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Olá,George Viana

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Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek (à esq.), Luiz Inácio Lula da Silva (ao centro) e Fernando Collor (à dir.) | Foto: Montagem Revista
Oeste/Shutterstock/Wikimedia Commons

EDIÇÃO 161

O Brasil visto pelos arqueólogos do


futuro
Provavelmente ele vai se perguntar como a economia conseguiu
sobreviver a tantas experiências descabidas cometidas por vários
aventureiros colocados em postos importantes de governos
UBIRATAN JORGE IORIO - 21 ABR 2023

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E m um dia qualquer de um futuro bem remoto, quando algum


arqueólogo se interessar pelo estudo da cultura e do modo de
vida no Brasil dos dias atuais, provavelmente vai se perguntar
como a economia conseguiu sobreviver a tantas experiências
descabidas cometidas por vários aventureiros colocados em postos
importantes de governos. Três pensamentos virão então à sua mente: a
quantidade de pajelanças econômicas, a capacidade da economia de
absorver os estragos produzidos pelas mandingas e, depois de algum
tempo, a prática das mesmas ou de novas coisas-feitas.

Se o estudioso dedicar sua atenção apenas ao período republicano, vai


�car embasbacado com o encilhamento de Rui Barbosa; aparvalhado
com a queima de mais de 14 milhões de toneladas de café de Vargas;
assombrado com a agressão à Física perpetrada por JK ao pretender, à
custa dos pagadores de impostos, transformar 50 anos em cinco;
estupefato com os três congelamentos gerais de preços de Sarney e os
dois de Collor (um deles acompanhado de sequestro dos ativos
�nanceiros), em um período de apenas cinco anos; boquiaberto com a
“banda cambial diagonal com movimento endógeno”, inventada por um
presidente episódico do Banco Central de FHC, que quase implodiu os
mercados �nanceiros; atônito com a Nova Matriz Econômica de certa
criatura que falava de maneira desconexa e ininteligível e que ocupou a
Presidência; e pasmado com um arcabouço �scal divulgado em março
do longínquo ano de 2023 e que mais parecia um calabouço fatal.

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Foto: Shutterstock

E, estatelado e coçando a cabeça, arguirá para si mesmo como esse país


conseguiu resistir a tantos descalabros, recuperou-se e se transformou
alguns anos depois em uma grande potência econômica. Pobre
arqueólogo, que talvez precise recorrer a um paleontólogo ou mesmo a
algo como um vidente do passado, especialistas, respectivamente, em
fósseis e em bolas de cristal que funcionam no sentido anti-horário. Em
sua pesquisa, compreenderá a terrível dúvida que nos assola hoje, a de
tentar prever para onde este governo está nos levando, uma indagação
comum em qualquer tempo — um simples exercício para, com base nas
ações do presente, tentar determinar aquilo que se espera do futuro —,
mas que, face à monumental capacidade de destruição que o governo já
demonstrou sobejamente em pouco mais de 100 dias, se transforma
em perguntas transcendentais: O que vai ser de nós? O que vai sobrar
depois da destruição? O que vai �car para as gerações seguintes?

Embora sempre tenha sido impossível para a teoria econômica —


mesmo depois do advento do todo o poderoso arsenal dos modelos
matemáticos de previsão desenvolvidos a partir do século 20 —
antecipar com exatidão o futuro, sempre foi também perfeitamente
possível e relativamente simples olhar para trás e aprender com a
experiência própria e alheia, tendo em mente, primeiro, que o presente
já foi futuro e que será passado quando o futuro for presente e,

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segundo, que a economia não deixa de ser uma ciência, embora de


coloração turva e cinzenta. E assim será até os dias do nosso
arqueólogo e depois dele.

