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Regeneração urbana e qualidade residencial

Urban requalification and residential quality

Maria João Freitas


Socióloga, Investigadora Auxiliar, LNEC, Lisboa, Portugal, mjfreitas@lnec.pt
João Branco Pedro
Arquitecto, Investigador Auxiliar, LNEC, Lisboa, Portugal, jpedro@lnec.pt

SUMÁRIO: Na presente comunicação pretende-se evidenciar a contribuição que a


regeneração urbana pode ter para a promoção da qualidade residencial. Primeiramente,
são discutidos os principais desafios que se colocam às sociedades contemporâneas. Em
seguida, é descrita a evolução do conceito de qualidade residencial. Por último, são
indicados alguns objectivos para as intervenções de regeneração urbana e contributos
para os alcançar.
PALAVRAS-CHAVE: regeneração urbana, qualidade residencial,

ABSTRACT: The present paper intents do show the contribution of the urban regeneration
for the promotion of residential quality. The main challenges that contemporaneous society
face are discussed. Secondly, the evolution of the residential quality is analysed. Finally,
some objectives for urban regeneration processes are presented and contributes to achieve
them are put forward.
KEYWORDS: urban regeneration, residential quality

INTRODUÇÃO
As cidades fazem-se e vivem das confluências entre as dinâmicas demográficas e as
configurações morfológicas dos territórios. Para além do grau de autonomia intrínseca que
estas dinâmicas e configurações comportam e da permeabilidade que manifestam à
influência de factores económicos, demográficos, sociais e políticos, é sobretudo da sua
confluência que se prefiguram a qualidade e sustentabilidade dos territórios bem como o
bem-estar e qualidade de vida que estes territórios são susceptíveis de proporcionar.
A progressiva perda de população, envelhecimento e bipolarização social de algumas
cidades obriga a equacionar as vantagens e as ameaças que se configuram à manutenção da
sua centralidade e atractividade.
As cidades fazem-se com e de gente que têm necessidades e expectativas. Na formalização
das suas escolhas os habitantes confrontam-se com os constrangimentos e oportunidades
que os territórios lhes proporcionam. Estes constrangimentos e oportunidades apresentam-
se em vários domínios de decisão, mas uma das relações mais estruturantes na formalização
de qualquer escolha de fixação é a relação estabelecida entre o habitar, o trabalhar e o
comutar. Nos últimos anos, esta relação tem ganho tanto em flexibilidade das fronteiras
territoriais como em dinâmica e precariedade com que as pessoas se fixam aos lugares.
As cidades com as suas dinâmicas e processos de uso e ocupação dos territórios, acumulam
história, mas também ambições e inovações. Nem sempre esta coabitação entre história e
inovação é pacífica e, apesar de o poder parecer, nem sempre se rege por vagas sucessivas
do que é “novo” a sobrepor-se ao que é “velho”. As mudanças do "velho" para o "novo"
fazem-se no tempo e materializam-se nos espaços, com as vontades e as escolhas dos seus
actores, que sendo múltiplos, as vão negociando através das suas práticas e em função das
oportunidades e constrangimentos com que se confrontam.
A coexistência de espaços “antigos” e “novos” nas cidades e as constantes mudanças
exigem que se pense o território urbano numa óptica de regeneração urbana. Enquanto
espaços de diversidade as cidades regulam-se e regeneram-se em função da pluralidade de
soluções com que conseguem responder à maior pluralidade de escolhas que se vão
fazendo sentir como necessárias e urgentes, em quantidade e grau de qualidade.
Na presente comunicação discutiremos alguns aspectos estruturantes para uma abordagem
da regeneração urbana como resposta aos desafios que se colocam às sociedades urbanas
contemporâneas e aos desafios que se colocam à promoção da qualidade residencial.
Concluiremos com alguns contributos para a abordagem da regeneração urbana na resposta
a esses mesmos desafios.

DESAFIOS DAS SOCIEDADES URBANAS CONTEMPORÂNEAS


De entre os principais desafios que se colocam às sociedades urbanas contemporâneas
existem três grandes grupos que importa considerar nesta comunicação: a) os desafios
relacionados com os valores societais; b) os desafios relacionados com as dinâmicas socio-
demográficas e espaciais; e c) os desafios relacionadas com as novas formas de regulação e
intervenção nos territórios.

