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REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS
CAMINHOS DA HISTÓRIA
Revista do Departamento de História
Centro de Ciências Humanas – UNIMONTES
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REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
CAMINHOS DA HISTÓRIA
Editores
Marcos Fábio Martins de Oliveira e Regina Célia Lima Caleiro (Unimontes)
Carlos Antonio Aguirre Rojas (Unam-México)
Márcia Pereira da Silva (Unesp-Franca)
Comissão Editorial
Alysson Luiz Freitas de Jesus (Unimontes), Carlos Antonio Aguirre Rojas (Unam-México), César
Henrique de Queiroz Porto (Unimontes), Cláudia de Jesus Maia (Unimontes), Filomena Luciene
Cordeiro (Unimontes), Laurindo Mékie Pereira (Unimontes), Márcia Pereira da Silva (Unesp-Franca,
SP), Marcos Fábio Martins de Oliveira (Unimontes), Marta Verônica Vasconcelos Leite (Unimontes),
Regina Célia Lima Caleiro (Unimontes), e, Renato da Silva Dias (Unimontes).
Conselho Consultivo
Alzira Lobo de Arruda Campos (aposentada UNESP. Universidade São Marcos), Ana Maria Sayago de
Warner (Universidad Nacional de Córdoba/Argentina), Ângelo Carrara (UFJF), Carla M. J. Anastasia
(UFMG), Celso Silva Fonseca (UnB), Eliana Regina de Freitas Dutra (UFMG), Estevão Chaves
Rezende Martins (UnB), Fábio Faria Mendes (UFV), Helenice Rodrigues da Silva (UFPR), Heloísa M.
Starling (UFMG), Ida Lewkowicz (UNESP), Laima Mesgravis (aposentada USP/UNESP. Universidade
São Marcos), Marcelo Badaró Mattos (UFF), Marcos Antônio Lopes (UEL), Tarcísio Rodrigues
Botelho (PUC-MG), e, Wilson do Nascimento Barbosa (USP).
Revisão Ortográfica
De responsabilidade dos autores
Publicação semestral
Endereço
UNIMONTES, Campus Universitário “Professor Darcy Ribeiro”
Caixa Postal 126 - Cep: 39401-089 - Montes Claros – MG
Site:<http://sites.google.com/site/revistacaminhosdahistoria>
e-mail: <reitoria@unimontes.br>
1996 - 2012
v. 17, n. 1, n. 2
Semestral
ISSN 1517-3771 (impressa)
ISSN 2317-0875 (online)
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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO...................................................................................... 7
DOSSIÊS
“HISTÓRIA DA UNIMONTES”
“EDUCAÇÃO”
Organizadores: Márcia Pereira da Silva, Regina Célia Lima Caleiro,
Marcos Fábio Martins de Oliveira................................................................... 9
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RESENHA................................................................................................. 239
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APRESENTAÇÃO
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REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
mos para informar aos leitores que a partir da próxima edição, volume 18, editare-
mos a Revista somente na sua forma eletrônica.
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DOSSIÊS
“HISTÓRIA DA UNIMONTES”
“EDUCAÇÃO”
Organizadores:
Márcia Pereira da Silva,
Regina Célia Lima Caleiro,
Marcos Fábio Martins de Oliveira
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UNIVERSIDADES E DESENVOLVIMENTO REGIONAL:
ALGUMAS CONTRIBUIÇÕES DA UNIMONTES NO
NORTE DE MINAS GERAIS, BRASIL1
1
Este artigo foi elaborado com base em pesquisa denominada “Terciário superior e desenvolvimento
regional: uma análise do caso da Universidade Estadual dDe Montes Claros – Unimontes”, realizada
pelo Departamento de Economia da Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes com o
apoio da Fundação de Amparo a Pesquisa de Minas Gerais - Fapemig. A equipe responsável pelo estudo
foi composta pelo Professor Coordenador: José Maria Alves Cardoso; pelas Professoras Pesquisadoras:
Luciene Rodrigues; Maria de Fátima Rocha Maia; Tânia Marta Maia Fialho e Andréia Maria Narciso R.
Paula. Contribuíram como estagiários os acadêmicos Jair Alves Pereira Filho, Maria Alice Ferreira,
Roni Carlos Chagas e Ana Márcia R. da Silva.
* Mestre em Economia. Pesquisador do Núcleo de Pesquisa em Economia da Unimontes. Professor do
Departamento de Economia – Unimontes / Faculdades Santo Agostinho – FACISA – Brasil.
josehcb21@yahoo.com.br
** Doutora em História Econômica pela Universidade de São Paulo – USP. Pesquisadora do CesNova /
UNL - GT: Políticas Públicas e Responsabilidade Social. Professora do Programa de Pós-Graduação em
Desenvolvimento Social/Depto. de Economia – Unimontes – Brasil. rluciene@unb.br
*** Doutoranda em Sociologia – FCSH - Universidade Nova de Lisboa – Portugal. Pesquisadora do
CesNova /UNL - GT: Políticas Públicas e Responsabilidade Social. Professora do Departamento de
Economia – Unimontes – Brasil.rochamaiaster@gmail.com
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1 Introdução
Assim, este artigo tem como objetivo analisar algumas contribuições da Unimontes
ao desenvolvimento do seu território – a região Norte de Minas. O estudo elucida
algumas das contribuições econômicas das atividades da Universidade em sua re-
gião de influência. Ademais, analisa alguns aspectos relacionados a sua contribuição
sociocultural na qualificação do capital humano para o desenvolvimento regional. As
considerações efetuadas se inspiraram em argumentos inerentes ao referencial te-
órico Keynesiano e em idéias relativas à contribuição da qualificação do capital
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Universidades e desenvolvimento regional
CARDOSO, José Maria Alves; RODRIGUES, Luciene; MAIA, Maria de Fátima Rocha
Essas concepções teóricas têm sua relevância e contribuíram nos debates volta-
dos para a compreensão dos processos de crescimento e desenvolvimento de
sistemas econômicos. Ao longo do desenvolvimento deste estudo verificou-se que
diversas estatísticas desagregadas para os níveis setoriais, regionais e locais não
estavam disponíveis. Apesar de tais limitações as análises efetuadas permitiram
que se chegasse a relevantes inferências.
Vale notar que alguns teóricos não aceitam como adequado e/ou viável adaptar e
estimar, aos níveis de região ou município, modelos Keynesianos de determinação
da renda. Entretanto, no tema em foco, tais modelos podem ser vistos como um
referencial teórico que fornece indicações que auxiliam na compreensão empírica
de alguns dos possíveis efeitos das atividades da Unimontes no contexto da econo-
mia regional. Por isso, resguardadas as limitações relativas à possibilidade de aplica-
ção dos modelos, é aceitável admitir que os argumentos de tais concepções teóricas
possam orientar algumas reflexões relevantes acerca da problemática estudada.
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CARDOSO, José Maria Alves; RODRIGUES, Luciene; MAIA, Maria de Fátima Rocha
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Nesse cenário a localidade, conhecida hoje como Montes Claros, soube apro-
veitar sua localização estratégica no espaço regional. Ampliou continuamente a
sua importância relativa, destacando-se como centro coletador e distribuidor de
produtos e serviços na região. Fatos como a expansão ferroviária e a presença
2
Localidade hoje conhecida como Município de Montes Claros.
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Universidades e desenvolvimento regional
CARDOSO, José Maria Alves; RODRIGUES, Luciene; MAIA, Maria de Fátima Rocha
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Para CARDOSO (2000, p.208-225), a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste – SUDENE,
que foi criada em dezembro de 1959, motivou na região a expectativa de que muitas ações voltadas para
o fomento regional fossem efetivadas. Sua atuação tanto reforçou quanto transformou algumas das
realidades econômicas e sociais norte mineiras. A autarquia procurava viabilizar a expansão capitalista
numa região que para o Estado precisava ser incorporada à dinâmica capitalista do centro e sul; áreas
mais dinâmicas do país.
A autarquia atuou na região e teve um escritório implantado no Município de Montes Claros na década
de 1960.
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Acredita-se que, se naquela análise outros municípios do Norte de Minas e do Vale do Jequitinhonha
tivessem sido considerados, a conclusão não teria apresentado viés significativo.
5
Destacam citados pesquisadores que a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, já estava em
funcionamento desde 1963; sendo a instituição mantida com recursos da FELP – Fundação Educacional
Luiz de Paula.
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Relatório de Gestão da Universidade Estadual de Montes Claros. Dez de 2004 a Dez de 2005
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Lideranças Norte mineiras e por meio dos seus representantes legislativos participaram ativamente
nesse processo. Para um relato mais pormenorizado ver Caleiro e Pereira (2002, pp. 39-41).
8
UNIMONTES, Relatório de Gestão - Dez de 2005 a Dez de 2006, p.01. É oportuno destacar que o
documento UNIMONTES, Plano de Desenvolvimento Institucional. 2005 – 2009 p.3; citando o
Regimento Geral da instituição diz que a sua missão é: “Contribuir para a melhoria e transformação da
sociedade, atender às aspirações e os interesses de sua comunidade Tornando-se fator de integração
regional”.
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Já se encontravam em implantação em 2007 as unidades de Bocaiúva e Taiobeiras no Norte de Minas
e a unidade de Pompeu na mesorregião Central Mineira.
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UNIMONTES, Relatório de Gestão - dez de 2004 a dez de 2005, p.05.
11
Instituição de Ensino Superior - IES
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UNIMONTES (2005, p. 7-8). Aqui, foram considerados as IES do Norte de Minas, do Vale do
Jequitinhonha e do Vale do Mucuri.
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des de ensino. Seus reflexos extrapolaram o campo físico e incidiram nas práticas
didático-pedagógicas.
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Rinaldo Barros foi Debatedor do tema: Universidade e a Promoção do Desenvolvimento Sustentável,
no II Seminário Internacional Sobre Ciência e Tecnologia na América Latina – 09 a 10 de novembro
de 2005 - UNICAMP - São Paulo. Na ocasião era professor adjunto da UERN e diretor da FAPERN.
14
MAYOR, F. Preparar um futuro viável: ensino superior e desenvolvimento sustentável. In: Conferência
mundial sobre o ensino superior. Tendências de educação superior para o século XXI. Anais da
Conferência Mundial do Ensino Superior. Paris: 1998.
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Pesquisa Financiada pela Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de Minas Gerais - FAPEMIG
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A Instituição, no ano de 2006, contou com uma receita total de R$ 80,8 milhões de
reais. Trata-se de valor expressivo no cenário econômico regional.
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Obs: A Unimontes não possui centro instalado no município de Teófilo Otoni.
17
Dados relativos às transferências da União e do Estado para os diversos municípios da região estudada
estão disponíveis no Tribunal de Contas de Minas Gerais (TCEMG). As informações citadas pelo
referido Tribunal têm base nos dados extraídos das prestações de contas apresentadas pelos diversos
Municípios. O objetivo da argumentação aqui apresentada é ilustrar a significância da Unimontes
enquanto agente por meio do qual se realiza ordinariamente gastos públicos. As informações aqui
apresentadas podem ser acessadas no sítio http://www.tce.mg.gov.br/Prestacontas/indexdados.htm
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QUADRO 1
Orçamento Realizado pela Unimontes e as transferências do Estado e da União para os Municípi-
os, no ano de 2005.18 (Valores em Reais Correntes)
Fonte: Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais/ Organização Pesquisa Terciário Superior19
18
Dados relativos às transferências da União e do Estado para os diversos municípios da região estudada
estão disponíveis no Tribunal de Contas de Minas Gerais (TCEMG).
19
Os dados da tabela são provenientes do Tribunal de Conta do Estado de Minas Gerais e dos Balaços
Orçamentários da Unimontes.
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Nesse estudo, optou-se por considerar apenas os gastos atribuídos a esses agentes públicos pelo Tribunal
de Contas do Estado de Minas Gerais - TCEMG. As informações citadas pelo referido Tribunal tem base
nos dados extraídos das prestações de contas apresentadas pelos diversos Municípios. O objetivo da
argumentação aqui apresentada é ilustrar a significância da Unimontes enquanto agente por meio do
qual se realiza ordinariamente gastos públicos. As informações aqui apresentadas podem ser acessadas
no sítio http://www.tce.mg.gov.br/Prestacontas/indexdados.htm Vale mencionar que alguns dos gastos
que são realizados de forma eventual pelo Estado e/ou pela União, em benefício dos Municípios
enfocados, apesar de importantes, não representam relevantes vieses às analises desse o estudo.
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Universidades e desenvolvimento regional
CARDOSO, José Maria Alves; RODRIGUES, Luciene; MAIA, Maria de Fátima Rocha
GRÁFICO 1: Expansão das Despesas Totais da Unimontes 1994 a 2006, a preços de 2006
Fonte: Dados dos Balanços Orçamentários da Unimontes. Atualização monetária segundo IGP-DI
– FGV para dezembro de 2006.
Em 2006 o total das despesas foi de aproximadamente R$ 84,3 milhões, valor que,
comparado ao realizado no ano anterior, representou acréscimo de 28%. Essas
estatísticas associadas às anteriores, corroboram a idéia de que houve na Unimontes
um deliberado esforço para viabilizar a sua missão institucional.
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Relatório final pesquisa “Terciário superior e desenvolvimento regional: uma analise do caso da
universidade estadual de montes claros – Unimontes” 2008.
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NAJBERG, S & PEREIRA, R. O.. Novas estimativas do modelo de geração de empregos do BNDES.
Texto publicado na Sinopse Econômica nº 133 de março de 2004, BNDES.
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Universidades e desenvolvimento regional
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Mais do que esse valor quantitativo, é relevante apontar a percepção dos atores
ligados, direta e ou indiretamente, à instituição quanto à irradiação dos efeitos
gerais da Unimontes sobre a realidade local e regional é positiva. Segundo esses
agentes a Universidade oportunizou vivência acadêmica à população local e mo-
tivou a atração e/ou o maior trânsito de pessoas de outros meios em suas localida-
des. Tal fato contribuiu para dinamizar as suas relações sociais e culturais, a pro-
dução, a renda e o emprego. Os reflexos das ações da Unimontes sobre essas
variáveis foram mais evidentes nos locais onde a Instituição possuía centros insta-
lados; portando se manifestaram de forma heterogênea24 .
23
No ano de 2006, segundo estatísticas do IPEADATA, o consumo das famílias, como percentual do PIB,
foi de 80,19%.
24
Houve dificuldade em se aferir quantitativamente muitos dos reflexos das ações da Instituição, devido
à inexistência de estatísticas desagregadas para os níveis locais e regionais. Muitas das relações econômicas
que decorriam indiretamente da atuação da universidade eram caracterizadas pela informalidade,
especialmente fora da sede. Isso não impediu, porém, que sua relevância fosse constatada e alguns dos
seus reflexos identificados.
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Em período de conclusão de curso.
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Estudo realizado por GONÇALVES (2000) evidencia que houve grande absorção dos egressos da
Unimontes formados nos anos de 1995 a 1998, no mercado de trabalho. Verificou-se também que a
absorção desses pelo mercado de trabalho se dá de forma rápida. Dos egressos do ano mais recente
(1998) na época da pesquisa feita por Gonçalves, percebeu-se que 96,6% deles já se encontravam em
plena atividade de trabalho remunerado. (p.75-76)
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É relevante destacar que na ocasião o enfoque da maior parte dos projetos das
pesquisas concluídas estava, em larga medida, direcionados para investigação de
questões de interesse local e/ou regional. Isso é fator positivo na medida em que,
o melhor conhecimento da região possibilita a maior eficiência e eficácia das ações
27
As estatísticas utilizadas até o ano de 2003 foram extraídas do Plano de Desenvolvimento Institucional
2005-2009 e a partir do ano de 2004 foram extraídas do Relatório de Gestão Unimontes 2006 – 2007.
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Considerações Finais
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Referências
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CARDOSO, José Maria Alves; RODRIGUES, Luciene; MAIA, Maria de Fátima Rocha
PAULA, H. A. de. Montes Claros Sua História, Sua Gente, Seus Costumes.
Montes Claros: Editora UNIMONTES, 2007. Coleção Sesquicentenária, v .1.
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NORMAL SUPERIOR MODULAR EMERGENCIAL:
UMA ANÁLISE DA EXPERIÊNCIA DA UNIMONTES
* Mestre em Desenvolvimento Social e docente das Faculdades Integradas Pitágoras de Montes Claros -
FIP/MOC.
** Doutora em História, docente do Curso de Graduação em História, do Programa de Pós-Graduação em
Desenvolvimento Social -PPGDS e do Programa de Pós-Graduação em História –PPGH /UNIMONTES.
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Introdução
A antiga FUNM foi criada pela lei 2.165, em 24 de maio de 1962, a partir de um
projeto do deputado mineiro Cícero Dumont. Sua criação veio atender propósitos
de interiorização do Ensino Superior em Minas.
Abreu (2006, p. 173) afirma que o objetivo da interiorização era “formar pessoas
tanto com potencial para estimular desenvolvimento local quanto para desenvolver
uma maturidade intelectual que as tornasse aptas a construírem novas lideranças”.
Embora não faça referência especificamente à criação da FUNM, a argumentação
permite compreender o propósito do grupo iniciador da instituição. Sobre a criação
da referida instituição, Silva (2008) relata:
1
Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES, Disponível em www.unimontes.br. Acesso em
março de 2012.
2
Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES, Disponível em www.unimontes.br. Acesso em
março de 2012.
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Normal Superior Modular Emergencial
SANTIAGO, Andréa Maria Oliveira Versiani, CALEIRO, Regina Célia Lima
Foi no ano de 1990 que o Decreto Estadual nº 30.971 criou a Universidade Estadual
de Montes Claros, no contexto da Constituição Mineira de 1989, em seu parágrafo
3º, Artigo 82, e estabeleceu a transformação da FUNM em autarquia 3 .
3
A portaria de número 1116, datada de 21/07/1994, homologou, via Ministério da Educação, o
reconhecimento da UNIMONTES como Universidade, conforme o parecer nº 232/94 do Conselho
Estadual de Educação de Minas Gerais (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2009.)
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[...] somente pela compreensão desse projeto político mais amplo, de direção da
sociedade, é que foi possível entender a criação da Escola Normal da Província
do Rio de Janeiro não representou apenas a transplantação de um modelo
europeu, mas que pelo seu potencial organizativo e civilizatório, ela se
transformava numa das principais instituições destinadas a consolidar e expandir
a supremacia daquele segmento da classe senhorial que se encontrava no poder.
A primeira Escola Normal brasileira foi criada na Província do Rio de Janeiro,
pela Lei nº 10, de 1835, que determinava:
Haverá na capital da Província uma Escola Normal para nela se habilitarem as
pessoas que se destinarem ao magistério da instrução primária e os professores
atualmente existentes que não tiverem adquirido necessária instrução nas escolas
de ensino mútuo, na conformidade de 15/10/1827 (VILLELA, 2003, p. 28).
O desmonte do regime militar (1964-1985) fez com que os anos de 1980 fossem
marcados pela reorganização dos movimentos sociais, notadamente o sindicalismo
do ABC Paulista. Nesse sentido, as reformas no Estado Brasileiro, a partir de
1990, têm o evidente objetivo de ocupar o poder antes pertencente ao governo
militar. Para Oliveira (1999, p. 70/71), essa reordenação torna-se necessária na
medida em que é preciso reconstituir a relação Estado – Sociedade, perdida com
décadas da crise.
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Normal Superior Modular Emergencial
SANTIAGO, Andréa Maria Oliveira Versiani, CALEIRO, Regina Célia Lima
Com o claro objetivo de garantir esse consenso, diversas estratégias são validadas,
dentre elas investimentos na área educacional evidenciando mostrando uma
mudança de rumo nas políticas dos organismos internacionais divulgadores do
“novo” ideário.
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Muito polêmica, seguiu-se a sua promulgação, marcada por intensa discussão dos
setores educacionais sobre sua viabilidade, sua legitimidade e principalmente sobre
o tipo de professor emanado desse processo.
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Normal Superior Modular Emergencial
SANTIAGO, Andréa Maria Oliveira Versiani, CALEIRO, Regina Célia Lima
Elisabeth Macedo (2000, p.24) argumenta que o modelo resulta em “um profissional
ilustrado, de conhecimentos elementares, não preparado para desenvolver pesquisa
que contribua para a sua prática docente”.
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professores leigos ou com apenas o 2º grau, presentes ainda nos seus quadros
funcionais, e em razão da nova legislação, é que os administradores municipais
vêm procurar medidas para alterar o atual quadro desses municípios,
proporcionando-lhes a melhoria do processo educativo. Essa melhoria está
intrinsecamente ligada à formação dos profissionais da educação, e essa
formação é condição fundamental para a melhoria da qualidade de vida, para o
desenvolvimento, de um modo geral, e para o exercício pleno da cidadania. É
importante destacar a necessidade de uma intervenção educacional no sentido
de minimizar o hiato que existe entre a oferta e a demanda no ensino superior
por meio do oferecimento de um curso de formação para os profissionais da
educação capaz de desenvolver a valorização e o prestígio social aos
professores que atuam da 1ª à 4ª série do Ensino Fundamental. O princípio
base deste projeto, que é oferecer uma educação de qualidade, está
fundamentado na prioridade nacional de valorização do magistério, por meio
da recuperação do papel social e pedagógico do professor (UNIVERSIDADE
ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2002, p. 38).
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Normal Superior Modular Emergencial
SANTIAGO, Andréa Maria Oliveira Versiani, CALEIRO, Regina Célia Lima
Leite (1997) chama atenção para o fato de que o aumento da escolaridade dos
alunos do Normal Superior contribui para uma precarização do trabalho docente,
negando uma antiga crença da Sociologia do Trabalho, que afirma ser a mão-de-
obra mais escolarizada a de melhores condições de trabalho. Infelizmente, a
realidade mostrada aponta em outro caminho.
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Considerações finais
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Atendendo à Resolução do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão nº. 144.
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Normal Superior Modular Emergencial
SANTIAGO, Andréa Maria Oliveira Versiani, CALEIRO, Regina Célia Lima
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Entretanto, antes de atender a demandas externas deve definir qual é a seu papel
no cenário das universidades públicas brasileiras. Faz-se necessário que professores
e pesquisadores envolvidos com os destinos da UNIMONTES, se organizem com
o propósito de pensar alternativas e uma nova agenda política para o processo de
formação de professores e, principalmente, que sejam ouvidos pelas instâncias
decisórias da Universidade.
Referências
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Normal Superior Modular Emergencial
SANTIAGO, Andréa Maria Oliveira Versiani, CALEIRO, Regina Célia Lima
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IMPLANTAÇÃO DO SISTEMA DE COTAS NA
UNIMONTES E ANÁLISE DA DEPENDÊNCIA
ENTRE ALUNOS COTISTAS E NÃO COTISTAS DOS
CURSOS DO CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS
(CCH)
*
Doutora em Demografia pelo CEDEPLAR/UFMG. Professora do Departamento de Economia
UNIMONTES.
**
Doutora em Ciências pela FCSLH/USP. Professora do Departamento de Economia e do Programa de
Pós-Graduação em Desenvolvimento Social – PPGDS/UNIMONTES.
***
Doutora em Educação pela Georg August Universität Göttingen. Professora do Programa de Pós-
Graduação em Desenvolvimento Social – PPGDS/UNIMONTES.
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Implantação do sistema de cotas na UNIMONTES e análise ...
GONÇALVES, Maria Elizete; RODRIGUES, Luciene; IDE, Maria Helena de Souza
1 Introdução
Nesta mesma linha, o presente artigo tem por objetivo analisar a ocorrência da
dependência entre alunos cotistas e não cotistas. O desenvolvimento do artigo
baseou-se no acompanhamento retrospectivo da trajetória acadêmica dos alunos
matriculados nos cursos do Centro de Ciências Humanas (C.C.H) da
UNIMONTES, cujo ingresso foi por meio do processo seletivo 1/2005.
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Esse estudo está dividido em quatro seções, além dessa introdução. Na primeira,
é realizada uma revisão de literatura sobre as políticas de ação afirmativa e o
sistema de cotas nas universidades, com ênfase na UNIMONTES. Na segunda,
é apresentada a metodologia de análise. Na terceira, são apresentados os resultados
do estudo e discussão. Por último, são feitas as considerações finais.
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Implantação do sistema de cotas na UNIMONTES e análise ...
GONÇALVES, Maria Elizete; RODRIGUES, Luciene; IDE, Maria Helena de Souza
No seu artigo, Oliven (2007) faz uma comparação considerando a forma como as
políticas afirmativas são implantadas nos Estados Unidos e no Brasil. Segundo a
autora, as diferenças entre esses dois países não está apenas em como tais políticas
são implantadas; a forma como se dá a classificação racial também é diferente.
No Brasil, um país com diversidade etnorracial, o que importa é a aparência das
pessoas, ou seja, o fenótipo, sendo considerada também a classe social; enquanto
na nação norte-americana, o que importa é a descendência, ou seja, o genótipo.
Porém, as diferenças não terminam por aí. Em termos geográficos, a população
negra dos Estados Unidos não chega a 10% da população, enquanto no Brasil a
população é metade negra, metade branca, com grande miscigenação.
Nesse sentido, Suiama (2006) infere que o desenvolvimento das ações afirmativas
no Brasil não pode reproduzir, de forma automática, as experiências bem sucedidas
dos Estados Unidos, devido a grande miscigenação aqui existente. O autor cita o
antropólogo DaMatta (1997), que faz a seguinte consideração sobre o assunto:
O Brasil tem um passivo histórico com as camadas populares no que diz respeito
à democratização do seu acesso à educação formal. Temos convivido
historicamente com uma realidade de descaso e exclusão de segmentos
significativos de parte da população do sistema de ensino. No que diz respeito a
universidade a situação é ainda mais dramática.
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Sabemos que não menos difícil tem sido a entrada e permanência dos estudantes
negros e portadores de necessidades especiais nas instituições de nível superior.
Uma análise da literatura disponível sobre cotas revela que a grande polêmica
parece envolver principalmente estudantes cotistas negros.
