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Universidade Estadual Paulista (UNESP)

Campus de São José do Rio Preto (IBILCE)


Curso de Licenciatura em Letras – Diurno/Noturno
Disciplina: Estudos do Texto e do Discurso
Docente: Dr. Eduardo Penhavel

Handout 5-a
Coesão Textual: a coesão referencial

1. Considerações iniciais

Definição de coesão textual

Costumou-se designar por coesão a forma pela qual os elementos linguísticos presentes na
superfície textual se interligam, se interconectam, por meio de recursos também linguísticos,
de modo a formar um “tecido” (tessitura), uma unidade de nível superior à da frase, que dela
difere qualitativamente (KOCH, 2004).

Formas de coesão textual: coesão referencial e coesão sequencial

Coesão referencial

A coesão referencial diz respeito ao processo pelo qual um elemento do texto faz
remissão a outro(s) elemento(s) do texto.

Coesão sequencial

A coesão sequencial diz respeito aos procedimentos linguísticos por meio dos quais se
estabelecem, entre segmentos do texto (enunciados, partes de enunciados, parágrafos e
mesmo sequencias textuais), diversos tipos de relações de sentido (semânticas e/ou
pragmático-discursivas), à medida que se faz o texto progredir (KOCH, 2004).

Objetivo da aula

Discutir o processo de coesão referencial

2. Caracterização do processo de coesão referencial

A coesão referencial, em termos mais tradicionais, pode ser entendida como o processo de
construção de cadeias referenciais. Ocorre quando uma expressão b retoma uma expressão a
(podendo, adicionalmente, uma expressão c retomar b e a, uma expressão d retomar c, b e a e assim
por diante), todas fazendo referência a um “mesmo elemento do mundo”, o referente (daí o termo
coesão referencial). Exemplo:

(1) Regina viajou para os EUA. Ela vai participar de um congresso de Linguística. A docente irá
apresentar um trabalho sobre Linguística Histórica.

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Com o desenvolvimento dos estudos em Linguística Textual, o processo de coesão referencial
passou a ser designado também de referenciação. Essa mudança deveu-se ao reconhecimento de
que as expressões referenciais (inclusive as que participam de uma cadeia referencial) não se
referem simplesmente a elementos do mundo, preexistentes ao texto. Na verdade, as próprias
expressões referenciais de um texto vão construindo os referentes a que se referem. Os referentes
deixam de ser vistos apenas como objetos do mundo (pré-existentes ao texto) e passam a ser
entendidos como objetos de discurso.

A esse respeito, Koch (2004, p. 58-59) diz o seguinte:

o discurso [texto] constrói aquilo a que faz remissão [...]. Isto é, todo discurso constrói uma
representação que opera como uma memória compartilhada, “publicamente” alimentada pelo
próprio discurso [...], sendo os sucessivos estágios dessa representação responsáveis, ao menos em
parte, pelas seleções feitas pelos interlocutores, particularmente em se tratando de expressões
referenciais.

Tal representação – a memória discursiva [...] – tem recebido os mais variados nomes na literatura,
como, por exemplo, esquematização [...], modelo de contexto [...], modelo de discurso […], fio ou
corrente do discurso […], modelo mental […], representação do discurso […], entre outras.

[...] uma expressão anafórica, nominal ou pronominal, consiste não em localizar um segmento
lingüístico (“antecedente”) ou um objeto específico no mundo, mas em estabelecer uma relação
com algum tipo de informação presente na memória discursiva.

A discursivização ou textualização do mundo por intermédio da linguagem não se dá como um


simples processo de elaboração de informação, mas de (re)construção interativa do próprio real.

3. Operações básicas no funcionamento da coesão referencial (referenciação)

O funcionamento do processo de coesão referencial compreende duas operações básicas:

(i) Ativação (introdução) de referente: processo pelo qual um referente ainda não
evocado num texto é referido pela primeira vez (em outros termos, um objeto de
discurso ainda não mencionado é introduzido, passando a preencher um nódulo na rede
conceitual do modelo de mundo textual: a expressão linguística que o representa é posta
em foco na memória discursiva, de tal forma que esse objeto fica saliente no modelo).