Valores societais
A consolidação do paradigma ambiental na forma como se pretende pensar e viver os
espaços locais e globais com que as sociedades se confrontam, tem apresentado como
incontornáveis, na exigência de sustentabilidade dos seus modelos de desenvolvimento,
princípios como os de conciliação entre:
i) Ecologia e Coesão socio-territorial – em que o incentivo à promoção de
sustentabilidade e qualidade - quer na relação a estabelecer entre o Homem e os
contextos naturais e tecnológicos, quer na relação entre as diversas plataformas em que
esta relação se materializa (do local ao global) - apela a uma mundividência
multidimensional e integrada na sua capacidade de leitura e intervenção sobre a
complexidade;
ii) Liberdades individuais e exercício de cidadania – onde o incentivo à promoção e
liberdade de escolha retoma o sentido da solidariedade no tempo (sustentabilidade das
opções) e exige o alargamento do exercício de poderes, nomeadamente através do
“empowerment” da sociedade civil e da participação social.

Dinâmicas sócio-demográficas e espaciais


O desenvolvimento da estrutura demográfica em consequência da alteração dos modos de
vida (expressa sobretudo em termos de novos modelos familiares e novas organizações da
vida quotidiana) e da intensificação das mobilidades populacionais (expressa sobretudo nas
novas expressões dos processos migratórios), tem apresentado como incontornável a gestão
de diversidades em contextos de maior proximidade. Neste sentido, tem vindo a ser
recolocado e recriado, no cerne das discussões sobre a coesão e sustentabilidades sócio-
espaciais:
i) a discussão em torno das identidades sociais e territoriais – onde a estabilidade dos
modelos predominantes se confronta com a emergência de “novos modelos”, e onde a
gestão das diferenças/semelhanças se processam em novas relações estabelecidas não só
em registos de grande proximidade física, mas também de maior virtualidade (“a aldeia
global”);
ii) a discussão em torno da “autenticidade” e do “património” – onde as barreiras da
apropriação simbólica da história e a noção de património ganham outros contornos em
decorrência das próprias dinâmicas que a relação entre o “velho” e o “novo” e o “igual”
e “diferente” introduzem na vivificação dos próprios territórios.

Formas de regulação e intervenção nos territórios


A “globalização” dos processos de decisão e intervenção nos territórios, expressa amiúde
na exigência da “subsidariedade” para a promoção de um desenvolvimento sustentável,
continua a solicitar das sociedades contemporâneas uma grande capacidade de “inovação” e
“conhecimento”, quer para a promoção, quer para a gestão do seus modelos de
desenvolvimento. Esta exigência tem vindo a manifestar-se sobretudo em dois aspectos:
i) a urgência da consolidação de uma sociedade do conhecimento (“Knowledge-base
Society”) – em que a produção e o consumo de informação e conhecimento emergem
como estruturadores e garantia de sucesso da sustentabilidade das dinâmicas a promover
e/ou gerir;
ii) o alargamento dos sistemas de acção e decisão à sociedade civil – onde a tradicional
distinção entre as esferas públicas e privadas emerge re-equacionada nas suas bases de
competências, nos fóruns de expressão e nas modalidades de acção.
Estes desafios bastariam para sustentar a defesa de soluções orientadas pelos princípios da
regeneração urbana, no que eles exigem de trabalho generativo e “inclusivo” de diferenças
e inovação na optimização das dinâmicas existentes, na promoção da qualidade através da
aposta numa pluralidade de soluções e na garantia de sustentabilidade ao proporcionar uma
diversidade de escolhas para o desenvolvimento das dinâmicas sócio-territoriais presentes e
futuras.
Porém, no que importa de precisar os conteúdos específicos de um processo de regeneração
urbana, a re-leitura atenta do próprio processo de evolução do conceito de qualidade
residencial apresenta-se também de grande utilidade.

