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RESUMO
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Políticas Educacionais e a Privatização: concepções, ações e tendências na educação pública
INTRODUÇÃO
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Políticas Educacionais e a Privatização: concepções, ações e tendências na educação pública
que atores do setor privado acabam participando ativamente da arena política e influenciando
decisivamente no debate educacional nacional.
Os autores acima citados, destacam que no conjunto da privatização exógena, amplia-se
e em vários países a subcontratação de serviços educativos “não básicos” como transporte
escolar, alimentação (merenda) e limpeza. A estes, temos que incluir o serviço de “portaria”
(ou segurança) das escolas. Como os autores colocam, esses serviços acabaram dissolven-
do-se no contexto da agenda neoliberal, como normalidade institucional, onde a eficiência e
economia é diretriz dos processos de gestão no contexto da “nova gestão pública”.
O trabalho de Adrião (2018) caracteriza formas pelas quais, a partir do final do século
XX, a privatização da educação básica se constitui. Em linhas gerais, identifica três grandes
dimensões: A primeira dimensão, relativa à privatização da oferta educacional, a segunda
refere-se à Privatização da gestão da educação e a terceira, à Privatização do currículo.
Face a este cenário fez-se necessário compreender o contexto local. Para tanto, este
texto procura mapear, refletir e analisar a interferência do setor privado na gestão da edu-
cação pública nas redes municipais do estado do Espírito Santo (ES). Logo, este trabalho
busca levantar, de forma preliminar, o conjunto dos contratos de serviços, nos quais existem
ganhos monetários de forma direta ou nas relações não lucrativas nos 78 municípios que
compõem o estado do ES.
METODOLOGIA
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Mesmo com essa exaustiva coleta de informações, percorremos os sítios tanto das
empresas, que trabalham a partir da lógica lucrativa, quanto os sítios dos institutos e funda-
ções que divulgam o trabalho a partir de uma perspectiva de ação social, para coletarmos
os locais de atuação e alcance dos serviços prestados.
Realizamos uma organização a partir da coleta de dados, tomando como referência
as seguintes categorias: a presença da terceirização dos serviços (merenda, limpeza, por-
taria/ vigilância); quais empresas, institutos ou fundações estão presentes na formação de
professores, na assessoria pedagógica e/ou modelo pedagógico; bem como na implanta-
ção de programas e com quais instituições os municípios têm celebrado convênios para
oferta de vagas.
Ressaltamos que o percurso de coleta de dados foi realizado de forma atenta e zelo-
sa. No entanto, podem existir mais informações que não foram encontradas, pelo fato de
muitos arranjos serem efetivados sem divulgação oficial.
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e suporte da educação pública. O PAES é estruturado em três eixos de trabalho: Apoio a
Gestão, Fortalecimento da Aprendizagem e Planejamento e Suporte (SEDU, 2019).
A Editora Positivo fornece o Sistema de Ensino Aprende Brasil, objetivando potenciali-
zar as qualidades das escolas dos Municípios, com um sistema completo, composto por um
conjunto específico de soluções e que oferece não só um material didático de qualidade, mas
também um amplo suporte na gestão escolar (EDITORA POSITIVO, 2019). Atualmente, o
Sistema de Ensino Aprende Brasil está sendo utilizado em 6 municípios capixabas.
A empresa Inova Consultoria em Educação LTDA ME desenvolve formações para
docentes e acompanhamento da gestão (INOVA, 2019), em aproximadamente 8 muni-
cípios estudados.
A Pearson Education do Brasil LTDA, atua, oferecendo para escolas públicas, por
meio do Name – Núcleo de Apoio a Municípios e Estados, consultoria pedagógica, forma-
ção continuada, portal da aprendizagem, avaliação da aprendizagem e serviços de idiomas
(PEARSON, 2019). No Espírito Santo, atua no município de Conceição do Castelo.
A Empresa Gualimp - Assessoria e Consultoria LTDA presta serviços de formação
continuada e assessoria pedagógica (GUALIMP, 2019). A partir dessa perspectiva a Gualimp
está presente em 5 municípios capixabas.
A empresa Wilivro se estrutura a partir da comercialização de um conjunto de recursos
pedagógicos e tecnológicos, afirma que pode transformar a educação por meio de diversas
soluções (WILIVRO, 2019). Está presente em um município do estado.
A “cesta” que compõe os contratos firmados entre as prefeituras municipais e a ini-
ciativa privada é integrada por atividades tradicionalmente desenvolvidas pelas equipes
pedagógicas dos órgãos da administração pública e das escolas: formação continuada de
educadores, efetivo acompanhamento das atividades docentes; investimento na produção
e distribuição de materiais didáticos aos alunos; processos de avaliação externa e interna,
entre as principais encontradas.