A entrada de negros no ensino superior por meio do sistema de cotas tem levantado
muitas discussões tanto na sua defesa (Munanga, 2004, p.49) quanto no seu ataque
(Santos, 2003, p. lll). Ou seja, na literatura não há consenso sobre a adoção de
cotas no ensino superior. Posição semelhante pode ser verificada em conversas
informais e em informações veiculadas pelos meios de comunicação.
Por se tratar de temática de forte impacto social, entendemos que se faz necessário
aprofundar estudos que possibilitem compreender a trajetória de alunos cotistas
no ensino superior de modo a fornecer bases argumentativas que permitam subsidiar
decisões em relação a essas políticas.
Nos anos 1990 uma série de iniciativas em relação às políticas afirmativas foi
adotada nas universidades brasileiras, o que resultou em reserva de parte de suas
vagas para alunos negros, indígenas, egressos de escolas públicas e portadores de
necessidades especiais.
Como exemplo, podemos apontar a iniciativa do estado do Rio de Janeiro que por
meio da Lei Estadual 3.708 de 9 de novembro de 2001 estabelece cotas de 40%
para negros e pardos na UERJ e na Universidade do Norte Fluminense. No estado
de Minas Gerais, a Lei Estadual 15.259 de 27 de julho de 2004 estabelece cotas
para egressos de escolas públicas, negros, índios e portadores de necessidades
especiais na UEMG e na UNIMONTES.
54
Implantação do sistema de cotas na UNIMONTES e análise ...
GONÇALVES, Maria Elizete; RODRIGUES, Luciene; IDE, Maria Helena de Souza
Gráfico 1: Percentual de candidatos inscritos no sistema de reserva de vagas, no total de inscritos por
ano - UNIMONTES (proc. seletivos de junho e dezembro, 2005-20l0)
Fonte: Barros e Cardoso (20l1).
55
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
Dois aspectos relacionados aos dados devem ser mencionados: i) ao fim do período
de acompanhamento, parte dos alunos não experimenta o evento de interesse e;
ii) no período de acompanhamento ocorre uma redução significativa da coorte.
Há diversos casos de transferência e evasão, entre outras situações. Ou seja, o
acompanhamento do aluno é interrompido.
Tanto na situação (i) quanto na situação (ii), os dados são censurados. A censura
corresponde à observação parcial da resposta. Mas, apesar de incompletas, as
observações censuradas dão informações sobre o tempo de sobrevivência dos
alunos. É a presença de dados censurados que requer o uso do método da análise
de sobrevivência.
(3)
(4)
56
Implantação do sistema de cotas na UNIMONTES e análise ...
GONÇALVES, Maria Elizete; RODRIGUES, Luciene; IDE, Maria Helena de Souza
(5)
4 Resultados e discussão
TABELA 1
Relação candidatos/vaga nos cursos do CCH-UNIMONTES (Proc.seletivo 1/2005)
1
O Curso de Artes Teatro não foi analisado devido à falta de alguns dados.
57
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
A TAB. 2 revela que cerca de 53% dos acadêmicos do curso de Artes Música
tiveram pelo menos uma dependência entre o 1° e o 8° período; sendo que o maior
percentual de ocorrência do evento ocorreu entre os alunos cujo ingresso foi pelo
PAES (60%). O menor índice de ocorrência do evento foi observado entre os
egressos de escola pública, sendo que cerca de 1/3 desses alunos tiveram pelo
menos uma dependência durante o curso. Metade dos alunos que ingressaram
como afro-descendente carente teve dependência.
TABELA 2
Total e percentual de dependências, segundo a modalidade de ingresso, Curso de Artes
Música - UNIMONTES.
TABELA 3
Tempo médio e mediano de sobrevivência à primeira dependência, segundo
modalidades de ingresso, Curso de Artes Música - UNIMONTES.
58
Implantação do sistema de cotas na UNIMONTES e análise ...
GONÇALVES, Maria Elizete; RODRIGUES, Luciene; IDE, Maria Helena de Souza
(a)
(b)
(c)
(d)
(d) (c)
(a) (b)
No curso de Artes Visuais, foi baixo o percentual de acadêmicos com pelo menos
uma dependência ao longo do período de acompanhamento da coorte (23%); sendo
que ele foi maior entre os alunos cujo ingresso foi pelo PAES (33,33%).
TABELA 4
Total e percentual de dependências, segundo a modalidade de ingresso, Curso de Artes
Visuais - UNIMONTES.
59
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
TABELA 5
Tempo médio e mediano de sobrevivência à primeira dependência, segundo
modalidades de ingresso, Curso de Artes Visuais - UNIMONTES.
(a)
(b)
(c)
(d)
(c) (d)
(b) (a)
60
Implantação do sistema de cotas na UNIMONTES e análise ...
GONÇALVES, Maria Elizete; RODRIGUES, Luciene; IDE, Maria Helena de Souza
4.1.3 Filosofia
TABELA 6
Total e percentual de dependências, segundo a modalidade de ingresso, Curso de
Filosofia - UNIMONTES.
TABELA 7
Tempo médio e mediano de sobrevivência à primeira dependência, segundo
modalidades de ingresso, Curso de Filosofia - UNIMONTES.
61
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
(a)
(b)
(d) (c)
(b) (a)
(d) (c)
4.1.4 Geografia
Verifica-se que cerca da metade dos alunos do curso de Geografia teve dependência
ao longo do curso (51,35%). Entre os alunos que vivenciaram o evento, a maior
parte foi de cotistas, principalmente da categoria egresso de escola pública.
TABELA 8
Total e percentual de dependências, segundo a modalidade de ingresso, Curso de
Geografia - UNIMONTES.
62
Implantação do sistema de cotas na UNIMONTES e análise ...
GONÇALVES, Maria Elizete; RODRIGUES, Luciene; IDE, Maria Helena de Souza
TABELA 9
Tempo médio e mediano de sobrevivência à primeira dependência, segundo
modalidades de ingresso, Curso de Geografia - UNIMONTES.
(a)
(b)
(c)
(d)
(e)
(c) (b)
(e) (d)
(a)
63
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
4.1.5 História
De acordo com a TAB. 10, cerca de 66% dos alunos do curso de História tiveram
pelo menos uma dependência durante o curso. Uma análise segundo as modalidades
de ingresso mostra que o menor percentual de ocorrência do evento ocorreu entre
os alunos cujo ingresso foi pelo Sistema Universal (42,86%). Em contrapartida, o
maior percentual de ocorrência do evento foi observado entre os egressos de
escola pública (83,33%), sendo alto também o índice para os afro-descendentes
carentes (80%).
TABELA 10
Total e percentual de dependências, segundo a modalidade de ingresso, Curso de
História - UNIMONTES.
TABELA 11
Tempo médio e mediano de sobrevivência à primeira dependência, segundo
modalidades de ingresso, Curso de História - UNIMONTES.
64
Implantação do sistema de cotas na UNIMONTES e análise ...
GONÇALVES, Maria Elizete; RODRIGUES, Luciene; IDE, Maria Helena de Souza
(a)
(b)
(c)
(d)
(a) (b)
(d) (c)
O teste Log-Rank indica que não existem diferenças significativas entre as curvas
de sobrevivência estimadas (p-valor = 0,4416).
TABELA 12
Total e percentual de dependências, segundo a modalidade de ingresso, Curso de Letras
Inglês - UNIMONTES.
65
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
TABELA 13
Tempo médio e mediano de sobrevivência à primeira dependência, segundo
modalidades de ingresso, Curso de Letras Inglês Vespertino - UNIMONTES.
(a)
(b)
(c)
(d)
(b) (a)
(d) (c)
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Implantação do sistema de cotas na UNIMONTES e análise ...
GONÇALVES, Maria Elizete; RODRIGUES, Luciene; IDE, Maria Helena de Souza
TABELA 14
Total e percentual de dependências, segundo a modalidade de ingresso, Curso de Letras
Português - UNIMONTES.
O tempo médio de sobrevivência ao evento foi maior para os alunos não cotistas
(7,l0 e 7,36 períodos para as categorias Sistema Universal e PAES,
respectivamente); e menor para os acadêmicos afro-descendentes carentes (5,50),
conforme TAB. 15.
TABELA 15
Tempo médio e mediano de sobrevivência à primeira dependência, segundo
modalidades de ingresso, Curso de Letras Português Noturno - UNIMONTES.
(e)
(d) (c)
(a) (e)
(b)
67
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
4.1.8 Pedagogia
Pode ser verificado pela TAB. 16 que foram registrados somente dois alunos com
dependência ao longo do curso de Pedagogia; um ingressante pelo PAES e o
outro como afro-descendente carente.
TABELA 16
Total e percentual de dependências, segundo a modalidade de ingresso,
Curso de Pedagogia - UNIMONTES.
TABELA 17
Tempo médio e mediano de sobrevivência à primeira dependência, segundo
modalidades de ingresso, Curso de Pedagogia Vespertino - UNIMONTES.
68
Implantação do sistema de cotas na UNIMONTES e análise ...
GONÇALVES, Maria Elizete; RODRIGUES, Luciene; IDE, Maria Helena de Souza
(a)
(b)
(c)
(d)
(a) (c)
(b) (d)
Considerações finais
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REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
Referências
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Implantação do sistema de cotas na UNIMONTES e análise ...
GONÇALVES, Maria Elizete; RODRIGUES, Luciene; IDE, Maria Helena de Souza
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REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
72
A IMPRENSA PERIÓDICA E A EDUCAÇÃO PARA A
VIDA MODERNA EM MONTES CLAROS/MG:
1889-1926
The periodical press and the education for the modern life in the city of
Montes Claros, State of Minas Gerais (MG), Brazil (1889-1926)
Abstract: The first decades of the Brazilian Republic were marked by a desire to
modernize society. In order to achieve this goal, various formal and informal
educational strategies were adopted. The present study highlights the periodical
press from the city of Montes Claros (considered the most important city in the
north of the State of Minas Gerais, Brazil) as one of the strategies used for the
purpose of modernization. Based on the analysis of four of the journals from this
particular city, the role of the media in population education is discussed, and the
peculiarities of the press analyzed.
73
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
Introdução
Este trabalho tem como objeto de estudo o ideal de modernidade da elite dominante
da mais importante cidade do norte de Minas Gerais, Montes Claros, entre os
anos de 1889-19261 . Adota como pressuposto central a existência de discursos de
modernidade na cidade que foram propagados de diversas formas e, assumindo
um caráter educativo, influenciaram as transformações locais; estes discursos,
oriundos sobretudo das elites, foram partilhados, mesmo que com resistências, por
parcela da população. Dentre as estratégias para educar a população, este trabalho
foca a imprensa periódica impressa e discute o seu papel na disseminação dos
princípios de uma vida moderna.
1
O recorte temporal justifica-se por dois marcos importantes, um nacional e outro local. A Proclamação
da República em 1889 incrementa o discurso no Brasil da necessidade de modernização. Já a chegada da
ferrovia a Montes Claros em 1926 marca o início de intensas transformações no município.
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A imprensa periódica e a educação para a vida moderna em Montes Claros/MG: 1889-1926
SILVA, Luciano Pereira da; SANTOS, Brenya Paula Miranda
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A imprensa periódica e a educação para a vida moderna em Montes Claros/MG: 1889-1926
SILVA, Luciano Pereira da; SANTOS, Brenya Paula Miranda
todo o século XIX e parte do século XX. Entretanto, se tal fato limitou a ação da
imprensa foi no sentido de que ela poderia ter sido ainda mais influente do que foi
se atuasse em uma sociedade em que a escolarização fosse disseminada a todos
os setores sociais, pois a relação de um periódico com a população não se restringe
à sua leitura.
Segundo Morel e Barros (2003, p. 103), a noção de que a imprensa era elitista
pode ser relativizada na medida em que não parece possível compreende-la isolada
da sociedade. Ela “influenciava e era influenciada por vozes, falas e gestos não-
escritos, em via de mão dupla, numa complexa teia de circulação, recepção e
retransmissão de conteúdos que ultrapassavam o meio impresso”.
Nesse processo, é notória a não passividade dos sujeitos nas “culturas do escrito’,
ou seja, mesmo que o que está escrito busque direcionar o receptor (leitor ou
ouvinte) para determinadas direções, as mediações que ocorrem entre o sujeito e
o escrito são diversas. Devido a isso, para Galvão (2007, p. 39), “o uso de verbos
tais como ‘apropriar-se da’, ‘relacionar-se com’ em lugar de ‘inserir-se na’, ‘entrar
na’ ou ‘ter acesso à(s)’ cultura(s) escrita(s) está relacionado com a tentativa de
explicitar o papel ativo dos sujeitos e dos grupos sociais nesse processo”.
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REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
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A imprensa periódica e a educação para a vida moderna em Montes Claros/MG: 1889-1926
SILVA, Luciano Pereira da; SANTOS, Brenya Paula Miranda
Para a cidade de Montes Claros, dos 28 periódicos que circularam entre os anos
de 1889 e 1926, conforme informações de memorialistas, metade não chegou ao
número dez e somente um quarto chegou ao número cinqüenta. Entretanto,
publicações locais como o jornal Correio do Norte que durou cerca de sete anos
(343 números) ou como o jornal A Verdade que durou cerca de dez anos (430
números) revelam que a influência desses veículos ultrapassava um grupo pequeno
de leitores.
79
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
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Lessa (1993, p.172) defende que já nas últimas décadas do século XIX diversos
elementos representavam o progresso da cidade. Para a autora, a moderna fábrica
de tecidos Cedro Madureira, o jornal A Gazeta do Norte e o cinema, entre outros,
são exemplos presentes em Montes Claros de “artefatos da modernidade
cosmopolita emergente no mundo”.
80
A imprensa periódica e a educação para a vida moderna em Montes Claros/MG: 1889-1926
SILVA, Luciano Pereira da; SANTOS, Brenya Paula Miranda
QUADRO 1
Jornais e revistas publicados em Montes Claros entre 1890 e 1926
81
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
Correio do Norte
Antônio Pereira dos Anjos foi convidado por Velloso para ser redator do Correio
do Norte. Também foi comerciante, professor e fazendeiro2 . Entre 1923 e 1926,
esteve à frente do poder municipal, ocupando o cargo de Presidente da Câmara e
Agente Executivo (VIANNA, N., 2007, p. 157-158, v. 2).
2
O redator é também pai do memorialista Cyro dos Anjos.
82
A imprensa periódica e a educação para a vida moderna em Montes Claros/MG: 1889-1926
SILVA, Luciano Pereira da; SANTOS, Brenya Paula Miranda
A Verdade
3
Os premonstratenses foram religiosos belgas que chegaram a Montes Claros a partir de 1903 mediante
convite do Papa Leão XIII feito à Ordem de São Norberto em 1894, em virtude da preocupação do
Papa com a penúria do clero no país. Chegaram primeiro a São Paulo e posteriormente a Mariana. Em
1902, abriu-se a perspectiva de um novo campo apostólico, o norte de Minas Gerais, que possuía cerca
de 40 paróquias sem pastores. Montes Claros foi a primeira cidade do norte de Minas Gerais a receber
os missionários.
83
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
Diante desse quadro, era urgente que missionários católicos assumissem a tarefa
de fazer bom uso da imprensa, pois os “inimigos da igreja” habilmente já utilizavam
de tais instrumentos. Nesta lógica, o jornal A Verdade atribuiu-se o adjetivo de “luz
da publicidade”.
84
A imprensa periódica e a educação para a vida moderna em Montes Claros/MG: 1889-1926
SILVA, Luciano Pereira da; SANTOS, Brenya Paula Miranda
A manutenção do respeito aos dias “santos” era apenas um dos temas que
compuseram o prélio dos religiosos contra o Estado. Apesar de muitas batalhas
não terem sido vencidas pelos católicos (a neutralidade do ensino, por exemplo, foi
mantida), a ação dos religiosos católicos ocupou grande proeminência na educação
da população em tempos de atração e repulsa aos preceitos da modernização.
Montes Claros
O jornal Montes Claros tinha como redator e proprietário, durante quase toda a
sua existência, o farmacêutico Antônio Ferreira de Oliveira. Surgiu em 1916 e, em
seu programa, assumia o compromisso de “bem servir à causa do município que
traz o nome, tratando de sua administração, dos moldes em que devia basear-se,
dos requisitos de administrador, bem como de agitar as questões palpitantes da
lavoura, da pecuária, do comércio, das grandes e pequenas indústrias” (VIANNA,
N., 2007, p. 240, v. 1).
A existência desse periódico pode ser dividida em três fases: a primeira durou até
fevereiro de 1918; a segunda, sob a direção de uma sociedade, durou de julho de
1918 a dezembro de 1920; em sua terceira fase, de curta duração, passou a ser
órgão do Partido Republicano Mineiro – PRM. Durante toda a sua existência
serviu aos interesses do grupo político da cidade ligado aos médicos Honorato
Alves e João Alves.
Gazeta do Norte
De acordo com Lessa (1993, p. 173), desde o início de sua publicação, este jornal
“já continha as modernas características dos jornais das grandes cidades: fotos,
charges, anúncios com desenhos, a novela com folhetim”.
85
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
quando foi Juiz Municipal e dirigiu o periódico “A Opinião do Norte”. Após residir
em outros municípios, voltou para Montes Claros em 1917 para assumir o cargo
de Delegado de Polícia. Para dedicar-se à advocacia e ao jornalismo pediu
exoneração do cargo (VIANNA, N., 2007, p. 545, v. 2).
Vieira (2007) afirma que os intelectuais brasileiros do início do século XX, de uma
forma geral, habitualmente envolviam-se com questões públicas, atuando como
líderes das causas da nação. Tais indivíduos, neste ínterim, pregaram a centralidade
do tema educação no projeto de modernidade brasileiro. Esta crença culminou
com o amplo engajamento de intelectuais em duas profissões determinantes para
a educação da população: o magistério e o jornalismo.
Outro aspecto dos proprietários e redatores dos jornais a ser destacado é o comum
vínculo à classe de grandes proprietários rurais. Dessa forma, a adoção de preceitos
progressistas que poderiam estar presentes no mundo acadêmico, pode ter sido
limitada pelos estreitos laços que uniam esses bacharéis ao conservadorismo do
mundo rural. Para Adorno (1988, p. 159), ainda no período Imperial, “as ligações
4
Apesar do redator do jornal A Verdade ter sido, durante a maior parte de sua existência, o Cônego Carlos
Vincart, formado em Filosofia e Ciências pela Universidade de Louvain, por ser belga e ter chegado a
Montes Claros apenas em 1903 em missão religiosa, ele não se enquadra na cultura bacharelesca
brasileira que justificou o exercício do poder por esses profissionais.
86
A imprensa periódica e a educação para a vida moderna em Montes Claros/MG: 1889-1926
SILVA, Luciano Pereira da; SANTOS, Brenya Paula Miranda
dos bacharéis com os interesses agrários [...] não foram desprezíveis, haja vista
que não poucos bacharéis provinham do campo e dos estratos sociais
economicamente privilegiados e politicamente associados ao mandonismo local”.
A exceção pode ter ficado por conta de José Tomas de Oliveira6 (jornal Gazeta
do Norte), já que não foi identificada nenhuma ligação dele com a economia agrícola.
Era casado com Aura Sarmento de Oliveira, cuja família possuía tradição no
desempenho de atividades comerciais. Seus dois filhos, Ari de Oliveira e Jair de
Oliveira também foram jornalistas.
Essa divisão trouxe com freqüência o debate e a troca de acusações entre redatores
e colaboradores dos periódicos. Em 05 de abril de 1919, por exemplo a matéria
publicada no Jornal Montes Claros acusava o jornal Gazeta do Norte de estar
descumprindo o seu programa por fazer campanha aberta para Ruy Barbosa,
5
Como a família de Antônio Ferreira de Oliveira era de Conceição do Serro, atual município de
Conceição do Mato Dentro, não foi possível identificar se sua família era produtora rural.
6
Nascido em Recife/PE, não foram encontrados dados sobre a ocupação profissional de seus pais.
7
Apesar do jornal Correio do Norte também possuir cunho político, pois estava a serviço do Partido
Conservador, como o outro grupo político da época, os liberais, não detinham de um periódico para
propagar suas idéias, não houve intenso debate entre esses grupos através da imprensa periódica de
Montes Claros durante o século XIX.
87
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
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[...] Uma outra cousa que faz mossa na mente e que ficou provado evidentemente
é que “A Verdade” é simplesmente uma folha politica, pois que foi ella propria,
pelo seu redactor ou gerente ou cousa que o valha, que protestou contra
minha referencia. E assim sendo era bem que a auctoridade ecclesiastica
mandasse riscar de seu cabeçalho os dizeres que lá estão e substituil-os por
estes: “Semanario Politico e sobre tudo incensador” [...] (MONTES CLAROS,
14 de junho de 1917, ano II, n.56, p. 2).
88
A imprensa periódica e a educação para a vida moderna em Montes Claros/MG: 1889-1926
SILVA, Luciano Pereira da; SANTOS, Brenya Paula Miranda
disso, ao afirmar:
89
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
No que diz respeito à educação formal, para a cidade de Montes Claros, o início
da República caracterizou-se pela ampliação de oferta do ensino por instituições
escolares. Destacou-se, nesse processo a instalação do Grupo Escolar Gonçalves
Chaves em 1909, no contexto das reformas educacionais no estado de Minas
Gerais que buscaram a criação de um novo espaço escolar.8 Entretanto, é evidente
que se continuava “educando” uma parcela restrita da população pela via do ensino
formal e que a ação de outros mecanismos era primordial. Nessa lógica, a imprensa
periódica poderia contribuir para a tarefa.
A adoção de um estilo mais cultural do que noticioso pela imprensa brasileira para
a época, fato já apontado anteriormente, reforça a dimensão formadora dos
periódicos. Uma das características conseqüentes dessa dimensão foi a publicação
de obras literárias nos jornais. Com isso, o leitor acessaria um tipo de literatura
tida como erudita e ainda pouco difundida entre a população. Para Morel e Barros
(2003), a publicação de trechos de uma narrativa fatiada (obra publicada em
pedaços), também contribuiu para o aumento nas tiragens dos periódicos, pois
instigava a curiosidade do leitor.
8
Ver: FARIA FILHO, Luciano Mendes de. Dos pardieiros aos palácios: cultura escolar e urbana em Belo
Horizonte na primeira republica. Passo Fundo: UPF, 1996 e DURÃES, Sarah Jane (Org.). A escola
como lugar - grupos escolares no Norte de Minas Gerais (1906-1937). Montes Claros: UNIMONTES,
2009.
90
A imprensa periódica e a educação para a vida moderna em Montes Claros/MG: 1889-1926
SILVA, Luciano Pereira da; SANTOS, Brenya Paula Miranda
A opção pela adoção de uma vertente mais cultural do que informativa reforçou o
papel da literatura nos jornais da época. No caso do jornal Correio do Norte, o
próprio editorial do primeiro número evidenciava isso, ao afirmar que “a seção
literária, que será ao mesmo tempo instrutiva – procurando unir o útil ao agradável
– conterá variedades – literatura amena, lendas e poesia, originais e traduzidas”
(CORREIO DO NORTE, 24 de fevereiro de 1884, ano I, n. 1, p. 1).
A educação da população era uma tarefa que a imprensa dividia com outras
agências formadoras, sejam aquelas criadas para esta função, como a escola, ou
aquelas reconhecidas como portadoras de potencial formador, como o teatro e o
cinema. Segundo Pallares-Burke (1998), no combate à ignorância e ao atraso
social, os periódicos acabaram associando-se às agências que poderiam contribuir
para a educação da população.
Veloso (2008) afirma que o jornal Gazeta do Norte possuía uma missão
“desanalfabetizadora” e que este órgão, a partir da associação a uma importante
instituição de ensino da época, a Escola Normal, produziu modificações significativas
em seu empreendimento educativo. Segundo a autora, o jornal assumiu para si um
conjunto de encargos que perfaziam o projeto de modernização da sociedade e
que passava, necessariamente, pela instrução da população que deveria mudar de
mentalidade e comportamento.
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REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
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Considerações Finais
A análise das fontes consultadas permite afirmar que a imprensa periódica impressa
foi um instrumento privilegiado para educar a população de Montes Claros nas
primeiras décadas do período republicano. Sua ação estendeu-se para além de
uma reduzida elite alfabetizada, visto que a população em geral relacionava-se
com os jornais de diversas maneiras.
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A imprensa periódica e a educação para a vida moderna em Montes Claros/MG: 1889-1926
SILVA, Luciano Pereira da; SANTOS, Brenya Paula Miranda
Outra peculiaridade local também esteve expressa nos periódicos: a intensa disputa
política travada por dois grupos locais. Assim, os jornais reproduziram a dinâmica
da bipolarização da sociedade local e também foram instrumentos amplamente
utilizados na afirmação de grupos políticos.
Fontes
Jornal A Verdade
GRAÇA, Ruth Tupinambá. Montes Claros era assim.... Montes Claros: Editora
Unimontes, 2007.
Referências
93
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
GRAFF, Harvey. O mito do alfabetismo. Teoria & Educação, n.2, p.30-64, 1990.
VIEIRA, Carlos Eduardo. Jornal diário como fonte e como tema para a pesquisa
em História da Educação: um estuda do relação entre imprensa, intelectuais e
modernidade nos anos de 1920. In: OLIVEIRA, Marcus Aurélio Taborda de (Org.).
Cinco estudos em história e historiografia da educação. Belo Horizonte:
Autêntica, 2007. p. 11-40.
94
‘ALUMIAR A MENTE’: A INSTRUÇÃO ESCOLAR
DOS DISCÍPULOS ANA E ZEZINHO NAS TERRAS
GOIANAS EM FINS DO SÉCULO XIX
Diane Valdez*
1
Professora Adjunta da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás (UFG).Mestre em
História (UFG) e doutora em Educação (UNICAMP). Pesquisadora na área de História da Educação e
integrante do Núcleo de Estudos e Documentação, Educação, Sociedade, Cultura (NEDESC). E-mail:
dvaldez@fe.ufg.br
95
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
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96
‘Alumiar a mente’: a instrução escolar...