CONCEITO DE QUALIDADE RESIDENCIAL


O conceito de qualidade residencial tem evoluído ao longo do tempo, podendo esta
evolução ser descrita em cinco fases principais, que são resumidamente apresentadas nos
pontos seguintes. Note-se que a evolução do conceito é contínua e nem sempre linear. Para
facilidade de compreensão a evolução do conceito é descrita por fases propostas pelos
autores e que resultaram de um processo de simplificação e generalização.
Fase 1 – Características do objecto
Nesta primeira fase o conceito de qualidade centrava-se
essencialmente nas características físicas do edifício. Os
arquitectos e construtores procuravam edificar soluções Habitação
duráveis e que proporcionassem adequadas condições
sanitárias. Os edifícios com qualidade deviam ser
concebidos e construídos de acordo com regras de boa arte
e utilizar materiais nobres. Os projectos eram usualmente
baseados em modelos ou tipos pré-definidos, que incorporavam os valores culturais, sociais
e estéticos da época.

Fase 2 – Adequação
A segunda fase corresponde à introdução do conceito geral
da qualidade, segundo o qual a qualidade é entendida como
a adequação entre as características do produto e as Moradores
necessidades dos seus utilizadores. De acordo com este
conceito geral, a qualidade residencial pode ser definida
como a adequação das características de uma habitação às Habitação
necessidades usuais dos seus moradores.
A aplicação deste conceito motivou alguma investigação
sobre as necessidades dos moradores e a definição de um conjunto de exigências de
concepção e construção. A investigação centrou-se na eficiência do fogo e das suas
diferentes tipologias.
O principal objectivo subjacente a esta abordagem era proporcionar, num curto período de
tempo, uma habitação de custo acessível a cada família. A solução baseava-se em
habitações mínimas e em novos edifícios.

Fase 3 – Adequação generativa


O desenvolvimento do conceito utilizado na fase anterior
levou a um conhecimento aprofundado das necessidades
dos moradores e das características dos edifícios. A
Moradores
principal inovação nesta terceira fase foi a compreensão de
que os moradores e a habitação constituem uma unidade
com interacções mútuas que evoluem ao longo do tempo. Habitat
residencial
Durante esta fase as necessidades e expectativas dos
moradores foram estudadas em maior detalhe, com recurso
a inquéritos habitacionais e a entrevistas aos moradores.
As necessidades dos moradores foram descritas para as
diferentes fases do ciclo de vida de uma família nuclear, e segundo perfis decorrentes do
estatuto social. Este conhecimento levou a uma formulação rigorosa de algumas exigências
e especificações que deveriam ser satisfeitas nos edifícios habitacionais.
O âmbito do objecto de estudo aumentou ao compreender-se que, a par do fogo e do
edifício, a vizinhança também desempenha um importante papel para a satisfação dos
moradores.
Durante esta fase pretendeu-se proporcionar uma habitação a cada família que respondesse
às necessidades durante um ciclo de vida. A intenção foi a de produzir novos edifícios
residenciais que optimizassem a relação entre as necessidades padrão de uma família
nuclear e as características do edifício, dentro de certas limitações económicas e produtivas.
As estratégias de flexibilidade e a diversidade foram utilizadas como uma forma de
responder à evolução das necessidades dos moradores.

Fase 4 – Adequação generativa dentro de um contexto


Os estudos sobre os moradores revelaram a
complexidade da composição social. Em complemento,
os problemas sociais que surgiram nas vizinhanças
constituídas por habitações optimizadas mostraram que
Moradores
uma perspectiva de adequação social e cultural era
necessária para compatibilizar as necessidades e
expectativas individuais com as necessidades de outros Habitat
moradores e da sociedade em geral. residencial

Com as mudanças na estrutura social, a norma (família


nuclear) tornou-se menos representativa e,
nomeadamente, as minorias aumentaram (ex., pessoas Contexto
sós, agregados mono parentais, idosos, pessoas em
cadeira de rodas, estudantes, grupos étnicos, etc.). O direito a ser diferente e ter uma
solução habitacional adequada tornou-se um importante objectivo.
A prioridade passou a ser proporcionar uma habitação adequada a cada grupo específico de
moradores. A solução mais comum foi a construção de novas habitações especializadas.
Contudo, a integração das novas habitações nas vizinhanças foi também uma questão
considerada.

