeneizadora ou a fabricação de um sentimento nacional, por meio de cerimônias
cívicas” (HESPANHA. In: JANCSÓ, 2003, p. 95). Ou seja, neste sentido os atos públicos (de
caráter coletivo) seriam uma das formas mais eficazes para fazer com que as sociedades
daquele período se identificassem como grupo, como comunidades de tipo nacional.
estão dissociados da realidade material (1988, p.45), a maior parte dos monumentos (onde se
incluem os museus) que conhecemos, e que referenciam figuras e fatos centrais na elaboração
de nossa história oficial, foi erigida no século XIX, com o fim do antigo regime e a ascensão
dos Estados nacionais. Neste mesmo sentido, para Anderson, os censos, que classificam as
populações e instituem o “outro” colonial e produzem, a partir disso, dinâmicas sociais
características para cada categoria social; os mapas, que criam e reforçam realidades
espaciais; e os museus, que classificam, homogenizam e cristalizam heranças políticas são as
instituições de poder que, por meio da representação da gramática nacionalista, sustentaram
os estados coloniais (ANDERSON, 2008).
Assim, fica fácil entender porque a memória passa a ser questão de Estado, tendência
que, no Brasil, é inaugurada em 1818 com a criação do Museu Nacional no Rio de Janeiro,
conforme mencionado acima.
Com a independência, em 1822, o regime político mudou, mas a estratégia seguiu
sendo a mesma: a utilização de instituições que, por meio da representação e da
homogeneização discursiva, tinham por objetivo educar para valores como patriotismo e a
unidade. Como instrumentos de legitimação do novo Estado, a exposição públicas dos
símbolos que representavam a nação em festas, ritos cívicos, juramentos, aclamações, desfiles
e exposições “objetivaram oferecer os contornos de uma unidade gradativamente construída
em torno do imperador e de seus familiares 'brasileiros''' no momento em que os discursos
buscavam convergência em torno de um novo pacto social, que não mais o de manutenção do
Império luso-brasileiro, mas do Império do Brasil (GALVES, 2011, p. 118).
Claro que poderíamos discorrer sobre uma série de museus característicos do século
XIX e início do XX: os museus históricos, tais quais o Museu Histórico Nacional (1922, Rio
de Janeiro) e o Museu Republicano Convenção de Itu, anexo ao Museu Paulista, (1923, Itu).
Assim como poderíamos dedicar atenção ao modelo, já da segunda metade do século XX,
cujo estado de São Paulo é o principal difusor: os Museus Históricos Pedagógicos, tais como
o MHP Prudente de Morais (1956, Piracicaba), MHP Campos Salles (1956, Campinas), MHP
Rodrigues Alves (1956, Guaratinguetá), e MHP Washington Luís (1957, Batatais), todos
nascidos da intenção de “criar centros de memória e de pesquisa acerca da vida dos quatro
presidentes republicanos oriundos do estado de São Paulo” (MISAN, 2008, p. 177). Todavia,
temos um caso que é, sem dúvidas, o mais emblemático: O Museu do Ipiranga (ou Museu
Paulista), sobre o qual vale trazer alguns apontamentos.
Se o Rio de Janeiro tinha o Museu Nacional, pioneiro, mas cuja narrativa associava o
Brasil ao seu passado colonial, São Paulo, por meio da construção de um Monumento à
Independência, objetivava trazer para si o protagonismo histórico no que tange a constituição
de uma nação livre, unida e moderna, ou nas palavras de Ulpiano Bezerra de Meneses, a
história nacional “a partir da ótica paulista e de seus limites alimentados pelos interesses
políticos e econômicos da elite bandeirante” (In: Brefe, 2005, p. 18).
Conforme nos aponta Ana Cláudia Fonseca Brefe, inaugurado em 1890 como
monumento,
O edifício em estilo neoclássico que abrigou o Museu do Estado a partir de 1894 não
foi inicialmente projetado para essa finalidade; sua concepção inicial destinava-se a
ser o Monumento à Independência brasileira, tendo sido construído na colina do
Ipiranga, próximo ao lugar onde D. Pedro I teria proferido o famoso ‘grito’, que fez
do Brasil um país independente ( 2005, p. 20).
A relação entre museu, identidade nacional e poder, consolidada ainda no século XIX,
conforme exposto, atravessou todo o século XX e chega ainda sólida ao século XXI. A
estratégia seguiu sendo adotada pelas novas nações, a exemplo do Qatar, que, conforme
apontou Ulpiano Bezerra de Meneses, “a criação de um museu nacional estava entre as 4
53
3.2 Museu no século XXI: arena de discussão sobre raça, gênero, classe e outros
marcadores de diferença social
No Brasil, muitas vozes têm se levantado tanto a favor quanto contra à remoção das
estátuas consideradas monumentos à barbárie, o que inclusive tem suscitado caloroso debate e
iniciativas como a da então Deputada Erica Malunguinho, que redigiu o Projeto de lei 404/2020,
de 20/06/2020, que “proíbe homenagens a escravocratas e a eventos históricos ligados ao
exercício da prática escravista no âmbito da administração estadual direta e indireta” (São Paulo,
2022)29. O caso emblemático mais recente diz respeito à estátua em homenagem ao bandeirante
Manuel de Borba Gato, que fica na zona sul de São Paulo e foi incendiada por manifestantes em
29
Projeto ainda em tramitação, conforme informação disponível em:
https://www.al.sp.gov.br/propositura/?id=1000327788. Acesso em 26 de dezembro de 2022.
54
24 de julho de 2022. Antes disso, outro monumento na mesma região serviu de palco para
manifestações públicas que alcançou grande repercussão midiática, o Monumento às Bandeiras,
popularmente conhecido como "empurra-empurra", no Parque do Ibirapuera, que, em outubro de
2013, foi coberto por tinta vermelha em alusão à responsabilidade do movimento das bandeiras
paulistas aos sertões quanto ao genocídio indígena.
desde 1985 [...]. Além dos dois museus implantados nas cidades de Hiroshima e
Nagasaki [...] inaugurados na década de 90 do século XX, Museu Memorial da Paz
de Hiroshima (Hiroshima Peace Memorial Museum) e o Museu da Bomba Atômica
de Nagasaki (Nagasaki Atomic Bomb Museum) (2015, pp. 92-3).
É dessa forma que o debate sobre as desigualdades se encontra cada vez mais visível
[...] (2022, p. 121).
Para nos limitarmos a alguns poucos exemplos no eixo Rio-São Paulo, presenciamos a
abertura de instituições e organizações que muito vêm contribuindo para o avanço das
agendas sociais no campo da memória: O Museu Afro Brasil Emanoel Araujo (SP),
inaugurado em 2004 para a valorização da história e da produção cultural (religiosa, artística,
científica, técnica, etc.) de africanos e afro-brasileiros31; o Museu de Favela (RJ), criado em
2008 por lideranças moradoras das favelas Pavão, Pavãozinho e Cantagalo para a valorização
30
Institucional. Disponível em: https://memorialdaresistenciasp.org.br/institucional/. Acesso em 26 de dezembro
de 2022.
31
Museu Afro Brasil Emanoel Araújo - MAB: http://www.museuafrobrasil.org.br/o-museu/apresentacao
57
desses territórios e dos grupos que neles habitam. Pioneiro, é o primeiro museu deste tipo no
mundo e o primeiro ponto de memória a compor a Rede de Museologia Social do Rio de
Janeiro, umas das redes de memória, museus comunitários, ecomuseus, pontos de memória e
afins surgidas pelo Brasil desde meados da década passada32. O Museu da Diversidade Sexual
de São Paulo, 2012, primeiro de sua categoria na América Latina33; e mais recentemente,
ambos em São Paulo e abertos em 2022, o Museu das Culturas Indígenas, experiência
pioneira que, por meio da gestão compartilhada e do protagonismo indígena, atua pela
proteção, difusão e valorização do patrimônio cultural indígena em território urbano34; e o
Museu das Favelas que, ocupando o Palácio dos Campos Elísios, se propõe agente de
transformação social por meio da memória e da difusão de saberes dos grupos habitantes de
favelas35.
Para não estender muito a questão, cabe mencionar as experiências dos dois museus de
arte mais conhecidos pelo público e mais visitados de São Paulo, segundo pesquisa
coordenada por João Leiva (2018): O Museu de Arte de São Paulo (MASP) e a Pinacoteca do
Estado de São Paulo (Pina)36.
No Masp, a tendência se percebe tímida ainda em 2015, mas ganha destaque em 2017
com duas exposições relacionadas a gênero, sexualidade e contestação e arrefece após 2019.
Os destaques são:
32
Museu de Favela - MUF: https://www.museudefavela.org/.
33
Museu da Diversidade Sexual de São Paulo: https://museudadiversidadesexual.org.br/
34
Museu das Culturas Indígenas: https://museudasculturasindigenas.org.br/
35
Museu das Favelas: https://museudasfavelas.org.br/
36
Segundo o Instituto Brasileiro de Museus, São Paulo é o estado brasileiro com o maior número de museus
mapeados. São 517, o que corresponde a 17,5% do total nacional.
58
Na Pina, menos expressivo, mas não menos relevante, o movimento é expresso mais
marcadamente entre 2018 e 2021, cujos destaques são:
A cada um desses exemplos cabe um cuidado análitico especial que não tem espaço no
presente estudo. Todavia, são importantes para demonstrar que mais do que representação, os
grupos sociais subalternizados ou minorizados vêm conquistando espaço efetivo de
participação nos processos discursivos institucionais, o que acirra as disputas narrativas em
torno da memória coletiva. Mas, ainda que estejamos presenciando um momento histórico
importante no que diz respeito às disputas pela memória, nas ruas e no interior das
instituições, sabemos que o patrimônio edificado (bens materiais imóveis) ainda funciona
como inscrição da classe dominante na cidade e que às classes subalternizadas têm cabido os
usos efêmeros de seus interiores e a contestação do uso do espaço público, contra a prática de
valorização da história e da memória dos grupos que, representando o projeto civilizatório que
nos constitui enquanto nação, produziram as violências que estruturam nosso complexo
sistema de desigualdades, a exemplo do já mencionado monumento ao bandeirante Manuel de
Borba Gato. Em outras palavras, as classes dominantes ainda têm os monumentos inscritos
na paisagem, enquanto os subalternizados têm apenas os próprios corpos como capital
simbólico que, vez ou outra e com muita tensão, vão ocupando seus interiores. A balança
ainda é bastante desequilibrada e sujeita a oscilações. Como casas de aluguel, o patrimônio
edificado está à disposição subalterna enquanto a relação se mantém política e
economicamente viável para ambas as partes, mas, em uma sociedade que se constituiu a
partir da supremacia masculina branca cis hétero cristã como a nossa, sabemos para que lado
a balança tende a pender.
37
Ou, nas palavras de Marcelo Nascimento Bernardo da Cunha, os discursos nas instituições de salvaguarda
patrimonial se afirmam “na medida dos interesses de grupos detentores do poder de afirmação e manutenção de
referenciais patrimoniais oficiais”(2008, p. 164).
60
38
Todo o conteúdo está disponível em: https://mbl.org.br/valores-principios. Último acesso realizado em: 17 de
abril de 2023.
39
Disponível em:
https://www.camara.leg.br/noticias/441927-projeto-obriga-escolas-a-respeitar-conviccoes-familiares-sobre-sexo-
e-religiao/. Acesso em 07 de janeiro de 2023.