VALDEZ, Diane
97
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
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A escrita autobiográfica vai se definindo a partir dos vários contatos que são
estabelecidos. A sua complexidade não permite limites fechados. Apenas a
estreita relação entre a história e a ficção não é suficiente para afirmar, dar
condições a escrita de ser autobiográfica. Uma escrita cuja identidade se mostrar
entrecortada por vários discursos, apresenta-se uma constituição híbrida e
somente depois de analisar os vários elementos de que é constituída é que vai
ser possível considerá-la enquanto discurso autobiográfico. (SILVA, 1999,
p.154).
Silva (1999) ainda afirma que Cora, sustentada pela memória familiar, projeta
quadros da infância que também se desdobram em outras fases de sua vida -
adolescência, juventude e velhice - denotando um mundo tencionado por desejos
irrealizados e frustrações. Nos escritos de Cora, é possível observar os diferentes
98
‘Alumiar a mente’: a instrução escolar...
VALDEZ, Diane
discursos apontados por Silva, contudo não é nossa intenção investigar sobre
autobiografia como fonte, mas sim destacar e recortar aspectos da infância
retratados ou representados nas linhas dos poemas da escritora goiana. Sobre
isso, Bezerra registrou:
Cora Coralina se insere nessa genealogia de escritoras cuja obra está marcada
por um rememorar que se desloca em ritmo do círculo familiar e de vivências
que são parte de seu dia-a-dia. Em Vintém de cobre: meias confissões de
Aninha, por exemplo, muitos de seus poemas procuram reviver uma infância
que se afasta da imagem tradicionalmente celebrada como um tempo de
inocência e ociosidade. [...] A visão de infância que surge em seus versos, por
conseguinte, recupera diversos tipos de tirania que fazem parte do processo
de crescimento das crianças. Nesse sentido, a memória firma-se como lugar de
interrogação e de re-inscrição do passado como uma forma de entender o
presente e o futuro (BEZERRA, 1999, p.80).
99
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
arrasaram para uma luta e uma superação da sombra, assim como para a
solidariedade humana (JOACHIM, 1999 p. 24).
Como bem afirmou Joachim (1999, p. 17), “Ela mergulha na sua terra, cava
profundamente nela com o anseio de melhor (re)encontrar-se com todas as
heterogeneidades, então ela é soberbamente regionalista”. Contudo, Cora não se
exime de expor, criticar e censurar a sociedade goiana, é possível notar, além das
críticas, uma ironia nada sutil em sua descrição. De acordo com Curado:
100
‘Alumiar a mente’: a instrução escolar...
VALDEZ, Diane
Recorrendo a uma frase de sua bisavó, a poetisa registrou que a escola era o local
próprio e adequado para se ‘alumiar a mente’. Apesar de traduzir em seus escritos
o ambiente escolar como um lugar sóbrio, frio e ameaçador, desponta-o como um
espaço de extrema relevância para sua formação. Goiás, no final do século XIX,
era uma província de economia baseada na agricultura e na pecuária, e, como
outras províncias colonizadas no século XVIII, considerada distante dos grandes
centros do Brasil, sobretudo do Rio de Janeiro e de São Paulo. Em função disso,a
carênciade recursos para a instrução públicaé notadaem fontes como os relatórios
dos presidentes da província e de outros profissionais representantes da instrução
da província. As anotações, sempre em tonalidade pessimista, explanam sobre um
estado insatisfatório, sem perspectivas, ausente de livros, professores despreparados
e ordenados insuficientes. Contudo, antes de corroborarmos com essas afirmações,
faz-se necessário lembrar que a afirmação de que o ensino, sobretudo o primário,
era precário, inexistente, ou que a instrução primária no Brasil oitocentista do
século XIX se confinou entre a desastrada política pombalina e o florescimento da
educação na era republicana como explana a obra Cultura Brasileira de Fernando
Azevedo definitivamente ainda não foi superada.
período. O que chamamos a atenção é para o perigo da ‘história única’ que muitas
vezes de forma anacrônica usando o presente, ou mesmo o período republicano
como modelo elementar, ignora o tempo e não enfatiza os movimentos pela instrução
no século XIX. Não podemos perder de vista que é nesse período que se assegurou,
sobretudo nos discursos, uma maior preocupação com a instrução primária, pois
era fundamental o papel da instrução na elevação do nível intelectual e moral da
nação. A capacidade redentora da educação era um poderoso instrumento de
regeneração e o Estado era criticado, pois sua falta de atenção para com o ensino
era apontada como causa principal da ‘ignorância’ a que o povo estava submetido.
A instrução era desejável, tanto para os ‘novos’ quanto para os ‘antigos’ liberais,
a diferença era que enquanto os antigos associavam instrução à ‘civilização’ do
povo, tentando incutir-lhe padrões de civilidade, os modernos liberais entendiam
que instrução e ‘progresso’ agregavam conceitos como utilidade, produtividade e
desenvolvimento.
Aninha teve dois anos de escola. Escola nos moldes antigos – do tempo da
mãe. Cada aluno com sua lousa de escrever, sentados em bancos sem encosto,
102
‘Alumiar a mente’: a instrução escolar...
VALDEZ, Diane
Tahan, baseada nos escritos de Cora e nos relatos de sua memória, descreveu um
modelo de escola do período não distante de outras fontes na história da educação:
separação dos alunos por sexo, bancos sem encosto, mesa coletiva e palmatória.
Segundo Silva (1975), a escola também recebia o nome de aula, pois só havia uma
classe ou aula, regida por um único mestre ou mestra. Algo que chama atenção
nessa passagem é a temida carta de acompanhamento enviada para os ‘senhores’
pais assinarem. Desconhecemos trabalhos sobre esta fonte, um elemento original
da escola, também não notamos o uso deste argumento nas obras de Cora, talvez
tenha sido algo que narrou para a composição de sua biografia, mas não levou
para seus poemas. Coralina ao registrar sua vida escolar não se conteve em somente
descrevê-la, mas também em justificar seu lugar de aluna:
Só tive na vida uma escola primária de uma antiga mestra que já tinha sido
mestra da minha mãe, Mestre Silvina. Aposentada, com aposentadoria pequena,
insuficiente para a sua sobrevivência, abriu uma escolinha particular e suas
ex-alunas matricularam lá seus filhos como no meu caso. Na minha escola
primária, eu nunca fui uma aluna da frente. A escola tinha bancos compridos
sem encostos, afastados da parede porque a mestra não aceitava que a criança
recostasse. Nessa escola, fui sempre do banco das mais atrasadas, sempre!
Tive muita dificuldade para aprender, ou a escola não me servia, ou eu não
servia para a escola, até hoje não defini muito bem. A mestra era sempre muito
paciente, mas cansada, já tinha ensinado a uma geração antes da minha, merecia
um descanso que a condição financeira não lhe permitia. De modo que eu ia
ficando no banco das atrasadas até não sei quando. Um dia aprendi alguma
coisa e fui passando pro banco da frente com muito vagar, muita demora,
muito esforço, acho que mais dela do que meu. Eu me lembro que não me
esforçava tanto, não tinha estímulo. Entrei nessa escola com cinco anos
(CORALINA apud BRITO, 2009, p. 19).
Nota-se que a autora toma como referência um lugar sóbrio e sem atrativos,
descrição coesa com o tempo em que estudou. Nas escolas domésticas, as aulas
eram ministradas em um cômodo da casa da mestra, ou seja, a descrição que a
poetisa faz, de alguma forma com ressentimento, demonstra que ela toma como
menção um ambiente escolar não de seu tempo, mas do tempo em que escreveu
o poema, já na velhice. Em várias passagens, Cora (2001) registrou a penúria de
sua escola. Além do banco pouco cômodo para a criançada, a autora ressaltou
103
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
outros elementos, como o velho armário, o pote d’água, o prato velho e a velha
caneca enferrujada usada por todas as crianças. Nota-se aqui algo que é constante
em seus escritos: o ‘velho’ contrapondo-se ao ‘novo’. Era a velha escola olhada
de longe e definida como um ambiente monótono, melancólico e ‘antigo’.
Silvina, além de mestra, era madrinha de Cora, o que demonstra a frágil fronteira
entre o mundo escolar e o mundo familiar, pois uma madrinha poderia exercer
direitos de alguém da família, sobretudo no exercício da rigidez na educação da
menina. Em seu poema Mestra Silvina, Cora registrou que a sua escola primária
foi seu ponto de partida para o mundo da escrita e da leitura. Quando escritora
defendia que era preciso reverenciar a velha mestra em suas noites de autógrafos,
pois, para a poetisa, a mestra foi a responsável pelo desencantamento:
A mestra é reverenciada pela poetisa e descrita como uma pessoa velha, cansada,
que dedicou sua juventude a ensinar a meninada, pois muitas mestras não se
casavam para se destinar ao magistério. Isso nos remete a uma espécie de destino
natural prometido ao mundo feminino, uma espécie de ‘sacerdócio’, ressaltado
pela poetisa como algo prestimoso e reconhecido. Silvina, de acordo com os relatos
de Cora, era respeitada‘como uma parenta considerada’, os alunos, na porta da
escola, saudavam-na com um “Bença, Mestra”, apontando que a tão sonhada
laicidade escolar preconizada pelos republicanos dificilmente se cumpriria naqueles
primeiros tempos de República em um ambiente escolar, doméstico e religioso.
Vale registrar que a própria poetisa advertiu sobre as aulas de religião aplicadaspelos
freis capuchinhos da cidade nesta mesma escola, encontros que ela apreciava,
pois recebia figuras minúsculas de santos.
104
‘Alumiar a mente’: a instrução escolar...
VALDEZ, Diane
A poetisa registrou que no meio da confusão do que era dado como ‘bem’,
representado pelos bolos nas mãos e outros inúmeros castigos físicos aos quais
era submetida, reforçou que o entendimento de‘bem’ era a bolacha dada pela
paciente bisavó e os biscoitos de brevidades dados pela tia Nhorita, o resto ela não
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REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
tinha noção do que era. A prática de educar a criança por meio da punição é
lembrada pela autora em seus diferentes escritos, como já ressaltamos, punir não
se limitava ao mundo escolar, em casa e em outros espaços a criança era contida
de diferentes formas. Isso não escapou do olhar crítico e ressentido da escritora.
Em seu poema Cora Coralina, quem é você?,ela observou que o ranço do seu
passado se fazia presente:
A brutalidade, a incompreensão,
a ignorância, o carrancismo.
Os castigos corporais.
Nas casas. Nas escolas.
Nos quartéis e nas roças.
A criança não tinha vez,
os adultos eram sádicos
aplicavam castigos humilhantes
(CORALINA, 2004, p.225).
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‘Alumiar a mente’: a instrução escolar...
VALDEZ, Diane
Coralina destacou em seus escritos sua relação com as poesias de Olavo Bilac,
Tomás Antônio Gonzaga, Almeida Garret, Gregório de Matos e Basílio da Gama
que lhe inspiraram nas leituras nos serões literários da cidade onde declamava não
só os poemas de autores conhecidos como também os de sua autoria. Na juventude,
escreveu poemas para jornais e utilizou o pseudônimo de Cora Coralina pela primeira
vez. Ler e escrever tinha um preço na sociedade da época, pois de acordo com
Tahan, Cora era alvo das conversas das comadres fuxiqueiras de Vila Boa de
Goiás que sentadas nas conversadeiras das casas coloniais não se cansavam de
falar:
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REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
escolar de seu primo Zezinho, um menino de sete anos, filho de sua tia Laudemíria
que após se separar do marido, algo que soava estranho para o período, foi viver
com o filho na Fazenda Paraíso. Propriedade de seu avô e da bisavó Antônia, o
espaço é propagado pela poetisa como um lugar que condizia ao nome, um ambiente
que nos reporta, como leitor, ao modelo de uma casa grande. Como já foi ressaltado,
Cora não floreou seu passado, sobretudo sua infância, porém, quando seus textos
se reportam à Fazenda Paraíso, as palavras marcam um lugar diferente e prazeroso,
nota-se uma clara romantização do ambiente rural, onde tudo parecia harmônico
e idílico.
Na Fazenda Paraíso, onde a menina Ana passava suas férias, havia fartura de
comida, diferente do alimento regrado da cidade e era cheia de gente que cercava
seu avô, um patriarca dono de muita terra goiana, um provável coronel que reunia
ao seu redor compadres, agregados, protegidos e ex-escravos que dali não saíram.
É nesse ambiente que Cora descreve com admiração sua tia Laudemíria como
uma moça nova, zelosa, ativa, espirituosa e alegre, que costurava bonitos vestidos.
A tia demonstrava preocupação com o filho que já tinha idade suficiente para
entrar na escola, porém ela não queria mudar para a cidade e também não queria
enviar Zezinho para o internato do seminário, adiou até quando foi possível, fato
que, para o menino que corria pelos campos da Fazenda, não fazia a menor
diferença.
A solução estava na própria Fazenda, a mãe procurou seu tio Fidelcino, descrito
como um homem nervoso, governado por luas e permanentemente amuado, contudo
um homem de notável conhecimento, como registrou Cora (2002, p. 16): “Sabia
gramática, Francês, Latim, retórica e tinha rudimentos das leis da Física. Estudara
juntamente com outro irmão, no distante e afamado Seminário do Caraça de onde
saiu sem completar o curso, com uma doença grave no olho”. Foi acertada as
aulas com o mestre que, segundo Cora, tinha capacidade para ensinaros rudimentos
ao Zezinho. Todavia houve o esclarecimento de que o mestre só ensinava à “velha
moda”:
108
‘Alumiar a mente’: a instrução escolar...
VALDEZ, Diane
A palmatória bem lavrada em cabiúna preta com seu cabo de bom jeito e
comprimento legal, sua palma de três centímetros de espessura e cinco de
diâmetro com um signo de Salomão riscado no meio e cinco furinhos espaçados
saiu do prego e fez sua entrada triunfal. Seis bolos para começar e puxados,
para não caçoar. Da casa-grande ouvia-se o choro alto da criança junto ao
apelo aflitivo – apelo inútil, aliás. Tio Fidelcino tinha uma fé robusta na palmatória
e muita segurança de suas conseqüências (CORALINA, 2002, p. 24).
“Chega meu tio...”, gritava o menino... “Chega meu tio...” E a palmatória subindo
e descendo no compasso cadenciado da rude punição – um, dois, três, quatro,
cinco, seis, sete, oito, nove, dez, onze, doze, ia contando minha tia com o
coração em suspenso, com as mãos no ouvido e o rosto lavado em lágrimas. Aí
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REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
minha tia não se conteve e gritou lá da janela: “O que foi meu filho?”. E o
menino de lá soluçando: “São as patacas, mamãe... são as patacas, mamãe...”
(CORALINA, 2002, p.28).
110
‘Alumiar a mente’: a instrução escolar...
VALDEZ, Diane
o mestre, ensinando e vigiando os outros alunos - uma prática que provém dos
colégios jesuítas desde o século XVI e que permaneceu na escola até meados do
século XX. De acordo com o texto de Coralina, em uma tarde o decurião requeria
respostas completas e prontas de contas com números variados, quem errasse
passava para trás e ganhava bolos. Não alcançando a resposta certa no banco
dos adiantados, o menino, vigiado pelo mestre e usando de seu cargo superior,
passou para banco dos alunos médios que também não souberam a resposta.
Desanimado, o decurião chegou ao banco dos atrasados onde encontrou Zezinho
com a resposta pronta e na ponta da língua. Cora resumiu o final no conto:
Saiu do banco de trás, passou pelos médios e tomou o primeiro lugar na frente
dos adiantados, com espanto da classe e admiração do mestre. Na semana
seguinte ele tinha tomado o lugar do decurião e com o direito, ainda, de usar a
palmatória. O mestre Patroclo depois de aposentado contava para quem
quisesse ouvir que foi aquele menino Zezinho – o único decurião de dez anos
que teve sua escola. Estava resgatado o tio Fidelcino e a comprovada excelência
de sua palmatória (CORALINA,2002, p.36).
Considerações finais
Em seus textos literários, Cora abriu seu baú de lembranças para contar partes de
suas histórias, são fragmentos que a escritora registrou de acordo com as imagens
que ela construiu. A poetisa elegeu fatos da vida escolar de uma infância vivida no
final do período oitocentista, contudo, muito não foi dito, afinal, ninguém consegue
revelar tudo, algumas coisas foram guardadas em outros baús, pois como a própria
poetisa registrou trata-se de ‘meias confissões’ - suficientes para compreendermos,
a despeito das ressalvas, o mundo escolar nesse período.
Podemos, com isso, destacar elementos materiais e emocionais que faziam parte
de um ambiente escolar e que estão postos em várias pesquisas sobre a história da
educação. Primeiro destacamos a importância da escola no período, contradizendo
a perspectiva de que em uma região rural não se atribuía importância a ela. Para
as duas famílias, de Cora e de sua tia, a instituição familiar era respeitável pela
frequência da criança no mundo escolar, pois ao contrário, a vida futura das crianças
estaria limitada ao mundo doméstico sem maiores expectativas e, apesar de o
ambiente escolar ser descrito como um lugar frio e atemorizante, ele é apontado
111
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
Sobre o papel dos mestres, é notável que eles assumiam um papel proeminente.
No entanto, observa-se, em algumas passagens, características de um exercício
exaustivo e não reconhecido, como a mestra cansada que lecionou várias gerações
por mais de meio século. O papel da mulher no exercício do magistério permeia
uma relação doméstica, dando a essa profissional o poder de punir para conseguir
o resultado esperado ao mesmo tempo em que a autorizava a fazer parte da
família, inclusive exercendo o papel de madrinha. Já o mestre, apesar do primeiro
ser alguém da família do discípulo, ocupava um lugar diferente, mesmo diante de
seus métodos não aprovados pela mãe do aluno, não se questionava o poder
masculino. Nota-se também a curta permanência das crianças na escola, dado
que vinha de encontro com a obrigatoriedade de ensino da época, cursar o ensino
primário era considerado suficiente.
É possível considerar vários outros aspectos do mundo escolar dos fins do século
XIX, contudo não há espaço para isso. O que notamos de mais significativo,
além da contribuição relevante da literatura para a escrita da história, é perceber
que se trata de lembranças de uma pessoa adulta que se reporta à infância. Esta
é uma ressalva importante para analisar até que ponto os relatos se aproximam
do cotidiano escolar do passado e como os valores atuais podem remodelar a
memória. Críticas, laudatórias ou nostálgicas, as lembranças conferiram um lugar
importante ao tempo de aprendizagem escolar, refletindo tanto uma afirmação
do presente, ou mesmo do futuro, quanto uma visão objetiva do passado, muitas
vezes mitificada. A infância é mais representada que descrita, sendo essas
representações marcadas pela ansiedade social, moral e política da obrigatória
seleção trazida pelo tempo e da deformação operada pela memória. Portanto,
reforçamos o registro de partes da vida escolar de Cora Coralina, que pode nos
ajudar a pensar melhor o contraditório e complexo mundo da instrução no final
do século XIX nas terras goianas.
Referências
112
‘Alumiar a mente’: a instrução escolar...
VALDEZ, Diane
tempo: estudos sobre Cora Coralina. Goiânia: Ed. Kelps, 1999, p. 78-90.
______. Meu livro de cordel. Goiânia: Livraria e Editora Cultura Goiana, 1976.
114
EDUCAR E CIVILIZAR NO SERTÃO: RASTROS DO
IMAGINÁRIO SOCIAL NA EXPERIÊNCIA DE
ESCOLARIZAÇÃO DA PROVÍNCIA DE GOIÁS –
SÉCULO XIX
Thiago F. Sant’Anna*
Abstract: This paper seeks to emerge the meanings of the experience of schooling
for girls and boys in the Province of Goiás in nineteenth century, associated with
notions of progress and civilization. Using categories derived from the Discourse
Analysis, we seek to question historical sources like texts of the reports of provincial
presidents and newspaper articles, to visualize the social representations that
compose the social imaginary that presided over the experience of schooling.
* Thiago Fernando Sant’Anna é doutor em História pela Universidade de Brasília e professor do Campus
Cidade de Goiás/Universidade Federal de Goiás. Email: tfsantanna@yahoo.com.br
115
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
1
RELATORIO que a’ Assemblea Legislativa de Goyaz apresentou na sessão ordinaria de 1845 o Exmo.
Presidente da mesma Provincia Dr. José de Assis Mascarenhas. Goyaz: Typographia Provincial, 1845,
p. 06-07. In: INSTITUTO DE PESQUISAS E ESTUDOS HISTÓRICOS – BRASIL CENTRAL.
Memórias Goianas. Relatórios dos governos da Província de Goiás. 1845-1849. Goiânia: UCG, 1996,
p. 16-17. v. 4.
2
RELATORIO apresentado à Assemblea Legislativa Provincial de Goyaz na Sessão ordinária de 1858
pelo Exmo. Presidente da Provincia Dr. Francisco Januario da Gama Cerqueira. Goyaz: Typographia
Goyazense, 1858, p. 12-14. In: INSTITUTO DE PESQUISAS E ESTUDOS HISTÓRICOS – BRASIL
CENTRAL. Memórias Goianas. Relatórios dos governos da Província de Goiás. 1856-1859. Goiânia:
UCG, 1997, p. 139-141. v. 7.
3
RELATORIO apresentado pelo Illm. e Exm. Sr. Dr. Aristides de Souza Spinola. Presidente da Província
à Assembléa L. Provincial de Goyaz, no dia 1º. de Março de 1880. Goyaz: Typographia Provincial,
1880, p. 22-29. In: INSTITUTO DE PESQUISAS E ESTUDOS HISTÓRICOS – BRASIL CENTRAL.
Memórias Goianas. Relatórios dos governos da Província de Goiás. 1880-1881. Goiânia: UCG, 2001,
p. 32-39. v. 13.
116
Educar e Civilizar no Sertão
SANT’ANNA, Thiago F.
4
Arquivo microfilmado do Instituto de Pesquisas e Estudos Históricos – Brasil Central.
5
A EDUCAÇÃO da Mulher. A Tribuna Livre: órgão do Club Liberal de Goyaz, Goiás, p. 1-4, 20 ago. 1881.
Arquivo microfilmado do Instituto de Pesquisas e Estudos Históricos – Brasil Central.
117
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
118
Educar e Civilizar no Sertão
SANT’ANNA, Thiago F.
Evocar uma imagem remete-nos ao campo das representações sociais por elas
formado. Representação social percebida, na acepção dada por Jodelet, que a
entende como “uma forma de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada,
com um objetivo prático, e que contribui para a construção de uma realidade
comum a um conjunto social” (JODELET, 2001, p. 22). Trata-se de “sistemas de
interpretação que regem nossa relação com o mundo e com os outros”(JODELET,
2001, p. 22). Tais saberes orientam nossas ações no mundo ao nomearmos,
definirmos e significarmos os diferentes aspectos e dimensões de nossa realidade
diária. São elas que nos permitem interpretar o mundo, tomar decisões e
posicionarmo-nos na realidade social. Elas são social e culturalmente produzidas e
seu objetivo é justamente o de instituir o real em seus aspectos social e individual,
orientando comportamentos e práticas sociais. O espaço escolar orientado por
essa lógica de gênero opera como espaço produtor/reprodutor de corpos masculinos
e femininos, participando, enfim, desse sistema que responde pela partilha binária
e desigual de gênero.
6
RELATORIO apresentado a Assembléa Legislativa Provincial de Goyaz pelo Exmo. Sr. Dr. Antero
Cicero de Assis, Presidente da Provincia em o 1º. de Junho de 1871. Goyaz: Typographia Provincial,
1871, p. 7. In: INSTITUTO DE PESQUISAS E ESTUDOS HISTÓRICOS – BRASIL CENTRAL.
Memórias Goianas. Relatórios dos governos da Província de Goiás. 1870-1874. Goiânia: UCG, 1999,
p. 73. v. 11
119
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
7
RELATORIO apresentado à Assembléa Legislativa Provincial de Goyaz pelo Exmo. Sr. Dr. Antero
Cícero de Assis, Presidente da Provincia em 1º. de Junho de 1875. Goyaz: Typographia Provincial,
1875, p. 28-29. In: INSTITUTO DE PESQUISAS E ESTUDOS HISTÓRICOS – BRASIL CENTRAL.
Memórias Goianas. Relatórios dos governos da Província de Goiás. 1875-1879. Goiânia: UCG, 1999,
p. 16-17. v. 12.
8
Segundo Lília Moritz Schwarcz, “de um lado, o positivismo era nessa época o único conjunto formal de
princípios reconhecido e, por outro, o evolucionismo social de Spencer penetrava de maneira forte,
como que justificando toda a estrutura social vigente”. Cf. SCHWARCZ, Lília M. Retrato em Branco
e Preto: jornais, escravos e cidadãos em São Paulo no final do século XIX. São Paulo: Companhia das
Letras, 2001, p. 51.
9
RELATORIO apresentado pelo Illm. e Exm. Sr. Dr. Aristides de Souza Spinola, Presidente da Provincia
à Assemblea Provincial de Goyaz no dia 1º. de Junho de 1879. Goyaz: Typographia Provincial, 1879,
p. 15-22 passim. In: INSTITUTO DE PESQUISAS E ESTUDOS HISTÓRICOS – BRASIL CENTRAL.
Memórias Goianas. Relatórios dos governos da Província de Goiás. 1875-1879. Goiânia: UCG, 1999,
p. 247-255 passim. v. 12.
120
Educar e Civilizar no Sertão
SANT’ANNA, Thiago F.
