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DIÓGENES CÂNDIDO DE L iM A ( o r g .

ENSINO E APRENDIZAGEM
DE LÍNGUA
conversas com especialistas
INGLESA

John Robert Schmitz . „• '


Luciano Amaral Oliveira | Vera Lúcia Menezes de Oliveira e Paiva
Kanavillil Rajagopalan | Luciano Rodrigues Lima | ElizabetlfRamos
Giêdra Ferreira da Cruz | Joceli Rocha Lima ,-
Domingos Sávio Pimentel Siqueira | Ana Antonia de Assis-Peterson
Eladyr (VIa Noberto da Silva | Telma Gimenez | Vilson José Leffa
Denise ScheyerI | Adelaide P. de Oliveira | Ricardo Augusto de Souza
Miriam Lúcia dos Santos Jorge | Hilário Inácio Bohn
Diógenes Cândido de Lima | Leda Maria Braga Tomitch
Leland Emerson McCleary | Melissa Santos Fortes *
Ana Maria Stahl Zilles
E d it o r : Marcos Marcionilo
C apa e P rojeto G rA fico: Andréia Custódio
I magem da capa : Stock
C onselho Editorial
Ana Stahl Zilles [Unisinos]
Carlos Alberto Faraco [UFPR]
Egon de Oliveira Rangel (PUCSPJ
Giívan Mullerde Oliveira [UFSC, Ipol]
Henrique Monteagudo [Universidade de Santiago de Compostela]
Kanavillil Rajagopalan [Unicamp]
Marcos Bagno [UnB]
Maria Marta Pereira Scherre [UFES]
Rache! Gazolla de Andrade [PUC-SP]
Salina Tannus Muchaii [PUC-SP]

CiP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

Ensino Aprendizagem de Ifngua inglesa: conversas com especialistas /


Diógenes Cândido de Lima (org.).- São Paulo:Parábola Editorial,2009.
(Estratégias de ensino; 11)

inclui bibliografia
ISBN 978-85-88456-95-2

I. Língua inglesa - Estudo e ensino (Superior). I. Lima, Diógenes Cândido


de, 1949 -.H. Série.

09-1522 CDD 428.24


CDU 811.11V243

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por escrito da Parábola Editorial Ltda.

ISBN: 978-85-88456-95-2
I a edição - I a reimpressão - junho/2010
© do texto: Diógenes Cândido de Lima, 2009
€) da edição: Parábola Editorial, São Paulo, maio de 2009
Preconceito contra o ensino de
língua estrangeira na rede pública

resistência dos alunos em se d e d ic a re m à disciplina d e língua


inglesa. Por mais q u e a aula seja prazerosa, q u e os alunos per­
c e b a m e e n te n d a m a utilidade d e c o n h e c e r um a se g u n d a lín­
g ua , a o fim das aulas, é co m u m a lg u m deles dizer:
“ Professora, o p ro b le m a não está e m sua a ula ou em a p re n ­
d e r um p o u c o d e inglês. O p ro b le m a é: p a ra q u e a p re n d e r
inglês se n ã o sabem os fa la r c o rre ta m e n te o p o rtuguê s, nossa
língua n a tiv a ? "
Os alunos e n te n d e m que c o m o n ã o falam sua língua m a te rn a
se gu ndo o q u e prevê a g ra m á tic a tra d icio n a l, é preciso prim ei­
ro “ fa la r b e m ” a língua nativa p a ra depois se d e d ic a re m a o
estudo d e um a segunda língua.
O utro fa to r que contribui p a ra a discrim inação em re la ç ã o às
aulas d e língua inglesa está a ss o c ia d o à lo c a liz a ç ã o dos m u­
nicípios. Em experiências em sala d e aula, em m unicípios m e ­
nores, notei que o p re c o n c e ito e m re la çã o às aulas d e língua
estrangeira é mais a ce n tu a d o , pois os alunos n ã o tê m p e rspe c-
tivas d e cursar um curso superior ou sair da c id a d e o n d e m ora m
em busca d e novas e melhores opo rtu n id a d e s. Os alunos d e
! 162 Ensino e aprendizagem de língua inglesa: conversas com especialistas
V_____

