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CRÍTICA DA RAZÃO NEGRA

título original: Critique de la raison negre


Achille Mbembe hille M m e
© Éditions La Découverte, Paris, 2013, 2015
© n-1 edições, 2018
,
Embora adote a maioria dos usos editor-iais do âmbito brasileiro, a n-1 edições
não segue necessariamente as convenções das instituições normativas,
pois considera a edição um trabalho de criação que deve interagir com a
1
pluralidade de linguagens e a especificidade de cada obra publicada.

COORDENAÇÃO EDITORIAL Peter Pá] Pelbart e Ricardo Muniz Fernandes


ASSISTENTE EDITORIAL Inês Mendonça
PROJETO GRÁFICO Érico Peretta
TRADUÇÃO Sebastião Nascimento
PREPARAÇÃO Tadeu Breda

Este livro, publicado no âmbito do Programa de Apoio à Publicação ano 2018 Carlos
Drummond de Andrade do Instituto Francês do Brasil, contou com o apoio do
Ministério francês da Europa e das Relações Exteriores 1 Cet ouvrage, publié dans le cadre
du Programme d'Aide à la Publication année 2018 Carlos Drummond de Andrade de l'Institut
Français du Brési~ bénéficie du soutien du Ministere de l'Europe et des Affaires étrangeres.

Este livro contou com o apoio à publicação do Institut Français 1 Cet ouvrage a bénéficié
du soutien des Programmes d'aides à la publication de l'Institut Français

BRASIL
t~Ts Llbertl•Égalllé• Fr11temirr!
RÉPUBLIQUE FRANÇAISE

AMBASSADE DE PRANCR
AU B'RÉSIL

A presente edição contou com o apoio de Flávia Lacerda.

A reprodução parcial sem fins lucrativos deste livro, para uso privado ou
coletivo, em qualquer meio, está autorizada, desde que citada a fonte.
Se for necessária a reprodução na íntegra, solicita-se entrar em contato
com os editores. TRADUÇÃO Sebastião Nascimento
n-1edicoes.org
... estas cabeças humanas, estas colheitas de
orelhas, estas casas queimadas, estas invasões
góticas, este sangue que fumega, estas cidades
que se evaporam à lâmina do gládio, não é a tão
baixo preço que nos desembaraçaremos delas.
Aimé Césaire, Discurso sobre o colonialismo
Capítulo 4
11 O devir-negro do mundo 185 O pequeno segredo
Vertiginoso conjunto Histórias do potentado
A raça no futuro O espelho enigmático
Erótica da mercadoria
1 O tempo negro
27 O sujeito racial Corpos, estátuas e efígies
Fabulação e clausura do espírito
Recalibragem Capítulo 5
O substantivo "negro" 229 Réquiem para o escravo
Aparências, verdade e simulacros Multiplicidade e excedente
A lógica do curral O farrapo humano
Do escravo e do espectro
2 Da vida e do trabalho
79 O poço dos fantasmas
Uma humanidade sustada Capítulo 6
Atribuição, interiorização e inversão 263 Clínica do sujeito
O negro de branco e o branco de negro O senhor e o seu negro
Paradoxos do nome Luta de raças e autodeterminação
O kolossós do mundo A elevação em humanidade
Partilha do mundo O grande estrondo
O nacional-colonialismo A violência emancipadora do colonizado
Frivolidade e exotismo A nuvem de glória
Autocegamento Democracia e poética da raça
Limites da amizade
Epílogo
3 309 Existe um só mundo
143 Diferença e autodeterminação
Liberalismo e pessimismo racial
Um homem como os outros?
O universal e o particular
Tradição, memória e criação
A circulação dos mundos
O SUJEITO RACIAL

As páginas seguintes serão dedicadas à razão negra. Esse termo


ambíguo e polêmico designa várias coisas ao mesmo tempo:
figuras do saber; um modelo de exploração e depredação; um
paradigma da sujeição e das modalidades de sua superação,
e, por fim, um compleXQ.12§~Ssa espécie de jaula
enorme, na verdade uma complexa rede de desdobramentos,
de incertezas e de equívocos, tem a raça como armação.
Para nós, só é possível falar da raça (ou do racismo) numa
linguagem fatalmente imperfeita, dúbia, diria até inade-
quada. Por ora, bastará dizer que é uma forma de represen-
tação primária. Incapaz de distinguir entre o externo e o
interno, os invólucros e os conteúdos, ela remete, em pri-
meira instância, aos simulacros de superfície. Vista em pro-
fundidade, a raça é ademais um complexo perverso, gerador
de temores e tormentos, de perturbações do pensamento e
de terror, mas sobretudo de infinitos sofrimentos e, even-
tualmente, de catástrofes. Em sua dimensão fantasmagórica,
é uma figura da neurose fóbica, obsessiva e, por vezes, his-
térica. De resto, consiste naquilo que se consola odiando,
manejando o terror, praticando o alterocídio, isto é, consti-
tuindo o outro não como semelhante a si mesmo, mas como
-Ubii::!.º propriamente ameaç~dor, do qualé preE~~? ~(? E~9.!~,;.,,,.,,,
ger,_ desfaz~!~uu~ao--crcr~h:~l;;t:Ia:S~f1~sfü~~t~4e§irni.r,_x1a,•..."....x, •••
ímpõ~silJHiêlàde ~e asseW1~arseu cont~?le t?tat1)\l[as, como
eiplfoa Frantz Fanon, raça' é também' o'
no~~- q~e se deve

i. James Baldwin, Nobody Knows My Name, FirstVintage Intemational, Nova York,


1993 [1961].

27
dar ao ressentimento amargo, ao irrepreensível desejo de como mais genuínos - a luta de classes ou a luta de sexos, por
vingança, isto é, à raiva daqueles que, condenados à sujei- exemplo. Em muitos casos, é uma figura autônoma do real,
ção, veem-se com frequência obrigados a sofrer uma infini- cuja força e densidade se devem ao seu carácter extremamente
dade de injúrias, todos os tipos de estupros e humilhações, móvel, inconstante e caprichoso. Aliás, há bem pouco tempo,
e incontáveis feridas. 2 Neste livro, interpelaremos a natureza a ordem do mundo fundava-se num dualismo inaugural que
desse ressentimento, dando conta daquilo que constitui a encontrava Pªf!~i~~~~~-1~~!!f~~?S2~lUlQ_y~JhQ rnito_dasupe;~--­
raça, sua profundidade a um tempo ;eal e fictícia, as relações rioridade racial.s Em sua ávida necessidade de mitos desti-
por meio das quais se exprime e o papel que desempenha no nãdõsãlüiiêfâil{~~tar seu poder, o hemisfério ocidental con-
movimento que consiste, como aconteceu historicamente siderava-se o centro do globo, a terra natal da razão, da vida
com os povos de origem africana, em transformar a pessoa universal e da verdade da humanidade. Sendo o rincão mais
humana em coisa, objeto ou rnercadoria.3 "civilizado" do mundo1 só g_Q.ci.d~Jlt~_fQj,s;ªpaz.deinve11taP"um
""=·"''""~""

