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Luis Alexandre Ribeiro Branco


Rua Várzea de Manique, 234, 1A, Manique de Baixo 2645-088 Alcabideche
Portugal
14 de Novembro de 2016

RESPOSTA À JOHN STOTT QUANTO AO LIVRO

BATISMO E PLENITUDE DO ESPÍRITO SANTO

O presente livro é resultado de uma série de palestras dadas em 1950 e

publicado pela primeira vez em 1966 e reeditado para a presente versão de 1990. Estas

datas são importantes para que possamos compreender a mente do autor dentro do

seu contexto original e assim façamos nossa avaliação, interpretação e aplicação para

os dias atuais.

Em primeiro lugar é importante ressaltar que John Stott reconhece a importância

da experiência pentecostal e que esta trouxe resultados nítidos para igreja dos seus

dias: “… não pode haver dúvidas de que Deus usou este movimento para trazer

bênçãos a um grande número de pessoas”1. Num segundo plano, o autor também

apresenta alguns problemas resultantes deste movimento, segundo o autor, por falta de

“debate teológico”2 sobre o tema. É importante notar que quando o autor fala que o

“debate teológico sério apenas começou” 3 isto foi uma avaliação feita em 1966, há meio

século. Acredito que hoje ainda enfrentamos o dilema do exagero no que diz respeito a

este tema, mas devemos igualmente reconhecer que meio século depois, temos

instituições pentecostais muito bem alicerçadas e com uma teologia pentecostal e/ou

carismática bem definidas e estabelecidas. Quanto aos exageros, estes sempre

existirão como desafio para que a igreja possa perceber a necessidade de uma teologia

John Stott, Batismo e Plenitude Do Espírito Santo, 4th ed. (São Paulo: Edições Vida
1

Nova, 1990), 7.
2 Idem, 7.
3 Ibidem, 7.

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pentecostal e/ou carismática. No entanto, nos últimos cinquenta anos uma teologia

pentecostal bíblica tem sido desenvolvida por teólogos extremamente capazes como,

por exemplo, Kenneth J. Archer e L. William Oliverio demonstram no livro: “Constructive

Pneumatological Hermeneutics in Pentecostal Christianity” 4.

Um outro aspecto a considerar é que o debate teológico não pode excluir a

“experiência”, pois a experiência é também, tanto na filosofia como na teologia uma

forma credível de autenticação de alguma verdade interior. Uma breve espreitada na

história da igreja, por exemplo, na formação do canon das Escrituras Sagradas, a

experiência edificante dos crentes quando os livros eram lidos em comunidade servia

também de evidência para canonicidade do livro ou não. A igreja nunca restringiu a fé

cristã ao meramente escritural, mas também na experiência dos crentes. Obviamente

que assim como diz John Stott: “… todas as nossas tradições, todas as nossas opiniões

e todas as nossas experiências precisam ser submetidas ao exame independente e

objectivo da verdade bíblica”5. O que é absolutamente correto, entretanto, não podemos

deixar de lado a formação da própria Escritura, que não surgiu meramente como um

manual sobre como a experiência com o Espirito Santo deveria acontecer, mas, acima

de tudo, ela surge como testemunha de que aquilo que se passava na igreja primitiva

tratava-se de uma experiência real e verdadeira. De certa forma podemos dizer que a

experiência precede a Escritura, entretanto, a Escritura fornece ao cristão as bases

para avaliar cada experiência dentro da perspectiva divina. A Escritura não veio para

sufocar a experiência viva do cristão, mas para avaliá-la e a fortalecer. Vejamos o que

escreveu o evangelísta Lucas em seu evangelho: “Visto que muitos houve que

empreenderam uma narração coordenada dos fatos que entre nós se realizaram,

4 Constructive Pneumatological Hermeneutics in Pentecostal Christianity: Palgrave

Macmillan, 2016).
5 Ibidem, 8.

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conforme nos transmitiram os que desde o princípio foram deles testemunhas oculares

e ministros da palavra, igualmente a mim me pareceu bem, depois de acurada

investigação de tudo desde sua origem, dar-te por escrito, excelentíssimo Teófilo, uma

exposição em ordem, para que tenhas plena certeza das verdades em que foste

instruído” (Lucas 1:1-4) - Observe que Lucas fala de “narração e “testemunhas

oculares” como precedentes ao seu evangelho.