lo ca lid a d e s m enores a firm a m estudar a p e n a s para co n clu ir o


ensino m édio, mas não p e rc e b e m o c o n h e c im e n to adq uirid o
na escola, p rin c ip a lm e n te o de língua estrangeira, c o m o um
fa c iiita d o r no m e rc a d o d e trab alh o, já q u e tal c o n h e cim e n to
n ã o é fa to r valorizado nas atividades exercidas nas c o m u n id a ­
des o n d e vivem .
A desvalorização d a língua inglesa no a m b ie n te escolar ta m ­
b é m é p e rc e b id a em d o c e n te s d e outras disciplinas. A p ro p a ­
g a ç ã o d e ideias por p a rte d e alguns profissionais d a e d u c a ç ã o
d e q u e a disciplina A ou B são mais im portantes que o inglês,
pois aqueias reprovam e esta não, ta m b é m contribui p a ra o
descaso d e alguns alunos em re la çã o à aprendizagern d e lín-
i g u a estrangeira.
Em cid a d e s um p o u c o m aiores e mais desenvolvidas, p e rce b i
q u e o descaso em re la ç ã o à língua inglesa n ã o é tã o a c e n tu a ­
do, d a d o q u e a m aior p a rte de d o ce n te s e discentes re co n h e ­
c e a im p o rtâ n c ia do c o n h e c im e n to d e u m a língua estrangeira,
visando, p rin cip a im e n te , a melhores o p o rtu n id a d e s d e trab alh o
o ferecid as àqueles que c o n h e c e m um a segunda língua.
As diferenças culturais existentes entre os habitantes d e m unicí­
pios c o m diferentes graus d e desenvolvim ento influenciam no
p re c o n c e ito em re la ç ã o a o ensino d e língua inglesa?
V .____________________________________________ ______________________ ____________________ J

M íriam Lúcia dos Santos J orge :

1. Língua estrangeira na escola: por quê?

Um dos pilares da elaboração de qualquer proposta de ensino de in ­


glês em escolas está na compreensão dos objetivos de seu ensino. A
língua estrangeira é um componente essencial para a educação bási­
ca dos brasileiros e precisa ser considerada como uma área de conhe­
cimento tão im portante quanto outra qualquer. Obviamente, sendo
eu professora de inglês, tendo a perceber a língua estrangeira como
um espaço privilegiado em relação aos contextos culturais, políticos e
sociais na contem poraneidade. No entanto, m ais que um a parcialida-
Preconceito contra o ensino de língua estrangeira na rede pública

de estim ulada pela minha profissão, justifico m eu ponto de v ista por


considerar que a principal razão para perceber esse privilégio vem de
m inha percepção do papel e d u c a tiv o da língua estrangeira.

Professores e alunos de inglês tendem a perceber o lu g a r da língua


e stra n g e ira no currículo principalm ente a p a rtir das possibilida­
des de seu uso prático: obtenção de emprego, v ia g em internacional,
aprovação no vestibu lar etc., que realm ente são ju stifica tiv as im ­
p o rtan tes p ara a inclusão das le no currículo d a educação básica.
G o sta ria de questionar, no entanto, se seriam essas as principais
razões p a ra o ensino de le na escola. M inhas reflexões levaram -
me a observar a im portância da LE para m uito além de seus usos
p ráticos. Gosto de ressa ltar as possibilidades da educação plena do
indivíduo, que podem ser propiciadas e potencializadas pelo conta­
to com a LE. Assim , defendo a priorização do ensino da lín g u a por
seu c a rá te r educativo.

O c a rá te r educativo do ensino de um a le está nas possibilidades que


o alu n o pode ter de se tornar m ais consciente da diversidade que
co n stitu i o mundo. A s m últiplas possibilidades de ser diferente, seja
p ela cu ltu ra, seja pelas identidades individuais, podem fazer com
que o indivíduo se torne m ais consciente de si próprio, em relação a
seu contexto local e ao contexto global. .

A lín g u a in glesa tem sido considerada como um a língua internacio­


n al que pode facilitar a comunicação no mundo globalizado, sendo o
cham ado inglês internacional tratado como um a língua neutra, que
pode ser ensinada a todos. No entanto, m uitos estudiosos da área
de li n g u ís t i c a a p lic a d a c r í t i c a têm questionado o status dessa
lín g u a como língua internacional, pois não existem línguas neutras:
tod as a s línguas estão vinculadas a um a cu ltu ra e todo ensino tem
im plicações ideológicas.