61
hoje - são assinadas por grandes nomes como Adriana Varejão, Cândido Portinari,
Fernando Baril, Hudinilson Jr., Lygia Clark, Leonilson e Yuri Firmesa
(MENDONÇA, 2017).
Sobre a obra de Varejão, Eduardo Cristiano Hass da Silva e Bárbara Virgínia Groff da
Silva dizem que,
Conforme apontado por Hass da Silva e Silva, a obra esteve exposta anteriormente na
exposição História às Margens, em cartaz no MAM (Museu de Arte Moderna de São Paulo)
40
A título de exemplificação, tomamos como referência os canais de notícia El País (disponível em:
https://brasil.elpais.com/brasil/2017/09/11/politica/1505164425_555164.html); BBC News Brasil (Disponível
em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-45191250) e Veja (disponível em:
https://veja.abril.com.br/coluna/rio-grande-do-sul/veja-imagens-da-exposicao-cancelada-pelo-santander-no-rs/).
62
A peça “Cena de Interior II” encontra-se precedida pela obra “Carne à Moda de
Franz Post” e sucedida pela obra “Parede com inscrições à la Fontana”.
Considerando o contexto da exposição “História às Margens”, a narrativa construída
não atenta para o caráter sexual da obra. Dessa forma, os discursos produzidos pela
mídia não produzem os mesmos ataques que foram produzidos à exposição
“Queermuseu: Cartografias da Diferença na Arte Brasileira” (HASS DA SILVA;
SILVA, Ibidem).
E por fim, o conjunto Criança Viada, composto de duas pinturas de Bia Leite, Travesti
de lambada e Deusa das águas, que representam cada qual a imagem de uma criança com a
inscrição “Criança viada travesti da lambada” e “Criança viada deusa das águas”
sobrepondo-a. Como nos lembra Paulo Lannes, em matéria para o site de notícias Metrópoles,
Bia nasceu no Ceará, vive no Distrito Federal desde 2010, se graduou em artes plásticas pela
Universidade de Brasília (UnB) e é figura importante na cena artística local. Segundo o autor,
o conjunto “foi apresentado em diversas exposições de Brasília e chegou a ganhar o prêmio de
2º lugar na categoria ‘Edital LGTB: Gênero e Identidade’, pela galeria paulista Transarte”
(LANNES, 2017).
Sobre a obra, Mário Tavares, Curador da Bienal do Mercosul, e autor de dois textos no
catálogo da exposição, em entrevista que compõem a matéria de Paulo Lannes, declara que
As duas telas de Bia Leite chegaram a ser expostas no XIII Seminário LGBT do
Congresso Nacional: O próximo pode ser você!, na Câmara dos Deputados, em Brasília, em
2016. Proposto pelos deputados Jean Wyllys (Psol-RJ), Luiza Erundina (Psol-SP), Chico
Alencar (Psol-RJ), Erika Kokay (PT-DF), Luizianne Lins (PT-CE), Alice Portugal
(PCdoB-BA) e Glauber Braga (Psol-RJ) e promovido comissões de Direitos Humanos e
Minorias; de Legislação Participativa; de Educação; e de Cultura41, o evento chegou a
incomodar a bancada evangélica e foi ameaçado por Eduardo Cunha, então presidente da
41
Segundo informações disponíveis em:
https://www.camara.leg.br/noticias/495791-comissoes-promovem-o-13o-seminario-lgbt-do-congresso-nacional/.
Acesso em 08 de janeiro de 2023.
63
Câmara dos Deputados, que gerou dificuldades para a edição anterior,42 mas transcorreu sem
maiores percalços.
Por fim, conforme relembrou Júlia Dias Carneiro (2018), depois de Porto Alegre, a
expectativa era que a Queermuseu - Cartografias da Diferença na Arte Brasileira tivesse
itinerado ao Rio de Janeiro, onde seria exposta no Museu de Arte do Rio (MAR), o que foi
impedido pelo próprio prefeito da cidade à época, Marcelo Crivella, que reforçou o coro de
que a mostra fazia apologia à pedofilia e à zoofilia. Todavia, a exposição consegue chegar ao
público do Rio de Janeiro quase um ano depois, em agosto de 2018, na Escola de Artes
Visuais (EAV) do Parque Lage. Ainda segundo Carneiro,
O ano de 2017 foi marcado pela vigilância moral desses grupos conservadores
capitaneados pelo MBL aos museus e demais espaços públicos de expressão artística como o
objetivo evidente de defender, formar opinião pública a favor e aprovar o projeto Escola Sem
Partido. A nudez e a sexualidade foram os principais alvos de ataques em pretenso combate à
corrupção política e moral.
Para nos manter no campo dos museus, vale mencionar os protestos contra o artista
Wagner Schwartz e sua performance La Bête, no Museu de Arte Moderna de São Paulo, em
setembro, quando uma cena, que se propunha a conduzir o público à reflexão sobre os limites
do corpo por meio da interatividade com um corpo humano nu, é transfomada nessa disputa
narrativa em arte pedófila a partir do momento que uma criança interage com o artista. Por
fim, a tensão pública em torno da abertura da exposição Histórias da Sexualidade, no Museu
de Arte de São Paulo (MASP), que vinha sendo preparada desde 2015 e que só foi aberta em
outubro de 2017 após uma série de protestos da classe artística e defensores da cultura e da
livre expressão em defesa do direito do Museu de abrir a mostra, o que foi feito, a princípio,
42
As dificuldades impostas pela bancada evangélica para a realização do “XII Seminário LGBT do Congresso
Nacional” foram denunciadas por deputados do PSOL e foram veiculadas pelos canais de mídia. A título de
exemplo, tomamos como referência: O Congresso em Foco (Disponível em:
https://congressoemfoco.uol.com.br/projeto-bula/reportagem/jean-wyllys-acusa-cunha-de-impedir-divulgacao-de
-seminario-lgbt-na-camara/); O Globo (Disponível em:
https://blogs.oglobo.globo.com/ancelmo/post/cartaz-da-camara-sobre-seminario-lgbt-gera-polemica-566928.htm
l) e Correio Braziliense (Disponível em:
https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/politica/2015/05/20/interna_politica,483845/daniela-mercury-
e-esposa-participam-de-seminario-lgbt-na-camara.shtml).
64
Ainda que mobilizando e dividindo a opinião pública, a exposição ficou em cartaz por
todo o período previsto, entre 19 de outubro de 2017 e 14 de fevereiro de 2018, e contabilizou
alguns recordes. Segundo Laura Mattos (2018), em matéria para a Folha de São Paulo, “com a
mostra que tanto barulho fez, o Masp bateu dois recordes: a maior visitação diária (6.471 no
feriado de 25/1) e o melhor mês de janeiro de sua história (53 mil)”.
43
Disponível em:
https://www.instagram.com/p/BbM-dqLlksz/?utm_source=ig_embed&ig_rid=657e15af-df12-4385-9727-d89c67
deebb7. Acesso em 09 de janeiro de 2023.
44
Infelizmente, mapear os ataques às experiências de expressão artísticas ou memoriais relacionadas a gênero e
sexualidade é uma tarefa ingrata e, aparentemente, sem fim. Para dar apenas mais um exemplo, segundo notícias
veiculadas em canais regionais, e aqui mencionaremos o veículo de notícias Estadão, de São Paulo, em 22 de
novembro de 2022, houve uma invasão no Centro Cultural da Diversidade, localizado na zona sul de São Paulo,
quando foram danificadas seis obras de artistas participantes da coletiva Minh’alma Cativa, que abriria 4 dias
depois, em 26 de novembro. Mais informações estão disponíveis em:
https://www.estadao.com.br/alias/exposicao-no-centro-cultural-da-diversidade-e-vandalizada-sete-obras-foram-p
erfuradas/. Acesso em 14 de janeiro de 2023.
65
Isso é da seara da administração pública que não pode ser substituída pelo Poder
Judiciário salvo se e quando houver sinais nítidos de ilegalidade e de lesividade.
Ora, se o juízo agravado considera questionável a escolha é preciso que haja tempo
para o debate processual. Em nosso sentir, a opção de suspender o repasse configura
sim uma subversão à lógica do direito administrativo.
Efetivamente é nítida a carga político ideológica da ação, que não se veste bem no
caso concreto.
E neste sentido, o autor da ação não fez questão alguma de ocultar que a sua
motivação era de caráter moral e ideológico. Em respeito ao assunto, chegou a publicar em
sua conta do Twitter, rede social no formato de microblog, mensagens como: “40 MILHÕES
do povo paulista para bancar a ampliação do Museu da Diversidade Sexual, que foi criado em
2012 pelo Tucano Geraldo Alckmin!”. Cuja qual completa com: “Entrei com uma ação
popular na justiça impedindo a transferência desses 40 MILHÕES e um projeto acabando
definitivamente com o museu!”. Outra postagem no microblog dizia: "Entrei com Projeto de
Decreto Legislativo para extinguir esse ‘Museu’ e com uma Ação Popular na Justiça para que
os 40 milhões anunciados por Doria não sejam utilizados na ampliação dessa peça de
militância. Não vamos nos calar”. Mas, a postagem que mais deixou evidente a sua motivação
foi publicada após o fechamento do Museu e, em tom comemorativo, dizia: “Não terá mostra
Drag no Museu LGBT”. Seguida de “o Carteiro, Gil Diniz, fechou o museu LGBT!”. As
mensagens foram apagadas do perfil de Diniz, mas foram registradas por canais de imprensa
por meio de prints ou transcrição do conteúdo e seguem disponíveis na rede mundial de
computadores45.
45
Para citar apenas dois exemplos, destacamos material publicada pela Agência de Notícias da AIDS, disponível
em:
https://agenciaaids.com.br/noticia/museu-da-diversidade-sexual-em-sao-paulo-e-fechado-por-tempo-indetermina
do/. E matéria da Veja São Paulo, disponível em:
https://veja.abril.com.br/comportamento/decisao-judicial-impede-aberturade-mostra-sobre-drags-em-sao-paulo/.
Ambas acessadas em 15 de janeiro de 2023.
66
Essas e outras mensagens publicadas pelo deputado que se auto reconhece como
Carteiro Reaça e se identifica nessas redes sociais a partir do nickname @carteiroreaca, vão
deixando à mostra que as questões administrativas e legais foram instrumentalizadas em ações
que tiveram por objetivo inviabilizar a manutenção de iniciativas a favor da promoção da
dignidade de pessoas do grupo LGBTQIA+. A última postagem mencionada acima deixa
evidente que o problema não é o montante de recurso alocado em equipamentos culturais, mas
o recurso ter sido alocado em equipamento cujo objeto é a diversidade sexual e de gênero.
Embora Diniz defenda que museus considerados tradicionais mereçam mais atenção
do Estado de São Paulo, conforme aponta a mensagem supracitada, e, consta no parecer do
Ministério Público do Estado de São Paulo, o Museu da Língua Portuguesa, usado por ele
como exemplo nesses documentos, não deixou de sofrer perseguição da mesma ordem.