Portanto, é possível antecipar em que porto os países que adotaram


trajetórias semelhantes às que o governo petista vem tomando
atracaram. É só olharmos para o passado, e a resposta aparece
cristalina: aportaram na miséria, na as�xia da liberdade, na censura,
na ditadura e na supressão da dignidade humana. E, se observarmos a
bagunça generalizada que campeia no Legislativo e no Judiciário, a
desinformação produzida incessantemente pela velha imprensa e as
imperfeições de muitas outras instituições, essa lamentável resposta
adquire limpidez e certeza ainda maiores. Será que meia dúzia de
populistas radicais, com ideias que recendem naftalina, vão ser bem-
sucedidos em apagar e destruir o legado que nossos avós nos
transmitiram, mesmo contra a vontade da maioria de nós? A�nal, não
subestimemos a capacidade destrutiva da ideologia dessa gente.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, durante anúncio de ministros, no CCBB Brasília |

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Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

As críticas à política econômica do governo do PT vêm se multiplicando


como coelhos, desde o primeiro dia, quando quem sabe entender as
coisas percebeu o tamanho da farsa. Surpresa — se houve — foi apenas
da parte de alguns economistas tucanos. Dentro do próprio governo, a
cada trapalhada do Haddad e a cada discurso sem pé, sem cabeça e sem
uso de plurais do presidente, as críticas vêm adquirindo um crescendo.
Os economistas e os políticos extremistas de esquerda criticam
acerbamente, apenas por criticar, sem apresentar alternativas sólidas
ao que o último bastião do bom senso — o Banco Central do Brasil —
vem fazendo para manter a in�ação controlada e dentro das metas
anunciadas.

É muito frustrante saber que durante quatro anos o país se comporta


como alguém que aprendeu a mexer em celulares, mas que a partir de
2023 voltou a usar pombos-correios

A maioria dessas críticas parece dar substância ao veredicto de Gustave


Flaubert, para quem “faz-se crítica quando não se pode fazer arte,
como quem se torna delator quando não pode ser soldado”. No centro
das diatribes, invectivas e impropérios contra “essa política econômica
do Campos Neto”, um velho bode expiatório: a taxa básica de juros. Há
detratores que chegam mesmo a pensar que a economia pode
encontrar a rota do crescimento sustentado mediante uma simples
decisão mais ousada do Copom, acompanhada, provavelmente, de
gestos histriônicos à la Maduro, de políticas industriais elaboradas por
gênios progressistas e de macaquices acadêmicas de cunho heterodoxo
semelhantes às que foram utilizadas no passado. É o velho cacoete dos
brasileiros de repetir fracassos, dirá o arqueólogo.

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Presidente do BC, Roberto Campos Neto | Foto: Raphael Ribeiro/ BCB

Outro Brasil é possível? É claro que sim, uma vez que, a rigor, há uma
in�nidade de brasis possíveis, desde aquele da opulência, da pujança e
da igualdade de oportunidades com que sonhamos até aquele outro, o
da pobreza, da miséria e da mais completa falta de liberdade, como nos
países — que todos sabemos quais são — cujos governos são cultuados
pela seita petista e que se transformaram em objetivos dos
progressistas desde a fundação do Foro de São Paulo.

O nosso arqueólogo do futuro — que terá lido obras de grandes


economistas, como Adam Smith, Richard Cantillon, Carl Menger,
Ludwig von Mises, Friedrich Hayek, Milton Friedman, Robert Lucas e
Thomas Sargent — dominará o conhecimento necessário para acreditar
que, assim como uma caçamba sem corda não pode descer ao fundo do
poço, regimes monetários sem respaldo em regimes �scais sólidos não
podem gerar crescimento.

