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É Sobre Eles!?

Personagens:

Ana Gabrielle (Lígia)


Eurico (Marido)
Maria Eduarda Ferreira (Lua)

Ideia e Texto de Leandro Polegato

Direção de Leandro Polegato e Diego Durães


Ato I
O palco sendo um quadrado. Cortando pela metade da ponta. Cortando com um cercado
grande. Para dentro do cercado, jornais no chão, pratos sujos, roupas sujas, ao canto um
colchão jogado, livros no chão, um caixote no meio. Para fora do cercado, roupas
penduradas em cabides, batom e maquiagem de mulher, taça de vidro, bebidas e
travesseiro.

Cena I
Lígia deitada no caixote dentro do cercado

Música, História de uma gata, de Lucinha Lins

Lígia (Deitada) (Delicada) A onde meu olhar alcança eu vejo idades diferentes, mas tem uma
coisa que não tem idade, não tem tamanho, é a tal da memória afetiva.

Deixa a música tocar

Lígia (Deitada) (Delicada) O mundo não faz sentido. Viver é basicamente uma contagem
regressiva pra não estar mais vivo, e a gente quer viver nossa vida buscando sentido onde
não tem, um sentido. Um caminho que todos devem seguir, chamam de caminho da
felicidade, se você estiver fora dele você não vale, não importa se você olhar pro espelho e
sentir que não é você de verdade. Abre um sorriso! Ou pelo menos finge que abre. Me diz
se vale a pena viver assim? Buscando um caminho certo, se afastando da sua realidade e só
apressando seu fim, acorda! Você não faz sentido e não precisa fazer. A vida é muito curta
pra ter certeza de alguma coisa, então para de achar que só tem um sentido certo pra viver.

Música acaba

Cena II
Eurico com Lua entra em cena
Eurico abraçando Lua pela cintura

Eurico (A falar a Lua) Eu te amo até essa bebida acabar, mas eu não quero que você vá
embora, eu só sou do tempo. Eu sinto até a última gota desse vinho barato.

Lua (A falar a Eurico) Amores vãos são mais verdadeiros pela graça de amar sem pra quê

Eurico (A falar a Lua) Histórias inventadas são mais bonitas porque...

Lua (A falar a Eurico) A verdade estraga tanta coisa. Mas me ame mais do que tudo, é só por
essa noite.

Eurico (A falar a Lua) O amor ele é uma eterna brincadeira temporal e eu brinco com o
tempo como se pudesse, como se fosse só mais uma das traquinagens do destino, sabe,
uma ferramenta do universo.

Lua (A falar a Eurico) E eu sinto as horas passando através dos meus dedos

Eurico (A falar a Lua) E nunca quis te segurar aqui de qualquer forma

Lua (A falar a Eurico) Eu também nunca quis fica de qualquer forma

Lígia (Se levanta assustada) Hannnn!!

Lua e Eurico se assustam

Lua sai correndo de cena

Cena III
Lígia (Triste) De novo!?

Eurico (Bravo) De novo oque!?

Lígia (Triste) De novo isso!?

Eurico (Bravo) De novo oque? Fala logo!!

Lígia (Brava) Você que tinha que fala alguma coisa

Eurico (Bravo) Olha o jeito que você fala comigo, você tá achando que é quem

Lígia (Triste) De novo você está trazendo mulher aqui

Eurico (Bravo) De novo!! Eu trouxe mulher aqui de novo, porque a casa é minha e quem
manda aqui sou eu! Eu vou trazer essa, mas outra, e mais outra, quantas eu quiser!!

Lígia (Triste) Você não pensa em mim nenhuma vez!?

Eurico (Debochado) Hahahah ta tristinha é!? Oque que foi... quê um chocolatinho pra cura
essa tristeza!?

Lígia (Triste) Não... você não entende, eu queria você aqui ó.… comigo, mas não...

Eurico (Debochado) Eu não vou fica aí com você não. Você que sabe... eu acho que eu já fiz
foi demais!! Queria casa... casamos. Queria lua de mel... teve. Agora a casa é minha.... e
você fica aí e eu, eu aqui!!