A querela se deu em torno do uso da linguagem neutra, ou, inclusiva. Tal debate tem
tomado espaço nas mídias, e o MLP se tornou palco importante para a questão desde que, no
dia 12 de julho de 2021, às vésperas da sua reabertura, publicou no Twitter uma mensagem
que apresentava sua nova marca e convidava o público a visitar as novas instalações. A
postagem dizia: “Nesta nova fase do MLP, a vírgula – uma pausa ligeira, respiro – representa
o recomeço de um espaço aberto à reflexão, inclusão e um chamamento para todas, todos e
todes os falantes, ou não, do nosso idioma: venham, voltamos!”48. Após alguns comentários
de desaprovação à postura do Museu, no dia 23 de julho, algum usuário marca Mário Frias,
então secretário especial da Cultura, numa das mensagens. A respeito, ele se manifestou
compartilhando em sua própria conta no microblog o seguinte texto:
preservação da nossa língua. Não aceitarei que esse investimento sirva para que
agentes públicos brinquem de revolução. Tomarei medidas para impedir que usem o
dinheiro público federal para suas piruetas ideológicas. Se o governo paulista se
comporta como militante, vandalizando nossa cultura, não o fará com verba federal
(FRIAS, 2021)
Na mesma data, a postagem - ou tweet, como são chamadas as mensagens nessa rede
social - contou ainda com comentário em tom de ameaça do então secretário. A mensagem
dizia: “Tomarei medidas para impedir que usem o dinheiro público federal para suas piruetas
ideológicas. Se o governo paulista se comporta como militante, vandalizando nossa cultura,
não o fará com verba federal” (Idem). Isso foi o suficiente para produzir uma onda de
perseguição digital que ocupou todas as redes sociais do Museu e parte significativa da mídia.
Calcular a métrica de alcance de uma postagem nas redes sociais demanda de uma
matemática complexa, sobretudo pelo fato de que essas redes são dinâmicas, o que significa
dizer que uma postagem de dois anos atrás continua acumulando engajamento. Neste sentido,
o efeito acumulativo dificulta o cálculo que definiria que postagem produziu maior alcance,
sobretudo no caso do Museu da Língua, que esteve fechado e com pouca presença virtual
antes do processo de reabertura. O histórico de relacionamento com o Museu e suas redes
sociais está em fase inicial de construção, mas, para se ter ideia do tamanho do escarcéu,
adotamos como medida de comparação o número de impressões (o número de vezes que o
usuário/ seguidor visualizou os tweets do perfil do Museu) em julho de 2021 e em julho de
2022. Em julho de 2021 o número foi de um milhão, quinhentos e setenta e sete mil,
oitocentos e cinquenta e três impressões. Enquanto que em julho de 2022, o número não
passou de 23 mil. O mês de julho de 2021 conferiu o maior engajamento do Museu nas redes
68
sociais. Até o dia em que essas linhas foram escritas, a postagem tinha atingido as marcas de
207 retweets, 1103 quote tweets, 1777 likes e 3,231 comments.
Embora nascida nas redes sociais, a questão ganhou a imprensa imediatamente após a
manifestação de Mário Frias.
O mês de julho marca o retorno do Museu da Língua Portuguesa à imprensa. Com data
confirmada, a reabertura do Museu em 31 de julho, reconstruído após o incêndio de dezembro
de 2015, é o assunto que fez com que, durante quase todo o mês de julho, a instituição
voltasse a ocupar espaço em canais de notícias como a CBN, ESPN, UOL Notícias, Folha de
S. Paulo, Band News, Diário Carioca, Veja, Conexão Capixaba, dentre outros. No dia 24, o
cenário mudou e o destaque transformou-se numa aguda crise de comunicação.
O primeiro canal de notícias a abordar a questão foi o Correio 24 horas sob o título
Museu da Lingua Portuguesa usa 'todes' em post e provoca polêmica. Na sessão Variedades,
página sete, sem autoria, o jornal diário que circula no estado da Bahia de forma impressa,
discretamente apresenta a polêmica, finalizando com “O Museu recebeu críticas e elogios e
em nota afirmou se propor ‘a ser um espaço para a discussão do idioma, suas variações e
mudanças’” (Correio 24 horas, 2021). Essa foi a única mídia a tratar a questão no dia 24 de
julho. No dia 25, a polêmica se instaura na mídia com a abordagem de cinquenta e três canais
de notícias, conforme relação que segue anexa a esta pesquisa.
Após esse boom, os dias seguintes foram menos intensos e aos poucos a reabertura
volta a ocupar a centralidade das notícias que se referem ao Museu. Um mês após a
publicação do Museu no Twitter, no dia 13 de agosto, apenas dois canais informativos dão
atenção ao caso: o blog Um de Tudo que, com uma perspectiva progressista, publica o texto A
falsa neutralidade de quem aponta dedos para a linguagem neutra, assinado pelo fotógrafo,
escritor, poeta e cineastas Rafael Assis, que inclusive, abre o texto nos lembrando que “não
faz muito tempo, mas é bom lembrar, que uma questão do ENEM virou um tema de absurda
repercussão quando o próprio presidente da república disse que iria interferir na avaliação
para evitar que nela houvesse a famigerada ‘ideologia de gênero’” (2021), fazendo menção à
polvorosa dos aliados de Bolsonaro entorno da questão do Exame Nacional do Ensino Médio
que fazia referência ao pajubá, dialeto secreto da comunidade LQBTQI+, sobretudo da
parcela trans; e, A Gazeta do Povo, jornal sediado em Curitiba com circulação impressa e
digital, que publicou em canal do Youtube o vídeo Museu da Língua Portuguesa erra ao
69
adotar linguagem neutra49. A chamada do vídeo deixa evidente qual o seu teor ao dizer que se
trata de
Até a data em que essas linhas foram escritas, o vídeo já acumulou 79 mil
visualizações e mil, oitocentos e quarenta e sete comentários, a maioria em tom de apoio à
pauta.
Todavia, dois pontos precisam ser ressaltados. Primeiro, ainda que o tema esfrie, em
termos de atenção da mídia, cada vez que o assunto reaparece, a experiência do Museu é
resgatada e o coloca de volta ao centro do debate. A exemplo de quando, no início de outubro
de 2021, a Rede Globo de Televisão anunciou que a novela que começaria a ser transmitida
no início de 2022, “Cara e Coragem”, faria uso de linguagem neutra. Nesta data, o Museu foi
vinculado à questão em 19 canais de notícias, conforme dados extraídos pela plataforma
Knewin Monitoring50.
O segundo ponto é que mais do que uma crise de imagens, a querela produziu efeitos
da ordem material ocasionadas por mudanças na Lei Rouanet (Lei Federal de Incentivo à
Cultura).
A partir de um decreto que, segundo Mônica Bergamo, não passou pelos técnicos da
subpasta de Fomento e Incentivo à Cultura, mudanças na lei têm produzido impactos nocivos
graves à saúde das instituições culturais. Ainda em relação à disputa entre o Governo Federal
e o do Estado de São Paulo em torno do protagonismo na entrega dos equipamento culturais à
sociedade, já mencionado anteriormente nesta pesquisa, no artigo intitulado Cabo de Guerra,
a colunista aponta que “um dos parágrafos que foi inserido determina que a inauguração, a
49
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=385TYLSUEZg&t=38s. Acesso em 19 de janeiro de 2023.
50
Plataforma de monitoramento de mídias, online, impresso, rádio e TV.
70
divulgação e a promoção dos projetos que utilizaram recursos da Rouanet por parte de estados
e municípios só poderão ocorrer após a autorização do governo federal” (BERGAMO, 2021).
O que implica em perda da autonomia e do protagonismo da Comissão Nacional de Incentivo
à Cultura (CNIC), e faz com que os projetos propostos sejam analisados a partir da orientação
ideológica do governo federal e não (ou não apenas) dos critérios técnicos por ela
estabelecidos.
Este foi um dos impactos, mas não é de longe o mais grave. Sobre o discurso de
moralização das negociações de incentivo à cultura, as mudanças colocaram as instituições
culturais numa situação de grave insegurança financeira.
Sob o título Maiores museus brasileiros estão sendo asfixiados por Bolsonaro, Jotabê
Medeiros publica no portal ARTE!Brasileiros artigo que descreve a situação de forma
elucidativa. Na perspectiva dele, o Governo Federal, por meio da via econômica, instituiu
processo que tinha por objetivo fustigar e asfixiar museus consagrados e de notória
importância para a sociedade. Se referindo ao final do ano de 2021 e início de 2022, o crítico
cultural e repórter de jornalismo cultural denunciou que,
nos últimos meses do ano passado e no início deste, a Secretaria Especial de Cultura
do governo arquivou os planos anuais de 2022 de diversas instituições museológicas
do país e deixou às suas gestões apenas a opção de estender os planos anuais de
2021 com uma complementação de incentivo (um mecanismo que chamam de
“expandido”).
[...]
Além de fixar um teto esdrúxulo para o pagamento de cachês de artistas (R$ 3 mil
reais), a medida impactou decisivamente nos museus, já que traz novas disposições
para os Planos Anuais (que possibilitam que a museologia faça o planejamento de
suas atividades, que requerem negociações adiantadas com outros museus).
A primeira mudança que cria preocupação é que todas as autorizações para captação
serão concentradas no próprio Secretário Especial de Cultura, o que dá um papel
subalterno a todos os estudos técnicos prévios (MEDEIROS, 2022).
bianuais, o que os obrigou “a enfrentar o ano de 2022 não com o valor estimado pelas suas
direções, mas com uma ‘complementação’ de arbítrio exclusivo do governo” (Idem).
A lista de Jotabê Medeiros, não por coincidência, é a mesma apresentada acima com
as instituições que têm trabalhado temas relacionados à diversidade sexual e de gênero. No
caso do Museu do Futebol, aparentemente, a penalização se relaciona ao fato de sua
implantação e gestão serem de responsabilidade das mesmas organizações mantenedoras do
Museu da Língua Portuguesa.
Importante apontar ainda que, não apenas os dois museus, mas também a Fundação
Roberto Marinho, responsável pela concepção de ambos, teve que lidar com a perseguição
pela via financeira, ainda em julho de 2021. Conforme o Portal Imprensa: Jornalismo e
Comunicação da Web, em matéria intitulada Em possível revide, governo edita portaria que
prejudica Fundação Roberto Marinho, seria provável que o governo Bolsonaro tivesse
arquitetado, como mais um ato de retaliação “pela via do cerceamento econômico, ao Grupo
Globo, considerado inimigo da pátria pelos fanáticos apoiadores do presidente” (Portal
Imprensa, 2021).
Ainda segundo o portal, o secretário especial da Cultura, Mário Frias, teria celebrado a
decisão, feito críticas à Fundação Roberto Marinho e alertado que as auditorias dos projetos
da Lei Rouanet eram prioridade de sua gestão. Lembra ainda que o secretário criticou o
Museu da Língua Portuguesa, implantado pela Fundação Roberto Marinho, condenando o uso
do pronome neutro "todes" feito pela instituição em suas redes sociais e que, nesta ocasião,
teria anunciado que tomaria medidas para impedir o uso do dinheiro público em ações
ideológicas, conforme mencionado anteriormente neste estudo (Idem). Como pudemos aferir,
as ameaças se concretizaram e o Museu da Língua Portuguesa não foi o único afetado.
na qual a palavra “todes” tem estabelecido relação metonímica nessa querela - que aparece na
exposição de longa duração na perspectiva da linguagem inclusiva, já que é disso que se trata.