"dir~l!Q..Qâ§.Z~pt~~'.~.§9_:I~-"S'..QJJSeguiu edificar uma sociedade


Fabulação e clausura do espírito 'ciVTI das nações compreendida como um espaço público de
reciprocidade do direito. ~~~origem a uma ideia de ser
Pode surpreender o recurso ao conceito de raça, pelo menos humano dotado de direitos civis e políticos, permitindo-lhe
tal corno o esboçamos. Primeiramente, a raça não existe exercer seus poderes privados e públicos corno pessoa, como
enquanto fato natural físico, antropológico ou genético.4 A cidadão pertencente ao gênero humano e, enquanto tal, inte-
raça não passa de urna ficção útil, urna construção fantas- ressado por tudo o que é humano,_.§.9,0~e..cod,ificou urna gama
rnática ou urna projeção ideológica, cuja função é desviar a ·-· ..... ---·· ... ·--······-··-···· .-·--·-···"···~-Wlif'"
de costumes aceitos por diferentes povos, que abrangem os
atenção de conflitos considerados, sob outro ponto de vista, rituais diplomáticos, as leis da guerra, os direitos de conquista,
a moral pública e as boas maneiras, ~s técnicas do comércio,
2. Frantz Fanon, Pele negra ... , op. cit., p. 166; ver também Richard Wright Native Son
Harper & Brothers, Nova York, 1940. ' ' da religião e do governo. Q "'\lf·f'()í\U
3. Joseph C. Miller, Way of Death. Merchant Capitalism and the Angolan Slave Trade,
1730-1830, University ofWisconsin Press, Madison, 1996.
Q_~st9 _EE}},!:ª'-~-t~~-~-~-~<?_~<:~~~r=-~*:~~-~~!-~!;:,~S,~
4. Karen E. Fields e Barbara J. Fields propõem distinções úteis entre "raça" (a ideia
e ~,2J?,Q.s:kLRYià?~4.9_!!;~,gfiliy;Q,.::;;:;;.f.Q!!Sllt1ll-ª;.a~macifestaçao4lQ,t.
segundo a qual a natureza teria produzido humanidades distintas, reconhecíveis exce.lência da existência obje%:t1!l,S4.2.· A Africa, de um modo
~~~""'~~~·;w.i;•ii,,,;;;341@!!1*1;.
por traços inerentes e características específicas que consagrariam as suas diferen-
ças, ordenando-as segundo uma escala de desigualdade), "racismo" (o conjunto 5. Ver a este respeito Josiah C. Nott, Types of Mankind, Trubner & Co., Londres,
das práticas sociais, jurídicas, políticas, institucionais e outras fundadas na recusa 1854; a seguir, os três volumes de James Bryce, The American Commonwealth,
da presunção de igualdade entre as pessoas humanas) e o que eles chamaram Macmillan, Nova York, 1888; depois, do mesmo autor, The Relations of the Advanced
de~ (o repertório de manobras que pretendem situar os seres humanos and the Backward Races of Mankind, Clarendon Press, Londres, 1902, e Impressions
assim diferenciados em matrizes operacionais). Karen E. Fields e Barbara J. Fields, of South Africa, Macmillan, Londres, 1897; Charles H. Pearson, National Life and
IJ:_qc~qaft'.X~IL~Qll;[Ef!~!~~~!ftf Íf!j\_ri:zeri,çg:r;J.,t[e_,.Yerso, Nova York, 2012 (ver princi- Character. A Forecast, Macmillan, Londres, 1893; Lowe Kong Meng, Cheok Hong
palmente a mtrodução e a conclusão). Ler, ainda, W. J. T. Mitchell, Seeing through Cheon e Louis Ah Mouy (ed.), The Chinese Question in Australia 1878-79, F. F.
Race, Harvard University Press, Cambridge, 2012. ·
Bailliere, Melboume, 1879.

CHillCA DA t~AZÀO NEGf<A O SUJEITO RACIAL


pnnicular, eram apresentados como Tal fardo não nos conferia, porém, o direito de abusar
dessa vida vegetal e limitada. Figura sua inferioridade. Pelo contrário, deixávamo-nos guiar
a qualquer figura e, portanto, funda- um dever - o de ajudá-la e protegê-la. 9 Era o que fazia
ç; infigurável, o negro em particular era o exem-
'l!:?. c~npre~~~!rn·f!ltQ._fQ!!?.~~L~E::--~-~~:~.~~.~~-1,E;~~~-~lll!~!e
u.mndo desse ser-outro, vigorosamente forjado pelo · *~~1irilizadora" e "humanitária", cujo corolário de violência
,, .... , ,,,, '"''·'"''''""'''·"'''''1'''"-''''"'·"'''"'''''''''""'''""''''"'-'''''"'""''"''-''""-·---
e cttjo negativo havia penetraqo todos os momentos era senão mora .1 º
t~xistência - a morte do dia, a destruição e o perigo, a Na manel.rad~ pensar, classificar e imaginar os mundos
Inominável noite do mundo. 6 Hegel dizia a propósito de tais (\Istantes, o discurso europeu, tanto o erudito como o popu-
figuras que eram estátuas sem linguagem nem consciência com frequência rec:Q!!~m~E!<?cedimentos de fa?:;!!~!º·
'~"*<m'<~~'iO!it!--J!l!J't:f!:;.'>-"',é~·;)'~"f!.c!div·>J~;f;,.._'f~"-'Ó:iL
de si; entes humanos incapazes de se despir de uma vez por apresentar como reais, certos e exatos iatos mmtas vezes
• -

todas da figura animal com a qual se confundiam. No fundo inventados, escapou-lhe justamente o objeto que buscava
'···-··- .. .. '
er,a_da"8uan:ature?:ª ~briga,ro que já e~tav~morto.
, __ ,

~ipreender, mantendo com ele uma relação fundamentalmente


Essas figuras eram.amarca dos povos ,:i~olados e insociá- l.rpaginária, ~~,~~0··q~ªnãô'suà pret~~sãõ'~rã···~êsê~vo.lver
veis, que em seu ódio se combatem até a morte", se trucidam St;beres destinados_ apreenciê~IQQ:PJ~tivaínênte: )\'sPri11ci- a
e se destroem.como animais - uma espécie de humanidade paiscaracteri$Iiçª; dessarelação.imagiJ:l~i:Iª 3:i~9~.~~t~9:JQnge.. .
de vida inconstante e que, confundindo devir-humano e d.e. ser eluciqªqas, rn<ls .Rs.P.!9S~9:imen~os graças a~~ 9..~.~i~y~. .,.
devir-animal, tem de si mesmaumaconsciê,ncia afinal .... _,
"sem ~ - ·- ~rabalho de fab1:1!ação' pôde ganhar ~orpo:, â,ssiiTi coinose~s
. universalidade". 7 Outros, mais caridosos, admitiam que tais ~feitos viol~IÍto~, sã~ hoje bem co~hecidos. 1',ress~ sêntid~,
criaturas não eram inteiramente desprovidas de humanidade. há pouco a acress~ritar.~~~~htànto; sé êXisté'umobJ~tO''ê~rn"
