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SEMINÁRIO DE SOCIOLOGIA II

1. ACUMULAÇÃO PRIMITIVA DO CAPITAL

Entretanto a acumulação do capital pressupõe a mais-valia, a mais-valia a produção capitalista, esta porém a
existência de massas maiores de capital e força de trabalho nas mãos de produtores de mercadorias. Todo este
movimento parece, portanto, girar num círculo vicioso, do qual só saímos subpondo uma acumulação
«original» («previous accumulation»(1*) em Adam Smith) anterior à acumulação capitalista, uma acumulação que
não é o resultado do modo de produção capitalista mas o seu ponto de partida.

Esta acumulação original desempenha na economia política aproximadamente o mesmo papel que o pecado
original na teologia. Adão deu uma dentada na maçã, e deste modo o pecado desceu sobre o género humano. A
origem daquele é explicada ao ser contada como anedota do passado. Num tempo remoto havia, de um lado,
uma elite diligente, inteligente, e sobretudo frugal, e do outro uma escumalha preguiçosa, que dissipava tudo o
que tinha e mais.

O dinheiro e a mercadoria não são desde o início capital, tão-pouco os meios de produção e de vida. Carecem
da transformação em capital. Mas esta mesma transformação só pode processar-se em circunstâncias
determinadas, que se condensam no seguinte: duas espécies muito diferentes de possuidores de mercadorias
têm de se pôr frente a frente e entrar em contacto, de um lado proprietários de dinheiro, de meios de produção e
de vida, aos quais o que interessa é valorizar a soma de valor por eles possuída por meio da compra de força de
trabalho alheia; do outro lado trabalhadores livres, vendedores da força de trabalho própria e por isso
vendedores de trabalho. Trabalhadores livres no duplo sentido de que nem eles próprios pertencem
imediatamente aos meios de produção, como os escravos, servos, etc, nem também os meios de produção lhes
pertencem, como no caso do camponês que trabalha a sua propriedade, antes estão livres deles, livres e sem
responsabilidades. Com esta polarização do mercado das mercadorias estão dadas as condições fundamentais
da produção capitalista. A relação de capital pressupõe o divórcio entre os trabalhadores e a propriedade das
condições de realização do trabalho. Logo que a produção capitalista se firma nos próprios pés, ela não
conserva apenas esse divórcio, reprodu-lo numa escala sempre crescente. O processo que cria a relação de
capital não pode, portanto, ser outra coisa que não o processo de divórcio entre o trabalhador e a propriedade
das suas condições de trabalho, um processo que por um lado transforma os meios sociais de vida e de
produção em capital e os produtores imediatos, por outro lado, em operários assalariados. A chamada
acumulação original nada é, portanto, senão o processo histórico de divórcio de produtor e meios de produção.
Ele aparece como «original» porque forma a pré-história do capital e do modo de produção que lhe corresponde.

A estrutura económica da sociedade capitalista saiu da estrutura económica da sociedade feudal. A


dissolução desta libertou os elementos daquela.