O que habituamos chamar de linguagem neutra é uma proposta, que parte dos
movimentos sociais, de superação do caráter sexista e elitista da língua por meio de um
conjunto de operações linguísticas de neutralização de gênero gramatical a partir da demanda
e proposição de grupos menorizados. O resultado seria uma linguagem inclusiva para pessoas
transexuais, travestis, não-binárias, intersexo ou de qualquer outra variedade de gênero que
não se sinta abrangida pelo uso do masculino genérico e dominante. Uma vez que a estrutura
gramatical do português expressa e evidencia hierarquias sociais, as modificações propostas
beneficiariam também as mulheres cisgênero.
Pode-mos citar aqui a diferença entre boi/vaca, galo/galinha, por exemplo, que
relaciona a figura feminina a um significado negativo e a masculina a um significado
positivo (que enaltece a sua masculinidade). Em sua fala final, o pesquisador
afirmou que os usos de “puto” e “puta” evidenciam que, pela língua, mantemos uma
hierarquia binária e sexista de gênero (GUIMARÃES, 2020, p.04).
Se, como disse Petter (2007, p. 11), a linguagem é a “expressão de emoções, ideias,
propósitos e é orientada pela visão de mundo, pelas injunções da realidade social,
histórica e cultural de seu falante”, como a gramática normativa pode acolher
aqueles que estão à margem do espectro de gênero? Como as emoções, as ideias e os
propósitos de uma pessoa não binária (bigênera, multigênera, pangênera etc) podem
ser representados em uma linguagem que marca o gênero em “masculino e
feminino”, “todas e todos”, “senhoras e senhores”?" (Idem).
Depois do exposto, temos que concordar quando Ulpiano Bezerra de Meneses diz que
Nas palavras de Odair da Cruz Paiva, “a relação dos museus com o tempo presente
tem sido motivo para um sem número de preocupações, problemas e desafios; estes implicam
reflexão e proposições de alternativas, mudanças de posturas e criação de práticas para a
manutenção, renovação e vitalidade daquelas instituições” (2014, p. 157). Neste sentido, olhar
para os museus com criticidade é corroborar para a modernização de seus discursos, quiçá
contribuir para que sejam de fato inclusivos, acessíveis e a serviço da sociedade. Em estudo
crítico sobre o Museu da Imigração do Estado de São Paulo, Paiva defendeu que as críticas
74
colocam a instituição onde todo museu deveria estar: no lugar do fórum - e não do templo
(2015, p. 15).
A primeira vez que entrei no novo Museu da Língua Portuguesa, ainda fechado, foi
numa visita técnica realizada pela curadora Isa Grinspum Ferraz para a equipe da Fundação
Roberto Marinho, responsável pela concepção do Museu, oportunidade para que a equipe que
estava sendo composta para sua reabertura pudesse conhecer e ir se apropriando do conteúdo
que compunha a exposição principal da instituição.
O que me chamou atenção, não foi a Rua da Língua, com seus quase 120 metros de
instalação visual e sonora, que ocupa toda a extensão oeste, que conecta todos os módulos do
primeiro andar da exposição, que impacta pela grandiosidade e incomoda parte do público por
ser responsável por uma confusão de estímulos sensoriais,. Na verdade, não me lembro
exatamente do percurso escolhido, menos ainda do que foi dito na ocasião. Hoje, com o
conteúdo já introjetado, me passou a ser difícil recordar a ordem das experiências. Não
lembro, por exemplo, das sensações em mim provocadas pela Rua da Língua ou por rever o
Beco das Palavras, mas lembro exatamente do que senti quando, pela escada, passamos do
segundo para o terceiro andar.
Entre uma porta corta fogo, que encerra um andar, e a outra, que antecede o seguinte,
forma-se um corredor escuro que, contando apenas com a iluminação de segurança, dificulta
identificar os degraus e o caminho a ser transposto até a próxima etapa da exposição. Naquela
ocasião, a porta do segundo andar estava fechada. Foi preciso esforço para abri-lá e atravessar
o curto percurso que conectava o andar à escada que nos levaria a um clarão, sinal de que a
76
porta corta-fogo do andar seguinte estava aberta. Para nosso alívio, a agonia de caminhar em
território escuro e desconhecido tinha se resumido a meio caminho. O que eu não esperava é
que o clarão se abria para a instalação chamada Falares e que ao subir a primeira metade dos
degraus já seria possível perceber uma das telas onde, em tamanho natural (ou quase), um
grupo bastante grande de pessoas dividira conosco, visitantes, suas experiências pessoais com
essa língua que identificamos como português do Brasil. E assim, no primeiro totem,
recepcionando o primeiro grupo a chegar para uma visita guiada, estava a professora Paula
Beatriz de Souza.
Ensinando para as crianças no primeiro aninho "para baixo" e "para cina". Quando
eu falava "para baixo" eles tinham que agachar, "para cima", levantar. E uma
aluninha, recém chegada do nordeste, ela ficava assim ((gesticula e se movimenta
expressando inquietação)), sem compreender o que eu tava falando. Aí eu fiquei
51
No canto esquerdo, a professora Paula, logo atrás, o poeta Carú de Paula, e à esqueda, a professora de dança
Mohana.
77
observando, aí quando eu falei pra ela "despenca!", ela agachou, eu, "arriba!", ela
levantou. E ali criou um vocabulário, que é o dialeto, exatamente, nosso, né, pelas
regiões. E alí ((gagueja)), a brincadeira e a aprendizagem até aumentou, porque aí
ficaram quatro formas, porque aí eu falava, tinha hora... Aí eu expliquei para ela,
“quando eu falar "pra baixo" é a mesma coisa que despenca, quando eu falar "para
cima", é arriba. E para os outros alunos que já eram aqui da região sul, sudeste, é...
também ensinei, e aí ficou a brincadeira, a aprendizagem ali, maior
Posteriormente, com o fim da visita, voltei ao segundo andar para assistir a todo o
conteúdo do totem Educadores, e percebo que Paula traz para sua narrativa a experiência
trans, em sua relação com a educação, considerando o lugar social que ocupa e os marcadores
sociais da diferença que se expressam em seu corpo. Para ela, poder ocupar o lugar da
direção, poder ocupar a sala de aula na educação infantil em detrimento de seu processo de
transição de gênero e ser reconhecida pelo valor de seu trabalho expressa avanço no campo da
educação, uma vez que há pouco tempo, vislumbrar esse cenário era quase impossível.
Marinho e Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo, o que significa
que naquele momento não tínhamos dados sobre o conteúdo da exposição. Para muitos de
nós, trabalhadores, aquele era de fato o primeiro contato. Não sabíamos, por exemplo, quais
os grupos sociais estavam representados, ou se o conteúdo estaria alinhado aos debates mais
atuais em suas respectivas áreas, nem o volume e as condições técnicas do que estava exposto.
Neste contexto, todo esforço de imersão no conteúdo seria valorizado, e o resultado é o que
segue nas páginas abaixo.
Com os caminhos abertos pela professora Paula e o totem Educadores, o mais coerente
parecia seguir investigando o conteúdo da instalação Falares e o restante do segundo
pavimento da exposição, terceiro do edifício que abriga o Museu, denominado de Língua
Viva.
As duas últimas instalações que compõem o pavimento Língua Viva (O que pode a
língua? e a Praça da Língua),sobre as quais falaremos mais abaixo, são experiências
imersivas que funcionam no formato de sessão de cinema, com intervalo de trinta minutos
entre uma e outra, tempo necessário para que o público participe da primeira experiência e se
desloque à segunda. Por uma questão de organização, de transparência na informação e da
garantia de que o público tenha a chance de organizar o tempo da sua visita da forma que
79
melhor lhe atenda, os orientadores de público recomendam, ainda na entrada do Museu, que
os visitantes subam direito a este pavimento e retire o ingresso para a sessão referente ao
horário que melhor lhe convier. Isso faz com que Falares seja a porta de entrada ao Museu da
maior parte do público.
A instalação foi proposta pela curadora principal da exposição, Isa Grinspum Ferraz,
mas foi concebida por dois curadores e uma cineasta convidados, o escritor pernambucano
Marcelino Freire; Roberta Estrela D’alva, atriz, pesquisadora, produtora cultural e poeta52, e a
documentarista carioca Tatiana Lohmann, respectivamente.
Aqui a diversidade social se expressa em maior potência. Uma prova disso é que em
Falares as linguagens neutra e inclusiva são contempladas, por exemplo. Embora esse não
seja o único espaço onde essas práticas linguísticas estão presentes (elas estão também em
vídeos de interpretação em libras que compõem os diretórios curatoriais e de acessibilidade53),
é nessa experiência expositiva que aparecem de forma estruturadas. No texto de apresentação
inscrito na parede pode-se ler o seguinte diálogo entre Roberta Estrela D'Alva e Marcelino
Freire:
52
Roberta Estrela D’alva é uma mulher cis negra, periférica e de notória presença na cena do hip hop do Brasil.
É importante apontar para a identidade de raça, gênero e de origem dos agentes para dar a dimensão do quanto o
Museu da Língua Portuguesa conseguiu promover de inclusão e acesso às vozes diversas na concepção de seus
discursos. Faremos isso mais vezes durante o transcorrer o texto.
53
Cada módulo expositivo é aberto por um diretório curatorial, onde também estão localizadas ferramentas de
acessibilidade. São doze totens ao total cada qual com um texto curatorial que apresenta ao público o módulo
expositivo correspondente, elemento audiovisual em Libras-Português (Manifesto poético Nosso Corpo Nossa
Língua de autoria do Slam do Corpo) , QR-Code que leva ao WebApp e um jogo sensorial ou objeto/obra tátil de
mediação com o público de pessoas com deficiência visual.
80
Ainda que de forma simplificada e sem dar conta da complexidade da questão, o texto
traz elementos importantes para localizar o debate historicamente e marcar uma possível
posição do Museu, por meio do partido curatorial, como espaço que objetiva apresentar a
língua e a linguagem como elemento social, cultural e político e que, portanto, está em
constante transformação, o que deveria tornar legítimo o uso da linguagem neutra.
54
Web App com navegação em português, libras, inglês e espanhol. Disponibiliza, apenas para a navegação nos
idiomas orais disponíveis, áudio descrição dos espaços e objetos táteis; oralização dos textos de parede e um
conteúdo extra para cada diretório. A navegação em libras dá acesso ao conteúdo que já está disponível na
exposição nesse idioma, servindo apenas para um acesso mais individualizado.
81
Na tela Jovens, o paulista Carú de Paula Seabra se apresenta como poeta e psicólogo
transmasculino, inicia sua fala declamando um poema de sua autoria e fala sobre a
invisibilidade transgênero e sobre o quanto teve que se esforçar mais que a maioria para ter
82
reconhecida a sua potência de saber. Anuncia que seu corpo e sua transgeneridade são temas
constantes em sua poesia.