John Stott realça muito bem aquilo que muitas vezes acontece nas igrejas que as

“rivalidades e divisões”6 como resultado de ensinos falsos e emocionalismo. Entretanto,

embora o autor tenha razão neste aspecto, é bom ressaltar que mesmo nas igrejas

históricas e tradicionais estas rivalidades e divisões são uma realidade perene no seio

das igrejas. E assim como no pentecostalismo surgem heresias, o mesmo acontece nas

igrejas históricas. Sendo esta a realidade, devemos nos aproximar cada vez mais da

Palavra de Deus e do Espirito Santo para que possamos ultrapassar esta dificuldades

inerentes dos nossos orgulhos e preconceitos.

John Stott diz com toda autoridade: “A experiência nunca deve ser o critério da

verdade; a verdade deve ser o critério da experiência”7. Na realidade entramos aqui

num processo espiral onde a experiência serviu de base para a Escritura e a Escritura

hoje seve de base para a experiência. Reconheço a autoridade da Escritura e sua

supremacia sobre a experiência, entretanto, a experiência nunca pode ser descartada

da vida da igreja, pois apenas a letra mata como escreveu Paulo em sua carta à igreja

de de Corinto: “… o qual nos habilitou para sermos ministros de uma nova aliança, não

da letra, mas do espírito; porque a letra mata, mas o espírito vivifica” (2 Coríntios 3:6). A

palavra grega γράμμα é uma referência a Escritura Sagrada. Esta passagem de

6 Ibidem, 11.
7 Ibidem, 12.

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Coríntios leva-me a concluir que é um imperativo sermos cheios da Palavra de Deus,

mas também do seu Santo Espírito. Ao comentar sobre Atos 2:4: “Todos ficaram cheios

do Espírito Santo …”, Charles H. Spurgeon escreveu em seu Devocional Diário:

Ser cheio do Espírito Santo é uma bênção preciosa. Seria impossível


superestimar as consequências deste sagrado enchimento da alma. Vida,
conforto, pureza, luz, poder, paz e muitas outras bênçãos preciosas estão
vinculadas de modo inseparável à presença do Espírito Santo. Na qualidade de
óleo santo, o Espírito unge-nos a cabeça, separa-nos para o sacerdócio dos
santos e dá-nos graça para realizar nossa função do modo certo. Na qualidade
de única água verdadeiramente purificadora, o Espírito Santo nos limpa do
poder do pecado e nos santifica, agindo em nós, para cumprir a boa vontade de
Deus (ver Filipenses 2.13). Na qualidade de luz, o Espírito Santo se manifestou
a nós quando estávamos perdidos. Agora, Ele nos revela o Senhor Jesus, em
nosso espírito, guiando-nos no caminho da justiça. Iluminados pelos raios puros
e celestiais do Espírito Santo, não vivemos mais nas trevas, e sim na luz do
Senhor. Como fogo, Ele tanto nos purifica da escória quanto faz arder nossa
natureza consagrada. O Espírito Santo é a chama sacrificial pela qual somos
capacitados a oferecer toda a nossa alma como um “sacrifício vivo” a Deus
(Romanos 12.1). Como um orvalho celestial, o Espírito Santo remove nossa
esterilidade e fertiliza nossa vida. Oh, que lá de cima, Ele desça sobre nós! Tal
orvalho da manhã é um doce começo para cada dia. Na qualidade de pomba
celestial, com asas de amor pacificador, o Espírito Santo repousa sobre a sua
Igreja e sobre a alma dos crentes. Na qualidade de Consolador, o Espírito Santo
dissipa as dúvidas e inquietações que podem contaminar a paz do amado dele.
O Espírito Santo desce sobre os eleitos, como desceu ao Senhor no Jordão, e
dá testemunho da filiação deles, produzindo um espírito filial por meio do qual
clamam: “Aba, Pai!” (Gálatas 4.6). Na qualidade de vento, o Espírito Santo traz o
fôlego da vida aos homens. Soprando onde quer, o Ele realiza operações de
vivificação, por meio das quais a criação espiritual é fortalecida e animada.
Rogue a Deus que possamos sentir a presença do Espírito Santo hoje e em
todos os dias8 .

John Stott atribui a estes movimentos as rivalidades e divisões no seio da igreja,

bem como os ensinos falsos e emocionalismo superficial9. Entretanto, Stott reconhece

que estes problemas são antigos, podendo ser encontrados inclusive na igreja primitiva.