Lígia (Triste) Eu só não saio daqui porque eu não consigo..., mas o dia que eu saí
Eurico (Debochado) (Saindo de cena) Isso sonha, sonha que você vai saí... olha, mesmo que
você quisesse você não ia sai daí, porque você que fica e eu sei disso!

Eurico sai totalmente de cena

Cena IV

Ana Gabriela em cena só

Ana Gabriela (Alto) Carpe Noctem!! Uma Boa Noite a todos!! Apenas de eu ter ficado
sozinha, eu tenho certeza de que sozinha eu não vou fica, é.… eu não vou não!! Talvez eu
até fique sozinha sim, mesmo eu não querendo, até porque eu nunca, mas nunca quis ficar
sozinha. Naquelas Carpes Noctems cantando, reluzente, em lindos, lindos palcos. Eram
noites brilhantes, e ele me conheceu assim sabe. Foi... cantando. Eu, eu me apaixonei à
primeira vista, (Música “Home” de Gabrielle Aplin) E ele, ele eu sabia que me amava, ele
dizia isso. Como eu disse nós conhecemos naquele bar que eu cantava. Eu cantando em
bares, era um começo para a minha sonhada carreira, enfim... naquele bar ficamos, nos
conhecemos, me apaixonei, e casamos... tudo lindo. Até que ele não deixou eu cantar mais,
falou que era melhor eu parar, tinha ciúmes dos homens me olhando, e eu, eu idiota parei.
Que idiota eu fui. Dai começou a grande cagada da minha vida, cada vez mais ele ia me
prendendo e eu aqui. Só uma coisa que ele não sabe. Estou gravida, mas não conte a ele,
não conte por favor, um segredo só nosso, eu te peço!! Eu só não sei oque fazer, porque
essa barriga vai crescer! Eu sempre sonhei tem um filho, eu não queria agora, nem aqui, e
nem com ele! Mas é o jeito, presa, calada e sozinha é assim que vou ter meu filho!! Espero
que me entendam e não me julguem! É o meu filho, o meu, o meu filho!!

Cena V
Eurico e Ferreira entram em cena; Eurico senta em seu espaço destinado e Ferreira deita
sobre ele e Eurico fazendo carrinho nela

Música “Confesso” de Serena


Ferreira (Alto) Meu amor, essa mulher vai fica aí!?

Eurico (Alto) Infelizmente vai, não tem onde coloca ela

Ferreira (Alto) Aff sei lá, encontra um lugar, eu não quero ela aqui, essa mulher me irrita

Ana Gabriela (Indignada) Essa mulher!? Você que me irrita, você está na minha casa, com o
meu marido

Eurico (Alto) Uepaa, ela está na minha casa

Ferreira (Alto) E... (Fala “Foda-se” mexendo apenas os lábios) Que ele é teu marido, não me
importa

Eurico (Alto) Não importa mesmo, porque ela vai ficar aqui

Ana Gabriela (Alto) Eu que deveria está aí... você não acha

Eurico (Alto) Não, eu não acho

Ferreira (Alto) Nem eu.... minha querida entenda, ele não te quê, ela me quê, a vida é assim,
entenda

Ana Gabriela (Alto) Não é que ele te quê, ele que todas

Eurico (Alto) Chega em esta falando muita, mais muita asneira

Ferreira (Alto) Hhahahaha eu também acho...


Eurico (Alto) Agora eu quero silencio de você que agora quero algo mais reservado com
ela... não sei se você me entende

Ana Gabriela (Passando mal) Aí, aí, minha pressão, to passando mal, vou desmaiar

Ferreira (Alto) Ela não entendeu que é pra ficar quieta, aff que mulherzinha mais chata

Ana Gabriela (Passando mal) não, não é sério, eu to passando mal, vou desmaia

Eurico (Alto) Não me interessa se é sério ou não, eu não me importo. Agora fica quieta

Eurico joga um objeto em Ana Gabriela; Antes do objeto chegar nela, ela desmaia

Ferreira (Alto) Pronto, agora sim a gente consegue fazer alguma coisa

Ferreira e Eurico ficam se abraçando até música acabar

Performance:

Música “Bordô” de Serena

Eurico e Ferreira pegam roupas fora do palco e levam para o palco com um pano grande.
Eurico levanta o pano; Ferreira vai para trás e coloca outra roupa; Ele abaixa o pano, ela
com outra roupa faz uma pose.