Q uando ensinam os inglês, por exemplo, usam os m ateriais que


en sin am um a varian te dessa língua, a lín gua falad a por falantes
brancos, de classe média, moradores de grandes centros urbanos e
com alto grau de escolaridade. Norm alm ente, quem estuda inglês
164 Ensino e aprendizagem de língua inglesa: conversas com especialistas

refere-se ao inglês britânico ou ao inglês americano. E o que acontece


com o inglês falado n a Austrália? N a índia? Na África? E o inglês fa­
lado pelas comunidades de imigrantes que vivem nos Estados Unidos
e Inglaterra? E o ebonics, inglês falado pelos afro-americanos? Por que
esses diferentes “ingleses” não são ensinados? A resposta para esse
questionamento é bem complexa. Podemos afirmar, no entanto, que os
pesquisadores que discordam da neutralidade do inglês como língua in­
ternacional defendem que o ensino de inglês - como de toda e qualquer
língua estrangeira — deve ser feito levando em conta as necessidades
do local onde essa língua é ensinada, ressaltando que o objetivo maior
do ensino de inglês no mundo globalizado é criar oportunidades para
o aprendiz participar da globalização de maneira emancipada. Apren­
der inglês deve empoderar os aprendizes, e não torná-los submissos
a determinada form a de imperialismo linguístico. E por isso que não
podemos deixar de considerar o v a lo r e d u c a tiv o de um a língua.

M uitos professores (de l e o u não) pensam que ensinar uma lín ­


gua significa apen as ensinar sua gram ática e seu vocabulário. A
aprendizagem n a escola frequentem ente é vo ltad a para tradução e
mem orização, p a ra o desenvolvim ento da com petência linguística.
R aram ente existe a preocupação com a com unicação (apesar de o
cenário atual esta r m uito m ais interessante do que era há uns anos
atrás). Ensinar um a língua é m uito mais complexo que isso. Saber
a gram ática e vocabulário é m uito im portante p a ra aprender a se
com unicar na lín g u a estrangeira. No entanto, precisam os pensar
que, mesmo sem perceber, quando ensinamos u m a língua estran ­
g eira estam os ensinando muitos outros aspectos relacionados a ela,
ta l como a cultura de um país, m aneiras de representar um povo
etc. O valor educativo de um a lín gu a é im portante por poder criar
oportunidades p a ra que os educandos e educandas possam:

— refletir sobre a língua e cultura materna;


— apren d er sobre a diversidade cultural que existe no mundo e no
se u próprio país;
— p en sar no que significa ser jovem, criança, adulto em outras
p artes do mundo;
Preconceito contra o ensino de língua estrangeira na rede pública 165 ]

— com preender as diferenças cu ltu ra is como p a rte da riqu eza da


diversidade humana;
— conhecer literatura de v á ria s p artes do m undo, assim como ou­
tras form as de expressão a rtística etc.

Quando as práticas escolares com preendem o ensino de gram ática


e vocabulário, por meio de tem á tica s e tarefas d esvin cu lad as das
necessidades dos alunos, podem os ter muitos problem as, como o
cham ado “desinteresse” dos alunos.

2. Os alunos: resistência ou desinteresse?

M u itas vezes, as escolas desconhecem a condição de ser jovem , ne­


gro, trabalhador, pai, mãe e ta n ta s outras m arcas das identidades
de nossos educandos. Esse desconhecim ento pode ser evidenciado
na estruturação dos currículos, n a escolha de m a teria is didáticos,
nas im agens trabalhadas nas a u la s, no funcionam ento da escola,
na seleção de tem as e conteúdos etc. No caso do in glês, por exemplo,
encontrei m uitos professores que trabalham sem pre o famoso verbo
to be, lista s de palavras que p recisam ser tra d u zid a s e m em oriza­
das, e outras práticas d istantes d as realidades socioculturais dos
nossos educandos. Também há professores que se preocupam em
tra b a lh a r com princípios m ais com unicativos p ara o ensino de le , e,
m esm o bem-intencionados, tra b a lh a m com tem áticas m uito distan­
tes das necessidades de seus alunos, resultando em desencontros
com consequências bastante inibidoras do nosso trabalho.

O resultado desses desencontros, m uitas vezes, é in terp retad o como


sim ples (ou complicada!) oposição dos alunos. “E le s não querem
aprender” , “E les não têm in teresse” , dizem os professores. No en­
tanto, outra possibilidade de interpretação, está na com preensão
de que os jovens que frequentam a escola, por sua condição juvenil,
têm resistido de m aneiras d iferen tes a qualquer proposta de educa­
ção que não lh es pareça adequada a suas realidades.

N ão teriam razão esses jovens e adolescentes que re siste m ao que a


escola lhes propõe como educação? Com tantas vivên cia s e culturas
I 166 Ensino e aprendizagem de língua inglesa: conversas com especialistas

diferentes dos grupos sociais e etários, podem as aulas de inglês


continuar favorecendo um ensino afastado dos sujeitos sociocultu-
ra is aos quais se pretende ensinar inglês?