8Spurgeon Charles, “Voltemos Ao Evangelho,” June 19, 2016, accessed November 14,
2016, http://voltemosaoevangelho.com/blog/2016/06/19-de-junho-devocional-diario-charles-
spurgeon/.
9 Ibidem, 11.

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Se este é um problema transtemporal e transdenominacional, por que atirar sobre os

ombros do movimento pentecostal tais elementos como se fora novo ou renovado no

pentecostalismo? David Lloyd-Jones, em seu clássico e fantástico livro “Avivamento”

explica que: “Há pessoas que desaprovam a ideia de avivamento. Há pessoas assim

tanto dentro da Igreja Cristã como fora dela”10. O avivamento incomoda aqueles que

querem apenas manter o status quo, e por incomodar tentam impedí-lo. A Igreja da

Inglaterra, ou Igreja Anglicana, ou Igreja Episcopal, a igreja de John Stott, desde a sua

fundação buscou meios de manter a igreja sob um mesmo jugo que a Igreja Católica

Apostólica Romana utilizou antes da Reforma Protestante, para mencionar apenas dois

avivamentos que foram resistidos pela Igreja Anglicana estão os avivamentos que

envolveram John Smith e John Wesley. John Smith, no século XVII, viu-se obrigado a

fugir com um grupo de cristãos da Inglaterra para a Holanda e depois para os Estados

Unidos da América devido as duras perseguições da Igreja Anglicana, dando início a

Igreja Batista. John Wesley nunca foi bem aceito, na verdade era evitado ao máximo

nas congregações anglicanas, por seus métodos evangelísticos e vida separada para

Deus, o que resultou no surgimento da Igreja Metodista no século XVIII.

A Igreja Anglicana resistiu aos avivamentos que surgiram dentro dela, expeliu

estes avivamentos, encarcerou homens como John Bunyon e com o passar do tempo a

igreja foi adotando posturas contrárias às Escrituras, como aborto, ordenação de

mulheres, casamento homosexual, ordenação de pastores e bispos homosexuais, etc.

Mesmo diante destas atitudes da Igreja Anglicana, John Stott, não condenou

publicamente estas coisas e durante toda a sua vida foi um ministro anglicano. Ao

contrário disto, John Stott deixa a entender em seu livro Same Sex Partnership,

Lloyd-Jones David Martyn, Avivamento, 2nd ed. (São Paulo: Publicações Evangélicas
10

Selecionadas, 1993), 138.

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publicado em 1998, sua aprovação quanto ao homosexualismo em suas diferentes

formas, no qual diz: “Nossa sexualidade, de acordo com a Escritura e a experiência, é

basicamente para a nossa humanidade ... Além disso, não só somos todos seres

sexuais, mas todos nós temos uma orientação sexual particular”11. Não tenciono

desacreditar John Stott, aliás sou apreciador de algumas de suas obras, mas me causa

estranheza que dentro da Igreja Anglicana levante-se um ministro para refutar o

pentecostalismo, enquanto o mundanismo bate na porta da sua própria igreja. Em

minha perspectiva, a resistência de John Stott com relação ao batismo do Espírito

Santo vai além da mera resistência teológica. E mais estranho ainda é a sua dualidade

hermenêutica que por um lado defende o homosexualismo e por outro condena o

pentecostalismo.

Outra declaração interessante de John Stott é quando diz: “A experiência nunca

deve ser o critério da verdade; a verdade deve ser sempre o critério para a

experiência” 12. Estou em concordância com o autor, entretanto, não podemos nos

esquecer que a Escritura é resultado de uma experiência do homem com Deus. Isto

não coloca a experiência acima e nem em pé de igualdade com a autoridade da

Escritura, mas negar a experiência é declarar o óbito da igreja. O grande teólogo norte

americano Eli Stanley Jones escreveu o seguinte: “A demanda de experiência religiosa

por parte da presente geração, leva-a diretamente a Cristo, porque todo o seu

evangelho é fundado em experiência”13.

11 John R W. Stott, Same Sex Partnerships? A Christian Contribution to Contemporary

Debate (London: Marshall Pickering, 1998), 336.