Em Língua Viva, a décima tela, Amara Moira, escritora e professora de Literatura,
antes fala da língua enquanto processo em constante transformação e sobre como, neste
processo, novas interpretações vão produzindo novas palavras, para depois recitar trechos de
um de seus livros, que trans uma infinidade de referências de uso do pajubá; tratar da relação
histórica entre este dialeto, língua de segurança que vem hoje saindo da zona do segredo e
ocupando espaços públicos, e a comunidade travesti. Amara trata ainda da origem da palavra
travesti, como ela chega no brasil e o contraponto com o termo transexual, que, segundo ela,
teria chegado mais tarde. Ela aponta para o fato de que o uso da palavra transexual criou uma
categoria que, enquanto outridade, expõe outra, a de pessoas não trans, a cisgeneridade. Na
perspectiva dela, uma vez que a norma cria exclusão e violência, essa outra categoria também
precisa ser nomeada, para que as pessoas que não são transgênero deixem de se ver como
norma, como normais, em contraponto às anormais.
É evidente que os vídeos que ficam disponíveis ao público são resultado de um
processo de edição. Todavia, o percurso narrativo se desenha de forma a apresentar Amara
como pesquisadora, antes de trazer a questão relativa à sua identidade de gênero, ainda que as
dimensões se misturem em determinado ponto. Isso aponta para uma mudança paradigmática
em relação às narrativas que é importante documentar. Segundo Sara Wagner York, travesti
pedagoga e mestre em educação, sua principal motivação para a pesquisa e para a escrita é a
possibilidade de romper com a prática discursiva “onde pessoas trans e travestis aparecem
sempre relacionadas à discussão sexo-genital” (YORK, 2021, p. 55), para ela, não é um
problema falar de sexo e de gênero, o problema é quando essa se torna a única narrativa
possível. Ela, como tantas outras pessoas trans que alcançaram a chance de ocupar lugares
hegemônicos de circulação de saberes, denuncia o fato de que a genitália e a condição de
gênero antecede o sujeito trans nas narrativas produzidas por pessoas cisgêneras. Falares faz
com que esse pavimento da exposição seja onde a presença de pessoas trans se faz de maneira
mais significativa e embora a transgeneridade esteja presente na fala de todas as pessoas trans
representadas na instalação, a questão não foi o ponto central ou a única questão abordada em
nenhum dos casos.
Pela ampla diversidade representada, que vai de populares, como é o caso de Mohana
e Carú, a figuras que ocupam lugar de celebridade, como Laerte Coutinho, Alcione ou Lia de
Itamaracá, Falares tem a potencialidade de dialogar com todas as camadas do público. Cada
visitante, cedo ou tarde, encontra pontos de identificação na instalação, seja pela admiração
83
com o trabalho de alguma figura pública, por questões identitárias ou pelo reconhecimento da
importância da presença de determinadas figuras no acervo de um museu de grande cidade
como São Paulo, a exemplo do poeta pernambucano Miró da Muribeca. Isso faz com que o
tempo de permanência médio na instalação seja relativamente longo. Pelas observações de
campo, pudemos aferir que a permanência passa dos dez minutos, enquanto a média dos
outros pontos da exposição não passa dos sete minutos. Uma estratégia narrativa que pode ter
parte nesse efeito de permanência diz respeito ao fato de as falas das personagens serem
fragmentadas e intercaladas, o que faz com que você precise ver o vídeo todo para acessar a
narrativa completa de determinada personagem. Se há pessoas trans em quase metade das
telas que compõem a experiência e se o tempo de permanência do público na instalação é
relativamente longo, podemos concluir que há ali um espaço de qualidade para a visibilidade
dessas narrativas. No entanto, a seleção das personagens peca no quesito diversidade dentro
do grupo identitário em questão. Mesmo as experiências de um grupo social específico como
o de pessoas trans são atravessadas por diferentes marcadores sociais da diferença, mas,
especificamente no que diz respeito ao que a instalação propõe - as variações linguísticas do
português do Brasil -, o grupo não é representativo se considerarmos que apenas Mohana não
é natural do Estado de São Paulo (e ainda assim, no momento da coleta do depoimento que
deu origem à instalação, ela já morava em São Paulo fazia quatro anos) e não possuía
formação superior.
Letícia Nascimento reforça que “as categorias subalternas como mulheres negras,
mulheres trans, mulheres do sul global, entre outras, sofrem com um histórico processo de
silenciamento dentro da normatização hegemônica de raça, classe e gênero” e aponta que “a
ausência do lugar de fala não é apenas a perda do direito à palavra, mas, sobretudo, o lugar
marginal que nossa existência ocupa dentro da hirarquização social das diferenças” e, neste
sentido, defende que “devemos nos apropriar da fala, da escrita, da linguagem, rachar o
mundo com nossas palavras” (NASCIMENTO, 2021, p.78)55, em primeira pessoa. Neste
55
Para tanto, Letícia Nacimento utiliza, como referência, dos trabalhos de Djamila Ribeiro e Gayatri
Chakravorty Spivak.
84
mesmo sentido, conforme nos aponta Bruna G. Benevides56, travesti cearense e autora, desde
2017, da importante pesquisa anual sobre violências contra pessoas trans no Brasil pela
ANTRA, pesquisadores e aliados foram importantes interlocutores no início da luta
organizada no movimento das travestis brasileiras, que nasce durante a ditadura militar,
momento em que a caça às travestis se torna ação de Estado, e ganha força durante a epidemia
do HIV. Esses agentes contribuiram para que as vozes delas circulassem por espaços que de
outra forma nunca tinha sido possível (a opinião pública via imprensa e discurso acadêmico,
sobretudo).Todavia, essa mediação produziu, como efeito colateral, um processo de tutela e
apropriação narrativa que foi determinante para a formação do imaginário coletivo acerca
dessa camada social, de forma que, nas palavras de Bruna, “hoje as pessoas trans precisem
revisitar essas narrativas a fim de resgatar essas vozes, as nossas vozes, e falar com nossas
próprias palavras, formas e modos, quem somos” (BENEVIDES, 2021, p. 14). Levando em
consideração que, apenas em 2022, o Museu recebeu 346 mil57 pessoas em suas instalações,
ainda que pouco representativa no que diz respeito à diversidade de experiências trans, a
instalação consegue-lhes garantir importante espaço de fala em primeira pessoa.
O andar é composto por mais duas instalações multimídia: O Que Pode a Língua? e a
Praça da Língua. Para chegar em O que pode a língua?, o público passa pelo corredor que,
composto por um grande painel com grafite criado por Daniel Melim, uma instalação com
imagens do coletivo Projetemos e a obra Lute, de Rubens Gershman, leva o nome de Língua
Solta. Esse conjunto de instalações têm o objetivo de demonstrar como a língua pode ser
apropriada pela arte e articulada como ferramenta para a luta pela transformação social, tanto
no exterior (aqui, representada pelo grafite, pixação e video mapping) quanto no interior dos
espaços públicos (aqui representado pela arte de galeria). Aqui, mais uma vez, a curadoria usa
de recursos expográficos para defender que, a instituição não está a serviço da salvaguarda e
manutenção de uma pretensa norma culta, mas de apontar para o constante movimento
característico da relação entre língua e sociedade.
Por sua vez, O Que Pode a Língua é uma videoinstalação concebido pelo médico
Carlos Neder projetado numa grande tela, como num cinema, oferecido ao público em um
auditório de 150 lugares divididos em 12 fileiras. O vídeo trata da relação entre língua -
código compartilhado que permite a comunicação - e linguagem - super poder humano,
56
Bruna Benevides é também fundadora do Fórum Estadual de Travestis e transexuais do Rio de Janeiro
(FORUMTTRJ).
57
Segundo dados do portal de transparência do Museu disponível em:
https://www.museudalinguaportuguesa.org.br/gestao/transparencia/. Acesso em: 18 de março de 2023.
85
sistema sofisticado e complexo que transcende a língua e a palavra. Com cerca de 15 minutos
de duração, o conteúdo não conta com a participação de pessoas trans, mas, em um espaço de
duração de cerca de 10 ou 12 segundos, a drag queen Pabllo Vittar fala da relação entre a capa
de um álbum musical e a identidade da música que ele contém. Como já mencionado, embora
não se trate de uma identidade de gênero, a performatividade drag colabora com o
esgarçamento dos limites pré-estabelecidos para os gêneros humanos, e sua presença tem a
potencialidade de naturalizar os trânsitos entre eles.
Ao fim da sessão, a tela sobe como uma porta de garagem basculante abrindo
passagem para o próximo espaço, a Praça da Língua, uma instalação audiovisual
multissensorial. Embora não conte com a participação de pessoas trans - e justamente por isso
-, nos parece importante discorrer um pouco sobre ela, e , para isso, vale apresentar o texto
curatorial disponível na parede da instalação:
representante possível para a literatura em língua portuguesa não brasileira? O que dizer de
Dulce Maria Cardoso, Adília Lopes, Lídia Jorge e Paulina Chiziane, para citar pouquíssimos
exemplos? Não é necessário dedicar muito esforço para crescer essa lista, o que indica para a
possibilidade de os vieses inconscientes serem as maiores barreiras para a elaboração de
discursos equânimes.
58
Recurso de acessibilidade disponível aos visitantes por meio de QR-Codes dispostos pelo espaço expositivo.
87
São 1.336 m ² no formato de um longo e escuro corredor que vai se preenchendo pelas
instalações expográficas formando uma profusão de luzes, cores, sons e uma significativa
densidade de conteúdo disposto nos mais variados formatos e suportes, compondo uma
experiência cacofônica e hiperestimulante que nos remete à sociedade urbana descrita por
Georg Simmel em The Metropolis and Mental Life (1903). Não por acaso, se o visitante
acessa a exposição pelo lado Oeste, sua primeira experiência é a Rua da Língua, instalação
audiovisual de cerca de 120 metros de comprimento, que atravessa todo o pavimento
representando esse que é o local maior dos encontros, a rua, onde a urbanidade se faz possível
e onde a língua se transforma cotidianamente (pelos encontros). A vídeo instalação de cerca
de trinta minutos de duração é iniciada com o poema de Augusto de Campos Cidade, City,
Cité, e, composta por micro cenas que representam linguagens artísticas diversas, que vai da
estética da publicidade à dança contemporânea, passando pelo grafite e pelas frases de
para-choque de caminhão. Fazendo uso do poema de Augusto de Campos, ela busca
apresentar a cidade (que poderia ser qualquer capital do Brasil) em sua atrocidade,
caducidade, capacidade (em poder de produção e em volume), em sua causticidade,
duplicidade, elasticidade, felicidade, ferocidade, fugacidade, historicidade, loquacidade,
lubricidade, mendicidade, multiplicidade, organicidade, periodicidade, plasticidade,
publicidade, rapacidade, reciprocidade, rusticidade, sagacidade, simplicidade, tenacidade,
velocidade, veracidade, vivacidade, unicidade e voracidade. Mas, se o visitante chega pelo
lado Leste, sua visita se inicia pela Línguas do Mundo, instalação por meio da qual se tem
acesso à sonoridade de 23 línguas presentes na constituição do que identificamos como
português do Brasil. Composta por 23 colunas cilíndricas metálicas iluminadas internamente,
representa a cacofonia da torre de babel no formato de floresta luminosa.
Ao todo, o pavimento é ocupado por oito instalações, no entanto, a única relação que
com a identidade trans se dá no totem francês-inglês da instalação audiovisual Palavras
Cruzadas, onde aparece a palavra travesti e seus significados em protuguês e em francês,
respectivamente.