Adormecida, essa humanidade não se tinha ainda lançado ' l~Lgar em que esta relação imagi~ári: e_ a e~onomia ficcional
aventura daquilo que Paul Valéry invocava como o "afasta <;i.~~~ ·ª·'~.1\,~,t~.n.t~.~,Q,io..a. x~x,.d,Q,,JJJJ.ilo,J.Uais.;,hmtal,;.~tiuto,~.~w
~_:mo sem :,~.tm::rto:~. 8 Era, no entanto, possível ~levá-la at'
:;;!~~~~~=~~~'.ii~J=:~~~~~~
Jj,i -~'"'··~~""'"'-"~r_.,.,_~~<M«"''''

6. Ver Pierre Larousse, Negre, Négrier, Traite des Negres. Trais articles du Grand
. meng,s,J:gn
cai:ª~tex:J.~~q,!lm"',Jl~m~om~.e~qlto

Dictionnaire universel du XIXe siecle, prefácio de Françoise Verges, Bleu autour, Paris, ~;'me próprio,
~'K%""""·'-""""'"
mas o indício de uma ausência de obra.
' ~,,_;'°"''""'"'"·'''"~'~''''i·~'.·'1'"Í~·~''"\'!·1ii:r.l~~'õf'.'<1..S.Oi:"".''''~·~lr~""..0"(~~"?sr.~z,,:f!iJi~fif~1~'"';»,::l,~{'f"]'.)2~)\';~1~ ,~,_;;·,"1,,~.·
1 '°'
2009,p.47. E vefâãiiê' que nem todos os negros sao arncanos e nem
7. Georg Wilhelm Friedrich Hegel, Fenomenologia do Espírito, 9ª· edição, tradução de
Paulo Meneses, Ed. Vozes, São Paulo, 2017, p. 469.
todos os africanos são negros. Apesar disso, pouco importa
~- ~a~afraseada ~elo autor como écart sans retour, a expressão original de Valéry onde eles estão. Enquanto objetos de discurso e objetos do
e ligeiramente diversa - éloignement sans retour -, preservando porém o mesmo
sentido; ver Paul Valéry, Introduction à la méthode de Léonard de Vinci, Éditions
de la Nouvel!e Revue Française, Paris, 1919 [1894], p. 27 [Introdução ao método de 9. Pierre Larousse, op. cit., p. 68.
Leonardo da Vinci, edição bilíngue francês/português, tradução de Geraldo Gérson to. Christopher Leslie Brown, Moral Capital. Foundations of British Abolitionism,
de Souza, Ed. 34, São Paulo, 1998, p. 146-147]. [N.T.] University of North Carolina Press, Chape! Hill, 2006.

30
CRÍTICA DA RAZÃO NEGl<A O SUJEITO RACIAL 31
conhech11ento, desde o início da época moderna, a África e e suas instituições das formas autóctones de servidão. Com 11

<J têm .mergulhado numa crise aguda tanto a teoria da ;fuit~s'XWéxrx, ohori~onte espacial da
non1inação quanto o estatuto e a função do signo e da repre- Europa alargou-se consideravelmente. O Atlântico foi-se
sentação. Aconteceu o mesmo com as relações entre o ser tornando o epicentro de ~~.!1,;,!JlQ.Y~tW.Ukat~~~'!.~~~,~~.~IJllJJl­
e a aparência, a verdade e a mentira, a razão e a desrazão, doST&4ugªr,à~2.~1~,,~Uf.~!filIL!::ltll.~.D,Ç?',~!!.,S2U~!;i~!lS1~tE!.~:1e­
em suma, entre a linguagem e a vida. De fato, sempre que se t<iiÍt~~Esse acontecimento se segue às tentativas europeias
tratou dos negros e da África, a razão, arruinada e esvaziada, anteriores de expansão rumo às Canárias, à Madeira, aos
jamais deixou de girar em falso e muitas vezes se perdeu Açores e às ilhas de Cabo Verde, correspondentes à etapa
num espaço aparentemente inacessível, onde, fulminada a inicial da economia de plantations utilizando mão. --"-"qçDhra
-- ~~ ~ ....~~- .... ~~ ~·-•·'-"'·-·_..~

linguagem, as próprias palavras careciam de memória. Com de_~§J~:ta'l:os. af:rJ~ç-ªnos. 12 -~ --- -~~ · ~ -~~ ~ ~

a extinção de suas funções elementares, a linguagem trans- A transformação de Espanha e Portugal - de colônias
formou-se num fabuloso mecanismo cuja força vem simul- periféricas do mundo árabe em motores da expansão tran-
taneamente de sua vulgaridade, de um formidável poder de satlântica europeia - coincidiu com o afluxo de africanos à
violação e de sua proliferação erradia. Ainda hoje e quando própria Península Ibérica, º,,,1li~l2~tt\S~!,~~!;,;,,S.~,,,1:llu:!i~º
se trata dessas duas marcas, a palavra nem sempre repre- çlÇls,, · · · ' · a ós a Peste Ne a (Black Death) e a
senta a coisa; o verdadeiro e o falso tornam-se indissociáveis Grande Fome,do. .século XIV. A maioria era e escravos '
.'1<fu.~~"2ll%M.'tfi0~~)1.~;9i~i%~~W>;'.Ji·,;A.~Y:;,"',,_,;,~-;r,\:-;..t\!:H;i;4.;f!,;'.';\<~):Jl•A~'%1&\ffi5f,:;;::<>:f,.-S1.
s
e a significação do signo não é necessariamente a mais ade- nem todos: também 'havia entre eles alguns homens livres.
quada à coisa significada. Não foi só o signo que substituiu a Se, até então, o aprovisionamento de escravos na Península
coisa. Muitas vezes, a palavra ou a imagem têm pouco a dizer ocorria por meio das rotas transaarianas controladas pelos
sobre o mundo objetivo. O mundo das palavras e dos signos mouros, operou-se uma reviravolta ~tn~'"""~ec.~"""~~ nos idos de i440, quando
autonomizou-se a tal ponto que não se tornou apenas uma os ibéricos inauguraram CQI1!<l:!()§Q.Ír§.LQJ>Sº!P a ~ric~LOci-
tela para apreensão do sujeito, de sua vida e das condições d~.mªl e_C,e,ntral viaOce~~o Atlântico.'õs primeiros negros
de sua produção, mas uma força em si, capaz de se libertar c:Pt~~7i<l~~·"'~;:;,·7ãzias"'ê''ê'õnvêrfrtto~"·~ objeto de leilões

;~~.~~~i~t~~~~~i~Y~fini~~:t~~i~C1i~~::i~!![:~1!~:~~~
de qualquer vínculo com a realidade. A razão disso pode ser
atribuída em grande medida à lei da raça.
Seria errôneo pensar que saímos definitivamente desse afiicana cresceu em decorrência.cl!ssoemilhares de esêrâvos
•• ' ,_ . . . . ·-•",.. - .' .. "<-;\ ·,'.•" '"'·~···"''" ··~·~ •• - ... .. , - • '-' ••• •... , ... ~

regime que teve o comércio negreiro e em seguida a colô-


nia de plantation ou simplesmente extrativista como cenas 11. Ver Suzanne Myers e Igor Kopytoff (eds.), Slavery in Africa. Historical and
originárias. :ti~§~.ª~.. ~i~s b~t.i~g,i(:l~S. ~a no~sa modernidade, Anthropological Perspectives, University ofWisconsin Press, Madison, 1979·