(ii) Reativação (manutenção) de referente: um referente já evocado no texto (mais


precisamente uma entidade já presente na memória discursiva) é retomado, por meio de
uma forma referencial, de modo que o referente permanece saliente no texto.

3.1. Estratégias de ativação (introdução) de referente no texto

3.1.1. Ativação não-ancorada

Ocorre quando um referente totalmente novo é introduzido no texto (passando a fazer parte da
memória discursiva dos interlocutores).

3.1.2. Ativação ancorada

Ocorre sempre que um novo referente é introduzido, sob o modo do dado, em virtude de algum tipo
de associação com elementos presentes no cotexto ou no contexto sociocognitivo, passível de ser
estabelecida por associação e/ou inferenciação.

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Modalidades de ativação ancorada:

a) Anáfora associativa

A anáfora associativa é uma forma de introdução de um novo objeto de discurso no texto. Trata-se
de um tipo de anáfora que explora relações metonímicas, ou seja, todas aquelas em que entra a
noção de ingrediência. Incluem-se aqui não só as associações metonímicas, mas também todas
aquelas relações em que um dos elementos pode ser considerado “ingrediente” do outro, como se vê
no exemplo em (4), em que “vagões” e “bancos” podem ser considerados “ingredientes” de “trem”:

(2) Uma das mais animadas atrações de Pernambuco é o trem do forró. Com saídas em todos os
fins de semana de junho, ele liga o Recife à cidade de Cabo de Santo Agostinho, um percurso
de 40 quilômetros. Os vagões, adaptados, transforma-se em verdadeiros arraiais. Bandeirinhas
coloridas, fitas e balões dão o tom típico à decoração. Os bancos, colocados nas laterais,
deixam o centro livre para as quadrilhas.

b) Nominalização

A nominalização constitui também uma forma de introdução de um novo objeto-de-discurso no


texto. A nominalização consiste no uso de uma expressão nominal que sintetiza (isto é, resumo,
encapsula, sumariza) uma porção de informação presente no cotexto precedente (ou subsequente).
Isto é, introduz-se um referente novo, encapsulando a informação difusa no cotexto precedente (ou
subsequente). Exemplo:

(3) O Capitão Celso Aparecido Monari, de 39 anos, lotado na Casa Militar do Palácio dos
Bandeirantes, residência oficial do governador Geraldo Alckmin, teve a prisão temporária
pedida pela Polícia Federal. Ele é acusado de comandar o tráfico e também chacinas
motivadas por dívidas de drogas na Zona Leste de São Paulo. O envolvimento do oficial com
o crime foi revelado com a apreensão de 863 quilos de maconha escondidos no fundo falso de
um ônibus na Rodovia Raposo Tavares, na região de Assis, oeste do estado.

3.2. Estratégias de reativação (manutenção) de referentes no texto

3.2.1. Uso de recursos de ordem gramatical

O uso de recursos gramaticais, normalmente, não promove a recategorização de referentes


(contribuindo com a manutenção de referentes). Trata-se do uso dos seguintes recursos:

a) pronomes;

b) elipses;

c) numerais;

d) advérbios locativos.

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3.2.2. Uso de recursos de ordem lexical

O uso de recursos lexicais (isto é, o uso das chamadas expressões nominais referenciais, que podem
ser definidas ou indefinidas) podem promover a recategorização de referentes. Trata-se do emprego
dos seguintes recursos:

a) repetição;

b) sinônimos;

c) hiperônimos;

d) nomes genéricos (palavras como questão, problema, negócio, coisa, pessoa, fato etc.);

e) expressão nominal recategorizadora.

Referências

KOCH, I. G. V. Introdução à Linguística Textual. São Paulo: Martins Fontes, 2004.

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