A acumulação primitiva é um conceito central na teoria marxista que se refere ao processo pelo qual
o capitalismo emergiu e se estabeleceu como sistema econômico dominante. Karl Marx discutiu esse
conceito em detalhes em sua obra "O Capital" e outros escritos. Aqui está uma explicação detalhada
do conceito, juntamente com exemplos históricos:
1. Definição da acumulação primitiva: A acumulação primitiva é o estágio inicial do desenvolvimento
do capitalismo, no qual os recursos e os meios de produção são transferidos das mãos da
comunidade ou de pequenos produtores para as mãos de uma classe capitalista em ascensão. Isso
envolve a expropriação, deslocamento e exploração das pessoas que anteriormente tinham acesso
comum a esses recursos.
2. Despossessão dos camponeses: Um dos principais aspectos da acumulação primitiva é a
desapropriação dos camponeses e agricultores de suas terras. Isso muitas vezes ocorreu por meio de
leis de cercamento, onde as terras comuns eram transformadas em propriedades privadas, forçando
os camponeses a se tornarem trabalhadores assalariados nas fábricas e indústrias emergentes. Um
exemplo histórico é a revolução cercadeira na Inglaterra, que começou no século XVI.
3. Colonização e exploração colonial: A acumulação primitiva também foi impulsionada pela
colonização de territórios estrangeiros, onde recursos naturais, terras e mão de obra foram
explorados para enriquecer as nações colonizadoras e seus capitalistas. Por exemplo, o colonialismo
europeu na África no século XIX resultou na exploração de recursos minerais, como diamantes e
ouro, bem como na exploração da mão de obra local.
4. Despojamento das comunidades indígenas: Em várias partes do mundo, a acumulação primitiva
envolveu o despojamento de comunidades indígenas de suas terras e recursos tradicionais. Um
exemplo notável é a expansão para o oeste nos Estados Unidos, que envolveu a remoção forçada de
tribos indígenas de suas terras.
5. Trabalho infantil e condições de trabalho desumanas: A acumulação primitiva também se
caracterizou por práticas de trabalho brutais, incluindo o uso de trabalho infantil e condições de
trabalho extremamente precárias nas fábricas e minas. Isso resultou em lucros crescentes para os
capitalistas, à custa do sofrimento dos trabalhadores.
6. Acumulação de capital inicial: Todo esse processo de desapropriação e exploração visava
acumular capital nas mãos da classe capitalista emergente. Esse capital inicial foi essencial para o
desenvolvimento posterior do capitalismo industrial.

Em resumo, a acumulação primitiva foi um estágio fundamental no desenvolvimento do capitalismo,


caracterizado pela expropriação, exploração e concentração de recursos nas mãos da classe
capitalista. Ela moldou profundamente a estrutura econômica e social do mundo moderno e é um dos
conceitos-chave na análise crítica de Karl Marx sobre o capitalismo.

*Lei dos Cercamentos (Enclosure Acts), lei inglesa que permitia que as terras comuns fossem cercadas e transformadas
em pasto. As terras comuns eram parte do sistema feudal que estipulava determinadas áreas para serem ocupadas e

cultivadas pelos camponeses.

2. Expropriação do Povo do Campo da Terra

O conceito de "Expropriação do Povo do Campo da Terra" é uma ideia-chave na análise de Karl Marx
sobre o desenvolvimento do capitalismo, particularmente em sua obra "O Capital". Este conceito se
relaciona intimamente com a acumulação primitiva e descreve o processo pelo qual os camponeses e
agricultores foram desapropriados de suas terras e meios de subsistência, forçados a se tornar
trabalhadores assalariados nas indústrias emergentes. Vou explicar detalhadamente esse conceito e
fornecer exemplos históricos.

Conceito de Expropriação do Povo do Campo da Terra:

1. Desapropriação das terras comuns: No início do capitalismo, muitas terras eram mantidas em
comum por comunidades rurais ou eram cultivadas por pequenos agricultores e camponeses. A
expropriação do povo do campo da terra envolve a transformação dessas terras comuns em
propriedades privadas, geralmente por meio de atos legais, como as leis de cercamento na Inglaterra.
Isso negava aos camponeses seu acesso tradicional à terra.
2. Cercamentos e leis de terras: Os cercamentos eram uma prática pela qual terras comuns eram
divididas e privatizadas, excluindo os camponeses que antes delas dependiam. As leis de terras,
frequentemente promulgadas pelos governos ou monarcas, legitimavam esses cercamentos. O
resultado era que os camponeses se viam desprovidos de terras e forçados a vender seu trabalho
como força de trabalho assalariada.
3. Êxodo rural e industrialização: A expropriação do povo do campo da terra foi acompanhada por um
êxodo rural em direção às cidades industriais. Os camponeses empobrecidos, privados de suas
terras, buscavam emprego nas fábricas e indústrias urbanas em crescimento. Isso proporcionou uma
oferta abundante de mão de obra barata que impulsionou a Revolução Industrial.