~~~:::::tn'~1~~ff~-:~·~~
12. Sobre esses processos, ver Benjamin Thomas, Timothy Hall e David Rutherford
(eds.), The Atlantic World ín the Age of Empire, Houghton Miffiin Company, Boston,
2001; Wim Klooster e Alfred Padula (eds.), The Atlantic World. Essays on Slavery,
capital, e é justamente isso que distingue o tráfico negreiro
• • .•. •"• •. - '"' "'"" " '.' ._ .. '-·-·· "• •.• ,_,,-'.-·-~'-'"·~·~"'.""-"-"·''"'{"'"'"·'-"'·,_ '"'•"';~."'),,;;.;;;;_s<,;;{<01,W,1';-:~.;.\,;:,':-.;if,
Migration, and Imagination, Pearson Prentice Hall, Upper Saddle River, 2005, p. i-42.

32 CRÍTICA DA RAZÃO NEGRA O SUJEITO RACIAL 33


"'pa,S.S,,lU'.g,D} ~ deserp,Q(lrcar an~almente em Portugal, ao ponto Ocidental e Central aos da América e da Europa. Essa estru-
o
de seu afluxo desestabilizar equilí5ríô-·cremográfJ0ood~@rtas tura de circulação se apoiava numa economia que exigia ela
,dqadesfüérica~: 13 Era ocaso de Lisboa, Sevilha e Cádiz, onde, rnesma capitais colossais. Incluía igualmente a transferência
po início do sécti19 xytÇçrc.a d~d~ipo~cemoda-populâçªo de metais e de produtos agrícolas e manufaturados, o desen-
era compo~tªR9L':1(rü:;auo,s. A maioria erãincümofüã.aecta~e­ volvimento da cobertura por seguros, da contabilidade e da
fas agrícolas e domésticas. 14 Em todos esses casos, quando i1tividade financeira, assim como a disseminação de conhe-
teve início a conquista das terras dá América, afro-ibéricos e cimentos e práticas culturais até então desconhecidos. Um
escravos africanos 4ut,~a,~am."triltJJ~\fJ:.~Ões marítimas, postos processo inédito de crioulização foi desencadeado e resultou
comerciais, plantações e-centros urb~;;·as'êfo'impêfiõ:1s Par- num intenso tráfego de religiões, línguas, tecnologias e cultu-
ticiparam de várias campanhas militares (Porto Rico, Cuba, ras. A consciência negra na era do primeiro capitalismo surgiu
Flórida) e fizeram parte, em 1519, dos regimentos de Hernã:n em p·artêd:essaâfüâffiíêa de movimento e circulação. Desse
Cortés que assaltaram o México. 16 ponto de vista, era o produto de uma tradição de viagens e de
A partir de 1492 e pelo viés do comércio triangular, o Atlâil_--- deslocameiitos;·apoiando,,,s.e.JJ..1JJJlâJQgis;_~.sl~=~çk§.naciGnaliza­
tico tornou-se um verdadeiro aglomerado, que agregou ;--
ção·•c1a.imagiJ1~Ç.~.~~...1;!!.!1.,,E~~~-~-§.ê2. gl,!~ RIQ.§.§.~~iRJ!..té..m€}ad~s
África, as Américas, o Caribe e a Europa em torno de uma
dOsécul0--XX.e..a~R1PPª~h~u .~·.maio,~ P~!!~.~S,~.,~E~.!lç!~~,..movi-
intrincada economia. Abarcando regiões outrora relativa- men~os de~~ãncipaÇãüY;- · · ········ ····
mente autônomas, e como vasta formação oceânico-conti- Entre 163'0'e-i78õ:··õ··;úmero de africanos que desembarca-
nental, esse conjunto inter-hemisférico se tornou o motor de ram nas possessões atlânticas da Grã-Bretanha ultrapassou de
transformações sem paralelo na história mundial. Os povos longe o de europeus. 18 O fim do século XVIII constituiu, nessa
de origem africana estavam no centro dessas novas dinâmicas perspectiva, o g-ran~J)J;Q,.Jle.guL~~i;itânioo..~........... /
que implicavam incessantes idas e vindas de uma margem Não se trata;ã'S~ente de cargueiros humanos que, partindo
a outra do mesmo oceano, dos portos negreiros da África de entrepostos e portos de escravos da África Ocidental e do
golfo do Biafra, depositavam homens na Jamaica e nos Esta-
13. Jorge Fonseca, "Black Africans in Portugal during Cleynaerts's Visit, 1533-1538",
dos Unidos. Lado a lado com o macabro comércio de escra-
in Thomas Earle. e Kate Lowe (eds.), Black Africans in Renaissance Europe, Cambridge vos cujo objetivo era o lucro, existiam também movimen-
University Press, Cambridge, 1995, p. u3-12i. Ver também A. C. de C. M. Saunders, tos de africanos livres, novos.colonos que, antigos "pobres
A Social History of Black Slaves and Freedmen in Portugal, 1441-1555, Cambridge
University Press, Cambridge, 1982. n.~~~~~k E.~~~~~~gf~l:~~~~-·ôu'refügiãdõs·aa:·rruerrãae··
14- Frédéric Mauro, Le Portugal et l'Atlantique au XVIIe siecle (1570-1670 ), SEVEPEN, ''~--
1 Paris, 1960.
17. Ver o estudo de Michelle Ann Stephens, Black Empire. The Masculine. Glo~al
15. Ben Vinson, ~?,Cftj!}l~j}!fl'l!_[o_~h.fS.}}!_aj~sty. T_he Free-Colored Militia in Colonial Imaginary of Caribbean Intellectuals in the United States, 1914-1962, Duke Umvers1ty
Mgq~o_, Stanford University Press, Stanford, 2ooi.
Press, Durham, 2005.
16:·v;;o caso de Juan Garrido em Matthew Restai!, "Black Conquistadors. Armed
18. David Eltis, Coerced and Free Migrations. Global Perspectives, Stanford University
Africans in Early Spanish America", The Americas, vol. 57, nQ 2, Outubro 2000, p. 177.
Press, Stanford, 2002.

