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IMAGEM – DEFINIÇÃO

“A imagem constitui-se como a forma de registo mais antiga e como meio de


expressão do ser humano. Desde os tempos mais remotos do Paleolítico até à época
moderna, as imagens estão presentes em todas as civilizações, servindo como
veículo de informação e de comunicação, de registo e de linguagem, ou seja,
funcionando primitivamente como marca ou ícone e depois como símbolo (Sousa,
2007). As imagens são uma forma de representação privilegiada que se massificou e
enraizou no desenvolvimento cultural dos povos; desempenham um papel
fundamental na compreensão do mundo e evidenciam-se pela sua
representatividade nos diversos campos do conhecimento e pelo seu contributo e
influência nos contextos social, económico, político e cultural e, portanto, na
transformação da sociedade (Costa et al., 2007).
O Homem contemporâneo é, por excelência, um consumidor de imagens. Nesse
sentido, as imagens têm adquirido um significado poderoso e abrangente resultante
de uma sociedade que as reconhece como um importante recurso cognitivo e que as
utiliza como veículo de comunicação e cultura. Disso são exemplo a fotografia, o
cinema, a televisão e a internet (Costa et al., 2007).
O termo imagem (do latim imago – cópia da realidade) é tão vulgarmente utilizado
que, numa primeira abordagem, parece ser de simples definição. Contudo, após uma
reflexão mais aprofundada, parece ser difícil estabelecer uma definição simples e
precisa do conceito de imagem que inclua todas as situações em que é empregado.
Desde a Antiguidade que a imagem constitui um tema crucial da reflexão filosófica,
debruçando-se filósofos e pensadores sobre a complexa relação entre imagem e
realidade assim como sobre as respetivas definições. Já Platão (427-347 a.C.) reflete
sobre estas questões e associa as imagens a sombras ou fantasmas, tendo como
base a ideia de representação e reflexo especular. Mais tarde, a retórica medieval
define imagem como aliquid stat pro aliquo “algo que está em lugar de uma outra
coisa”, apontando para algo que pode ser fabricado (Zunzunegui, 1995).
E só a partir do século XX que se pode falar de uma definição de imagem ligada à
ideia de materialidade e independente dos temas e objetos representados. Por
exemplo, Abbagnano (2000) defende que:
A imagem pode ser entendida como semelhança ou sinal das coisas que pode
conservar-se independentemente das coisas: às imagens podem ser atribuídos dois
sentidos, o primeiro como produto da imaginação e, o segundo, como sensação ou
perceção, vista por quem a recebe. (p. 537)
Joly (1994) considera que a imagem é uma mensagem. Para a autora, o termo
imagem vincula-se à representação visual e, em si mesmo, possui diversos
significados, desde reflexo passando por sombra, por simulacro, até às imagens
mentais ou signos. Deste modo, a imagem é uma representação de algo, sendo vista
como signo.
Moles (1981) considera que as imagens devem ser encaradas enquanto fatores do
que refere ser a comunicação funcional. Assim, a imagem é utilizada com objetivos
comunicativos precisos sendo veículos funcionais para a transmissão da informação.
Moles define a imagem enquanto fator social mas também como algo material que é
capaz de funcionar como memória documental (através do tempo e do espaço) e
como fator de transmissão de uma determinada mensagem.
Noutra perspetiva, o neurocientista António Damásio (2010) refere que:
Imagem designa um padrão mental em qualquer modalidade sensorial, como, por
exemplo, uma imagem sonora, uma imagem táctil, a imagem de um bem-estar.
Essas imagens comunicam aspetos das características físicas do objeto e podem
comunicar também a reação de gostar ou não gostar que podemos ter em relação
ao um objeto, os planos que podemos ter em relação a esse objeto ou a rede de
relações desse objeto com outros objetos. (p. 24)
Damásio (2010) considera o conceito de imagem como sinónimo de representação,
salientando que a representação, longe de reproduzir o objeto percebido pelos
sentidos, é uma construção cognitiva: “Ademais, seja qual for o grau de fidelidade
(ao objeto percebido), os padrões neurais e as imagens mentais correspondentes
são criações do cérebro tanto quanto produtos da realidade externa que levou à sua
criação” (p. 405).
Quaisquer que sejam as posições teóricas adotadas, parece incontornável que se
entende por imagem algo que se assemelha a qualquer outra coisa e que se utiliza
para representar essa outra coisa eventualmente na sua ausência, suscitando
significados (isto é, interpretações).
A complexidade encontrada na definição do conceito de imagem reflete-se também
na multiplicidade de tipos de imagens considerados nas diversas perspetivas teóricas
e, consequentemente, na dificuldade em estabelecer uma classificação ou tipologia
uniforme.
A partir dos estudos de Pierce, ao longo do século XX, vários autores com diferentes
perspetivas teóricas apresentaram propostas de classificação das imagens. De entre
estas, destacamos as que se seguem por serem aquelas em que fundamentámos a
nossa investigação.
Mitchell (1984) distingue os seguintes tipos de imagem: imagens gráficas (imagens
desenhadas ou pintadas, esculturas), imagens ópticas (fotografias, imagens
especulares, projeções), imagens percetuais (obtidas pela observação do mundo e
dos seus dados), imagens mentais (sonhos, lembranças, ideias, fantasias,
representações mentais) e imagens verbais (metáforas, descrições). Baptista (2012)
considera que a classificação das imagens proposta por Mitchell (1984) distingue
imagens captadas fisiologicamente ou mecanicamente (as percetuais e as ópticas),
de imagens produzidas (as gráficas) e de imagens imaginadas (as verbais e as
mentais) e identifica algumas características dos diferentes tipos de imagens
referindo que:
As imagens gráficas e as ópticas têm uma dimensão material e um contexto de
apresentação e que a mesma imagem pode ser vista e lida por diferentes pessoas.
Estas congelam um determinado momento de uma forma fixa, através de uma
determinada técnica de representação ou captação e é esse mesmo momento que
pode ser percecionado. As imagens verbais e neutrais só podem ser vistas pelo
sujeito que as constrói e podem ser permanentemente modificadas; são
desencadeadas por textos verbais, pelo contacto sensorial com o mundo e pela
imaginação e são imateriais e fluidas. Eventualmente, podem ser transmitidas a
outrem, descritas com a ajuda da palavra ou de imagens gráficas. As imagens
percetuais dependem do órgão da visão, mas as mentais e verbais podem ser vistas
de olhos fechados (p. 52).
Noutra linha de investigação, com base na análise de estudos psicolinguísticos sobre
perceção visual, Henderson e Ferreira (2004) propõem uma classificação dos
estímulos visuais que tem sido usada em estudos em que se adota o visual world
paradigm (o paradigma de investigação onde fundamentámos a presente
investigação). Henderson e Ferreira (2004) consideram a existência de duas
categorias de imagens: as true scenes e as ersatz scenes. Nas true scenes o input do
sistema visual pode ser o mundo real ou uma imagem desse mundo. As true scenes
incorporam fundos detalhados e rigorosos assim como entidades que ocorrem no
mundo real e que estão organizadas entre si de forma adequada e proporcionada.
Por exemplo, uma fotografia em que os animais têm o tamanho adequado em
relação à escala da imagem. Nas ersatz scenes, a imagem pode ser completa ou ser
uma construção à qual faltam algumas das características essenciais e típicas do
mundo real. São inúmeros os estímulos visuais que são exemplo de ersatz scenes
nomeadamente desenhos, imagens sem fundo, imagens com personagens
anormalmente grandes ou imagens simples de objetos. Na categoria ersatz scene,
Henderson e Ferreira (2004) consideram vários subtipos dos quais destacamos a
scene sketch. Na scene sketch a imagem representa um pequeno conjunto de
objetos a interagir de um modo semanticamente coerente e interpretável, mas
apresenta falta do conteúdo de todo o contexto visual circundante que estaria
presente numa true scene.”