A difusão da instrução pública era vista como estratégia para arrancar o país do
atraso, retirá-lo do conjunto das nações pobres e bárbaras e colocá-lo entre as
ricas e civilizadas, alinhando-o, portanto, às modernas nações européias e à norte-
americana. Sinal disso é a referência no relatório do referido Presidente Spínola
de que “vasto e complexo assumpto da instrucção publica não é difficil invocar
theorias, que tem sido brilhantemente sustentadas nos Estados-Unidos e na
Allemanha”. 11 Afinal, como nos ensina Orlandi, o que é dito codifica uma
10
RELATORIO apresentado pelo Illm. e Exm. Sr. Dr. Aristides de Souza Spinola, Presidente da Provincia
à Assemblea Provincial de Goyaz no dia 1º. de Junho de 1879. Goyaz: Typographia Provincial, 1879,
p. 15-22 passim. In: INSTITUTO DE PESQUISAS E ESTUDOS HISTÓRICOS – BRASIL CENTRAL.
Memórias Goianas. Relatórios dos governos da Província de Goiás. 1875-1879. Goiânia: UCG, 1999,
p. 247-255 passim. v. 12.
11
RELATORIO apresentado pelo Illm. e Exm. Sr. Dr. Aristides de Souza Spinola. Presidente da Província
à Assembléa L. Provincial de Goyaz, no dia 1º. de Março de 1880. Goyaz: Typographia Provincial,
1880, p. 22-29. In: INSTITUTO DE PESQUISAS E ESTUDOS HISTÓRICOS – BRASIL CENTRAL.
Memórias Goianas. Relatórios dos governos da Província de Goiás. 1880-1881. Goiânia: UCG, 2001,
p. 32-39 passim. v. 13.
121
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
mensagem sobre o que foi dito antes, em outros lugares. Os dizeres não são,
“apenas mensagens a serem decodificadas”, mas
O que é dito sobre instrução pública remete-nos ao que não é dito ali, mas que faz
parte de suas condições de produção. Remete-nos, assim, às ideias de modernidade,
civilização, progresso e construção da nação, imagens e significações usadas na
tessitura do projeto político do Brasil Imperial. Elas são reiteradas nos diferentes
discursos governamentais e educacionais do século XIX. Constrói-se uma memória
acerca da educação e de seu papel na construção de nação, projetada como
moderna, civilizada, com progresso material e moral. Orlandi ressalta a importância
da memória e seu efeito de sentido ou interdiscurso, isto é, o que foi dito antes, os
acontecimentos passados:
Este é definido como aquilo que fala antes, em outro lugar, independentemente,
Ou seja, é o que chamamos memória discursiva: o saber discursivo que torna
possível todo dizer e que retorna sob a forma do preconstruído, o já-dito que
está na base do dizível, sustentando cada tomada de palavra. O interdiscurso
disponibiliza dizeres que afetam o modo como o sujeito significa em uma situação
discursiva dada (ORLANDI, 2002, p. 31).
122
Educar e Civilizar no Sertão
SANT’ANNA, Thiago F.
123
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
A construção da nação, todavia, era projeto que dividia as elites, pois não havia
consenso quanto ao arranjo institucional que melhor atendesse aos diferentes
124
Educar e Civilizar no Sertão
SANT’ANNA, Thiago F.
Referências
12
Cf. SAVIANI, 2008, (Coleção memória da educação); OLIVEIRA, A. de Almeida. O Ensino Publico.
Obra destinada a mostrar o estado, em que se acha, e as reformas que exige a instrucção publica no
Brazil. Vol. Único. Maranhão, 1874; BARBOSA, Rui. Obras Completas de Rui Barbosa. Reforma do
Ensino Primário e várias instituições complementares da Instrução Pública. Vol. X, Tomo III. Ministério
da Educação e Saúde: Rio de Janeiro, 1947.
13
VILLELA, Heloisa de O. S. O Mestre-Escola e a Professora. In: LOPES, Elaine Marta Teixeira; FARIA
FILHO, Luciano Mendes; VEIGA, Cynthia Greive. (Orgs). 500 Anos de Educação no Brasil. 3 ed.
Autêntica, Belo Horizonte, 2003, p. 103. Sobre o medo das elites em relação à levantes de escravos,
AZEVEDO, Célia Marinho de. Onda Negra, Medo Branco: o negro no imaginário das elites. Século
XIX. São Paulo: Annablume, 2004.
125
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
AZEVEDO, Célia Marinho de. Onda Negra, Medo Branco: o negro no imaginário
das elites. Século XIX. São Paulo: Annablume, 2004.
NAVARRO SWAIN, Tânia. Você disse imaginário? In: ______ (Org.). História
no plural. Brasília: UnB, 1994, p. 55.
126
Educar e Civilizar no Sertão
SANT’ANNA, Thiago F.
RELATORIO apresentado pelo Illm. e Exm. Sr. Dr. Aristides de Souza Spinola.
Presidente da Província à Assembléa L. Provincial de Goyaz, no dia 1º. de Março
de 1880. Goyaz: Typographia Provincial, 1880. In: INSTITUTO DE PESQUISAS
E ESTUDOS HISTÓRICOS – BRASIL CENTRAL. Memórias Goianas.
Relatórios dos governos da Província de Goiás. 1880-1881. Goiânia: UCG, 2001.
v. 13.
RELATORIO apresentado pelo Illm. e Exm. Sr. Dr. Aristides de Souza Spinola,
Presidente da Provincia à Assemblea Provincial de Goyaz no dia 1º. de Junho de
1879. Goyaz: Typographia Provincial, 1879. In: INSTITUTO DE PESQUISAS E
ESTUDOS HISTÓRICOS – BRASIL CENTRAL. Memórias Goianas.
Relatórios dos governos da Província de Goiás. 1875-1879. Goiânia: UCG, 1999.
v. 12.
127
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
SAVIANI, Demerval. História das Idéias Pedagógicas no Brasil. 2ª. ed. Rev. e
ampl. Campinas. SP: Autores Associados, 2008, (Coleção memória da educação).
128
EDUCAÇÃO AMBIENTAL SOB O ENFOQUE DA
CONSTRUÇÃO DO ESPAÇO GEOGRÁFICO:
RECUPERANDO O PASSADO E COMPREENDENDO
O PRESENTE
* Profa. Dra. em Geografia na Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” -UNESP/campus
de Franca na Faculdade de Ciências Humanas e Sociais - FCHS, junto ao Departamento de Educação,
Ciências Sociais e Políticas Públicas (DECSPP). É professora do quadro da Pós-graduação em Serviço
Social. Atualmente exerce a chefia do Departamento DECSPP/ campus de Franca. E-mail:
analucia@franca.unesp.br
129
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
130
Educação Ambiental sob o enfoque da construção do espaço geográfico
GIOMETTI, Analúcia Bueno dos Reis
Introdução
Para reverter este quadro desolador há uma crescente busca pela Educação
Ambiental que, ao se respaldar nos avanços tecnológicos e científicos, procura
detectar os problemas ambientais advindos do modelo de desenvolvimento atual,
excludente e esgotante, o qual compromete os recursos naturais. Ao mesmo tempo,
este modelo educacional aponta os caminhos para a reversão dos processos
degenerativos, quando trabalha noções de sustentabilidade ambiental com os alunos,
procurando incutir noções de preservação do meio ambiente.
131
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
2008, p. 47).
Assim, o aluno desta série já está apto a discutir os conceitos, que envolvem:
primeiro, a compreensão da construção do núcleo urbano no contexto da formação
do Estado de São Paulo/brasil; segundo, a ação antrópica como desencadeadora
da apropriação do espaço; terceiro, a noção espacial - geoambiental do município;
quarto, a noção temporal do município, e o quinto o conceito que envolve o papel
da construção da consciência local/mundial para os problemas ambientais.
132
Educação Ambiental sob o enfoque da construção do espaço geográfico
GIOMETTI, Analúcia Bueno dos Reis
Ao final deste projeto espera-se que os alunos sejam capazes de: trabalhar os
principais conceitos sobre o tema proposto; construir e desenvolver ações que
impactem menos o meio ambiente; aplicar conceitos relativos à preservação do
planeta; descrever (identificar, distinguir, perceber) os problemas ambientais locais,
regionais e globais; explicar e compreender (construir, interpretar e opinar) as
133
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
134
Educação Ambiental sob o enfoque da construção do espaço geográfico
GIOMETTI, Analúcia Bueno dos Reis
[...] explicações para aquilo que, [...] permaneceu ou foi transformado, isto é, os
elementos do passado e do presente que podem ser compreendidos mediante a
análise do processo de produção/organização do espaço (BRASIL, 1997, p. 74).
135
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
Ao final desta atividade, o aluno terá demarcado as áreas de expansão urbana nos
diversos períodos históricos. Procurar demarcar zonas de crescimento desta malha
por períodos mais expressivos, associando o deslocamento deste crescimento a
fatores econômicos, sociais, políticos. Tomar como base geográfica a rosa-dos-
ventos, que norteará a tendência deste crescimento, partindo da área central.
136
Educação Ambiental sob o enfoque da construção do espaço geográfico
GIOMETTI, Analúcia Bueno dos Reis
Assim, trabalhar o conteúdo do texto com os alunos, tendo como suporte de estudo
o texto da evolução histórica do município estudado. Os alunos vão demarcando
com cores a expansão da zona urbana, seguindo a planta guia deste crescimento.
Ao final desta atividade construirão uma planta que demarcará o processo de
expansão do sítio urbano demarcado as áreas de expansão urbana nos diversos
períodos históricos de evolução da malha urbana.
Este módulo se encerra com visitas de campo. Na excursão, os alunos irão percorrer
estes pontos da zona urbana, respeitando os períodos cronológicos, iniciando pela
área onde se deu o início do povoamento da cidade estudada. Para uma melhor
compreensão histórico-geográfica, recorrer ao auxílio da planta urbana para que
os alunos se orientem durante os trabalhos desenvolvidos. A professora demarca
previamente os pontos de paradas mais representativos da espacialização da
expansão urbana.
Assim, escolher estes pontos segundo a visão espaço e tempo, procurando iniciar
os trabalhos pela área pioneira do núcleo urbano, destacando a importância deste
local, por ser a área onde teve origem a expansão da malha urbana. Fazer uma
descrição do meio ambiente despertando a atenção do aluno, seguindo o roteiro da
caracterização geográfico-histórica abaixo discriminada.
137
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
10. analisar o relevo do bairro: relevo plano; relevo suavemente ondulado; relevo
fortemente ondulado (apresentando grandes diferenças altimétricas expressas
em ruas e avenidas com muita subida e descida).
13. junto ao ponto de parada há presença de depósito de lixo e/ou aterro sanitário.
138
Educação Ambiental sob o enfoque da construção do espaço geográfico
GIOMETTI, Analúcia Bueno dos Reis
Nas séries iniciais, encerrar os trabalhos de campo com atividades orais, buscando
o resgate do que foi vivenciado na excursão, estimulando os alunos a colocarem
no papel suas impressões mais marcantes, através de desenhos e esquemas do
roteiro da excursão.
Referências
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REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
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ARTIGOS LIVRES
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A IMPLANTAÇÃO DO GÁS CANALIZADO NO
MUNICÍPIO DE SÃO PAULO
Abstract: Considering the importance that natural gas gained after the recent
discovery of large reserves in the country, the article discusses the implementation
of the piped network and its evolution during the twentieth century and in the last
decade, based on a case study, the dynamics of expansion of the service in 96
districts used officially by the City of São Paulo since 1991. In conclusion, it appears
that the choice of location to serve considers factors such as income, vertical, built
density and type of land use, based on the so-called “expanded center” and becoming
diffuse mainly along the periphery of the southern and eastern regions city??.
143
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
Introdução
Com isso espera-se que o país, computando o volume das descobertas recentes,
passe a consumir o gás natural de forma mais intensa, não somente nos setores
automotivo e industrial, mas também em usos cotidianos no comércio, prestação
de serviços e residencial.
144
A implantação do gás canalizado no município de São Paulo
MASSARA, anessa Meloni
O maior mercado do país conta com três distribuidoras: Comgás, Gás Natural
Fenosa e Gas Brasiliano.
Em 26 de abril de 2000, a empresa Gas Natural SPS (São Paulo Sul S/A) ganhou
a licitação convocada pela Comissão de Serviços Públicos de Energia (CSPE) do
Estado de São Paulo, para outorga de concessão para a exploração de serviços de
distribuição de gás canalizado na área sul do referido Estado.
A zona adquirida tem a extensão de 53.000 Km2, com uma população em torno de
2,7 milhões de habitantes e que compreende 93 municípios entre as regiões admi-
nistrativas de Sorocaba e Registro.
145
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
A Gas Natural SPS se tornou em 2010 a Gas Natural Fenosa, que é um Grupo
energético voltado à prestação de serviços à comunidade, com intenção de ser
uma empresa integrada, líder na Espanha e com projeção internacional.
1
Lembrando que no final do século XIX, teve início a introdução da energia elétrica.
146
A implantação do gás canalizado no município de São Paulo
MASSARA, anessa Meloni
147
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
1912: controle pela São Paulo Tramway, Light and Power Company Ltd.
1984: controle passa para a estatal Cesp – Companhia Energética de São Paulo
A rede em 1900 para esse fim era pouco desenvolvida; em 1901 aparece o primei-
ro fogão a gás, no Palácio do Governo.
2
Mantendo a lembrança do uso de lampiões a gás, foram conservados aqueles localizados no Pátio do
Colégio. Em 1995, estes lampiões foram desativados, passando por reforma dos postes e adequação
para o uso do gás natural, incluindo detalhada revisão da rede subterrânea, implantada no final do século
XIX, sendo reinaugurados em 2000, na ocasião do 447° aniversário da Cidade.
148
A implantação do gás canalizado no município de São Paulo
MASSARA, anessa Meloni
Na década de 50, levantamento (PMSP, 1961, s.p.) mostra que pouco havia se
expandido esse serviço; situação confirmada em 1968, pelo Plano Urbanístico
Básico, mostrando a concentração na região central da cidade, caminhando para
os Jardins e Vila Mariana.
Até 1976, só existe rede por gás de nafta ainda em ferro fundido, intitulado
“subsistema I” servindo comércio e residências e pequena indústria. Em 1976 é
criado o chamado “subsistema II”, primeiro servindo média e grande indústria e
pequena quantidade de comércio.
149
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
Em 1993, a Usina Massinet Sorcinelli começa a produzir gás natural e tem início o
programa de conversão em comércio e residências em larga escala (iniciado em
89).
3
O Centro expandido é delimitado pelo chamado mini-anel viário, composto pelas marginais Tietê e
Pinheiros, mais as avenidas Salim Farah Maluf, Afonso d’Escragnolle Taunay, Bandeirantes, Juntas
Provisórias, Presidente Tancredo Neves, Luís Inácio de Anhaia Melo e o Complexo Viário Maria
Maluf.
150
151
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
A cidade de São Paulo conta com 96 distritos dos quais 28 deles localizados em
seu centro geográfico já possuem rede de gás canalizado. Os outros 68 distritos
também foram subdivididos conforme a situação da rede gerando três agrupa-
mentos distintos e que se destacaram na coleta de informações.
Figura 3 Localização dos distritos por condição da rede de gás no município de São Paulo. Fonte:
MASSARA, 2007; COMGÁS, 2010. Nota: mapa base adaptado de SEMPLA, 2001; figura mera-
mente ilustrativa. Sem escala.
152
A implantação do gás canalizado no município de São Paulo
MASSARA, anessa Meloni
O primeiro grupo de expansão da rede, que conta com 16 distritos com parte de
seu território já coberto pela rede de gás natural (aproximadamente 50% ou mais
de sua área). São em sua maioria distritos que mesclam usos residenciais horizon-
tais e verticais, com galpões industriais, sendo substituídos por comércio e servi-
ços sofisticados. Concentram lançamentos imobiliários e chances de desenvolvi-
mento urbano (figura 3a).
O terceiro grupo é formado por 28 distritos que não possuem rede de GN. São em
sua maioria, distritos basicamente residenciais, caracterizados por casas muito
simples ou por conjuntos habitacionais. Com o advento de conjuntos do CDHU
com instalações prediais para gás, talvez venha a se tornar atraente a implantação
da rede, porém concentra áreas com problemas na coleta de esgotos e iluminação
e baixa renda (figura 3c) (IBGE, 2000).
Considerações Finais
Na análise da Cidade de São Paulo, Massara (2007) aponta que os distritos com
melhores características urbanas são àqueles que recebem primeiro o serviço4 .
Essa conclusão (figura 4) pode ser feita imaginando a cidade como uma série de
escamas com diferentes camadas, sendo o centro das escamas, associado ao
centro expandido, que compreende os primeiros bairros da cidade a usarem o gás
em rede.
A próxima lamina é constituída por um anel que envolve o centro é que coincide
com um misto entre a área servida em até 30% e a área servida em até 15% por
rede de gás natural, que respectivamente vai se distanciando do centro, se tornan-
do menos sofisticado em termos de usos residenciais, de comércio e serviços, mas
que ainda concentra indústrias que podem atrair o uso do gás canalizado. A lâmina
externa representa os distritos periféricos que embora muitas vezes com alta con-
centração populacional e verticalização residencial, perdem em qualidade de vida,
renda, projeções de expansão e sofisticação de usos (e consequente demanda por
energia) e estão mais distantes da área coberta pela rede, dificultando e onerando
sua implantação.
4
Vale ressaltar que a expansão da rede é bastante dinâmica; portanto a condição de 2011 pode ser
diferente da demonstrada até o último levantamento da autora.
153
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
Figura 4 Situação aproximada da implantação da rede de gás natural na cidade de São Paulo. Fonte:
Massara, 2007; Comgás 2010. Nota: Mapa base adaptado de SEMPLA, 2001. figura meramente
ilustrativa. Sem escala.
Através desta breve análise, fica explícito que existe uma relação de maior peso
envolvendo as transformações de uso do solo e conseqüente implantação das
infra-estruturas. Essa relação é baseada no conjunto de características da cidade
a começar pela implantação de seu núcleo inicial e consolidação do “centro” cul-
minando com o direcionamento de investimentos visando o setor imobiliário e sua
valorização no setor oeste da cidade.
154
A implantação do gás canalizado no município de São Paulo
MASSARA, anessa Meloni
Agradecimentos
A pesquisa que resultou neste artigo contou com financiamento do CNPq e orien-
tação do Prof. Witold Zmitrowicz, Arquiteto Urbanista, Prof. Livre-Docente apo-
sentado do curso de Engenharia Urbana e Ambiental-USP e Vice-Diretor do Centro
Interunidade de História da Ciência – USP.
Referências
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REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
156
“UMA COISA É VER E OUTRA É O CONTAR”: OS
IMPACTOS CAUSADOS PELAS NOVAS
DESCOBERTAS MINERAIS NO NORTE DE MINAS
GERAIS NA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XVIII
Resumo: Com a proibição dos caminhos dos Currais e dos Sertões da Bahia e
com a construção do Caminho Novo para o Rio de Janeiro, as localidades
transpassadas pelos circuitos mercantis que ligavam por terra a capitania da Bahia
à região mineradora foram perdendo dinamismo e importância econômica. Mas
quais teriam sido as conseqüências trazidas pelas novas descobertas minerais em
Minas Novas, no Serro do Frio e em Paracatu? Este artigo pretende mapear
melhor essas conjunturas econômicas e verificar os impactos decorrentes dos
novos descobrimentos minerais no Norte de Minas Gerais. Para tanto, nos vale-
mos das cartas que o comerciante português Francisco Pinheiro trocou com um
correspondente em Sabará, de diversos documentos remetidos ao Conselho Ul-
tramarino português e de alguns processos de habilitação para o Santo Ofício.
Tudo isso foi analisado de forma conjugada a fontes inéditas, tais como mais de
1.000 escrituras de procuração e outras escrituras registradas nos cartórios da
Vila de Sabará ao longo da primeira metade do século XVIIII.
Abstract: The prohibitions of trade beyond the Bahia route and the making of a
new route between Rio de Janeiro and the mining area, leaded to an economic
decrease of the trading routes between Bahia and Minas Gerais. But what were
* Mestre em História pela Universidade Federal de Minas Gerais, Doutorando em História pela Univer-
sidade Federal Fluminense e Bolsista Capes (REUNI e PDEE).
157
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
the consequences of some new minerals founds in Minas Novas, Serro do Frio,
and Paracatu? The aim of this article is to analyze the changes caused by the new
mineral discoveries in North Minas Gerais. For these purpose we use some letters
written to an important Portuguese merchant, Francisco Pinheiro; some official
documents made by the Church and by the Portuguese crow; and many unpublished
sources, as more than 1000 proxies and some others documents recorded in the
notary offices of Sabará. All these documents were produced over the first half of
the eighteenth century.
Introdução
Segundo Charles Boxer, “os arraiais mineiros que se enfileiravam ao longo do rio
das Velhas, depressa estavam interligados por uma rede de trilhas e passagens,
inclusive com os remotos postos avançados estabelecidos no inabordável Serro do
Frio” (BOXER, 2000, 63). Relatos coevos atestavam o volume e a importância do
1
De acordo com o artigo 17, do comércio com a Bahia “pode seguir o descaminho de meus quintos –
porque, como o que se vende é a troco do ouro em pó, toda aquela quantia se há de descaminhar”. Por
isso passou a ser proibido o comércio de escravos e demais gêneros (com exceção do gado) por aquele
circuito. Ver: REGIMENTO das Minas de 1702. APUD: FIGUEIREDO, Luciano R. de A.; CAMPOS,
Maria Verônica (Org.). Códice Costa Matoso. ColeçaÞo das notiìcias dos primeiros descobrimentos das
minas na Ameìrica que fez o doutor Caetano da Costa Matoso sendo ouvidor-geral das do Ouro Preto,
de que tomou posse em fevereiro de 1749, & vaìrios papeìis. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro,
1999, p. 318.
158
“Uma coisa é ver e outra é o contar”
SANTOS, Raphael Freitas
comércio praticado nos caminhos às margens dos rios das Velhas e do São Fran-
cisco. Conforme foi escrito em 1705 nas “Informações Sobre as Minas do Bra-
sil”, “não só é grande, mas precisamente como necessária a que eles [os mora-
dores das minas] têm no comércio do rio de São Francisco” (Cf. Anais da Bibli-
oteca Nacional do Rio de Janeiro, vol. 57, p. 172-186, 1939, p. 178 (grifos
nossos).
Segundo o cronista anônimo, seria “grande porque lhe entram por ele fazendas de
todo o gênero, escravos, e mais coisas necessárias para seu uso com menor valor
do que lhe custam no Rio de Janeiro” (Cf. Anais da Biblioteca Nacional do Rio
de Janeiro, vol. 57, p. 172-186, 1939, p. 178).
pelo dito rio ou pelo seu caminho lhe entram os gados de que se sustentam o
grande povo que está nas minas (...), da mesma sorte se prove pelo dito rio
caminho de cavalos para suas viagens, de sal feito de terra no rio de São
Francisco, de farinha e de outras coisas, todas precisas para o trato e sustento
da vida(Cf. Anais da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, 1939, p. 179).
Mas, ao final da primeira década do século XVIII, houve uma importante mudan-
ça na política de ocupação e de exploração das áreas mineradoras, em grande
medida devido a Guerra dos Emboabas. Para Adriana Romeiro, “nas deliberações
[do Conselho Ultramarino] sobre o conflito fica evidente a mudança de orienta-
ção” (ROMEIRO, 2005, 212). Nessa perspectiva, as criações de vilas, a introdu-
ção de novas formas de tributação e as proibições sobre algumas das mais lucra-
tivas operações mercantis realizadas entre a Bahia e as Minas fizeram com que
houvesse um deslocamento do eixo econômico da região mineradora de Sabará,
Caeté e adjacências – visceralmente ligadas aos Caminhos dos Currais e dos
Sertões da Bahia – para as minas de Ouro Preto, de Vila do Carmo e demais
arraiais próximos (CAMPOS, 2002).2 É evidente que as localidades nos sertões
ao norte de Minas Gerais, ligados à Bahia e às rotas mercantis que vinham dessa
capitania, também foram bastante atingidas pelos impactos dessa reorientação
político-econômica.
Cabe ressaltar que as proibições ao comércio pelos Caminhos dos Currais e dos
Sertões da Bahia, somada à política que privilegiava o abastecimento da região
mineradora através do Caminho Novo do Rio de Janeiro, promoveram importan-
2
Vale à pena lembrar que antes de 1709 a sede da Intendência das Minas era em Sabará, onde vivia Manoel
de Borba Gato; e que, nesse período, a região era provavelmente a mais povoada e rica de todo o
território que seria, mais tarde, a capitania de Minas Gerais (DERBY, 1899; ANDRADE, 2008).
159
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
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Mas não nos restringimos ao uso das escrituras notariais. A utilização de uma
expressiva diversidade de fontes, analisadas de forma conjugada, nos possibilitou
uma perspectiva integradora do sujeito individual ao movimento mais amplo da
história. Conforme afirmou certa vez Carlo Ginzburg, inspirado nos estudos de
160
“Uma coisa é ver e outra é o contar”
SANTOS, Raphael Freitas
Nesse sentido, foi possível fazer vários apontamentos a respeito dos ritmos com
que mudaram as relações entre Minas Gerais e os portos de Salvador e do Rio de
Janeiro, por exemplo (c.f. Gráfico 1). Até o início da década de 1730, o percentual
de procuradores nomeados para o Rio de Janeiro era muito menor do que daque-
les nomeados para atuar na capitania da Bahia, sinalizando para a proeminência
política e econômica de Salvador em relação à praça carioca. Durante esse perí-
odo, os baianos representavam, em média, 26% dos procuradores registrados em
cartório, enquanto a média de procuradores sediados no Rio de Janeiro, para o
mesmo período, era de 9%.3 Porém, esse quadro começou a sofrer alterações a
partir de meados da década de 1730, marcando o início de uma mudança irreversível
na orientação política e econômica da América portuguesa em torno do povoa-
mento e exploração da porção meridional da Colônia – consolidada em 1763 com
a mudança da sede do Vice-Reino para o Rio de Janeiro. Não existem registros
de escrituras de procuração para o período que compreende os anos de 1732 e
1734. Mas sabemos que em 1735 o percentual de procuradores “fluminenses”
(11%) se aproximou pela primeira vez dos “baianos” (13%). Depois disso, a ten-
dência foi de crescimento na proporção de procuradores nomeados para atuar no
Rio de Janeiro e de recrudescimento nos índices de procuradores atuantes na
Bahia, principalmente aqueles nomeados para agir nos sertões e no recôncavo da
Capitania (SANTOS, 2011).