Ferreira levanta o pano; Eurico vai para trás e coloca outra roupa; ela abaixa o pano, ele
com outra roupa faz uma pose.

Eurico levanta o pano; Ferreira vai para trás e coloca outra roupa; Ele abaixa o pano, ela
com outra roupa faz uma pose.
Ferreira levanta o pano; Eurico vai para trás e coloca outra roupa; ela abaixa o pano, ele
com outra roupa faz uma pose.
Fim da performance; Eurico e Ferreira saiam de cena

Cena VI
Ana Gabriela em cena se sentando

Ana Gabriela (Sentado) (Recuperando ar) Quando eu vejo um fim, eu gostaria de ver mais
que um simples fim. Gostaria de ver muito mais do que uma só ideia. O fim não pode ser só
fim não é mesmo. E quando eu ver o meu fim, eu não quero vê isso daqui eu quero ver
muito, mas muito mais. Quero ter novas experiências, novas saudades, novos amores,
quero ter de novo... tudo. Tudo mesmo, mas eu acho que meu filho vai ser algo novo, que
irá me trazer algo novo. Vai ser a coisa mais nova nós últimas 5 anos que estou aqui.
Haammmmm.

Eurico entra em cena

Cena VII

Eurico (No seu espaço) (Irónico) Parou de passar mau foi!!?

Ana não responde

Eurico (Irónico) Em... Não vai me responder!?


Ana não responde

Eurico (Bravo) Me responde quando eu estiver te perguntando!!!

Ana (Debochada) E se eu simplesmente não quiser

Eurico (Bravo) Você não quê oque mais!?


Ana (Alto) Eu não quero mais isso. Essa cadeia, a cinco, a cinco anos.

Eurico (Alto) Não é a cadeia, é a tua casa

Ana (Alto) Não, não é a minha casa. Se fosse a minha casa eu iria sair, volta, dormi, viver
como uma pessoa qualquer

Eurico (Irónico) É só você viver!

Ana (Alto) Como!? Você, você me prende aqui, você me prende aqui não entende. São cinco
anos aqui, são 60 meses e 1800 dias!! Você me prendendo, me batendo, eu, eu não aguento
mais.

Eurico (Irónico) Pra quem já ficou 60 meses oque é a vida toda!?

Ferreira entra em cena

Cena VIII

Ferreira em cena abraçando Eurico

Ferreira (Alto) Meu amor... Quando a gente vai jantar!?

Eurico (Alto) Se arruma lá... que hoje será especial

Ferreira (Alto) Especial!!? Ain que deliciaa...


Ferreira (Alto) E essa dai!? Já está melhor!?

Ferreira (Alto) É você mesmo... ta bem-querida!?


Eurico (Alto) Ela está ótima, já está até resmungando

Ferreira (Alto) Aff você só reclama, não sabe agradecer não!?

Eurico (Alto) De fato ela só sabe fala merda mesmo!


Eurico (Alto) Agora vai lá que antes eu tenho que fazer algumas coisinhas. Daqui 20 minutos
estamos saindo.

Ferreira (Alto) Ta bom... estou indo

Ferreira sai de cena

Cena IX
Eurico (Alto) Sabe que eu estou achando você muito, mas muito mau educada
Ana não fala nada

Eurico (Alto) Não responde... não fale nada


Eurico (Alto) Esta me ouvindo!?
Ana não responde
Eurico (Alto) É assim então... Ok

Eurico sai de cena

Cena X
Ana em cena

Ana (Alto) Eu não estou aguentando mais. Um filho na barriga, que não sei como vou ter,
uma vida aqui comigo. Sem um marido, sem ninguém, sozinha. Eu me perco se fosse contar
quantas as vezes fui espancada, calada. Eu pensava que era amor, mas não, não é, parece
que é um rancor que esta dentro dele que nunca, mais nunca mais vai sair dali.
Eurico (Da cochia) (Alto) Fique quieta!!