34 CRÍTICA DA RAZÃO NEGRA O SUJEITO RACIAL 35


Independência dos Estados Unidos, partiam da Nova Escó- ou ainda o escravo liberto ou o escravo de nascença. Entre
cia, da Virgínia ou da Carolina para instalar novas colônias na 1776 e i825, a Europa perdeu a maior parte de suas colônias
própria África, como no ~2~~~~Q"'~ americanas devido a uma série de revoluções, movimentos de
A transnacionalização é:fi:i:"'condiÇão negra foi, portanto, um independência e rebeliões. Os afro-latinos tinham desempe-
momento constitutivo da modernidade, tendo sido o Atlân- nhado um papel preponderante na constituição dos impérios
tico o seu lugar de incubação. Essa condição abarcou em si ibero-hispânicos. Haviam servido não só como mão de obra
um inventário de situações muito contrastantes, indo do escrava, mas também enquanto tripulantes, exploradores,
escravo traficado, convertido em objeto de venda, ao escravo oficiais, colonos, proprietários de terra e, em certos casos,
por condenação, o escravo de subsistência (criado domés- homens livres e senhores de escravos.21 Quando da dissolução
tico perpétuo), o escravo parceleiro, o meeiro, 2º o manumisso, dos impérios e dos levantes anticoloniais ao longo do século
XIX, voltamos a encontrá-los em diversos papéis, seja como
19-,i:iexander.x. Byrd, Captives and Voyagers. Black Migrants across the Eighteenth-Century soldados, seja a encabeçar movimentos políticos. Com as
Bntish Atlantzc World, Louisiana State University Press, Baton Rouge, 2008; Philip D. estruturas imperiais do nmndo atlântico arruinadas e subs-
Morgan, "British Encounters with Africans and African-Americans, circa 1600-1780", in
Bem~rd Ba'.1?°'11 e Phi~ip D. Morgan (eds.), Strangers within the Realm. Cultural Margins of tituídas pelos Estados-nações, as relações entre as colônias
the Fzrst Bntish Empzre, University ofNorth Carolina Press, Chape! Hill, 1991; Stephen e a metrópole sofreram alterações. Uma classe de brancos
J. Br~dwood, Black Poor and White Philantropists. London's Blacks and the Foundation of crioulos se implantou e consolidou sua influência.22 As velhas
thi: Szerra ~eone Settlement, 1786-1820, Liverpool University Press, Liverpool, 1994; Ellen
G1bson Wilson, The Loyal Blacks, G. P. Putnam's Sons, Nova York, 1976. questões de heterogeneidade, diferença e liberdade foram res-
20. Os regii:ries de escravidão mencionados remetem ao escalonamento proposto por suscitadas, ao passo que as novas elites se aproveitaram da
~_t:~"~.~1~~ como etapas precedentes à manumissão. Segundo ele, ambos ideologia da mestiçagem para negar e desqualificar a questão
os regime$(mansé e case) implicavam o trabalho rural no cultivo de um lote de terra
concedido pelo senhor, diferindo ambos na destinação do produto desse cultivo. No racial. A contribuição dos afro-latinos e dos escravos negros
primeiro caso, a pessoa escravizada seria dispensada do trabalho nas terras senho- para o desenvolvimento histórico da América do Sul acabou
riai~ por algumas horas do dia ou por um ou mais dias na semana para que pudesse .
cultivar o lote de terra que lhe era confiado para sua própria subsistência e a de sua
sendo, se não apagada, pelo menos severamente ocultada. 23
família: "Nesse caso, o senhor gozava de uma renda em trabalho menor mas não
er~ n:ais obri~ado .ª fornecer aos escravos a totalidade da sua comida" CP· 93). o são.,E,arcelero e aparcero. Cf. Claude Meillassoux, Anthropologie de l'esclavage. Le ven-
adjetivo manse denva do vocábulo manse, originário do vocabulário feudal francês tre d~fer et d'argent, Presses universitaires de France, Paris, 1986 [Antropologia da
e corresponde à "medida de terra julgada necessária para sustentar ~""em e su~ escravidão: o ventre de ferro e dinheiro, Jorge Zallar, São Paulo, 1995; Antropologia de la
família (Dic. Litree)" (p. 257). No segundo caso, a pessoa escravizada seria inteira- esclavitud: El vientre de hierro y dinero, Siglo XXI, México D.F., 1990]. A numeração
me~te dispensada do trabalho nas terras senhoriais, dedicando-se integralmente ao das páginas citadas corresponde à edição brasileira. [N.T.]
cul~1vo do lote q~e lhe fora concedido, sendo que percentuais variáveis da produção 21. Matthew Restall, Zoe. cit.
obtida eram destmados ao senhor como pagamento ou quitação de algum encargo: 22. Lester Langley, The Americas in the Age of Revolution, 1750-1850, Yale University
"Esse pagamento era considerado como a redenção do trabalho nos campos do Press, New Haven, 1996; John Lynch, The Spanish American Revolutions, 1808-1826,
senhor. W.es.§_ªJér!!1E:!~i.2~-~-~SE\!Y9§ fQffi\;SÍát~lUJl~r~nc!a ~m Rroduto e não. mais W. W. Norton, Nova York, 1986 [1973]; John H. Elliott, Empires ofthe Atlantic World.
em_::abal~o" (p. 93). Na tradução brasileira, feita po;'iucy'Magillrã;~-·~~-por Britain and Spain in America 1492-1830, Yale University Press, New Haven, 2006.
Luiz reripe de Alencastro, a expressão mansé é traduzida por "feudatário" e~ca~- 23. Kim Butler, Freedoms Given, Freedom Won. Afro-Brazilians in Post-Abolition São
P~.~:~~;;j~g:'.;J~:fa tradução mexicana, d~rlvtõITn:a;··ãfi:fã<lliÇõ;;;·~';;";pe'~~ivas Paulo and Salvador, Rutgers University Press, New Brunswick, 1998; João José

36
CRÍTICA DA RAZÃO NEGRA O SUJEITO RACIAL 37
Crucial desse ponto de vista foi o caso do Haiti, cuja decla- Os primeiros escravos negros haviam desembarcado nos
ração de independência aconteceu em 1804, apenas vinte anos J:!stados Unidos em 1619. Na véspera da revolução contra os
após a dos Estados Unidos, assinalando urna reviravolta na ingleses, contavam-se mais de quinhentos mil nas colônias
história moderna da emancipação humana. No decorrer do t'~Ílcldes. Em 1776, cerca de cinco mil se enfileiraram como
século XVIII, o século das Luzes, a colônia de Santo Domingo t'JQldados ao lado dos patriotas, por mais que a maioria deles
foi o exemplo clássico da plantoçracia, urna ordem social, ;)tunais tivesse gozado do estatuto de cidadão: para a maior
política e econômica hierárquica encabeçada por um número t'>nrte deles, a luta contra a dominação britânica era indis-
relativamente reduzido de grupos brancos rivais, tendo nos sociável da luta contra o sistema escravagista. Desertando
estratos intermediários um grupo de homens livres de cor das plantações da Geórgia e da Carolina do Sul, cerca de dez
e mestiços e, na base, urna ampla maioria de escravos, mais tnil se juntaram às tropas inglesas. Outros, refugiados nos
da metade dos quais nascidos na África. 2 4 Ao contrário dos pântanos e nas florestas, engajavam-se no combate por su.a
outros movimentos de independência, a Revolução Haitiana própria libertação. No fim da guerra, cerca de catorze mil
foi o resultado de urna insurreição de escravos. A ela se deveu negros, alguns deles já livres, foram evacuados de Savan-
1 o surgimento, em i805, de urna das mais radicais Constitui- nah, Charleston e Nova York e transportados para a Flórida,
26
1
ções do Novo Mundo. Essa Constituição baniu a nobreza, ins- Nova Escócia, Jamaica e, mais tarde, para a África. A revo-
1
taurou a liberdade de culto e impugnou tanto o conceito de lução anticolonial contra os ingleses desembocou num para-
11 propriedade quanto o de escravidão - algo que a Revolução doxo:_129!_.~ laqç.,..a~xpansão,das..esferasJieJihe:i:dade_p_a:i:a..
111 Americana não ousara fazer. A nova Constituição do Haiti não os brm:iços,. po~. ºl1tr(), ~.C::.<2!1:§.2!!,g~ç~c:>.~~~.E~<:'.<::~4~E1!~.§JJQ_,
só aboliu a escravatura, corno também autorizou o confisco sisteTI?-a ~·~~~~~~iisiâ:Ern grande mecÜda, os pr~dutore~slQ
11
de terras dos colonos franceses, decapitando pelo caminho skü...ttililª-!ii~.Ç2-cÊErª~c.> ~lla.:J!~~i<iaC1e~ã:::cusrK9'.:<rrtaJ5ª11i!5..dos
grande parte da classe dominante; aboliu a distinção entre escravos,..QX;;}Ǫ~:5J-·§·sfül .mão.de,obra..s.e.tvil,-·G.s.Estados, Uni-
/1
nascimentos legítimos e ilegítimos, e levou às últimas con- dos instauraram a economia de divisão de classes no seio da
sequências as ideias, na altura revolucionárias, de igualdade população branca - divisões que conduziriam a disputas de
racial e de liberdade universal. 2s poder com consequências incalculáveis. 27
1
No decorrer do período atlântico aqui sucintamente
Rei.s, Sl~ve Rebellion in Brazil. The Muslim Uprising of 1835 in Bahia, Johns Hopkins
Umvers1ty Press, Londres, 1993 [Rebelião escrava no Brasil: a história do levante dos University of North Carolina Press, Chapell Hill, 2004; Robin Blackburn, The
mal~s em 1835, Companhia das Letras, São Paulo, 2003]; Colin Palmer, Slaves of the Overthrow of Colonial Slavery, 1776-1848, Verso, Londres, 1988; e Robin Blackburn,
Whzte God. Blacks in Mexico, 1570-1650, Harvard University Press, Cambridge, 1976. "Haiti, slavery, and the age of the democratic revolution", William and Mary
24. John Thornton, "African soldiers in the Haitian revolution", Journal of Caribbean Quarterly, vol. 63, nº 3, Outubro 2006, p. 643-674.
History, vol. 25, n2 1-2, 1991, p. 1101-1114. 26. Sidney Kaplan e Emma Nogrady Kaplan, The Black Presence in the Era of the
25. David Geggus (ed.), The Impact of the Haitian Revolution in the Atlantic World American Revolution, University of Massachusetts Press, Amherst, 1989.
University of South Carolina Press, Columbia, 2001; Laurent Dubois, A Colon; 27. Edmund Morgan, American Slavery, American Freedom. The Ordeal of Colonial
of Citizens. Revolution and Slave Emancipation in the French Caribbean, 1787-1804, Virgínia, W. W. Norton & Co., Nova York, 1973·