Com base nessa mesma documentação também foi possível identificar algumas
conjunturas mais localizadas, como as descobertas minerais na porção setentrio-
nal da capitania de Minas Gerais. Embora elas tenham sido decisivas para a ocu-
pação e colonização dos sertões da América portuguesa, não foram capazes de
transformar estruturalmente a economia mineira da mesma forma que as mudan-
ças na exploração e no abastecimento das chamadas “Minas dos Cataguazes”.
Vejamos a partir de agora os ritmos das novas descobertas minerais no norte de
Minas Gerais e algumas das conseqüências dessas alterações conjunturais para
Minas Gerais.
3
Não por acaso, até o início da década de 1730, a média do percentual de procuradores que se encontrava
em Pernambuco, Piauí e Paraíba também não era nada desprezível (2,5%) e superava em muito a
quantidade de procuradores que se encontravam, por exemplo, em São Paulo, Rio Grande e Sacramento
(0,5%). FONTE: MO/IBRAM – Casa Borba Gato: LN (CPO e CSO) – 1717-1750
161
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
4
Em um bando o Vice-Rei ordenou “que não obedecessem aqueles mineiros, nem ao governo destas
Minas nem ao ouvidor geral da dita comarca, entendendo que o tal descobrimento era pertencente a
jurisdição da Bahia”. CARTA de D. Lourenço de Almeida, governador das Minas Gerais, sobre a
deserção dos mineiros para Novas minas e sobre o descaminho do ouro. AHU – Cons. Ultram. – Brasil/
Minas Gerais –: cx. 13 doc. 40 – 30/11/1728.
5
PARECER do Conselho Ultramarino sobre a informação do ouvidor geral da Comarca do Serro do Frio,
António ferreira do vale, relativa aos descobrimentos das Minas nos sertões da Bahia. AHU – Cons.
Ultram. – Brasil/Minas Gerais –: cx. 14 doc. 14 – 14/03/1729.
162
“Uma coisa é ver e outra é o contar”
SANTOS, Raphael Freitas
e esse percentual foi de 15%. Isso significa que muitas pessoas migraram para as
recém-descobertas minas de ouro, diamante e outras pedras preciosas a fim de
enriquecer com a mineração, com o abastecimento da região, com a prestação de
serviços e/ou para representar os interesses econômicos de outrem. Portanto, não
restam dúvidas de que o descobrimento das Minas Novas levou a uma verdadeira
corrida do ouro para o norte de Minas Gerais.
“Em tenra idade”, João Gomes do Rego abandonou a freguesia de Santa Eulália
de Passos, próxima à cidade do Porto, e embarcou para a Bahia. Porém “passado
ano e meio pouco mais ou menos, de assistência nesta cidade que teve, o habili-
tando se passou para as Minas”. De acordo com uma testemunha, que “com ele
6
CARTA do [vice-rei e capitão-general do estado do Brasil], conde de Sabugosa, Vasco Fernandes César
de Meneses ao rei [D. João V] sobre a deserção dos mineiros das Minas Gerais. AHU – Cons. Ultram.
– Brasil/Bahia –: cx. 27 doc. 106 – 12/10/1728.
7
Ibidem.
163
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
veio embarcado para esta Bahia”, depois de ter acumulado cabedal com a nego-
ciação de comboios e carregações para as Minas Gerais, João Gomes do Rego
viajou de volta para Portugal a fim de se casar com “Micaela Maria, e com ela
voltando outra vez para esta cidade [da Bahia] fez várias viagens com seu negó-
cio para as mesmas minas, até que ultimamente levou consigo a dita sua mulher
para as minas do Serro do Frio, onde está de assento e morador”. Contudo, con-
forme relataram os informantes do Santo Ofício, depois das descobertas das “Mi-
nas Novas”, João Gomes do Rego “deixou suas roças no Serro do Frio onde
assistia” e “de presente assiste nas novas [minas] chamadas dos Fanados”.8
8
HABILITAÇÃO para o Santo Ofício de João Gomes Rego. ANTT/HSO: João, mç. 62 doc. 1170 –
1731.
9
Francisco Pinheiro foi um fidalgo-mercador português que mantinha intensas relações comerciais com
o norte da Europa, com a África e com várias partes da América. Nesse continente, ele contava com
correspondentes nas principais praças mercantis, como Bahia, Recife, Rio de Janeiro e São Paulo. Com
a expansão aurífera, durante a primeira metade do século XVIII, Francisco Pinheiro também contou
com uma rede de correspondentes em Minas Gerais (GUIMARÃES, 2007; FURTADO, 2008).
10
CARTA de Francisco da Cruz para Francisco Pinheiro. Vila Real 17 de junho de 1728. IN: LISANTI, F.
Luís. Negócios Coloniais: uma correspondência comercial do século XVIII. Vol. I. Brasília: Ministério
da Fazenda, 1973, p. 300.
11
Ibidem (grifos nossos).
12
CARTA de Francisco da Cruz para Francisco Pinheiro. Vila Real, 17 de julho de 1728. IN: LISANTI, F.
Luís. Negócios Coloniais... op. cit., p. 301-302
164
“Uma coisa é ver e outra é o contar”
SANTOS, Raphael Freitas
pois não acho quem as compre e só digo que há nesta vila quem quer vender
outras que lhe custaram 500 oitavas de ouro, as estão metendo pelos olhos por 200
oitavas com os trastes de casa e não há quem as queira”. Segundo Francisco da
Cruz, isso teria acontecido por “todos quererem ir para as Minas Novas, que
muitos se tem ido e deixam seus engenhos e fazendas que valem mais de meia
arroba de ouro”.13
armando meu cunhado e dez amigos uma tropa de quarenta negros e quatro
homens brancos lhe foi preciso valer-se de mim para o seu nesta vila [de
Sabará] os preparar de que lhe fosse necessário cuja tropa já se há de achar
nelas a perto de mês e meio, e espero por novas delas até o fim de agosto a
princípio de setembro que vem para eles e mais eu passarmos para elas.14
O volume de ouro extraído e dos negócios realizados pode não ter correspondido
à quantidade de pessoas que se dirigiram aos novos descobrimentos. A adminis-
tração daquelas minas, sob os cuidados da Bahia, também poderia ter limitado a
atuação de agentes residentes em Minas Gerais. Todas essas hipóteses, de algu-
ma forma, ajudam a explicar esse processo. Mas as descobertas diamantíferas
13
Ibidem.
14
Ibidem. Seu cunhado era Manoel Mendes da Costa, que também era um dos correspondentes de
Francisco Pinheiro. Ao que tudo indica, ele e seu irmão Francisco Mendes da Costa partiram para as
Minas Novas em 1729. Foi possível encontrar seu nome como procurador nomeado em Minas Novas
e em Vila Rica. Ver, respectivamente: ESCRITURA de procuração bastante feita por João Marinho de
Queiros. MO/IBRAM – Casa Borba Gato: LN, CPO 04(03), fls. 62-63 – 22/02/1729; ESCRITURA de
procuração bastante feita por Manoel Leitão Cardoso. MO/IBRAM – Casa Borba Gato: LN, CPO
05(04), fls. 105-106 – 27/05/1730.
165
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
Junto com uma carta escrita na Vila de Sabará, no dia 03 de agosto de 1729,
Francisco da Cruz enviou para Francisco Pinheiro uma amostra do que possivel-
mente seria um diamante, com um pedido para “lapidar e mandar-me o preço em
que o avaliam para eu poder me governar no negócio deles”.16 No ano seguinte,
antes mesmo de obter resposta de seu patrono e compadre, Cruz escreveu dizen-
do que “no que toca serem eles (os diamantes) finos não temos dúvida porque da
cidade da Bahia vem muitos sujeitos acima a comprá-los por todo o custo”.17
15
Em 1731, o Vice-Rei escreveu uma carta relatando a falta de mantimento, os preços excessivos dos
produtos “por não chover” naquela região e, sobretudo, chamando atenção para a quantidade de
pessoas que tem “desertado para o Serro do Frio por causa dos diamantes”. Dois anos depois, em outra
carta dirigida ao monarca, o Conde de Sabugosa descreve um cenário ainda mais grave de “deserção” e
“decadência” em Minas Novas. Ver, respectivamente: CARTA do vice-rei e capitão-general do Brasil,
conde de Sabugosa, Vasco Fernandes César de Menezes ao rei [D. João V] comunicando o estado em que
se encontra as Minas novas, com preços excessivos dos mantimentos, morte de muita gente por
doenças, deserção de pessoas para o Serro Frio em busca de diamantes. AHU – Cons. Ultram. – Brasil/
Bahia –: cx. 36, doc. 1 – 02/10/1731; CARTA do [vice-rei e capitão-general do estado do Brasil], conde
de Sabugosa, Vasco Fernandes César de Meneses ao rei [D. João V] sobre os motivos para a decadência
das Minas Novas. AHU – Cons. Ultram. – Brasil/Bahia –: cx. 44 doc. 41 – 19/09/1733.
16
CARTA de Francisco da Cruz para Francisco Pinheiro. Vila Real, 03 de agosto de 1729. IN: LISANTI,
F. Luís. Negócios Coloniais... op. cit., p. 322.
17
CARTA de Francisco da Cruz para Francisco Pinheiro. Vila Real, 17 de maio de 1730. IN: LISANTI, F.
Luís. Negócios Coloniais... op. cit., p. 324.
166
“Uma coisa é ver e outra é o contar”
SANTOS, Raphael Freitas
Para Francisco da Cruz, a descoberta dos diamantes parecia ser outra boa opor-
tunidade de negócio. Mas, para que fosse levado a cabo, seria necessário o finan-
ciamento de alguém com cabedal e influência como o fidalgo-mercador Francisco
Pinheiro. Por isso, Cruz tentou convencer o homem de negócios português das
possibilidades reais de ganho que aquele empreendimento poderia gerar. Em carta
relatou que, há menos de 15 dias,
esteve em minha casa um amigo bem nomeado nestas terras, e nessa corte por
nome José da Silva, ou Candeias de alcunha, e me persuadiu me retirar-se para
o dito Serro se queria fazer fortuna pois ele bem pobre passara para lá com uma
companhia de amigos de Vila Rica e se considerava já com algum cabedal (...).
Meu compadre estive na mão uma pedra que ele tirou que tem o peso como
quem na pesou uma oitava e quarto, e me disse que tinham oferecido sessenta
mil cruzados a vista o que não porei dúvida pela muita azafama que há a elas.18
Sabendo das intempéries ocorridas nas Minas Novas, Francisco da Cruz se ante-
cipou às possíveis desconfianças e contou ter lhe dito “um amigo que a gente era
muita, mas que se tinham descoberto oito córregos, e por outro nome rios, aonde
se estavam tirando com grandeza” os diamantes. Sem rodeios, propôs para Fran-
cisco Pinheiro “fazer comigo alguma sociedade com seis negros seus a ver a
fortuna que fazemos”.19 Mas o projeto de Francisco da Cruz de fazer fortuna nas
regiões diamantíferas não foi para frente. Em parte devido à desconfiança que
Francisco Pinheiro aparentava ter sobre seu correspondente sediado em Sabará,
mas, sobretudo, por causa da decisão da coroa portuguesa de demarcar o distrito
diamantino e proibir a exploração dentro desse território. Essa proibição durou
entre os anos de 1734 e 1739. Vale lembrar que essa medida visava salvaguardar
as áreas não exploradas para o futuro e restringir a oferta do diamante no merca-
do internacional, uma vez que o grande aumento da produção havia causado uma
redução no preço da pedra.20 Foi decepcionante para Francisco da Cruz ter co-
nhecimento sobre essa matéria. Em tom lamentoso escreveu para Francisco Pi-
nheiro, relatando que “segundo o que se diz por dizerem que Sua Majestade man-
da ordem para que se fechem as minas dos diamantes”. Mas o próprio correspon-
dente de Francisco Pinheiro ponderou diante da notícia e sugeriu que essa medida
18
CARTA de Francisco da Cruz para Francisco Pinheiro. Vila Real, 17 de maio de 1730. IN: LISANTI, F.
Luís. Negócios Coloniais... op. cit., p. 324.
19
Segundo Cruz, outros correspondentes de Francisco Pinheiro já havia se enveredado por esses negócios,
como foi o caso do italiano João Francisco Muzi, “que este entendo já tem a sua sociedade”. Ibidem.
20
A estratégia da demarcação de um território que deveria ser exclusivo para a exploração do diamante
revelou-se insuficiente. Por isso, em sua reabertura, as lavras passaram a ser exploradas por particulares,
sob os cuidados de um único contratador, que tinha o direito de explorar a área por um período de
quatro anos – o tempo de duração dos contratos. Esse sistema vigorou até 1771, quando foi criada com
a Real Extração dos Diamantes. A partir desse momento a Coroa passou então a monopolizar a
exploração do diamante (FURTADO, 1996).
167
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
“não terá efeito, pois o povo sempre os há de tirar as escondidas e nas ditas terras
há de habitar sempre gente bastante”.21
21
CARTA de Francisco da Cruz para Francisco Pinheiro. Vila Real, 15 de abril de 1734. IN: LISANTI, F.
Luís. Negócios Coloniais... op. cit., p. 353.
22
CARTA do [vice-rei e capitão-general do estado do Brasil], conde de Sabugosa, Vasco Fernandes César
de Meneses ao rei [D. João V] sobre os motivos para a decadência das Minas Novas ... op. cit. Nessa
mesma carta, escrita em 07 de agosto de 1733, o Superintendente relatou que: “feita a cobrança do ano
passado imediatamente a da nova capitulação, e recolhidas ao cofre aquela grande soma de dinheiro,
logo se experimentou a falta dele na decadência do negócio”. Por causa das “desordens dos litigantes,
e muito prejuízo pela ruína dos serviços de Jequitinhonha, e desarranjo de muitos mineiros, se acha ao
presente aquela Minas muito debilitada, e a maior parte dos moradores com bastante consternação”.
168
“Uma coisa é ver e outra é o contar”
SANTOS, Raphael Freitas
A partir das procurações registradas nos cartórios da vila de Sabará foi possível
avaliar também os impactos de outro boom minerador no norte de Minas Gerais,
ocorrido na primeira metade do século XVIII: a descoberta das minas de Paracatu,
localizadas nos sertões da comarca do Rio de Velhas, no caminho que ligava
Minas Gerais às minas de Goiás e Mato Grosso.
De acordo com os dados coletados nos Livros de Nota dos cartórios da vila de
Sabará, após as descobertas das minas “nos sertões dos Goyases” (1725), apenas
no ano de 1731 – portanto, bem no início da ocupação dessa região – não foram
encontrados em nossa amostragem procuradores que assistiam nesses descobri-
mentos minerais. Para todos os demais anos havia ao menos um procurador no-
meado para atuar naquelas paragens. É claro que os procuradores nomeados
para Goiás e Mato Grosso representavam uma percentagem mínima dos procura-
dores registrados em cartório naquele período (em média 1,2%). Mas, apesar da
pouca representatividade, não restam dúvidas de que essas descobertas causa-
ram um significativo impacto para a economia de Minas Gerais.
23
CARTA de Francisco da Cruz para Francisco Pinheiro. Vila Real, 22 de maio de 1726. IN: LISANTI, F.
Luís. Negócios Coloniais... op. cit., p. 291.
24
Ibidem. Essas informações foram confirmadas por outro correspondente de Pinheiro na vila de Sabará.
Segundo Antônio da Costa Mendes, “enquanto ao estado destas terras, tenho visto neste pouco tempo
(...) muita gente [indo] para o Cuiabá, e só depois que estou nas [Minas Gerais] se tem contado passante
[mais] de duas mil e tantas pessoas, e já a monção passada dizem foram bastante”. Ver: CARTA de
Antônio Mendes da Costa para Francisco Pinheiro. Vila Real, 20 de maio de 1726. IN: LISANTI, F.
Luís. Negócios Coloniais... op. cit., p. 284.
169
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v. 17, n.1, n.2/2012
Uma das mais importantes estradas reais criadas para abastecer a região de Goiás
ficou conhecida como “Estrada das Nascentes”. Ela ligava Vila Boa, em Goiás, a
Paracatu, em Minas Gerais. Isso significa, portanto, que uma importante rota para
abastecer as minas de Goiás e Mato Grosso de produtos e escravos desembarca-
dos no porto do Rio de Janeiro eram os Caminhos dos Currais. Teria sido justa-
mente durante uma dessas viagens para os “Goiazes” que as minas do vale do rio
Paracatu foram descobertas pelo bandeirante Felisberto Caldeira Brant. Ele, jun-
tamente com José Rodrigues Frois, comunicou à Coroa, em 1744, essa que seria
a última grande descoberta aurífera da primeira metade do século XVIII (OLI-
VEIRA MELLO, 1994). Em pouco menos de um ano, naquelas paragens “se
juntaram de todas as comarcas das Minas Gerais, Goiás, São Paulo, Bahia e Rio,
mais de 10 mil almas”,25 transformando o pequeno arraial de São Luiz e Santana
das Minas de Paracatu em um mar de gente. Esse talvez tenha sido o principal
impacto da descoberta das minas de Goiás e Mato Grosso para a economia da
capitania de Minas Gerais.
25
CARTA do Governador Gomes Freire de Andrade. APM, SC 45 (1744-1749) fl. 67. APUD: BARBOSA,
Waldemar de A. Dicionário Histórico Geográfico de Minas Gerais. Belo Horizonte: Itatiaia, 1995, p.
237.
26
Depois da criação das casas de fundição, “viandantes e moradores” de Minas Novas deveria remeter o
ouro em pó à vila de Sabará para então fundi-los. Para evitar que eles fossem “obrigados a vir a esta vila
do Sabará rodear tantas léguas, ou expor se a perder o seu ouro levando-o em pó aos portos do mar”,
o governador Gomes Freire ordenou “remeter barras de ouro correntes desta casa de fundição do Sabará
para o distrito do Paracatu”. Ver: ORDEM do Governador Gomes Freire de Andrade. APM, SC 93
(1749-1753), f. 98-98v – 13/10/1751.
170
“Uma coisa é ver e outra é o contar”
SANTOS, Raphael Freitas
27
ESCRITURA de sociedade que fizeram Bento Francisco Vasquez Feijó e Diogo Ferreira Cunha. MO/
IBRAM – Casa Borba Gato: LN, CPO 11(35), fls. 32v-33v – 05/03/1745.
28
Ibidem.
29
Na letra de crédito lê-se: “Devo que pagarei a Diogo Ferreira Cunha 587 oitavas e um quarto de ouro
limpo capaz de receber procedida de metade de seis negros e três cavalos e ferramentas e outros gastos
que tudo lhe comprei e recebi a meu contento assim em preço como em bondade a qual quantia pagarei
a ele dito ou a quem este me mostrar da feitura deste a 2 anos e meio sem isso por dúvida alguma e por
cuja satisfação obrigo minha pessoa e os próprios bens que aqui se faz menção e por verdade lhe passei
este de minha letra e sinal . Vila de Sabará 16 de setembro de 1744. Bento Francisco Vasquez Feijó”. Ver:
TRESLADO de um crédito apresentado por Diogo Ferreira Cunha. MO/IBRAM – Casa Borba Gato:
LN, CPO 11(35), fls. 33v-34 – 05/03/1745.
171
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
Nesse sentido, uma das mais importantes razões para parco desenvolvimento eco-
nômico e para a fragilidade dos circuitos mercantis integrados a nova descoberta
aurífera em Paracatu reside nas indefinições administrativas e jurisdicionais nos
sertões da capitania de Minas Gerais. A exploração aurífera poderia ter o poder
de transformar a economia local, na medida em que criava as condições necessá-
rias para uma ampla circulação de moedas no mercado. Mas o dinheiro produzido
30
CERTIDÃO feita por Paulo Mendes Campelo, escrivão da Câmara de Vila Real de Nossa Senhora da
Conceição do Sabará, de algumas folhas dos livros de contas, que se tomarem, em cada ano, aos
procuradores. AHU – Cons. Ultram. – Brasil/Minas Gerais –: cx. 44 doc. 75 – 21/08/1744.
31
ESCRITURA de venda feita pelo capitão Paulo Mendes Campelo ao licenciado José Corrêa e Silva.
MO/IBRAM – Casa Borba Gato: LN, CPO 11(35), fls. 78-78v – 12/04/1745.
32
CARTA de José António Freire de Andrada, governador de Minas, informando Diogo de Mendonça
Corte-Real acerca das medidas cautelares que tem tomado no sentido de evitar a introdução de ouro
falso assim como da necessidade que há em se nomear um ministro para Paracatu. AHU – Cons.
Ultram. – Brasil/Minas Gerais –: cx. 61 doc. 27 – 20/02/1753.
33
CARTA de José António Freire de Andrada, governador de Minas, informando Diogo de Mendonça
Corte-Real acerca das medidas cautelares que tem tomado no sentido de evitar a introdução de ouro
falso assim como da necessidade que há em se nomear um ministro para Paracatu. AHU – Cons.
Ultram. – Brasil/Minas Gerais –: cx. 61 doc. 27 – 20/02/1753. Além disso, a qualidade do mineral
encontrado nessas novas descobertas não era tão boa quanto nas minas chamadas antigamente de
“Cataguazes”, “em razão da inferioridade do toque do ouro naquele continente”.
172
“Uma coisa é ver e outra é o contar”
SANTOS, Raphael Freitas
Além disso, os moradores mais antigos de Paracatu, que tinham roças, sítios e fa-
zendas na região reclamavam que “querem os contratadores que os suplicantes
estando perto do arraial as suas roças paguem direitos dos víveres e mantimentos
que vão vender ao arraial”. Isso acontecia justamente porque não havia uma defini-
ção clara se “nestes termos ou o Paracatu se considere como parte das Minas, ou
como território Extraminas”.35 O resultado dessa indefinição foi, de um lado, a
miséria dos pequenos proprietários, comerciantes e mineradores; e, de outro, os
“rendeiros e administradores, de que todos em breve tempo se tem visto opulentos
com muita soma de mil cruzados, uns nessas minas e outros no Reino”.36 A trajetó-
ria de Antônio Manoel Granja parece ser bastante emblemática nesse sentido.
34
Isso porque, tanto aqueles que levavam o ouro das lavras para gastar das minas, como as “pessoas
negociantes que vão aos engenhos e fazendas dos suplicantes compra-lhes os seus efeitos”, acabavam
tendo o dinheiro confiscado pelos rendeiros e administradores. REPRESENTAÇÃO dos oficiais da
Câmara de Vila Real do Sabará, dando conta das extorsões de que são vítimas os moradores das minas
de Paracatu, e solicitando providências para o caso. AHU – Cons. Ultram. – Brasil/Minas Gerais –: cx.
66 doc. 22 – 11/11/1754.
35
Ibidem.
36
Ibidem.
37
HABILITAÇÃO para o Santo Ofício de Antônio Manoel Granja. ANTT/H.S.O: António, mç. 136,
doc. 2254 – 1760 (grifos nossos).
38
Ibidem.
39
CARTA de Domingues Nunes Vieira, desembargador e intendente da Comarca de Sabará, informando
Diogo de Mendonça Corte-Real sobre a remessa da relação das fazendas que entravam nas Minas assim
como sobre a relação dos homens abastados da referida capitania AHU – Cons. Ultram. – Brasil/MG-
: cx. 70, doc. 40 –24/07/1756.
173
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
Considerações finais
O ouro extraído nas Minas Novas e em Paracatu não circulou com muita intensi-
dade naquelas regiões. Mais escasso, de pior qualidade, e restrito a poucas pesso-
as, o ouro encontrado nos sertões ao norte da capitania de Minas Gerais não foi
capaz de produzir o efeito de arraste característico desse fenômeno econômico
(ASSADOURIAN, 1979; CARRARA, 2010). Em outras palavras, nas minas
norte mineiras o ouro não permitiu o fomento da produção, do comércio, dos ser-
viços, enfim, dos circuitos mercantis com a mesma amplitude que ocorreu nas
minas na região central da capitania de Minas Gerais. As razões para esse fato
podem ser encontrados nas reorientações no abastecimento das minas promovi-
das pela coroa portuguesa, que tornaram proibidas por algum tempo as rotas mer-
cantis que ligavam a Bahia às Minas Gerais e estimularam o comércio pelo Cami-
nho Novo do Rio de Janeiro; e, principalmente, nos favorecimentos por parte da
coroa portuguesa ao desenvolvimento de práticas monopolísticas no que tange a
alguns dos negócios mais lucrativos operados em Minas Gerais, como eram os
contratos régios (dízimos, entradas, passagens e outros tributos) e a mineração do
diamante.
40
REQUERIMENTO do capitão Antônio Manoel Granja, solicitando a expulsão dos três sacerdotes que
perturbavam a paz e o sossego dos povos. AHU – Cons. Ultram. – Brasil/MG-: cx. 84, doc. 30 – 13/08/
1764.
41
CARTA de Francisco da Cruz para Francisco Pinheiro. Vila Real 17 de junho de 1728... op. cit.