O com portam ento dos alunos é muito m ais um a forma de resistên ­


cia a práticas pedagógicas que não lhes são significativas. Não por
acaso tantos professores, no mundo inteiro, veem que seus alunos
não são m ais aqueles... prefiro pensar que não se trata apenas de
um a forma de m an ifestar desinteresse, m as um a demanda por m u ­
danças na educação e na escola.

3. O status d a disciplina na escola

U m a reclam ação constante de professores d e inglês é a pouca carga


horária dedicada ao ensino de inglês nas escolas. Essa carga h orá­
ria é fruto de um a c u ltu ra escolar que, por anos, entendeu a lín gua
como um conteúdo de im portância m arginal. Conscientes da im por­
tâ n cia da le , podemos hoje reeducar nossos colegas de escola, criar
oportunidades para que com preendam a im portância da le . A lém
disso, professores precisam ser mais reivindicativos, exigir boas
condições para a realização de seu trabalho. N ão baêta, no en tan ­
to, fazer longos discursos n a reunião pedagógica da escola. E sses
discursos podem ser, sim, im portantes. Contudo, mais im portantes
serão as práticas pedagógicas inovadoras, coerentes com as necessi­
dades de nossos alunos, que possibilitem a exploração do potencial
prático e educativo do ensino de LE.

4. Cidade grande, cidade pequena: quem é seu aluno?

Outro questionam ento incide sobre as diferenças culturais existentes


entre os habitantes de m unicípios com diferentes graus de desenvolvi­
mento. O que significa ser criança, adolescente, jovem ou adulto em
um grande centro urbano? E o mesmo que ser jovem no meio rural? E
ser morador de um condomínio fechado de luxo, que tem sua própria
escola? E estudar à noite? E ser chefe de fam ília? E ser pai, mãe?...
Preconceito contra o ensino de língua estrangeira na rede pública

Tantas diferenças que se perdem quando idealizam os aqueles a quem


queremos ensinar... Essas diferenças precisam ser (re)conhecidas
pelo professor, precisam ser aceitas e legitim adas em suas práticas.

Podemos com preender as diferenças a partir de nossas crenças, e h á


o perigo de sermos exclusivam ente afetados por nossos preconceitos
e pelos estereótipos que tem os sobre o outro, seja ele quem for. O
segredo p a ra conhecer nossos alunos pode ser a escuta sensível de
suas histórias, das histórias de suas com unidades e de outras h is­
tórias que possibilitem conhecer esse aluno a p a rtir de sua própria
voz e pontos de vista. A possibilidade de conhecer os educandos do
ponto de v ista sociocultural nos perm ite propor práticas pedagógi­
cas mais coerentes com seus desejos, sonhos, e principalm ente, com
a possibilidade de empoderá-los p a ra que sejam sujeitos na con stru­
ção de su a s próprias histórias.

Precisam os nos esforçar e ten ta r com preender nossas próprias h is­


tórias, descobrir de onde vêm nossas crenças, que valores estão su b­
jacentes às nossas práticas. Conhecendo-nos a nós mesmos, tem os
maiores chances de conhecer o outro sob perspectivas diferentes,
pontos de v ista diversos etc. Assim , podemos pen sar nos objetivos
educativos que orientam nossas práticas.

5. Para onde você quer levar seus alunos?

U m a pergunta que sempre considero im portante um professor, de


qualquer nível de ensino, enfren tar é: que professor você gostaria de
ser, de que professor seus alunos precisam e gostariam de ter e que
pessoas vocês gostariam de formar?

A aula de língua estrangeira pode proporcionar aos aprendizes


oportunidades de compreender e explorar diferentes visões de m un­
do e form as de expressão, cultivando as possibilidades de um a pers-
pectiva m ulticultural crítica no ensino de lín gu as, que não n eg a as
diferenças e que desafiem os discursos que perpetuam hierarqu ias
linguísticas e raciais.
[ 168 Ensino e aprendizagem d e língua inglesa: conversas com especialistas

U m a perspectiva crítica e m ultieultural p ara o ensino de inglês en­


contra, no B rasil, um contexto rico p ara a (re)descoberta da diver­
sid ad e em nosso país. Fazem os essa afirm ação a p artir do entendi­
m ento que a educação em língua estrangeira pode ser feita tam bém
por m eio das discussões de identidade, relações língua estrangeira
e lín g u a m aterna, comunicação intercultural e uma oportunidade
p a ra repensarm os as identidades raciais e sociais, dentre outras
que são construídas em nosso país. Todas essas possibilidades são
consequências das oportunidades de pensar o próprio eu a p a rtir do
p e n sar no outro, no estrangeiro.

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