Por essa razão, para além dos problemas pedagógicos derivados da adoção de material
instrucional, em alguns casos desde a pré-escola, o que é importante destacar é o fato de
que as empresas privadas passam, ao vender os chamados “sistemas de ensino”, a inter-
ferir na gestão do próprio sistema escolar público local (ADRIÃO et al, 2009, p. 806). A res-
peito dessa interferência, concordamos com Costa (2019, p. 162) que afirma que “a ideia
de educação enquanto direito humano e bem público, nunca foi tão seriamente atacada e
ameaçada como vem ocorrendo a partir das reformas neoliberais e neoconservadoras do
último quarto de século XX e no presente século”.
Para além dos contratos firmados, as prefeituras pesquisadas realizam arranjos por meio
de vinculação com institutos e/ou fundações para prestação de serviços na área educacional,
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sem que estes tenham a perspectiva de lucro financeiro direto. Apresentaremos a seguir
alguns arranjos levantados na pesquisa, bem como sua influência na educação pública.
Como uma iniciativa do Instituto Natura, o TRILHAS surgiu com o objetivo de contribuir
para a formação continuada de professores alfabetizadores e estudantes de pedagogia,
afirmando colaborar para o desenvolvimento de alunos leitores e escritores até o 2º ano
do Ensino Fundamental (PORTAL TRILHAS, 2019). Nos municípios do Espírito Santo, o
programa está presente em 50 deles, com cursos presenciais e EAD.
O Ensina Brasil é uma organização sem fins lucrativos que visa mobilizar mais talentos e
desenvolver lideranças para transformar a educação, começando pela sala de aula (ENSINA
BRASIL, 2019). Está presente, no Espírito Santo, no município de Cariacica.
O Programa Boa Energia nas Escolas de iniciativa da EDP Escelsa tem a proposta
de formar professores a respeito do uso seguro e eficiente da energia elétrica (EDP, 2019).
Com essa metodologia tem alcançado 13 cidades do ES.
O Instituto Votorantim com o Programa “Parceria pela Valorização da Educação” busca
a partir de sua atuação contribuir para a melhoria da educação pública a partir da qualificação
de práticas de gestão, desenvolvendo competências para favorecer a atuação eficiente de
gestores educacionais e escolares, mobilizando comunidades em prol de uma educação
de qualidade (INSTITUTO VOTORANTIM, 2019). Com esse discurso, tem alcançado 9
cidades capixabas.
O Rede Escolaí que tem por objetivo promover a articulação da comunidade educativa
para que ela crie, de maneira colaborativa, soluções para seus desafios (REDE ESCOLAÍ,
2019), está presente em 3 municípios do ES.
A Fundação SM afirma que trabalha para fortalecer a educação pública, de forma
colaborativa com os governos municipais, estaduais e federal, organismos internacionais,
organizações da sociedade civil, institutos e fundações (SM, 2019). Está presente em Serra,
contribuindo com a implementação da primeira escola de tempo integral do município.
O Instituto de Corresponsabilidade pela Educação – ICE foi criado em 2003 por um
grupo de empresários motivados a conceber um novo modelo de escola e resgatar o pa-
drão de excelência do então decadente e secular Ginásio Pernambucano, localizado em
Recife (ICE, 2019). Esse instituto esteve presente em um dos municípios para a imple-
mentação de três escolas de Tempo Integral, em parceria com o Movimento Empresarial
Espírito Santo em Ação.
O SEBRAE com o curso Jovem Empreendedor Primeiros Passos (JEPP) está presente
em 2 municípios e se articula mediante a capacitação de professores, fornecimento de livros
didáticos para os alunos e o acompanhamento/monitoramento pedagógico da metodolo-
gia (O JEPP, 2019).
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Ao apontarmos os programas/projetos das instituições/fundações refletimos com Freitas,
2014 quando este destaca o que está em jogo nessa política, a disputa pelo controle tanto
da “gestão” escolar como do próprio “processo formativo” da juventude (objetivos, métodos
e conteúdos), ambos aspectos fundamentais para o controle ideológico e seu alinhamento
à lógica das necessidades do aparato produtivo.
Outro arranjo presente nos municípios capixabas se dá pelo repasse de verba para o
Movimento de Educação Promocional do Espírito Santo (MEPES) nas Escolas Família Agrícola
e Escolas Família Turismo, com intuito de subsidiar vagas na Educação Básica. O MEPES é
uma associação civil de direito privado, de fins não econômicos, tem por finalidade promover
integralmente a pessoa humana, interagindo na saúde, educação e ação comunitária, sem
fins econômicos e está presente, atualmente, em 23 municípios capixabas (MEPES, 2019).