174
“Uma coisa é ver e outra é o contar”
SANTOS, Raphael Freitas
GRÁFICO 1: Percentual de procuradores nomeados para a Bahia, Rio de Janeiro e São Paulo,
registrados nos cartórios da vila de Sabará
Fonte: MO/IBRAM – Casa Borba Gato: LN (CPO e CSO) – 1717-1750
GRÁFICO 2: Percentual de procuradores nomeados para Minas Gerais, registrados nos cartórios da
vila de Sabará
Fonte: MO/IBRAM – Casa Borba Gato: LN (CPO e CSO) – 1717-1750
OBS: Apesar de apenas na segunda metade do século XVIII Minas Novas ter
sido incorporada efetivamente à Comarca do Serro e à Capitania de Minas Gerais
– conforme a resolução do Conselho Ultramarino de 13 de maio de 1757 –, con-
tamos a região como parte da comarca do Serro do Frio, uma vez que vila estava
subordinada a Ouvidoria da Comarca (PARECER do Conselho Ultramarino so-
bre a informação do ouvidor geral da Comarca do Serro do Frio, António ferreira
175
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
do vale, relativa aos descobrimentos das Minas nos sertões da Bahia. AHU –
Cons. Ultram. – Brasil/Minas Gerais –: cx. 14 doc. 14 – 14/03/1729)
FONTES
REFERÊNCIAS
176
“Uma coisa é ver e outra é o contar”
SANTOS, Raphael Freitas
DIAS, Maria Odila L. da Silva. Sertões do Rio das Velhas e das Gerais: vida
social numa frente de povoamento – 1710-1733. IN: FURTADO, Júnia F. (org.)
Erário Mineral – Luis Gomes Ferreira. Vol. 1. Belo Horizonte: Fundação João
Pinheiro, 2002.
178
HISTÓRIA E MEMÓRIA: AS ORIGENS DA DIOCESE
DE MONTES CLAROS NO NORTE DE MINAS
GERAIS (1903-1943)
179
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
Introdução
1
Com essas palavras queremos compreender os desejos e empenhos para melhorar a situação da Igreja
no Brasil a fim de atender às diretrizes provenientes de Roma. Essa «reforma» não permanece pois no
mesmo nível daquela tridentina, mas é peculiar ao Brasil. Segundo Riolando Azzi, «a palavra «reforma»
foi utilizada pelos próprios bispos do século passado, e aparece com freqüência em seus documentos
pastorais. Na realidade, ela lembrava de perto a reforma tridentina, na qual os prelados buscavam sua
inspiração. O termo era utilizado em sua acepção comum, significando basicamente a substituição de
elementos considerados deficientes ou sem vitalidade por novas formas que permitissem à fé católica
apresentar-se com nova face» (R. AZZI, O altar unido ao trono: um projeto conservador, São Paulo
1992, 29).
180
História e Memória: As origens da diocese de Montes Claros...
SILVA, Franscino Oliveira
2
Alessandro Bavona nasceu em 1856. Foi Núncio do Brasil no período Roccadicambio (Aquila) aos 11 de
maio 1906-1910. Aos 2 de fevereiro de 1910 foi nomeado Núncio da Áustria. Morreu aos 19 de janeiro
de 1912 em Viena (Cf. G. DE MARCHI, Le Nunziature Apostoliche, 80).
3
Cf. algumas obras relevantes, dentre outras, a esse respeito: E. CARONE, A República Velha: instituições
e classes sociais. São Paulo 1975; ID., A República Velha: evolução política (1889-1930), São Paulo
1985; B. FAUSTO, O Brasil republicano: estrutura de poder e economia (1889-1930), São Paulo 1985;
T. BRUNEAU, O Catolicismo em época de transição, São Paulo 1974.
4
No dístico «Ordem e Progresso», presente na Bandeira Nacional e na elaboração da Primeira Constituição
Federal do Brasil verifica-se a influência liberal-positivista. Embora os seguidores do positivismo não
consigam implantar uma ditadura republicana no Brasil, seus seguidores persistem através de um
positivismo difuso, influenciando na doutrina e na prática de certos grupos políticos (Cf. J. C. COSTA,
Contribuição à história das idéias no Brasil, Rio de Janeiro 1967, 21-52).
181
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
geral eram grandes fazendeiros e políticos. Foi nos mecanismos desse sistema
que o chamado «coronelismo» tornou-se a base de uma possível política dos
Estados. Nesse período, os coronéis, chefes locais distribuídos nas várias regiões
do país, foram importantes na manutenção da tradicional composição do poder
político, baseado no princípio das trocas de interesses com o Estado, surgindo daí
uma legitimação recíproca entre o poder central e o poder regional.
5
Lindolpho Caetano de Souza e Silva Filho, nasceu aos 12 de janeiro de 1855 em Januária. Filho de
Manuel Caetano de Souza e Silva e Anna Lúcia de Souza Menezes. Ele entrou no seminário de
Diamantina aos 11 de outubro de 1873. Depois de alguns anos retirou-se porque seu pai estava muito
doente. Após a morte de seu pai ele não retornou ao seminário (Cf. Livro de Matrículas I [1867-1886],
n. 240, in ASMD). Quando acontecia a fase de integração republicana, no município de Januária, surgiu
Lindolpho Caetano de Souza e Silva, no cenário político local, projetando-se como chefe partidário de
grande influência. Nesta mesma época era companheiro do Cônego Levínio José Torres Jatobá.
Quando Lindolpho Caetano foi para a Câmara Estadual (1891-1897), o cônego ficou como Chefe
Executivo de Januária. Depois este deputado foi para a Câmara Federal (1897-1910) (Cf. J. V. LIMA ,
«Januária e seu passado político», in Primeiro Centenário de Januária [1860-1960], Belo Horizonte
1960, 51-58).
6
Nasceu no município de Paus Pretos, em 1844. Filho de Jacinto Soares de Oliveira e de Montes Claros
aos 3 de maio de Caetana de Jesus e Barros. Como representante comercial conseguiu construir um
patrimônio financeiro considerável e depois o perdeu todo na política. Ocupou vários cargos políticos
na cidade de Montes Claros. Foi Presidente do Conselho da Intendência Municipal de Montes Claros,
em substituição a Camilo Prates, que se exonerara. Elegeu-se deputado estadual (1896-1906). Faleceu
em Teófilo Ottoni aos 21 de setembro de 1918 (Cf. N. VIANNA, Efemérides Montesclarenses, 463-464).
7
Nasceu aos 29 de dezembro de 1859, na fazenda Santo André. Filho de Hermenegildo Rodrigues Prates
e Francisca Ambrosina Prates Sá. Ele fez o curso de Humanidades em Ouro Preto. Ingressou na política
aos 22 anos quando foi eleito Deputado Provincial. Foi um dos constituintes de 1891, da Constituição
Estadual e Senador Estadual. Na sua carreira política foi o chefe liberal de Montes Claros e líder no
Norte de Minas. Em 1911 foi eleito Deputado Federal, sendo reeleito até 1930, quando foi dissolvido
o Congresso Nacional. Em Montes Claros enfrentou um forte adversário político que era Dr. Honorato
Alves. Seu partido – camilista, partido de baixo, estrepe – era constituído pelas famílias Prates, Chaves
e os remanescentes celestinistas – Teixeira, Paula, Guimarães, Souto etc. Faleceu em Belo Horizonte
em dezembro de 1940 (Cf. H. A. PAULA, Montes Claros, I, Montes Claros 1979, 170).
8
Honorato José Alves nasceu em Mendanha, Minas Gerais, a 10 de novembro de 1868. Filho do Coronel
Marciano José Alves e Antônia Josefina Alves que mudaram para Montes Claros no ano de 1877. Fez
medicina no Rio de Janeiro, diplomando-se em Ciências Médico-cirúrgicas a 30 de novembro de 1890.
Formado, chegou a Montes Claros em princípios de 1891, exercendo a profissão e filiando-se aos
remanescentes do partido Conservador, obtendo apoio do Dr. Carlos Versiani, também médico e chefe
do tradicional partido. Foi eleito Deputado Estadual em 1903, e Presidente da Câmara de Municipal de
Montes Claros em 1904, quando já exercia o mandato. Eleito Deputado Federal em 1906, conseguiu
reeleições sucessivas até 1930. Quando se elegeu Deputado Federal transferiu-se para Belo Horizonte
e, depois para o Rio de Janeiro onde faleceu aos 23 de março de 1948 (Cf. N. VIANNA, Efemérides
Montesclarenses, 150).
182
História e Memória: As origens da diocese de Montes Claros...
SILVA, Franscino Oliveira
No ano de 1899 já era ventilada a ideia da criação de uma nova diocese no extremo
Norte de Minas10 . Fala-se de dois professores públicos Manoel Ambrósio11 e
Antônio Nascimento que reivindicavam para Januária a sede episcopal da futura
diocese. Certamente pensavam que, dentro dos projetos de melhoramentos para a
região, a criação de um novo bispado seria de grande significado (GASPAR, 1925,
p. 5). Foi num antigo semanário local de 1903, intitulado A Luz que o professor
Manoel Ambrósio lançou o primeiro artigo em favor do bispado de São Francisco,
durante a visita pastoral de Dom Joaquim à cidade de Januária (A Luz, 20 de
setembro 1903, p. 51).
9
Uma série de revoltas militares culminou com a força rebelde conhecida começou no Rio de Janeiro em
1922 e como «Coluna Prestes» (Cf. E. CARONE , Revoluções do Brasil Contemporâneo [1922-1938],
São Paulo 1989). Cf. também A. L. PRESTES, A Coluna Prestes, São Paulo 1990; V. P. BORGES, Tenentismo
e Revolução Brasileira, São Paulo 1992.
10
Nesse mesmo ano, o Papa Leão XIII numa carta dirigida ao Episcopado brasileiro voltou a insistir na
conveniência da criação de novos bispados no Brasil (Cf. LEO PP. XIII, «Epistola Paternae Providaeque»
[18 setembro 1899], in ASS 32 [1899-1900] 214-217).
11
Neste período existiam dois partidos políticos em Januária: Luzeiro e Escureiro. O Partido da Luz,
vinculado ao jornal A Luz, no qual pontificava Manuel Ambrósio, panfletário ardente, crescia sob um
impulso de mudança e renovação (Cf. J. V. LIMA , «Januária e seu passado político», in Primeiro
Centenário de Januária [1860-1960], Belo Horizonte 1960, 56).
12
Citamos aqui alguns livros da historiografia montes-clarense: VIANNA , Efemérides Montesclarenses
1707-1962, Rio de Janeiro 1964; U. VIANNA, Montes Claros. Monographia do Município de Montes
Claros, Belo Horizonte 1918; H. A. PAULA, Montes Claros – sua história, sua gente, seus costumes, III,
Montes Claros 1979.
183
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
O núncio acolheu com interesse aquele projeto de constituição de uma nova diocese
e se prontificou imediatamente a executá-lo, apresentando duas exigências iniciais:
1 o. O consenso dos três bispos das dioceses cujo território deveria ser
desmembrado, isto é, Bahia, Goiás e Diamantina. 2o. Obtido o consenso,
apresentassem as oportunas garantias requeridas no caso. E desde já se prontificou
para informar a Santa Sé a respeito do desejo da ereção da nova diocese. Em
1907 veio um outro núncio para o Brasil, Dom Alessandro Bavona (1906-1910).
Aos 28 de agosto de 1907 Dom Joaquim escreveu ao núncio para falar sobre os
trabalhos dele pela ereção da nova diocese (Nunziatura Apostolica in Brasile,
1907, fasc. 611, p. 2), apresentando-lhe as resoluções tomadas pelos bispos da
Província Eclesiástica Meridional do Brasil, nas conferências celebradas, há 6
anos, na capital de São Paulo. Entre as resoluções figurava a de se aumentarem
as dioceses de conformidade com as necessidades dos fiéis para incremento da
religião.
Ele explicou que se tratava de uma região pobre composta de um território muito
extenso. Deste modo, pediu a atenção do novo núncio ao projeto da criação da
diocese norte-mineira no bispado de Diamantina. Para a nova diocese iriam passar
todas as povoações compreendidas dentro dos limites da arquidiocese da Bahia
com Diamantina pelo rio Jequitinhonha, Itacambirussú, Congonhas Grande, Jequitaí,
São Francisco até o Urucuia, que dividirá a nova diocese com a do triângulo, e,
passada a foz do Urucuia, São Francisco abaixo de um e do outro lado, dividindo
com Goiás e Bahia. Seriam 23 paróquias com possibilidade de criação de outras e
sete cidades para a constituição da nova diocese. Como a região sertaneja é
pobre, seria difícil oferecer as doações para o novo bispado. A cidade de Januária
13
Carta de Dom Joaquim ao Núncio Apostólico Dom Giulio Tonti aos 21 de novembro de 1903, in ASV,
Nunziatura Apostólica in Brasile, (1903) fasc. 495, 39-41: «Quando visitei o valle de São Francisco,
indo quasi até a divisa com o Arcebispado da Bahia tocaram-me lá na creação d’um Bispado, composto
de parte da Diocese de Diamantina, de parte do Arcebispado da Bahia e de parte de Goyaz».
184
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SILVA, Franscino Oliveira
possuía a estrutura necessária para ser sede do bispado. Até essa época, Dom
Joaquim, quando fala a respeito da nova diocese, sempre se refere à cidade de
Januária14 .
14
Distância da capital de Minas Gerais, em linha direta: Januária 490 Km, Montes Claros 352 Km (Cf.
SECRETARIA DA AGRICULTRA, Annuario Estatistico (Situação physica), I, Belo Horizonte 1924, 65). Quanto
à população, no recenseamento de 1900, o município de Januária contava com 30.468 habitantes e o
de Montes Claros com 54.356 habitantes (Cf. SECRETARIA DA AGRICULTURA, Annuario Estatistico (Situação
demografica), II, Belo Horizonte 1925, 54).
185
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É certo que a partir de 1908 foi formada uma comissão para a criação do bispado de
Montes Claros. Era composta dos seguintes membros: Dr. João José Alves, Antônio
Narciso Soares, Sílvio Teixeira de Carvalho, Joaquim José da Costa, Celestino Soares
da Cruz, Antônio dos Anjos, José Antônio Pereira e Antônio Augusto Spyer
(Nunziatura Apostólica in Brasile, 1911, fasc. 611, p. 18-19). Esses homens tinham
prestígio político na cidade de Montes Claros. Aos 5 de março de 1909, membros da
comissão escreveram ao bispo de Diamantina para comunicar-lhe que haviam
começado a arrecadar as quantias prometidas, e que verificaram logo a impossibilidade
da arrecadação integral, já que, naquela época uma seca tremenda tinha assolado a
região, impossibilitando as pessoas de satisfazerem o compromisso.
E afirmam nessa carta: «Já temos fome e, dentro em breve, com a imigração
baiana que começa, vamos presenciar horrores, se Deus, pela sua infinita
misericórdia, não se compadecer de nós» (Nunziatura in Brasile, 1909, fasc. 611,
p. 18-19). Enfim, a comissão apresenta as desculpas e eles deixam claro que não
podem realizar em dinheiro a importância do patrimônio.
Dom Joaquim respondeu à carta e disse que esteve em Roma, e ali Dom Lúcio
havia recebido um telegrama de Montes Claros, afirmando que eles tinham
arranjado o patrimônio. O telegrama já estava com o núncio, mas mesmo assim
iria escrever-lhe, pedindo que ele esperasse um pouco. O bispo encorajou os
membros da comissão e observou que a quantia exigida era pequena em
comparação com aquelas que eram exigidas em São Paulo. Ele pediu que as
subcomissões constituídas nos povoados continuassem o trabalho começado
(Nunziatura Apostólica in Brasile, 1909, fasc. 611, p. 20-21). Na mesma data
enviou uma carta aos cônegos premonstratenses. Nesta carta aparece uma
contribuição importante para os estudos da criação da diocese de Montes Claros.
O desinteresse por parte dos cônegos é conhecido pelo bispo. Dom Joaquim escreve
que eles devem ter interesse pela criação do bispado, pois muito lucrarão com
este melhoramento. Ele exorta aos premonstratenses que
186
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SILVA, Franscino Oliveira
Reconhecendo que não podia contar com a quantia exigida, aos 19 de outubro de
1909, Dom Joaquim escreveu ao núncio, pedindo-lhe que tratasse da criação da
diocese, ainda que não pudesse contar com o patrimônio de 25 contos de réis.
Explicou que o Norte de Minas é pobre e, além disto, a vontade dos fiéis era
pouca, ele desabafa com o núncio ao dizer que a criação se tornara uma «urgente
necessidade», pois era dificílimo a um bispo servir tão extensa zona.
Na mesma carta Dom Joaquim tocou no assunto do possível bispo para a nova
diocese, sugerindo que fosse um padre religioso ou Dom João Pimenta:
Si houver padre de Comunidade Religiosa que possa ser nomeado para a nova
diocese, então a sua comunidade ajudará, como tem acontecido com os Padres
Lazaristas assumptos ao episcopado. Si não, parece que o D. Pimenta (Rio
Grande do Sul) aceitaria, caso, saindo eu, elle não me venha substituir
(Nunziatura Apostólica in Brasile, 1909, fasc. 611, p. 30).
No ano seguinte, aos 21 de julho, numa carta escrita ao núncio, Dom Joaquim
narra uma de suas viagens pastorais a uma zona que iria pertencer ao bispado de
Montes Claros. Naquela época, devido à grande seca no sertão baiano, muitos
deles migrantes chegavam a Minas. Muitos deles, segundo Dom Joaquim, vinham
ceivados de idéias protestantes ou já protestantes formados em Canavieiras-BA.
Somente no distrito de Vigia já habitavam mais de 10 famílias protestantes. Dom
Joaquim se mostrou também muito preocupado, pois um deputado maçom havia
feito uma circular, distribuiu-a reservadamente na região de Montes Claros,
convidando os seus companheiros a fundarem casas ou lojas da seita, para
«combater o clericalismo que haveria de propagar o romanismo pela
fundação do Bispado do Norte» (Nunziatura Apostólica in Brasile, 1911, fasc.
611, p. 52-53). Deste modo, deixou clara a urgência da fundação do bispado para
o bem da Igreja. Ainda nesta carta, Dom Joaquim fez saber ao núncio que um
cônego havia comunicado que tal criação estava longe de tornar-se realidade, e
quando isso viesse acontecer, os cônegos queriam estar longe de Montes Claros.
Em toda a correspondência mantida com o núncio, o bispo de Diamantina insiste
para que a nova diocese seja criada.
No dia 10 de dezembro de 1910, o Papa Pio X com a Bula Postulat Sane criou a
diocese de Montes Claros que compreende toda a parte do Extremo Norte de Minas,
limitando-se ao norte com o arcebispado da Bahia, pelas divisas do Estado de Minas
Gerais com o da Bahia, isto é: Pelo rio Carinhanha desde de sua nascente até sua
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foz no São Francisco; pelo São Francisco acima até a barra do Rio Verde Grande;
pelo Rio Verde Grande até a barra do Rio Verde Pequeno; pelo Rio Verde Pequeno
até sua cabeceira na serra das Almas; daí, por quatro linhas retas: a 1a. ao Morro do
Condiuba15 ; a 2a. do Morro do Condiuba ao Vale Fundo; a 3a. do Vale Fundo à barra
do Mosquito, no Rio Pardo; a 4a., finalmente da barra do Mosquito à cachoeira do
Salto Grande no Jequitinhonha, ou com mais exatidão, ao Poço do Italiano, na parte
inferior da cachoeira. Ao sul com o bispado de Diamantina (do qual foi em grande
parte desmembrada): pelo Jequitinhonha, a partir do Salto Grande, até a confluência
do ribeirão de Macaúbas, pouco acima do arraial de Terra Branca; daí pelo Macaúbas,
por montes interpostos, e pelo Jequitinhonha até a sua barra no São Francisco. Ao
oeste com o bispado de Goiás: pelas divisas do Estado de Minas Gerais com o de
Goiás, isto é, pelas serras das Arrependidas e de Santa Maria e a sudoeste com o
bispado de Uberaba: Pelo São Francisco, a partir da barra do Jequitaí até a barra do
Urucuia; daí, pelo Urucuia acima até a barra do Rio Claro; por este acima até as
divisas do distrito do Formoso, que ficou pertencendo à diocese de Uberaba.
O primeiro bispo de Montes Claros, D. João Antônio Pimenta, teve logo o interesse
e conhecimento da formação de todas essas paróquias. No ano de 1915, D. João
Pimenta escreveu sobre a realidade territorial da diocese. O resultado de seu trabalho
foi oferecido ao escritor Urbino de Souza Vianna para ser publicado em uma obra
que ele estava elaborando, e publicou sob o título «Monographia do município de
Montes Claros». Ele o fez, porém, com a condição que o escritor, publicando-o no
seu livro, declarasse em nota tê-lo obtido da Secretaria Eclesiástica Diocesana como
15
Morro do Condiuba, a 20 Km mais ou menos da cidade do Condiuba, antigo Santo Antônio da Barra,
Estado da Bahia. Condiuba corresponde a Caranda-yba, a palmeira copernica cerífera (Cf. «Condiuba»,
in Anuário de Minas, ano II, Belo Horizonte 1907, 340).
16
Num estudo realizado sobre algumas paróquias do século XIX, Anna Amélia Vieira Nascimento ressalta
o relevante papel social das freguesias em geral: «Constituía-se a freguesia no centro de muitos
diferentes aspectos. Era, em primeiro lugar, o núcleo de atividades religiosas, naturais à sua própria
concepção, dirigidas pelos párocos, tanto dentro da Igreja como nas suas dependências, espalhando-se
essas funções religiosas pelas ruas através de procissões, dos viáticos, das extrema-unções, das visitas de
santos às casas particulares. Funções políticas eram também inerentes às freguesias, pois nos seus
consistórios reuniam-se as comissões a fim de compor ou rever as listas de qualificação temporal. As
próprias eleições primárias se realizavam na Igreja […]» (A. A. V. N ASCIMENTO, Dez Freguesias da
Cidade do Salvador: aspectos sociais e urbanos do século XIX, Salvador 1986, 29-30).
188
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SILVA, Franscino Oliveira
subsídio para a parte de sua obra relativa ao Bispado. D. João lamentou que «o Sr.
Urbino, aproveitando-se do trabalho, esqueceu-se da nota promettida». Sendo assim,
o bispo mesmo transcreveu seu trabalho no livro do tombo que segundo ele, «está
publicado verbo ad verbum na «Monographia» de Urbino Vianna, de fls. 260 a 277,
com exceção das referências aos vigários e pequenas modificações necessárias
para que este perdesse as feições próprias e pudesse figurar na obra como parte de
um todo harmonico» (Livro de Tombo I, p. 4-5).
17
Essa classificação foi feita pelo primeiro bispo de Montes Claros quando teve que exigir a contribuição
de cada paróquia num período de maiores dificuldades financeiras do bispado (Cf. M. M. GASPAR, O
Bispado de Montes Claros, 23-24).
189
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18
Entre aqueles que não chegaram ao sacerdócio, muitos se tornaram notórios em várias atividades:
Medicina, Engenharia, Farmácia, Política, Comércio, etc. Entre eles um Governador do Estado de Minas
Gerais e Presidente da República (1956-1961): Juscelino Kubitschek de Oliveira (Cf. P. K. C. MOURÃO, O
Seminário de Diamantina de 1867 a 1930, 27-32). Muitos ex-alunos manifestaram através de escritos
sobre a experiência que fizeram no Seminário de Diamantina. No ano de 2003, como parte da comemoração
do sesquicentenário da criação da diocese de Diamantina, foi publicado um livro do Mons. Otacílio
Augusto de Sena Queiroz. Ele nasceu em 1918 e entrou para o Seminário em 1938. Neste livro ele relata
como era a vida no Seminário de Diamantina. Nos escritos dos ex-alunos, é sempre possível constatar um
reconhecimento pela boa formação dada pelos padres lazaristas: «Para nós, o Seminário era um mundo
completo, independente, auto-suficiente. O Mundo exterior nós o considerávamos como errado,
desorientado, objeto de irrisão, e, pior, sedutor. Comprazíamo-nos, talvez com excesso, em «nossa
formação». A fama do Seminário de Diamantina e do Caraça, parece, reforçava esta mentalidade. Ensino
era o nosso (Cf. O. A. S. QUEIRÓZ, Um padre, sua gente, sua terra, Belo Horizonte 2003, 294).
190
História e Memória: As origens da diocese de Montes Claros...
SILVA, Franscino Oliveira
Inicialmente ele foi vigário em Capelinha (1883-1896). No ano de 1892 ele mudou
para Água Boa, pertencente à Capelinha a fim de construir uma Igreja. Em 1897,
foi transferido para a paróquia de Piedade e em 1899 foi ocupar a importante
paróquia de Teófilo Ottoni. Em 1905, foi escolhido para coadjutor sucessor de
Dom Cláudio Gonçalves Ponce de Leão19 , bispo do Rio Grande do Sul, tendo sido
preconizado bispo titular da Pentacômia (na Ásia Menor) a 21 de fevereiro de
1906. O programa dos bispos em geral é um só, mas cada um procura determinar
seu modo de agir, mais em particular por meio de sua divisa episcopal
19
Nasceu em Salvador no ano de 1841. Filho de um rico e aristocrático desembargador, esteve matriculado
na Escola Politécnica em Paris antes de iniciar seu noviciado lazarista no Seminário de São Sulpício.
Foi bispo de Goiás nove anos (1881-1890) e vinte e dois anos de Porto Alegre (1890-1912), sendo seu
primeiro arcebispo, resignou ao cargo por idade avançada (71 anos) e estado de saúde (Cf. N. SOUZA,
«Uma Fisionomia do Episcopado Brasileiro», in PONTIFICIA COMMISSIO PRO AMERICA LATINA, Os últimos cem
anos da evangelização na América Latina, 639).
191
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e do seu escudo de armas. A divisa escolhida por D. João foi Sub umbra alarum
tuarum20 . Dessa maneira queria marcar seu episcopado por um acolhimento ao
povo, marcado pelo amor, pela defesa e proteção como faz a galinha com seus
pintinhos contra possíveis inimigos (Mt 23, 37). Ele foi ordenado bispo em Barreiras
a 20 de maio de 1906, por D. Joaquim Silvério de Souza e no dia 8 de setembro do
mesmo ano fez a sua entrada em Porto Alegre. Ali ele permaneceu até a sua
partida para Montes Claros.
20
Essas palavras, em latim, encontram-se literalmente no salmo 16, 8b (Cf. Bibliorum Sacrorum iuxta
vulgatam clementinam nova editio, Cittá del Vaticano 1951, 476). Mais tarde, no centenário do
nascimento de D. João Antônio Pimenta, em 1959, as palavras sub umbra alarum tuarum tornaram-
se a divisa do Brasão de Armas do município de Montes Claros, oficializado pela Lei n. 430, de 25 de
março de 1959.