Ana (Alto) Eu tenho que te fala uma coisa

Ferreira (Da cochia) (Alto) Fale rápido que estamos saindo

Eurico (Da cochia) (Alto) Vai fala

Ana (Alto) Eu... eu estou grávida de você

Dois barrulhos de tiro

Música IDK You Yet de Alexander 23 começa a tocar

Ana leva esses tiros na barriga, ela começa a sangrar e gritar muito.
Ana cai no chão, e dá o seu texto no chão

Ana Gabriela (Chão) De saudade não morro. Não hoje, não dessa vez. Eu já morri algumas
vezes, eu confesso, mas toda vez que eu me via levantando do túmulo e deixando a poeira
pra trás, com a pele gasta e a falta de esperança, eu demorei tempos para me recompor.
Talvez porque a decomposição fosse o mais viável, quando a morte lhe atinge e te arranca
pedaços. O fato é que desde que você foi caminhar por outros cemitérios e tentar matar
mais almas por aí, eu me deixei ressurgir, mesmo antes do óbito, vi que a saudade já não
valia mais a pena, quando eu te vi dar adeus também te vi dizer oi pra outra, tão coitada
como eu, espero que ela tenha força e não se suicide junto a ti, espero que ela perceba a
dor de se ter o anjo da morte caminhando lado a lado, mas sem tempo pra vida.

Eurico e Ferreira (Cochia/Juntos) Fale tudo!!!

Ana Gabriela (Chão) Às 20h e 34 da noite. Coisas acabam, livros, filmes, fins de tarde
ensolarados, amizades, papos prolongados, sobremesas de domingo, os próprios domingos,
amores sinceros, amores jovens, amores, algumas coisas já vêm com prazo de validade,
algumas terminam antes, outras enrolam por dias, meses, até anos, e acabam. Algumas
coisas tem que acabar, para assim coisas novas começarem, e talvez, acabarem de novo.
Ato II
Palco quadrado. Ana no centro de palco. Fitas e panos no palco para performance.
Troca de cenário com a música “Desses Nadas”
Performance de Fita a Ana

Performance de Pano a Ferreira e Eurico

Eurico e Ferreira deitados um de frente para o outro na frente do palco; Ana em pé atrás
dos dois

Eurico (Alto) Viver me causa náusea. Na verdade, pensar sobre viver me causa náusea,
porque a partir do momento que eu começa a estrinchar tudo o que consiste, oque fazemos
o que eu faço, as trocas, silêncio, seus olhares, mercados, obrigações, mercadoria, eu como
mercadoria, sistema, tempo, idade, mote, memoria, fim, esquecimento. Tudo, tudo isso me
causa náusea, e pensar sobre um é necessariamente pensar sobre todos, sabe num ciclo,
num lupin eterno que eu me fui enfiada, eu queria que algum pseudo momento não
acreditar que seja só isso, sabe, eu quero me convencer por um milésimo de segundo que a
minha existência representa alguma coisa no mundo mesmo sabendo que não. Eu não sou
nada.

Ferreira (Alto) Se eu acabo amanhã. Meia dúzia de pessoas vão sentir a minha falta, depois
nada, o meu trabalho me substituiria, as pessoas com quem eu flerto, flertariam com
outras, quem eu me relacionei, seguiriam suas vidas mais que já seguem, e eu, nada, nadica
de nada, nenhuma marca ou registo meu no mundo, quase como se eu nunca tivesse
existido, talvez eu realmente nunca tenha. Quantas pessoas já pseudo existiram por um
pseudo momento, sabe, quantas pessoas viveram um ciclo eterno e hoje não são nada,
nadica de nada, quantos milhões de ninguém nesse mundo já brigou, esse país já brigou,
esse estado, cidade, essa casa, quantas...

Ana (Alto) Quantas pessoas que hoje não são nada, foram algo nos lugares em que hoje eu
possa estar pseudo alguma coisa. Eu preciso garantir que eu não vou ser nada só porque
não existe alguém olhando para mim, mas quanto mais eu quero sobreviver, mais enjoada
eu fico, viver me causa náusea, mas morrer me causa mais ainda.
Esperam a música acabar; Levantam e agradecem.

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