Os municípios de Pancas e São Domingos do Norte estabeleceram Termo de
Colaboração com a “Fundação Presbiteriana Educacional e Assistencial Rev Gedeon José
Lidorio” para a transferência de recursos financeiros com intuito de atender a Educação Infantil.
A respeito do repasse de verbas, a fim de conceder vagas na Educação Básica, Adrião
(2018, p. 13) apud Borghi et al. (2014, p.72) aponta, para a Educação Infantil, os tipos de
subsídios comuns no Brasil: Repasse por número de matrícula com frequência gratuita;
repasse de um valor fixo, quando a repasse não tem relação com a matrícula e custeio de
itens de manutenção da escola, como cessão de prédios, de funcionários e insumos varia-
dos. Destaca ainda que mesmo que esse formato se refira à educação infantil, é possível
encontrar estes formatos nas demais etapas de escolaridade.
A configuração a privatização da oferta educacional, por meio da vigência de mecanis-
mos de subsídio público a organizações privadas por meio de contratos, convênios, termos
de parceria e de cooperação, pois há repasses financeiros para a manutenção da oferta da
educação obrigatória a essas instituições (ADRIÃO, 2018).
Em relação às atividades terceirizadas, atualmente, na educação pública municipal
do ES os serviços como limpeza, merenda, vigilância/portaria são realizados em sua maioria
por servidores públicos. Aproximadamente 15,4%, 17,9% e 10,25% são realizados por empre-
sas terceirizadas, respectivamente, nas atividades de merenda, limpeza e vigilância/portaria.
Freitas (2018) realiza um alerta ao afirmar que o propósito dos neoliberais é destruir
a “educação pública de gestão pública” e não apenas defini-la, querem o Estado apenas
como provedor de recursos públicos, não como gestor. Exatamente o que acontece com a
realização de contratos para os serviços de limpeza, merenda, vigilância/portaria, o Estado
paga pelos serviços, mas não realiza a gestão das atividades.
A tabela a seguir sintetiza a relação dos arranjos com o setor privado nos municípios
capixabas, separados pelas 10 microrregiões do Espírito Santo, segundo o Instituto Jones
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dos Santos Neves. O arranjo I representa a presença de arranjos que se relacionam dire-
tamente com a gestão pedagógica da escola vendendo produtos (formação, assessoria
pedagógica, livros didáticos ou apostilas e programas educacionais); o arranjo II representa
a presença de arranjos que se relacionam diretamente com a gestão pedagógica da escola
ofertando os serviços/produtos anteriormente citados sem ganhos financeiros aparentes; o
arranjo III representa a presença de convênios concedidos para oferta de vagas na educação
básica; o arranjo IV representa a presença atividades terceirizadas de merenda, vigilância/
portaria e limpeza.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Considerando que o tema tratado ameaça a educação pública capixaba serão neces-
sários aprofundamentos e constantes estudos, pois conhecendo os esquemas e caminhos
efetuaremos frente às intencionalidades do setor privado.
REFERÊNCIAS
1. ADRIÃO, T. et al. 2009. Uma modalidade peculiar de privatização da educação pública: a
aquisição de “sistemas de ensino” por municípios paulistas. Educ. Soc., Campinas, vol. 30,
n. 108, p. 799-818.
10. FREITAS, L. C. A Reforma Empresarial da Educação: Nova direita, velhas ideias. São Paulo:
Expressão Popular, 2018.
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14. INSTITUTO VOTORANTIM. Disponível em: <www.institutovotorantim.org.br/>. Acesso em:
21 mar. 2019.
18. PACTO PELA APRENDIZAGEM NO ESPÍRITO SANTO – PAES. Disponível em: <https://sedu.
es.gov.br/paes >. Acesso em: 20 mar. 2019.
22. PROGRAMA “BOA ENERGIA NAS ESCOLAS” ENSINA ECONOMIA DE ENERGIA AOS EDU-
CADORES MUNICIPAIS. Disponível em: <https://www.cariacica.es.gov.br/noticias/13595/
programa-boa-energia-nas-escolas-ensina-economia-deenergia-aos-educadores-municipais>.
Acesso em: 22 mar. 2019.
23. REDE ESCOLAÍ. Disponível em: <http://www.redeescolai.com.br/>. Acesso em: 22 mar. 2019.
24. ROBERTSON, S.; VERGER, A. A origem das parcerias público-privada na governança global
da educação. Educação& Sociedade, v. 33, n. 121, p. 1133-1156, dez. 2012. ISSN 0101-
7330. 2012
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