12 Ibidem, 12.
13 Eli Stanley Jones, O Cristo de Todos Os Caminhos (São Paulo: Imprensa Metodista,
2005), 9.

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Quanto a preocupação de John Stott com o uso excessivo de narrativas, é

compreensível, entretanto, ao escrever que a revelação do propósito de Deus na Bíblia

deve ser buscada “preferencialmente nas suas passagens didáticas, e não nas

descritivas”14, o autor não levou em consideração que mais de quarenta porcento das

Escrituras é composto de narrativa. Jesus fez uso varias passagens bíblicas descritivas

para enfatizar um ponto didático. Alguns exemplos são: Mateus 19:4-6 e Marcos 10:6-8

em referência à Genesis 1:27 e 2:24; Lucas 11:30 em referência a história de Jonas;

João 3:14 em referência a Números 21:9. É interessante observar também que Deus se

apresenta como o Deus de Abraão, o Deus de Isaque e o Deus de Jacó (Êxodo 4:5),

isto nos mostra que Deus é o Deus da história e das narrativas, pois a vida dos

patriarcas são mencionadas na Bíblia de forma descritivamente didáticas.

Creio que como interpretes da Bíblia, devemos respeitar o género de cada um de

seus livros, bem como o género de cada unidade bíblica, entretanto, nada disto impede

a Escritura de cumprir seu papel: “Toda a Escritura é divinamente inspirada, e

proveitosa para ensinar, para redargüir, para corrigir, para instruir em justiça” (2 Timóteo

3:16). A palavra grega utilizada por Paulo para “toda” é “πάς”, inclui todas as formas de

declinações e géneros literários.

Avançando um pouco mais, a premissa pentecostal na forma como é usada pelo

autor pressupõe que a doutrina do batismo com o Espírito Santo estaria relacionada

com a salvação. Vejamos o que diz a declaração de fé dos Batistas Nacionais15 como

exemplo para análise:

Cremos que o Espírito Santo é o Espírito de Deus. Ele inspirou homens santos
da antiguidade para escrever as Escrituras. Capacita homens através de

14 Ibidem, 12.
15 Manual Básico Batista Nacional.

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iluminação a compreender a verdade. Exalta a Cristo. Convence do pecado, da


justiça e do juízo. Atrai homens ao Salvador e efetua regeneração. Cultiva o
caráter cristão, conforta os crentes e concede os dons espirituais pelos quais
eles servem a Deus através de Sua Igreja. Sela o salvo para o dia da redenção
final. A presença dEle no cristão é a segurança de Deus para trazer o salvo à
plenitude da estatura de Cristo. Ele ilumina e reveste de poder (Batismo no
Espírito Santo) o crente e a Igreja para a adoração, evangelismo e serviço (Gn
1.2; Jz 14.6; Jo 26.13; SI 51.11; 139.7; Is 61.1-3; Jl 2.28-32; Mt 1.18; 3.16; 4.1;
12.28-32; 28.19; Mc 1.10,12; Lc 1.35; 4.1,18, 19; 11.13; 12.2; 24.49; Jo 4:24;
14.16, 17,26; 16.7-14; At 1.8; 2.1-4, 38; 4.31; 5.3; 6.3; 7.55; 8.17, 39; 10.44;
13:2; 15.28; 16.6; 19.1-6; Rm 8.9-11; 14.16, 26, 27; I Co 2.10-14; 3.16; 12.3- 11;
Gl 4.6; Ef 1.13,14; 4.30; 5.18; 1Ts 5.19; 1Tm 3.16; 4.1; 2Tm 1.14; 3.16; Hb 9.8,
14; 2Pe 1.21; 1Jo 4.13; 5.6, 7; Ap 1.10; 22.17).

Cremos que a salvação dos pecadores é inteiramente de graça pela mediação


do Filho de Deus, o qual, segundo desígnio do Pai, assumiu livremente nossa
natureza mas sem pecado, honrou a lei divina pela Sua obediência pessoal, e
por Sua morte realizou completa expiação dos nossos pecados; que, tendo
ressurgido dos mortos, está agora entronizado nos céus e que, unindo em sua
maravilhosa pessoa a mais terna simpatia com a perfeição divina, está
completamente capacitado para ser o Salvador adequado, compassivo e todo-
suficiente dos homens (Ef 2.5, 8, 9; Mt 18.11; l Jo 4.10; 1Co 3.5,7; At 15.11; Jo
3.16; Jo 1.1-14; Hb 4.14; 12:24; Fl 2.6,7; Hb 2.9, 14; 2Co 5.21; Is 42.21; Fl 2.8;
Gl 4.4, 5; Rm 3.21; Is 53.4, 5; Mt 20.28; Rm 3.21; 3.24, 25; 1Jo 4.10; 2.2; 1Co
15.1-3; Hb 9.13-15; Hb 1.3, 8; 8.1; Cl 3.1-4; Hb 7.25; Cl 2.9; Hb 2.18; 7.26; SI
89.19; SI 34).