A instalação é composta por oito totens luminosos de duas faces que sustentam telas
interativas com conteúdo sobre línguas e povos que contribuíram para a formação do
português do Brasil, por meio dos quais o visitante tem acesso a informações sobre a origem
de palavras comuns ao vocabulário no Brasil, mas que tiveram origem no tupinambá, no
iorubá, no francês, no inglês, no espanhol, no italiano e outros idiomas, assim como a
contribuição do português do Brasil nos idiomas falados em outros países. As palavras são
88
Fonte: Twitter
palavras que não imaginavam ter origem estrangeira ou aquelas que estão envoltas a questões
tabu. Neste segundo grupo aparecem as palavras “travesti” e “gay” do totem
“Inglês/Francês”, xoxota e bunda do totem Quicongo/Quibundo/Umbundo e neca do
Iorubá/Eve-fon, por exemplo.
Travesti, em português, aparecia como "pessoa que não se identifica com o gênero
biológico e se veste e se comporta como pessoas de outro sexo", e, em francês, "homem que
se veste de mulher". Sabemos que toda simplificação está suscetível a falhas interpretativas,
mas no caso dos verbetes que objetivavam definir a palavra “travesti” há, ao menos, dois
grandes problemas estruturais: A biologização discursiva e a negação da identidade feminina
quando reduz a experiência travesti à mera questão de vestimenta ou de performatividade de
uma forma possível de ser homem em sociedade e não de subjetividades complexas. Letícia
Nascimento reforça que discurso produz efeitos e que “precisamos entender os processos
discursivos como criadores da nossa realidade social” (2021, p. 96 e 127)60. Isso para dizer
que, as definições foram, evidentemente, criadas sem o diálogo com o movimento de pessoas
trans organizado, sem a consulta às pessoas trans que ocupam outros espaços no acervo, e
que, longe de informar e educar para a transformação social, produzem o efeito de reiteração
dos discursos que produziram e legitimaram violências contra essa população. Em Falares,
por exemplo, Amara Moira conta que “hoje, uma das grandes reivindicações trans, do
movimento trans, é que o genital não defina de maneira nenhuma o meu gênero e a minha
maneira de existir no mundo”, assim, associar travesti a homens e evocar o gênero biológico é
reforçar o lugar que o pênis tem na formação do imaginário social acerca das identidades de
gênero, o que silencia as vozes das pessoas trans que estão há décadas dizendo o contrário
sobre si mesmas.
Como nos lembra Maria Clara Araújos dos Passos em seu Pedagogias das
Travestilidades, “tanto para Paulo Freire e Moacir Gadotti quanto para os movimentos sociais,
o conflito é um instrumento político-pedagógico. Para que algo novo surja, é necessário que
os antigos e os novos ideários se confrontem” (2022, p. 38). Mas, não é disso que se trata. O
encontro de ideias discordantes acerca das questões de gênero aparecem em Falares, onde
Amara Moira apresenta o pajuba como língua de segurança das travestis (e outras dissidências
de gênero) e, Francisco Bosco, homem branco cis filósofo, colunista, ensaísta, letrista e
compositor brasileiro, o apresenta como fruto da radicalização do campo da teoria e dos
ativistas de gênero e da comunidade LGBTQIA+ e desconfia se os efeitos sociais disso são
60
Para tanto, ela recorre a Foucault e à Butler.
90
positivos, uma vez que, ao invês de normalizar a presença das pessoas de expressão e
identidades de gênero divergentes, a exotiza.
Nesse sentido, Palavras Cruzadas é a anulação de Falares, não pelo contraponto,
porque para esse é preciso diálogo, mas justamente pela falta dele. E é sobre os efeitos desse
tipo de escolha discursiva que Sara Wagner York se refere quando diz:
Afinal, xs subalternxs (sic) podem e devem falar por si mesmxs (sic). Eu, enquanto
mulher travesti e professora , não permito que meu discurso seja invalidado ou
menor, entretanto, antes, ele não era ouvido e ainda que fosse, sem credibilidade.
Sou uma pesquisadora do asfalto, da luta de viver a cada dia com a possibilidade
estatística de uma morte eminente muito maior do que qualquer sujeito da população
cisgênera. Morte essa que é quase sempre física mas também simbólica, morte que
faz adoecer, minguar a subjetividade e as minhas possíveis potências e desejos, a
vida (York, 2021, p.62).
Fonte: Instagram
61
Publicado em 28 de agosto de 2022. Disponível em: https://www.instagram.com/p/ChzYZVAAPsC/. Acesso
em 12 de março de 2023.
91
reforçando que se trata de uma identidade feminina e que, portanto, a essas pessoas deve-se
referir no feminino, com o uso do artigo “A”, jamais O travesti. E, em francês, "no teatro,
papel masculino interpretado por uma mulher, ou um papel feminino interpretado por um
homem", contextualizando que a relação com o masculino vem do teatro e não de
características biológicas e/ou identitárias que atravessam esses corpos.
Ainda que não saiba, a travesti por trás da @leleonoura foi protagonista da mudança
operada pelas equipes de Articulação Social e do Centro de Referência do Museu da Língua
Portuguesa.
A programação online do Museu tem como principal meio de transmissão o seu canal
na plataforma de compartilhamento de vídeos Youtube, onde fica disponível para visualização
após realização dos eventos, e tem por característica a mesclagem entre conteúdo formal
sobre a língua, curiosidades sobre o edifício e temas relacionados às agendas dos movimentos
sociais, sempre relacionando língua e sociedade62. Nesse contexto, a programação contou com
cinco participações de pessoas trans até a data de escrita desse texto. Importante apontar que
duas dessas participações foram no bojo das comemorações ao Dia Internacional da Língua
Portuguesa, principal efeméride do Museu, portanto, nada marginais.
A primeira, no dia três de maio de 2021, contou com Linn da Quebrada, na primeira
live da programação online em comemoração ao Dia Internacional da Língua Portuguesa.
62
Para conhecer toda a programação online do Museu da Língua Portuguesa, a melhor fonte é o canal do Museu
no Youtube, disponível em: <https://www.youtube.com/channel/UCDyct6F210UrUWptJ22DkNw>.
92
63
A música Meu Bairro Minha Língua está disponível em todas as plataformas digitais, e o clipe pode ser visto
no canal de Vinicius Terra no Youtube, disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=AA6ZXd09MMQ&list=OLAK5uy_maS11o2a6tCKUkMzJbK0y81sLMJA
y_RCQ>.
64
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=_fRTGMnZ3xk&t=59s. Acesso em 12 de março de 2023.
93
Amara Moira, compondo mesa com o também escritor Geovani Martins e a curadora de
literatura indígena Julie Dorrico. O evento foi mediado pelo escritor pernambucano
Marcelino Freire. Nessa oportunidade, Amara falou sobre seu processo de escrita; sobre o
tensionamento entre a palavra que nomeia a experiência subjetiva e a norma culta da língua;
e, mais uma vez, tratou do bajubá, ou pajubá, como linguagem popular de origem yorubá
apropriada pelas comunidades LGBTQIAP+, sobretudo as travestis, como código linguístico
de segurança que se torna uma espécie de dialeto de identificação de grupo. Com os
comentários também abertos para interação somente durante o período de transmissão do
evento, ficou registrada apenas uma manifestação de desaprovação, e dizia respeito a forma
como os representantes do Museu se expressaram na abertura da live. Um participante da
audiência, que se identificou como Sergio Lazzarini, comentou: “Convidados e
convidadas???? Convidados - plural - significa ‘todas as pessoas’, todo o público masculino e
feminino”. E, considerando todas as redes sociais do Museu, essa foi a única ocorrência.
Em oito de junho, foi ao ar a quarta mesa do webinário Língua Portuguesa e Direitos
Humanos. O evento teve por objetivo debater o tema Diversidade Linguística: Entre a
Celebração e a Resistência e contou com a participação de Rita Von Hunty, drag queen e
professora. Embora drag não seja uma identidade trans, mas uma performance artística, e Rita
é uma personagem trazida à vida pelo homem cisgênero gay Guilherme Terreri Lima Pereira,
sua existência também trata do rompimento das normas estabelecidas para os comportamentos
de gênero na sociedade ocidental. O convite ter sido feito à Rita e não ao Guilherme já é
bastante significativo e digno de registro. Todavia, Rita tratou diretamente sobre linguagem
neutra como mecanismo de resistência linguística das identidades de gênero não conformes.
Embora o tema tenha sido o responsável pela maior contenda envolvendo o nome do Museu
até aqui, não foram registradas reações de desaprovação do público. Ao contrário, a live
contou com intensa participação, todas no sentido de fomentar o debate e parabenizar o
Museu pela iniciativa.
A título de exemplo, deixo aqui dois registros de interação do público no chat da live:
“Qual a proposta possível para o ensino de linguagem neutra? A marcação de gênero é algo
muito recorrente na nossa língua, então, pra você, como poderia ser iniciado a abordagem em
sala de aula?”, foram as perguntas feitas por Mayara Gomes. Por sua vez, José Ricardo
Pimenta comentou: “Acredito que a linguagem neutra seja um incentivo para a busca da
linguagem inclusiva”.
É possível que, por ter sido anterior à crise e por não trazer o conteúdo explicitado no
título do evento, as postagens relativas a essa ação também não sofreram ataques
94
65
O Twitter foi o canal que mais sofreu ataques. A postagem relativa à participação de Jonas Maria está
disponível em: https://twitter.com/MuseudaLingua/status/1409638336155721734. Último acesso foi realizado
em: 22 de abril de 2023.
95
Agrippina Manhattan e a baiana Ventura Profana. Ainda que, em termos globais, a presença
de pessoas trans corresponda a quase o dobro do percentual mapeado na sociedade brasileira,
que é de cerca de 2%, segundo levantamento pioneiro feito pela Faculdade de Medicina de
Botucatu da Universidade Estadual Paulista (UNESP) publicado em 202166, o mesmo não se
pode dizer em relação às mulheres e às pessoas negras, que, segundo o último censo do IBGE,
ultrapassam, cada qual, a metade da população67.
Para finalizar, é importante ressaltar que o Museu é aberto contando com cinco
pessoas trans na equipe, todas no núcleo educativo. Havia alguma diversidade em termos
raciais (2 eram brancas, 2 pardas e 1 negra), etária (uma delas já havia passado dos 50 anos),
de gênero (eram três travestis, um homem trans e uma pessoa não binária), três acessaram o
nível superior de ensino, duas delas tendo chegado à pós graduação, todas terminaram o
ensino médio (condição mínima de escolaridade para a função de orientação de público), três
moravam na região central, duas no mesmo bairro onde o museu está instalado (Luz-Bom
Retiro)68 e duas em regiões periféricas da cidade.
66
Estudo publicado na Nature Scientific Reports em 2021, disponível em:
https://ibdfam.org.br/noticias/9307/Cerca+de+2+em+cada+100+brasileiros+s%C3%A3o+transg%C3%AAneros
+e+n%C3%A3o+bin%C3%A1rios%2C+revela+pesquisa#:~:text=%C3%89%20o%20que%20revela%20um,de
%203%20milh%C3%B5es%20de%20indiv%C3%ADduos. Último acesso em: 20 de abril de 2023.
67
Segundo o último censo do IBGE (2021), mulheres correspondem a 51% e negros correspondem a 56% da
população brasileira.
68
Ser morador do território onde o Museu está inserido é parte dos critérios que priorizam candidatos às vagas
do Museu.