38 39
CRÍTICA DA RAZÃO NEGRA O SUJEITO RACIAL
~escrito, esta pequena província do planeta que é a Europa se rrmtieamenie as frgntç;i:r~~
' '·-·
..~ntre o crível ~ ...C:Ü~Sii~..,g
"-~"'-"'"""~"'~"""'''"~"'°·· ~· ~..,,-.""""~<;'Olc"-"'-~~"'"'-"~A'!·'-""'-''-"""'"-"'""'r'-'•-"~

mstalou progressivamente numa posição de comando sobre ~:a\l:ilbLOS.QO, e o factual. º


3

o resto do mundo. Paralelamente, ao longo do século XVIII, rimeir;"g;;~<le'ciâssificação das raças levada a cabo por
entraram em cena vários discursos de verdade acerca da natu- n ocorreu num ambiente em que a linguagem acerca
reza, da especificidade e das formas de vida, das qualidades, rnundos outros fora construída a partir dos preconceitos
~raç?s e c~racterísticas dos seres .humanos, de populações s ingênuos e sensualistas, aQ,Pfl~~(1_-q.Ue,.formas.J:le...:vida
mteiras diferenciadas em termos de espécies, gêneros ou emamente _ c,g.:rnplexas. ennn:r~m~!i9ª§.~P"l:LIª~impJici-
raças, classificados ao longo de uma linha vertical. 28 ·~ d~~ ~Pft~tos.31 Chamemos a isso o momento gregário
Paradoxalmente, foi também a época em que os povos )ensamento ocidental. Nele, o negro é representado como
e as culturas começaram a ser considerados como indivi- protótipo de uma figura pré-humana incapaz de escapar de
dualidades contidas em si mesmas. Cada comunidade - e animalidade, de se autoproduzir e de se erguer à altura
cada povo - era entendido como um corpo coletivo único. seu deus. Encerrado em suas sensações, tem dificuldade
Deixava de ser dotada somente de força própria, para ser ~nn quebrar a cadeia da necessidade biológica, razão pela qual
a unidade de base de uma história movida, assim ·se cria, n~lo chega a conferir a si mesmo uma forma verdadeiramente
por forças. surgidas apenas para aniquilar outras forças, humana nem a moldar seu mundo. É nisso que se distancia
numa luta de morte cujo desenlace só pode ser a liberdade da normalidade da espécie. O momento gregário do pensa-
ou a servidão. 29 A ampliação do horizonte espacial europeu mento ocidental foi, aliás, aquele ao longo do qual, com o
seguiu, pois, lado a lado com um constrangimento e uma auxílio do instinto imperialista, o ato de captar e de apreender
retração de sua imaginação cultural e histórica, e até, em foi progressivamente se desligando de qualquer tentativa de
certos casos, uma relativa clausura do espírito. De fato, uma conhecer a fundo aquilo de que se falava. A Razão na Histó-
vez identificados e classificados os gêneros, as espécies e as ria, de Hegel, representa o ponto culminante desse momento
raças, resta apenas indicar quais diferenças os distinguem gregário. D.m:ante:v:ªr.iQ§.ê,~S~!~~,~~~-,~~~;:~:l!~--~~~~~~--~·gue
uns dos outros. Essa relativa clausura do espírito não impli- sabemos advir iniciªlm~n!~"g-~-~§f~XélJ~:nim.aL~ SG1Yil1, em
Ri~!n~i!iJiii.b.~~~E~r~~~2m~-~r-~êJ~1!l!!,~1l-t1~~~~-r,:~~. ~~rge~i~~·
32

cou necessariamente a extinção da curiosidade em si. Porém,


desde a Alta Idade Média até a época das Luzes, a curiosi- o que então se chamava "estado de raça" correspondia, assim
dade enquanto faculdade do espírito e sensibilidade cultu-
. Essa clausura do espírito não impediu, porém, o desenvolvimento de um espÍ·
ral se manteve inseparável de um impressionante trabalho 30
rito de curiosidade. Ver Lorraine Daston e Katharine Park, Wonders and the Order
d~f@glª~. <?' que, ao incidir sobre ffii:intlos··e7utros .JJcrrrava of Nature, 1150-1750, Zone Books, Nova York, 2001.
-----·---w.-,.,,,,,.~ ......., ., ._.,., . . . . .
.-.-.•""•"''"'"'"'''''••A•••, """'"'''"f'"'''"'•••M~••o••.,-''
i. Georges-Louis Buffon, "Variétés dans l'espêce humaine", em His~oire ~aturelle,
3
28. V~r º.que diz a respeito Michel Foucault, As palavras e as coisas: uma arqueologia
générale et particuliere, avec la description du Cabinet du Roy, vol. 3, Impnmene royale,
das ciencias humanas, tradução de Salma Tannus Muchail, Martins Fontes São Paulo Paris, 1749, p. 371-530. . . .
2000 (principalmente o capítulo 5). ' ' . Friedrich w. Schelling, Introduction à la philosophie de la mythologie, Aub1er, Pans,
32
29. Éric Vogelin, Race et État, Vrin, Paris, 2007, p. 265. 1945 [1842], p. 109.