Como é possível testificar no Manual Batista Nacional o batismo com o Espírito

Santo não tem qualquer relação com a salvação e nem mesmo o termo segunda

bênção é mencionado na declaração, bem como também não há qualquer indicação de

que seja uma experiência que deva ser buscada de forma isolada daquela que deve ser

a busca de todo Cristão, que é glorificar a Deus.

John Stott diz ainda que o perdão dos pecados e o dom do Espirito Santo são

dados gratuitamente aos que são batizados16, entretanto, o texto não aparece nesta

disposição proposta pelo autor, mas sim: “Arrependei-vos, e cada um de vós seja

batizado em nome de Jesus Cristo para remissão dos vossos pecados, e recebereis o

16 Ibidem, 19.

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dom do Espírito Santo” (Atos 2:38). O texto está disposto em ordem de eventos, ou

seja, o arrependimento é o primeiro evento, o batismo é o segundo evento, o perdão é

o terceiro evento e o dom do Espírito Santo é o quarto evento. John Stott não atentou

para uma pequena palavra que aparece no original, “καὶ” ou “e” em português. A

palavra καὶ define o efeito das causas anteriores a ela, ou seja, o “dom do Espírito” e o

efeito causado pelo arrependimento, batismo e perdão. Outro equivoco de John Stott é

relacionar a salvação com o batismo, o que faz com que seu texto misture batismo com

o Espírito Santo com o batismo nas águas. É evidente que Pedro está falando do

batismo nas águas em Atos 2:38. Mas por que o autor cria esta confusão? Simples, o

autor é anglicano, para quem o batismo é um sacramento, portanto, a Igreja Anglicana

é uma igreja sacramental. Professa o “Santo Batismo e a Santa Eucaristia” como

legítimos sacramentos diretamente ordenados por Cristo e “instrumentos da graça

salvífica de Deus”.

O autor diz que a “… norma para hoje …”17 é que o batismo nas águas é o

mesmo que o batismo do Espírito Santo. Mas em que está estabelecida esta “norma”?

Na fé anglicana e não na norma bíblica. O autor segue num malabarismo hermenêutico

ao interpretar; Atos 8:13; Atos 11:14 e Atos 19:17. Outro ponto a salientar é que aquilo

que o próprio autor condena, que é o uso de passagens descritivas como didáticas, e é

exatamente o que ele faz para defender sua perspectiva.

E para concluir esta primeira parte, cito uma frase de John Stott que encontra-se

no mesmo livro: “… não existe um única passagem na qual eles os exortam a recebê-

lo” 18. Descritivamente não, mas didaticamente sim: “E não vos embriagueis com vinho,

em que há contenda, mas enchei-vos do Espírito” Efésios 5:18.

17 Ibidem, 21.
18 Ibidem, 28.

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Continuo com dificuldades para aceitar a interpretação de John Stott de que o

batismo e dom são a mesma coisa19. Não o são nem gramaticalmente e nem na prática

cristã. O texto evocado pelo autor para determinar sua premissa está em Atos 2:38,

mais uma vez utiliza-se de passagens descritivas para marcar um ponto teológico, algo

que ele mesmo considera um erro hermenêutico. A palavra batismo - βαπτίζω - e a

palavra dom - δωρεά - em nada se assemelham, nenhuma é sinónimo da outra. Seus

significados e uso em nada tem a ver um com o outro. Entretanto, John Stott usa esta

pseudo semântica para justificar uma prática teológica da sua denominação como já

discutimos anteriormente. Ler este livro de John Stott sem ter em mente de que ele se

trata de um teólogo anglicano pouco ou nenhum proveito terá para o leitor.