In: MONTEIRO, Paula Propriedades das imagens e avaliação de comportamentos


linguísticos. [tese de doutoramento apresentada na Faculdade de Letras/Faculdade
de Medicina da Universidade de Lisboa, julho 2017, p.11 e p. 13-16]

Bibliografia referenciada:

Abbagnano, N. (2000). Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

Baptista, M. A. C. (2012). A palavra na leitura de imagens: A cidade que o anjo vê e


os címbalos que o leitor não vê. In: A. Costa & I. Duarte (Orgs). Nada na linguagem
lhe é estranho. Homenagem a Isabel Hub Faria. Porto: Afrontamento, 45-59

Henderson. J. M. & Ferreira, F. (2004). Scene perception for psycholinguists. In: J. M.


Henderson, and F. Ferreira (Eds.), The interface of language, vision, and action: Eye
movements and the visual world. New York: Psychology Press.

Joly, M. (1994). Introdução à Análise da Imagem. Lisboa, Edições 70.

Mitchell, W. J. T. (1984). What Is an Image? New Literary History. 15 (3), 503-537.

Moles, A. (1981). L’image: Communication Functionelle. Paris, Casterman.

Zunzunegui, S. (1995). Pensar la imagen. Catedra Universidad Del Pais Vasco:


Madrid.

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