41
40 CRÍTICA DA RAZÃO NEGRA O SUJEITO RACIAL
se pensava, a um estado de degradação e a uma defecção de O negro da plantation era, todavia, uma figura múltipla.
natureza ontológica. A noção de raça permitia representar as Caçador de quilombolas34 e fugitivos, carrasco e ajudante de
humanidades não europeias como se tivessem sido tocadas carrasco, es~ informante, doméstico, cozinheiro,
por um ser inferior. Seriam o reflexo depauperado do homem liberto que se mantém cativo, concubina, roceiro dedicado ao
ideal, de quem estariam separadas por um intervalo de tempo corte da cana, encarregado do engenho, operador de maqui-
intransponível, uma diferença praticamente insuperável. naria, acompanhante de seu senhor e guerreiro ocasional.
Falar delas era, antes de mais nad·a, assinalar uma ausência Essas posições estavam longe de ser estáveis. De acordo com
- a ausência do mesmo - ou ainda uma presença alheia, a de
as circunstâncias,JJ~ão pqg!ê~.8-;.;~~~:,rie~te ser "con-
monstros e fósseis. Se o fóssil, escreve Foucault, é "aquilo que
deixa subsistir as semelhanças através de todos os desvios que --~~~~~:.~~91~..P~,~~ar,
a natureza percorreu" e se funciona sobretudo como "uma
forma longínqua e aproximativa da identidade'', o monstro,
~~~]i~~~~ii~i:~:~~~r:ii~li%~~~~~:Rg2H~~~~~
caç.ªQ2E_cJ.e escravos. .
por sua vez, "n.a.r,~~~tw.:a,,.a.gfa;1~~~affe­
re,~33 No grande quadro das espécies, gêneros,· raças e
o _negrÕ"êl'a:··:pl~!;t,cr.tf9n ..~!:éli ~cJ.~II1~~s,~q11e,1: que se havia
classes, o negro, em sua magnífica obscuridade, representa a
SQ~.liiiii4?~.n2',é,.~!2 ~2~ s~g!,2~,,.~J.:.~2.1?!~~~.~.S? (l()~.,.Q:utros
:tl.<;fil2.~: O que caracterizava a plantation, no entanto, não eram
síntese dessas duas figuras. Mas o negro não existe enquanto
apenas as formas se~entárias de sujeição, a desconfiança, as
tal. Ele é constantemente produzido. Produzi-lo é gerar um intrigas, rivalidades e ciúmes, o jogo movediço das alianças, as
vínculo social de sujeição e"um corycL!f:e~;xtra~o isto é, um táticas ambivalentes, feitas de cumplicidades e esquemas de
'""''''''''''''''''"q'''"'""' ''""'"" ' ~'"" -:J
corpo inteiramente exposto à vontade de um senhor e do qual toda espécie, assim como de canais de diferenciação decor-
nos esforçamos para obter o UJ..á:ximG,~·'fernnmt!\JJtQ. Sujeito rentes da reversibilidade das posições. Era também o fato de
a corveias de toda ordem, o B~gr_Q_éJ,ªU1QéIU,.Q.l1Q1ll~.•ds:.. uma que o vínculo social de exploração não havia sido estabelecido
inj.úrl_(l2 5?__8-f,1!1J29Jg cJ.o homem conf~çimacJ.()5~gm~Q':'~çuite e o de forma definitiva. Ele era constantemente posto em causa
sofrimentg, n~IIl ~ampo de batalha em gu~ se opõeII1[acções
e gr11pos ~ocial e r,a~ialmente se~entac1os. Er~ ~s~~,o caso
34. No original, marrons. Na língua portuguesa, o termo preferencial atribuído às
na maiofià dasplàntócracias insulares do Caribe, universos pessoas escravizadas que se evadiam do cativeiro foi tomada do quiU:-bund.o, de~c:e­
se~entários onde a lei da raça se assentava tanto no con- vendo a comunidade formada pelos fugitivos (quilombo, com o sentido enmologico
de arraial, união ou_acampamento) e, por derivação, seus fundadores ou habitantes
fronto entre fazendeiros brancos e escravos negros quanto (quilombolas). As variações encontradas na língua francesa - marron, negmarron,
na oposição entre os negros e os "livres de cor" muitas vezes e _cimarron - foram adotadas a partir do espanhol címarrón, derivado por sua vez da
mulatos libertos), sendo que alguns deles eram eles próprios 'Tí;c~~~aque, e também possuem correspondentes e'.11 regionalismo~ brasileiros
-:marrano, marruá, chimarrão-, mas a derivação de sentido para se refenr aos ex-ca-
senhores de escravos. tÍwsquebuscàv~fâãd'e não se operou no uso em língua portuguesa, que se
aplica preponderantemente em referência aos animais domesticados que se desgar-
33. Michel Foucault, op. cit., p. 216-217. ram e se tornam bravios e revoltos, em consonância com o sentido original dado ao
termo pelos aruaques, também preservado no seu uso em língua espanhola. [N.T.]

42
CRÍTICA DA RAZÃO NEGRA 43
O SUJEITO RACIAL
e precisava ser incessantemente produzido e reproduzido A plantélS~<? ![.<ll]:§fü!:!llQY:..se..gr.adualmente·numa-·instituiçã:o···
por meio de uma violência de tipo molecular, que ao mesmo econômica, disciplinar e penal. Os negros e seu§ Q~§ÇeJ1Qe!l!eê,,,
tempo suturava e saturava a relação servil. ·a·'"""·%•·•····a··'"I"""""·"w······a·.,.... ,,.,,,. • ,... . ,,.... ,,."'""d. . . . .---·-··-·""'", .•.
po iam, a 1 em .1ante, ser c;ompra os para sempre.
De tempos em tempos, ela explodia na forma de levantes, Ao longo do século XVII, um imenso trabalho 'legislativo
insurreições e complôs de escravos. Instituição paranoica, a veio selar o seu destino. A fabricação dos sujeitos raciais no
plantation vivia constantemente sop o regime do medo. Em continente americano começou por sua destituição cívica e,
vários aspectos, cumpria todos os requisitos de um campo, de portanto, pela consequente exclusão de privilégios e de direi-
um parque ou de uma sociedade paramilitar. O senhor escra- tos assegurados aos outros habitantes das colônias. Desde
vagista podia muito bem fazer sucederem-se as coerções, logo, não eram mais homens como todos os outros. Ela pros-
criar cadeias de dependência entre ele e seus escravos, alter- seguiu com a extensão da servidão perpétua a seus filhos e
nar terror e benevolência, mas sua vida era permanentemente descendentes. Essa primeira fase se consolidou num longo
assombrada pelo espectro do extermínio. O escravo negro, processo de construção da incapacidade jurídica. A perda do
por sua vez, ou bem era aquele que se via constantemente no direito de recorrer aos tribunais fez do negro uma não pessoa
limiar da revolta, tentado a responder aos apelos lancinantes do ponto de vista jurídico. Agregou-se a esse dispositivo judi-
da liberdade ou da vingança, ou então aquele que, num gesto ciário uma série de códigos de legislação escravocrata, muitos
de sumo aviltamento e de abdicação radical do sujeito, pro- deles na sequência de levantes de escravo&~Co~sum~d~ ~ssa
curava proteger a própria vida deixando-se utilizar no projeto codificação, p()ge-se dizer que, por volta de ~7~§;_:a:·êfffriiiíi~a
de sujeição de si mesmo e de outros escravos. ~efztaa-m,~n-ã~~- q~eJ aêxfSira~~s1~a1~s-õci<l~I1~.él!§1J~~Qfi­
Além do ma1s, entre 1620 e 1640, as formas de servidão ~ia1n1eiife·a suaapariç~o .~<?S Esta9gE;\JgfªÇ)--~; ~-~Ll2lfm&t1Qn
mantiveram-se, particularmente nos Estados Unidos, relati- erª~ª~·Çfüii"..9.ii~·fªiI?~"iiTI<:lrra dos.§eY.s. SQJltQ!n,2s. Quanto
vamente indefinidas. O trabalho livre coexistia com a servidão ao negro, passou a ser a partir de então nada além de um
temporária (que é uma forma de sujeição transitória, de dura- bem móvel, pelo menos de um ponto de vista estritamente
ção limitada) e a escravidão (hereditária ou não). No seio do legal. A partir de 1670, impunha-se a questão de....sab~x;,..com0-
colonato, havia profundas divisões de classe, opondo também p01:,pªr·ª· trabalhar uma grªn,g~ qµa,11tidad~ de mã9_ c!e ol?;ra,..,a.w
o colonato à massa de cativos. Estes, no entanto, formavam fim..Q~"Yi. ªbül~i[ ªº-çQfile_n;;iªliza4si~Ql~ngg~<i~.
.ijil.ii"Pi2g"vs.
uma classe multirracial. Foi entre 1630 e 1680 que se deu a enGrmes..distªn.das. .,,Ain:Y_en.Ç.filLç!QJ:J-g~Q""J::iln&tituLa.xesp_a.s.ta. ."",,
bifurcação. É na verdade dessa época que data o nascimento a·essa,.ques!ãQ,Q.. 11egrn .f9iç1g.fütq,odem~nmç~ntrnLq.JJ~,. aQ.... -
da sociedade de plantation. O princípio da servidão perpétua permitcir. a-criação.,,po;r meJ() daplarz.tqtf911,.de. .uma,das.formas.,"'""
de pessoas de origem africana, estigmatizadas pela sua cor, mais.. efica4e.s de.,acumulação de.riqueza..na~épocaracele.r@u,.·
tomou-se progressivamente a regrél:9s_ªfriç_aJlQ. §~~. §l!.ª.•pr,0- a iritegraç.ão do cªpita1ismo merça,ntil, dª .JJlJ~çanj2íªç.ão..e ..d0·~""
1 genitura tornaram-se escravos perpétuos.As.dL~tj11ç9e~Lentre corttrole do trabalho subordinado. Aplantation representava
·sêrvõs brancos e escravos negros afirmaram-se de forma clara.
.._,~~-~~~-,--'~ J~·-·'~" ._,,.,,,_."""'"-·---,-~"·"· ---•----~-·-· ~-"-""~·~,w;•,,,~,..·''"''" ·..•~··-'·' · ~-,v-., -""-'"' º' • ._, " , . , • ' ' " ' "".., •·•~~"''-~-.. <o .,~·-«'é'-"""·':,«',õ;~-<,.,.,cw •·v<""
na época uma grande inovação, e não simplesmente do ponto

44 CRÍTICA DA RAZÃO NEGRA O SUJEITO RACIAL 45


de vista da privação de liberdade, do controle de mobilidade Rccalibragem
da mão de obra e da aplicação ilimitada da violência. A inven-
ção do negro também abriu caminho para inovações cruciais r:\; verdade que o século XXI não é o século XIX, período que
nas áreas do transporte, da produção, da comercialização e assistiu a uma biologização determinante da raça no Oci-
dos seguros. dente, associada ao surto colonial na África. Foi também a
Apesar disso, nem todos os negr.os no Caribe ou nos Esta- época na qual, com a ajuda do pensamento evolucionista
dos Unidos eram escravos. A.racialização da servidão, espe- darwiniano e pós-darwiniano, ~![~~g!~~~~~::_iistas for~m •
cialmente nos Estados Unidos, levou os brancos, e sobretudo disse.mi!!.ª-~~~ por vários E~!§~.~.~E:. 2!!~es.são com a aegeriêr~,:_
os brancos pobres,35 prestadores de toda espécie de serviços, ·~ªº-~_g_§UiclclI2::~~alizou. 37 No eritãiirõ;benefiêfaiiao=se
a se distinguirem o mais que pudessem dos africanos, reduzi- do processo de globali~ãõeêfos efeitos contraditórios que
dos ao estatuto de escravos._~s ~o~~!~:'.!~2:,,I~,Ç~,ªY~O provoca por toda parte, a lógica da raça volta a irromper na
~~~5ue os separava dos escr~vos 11ã,g_fQ,Sg~.~~:an~ueJ_l>Jls,,,_­ consciência contemporânea.38 Um pouco por todo lado se rea-
tante. E"füâttdo momento, o hemisfério todo tevêocasião de viva a fabricação dos sujeitos raciais. 39 Ao preconceito de cor
-fê'S't'emunhar a emergência dos homens livres de co~, alguns herdado do tráfico de escravos e traduzido nas instituições de
dos quais chegando a ser proprietários de terras e de escra- segregação (como no caso das ~" nos Estados_
vos, e até mesmo patrões de brancos em servidão temporária. Unidos e do regime de apartheid na África do Sul), ao racismo
Resultante de ondas emancipatórias, nos lugares onde isso era antissemita e do modelo colonial de bestialização de grupos
possível, e de uniões mistas entre escravos negros e brancos considerados inferiores, vieram se somar novas constantes do
livres ou entre mulheres brancas livres e negros, a população racismo, com base em mutações das estruturas de ódio e na
de livres de cor foi gradualmente crescendo. Especialmente recomposição das figuras do inimigo íntimo. 4º Depois de um
no Caribe, o fenômeno de brancos que mantinham concubi-
!Y nas negras se tornou algo relativamente comum'. ~or D:lª!~~e York, 2007 [1974], p. xiii-xxiv; e Caryn Cossé Bell, Revolution, Romanticism, and the
!'\ .,.a s~gr~~ação racial fosse oficialm~gt_~ rigorq~a, a libertinage~~-­ Afro-Creole Protest Tradition in Louisiana, 1718-1868, Louisiana State University
i: inter-racial e ôconcubiható com mulheres de cor livres ou Press, Baton Rouge, 1997·