Esta é, em síntese, a grande questão, da qual todas as posturas dos ditos


progressistas revelam profundo desconhecimento: a falta de percepção

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de que, sem uma extensa alteração no regime �scal, baseada em um


forte enxugamento do Estado que possibilite necessidades de
�nanciamento de longo prazo permanentemente menores; sem uma
reforma tributária corajosa e capaz de libertar o aprisionamento da
energia criativa a que o governo do PT quer submeter o setor privado;
sem uma descentralização administrativa de caráter federalista; sem
que o Judiciário volte a limitar-se às suas funções constitucionais e
deixe de atuar politicamente; sem, en�m, uma reforma política
profunda que possa possibilitar todos esses requisitos, e com toda essa
tamanha falta de compreensão de que a caçamba da política monetária
precisa estar atada à corda da política �scal, estaremos condenados a
continuar caminhando em círculos, sem crescimento e com a in�ação
contida à custa de um desemprego crescente — um fenômeno que teria
tudo para ser transitório, mas que acaba se perpetuando, caso o atual
con�ito entre os lados �scal e monetário seja mantido.
A questão é muito séria: a continuar do jeito que está — com o governo
inchando cada vez mais o setor público, extorquindo sempre mais dos
agentes privados, espantando com excessos de controles e sinais
equivocados os investidores externos e internos e tentando ludibriar o
mundo com a estúpida proposta de que gastos com investimentos na
área “social” não são gastos (como se leopardos não fossem felinos) —,
teremos necessidade de uma taxa de juros cada vez mais elevada para
que a in�ação permaneça controlada; se a opção for pela heterodoxia
de reduzir o superávit primário mediante mágicas contábeis, por
colocar incontáveis companheiros em diretorias de estatais que já não
deveriam mais existir e em cargos públicos pagos a peso de ouro; e se
for de diminuir arti�cialmente a taxa básica de juros, sem o necessário
respaldo �scal, seremos involuntariamente arrastados para o
precipício mais rapidamente, com o caos cambial, monetário, político e
social.

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Ilustração: Shutterstock

Só haveria uma solução para que o nó em que o governo petista volta a


nos prender possa ser desatado, que é a busca de uma coordenação —
não simplesmente simbólica, de fachada, de curto prazo e para inglês
ver, mas permanente e que possa ser percebida como tal — entre os
regimes �scal, monetário e cambial: política monetária exatamente
como vem sendo executada, com câmbio efetivamente �utuante e
reformas liberais no Estado brasileiro. Ou seja, exatamente o que a
equipe econômica do governo anterior procurou fazer entre 2019 e
2022. É muito frustrante saber que durante quatro anos o país se
comporta como alguém que aprendeu a mexer em celulares, mas que a
partir de 2023 voltou a usar pombos-correios.

Não sejamos ingênuos: o único tipo de coordenação que se pode


esperar desse governo é da pior classe possível e que, infelizmente,
parece ser líquida e certa caso as enormes pressões que o Banco
Central vem sofrendo terminem com sua autonomia: trata-se de uma
coordenação entre desregramentos, da gestão entre descomedimentos,
com o setor público gastando irresponsável e demagogicamente e a
autoridade monetária, comandada então por um serviçal dos políticos
de plantão no poder, bancando a orgia com taxas de juros de mãe para
�lho e a consequente chuva de moeda despejada demagogicamente de

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impressoras transportadas por helicópteros.

Com a ocupação das cadeiras estofadas de Brasília pelo petelhato, com


sua paixão mórbida e desenfreada para torrar o dinheiro dos cidadãos e
das empresas e sendo mantida a ortodoxia monetária correta
presentemente adotada, desamarra-se de vez a corda da caçamba:
apertos e mais apertos no lado monetário, frouxidão e mais frouxidão
no lado dos gastos para manter a máquina estatal.

Ilustração: Shutterstock

A conclusão a que possivelmente chegará o arqueólogo é que, com


tantos anos de experiência estudando os hábitos de civilizações ao
longo de milênios, nunca viu nada parecido, e que os brasileiros são
mesmo um caso à parte, um jabuti que consegue subir na árvore por
conta própria.

Ubiratan Jorge Iorio é economista, professor e escritor

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Ubiratan Jorge Iorio é economista, professor e escritor


Instagram: @ubiratanjorgeiorio
Twitter: @biraiorio

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