97
Sabemos que a evasão escolar é um dos efeitos da transfobia estrutural, o que faz com
que, ainda hoje, concluir os estudos básicos seja o segundo maior desafio dessa população69.
Se por um lado, é crescente a presença de pessoas trans nos bancos acadêmicos70 e que a
presença delas em cargos mais especializados representa importante conquista social, por
outro, a ausência de espaços para aquelas que não alcançaram níveis mais elevados de
escolaridade as mantêm em situação de extrema vulnerabilização. Não é preciso estudo
qualificado para perceber o agudo crescimento da população em situação de rua no centro da
capital paulista e o aumento da presença trans nesta população, por exemplo. Igualmente
alarmante é o crescimento da área de prostituição nessa região e o também aumento da
presença trans nesta condição.
69
O primeiro é se manter viva na sociedade que mais mata pessoas trans no Mundo, conforme já apontado. É
salutar apontar que essas mortes são produzidas, muitas das vezes, de forma pública e com requintes de
crueldade.
70
Sara Wagner York, Maria Clara Araújo dos Passos, Letícia Carolina Pereira do Nascimento, Amara Moira,
Caru de Paula e tantas outras pessoas trans citadas neste estudo representam por suas próprias experiências e nos
relatam em suas pesquisas e publicações essa presença crescente. Todavia, de acordo com estimativas da Antra, a
Associação Nacional de Travestis e Transexuais, para o ano de 2021, apenas 0,02% das pessoas trans no Brasil
chegam ao ensino superior, contra 3,7% do restante da população, segundo a Abres, Associação Brasileira de
Estágios. Dados disponíveis em: https://antrabrasil.org/2020/12/17/nota-antra-cotas-universidades-pessoas-trans/
e https://abres.org.br/estatisticas/. Acesso em 04 de abril de 2023.
98
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme aponta o processo que culminou na nova definição, os museus têm buscado
universalizar esse paradigma, o que implica em substituir a história oficial narrada pela voz
hegemônica pela multiplicidade de vozes e histórias que compõem as sociedades, resgatando
agentes políticos marginalizados da invisibilidade e descentralizando o objeto, dando maior
espaço para as identidades, a memória e cultura imateriais.
Um aspecto que demonstra a constante renovação dos museus diz respeito à duração
de suas exposições. Tradicionalmente, as exposições nos museus eram categorizadas em
permanentes ou temporárias. As exposições permanentes são aquelas que davam solidez à
identidade da instituição que poderia ou não utilizar-se das exposições temporárias como
ferramenta para a ampliação dos debates. No entanto, pensando nas rápidas transformações
sociais, na velocidade da informação e do desenvolvimento técnico, científico e cultural que
se refletem nos museus, como parte do conjunto dos produtos sociais, tem sido cada vez mais
comum - e esperado - que as instituições abram mão do paradigma de permanência e apostem
nos diálogos entre a longa e a curta duração. Neste sentido, atualmente o que impera nas
instituições museológicas são as exposições temporárias, que podem ser de curta, média ou
longa duração71.
Para além das exposições no espaço físico do museu, museus também fazem
exposições itinerantes, levando esses discursos por eles elaborados e parte de seu acervo para
que pessoas de outras localidades tenham acesso e, com a popularização da internet, é comum
que façam exposições virtuais. Os sites e as redes sociais dos museus são ferramentas
importantes de difusão do conhecimento por eles produzidos.
Na perspectiva de Neu, as exposições são a parte mais superficial das ações do museu,
71
As exposições de curta duração ficam em cartaz entre um e cinco meses, em média, as de média entre cinco
meses e um ano e as de longa duração ficam em cartaz entre um e cinco anos.
100
em suas palavras,
discurso violento contra essa comunidade, o que se deu a partir da interação, via redes sociais,
com o público, que teve a chance de colaborar com a ampliação e o fortalecimento de
discursos e ações no interior da instituição. Mas é preciso apontar que, do contexto de
pré-abertura para o momento em que escrevo essas linhas, houve mais retrocesso do que
avanço.
No que diz respeito à presença em seus quadros funcionais, também não houve
avanço. Ao contrário, o Museu reabre com cinco pessoas trans na equipe e fecha o primeiro
trimestre de 2023 com apenas quatro.
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107
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memória', diz historiador. Disponível em:
https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/rfi/2020/06/11/destruir-uma-estatua-nao-resolve-e-
108
24, 25 e 26/07/2021
–
Marcelo vai reunir-se com Lula e Bolsonaro no Brasil
PRT | IOL Diário de Portugal |26 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Notícias
(...) O Presidente da República vai encontrar-se com Bolsonaro no inicio da próxima
semana. O encontro, apurou a TVI, realiza-se a convite do Presidente do Brasil e insere-se
na viagem que Marcelo Rebelo de Sousa vai fazer àquele país, por ocasião da reabertura
do Museu da Língua Portuguesa. (...)
–
Mario Frias critica uso da palavra 'todes' por Museu da Língua
Portuguesa
–
Produtor de Medicamentos Butantan Mostra Interesse em
Investir na África Lusófona
PRT | Diário Económico |26 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por Redaccção | Notícias
(...) Doria contou que os presidentes de Cabo Verde, Jorge Fonseca, e de Moçambique,Filipe
Nyusi, confirmaram presença na cerimónia de reabertura do Museu da Língua
Portuguesa no Brasil, na cidade de São Paulo, no dia 31 de julho, e ao ser perguntado se o
governo paulista pretendia levar os chefes de Estado africanos para conhecer as fábricas de
vacinas do Butantan, respondeu afirmativamente. (...)
110
–
Presidente da República vai reunir-se com Jair Bolsonaro
durante visita ao Brasil
PRT | Antena 1 - RTP - Rádio e Televisão de Portugal |26 jul 2021 | Museu da Língua
Portuguesa | Por por RTP | Notícias
(...) O chefe de Estado irá ainda marcar presença na reabertura do Museu da Língua
Portuguesa, em São Paulo, reconstruído após o incêndio de 2015. (...)
111
–
Em 'Tempo', M. Night Shyamalan leva medo a uma praia
MS | A Crítica de Campo Grande |26 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Notícias
(...) Nos siga no Deixe seu Comentário Veja Também Mario Frias critica uso da palavra
'todes' por Museu da Língua Portuguesa CELEBRAÇÃO Evento que celebra o Dia da
Mulher Negra tem Zezé Motta soltando a voz COMEMORAÇÕES DO DIA Hoje é Dia:
Jorge Amado trabalhou pelo Dia do Escritor; (...)
PR | Diário Indústria & Comércio |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Notícias
(...) O museu está instalado no histórico prédio da Estação da Luz. Foto: Ana Mello
Reconstruído após o incêndio que o destruiu em dezembro de 2015, e com o conteúdo
atualizado, o Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, será reinaugurado no
sábado 31 de julho, às 11h, em cerimônia que será transmitida pelas redes sociais da
instituição. (...)
RN | São Miguel Para Todos |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por são miguel para
todos | Notícias
112
(...) Foto: Agência O Globo Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de Jair
Bolsonaro, usou seu Twitter para criticar o uso da palavra 'todes' pelo perfil oficial
do Museu da Língua Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. (...)
Bem protegido
RN | Martins em Pauta |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por Martins em
Pauta | Notícias
(...) Domingo, 25 de Julho de 2021 Foto: Agência O Globo Mario Frias, secretário especial
de Cultura do governo de Jair Bolsonaro, usou seu Twitter para criticar o uso da palavra
'todes' pelo perfil oficial do Museu da Língua Portuguesa, que reabre no próximo dia
31 de julho. (...)
113
PR | Diário dos Campos |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Notícias
(...) Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de Jair Bolsonaro, usou seu
Twitter para criticar o uso da palavra 'todes' pelo perfil oficial do Museu da Língua
Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. 'O Governo Federal investiu 56
milhões de reais nas obras do Museu da Língua Portuguesa para preservarmos o nosso
patrimônio cultural, que depende da preservação da nossa língua. (...)
SP | A Tribuna de Santos Online |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Notícias
114
(...) Mario Frias critica uso da palavra 'todes' por Museu da Língua
Portuguesa Secretário especial de Cultura do governo Jair Bolsonaro usou o Twitter para
se posicionar sobre o caso Por: Estadão Conteúdo - 25/07/21 - 18: (...)
SP | Reporter Diário |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por Da Redação | cultura
(...) Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de Jair Bolsonaro, usou seu
Twitter para criticar o uso da palavra 'todes' pelo perfil oficial do Museu da Língua
Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. 'O Governo Federal investiu 56
milhões de reais nas obras do Museu da Língua Portuguesa para preservarmos o nosso
patrimônio cultural, que depende da preservação da nossa língua. (...)
BA | Jornal da Chapada |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por Jornal da
Chapada | Notícias
(...) O secretário especial da Cultura, Mario Frias, condenou o uso do pronome neutro 'todes'
pela redes sociais oficiais do Museu de Língua Portuguesa. 'O Governo Federal investiu
R$56 milhões nas obras do Museu da Língua Portuguesa, para preservarmos o nosso
patrimônio cultural, que depende da preservação da nossa língua. (...)
BR | MSN Brasil |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por Redação | Notícias
(...) Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de Jair Bolsonaro, usou seu
Twitter para criticar o uso da palavra "todes" pelo perfil oficial do Museu da Língua
Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. "O Governo Federal investiu 56
milhões de reais nas obras do Museu da Língua Portuguesa para preservarmos o nosso
patrimônio cultural, que depende da preservação da nossa língua. (...)
115
MG | Estado de Minas online |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Notícias
(...) Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de Jair Bolsonaro, usou seu
Twitter para criticar o uso da palavra 'todes' pelo perfil oficial do Museu da Língua
Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. "O Governo Federal investiu 56
milhões de reais nas obras do Museu da Língua Portuguesa para preservarmos o nosso
patrimônio cultural, que depende da preservação da nossa língua. (...)
BR | Correio Braziliense Online |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por Agência
Estado | Notícias
(...) Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de Jair Bolsonaro, usou seu
Twitter para criticar o uso da palavra "todes" pelo perfil oficial do Museu da Língua
Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. "O Governo Federal investiu 56
milhões de reais nas obras do Museu da Língua Portuguesa para preservarmos o nosso
patrimônio cultural, que depende da preservação da nossa língua. (...)
(...) Crédito: Reprodução Twitter Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de
Jair Bolsonaro, usou seu Twitter para criticar o uso da palavra "todes" pelo perfil oficial
do Museu da Língua Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. (...)
BR | Head Topics - Brasil |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Notícias
(...) EstadaoCultura Mario Frias critica uso da palavra 'todes' por Museu da Língua
Portuguesa Secretário especial de Cultura de Bolsonaro definiu uso de gênero neutro
como 'pirueta ideológica'; (...)
117
BR | Head Topics - Brasil |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Notícias
(...) ISTOÉGENTE O cantor sertanejo Tiago, da dupla com Hugo, rebateu o comentário de
Fafá de Belém sobre sua cirurgia peniana. A veterana o chamou de 'ridículo' em uma
postagem de Hugo Gloss nas redes sociais. + Mario Frias critica uso da palavra 'todes'
por Museu da Língua Portuguesa + Michel Teló comemora aniversário do filho caçula,
[? (...)
(...) Roberto Castro/ Mtur Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de Jair
Bolsonaro, usou seu Twitter para criticar o uso da palavra "todes" pelo perfil oficial
do Museu da Língua Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. (...)