21
Porto Alegre na época de Dom João se comparada com Montes Claros já era uma cidade muito
desenvolvida; Desde de 1866 já tinha o fornecimento de água encanada. Em 1874 a iluminação pública
a gás. Em 1880 iniciou-se o sistema de esgotos. Possuía Mercado Municipal, Teatro, etc. No início do
século XX, Porto Alegre já contava com vários estabelecimentos de ensino como a Faculdade de
Engenharia (1896), o Instituto Astronômico (1906-1908), a Faculdade de Direito (1908-1909), o
Instituto Eletro-Técnico (1908-1909), a Escola Técnica-Profissional (1907-1908) e outros. O tempo
de D. João era marcado por uma modernização que ia recebendo novos estímulos (Cf. A. W. DOBERSTEIN,
Estatuários, Catolicismo e Gauchismo, Porto Alegre 2002, 38-40).
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latina, mas desconhecia a língua alemã. Algumas cidades como Caxias, Santa
Cruz, São Leopoldo e Novo Hamburgo eram de colonização ítalo-germânica22 .
Um outro motivo que pode ter confirmado a vontade de D. João de ser transferido
de Porto Alegre foi porque D. Cláudio conseguiu da Santa Sé a divisão eclesiástica
da diocese de São Pedro do Rio Grande do Sul, com a sede de uma Arcebispado
em Porto Alegre. O Papa Pio X, pelo decreto de 15 de agosto de 1910, dividiu o
Rio Grande do Sul em quatro circunscrições, nomeando D. Cláudio José primeiro
Arcebispo da Arquidiocese de Porto Alegre e criando mais os bispados de Pelotas,
Uruguaiana e Santa Maria, as quais com a diocese de Florianópolis no Estado de
Santa Catarina criada em 19 de março de 1908, passaram a formar a nova Província
Eclesiástica de Porto Alegre. Sem muitas explicações, D. João preferiu fazer seu
pedido de transferência para Montes Claros, «sob alegação e fundamento de
dificuldade de aclimação no Rio Grande do Sul por causa de sua baixa temperatura
no inverno» (PIMENTA, 1928). Após a sua nomeação para Montes Claros em 7
de março de 1911, ele escreveu, no dia 25 de maio de 1911, a sua primeira Carta
Pastoral saudando os seus diocesanos. Nesta carta pastoral, ele narra a sua trajetória
em busca da realização da vontade de Deus. Sua permanência em Porto Alegre
lhe havia permitido uma experiência positiva nos inícios de seu episcopado. Quando
chega o tempo de assumir a nova missão, ele se manifesta muito pesaroso, porém,
é conhecido que, desde os primeiros passos para a criação da Diocese de Montes
Claros, ele já havia manifestado ao bispo de Diamantina o seu desejo de ser
nomeado para a nova diocese, como já foi dito anteriormente, desde que não
houvesse o perigo de vir a substituí-lo em Diamantina, caso fosse necessário.
22
Existia uma acusação desde o início da imigração em 1824 repetida contra os alemães e descendentes,
que era a não-integração, tomada como antipatriotismo e anticidadania (Cf. A. W. D OBERSTEIN ,
Estatuários, Catolicismo e Gauchismo, 117).
193
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Considerações finais
Esta pesquisa esclareceu que a diocese de Montes Claros foi criada numa situação
de precariedade. Era difícil levantar um patrimônio que permitisse o funcionamento
de uma nova diocese no extremo Norte de Minas. Coube ao bispo de Diamantina
uma atuação constante e insistente em prol da criação dessa diocese. Dom Joaquim
não escondia a sua simpatia pela cidade de Januária como sede para a nova
diocese, entretanto foi Montes Claros o lugar em que tal sonho se transformou em
realidade. A historiografia montes-clarense atribui aos cônegos premonstratenses
a maior parte do esforço para a criação da Diocese de Montes Claros, os
documentos, porém, desabonam essa afirmação historiográfica. De fato, os
documentos existentes no Arquivo Vaticano comprovam que foi necessária uma
advertência do bispo de Diamantina aos padres belgas para que eles se envolvessem
mais seriamente com o processo de criação dessa Diocese.
Para sediar a nova diocese, a cidade de Montes Claros foi escolhida porque,
desde o século XIX, já era apreciada pela sua posição geográfica que lhe dava o
caráter de porta do sertão no extremo Norte de Minas. Com o tempo, torna-se
comum apresentá-la como capital do Norte de Minas, pela sua posição geográfica,
pelo seu progresso, pela sua vida. Tudo isso devido à sua vitalidade na sociedade,
no comércio. Ao decidir-se pela cidade de Montes Claros como sede da diocese,
o bispo de Diamantina desejou transformá-la também numa capital religiosa, a fim
de que a vitalidade religiosa pudesse abranger toda a região norte-mineira. Além
de sua privilegiada posição geográfica, a cidade contava com a presença dos
religiosos belgas e a Igreja do Brasil esperava deles uma colaboração espiritual e
material significativa, para a organização interna da Igreja.
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SILVA, Franscino Oliveira
REFERÊNCIAS
BARBOSA, Manoel. A Igreja no Brasil: Notas para a sua história. Rio de Janeiro:
1945.
PAULA, Hermes A. Montes Claros – sua história, sua gente, seus costumes, 3
volumes. Montes Claros: 1979.
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MARC BLOCH E LUCIEN FEBVRE: REVISITANDO
A PRIMEIRA GERAÇÃO DOS ANNALES
* Professor-Adjunto da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, nos cursos de Graduação e Pós-
Graduação em História. Professor-Colaborador do Programa de Pós-Graduação em História Compara-
da da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Doutor em História pela Universidade Federal Fluminense.
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Marc Bloch (1886-1944) e Lucien Febvre (1878-1956) são os dois grandes funda-
dores da escola dos Annales; Fernando Braudel (1902-1985), o grande arquiteto
que consolida o movimento e que o estrutura como uma instituição definitiva, na
geração seguinte. Inúmeros outros personagens, aos quais voltaremos oportuna-
mente, fazem parte desta história que atravessa todo o século passado, uma vez
que a herança dos Annales foi posteriormente reivindicada por historiadores fran-
ceses que deram continuidade ao projeto de publicação da célebre Revista dos
Annales, que foi desde 1929 o grande meio e instrumento de divulgação do grupo,
existindo até os dias de hoje. Nomes como o de Pierre Chaunu, Georges Duby,
Jacques Le Goff, Jacques Revel, Le Roy Ladurie, Marc Ferro, Philippe Ariès e
Michel Vovelle indicam apenas algumas das várias figuras historiográficas que
são associadas à herança de Bloch, Febvre, Braudel e Ernst Labrousse, embora
também abundem as análises que se empenham em mostrar que este novo grupo
de historiadores franceses – que assumiu desde os anos 1970 o epíteto de Nouvelle
Histoire – mais estaria em relação de ruptura com os projetos iniciais dos primei-
ros Annales, do que em continuidade com os mesmos1 .
1
A mais conhecida destas análises é a apresentada em História em Migalhas, de François Dosse (1987).
O modelo contrário, da continuidade entre os Annales e a Nouvelle Histoire, está representado pela
obra Escola dos Annales (1990) de Peter Burke.
198
Marc Bloch e Lucien Febvre: revisitando...
BARROS, José D’Assunção
Com relação a Bloch e a Febvre, suas relações em vida foram permeadas por
ambigüidades: eles passaram à história da historiografia com a imagem de dois
espíritos unidos por um inabalável objetivo comum, mas as relações pessoais entre
os dois nem sempre foram tão fraternas como as que aparecem em algumas
sínteses sobre o movimento, particularmente as que assumem o ponto de vista do
‘mito fundador’ construído por alguns dos próprios historiadores dos Annales e da
Nouvelle Histoire. De todo modo, Marc Bloch e Lucien Febvre foram compa-
nheiros no grande projeto que encaminharam juntos: a consolidação de um novo
grupo historiográfico, e de uma nova contribuição para a historiografia europeia.
Após a morte prematura de Marc Bloch nas mãos de nazistas, em 1944, Lucien
Febvre publicou um generoso memorial sobre o companheiro de projetos
historiográficos (FEBVRE, 1953, p.391-407).
Outro ponto capital no conjunto de estratégias e de gestos que foram bem sucedi-
dos em consolidar os Annales como movimento historiográfico renovador – além
do “programa” que definiu um certo modelo de historiografia – foi a constituição
de um meio eficaz para difusão das idéias do grupo. Um meio de divulgação é
2
Em uma resenha sobre o recém publicado livro A Sociedade Feudal, de Marc Bloch (1939-40), Febvre
insere, ao lado de elogios mais superficiais à obra, uma crítica bastante reveladora sobre a “ausência do
indivíduo” (do ser humano específico) na obra de Bloch, dando a entender que o seu parceiro no
programa historiográfico dos Annales recaíra em um “sociologismo abstrato”. Sobre isto, ver
DUMOULIN, 2000, p.16.
199
REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
Desde 1929, a publicação dos Annales jamais foi interrompida. / Nem um ano
sequer, quaisquer que fossem as dificuldades que se abatiam sobre a França e
o mundo, os Annales renunciaram a sua dupla tarefa científica e educacional.
/ Os Annales continuam. Num clima novo, com fórmulas novas. E com um
novo título. [...]. [FEBVRE, Contra o Vento: Manifesto dos Novos Annales,
1946]
200
Marc Bloch e Lucien Febvre: revisitando...
BARROS, José D’Assunção
Uma segunda instituição, que complementará a École des Hautes Études foi a
Maison des Sciences de l’homme (1962). Com estas duas instituições, controla-
das pelos historiadores dos Annales, as bases materiais e institucionais do grupo
estavam lançadas. Havia uma Revista e instituições concretas que poderiam as-
segurar os objetivos tanto de difusão de idéias como de formação de novos qua-
dros de historiadores; havia ainda um sistema annalista de ensino que faria dos
Annales uma escola, no sentido mais estrito do termo, e cargos institucionais que
agora passavam a se afirmar como oportunidades de poder. O movimento dos
Annales – ou a “Escola dos Annales”, conforme a designação mais utilizada –
tornar-se-ia, com o tempo, um dos símbolos maiores de toda uma nova historiografia,
a tal ponto que se costuma empregar também a designação “Nova História” ex-
tensivamente às duas primeiras gerações dos Annales, embora a expressão
Nouvelle Histoire tenha se tornado a marca registrada mais específica da gera-
ção de historiadores franceses que, a partir dos anos 1970, assume a direção da
mesma revista que havia sido fundada em 1929 por Febvre e Bloch.
Lucien Febvre e Marc Bloch, além de terem sido os grandes fundadores do movi-
mento dos Annales, foram também os nomes mais importantes da primeira fase
deste movimento, devendo ser também lembrada como outra contribuição impor-
tante a história quantitativa, que já começa a ser introduzida na década de 1930
por Ernst Labrousse. Neste artigo, pretendemos rever a especificidade da produ-
ção dos dois fundadores, procurando identificar as influências que participam da
formação de uma identidade teórica específica em cada um destes historiadores
franceses. Começaremos por lembrar que a atmosfera política que impulsiona
estes historiadores é a da passagem da Belle Époque ao período das duas Guer-
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Lucien Febvre (1878-1956) ocupa um lugar bastante singular na Escola dos Annales.
Sempre fora um autor aberto a influências bem diversas, que então conseguia
reverter de forma original à sua própria singularidade e estilo pessoal. Em seu
acorde historiográfico é possível entreouvir algumas destas influências, apreender
uma complexa e sofisticada rede inter-autoral que conecta Febvre tanto a autores
com os quais conviveu pessoalmente, como a pensadores e pesquisadores de
outras épocas que foram importantes na formação do seu pensamento e no seu
modo de ver a História e as demais ciências humanas. A nota de
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Marc Bloch e Lucien Febvre: revisitando...
BARROS, José D’Assunção
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Durante toda a sua vida, Febvre reconheceu sua dívida historiográfica para com
Michelet, e com relação a Marx, explicitou o reconhecimento de sua importância
algumas vezes. Se avançarmos um pouco na história da historiografia, para a
geração anterior à de Febvre, encontraremos um outro autor no qual Marx e
Michelet também estavam presentes. Trata-se do historiador socialista Jean Jaurès
(1859-1914). Conforme salientou Peter Burke em seu breve estudo sobre os
Annales (1991, p.25), Jaurès dizia-se, a um só tempo, “materialista como Marx e
místico como Michelet” (JAURÈS, 1901, p.65). É quase uma sensação de recu-
perar um elo perdido em uma árvore genealógica, ou de descobrir a nota musical
na qual se combinam duas outras, quando verificamos que Febvre foi leitor ávido
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Marc Bloch e Lucien Febvre: revisitando...
BARROS, José D’Assunção
O novo tratamento biográfico proposto por Febvre – não mais visando realizar a
história de uma vida ilustre por si mesma, mas sim utilizando a história de vida
como caminho para examinar um problema histórico bem definido – constitui inte-
ressante antecipação da tendência de tratamento biográfico que iria se afirmar
muito depois, nos anos 1980. Até a época dos primeiros Annales, a biografia fora
um gênero muito apreciado, sobretudo pelos historiadores do século XIX, notan-
do-se que passaria a ser bem menos percorrido pelos novos historiadores das seis
primeiras décadas do século XX, inclusive por influência de correntes comprome-
tidas com a renovação historiográfica, como a dos Annales. Vimos atrás que a
biografia tradicional coadunava bastante com a História Política tradicional (pois
os biografados não raramente eram figuras políticas importantes, como reis ou
generais), e que a história factual rondava em torno do mais habitual modelo de
tratamento biográfico – uma história linear na qual todos os fatos eram escolhidos
e reordenados para contar uma boa e coerente história, muitas vezes laudatória,
na qual o que interessava era conhecer a vida do biografado por ela mesma. A
decisão de percorrer esse território no qual tanto se compraziam os antigos histo-
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Por outro lado, Os Reis Taumaturgos (1924) constituiu uma experiência pioneira
que, de alguma maneira, pode ser relacionada a um novo campo que apenas se
desenvolveria a partir dos anos 1960: a História das Mentalidades (tanto Bloch
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Marc Bloch e Lucien Febvre: revisitando...
BARROS, José D’Assunção
A obra que nos interessará mais é aquela que revela as concepções teórico-
metodológicas de Bloch, suas relações historiográficas, seu diálogo com outros
campos de saber, suas opiniões sobre o ofício do historiador. Elaborada entre 1941
e 1942 – nas difíceis condições da clandestinidade impostas por sua luta contra a
ocupação nazista – a Apologia da História de Bloch seria sempre citada pelos
futuros historiadores ligados aos Annales, e por outros de correntes igualmente
renovadoras, como um dos grandes clássicos da Historiografia. A principal luta
desta obra é contra a historiografia estreita e superficial de diversos setores da
historiografia de sua época, contra os quais Bloch opunha uma historiografia si-
multaneamente mais ampla e profunda. “Ampla” por preconizar tal diversidade
de temas e de dimensões de estudo que fazia a História Política tradicional pare-
cer extremamente estreita, na sua limitação a apenas uma pequena fatia do polí-
tico (o poder relacionado às instituições e ao estado, os confrontos bélicos e alian-
ças, e a vida dos grandes políticos). “Profunda” por combater a superficialidade
da história factual, opondo-lhe a densidade e a profundidade que só pode ser
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3
Para uma síntese da proposta de Bloch – “história ampla, profunda, longa, aberta, comparativa”, e, por
fim “coletiva”, porque feita a muitas mãos – ver o prefácio de Le Goff para a edição de 1993 (BLOCH,
2001, p.26).
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Marc Bloch e Lucien Febvre: revisitando...
BARROS, José D’Assunção
mento cientificamente produzido, e Marc Bloch a definira como “ciência dos ho-
mens no tempo”. Os positivistas e historicistas poderiam discordar sobre que tipo
de ciência era a História – se uma ciência aparentada às ciências naturais, ou se
totalmente distinta, conformando uma espécie própria de ciência – mas poucos
questionariam, naquela época, que a História tinha uma dimensão científica. Marc
Bloch também não o fez. Reconhecer a cientificidade da História, contudo, não o
impediu de indagar se a História não teria também a sua parcela de arte e poesia:
Posto isto, a História para Marc Bloch será mesmo uma ciência – uma “ciência
em construção”, tal como já discutimos anteriormente (ver o capítulo sobre o
“Programa dos Annales”). Em Apologia da História, Marc Bloch se esmera em
definir o que seria essa ciência, qual seria a sua singularidade. Chega à definição,
que até hoje é a mais aceita, de que “a história é a ciência dos homens no tempo”.
Dos “homens”, e não do “Homem”, para evitar a ideia abstrata de homem, já que
o que a História busca é a vida, em sua agitação, em sua especificidade, em seu
entrelaçado de cultura, política, economia e mentalidade, mas sempre concretiza-
da em homens reais que viveram a história. Há outra frase da Apologia da Histó-
ria, que se tornou célebre, na qual Marc Bloch diz: “O historiador é como o ogro
da lenda; onde fareja carne humana, sabe que ali está a sua caça” (BLOCH,
2001, p.54). De igual maneira, “uma ciência do tempo” (“dos homens no tempo”),
e não uma “ciência do passado humano”.
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Bloch discute este tema sob o rótulo de “ídolo faz origens”. Fascinado por “com-
preender o mais próximo pelo mais distante”, mas às vezes presa fácil dos aspec-
tos mais simplórios deste fascínio, o historiador facilmente pode ser conduzido
pela ideia de que a origem tudo explica. A própria palavra “origem” parece reme-
ter à ideia de um “começo” que se explica; ou, com sentido ainda mais perigoso,
“um começo que tudo explica”. O ídolo das origens é o canto de sereia para os
historiadores que se deixam naufragar na sua viagem de busca pelo acontecimen-
to primordial. Mas, “de onde fazer partir o Cristianismo? Da atmosfera sentimen-
tal em que se elaboraram, no mundo mediterrânico ou iraniano, as religiões da
salvação? De Jesus? De Paulo? Ou das gerações que vieram se fixar nas linhas
essenciais do dogma?” (BLOCH, 2001, p.56). Perigo maior, contudo, a sereia das
sereias, é quando essa busca é contaminada pelo traiçoeiro canto das “causas e
efeitos”. O extremo perigo, abismo que tem tragado frotas de historiadores, é o
tratamento linear e teleológico da dinâmica de causa-efeito, que produz a ilusão de
que a história é uma só via, e de mão única. Esta escolha de um ponto no passado
para servir de origem a uma linha reta que vai dar em outro ponto mais à frente (o
acontecimento que se quer explicar, ou mesmo o nosso próprio presente), confor-
mando uma explicação que exclui as outras possíveis, e configurando uma história
que elimina todas as outras que poderiam ter sido traçadas a partir de outros
começos e elaboradas conforme itinerários distintos, constitui a prática que depois
seria denominada “retrodição”..
Para além dos elementos teóricos, que nos interessaram até aqui, é preciso dizer
que Apologia da História discute com especial interesse questões metodológicas,
como a ‘mediação’ do conhecimento historiográfico ou a natureza das fontes his-
tóricas, tratadas por Marc Bloch sob o signo de “vestígios”, o que já o aproxima de
uma abordagem mais moderna do documento histórico (BLOCH, 2001, p.73).
Aspectos discutidos na Apologia, como a necessidade de buscar também os ‘tes-
temunhos involuntários’, para além da documentação ou dos aspectos de um dis-
curso que revelam a intencionalidade (p.72), ou ainda como a menção da possibi-
lidade de consulta aos “relatos de testemunhas” (p.74), prenunciando vagamente
o que muito mais tarde constituiria a modalidade da História Oral, fazem deste
livro um dos registros mais expressivos sobre a abertura metodológica proposta
pelos Annales. A preocupação de Marc Bloch com a temática da Memória, aliás,
empresta ao seu livro mais um dos seus tons de pioneirismo, o que não o impede
de recomendar a necessária cautela que devem ter os historiadores que lidarão
com as reconstituições que se valem da memória (tanto as que encontraram seu
registro a partir de depoimentos colhidos através do historiador, como aquelas que,
registradas no interior de documentos, chegam aos historiadores já recolhidas por
outros ou prestadas espontaneamente). Posto isto, a grande questão que nos colo-
ca Marc Bloch é a da percepção do “voluntário” e do “não-voluntário” no univer-
so das fontes históricas (a riqueza de suas considerações residem, aliás, em dar a
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Marc Bloch e Lucien Febvre: revisitando...
BARROS, José D’Assunção
Quando, com efeito, lemos, para nos informar, Heródoto ou Froissart, as me-
mórias do marechal Joffre ou as notícias, aliás completamente contraditórias,
dadas pelos jornais alemães e britânicos, sobre o ataque a um comboio no
Mediterrâneo, o que fazemos senão nos conformar exatamente ao que os
autores destes escritos esperavam de nós? Ao contrário, as fórmulas dos
pairos dos mortos eram destinadas a serem recitadas apenas pela alma em
perigo e ouvidas tão somente pelos deuses; o homem das palafitas que, no
lago vizinho onde o arqueólogo os remexe atualmente, jogava fora os dejetos
de sua cozinha, queria apenas poupar sujeira à sua cabana; a bula de isenção
pontifical só era tão precavidamente preservada nos cofres do mosteiro a fim
de ser, chegado o momento, brandida aos olhos de um bispo importuno (BLOCH,
2001, p.24-25).
Os testemunhos não-voluntários também são descritos por Marc Bloch nos ter-
mos de “testemunhos à revelia” (2001, p.77). A maestria do historiador francês,
contudo, está em dar a perceber que há uma dimensão de testemunho não-volun-
tário que pode ser igualmente apreendida nos documentos que foram motivados
por certa intencionalidade. Sito de outra forma, o documento que pertence à cate-
goria dos gêneros de testemunhos voluntários, também traz a sua margem do
involuntário, da informação que escapa sem que o seu enunciador se dê conta, ou
mesmo sem que o próprio enunciador do discurso tenha qualquer consciência
maior de que ela está ali. Uma hagiografia, por mais que tenha sido construída em
torno da fantasia dos milagres e do cuidadoso ato de esculpir uma personalidade
destinada a servir de exempla, ao mesmo tempo em que formatada para atender
aos interesses de uma das muitas ordens da Igreja medieval, possui um registro
involuntário que escapa das entrelinhas do que o hagiógrafo se propôs a dizer. Há
uma cultura material que a informa, modos de pensar e de sentir que a atraves-
sam, informações que o autor do texto não pensava trazer, ou nem sabia que
estava trazendo, e que constituem esta sombra de involuntário que sempre termi-
na por impregnar qualquer testemunho voluntário:
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REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
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santos da Ala Idade Média, pelo menos três quartos são incapazes de nos
ensinar qualquer coisa de concreto sobre os piedosos personagens cujo des-
tino pretendem nos retraçar. Interroguemo-las, ao contrário, sobre as maneiras
de viver ou de pensar particulares às épocas em que foram escritas, todas as
coisas que o hagiógrafo não tinha o menor desejo de nos expor (BLOCH, 2001,
p.78).
Concluiremos frisando mais uma vez o ambiente teórico que se estabelece a partir
da produção historiográfica de Marc Bloch. No que concerne às conexões
paradigmáticas deste historiador francês, através da Apologia da História e de
suas outras obras podemos perceber interações bastante ambíguas com relação
aos paradigmas Positivista e Historicista, para não mencionar o Materialismo His-
tórico. Já mostramos anteriormente que, do Positivismo, Marc Bloch havia se
apropriado bem claramente de alguns conceitos durkheimianos – como os de “re-
presentações coletivas” e de “coesão social” (Sociedade Feudal, 1939). Ao mesmo
tempo, tal como também já foi discutido, o historiador francês dirige uma respeito-
sa crítica à escola durkheimiana em diversas passagens da Apologia da História
(2001, p.47, p.51) – e isto ao lado de sua incontornável luta nos quadros de uma
disputa territorial que visava combater o projeto durkheimiano de secundarização
da História. Por outro lado, com relação à antiga sugestão de ‘imutabilidade da
natureza humana’, presente em certo número de filósofos iluministas e, depois,
em outro tanto de sociólogos positivistas, a posição de Marc Bloch mostra-se
oscilante e ambígua, situando-se entre a ideia da existência de um “fundo perma-
nente” da experiência humana e, no pólo oposto, a tendência Historicista a colo-
car em relevo a radical mutabilidade do homem nas diversas sociedades. Em um
aspecto, por outro lado, a herança historicista é bastante clara: a ideia de que o
historiador deve se aproximar da alteridade histórica através do gesto de “com-
preender” (BLOCH, 2001, p.128). Marc Bloch, enfim, soube lidar com as
dissonâncias de seu tempo em seu acorde historiográfico. Não foi um pensador
vinculado diretamente a nenhum paradigma teórico, mas sim um historiador asso-
ciado a uma escola que não propõe, em seu programa, nenhuma associação teó-
rica mais específica, deixando as escolhas teóricas a cargo dos seus membros.
214
Marc Bloch e Lucien Febvre: revisitando...
BARROS, José D’Assunção
Marc Bloch exerceu essa liberdade de maneira criativa, produzindo a sua própria
coerência teórica.
Referências
BURKE, P. A Escola dos Annales. São Paulo: UNESP, 1991 [original: 1990].
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CAIAPÓS, ARAXÁS, BOROROS, GERALISTAS...
CONFLITOS REVELADOS, IDENTIDADES E
MEMÓRIAS CONSTRUÍDAS NO SERTÃO DA
FARINHA PODRE NOS SÉCULOS XVIII E XIX
Abstract: This article intends to discuss/analyze the contact relations among Indians
and between Indians and geralistas (natives or inhabitants of Minas Gerais),
undertaken at Sertão da Farinha Podre, current regions of the Triângulo Mineiro
and Alto Paranaiba, during XVIII and XIX centuries. For such purpose, besides
broaching the existing historiographical production, as regards this matter, it is
*
Doutora em História pela PUC/ SP, atualmente é Professora Adjunta do Departamento de História da
Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM – Uberaba – MG.