~ c~.ê.cravas, eram algo corriqueiro entre as elites br~~~~ 37. Edwin Black, War Against the Weak. Eugenics and America's Campaign to Create a
Master Race, Thunder's Mouth Press, Nova York, 2003.
38. Étienne Balibar fala, ao tratar desse tema, do "regresso da raça" (Étienne Balibar,
35. No original, "petits Blancs". No contexto colonial francês, sobretudo no que se "Le retour de la race", <www.mouvements.info>, 29 de março de 2007).
refere à sociedade colonial de Santo Domingo, a população branca se dividia em 39. Peter Wade, Blackness and Race Mixture. The Dynamics of Racial Identity in
grands blancs, estrato abastado composto por proprietários e burocratas, e petits Colombia, Johns Hopkins University Press, Baltimore, 1993; France W. Twine,
blancs, a camada dos artesãos e trabalhadores braçais brancos. [N.T.] Racism in a Racial Democracy. The Maintenance ofWhite Supremacy in Brazil, Rutgers
36. Acerca dos dilemas que resultam dessa mistura, ler Doris Garraway, The Libertine University Press, New Brunswick, 1998; Livio Sansone, Negritude sem etnicidade: o
Colony. Creolization in the Early French Caribbean, Duke University Press, Durham, local e o global nas relações raciais, culturas e identidades negras do Brasil, tradução de
2005 (em párticular os capítulos 4 e 5). Ver, para os Estados Unidos, Ira Berlin, Vera Ribeiro, EDUFBA, Salvador, 2004.
Slaves Without Masters. The Free Negro in the Antebellum South, The New Press, Nova 40. David Theo Goldberg, The Racial State, Blackwell, Oxford, 2002.

46 CRÍTICA DA RAZÃO NEGRA O SUJEITO RACIAL 47

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