Exemplos Históricos:

1. Revolução Cercadeira na Inglaterra: Um exemplo clássico da expropriação do povo do campo da


terra é a Revolução Cercadeira (Enclosure Movement) na Inglaterra, que ocorreu principalmente nos
séculos XVIII e XIX. Durante esse período, vastas extensões de terras comuns foram cercadas e
transformadas em propriedades privadas, expulsando os camponeses de suas terras.
2. Reforma agrária na Rússia: Após a Revolução Russa de 1917, o governo comunista liderado por
Lenin implementou uma reforma agrária que expropriou os latifundiários e redistribuiu as terras aos
camponeses. Embora essa ação fosse destinada a beneficiar os camponeses, também envolveu uma
forma de expropriação, pois tirou a propriedade privada da terra de alguns para entregá-la a outros.
3. Colonização na América Latina: Durante a colonização europeia das Américas, terras que eram
tradicionalmente utilizadas por comunidades indígenas foram expropriadas pelos colonizadores
europeus, resultando na perda de terras e meios de subsistência para os povos nativos.

Em resumo, a expropriação do povo do campo da terra é um processo histórico fundamental


associado à transição para o capitalismo, envolvendo a privatização das terras comuns, a expulsão
dos camponeses de suas terras e a transformação desses camponeses em trabalhadores
assalariados nas indústrias emergentes. Esse processo desempenhou um papel crucial na formação
do sistema capitalista moderno.

Em Inglaterra a servidão desaparecera de facto na parte final do século XIV. A maioria imensa da população era composta

então, e ainda mais no século XV, por camponeses livres, que cultivavam as suas próprias terras, fosse qual fosse o título

feudal atrás do qual se escondia a sua propriedade. Nas quintas senhoriais maiores, o bailiff (feitor), anteriormente ele mesmo

servo, foi desalojado pelo rendeiro livre. Os operários assalariados da agricultura eram compostos em parte por camponeses,

que valorizavam o seu tempo de ócio trabalhando para grandes proprietários, em parte por uma classe autónoma, pouco

numerosa em termos relativos e absolutos, de autênticos operários assalariados. Mesmo estes últimos eram de facto, e ao

mesmo tempo, camponeses que exploravam terra sua, já que além do seu salário recebiam terra arável, no montante de 4 e

mais acres, juntamente com as cottages. Além disso, gozavam, com os camponeses autênticos, do usufruto da terra comunal,

no qual pastava o seu gado e que ao mesmo tempo lhes oferecia lenha, madeira, turfa, etc. Em todos os países da Europa a

produção feudal está caracterizada pela divisão da terra pelo maior número possível de subfeudatários. O poder do senhor

feudal, como o de todo o soberano, assentava não no comprimento da sua lista de rendas mas no número dos seus súbditos, e

este dependia do número de camponeses que exploravam terra própriaEmbora o solo inglês depois da conquista

normanda tenha por isso sido dividido em baronias gigantescas, das quais uma única muitas vezes incluía 900 das velhas

anglo-saxónicas, ele estava semeado de pequenas explorações camponesas apenas aqui e além interrompidas por quintas

senhoriais maiores. Foram essas relações, com o florescimento simultâneo das cidades, característico do século XV, que

permitiram aquela riqueza popular que o chanceler Fortescue pintou com tanta eloquência no seu De laudibus legum Angliae

[Dos Méritos das Leis Inglaterra], mas elas excluíam a riqueza de capital.