Um outra declaração do autor parece-me muito pertinente: “Se todos foram

baptizados com o Espírito Santo, a maioria não parece ter sido” 20. O fato realmente é

este, não é uma mera aparência ou uma suposição. Vivemos numa época em que está

cada vez mais difícil encontrar pessoas, inclusive ministros do evangelho, cheios do

Espírito Santo de Deus. Vejamos o que escreveu Leonard Havenhill em seu

extraordinário livro “Por que Tarda o Pleno Avivamento”:

A grande tragédia de nossos dias é que existem muitos pregadores sem vida, no
púlpito, entregando sermões sem vida, a ouvintes sem vida. Que lástima! Tenho
constatado um fato muito estranho que ocorre até mesmo em igrejas
fundamentalistas: a pregação sem unção. E o que é unção? Não sei. Mas sei
muito bem o que é não ter unção (ou pelo menos sei quando não estou ungido).
Uma pregação sem unção mata a alma do ouvinte, em vez de vivificá-la. Se o
pregador não estiver ungido, a Palavra não tem vida. Pregador, com tudo que
possuis, adquire unção21 .

19 Ibidem, 35.
20 Ibidem, 46.

Leonard Havenrill, Por Que Tarda o Pleno Avivamento? (Belo Horizonte: Editora Betâ -
21

nia, 1989), 13.

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Confesso que o afastamento do cristão de uma experiência real com Deus e com

o seu Santo Espírito esta no comodismo, na falta de coragem de abandonar os

caminhos maus, na falta de amor a Deus e no caso dos pastores, na proficionalização

da vocação. Quando lemos João 14, 15 e 16 e comparamos com nossas vidas

descobrimos um hiato, um hiato que nos separa de Deus. Ranvenhill continua:

Chega dessa pregação estéril, espiritualmente vazia, que é ineficaz, porque foi
gerada num túmulo e não num ventre, e se desenvolveu numa alma sem
oração, sem fogo espiritual! É possível alguém pregar e ainda assim se perder;
mas é impossível orar e perecer. Se Deus nos chamou para o seu ministério,
então, prezados irmãos, insisto em que precisamos de unção. Com tudo que
possuis, adquire a unção, senão os altares vazios de nossas igrejas serão
exemplos vivos de nosso intelectualismo ressequido22 .

Desejo concluir minha avaliação do livro BATISMO E PLENITUDE DO ESPÍRITO

SANTO primeiramente dizendo que me abstive de comentar os capítulos três e quatro

por estarem fora daquilo que consigo associar ao tema do livro e por dizerem coisas

concernentes ao ministério do Espírito Santo, mas não necessariamente ao tema do

batismo com o Espírito Santo ou Plenitude do Espírito, mas sim com aquilo que

poderíamos chamar de a Doutrina do Espírito Santo, mais propriamente dita, ainda que

o batismo e plenitude também encaixem-se nesta categoria doutrinária.

Minha avaliação foi honesta, sem qualquer pretensão de denegrir a imagem do

autor, mas esclarecer apologeticamente alguns pontos que acredito serem importantes,

pelo menos foram para mim.

Minha teologia é reformada, creio na doutrina da graça, na preservação da

salvação daqueles que são eleitos de Deus, na confiabilidade das Escrituras, na sua

inspiração verbal e plenária, na salvação pela fé em Cristo Jesus e na imutabilidade de

22 Ibidem, 15.

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Deus, que é o mesmo ontem, hoje e o será para Sempre. Creio no revestimento de

poder do cristão com o Espírito Santo de Deus, que o capacita para a obra do Senhor e

que esta experiência tenha o nome que for, batismo com o Espírito Santo, Plenitude do

Espírito Santo, Revestimento de Poder, entre outros nomes nada mais são do que a

vida do cristão rendida a Deus, interessado e disponível para a sua obra. Acredito que

esta não é uma primeira, nem segunda bênção, mas um enchimento constante e

crescente para aqueles que desejam viver para Deus. Creio na continuidade dos dons,

sem excessão, e que estes servem para a edificação da igreja e devem ser usados com

ordem e decência como ensina as Escrituras Sagradas. Creio que vivemos em um

tempo difícil e que sem a graça e poder do Espírito Santo seremos agentes ineficazes

do Reino de Deus,

Luis Alexandre Ribeiro Branco

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Prof. Doutor Luis Alexandre Ribeiro Branco


• Professor no Seminário Teológico Baptista -Seminário Teológico Baptista -STB
• Professor na Academia Senior da Cruz Vermelha Portuguesa
• Investigador na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FLUL)
• Pastor na Igreja Evangélica Baptista de Cascais
• Missionário da Junta Administrativa de Missões da Convenção Batista Nacional - JAMI

Blog: http://verdadenapratica.wordpress.com
Telemóvel: +351929264661
Residência: +351309914965
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