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Fichamento do Texto: A Educação Pública e sua Relação com o Setor

Privado : implicações para a democracia educacional.

"Os princípios de descentralização, autonomia escolar e participação, que anteriormente


constituíam os pilares do diálogo sobre a gestão democrática da educação, atualmente
apresentam uma essência pouco democrática, ao servirem, na realidade, para encobrir a
falta de responsabilidade do governo diante da situação educacional no Brasil." Pág.107;

"Atribuir a origem da crise exclusivamente a uma crise fiscal e ao modelo de intervenção


estatal, conforme diagnosticado pelo neoliberalismo e pela Terceira Via, negligencia sua
conexão com a crise mais ampla do sistema capitalista. Isso resulta em duas principais
consequências para o debate proposto neste texto: a) o Estado é instado a adotar o
mercado como padrão de qualidade, e b) as instituições públicas, especialmente as
estatais, são despojadas de seu papel central na implementação das políticas públicas
(PERONI, 2003; PERONI; ADRIÃO, 2005). Essas consequências redefinem o papel do Estado
e sua relação com o setor privado."pág.108;

"Com base nesse diagnóstico, duas soluções são propostas: a racionalização dos recursos
e a diminuição do poder das instituições, argumentando que as instituições democráticas
são suscetíveis a pressões e demandas populares, além de serem vistas como improdutivas
dentro da lógica de mercado. Consequentemente, a responsabilidade pela implementação
das políticas sociais deve ser transferida para a sociedade: os neoliberais advogam pela
privatização (mercado), enquanto a Terceira Via defende a gestão por entidades
não-estatais (sem fins lucrativos) (PERONI, 2006, p. 14)." pág.109;
"De acordo com o redesenho proposto para a reforma do Estado, duas tendências se
destacam: em uma delas, o Estado se afasta da execução direta, mantendo-se como
financiador e avaliador das políticas sociais, agora entregues a diferentes agentes privados,
configurando o que tem sido identificado como propriedade pública não-estatal. Na outra
tendência, embora a propriedade das atividades ou serviços permaneça sob controle do
Estado, eles passam a ser geridos segundo a lógica de mercado, caracterizando o que é
conhecido como o quase-mercado (PERONI; ADRIÃO, 2005)." - pág 109;

"Destacamos dois movimentos que concretizam essa transição na execução das políticas
sociais: através da alteração do status jurídico de uma instituição estatal, que passa a
adotar uma natureza de direito privado (como ocorre nos casos das organizações sociais,
fundações, conselhos escolares transformados em Unidades Executoras etc.); ou por meio
do estabelecimento de parcerias entre o Estado e instituições privadas sem fins lucrativos,
amplamente identificadas como parte do Terceiro Setor, para a implementação das políticas
sociais. Com o quase-mercado, a propriedade permanece sob controle estatal, mas a
gestão é orientada pela lógica de mercado, principalmente devido à crença de que o
mercado é mais eficiente e produtivo do que o Estado, um aspecto da teoria neoliberal
compartilhado pela Terceira Via" - pág. 109-110;

"As parcerias público-privadas presentes na educação básica refletem tanto a abordagem


do público não estatal quanto a do quase-mercado, pois o sistema público acaba adotando
a lógica de gestão proposta pelo setor privado ao introduzir os princípios da chamada
administração gerencial ou nova gestão pública... De acordo com o autor, há ideias-chave
consistentes:

● A percepção do gasto público como custo improdutivo, ao contrário de um


investimento coletivo e social;
● A representação dos servidores públicos como adversários da sociedade,
privilegiados e defensores de interesses particulares;
● A crítica à interferência negativa do Estado nos mercados e a defesa da supremacia
destes últimos como mecanismos mais adequados de distribuição de bens e
serviços à sociedade;
● A definição do Estado como principal promotor/empreendedor, em vez de provedor
de bens e serviços sociais;
● A importação de práticas de gestão comuns ao setor privado, incluindo questões
como eficiência, eficácia, produtividade, avaliação e controle de resultados,
satisfação do cliente, delegação e gestão participativa, prevenção e controle de
gastos;
● A ênfase na importância do poder e na mudança de papel dos chamados
administradores públicos para gerentes ou gestores públicos profissionalizados,
com um perfil voltado para a noção de orientador/integrador e empreendedor, em
contraste com o papel de supervisor ou administrador (Junquilho, 2002, p. 2)" - pág.
110-111;

"No campo educacional, tem-se observado a adoção de diversas políticas de convênio e


parcerias, como a compra de material apostilado, a aquisição de sistemas de gestão
desenvolvidos por instituições com ou sem fins lucrativos, o aumento das matrículas
financiadas por recursos públicos em instituições privadas, além da terceirização de
serviços como fornecimento de merendas e contratação de funcionários que não fazem
parte do quadro do magistério" - pág. 111;

"A política educacional resultante da aquisição de uma 'cesta de produtos ou insumos


adquiridos no mercado educacional', além de não resultar de discussões com a comunidade
escolar, uma vez que é definida em conformidade com um padrão estabelecido pelo setor
privado, redefine o espaço público e reduz sua autonomia em relação ao setor privado. Tal
situação é ainda mais evidente nos municípios, considerando as dificuldades
político-administrativas que essa esfera governamental enfrenta" - pág. 111;

"Há outra maneira pela qual o campo educacional tem se adaptado aos princípios da Nova
Gestão Pública, que é através do financiamento ou subsídio pelo poder público a escolas
e/ou instituições privadas com ou sem fins lucrativos. A justificativa para esse fenômeno é a
necessidade de garantir o direito à educação básica, o que tem levado à proliferação de
programas de 'compra' de vagas em escolas privadas em detrimento da expansão de vagas
em escolas públicas. Essa tendência, historicamente presente no que diz respeito ao direito
das crianças à creche, tem se expandido para a educação infantil, de modo que, em alguns
casos, a própria estatística educacional é comprometida, já que o município considera
como pública a vaga oferecida pela instituição privada, embora subsidiada por ele. Esse
movimento indica uma preocupante ampliação da oferta de atendimento custeada por
recursos públicos, mas subordinada à disponibilidade do setor privado" - pág. 112;

"As consequências para a gestão da educação pública, especialmente para a gestão


democrática da educação, são questionáveis ​diante da padronização e da determinação do
que e como ensinar. Como garantir a autonomia já limitada, mas duramente conquistada,
das escolas para desenvolverem suas propostas pedagógicas em parceria com a
comunidade usuária?" - pág. 113;

"Embora seja verdade que os sistemas públicos de ensino e as escolas tenham feito pouco
para garantir o direito à educação para a maioria, dada a persistência de vários mecanismos
de exclusão, é igualmente verdade que delegar a entidades fora do setor público, sobre as
quais o controle social é ainda mais difícil, a responsabilidade por atender à demanda e
gerenciar a política educacional não contribuirá significativamente para a extensão do
direito à educação, especialmente porque somente o Estado, por sua natureza universalista
e, ainda que limitada, sua condição contraditória, pode fazer isso" - pág. 113

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