**
Graduando em História – Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM – Uberaba – MG.
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Caiapós, Araxás, Bororos, Geralistas...
LIMA, Glaura Teixeira Nogueira; MORI, Lima, Robert
Como este trabalho objetiva promover o estudo e a análise dos povos indígenas
que residiam nas atuais regiões do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, podemos
afirmar que os Caiapós que habitavam esta região possuíam como seus inimigos,
localizados a leste, apenas os Araxás, população indígena que será tratada poste-
riormente. Além de possuírem como território uma vasta área do Brasil central,
eram também a população predominante do Sertão da Farinha Podre.
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REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
Por outro lado, com a intensificação dos ataques não apenas ao longo da Estrada
dos Goiases, mas também aos arraiais e fazendas, e, por consequência, colocando
em risco a arrecadação do quinto e a execução da atividade mineradora, os Caiapós
foram vistos pelas autoridades coloniais como um “problema”.
Um ano depois, em 1911, nesta mesma região, na confluência dos rios Grande e
Paranaíba, no pontal do Triângulo Mineiro, Alexandre de Souza Barbosa, morador
220
Caiapós, Araxás, Bororos, Geralistas...
LIMA, Glaura Teixeira Nogueira; MORI, Lima, Robert
Note que Saint Hilaire, francês, afirma que ouviu no aldeamento de Mossâmedes
que os Caiapós se autodenominavam “panariá”, termo muito próximo do termo
“panará” descrito por Alexandre Barbosa.
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REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
contato com uma população indígena isolada, conhecida pelos seus inimigos, os
txucarramães, como kreen akarore (kran iakarare, que significa “cabeça cortada
redonda”) uma referência ao corte de cabelo utilizada por estes índios (ARNT et
al., 1998).
Constitui-se uma frente de atração encabeçada pelos irmãos Villas Boas, Cláudio
e Orlando que, após seis anos de tentativas, enfim, realizaram o primeiro contato
com estes índios isolados (DAVIS, 1978). O local deste encontro foram as mar-
gens do rio Peixoto de Azevedo, na região norte de Mato Grosso (GIRALDIN,
1997). Conhecidos como kreen akarore, eles se autodenominavam Panará.
Este contato com os Panarás levou o grupo a uma queda populacional muito drás-
tica, motivada principalmente por doenças contra as quais os índios não possuíam
defesa imunológica. A população que, anteriormente ao contato, estava compre-
endida entre 300 e 600 índios, dois anos depois, em 1975, contavam com apenas
79 sobreviventes que, por sua vez, foram transferidos para o Parque Indígena do
Xingu (ARNT et al., 1998).
Nestes breves relatos ocorridos nos séculos XIX e XX, pudemos perceber que
tanto os Caiapós como os kreen akarore possuíam uma maneira própria de se
autodenominarem: Panará. Portanto Caiapó e Panará são o mesmo povo? Vere-
mos a seguir algumas considerações acerca deste assunto.
222
Caiapós, Araxás, Bororos, Geralistas...
LIMA, Glaura Teixeira Nogueira; MORI, Lima, Robert
Segundo a tradição oral dos índios Panarás, seus antepassados vieram do leste, de
uma área de campo aberto (como vimos, os Caiapós habitavam o sistema
biogeográfico do cerrado, constituído por vegetação de pequeno porte com galhos
retorcidos e folhas grossas) e seus inimigos eram os “brancos”, que também se
encontravam no leste e possuíam armas de fogo (ARNT et al., 1998).
Uma destas cerimônias praticadas pelos Panarás era o nôpeyn, “que consistia na
escarificação com dente de paca de regiões do tórax e das costas, após expedi-
ções guerreiras, objetivando transmitir aos jovens a força e a bravura dos inimi-
gos” (ARNT et al., 1998, p. 2). Portanto, a prática da guerra na sociedade Caiapó/
Panará possuía/possui um valor muito importante.
Podemos afirmar que estas investidas dos Caiapós não foram motivadas apenas
porque “defendiam seu território” confome aponta Ataídes (ATAÍDES, 1998, p.
23). A formação da identidade panará, o desencadeamento de rituais, a apropria-
ção de bens dos inimigos e a vingança, assim como não podemos negligenciar a
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REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
defesa do seu território, são os motivos que promoviam a realização destes ata-
ques a outros povos indígenas ou aos primeiros colonizadores do Brasil central.
O êxito das incursões guerreiras dos Caiapós ocorria por diferentes motivos. Pri-
meiramente, conheciam muito bem o ambiente onde viviam há séculos, ou seja, o
cerrado e as matas que o compõem. Outro fator importante era seu aparato béli-
co, relativamente simples, inferior aos dos colonizadores “brancos”, porém bas-
tante funcional. Como exemplo, podemos citar o viajante Johann Emanuel Pohl,
que chamou a atenção para o tamanho do arco caiapó, com quase dois metros de
comprimento, assim como a destreza com que manejavam e acertavam o alvo,
mesmo a considerável distância (POHL, 1976).
Esta pressão da população teria como objetivo justificar as ações violentas e pro-
mover a guerra justa ofensiva ou a guerra justa defensiva. A primeira modalidade
“caracterizava-se por ser lícito atacar aldeias indígenas e somente poderia ser
realizada por ordem do Rei”. Já a segunda modalidade permitia o ataque a: “grupo
de guerreiros encontrados em atitude que caracterizasse um ataque iminente”.
Ou seja, proibia que as aldeias fossem atacadas. As autoridades coloniais utiliza-
ram destas duas modalidades para tentar conter os ataques e exterminar os Caiapós.
(GIRALDIN, 1997, p. 69).
Buscando uma ação mais efetiva no intuito de contê-los e/ou exterminá-los, Dom
Luís de Mascarenhas, em 1742, baixou um regimento que regulamentou “a ação
dos Capitães de Cavalos da conquista do Kayapó” (ATAÍDES, 1998, p. 24), cuja
função consistia em patrulhar regiões onde os índios estavam estabelecidos, buscan-
do contê-los ou exterminá-los. Fracassada esta tentativa, as autoridades coloniais
buscaram nos trabalhos empreendidos pelos sertanistas, meios mais efetivos de
combate aos Caiapós. Após constantes solicitações por parte do governador da
capitania de São Paulo, Dom Luis de Mascarenhas, finalmente em 1746 foi auto-
rizada as ações contra os Caiapós (LOURENÇO, 2005). Tentou-se para este fim,
a contratação de Ângelo Preto de Cuiabá, que impossibilitado de comparecer, foi
substituído por Antônio Pires de Campos e seu 500 Bororos (CHAIM, 1983).
Neste contrato, o sertanista se comprometia a aldear os Bororos ao longo da
estrada do Anhanguera (GIRALDIN, 1997).
224
Caiapós, Araxás, Bororos, Geralistas...
LIMA, Glaura Teixeira Nogueira; MORI, Lima, Robert
Márcia Amantino afirma que “o coronel Antonio Pires de Campos conseguiu ob-
ter a autorização para estabelecer aldeias de índios Bororos na área hoje conheci-
da como o Triângulo Mineiro para servir de escudo contra os Caiapós”
(AMANTINO, 2006, p. 198). Esta afirmação é confirmada pelo ofício do gover-
nador e capitão general de Goiás, Conde dos Arcos, Dom Marcos de Noronha ao
rei Dom José, datada de 25-01-1752, onde o dirigente da capitania escreve:
Estas lutas encabeçadas por Antônio Pires de Campos contra os Caiapós dura-
ram até por volta do ano de 1751, quando flechado em combate, morreu em de-
corrência de complicações deste ferimento na região de Paracatu. Historicamen-
te, este sertanista mostrou-se empenhado em exterminar os Caiapós, trabalhando
durante anos para atingir tal objetivo. Não logrou êxito, sendo posteriormente subs-
tituído nesta empreitada, pelo seu irmão, Manuel de Campos Bicudo, em troca do
perdão das dívidas contraídas por Pires de Campos (CHAIM, 1983).
Mas foi por meio dele, ou melhor, a partir de um possível pedido de aldeamento
feito a ele por uma população indígena habitante do Sertão da Farinha Podre, e
posteriormente, pelas cartas e provisão escritas a partir deste fato, que foi permi-
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REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
v. 17, n.1, n.2/2012
O autor Oiliam José em sua obra “Indígenas de Minas Gerais” afirma que os
índios Araxás habitavam “o Oeste de Minas e extinguiram-se desde muito. Sofre-
ram severíssimo ataque da bandeira de Lourenço Castanho Taques. Pertenciam
ao bloco dos Cataguás e dominavam vasta zona até o Triângulo Mineiro” (JOSÉ,
1965, p. 19).
Para outros autores, ao contrário do que afirma Oiliam José, a primeira notícia
sobre os Araxás, foi fornecida por Lourenço Castanho Taques, mas não foi credi-
tada a ele a dizimação destes indígenas, mas sim a Inácio Corrêa Pamplona (SIL-
VA, CARDOSO, s/d.), (CARVALHO, 1928), (PONTES, 1928), (COSTA, 1987).
1
Utilizarei neste trabalho o termo araxás, com “x” por ser este vocábulo o mesmo da cidade-balneário
homônima, famosa por suas águas minerais utilizadas para o tratamento de inúmeras enfermidades do
corpo.
226
Caiapós, Araxás, Bororos, Geralistas...
LIMA, Glaura Teixeira Nogueira; MORI, Lima, Robert
Segundo esta carta, os Araxás pediram a Antônio Pires de Campos que “querem
Missionário, e que querem ser governados por homens brancos” (AHU. Cx.: 5,
Doc.: 427). O que podemos perceber é que para terem o conhecimento do traba-
lho missionário e para desejarem se estabelecer em um aldeamento, presume-se
que estes índios já estavam mantendo algum tipo de contato com os primeiros
colonizadores, possivelmente com o próprio Pires de Campos, que um ano antes
estabelecera o primeiro aldeamento da região, Rio das Pedras, habitado pelos
Bororos. O próprio local em que habitavam, próximo à estrada do Anhanguera,
possivelmente facilitou o contato entre estes índios e os “brancos”. Uma segunda
hipótese levantada, poderia ser a vontade do sertanista em subjugá-los, assim
como fez com os Bororos, que viveriam em um regime de escravidão perante o
sertanista. Sobre as relações entre os Bororos e o Pires de Campos, há indícios de
que os índios viviam sob o jugo do sertanista “num regime de escravidão diante do
comandante” (ATAÍDES, 1998, p. 73).
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REVISTA CAMINHOS DA HISTÓRIA
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As reduções eram:
Quanto ao local escolhido para instalar esta redução a carta do governante aponta
que seria “junto ao Rio das Velhas [atual Rio Araguari], porque com ella se segu-
rará melhor aquelle caminho e ficasse menos exposto às hostilidades que nelle
tem feyto repetidas vezes o gentio Cayapó” (AHU. Cx.: 5, Doc.: 427).
Este aldeamento, além de receber os índios Araxás, teria também como função a
defesa da estrada dos Goiases das constantes incursões guerreiras realizadas
pelos Caiapós. Seria o segundo construído na região para este propósito, pois em
1748, o aldeamento de Rio das Pedras já havia recebido os Bororos.
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Caiapós, Araxás, Bororos, Geralistas...
LIMA, Glaura Teixeira Nogueira; MORI, Lima, Robert
das Velhas, no mesmo caminho de São Paulo”. Os motivos da escolha deste local
foram sendo posteriormente enumerados pelo governador, pois o “cítio tinha todas
as comodidades que costumão agradar os gentios, como seja abundância de caça,
de peyxe e muitos cocos e todas as mais frutas silvestres de que utilizão e o país
hé abundante”. Este fragmento da carta nos permite notar a riqueza da fauna e da
flora da região, característica que obviamente era necessária para a subsistência
dos indígenas (AHU. Cx.: 6, Doc.: 465)
Em outra carta de Dom Marcos de Noronha endereçada ao rei Dom José, datada
de 13 de Abril de 1751, o governante da capitania de Goiás forneceu notícias
sobre a chegada dos dois padres que, juntamente com Antônio Pires de Campos
iriam cuidar da redução dos Araxás. A utilização deste aldeamento como ponto de
defesa da estrada do Anhanguera também foi reafirmado, pois:
a tal aldeia naquelle distrito ficaria no mesmo caminho que vem de São Paulo
para esta vila, defendido das grandes hostilidades que tem feito o gentio
Cayapó, não só aos moradores que nelle assistião, mas também aos viandan-
tes que por ele passavão” (AHU. Cx.: 6, Doc. 473).
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o gentio Cayapó tinha feito tal hostilidade aos gentios Arachás, que não só lhe
fizerão huma grande mortandade, mas depois lhe cativarão todas as mulheres e
crianças as quais levarão para o seu alojamento, para as comerem porque sem-
pre que tem ocasião, se sustentão de carne humana (...) porque da nação Arachás
(...) os homens extinguiu o gentio Cayapó totalmente (AHU. Cx.: 6, Doc.: 465).
Portanto a dizimação dos Araxás ocorreu por intermédio dos Caiapós, ao contrá-
rio da versão até agora vigente, construída pelos memorialistas, que creditavam a
Inácio Correia Pamplona ou a Lourenço Castanho Taques tal feito. Veremos ago-
ra os motivos que nos levaram a esta conclusão.
Entre 1764 e 1765, Pamplona foi convidado pelo governador da capitania de Minas
para explorar os sertões localizados a oeste, próximos ao Sertão da Farinha Podre.
A autoridade política mineira estava interessada em promover a ocupação de novas
áreas mediante a utilização de gente ociosa, procurando também aumentar os rendi-
mentos auríferos da coroa com possíveis descobertas de novas jazidas. Após 1765,
Pamplona ainda realizou mais cinco entradas nesta região (SOUZA, 1999).
Por volta de 1782, Inácio Correia Pamplona estava atacando os Caiapós na cabe-
ceira do Rio das Velhas, atual Rio Araguari (GIRALDIN, 1997), portanto, em
região próxima à Serra da Canastra, onde se localizam as nascentes deste curso
d’água. Se analisarmos a primeira entrada deste sertanista, em 1765, decorreram
no mínimo 15 anos da dizimação dos Araxás, ocorrida a partir de informações
contidas nas documentações do Arquivo Ultramarino, entre 1749 e 1750, pelas
mãos dos índios Caiapós.
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Caiapós, Araxás, Bororos, Geralistas...
LIMA, Glaura Teixeira Nogueira; MORI, Lima, Robert
radas (AHU. Cx.: 6, Doc.: 465) . Temos que considerar que as populações indíge-
nas do grupo lingüístico Macro Jê não realizam o ritual antropofágico. Este ritual
era praticado principalmente pelos povos Tupis, como os Tupinambás, que habita-
vam, principalmente a região da costa brasileira.
Devemos encarar estes relatos coloniais sobre o extermínio dos Araxás, com
parcimônia. O período em que esta documentação foi produzida, meados do sécu-
lo XVIII, coincidiu com o período mais intenso de combate aos Caiapós. Portanto,
poderia ser um meio utilizado pelas autoridades e sociedade coloniais, para justifi-
car os ataques através da utilização das guerra justas, as quais nos referimos
anteriormente, tratando dos Caiapós.
Em 1750, o aldeamento no Rio das Velhas que estava sendo construído pelo padre
José de Castilho para os índios Araxás, que como vimos não chegaram a ser
aldeados, recebeu os índios Bororos, e passou a ser denominado Santana do Rio
das Velhas.
Além de Rio das Pedras e Santana do Rio das Velhas, foi edificado o aldeamento
de Lanhoso, atualmente extinto, com recursos oriundos da Fazenda Real da Capi-
tania de Goiás (CHAIM, 1983). Convém ressaltar que entre 1748 e 1816, as
atuais regiões do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba constituíam a parte sul da
então capitania goiana.
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O século XIX foi o período em que a “questão indígena’ (...) deixou de ser uma
questão de mão-de-obra, para se converter essencialmente numa questão de ter-
ras” (CUNHA, 1992b, p. 4). Houve, portanto, uma mudança no foco da explora-
ção dos indígenas, do âmbito do trabalho escravo, que não se extinguiu, passando
para as questões relacionadas à posse e espoliação de suas terras.
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LIMA, Glaura Teixeira Nogueira; MORI, Lima, Robert
Dois anos mais tarde, Antônio Eustáquio decide empreender nova expedição no-
vamente na direção oeste do Desemboque. Nesta ocasião, o sargento-mor visitou
o Arraial da Capelinha, fundado por José Francisco de Azevedo às margens do
Ribeirão do Lajeado, constituído por aproximadamente uma dezena de choupanas
e uma capela destinada a Santo Antônio e São Sebastião (PONTES, 1978). No-
tando a ausência de solos férteis e de boas aguadas, o comandante decidiu avan-
çar cerca de 15 quilômetros a oeste e, na confluência do Córrego das Lajes com
o Rio Uberaba, estabeleceu a “Chácara Boa Vista”, que localizava-se bem próxi-
mo do aldeamento de Uberaba Falsa, habitado pelos descendentes dos índios
Bororos, aldeados por Antônio Pires de Campos em meados do século XVIII.
Antônio Eustáquio, portanto, instalou-se em terras aldeanas, dentro daquela faixa
de três léguas em torno da estrada do Anhanguera. Estas terras concedidas aos
índios “eram inalienáveis [mas] os luso-brasileiros podiam estabelecer-se nelas na
qualidade de agregados, com o consentimento de seus legítimos donos e a ratifica-
ção dos chefes destes” (SAINT HILAIRE, 1975, p. 131).
Convém ressaltar que já em 1816 o Sertão da Farinha Podre havia sido transferi-
do para a jurisdição da Capitania de Minas Gerais. Em 1819, nomeado como juiz
de sesmarias, foi concedido a Antônio Eustáquio “o poder de estabelecer os limi-
tes das sesmarias e posses, o que foi usado em favor dos fazendeiros – e em
prejuízo dos índios” (LOURENÇO, 2005, p. 156). Esta foi uma das característi-
cas da política indigenista no século XIX, pois a “desenvoltura do poder local
aumenta na razão direta da distância da corte” (CUNHA, 1992a, p. 134). Ou seja,
os governos locais exerciam importante papel na espoliação das terras indígenas,
atendendo aos mais diversos interesses.
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Quanto aos Caiapós remanescentes, uma parte considerável destes indígenas fo-
ram aldeados pelo padre da Congregação da Missão de São Vicente de Paulo,
Leandro Rabelo Peixoto e Castro (PONTES, 1978) ainda na década de 1820, no
pontal do Triângulo Mineiro, em Campo Belo, atual cidade de Campina Verde.
Após o aldeamento destes índios que opuseram tenaz resistência aos colonizado-
res “brancos”, foi possível liberar terras para a colonização, permitindo também a
abertura da estrada do Piquiri, que ligava Uberaba a Campo Grande da Vacaria,
atual cidade de Campo Grande, hoje localizada no estado de Mato Grosso do Sul
(LOURENÇO, 2005).
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Fontes Manuscritas
Arquivo Ultramarino – Projeto Resgate – Goiás. AHU – Cx.: 6, Doc.: 427. (1749);
AHU – Cx.: 6, Doc.: 465. (1751); AHU – Cx.: 6, Doc.: 473. (1751); AHU – Cx.:
7, Doc.: 502. (1752); AHU – Cx.: 8, Doc.: 569. (1753);
Referências
ARNT, Ricardo et al. Panará: a volta dos índios gigantes. São Paulo: Instituto
Socioambiental, 1998.
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CUNHA, Manuela Carneiro da (org.). História dos Índios no Brasil. São Pau-
lo: Companhia das Letras, 1992a.
LIMA, Glaura Teixeira Nogueira. Das águas passadas à terra do sol: ensaio
sobre a história de Araxá. Belo Horizonte: BDMG Cultural, 1999.
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RESENHA
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“FOI ASSIM QUE CONHECI MEU AVÔ...”1 :
AUTOBIOGRAFIA DA CRIANÇA QUE NASCERÁ
PARA SER CARPINTEIRO
A obra, aqui resenhada, é o seu mais recente livro e recebido (por essa, sua leitora)
com grata alegria, pois se trata de uma “escrita de si”, sensível, em que o autor
articula trajetória pessoal, familiar, por meio de sua concepção de cultura, cultura
coletiva ou social. José de Souza Martins nos entrega, publicamente, sentimentos,
segreda impressões sobre outros e sobre si mesmo em um “despudor” paradoxal, ou
seja, maravilhoso e respeitoso. Ao terminar de ler, ficamos com a impressão de que,
em alguma medida, a memória narrada por ele, a nós também pertence (ou pelo
menos, não é estranha a boa parte dos brasileiros que viveram o século XX).
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Minha geração é a dos filhos da Era Vargas, a geração dos que viveram a
grande e complicada transição do Brasil pós-escravista do café para o Brasil
da grande indústria; a geração das crianças e adolescentes que nasceram para
o trabalho precoce, de diferentes modos, segundo a situação social de cada
um, presas do labirinto da transição social (MARTINS, 1994, p. 447).
Nós que procedemos do grande e ignorado mundo dos pobres, seres residu-
ais da sociedade tradicional e pré-moderna que foi largando suas gentes por
caminhos e veredas da transição para o mundo moderno, nascemos coadju-
vantes da trama da vida, no meio do drama que já estava sendo encenado.
Nossas pressas pessoais só têm sentido na lentidão do acontecer histórico
(MARTINS, 1994, p. 443)
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Resenha: “Foi assim que conheci meu avô...” :
ULISSES, Ivaneide Barbosa
(REIS, 2011, p. 259). É assim, que nos parece, que o Sociólogo narra a sua
história; ele cria, simultaneamente, uma teia social que denúncia e anuncia as suas
próprias ideias para o futuro, diz-nos qual a sua “condição desejante no mundo”.
É um Sociólogo militante. Ao narrar a sua trajetória, parece, ele mesmo, não acre-
ditar que tenha chegado tão longe do destino posto ao “moleque de fábrica”, que
ao nascer foi levantado ao alto pelos braços do pai e vaticinado por este como
futuro trabalhador de carpintaria. Tal história, contada muitas vezes por familia-
res, foi lembrada no momento do juramento em 1993 ao assumir a Cátedra Simón
Bolivar da Universidade de Cambridge, na Inglaterra. Escreve:
A partir daí, José de Souza Martins, desenrola uma narrativa que apresenta os
dois lados da família (paterna e materna), por meio de encontros com pessoas e
objetos. Sua família se constrói no que o sociólogo diz ser um mundo de “[...] certo
realismo fantástico da cultura e nas mentalidades populares” (MARTINS, 1994,
p. 10); são pessoas (o autor, igualmente) que atravessam o século XX, no limiar
de representações de mundos díspares: o industrial e o artesanal; o urbano e o
rural; o letrado e o analfabeto.
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Enfim, a obra de José de Souza Martins se propõe a ser uma autobiografia de uma
criança e de um jovem, pois a narrativa se encerra pouco depois da sua saída da
fábrica para tentar uma educação distante do mundo do operariado, escreve-nos,
“Memórias de operários, sobretudo de operários-crianças, são certamente raras,
se é que existem” (MARTINS, 1994, p. 448). Alguns trabalhos hoje vêm
problematizando a “invisibilidade” da criança e do jovem nas pesquisas acadêmi-
cas como de Helena Abramo e Lúcia Rabello Castro, ambas da psicologia. As
Ciências Sociais também tem se interessado pelo tema, inclusive com a presença
de simpósios temáticos e cursos de curta duração, em encontros da área e
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Resenha: “Foi assim que conheci meu avô...” :
ULISSES, Ivaneide Barbosa
exemplificamos com o trabalho organizado pela historiadora Mary Del Priori “His-
tória da Criança no Brasil” (1999).
É inegável que, entre os muitos aspectos na obra de José de Souza Martins que
podem chamar a curiosidade ou a atenção privilegiada do leitor, salientei dois, que
me comoveram mais fortemente na leitura desta obra: os aspectos relacionados à
própria narrativa de si do autor e a sua perspectiva de dar visibilidade a uma fase
da vida do ser humano considerada “nublada”, tanto no que diz respeito à
historiografia quanto na experiência de vida de cada um de nós.
Mas, existem ainda outros aspectos significativos no livro do sociólogo que mere-
cem ser conferidos por diferentes leitores, como é caso das grandes personagens
que surgem página a página como o avô postiço, o próprio pai, sua tia Anna e
tantos outros; mas também o próprio autor o “moleque de fábrica” com sua astú-
cia diária.
Referências
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NORMAS PARA APRESENTAÇÃO DE ORIGINAIS
Informações gerais
resenhas;
Somente serão aceitas, quando houver, uma resenha, uma tradução, uma comuni-
cação e uma entrevista em cada edição.
Estrutura do trabalho
Os artigos e traduções deverão obedecer à seguinte seqüência:
Título;
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Nome do autor (somente em uma das cópias impressas) - deve vir à direita da
página, acompanhado das referências acadêmicas do autor informadas em nota
de rodapé. A remissão dessa nota deve ser feita pela utilização do símbolo
asterisco (*); já que as remissões numéricas são reservadas as notas explicativas;
Resumo; Abstract;
Palavras-chaves; Keywords;
Texto - usar para as citações, bem como para as referências a autores
o sistema autor-data de acordo com as atuais normas da ABNT;
Citação textual (caso haja) - até três linhas devem ser colocadas no corpo do
texto entre aspas; com mais de três linhas devem vir destacadas do texto, em
espaço simples;
Notas de rodapé (caso haja) - devem ser colocadas ao pé da página, somente
notas explicativas e para referências à arquivos e fontes primárias. As remis-
sões para o rodapé devem ser feitas por números, na entrelinha superior;
Fontes (caso haja) - devem vir antes das Referências Bibliográficas, listadas
por arquivos ou locais em que se encontram;
Tabelas e figuras (caso haja) - devem ser numeradas consecutivamente,
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acordo com as normas ABNT/última versão.
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serão analisados.
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mos serão destruídos.
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