6. GÊNESE DO CAPITALISTA INDUSTRIAL

A "Gênese do Capitalista Industrial" é um conceito central na teoria de Karl Marx sobre a formação do
capitalismo industrial. Ela descreve como o sistema capitalista emergiu a partir de estágios anteriores do
desenvolvimento econômico. Vou explicar detalhadamente esse conceito, relacionando-o a exemplos históricos:
1. Estágios anteriores: Marx argumentou que o capitalismo industrial não surgiu de repente, mas evoluiu
gradualmente a partir de estágios econômicos anteriores. Um desses estágios foi o feudalismo, onde a produção
estava centrada em propriedades feudais, com camponeses trabalhando a terra em troca de proteção e acesso a
recursos. O feudalismo era caracterizado pela propriedade da terra, produção agrícola e uma estrutura social
hierárquica.
2. Transição para o capitalismo: A transição para o capitalismo industrial começou com a acumulação primitiva,
como mencionado anteriormente. Isso envolveu a expropriação dos camponeses de suas terras comuns,
transformando-as em propriedades privadas para criar mão de obra assalariada e liberar recursos para a
industrialização. Esse processo criou as condições iniciais para o surgimento do capitalismo.
3. Revolução Industrial: O marco central na gênese do capitalismo industrial foi a Revolução Industrial na
Inglaterra, que começou no final do século XVIII. A Revolução Industrial trouxe avanços tecnológicos, como a
máquina a vapor, a mecanização têxtil e a produção em massa, que permitiram uma produção mais eficiente em
fábricas. Isso transformou a economia de uma base agrária e artesanal para uma economia industrializada.
 Exemplo histórico: A invenção da máquina a vapor por James Watt em 1765 foi um marco crucial. Ela
permitiu a mecanização de indústrias e impulsionou a produção de bens em larga escala.
4. Desenvolvimento do capitalismo: Com a Revolução Industrial, as fábricas e as indústrias começaram a
dominar a produção econômica. Os proprietários de fábricas e capitalistas acumularam riqueza por meio da
exploração da mão de obra assalariada, obtendo lucro com a venda de mercadorias produzidas em massa. A
produção, anteriormente descentralizada, agora estava concentrada em fábricas.
 Exemplo histórico: A rápida urbanização da Inglaterra durante a Revolução Industrial é um exemplo do
deslocamento da população rural para as cidades em busca de emprego nas fábricas.
5. Concentração de capital: Com o tempo, o capitalismo industrial levou à concentração de capital nas mãos de
um número relativamente pequeno de capitalistas. Isso resultou na formação de uma classe trabalhadora urbana e
industrial, com uma crescente polarização entre capital e trabalho.
 Exemplo histórico: O crescimento das corporações industriais no final do século XIX, como a Carnegie
Steel Company de Andrew Carnegie e a Standard Oil Company de John D. Rockefeller, ilustra a
concentração de capital nesse período.

Em resumo, a "Gênese do Capitalista Industrial" de acordo com Karl Marx descreve a transição do feudalismo
para o capitalismo industrial, destacando a acumulação primitiva, a Revolução Industrial e a concentração de
capital como etapas-chave desse processo. Essa evolução econômica e social transformou radicalmente a
organização da produção, a estrutura social e as relações de classe na sociedade ocidental.

A génese do capitalista industrial(95*) não decorreu da mesma maneira gradual do que a do rendeiro. Sem dúvida, muitos

pequenos mestres de corporação e ainda mais pequenos artesãos autónomos ou também operários assalariados

transformaram-se em pequenos capitalistas e, pela exploração gradualmente estendida de trabalho assalariado e

correspondente acumulação, em capitalistas sans phrase(96*). No período de infância da produção capitalista aconteceu muitas

vezes como no período de infância da cidade medieval onde a questão [de saber] quem, de entre os servos evadidos, devia

ser mestre e quem [devia ser] criado, em grande parte, foi resolvida pela data mais antiga ou mais tardia da sua fuga. No

entanto, o passo de tartaruga deste método não correspondia de maneira nenhuma às necessidades comerciais do novo

mercado mundial, que as grandes descobertas do fim do século XV tinham criado. A Idade Média, porém, havia transmitido

duas formas diversas de capital, que amadureceram nas mais diversas formações económicas da sociedade e que, antes da

era do modo de produção capitalista, quand même(97*) valiam como capital — o capital de usura e o capital de mercador.

«No presente, toda a riqueza da sociedade vai, em primeiro lugar, para a posse do capitalista...

paga ao dono da terra a sua renda, ao trabalhador o seu salário, ao colector de impostos e

dízimas as suas exigências, e guarda para si próprio uma grande parte — de facto, a maior

parte, e uma parte que está continuamente a aumentar — do produto anual do trabalho. Pode

agora dizer-se que o capitalista é o primeiro dono de toda a riqueza da comunidade, apesar de

nenhuma lei lhe ter conferido o direito a essa propriedade... esta mudança foi efectuada pela
cobrança de juros pelo capital... e não é curiosidade pequena que todos os legisladores da

Europa diligenciassem para impedir isto, mediante estatutos, nomeadamente estatutos contra a

usura... O poder do capitalista sobre toda a riqueza do país é uma mudança completa no direito

de propriedade, e por que lei — ou série de leis — foi ele efectuado?»(98*)

O autor deveria ter-se lembrado de que as revoluções(99*) não se fazem por leis.

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