RJ | O Dia RJ Online |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por E Estadão
Conteúdo | Notícias
(...) 18 São Paulo - Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de Jair Bolsonaro,
usou seu Twitter para criticar o uso da palavra "todes" pelo perfil oficial do Museu da
Língua Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. (...)
MG | Jornal Correio do Papagaio |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Notícias
(...) Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de Jair Bolsonaro, usou seu
Twitter para criticar o uso da palavra "todes" pelo perfil oficial do Museu da Língua
Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. "O Governo Federal investiu 56
milhões de reais nas obras do Museu da Língua Portuguesa para preservarmos o nosso
patrimônio cultural, que depende da preservação da nossa língua. (...)
RS | Gaúcha ZH |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por Estadão Conteúdo | Cultura e
Lazer
(...) Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de Jair Bolsonaro, usou seu
Twitter para criticar o uso da palavra "todes" pelo perfil oficial do Museu da Língua
Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. "O Governo Federal investiu 56
milhões de reais nas obras do Museu da Língua Portuguesa para preservarmos o nosso
patrimônio cultural, que depende da preservação da nossa língua. (...)
RJ | Tribuna de Petropolis |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por Estadão | Notícias
(...) Mario Frias critica uso da palavra 'todes' por Museu da Língua Portuguesa 25/jul
15:03 image/svg+xml Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de Jair
Bolsonaro, usou seu Twitter para criticar o uso da palavra 'todes' pelo perfil oficial
do Museu da Língua Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. (...)
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SP | Portal Meon |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por Conteúdo Estadão | Notícias
(...) Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de Jair Bolsonaro, usou seu
Twitter para criticar o uso da palavra "todes" pelo perfil oficial do Museu da Língua
Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. "O Governo Federal investiu 56
milhões de reais nas obras do Museu da Língua Portuguesa para preservarmos o nosso
patrimônio cultural, que depende da preservação da nossa língua. (...)
SP | Diário do Grande ABC ONLINE |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Esportes
(...) Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de Jair Bolsonaro, usou seu
Twitter para criticar o uso da palavra "todes" pelo perfil oficial do Museu da Língua
Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. "O Governo Federal investiu 56
milhões de reais nas obras do Museu da Língua Portuguesa para preservarmos o nosso
patrimônio cultural, que depende da preservação da nossa língua. (...)
(...) Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de Jair Bolsonaro, usou seu
Twitter para criticar o uso da palavra 'todes' pelo perfil oficial do Museu da Língua
Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. 'O Governo Federal investiu 56
milhões de reais nas obras do Museu da Língua Portuguesa para preservarmos o nosso
patrimônio cultural, que depende da preservação da nossa língua. (...)
PR | Bem Paraná Online |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por Estadão
Conteúdo | Notícias
(...) Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de Jair Bolsonaro, usou seu
Twitter para criticar o uso da palavra "todes" pelo perfil oficial do Museu da Língua
Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. "O Governo Federal investiu 56
milhões de reais nas obras do Museu da Língua Portuguesa para preservarmos o nosso
patrimônio cultural, que depende da preservação da nossa língua. (...)
PR | Cgn |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por Agência Estado | Notícias
(...) Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de Jair Bolsonaro, usou seu
Twitter para criticar o uso da palavra 'todes' pelo perfil oficial do Museu da Língua
Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. 'O Governo Federal investiu 56
milhões de reais nas obras do Museu da Língua Portuguesa para preservarmos o nosso
patrimônio cultural, que depende da preservação da nossa língua. (...)
SP | O Liberal online - Americana (SP) |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por Por
Agência Estado | Cultura
(...) Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de Jair Bolsonaro, usou seu
Twitter para criticar o uso da palavra 'todes' pelo perfil oficial do Museu da Língua
Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. 'O Governo Federal investiu 56
milhões de reais nas obras do Museu da Língua Portuguesa para preservarmos o nosso
patrimônio cultural, que depende da preservação da nossa língua. (...)
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BR | Estadão Online |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por Redação, O Estado de
S.Paulo | Cultura
(...) Mario Frias, secretário especial de Cultura do governo de Jair Bolsonaro, usou seu
Twitter para criticar o uso da palavra "todes" pelo perfil oficial do Museu da Língua
Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. "O Governo Federal investiu 56
milhões de reais nas obras do Museu da Língua Portuguesa para preservarmos o nosso
patrimônio cultural, que depende da preservação da nossa língua. (...)
RO | Ouro Preto Online |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Notícias
(...) Leia também1 DiCaprio, Greta e Macron se calam sobre incêndios nos EUA 2 Heleno
atribui suspeitas de Joice sobre GSI a 'perturbação da pancada' 3 Nunes Marques aciona
PGR contra colunista da Folha 4 Joice revela a site que tem "dois suspeitos" de suposto
atentado 5 Frias critica uso de "todes" em post do Museu da Língua Portuguesa (...)
BR | Imprensa Brasil |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por Redação | Notícias
(...) 'O governo federal investiu R$ 56 milhões nas obras do Museu da Língua
Portuguesa, para preservarmos o nosso patrimônio cultural, que depende da preservação
da nossa língua', disse o secretário. 'Não aceitarei que esse investimento sirva para agentes
públicos brincarem de revolução'. disse Frias. (...)
Portuguesa, que reabre no próximo dia 31 de julho. "O Governo Federal investiu 56
milhões de reais nas obras do Museu da Língua Portuguesa para preservarmos o nosso
patrimônio cultural, que depende da preservação da nossa língua. (...)
SP | Tribuna Ribeirão |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por Redação 1 | Notícias
(...) A reabertura do Museu da Língua Portuguesa, instalado na histórica Estação da
Luz, na capital paulista, será no dia 31 de julho. A estrutura sofreu um incêndio de grandes
proporções em 21 de dezembro de 2015 e teve que ser completamente reformada. (...)
MT | Jornal do Advogado MT |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por Rocha | Notícias
(...) Início Bastidores Mario Frias diz? O secretário especial da Cultura, Mario Frias,
condenou o uso do pronome neutro 'todes' pela redes sociais oficiais do Museu de Língua
Portuguesa. 'O Governo Federal investiu R$ 56 milhões nas obras do Museu da Língua
Portuguesa, para preservarmos o nosso patrimônio cultural, que depende da preservação
da nossa língua. (...)
AM | Revista Cenarium Jornalismo Técnico e Investigativo |25 jul 2021 | Museu da Língua
Portuguesa | Notícias
(...) O perfil do Museu da Língua Portuguesa no Twitter publicou um vídeo, na
sexta-feira, 23, anunciando a reabertura do local e a nova logo. Porém, no texto da
publicação o uso de 'todes' não agradou a todos e gerou muitas críticas. Alguns comentários
foram de que o uso do 'todes' tem significado totalmente ideológico, outros alegaram pura
ignorância dos responsáveis por gerir a página. (...)
BR | Repórter |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por Redação | Notícias
(...) Home Brasil By Redação 1 O Museu da Língua Portuguesa, localizado na estação
da Luz, em São Paulo, reabre no dia 31 de julho suas portas ao público após 5 anos. Desde
que sofreu um incêndio em dezembro de 2015, o local passou por uma grande reconstrução
e reforçou suas medidas de proteção. (...)
PRT | Observatório da Língua Portuguesa |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa |
Por Observatório da Língua Portuguesa | Notícias
(...) Espaço reabre ao público reconstruído, após incêndio. Conteúdo renovado vai combinar
novas experiências audiovisuais e instalações marcantes Link imagens:
https://we.tl/t-KOvkO54zWb O Museu da Língua Portuguesa, instituição da Secretaria
de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo, será reinaugurado no próximo dia
31 de julho,? (...)
BR | MILhafre: um olhar lusófono sobre o mundo |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa |
Por Nova Águia | Notícias
(...) Depois do presidente de Portugal, também os chefes de Estado de Cabo Verde e de
Moçambique confirmaram presença no evento de reabertura do Museu da Língua
Portuguesa, no Brasil dia 31 de julho, segundo o Governador de São Paulo, João Doria.
(...)
PRT | Observatório da Língua Portuguesa |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa |
Por Observatório da Língua Portuguesa | Notícias
(...) São Paulo, Brasil, 25 jul 2021 (Lusa) - Adaptações criadas para facilitar a interação do
público com o acervo digital, durante a pandemia, e a renovação da aposta na valorização da
diversidade linguística são os destaques do novo Museu da Língua Portuguesa, no
Brasil, que reabre ao público em agosto. (...)
BR | Vida Destra |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por Vida Destra | Notícias
(...) Depois de ter sido destruído por um incêndio em 2015, o Museu da Língua
Portuguesa foi reconstruído e será reaberto ao público no próximo dia 31 de julho. (...)
NDF | Bahia e Região |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Por ueslei | Notícias
(...) FolhaPress O secretário especial da Cultura, Mario Frias, condenou o uso do pronome
neutro 'todes' pela redes sociais oficiais do Museu de Língua Portuguesa. 'O Governo
Federal investiu R$ 56 milhões nas obras do Museu da Língua Portuguesa, para
preservarmos o nosso patrimônio cultural, que depende da preservação da nossa língua. (...)
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MG | Estado de Minas online |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Notícias
(...) ) Obras no Museu da Língua Portuguesa No próximo dia 31, será realizada a
reinauguração do Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, com duas obras de
Ricardo Aleixo, sendo uma delas a filmagem de uma performance que será exibida numa
tela de 100 metros, um trabalho inédito, feito a convite do museu.
PRT | Antena 1 - RTP - Rádio e Televisão de Portugal |25 jul 2021 | Museu da Língua
Portuguesa | Por por Lusa | Notícias
(...) Novo Museu da Língua Portuguesa adapta-se à pandemia e aposta na diversidade
por Lusa cancelar Adaptações criadas para facilitar a interação do público com o acervo
digital, durante a pandemia, e a renovação da aposta na valorização da diversidade
linguística são os destaques do novo Museu da Língua Portuguesa, no Brasil, que
reabre ao público em agosto. (...)
PRT | Notícias ao Minuto |25 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Notícias
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(...) Doria contou que os presidentes de Cabo Verde, Jorge Fonseca, e de Moçambique,Filipe
Nyusi, confirmaram presença na cerimónia de reabertura do Museu da Língua
Portuguesa no Brasil, na cidade de São Paulo, no dia 31 de julho, e ao ser perguntado se o
governo paulista pretendia levar os chefes de Estado africanos para conhecer as fábricas de
vacinas do Butantan, respondeu afirmativamente. (...)
TICTAC
SP | Gazeta de São Paulo - Impresso - Flip |23 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Notícias
(...) Após um incêndio devastador em dezembro de 2015, o Museu da Língua
Portuguesa reabre suas portas em 31 de julho. Contudo, a história do prédio que abriga
um dos primeiros museus totalmente dedicado a um idioma no mundo começou bem antes e
se mistura com outro símbolo histórico da cidade de São Paulo, a Estação da Luz. (...)
SP | Gazeta de São Paulo - Impresso - Flip |23 jul 2021 | Museu da Língua Portuguesa | Notícias
(...) Após um incêndio devastador em dezembro de 2015, o Museu da Língua
Portuguesa reabre suas portas em 31 de julho. Contudo, a história do prédio que abriga
um dos primeiros museus totalmente dedícado a um idioma no mundo começou bem antes e
se mistura com outro simbolo histórico da cidade de São Paulo, a Estação da Luz.