Fase 5 – Adequação generativa num contexto evolutivo


Hoje em dia tornou-se claro que a satisfação dos
moradores se baseia na percepção do ambiente
residencial como uma forma para concretizar os seus
projectos de vida. A percepção do ambiente residencial
enfatiza a imagem em complemento do uso, o que Moradores
significa que numa área residencial com qualidade as
exigências estéticas e simbólicas devem ser Habitação
consideradas a par das exigências de segurança, residencial
conforto, e uso. Contrariamente às exigências de
segurança e conforto, que estão essencialmente
relacionadas com as aptidões humanas, as exigências
estéticas e simbólicas são fortemente influenciadas por
factores históricos e culturais. Contexto em evolução
Em complemento, os aspectos processuais relacionados
com a promoção e gestão dos empreendimentos habitacionais assumem maior importância
como factores de qualidade. Por exemplo, a explicação das decisões, o alargamento dos
actores sociais que intervêm nas diferentes fases, e a democratização na sua participação
são objectivos cuja aplicação prática é ainda recente.
Por último, a escala de análise alargou-se para além do edifício e da vizinhança, passando a
integrar a envolvente urbana, e portanto aspectos não físicos, tais como, a gestão local, o
impacto ambiental, e o apoio social.
Esta evolução do contexto aconteceu a par de uma alteração estrutural do sector
habitacional. Actualmente, na maioria dos países desenvolvidos, a prioridade deixou de ser
resolver o deficit habitacional, para se passar a apostar na melhoria da qualidade da
habitação. Não existe uma solução dominante mas uma atitude ecléctica, segundo a qual
são possíveis diferentes abordagens, tais como: a reabilitação da habitação ou a construção
de novos edifícios, a habitação especializada para um grupo de utentes ou a habitação
flexível, uma imagem inovadora ou a recuperação de ambientes e elementos do passado
(retro), etc..

CONTRIBUTO DA REGENERAÇÃO PARA A PROMOÇÃO DA


QUALIDADE RESIDENCIAL
Porque é a regeneração uma via privilegiada para dar resposta aos desafios apresentados,
quer em termos societais, quer em termos da promoção da qualidade? Esta é a questão a
que importa responder.
As sociedades e as cidades pedem sustentabilidade, qualidade e coesão e a resposta terá de
ser encontrada em soluções que garantam “autenticidade”, “inovação” e “diversidade de
escolhas”. As sociedades e as cidades pedem maior protagonismo dos seus actores e a
resposta terá que ser encontrada em soluções sinergéticas que permitam a coabitação das
diferenças e a participação alargada dos actores. As sociedades e as cidades pedem a
reconstrução identitária das suas populações e territórios em função do alargamento dos
seus horizontes de referências e a resposta terá que ser encontrada em soluções que
garantam o desenvolvimento dessas mesmas identidades e vocações quer ao nível local
quer em função dos seus novos posicionamentos relativos à escala mais global.
Da mesma forma o conceito de qualidade residencial exige um alargamento da escala de
intervenção que engloba as várias escalas do habitat residencial e a resposta terá de ser
encontrada em soluções que garantam a constituição de um contínuo espacial coerente. A
qualidade residencial ultrapassa as dimensões físicas dos objectos construídos e a resposta
deverá ser encontrada em soluções que integre aspectos como a gestão urbana a viabilidade
económica ao longo da vida útil do edificado e vitalização das dinâmicas locais. A
qualidade residencial integra uma maior multiplicidade de necessidades que se alteram no
tempo e a resposta deverá ser encontrada na diversidade e flexibilidade das soluções. A
qualidade residencial abrange uma envolvente residencial com vida e quotidianos activos e
a resposta não pode deixar de viabilizar a participação e o desenvolvimento de identidades
locais contribuintes de uma maior coesão social. Também a abordagem da qualidade exige
que se respeitem requisitos ecológicos e de sustentabilidade e a resposta convida a uma
inovação tecnológica que garanta o desenvolvimento dos níveis de conforto e bem-estar
sem comprometer aqueles requisitos.
E todas estas são as soluções que o conceito de regeneração urbana abrange quando
pretende a optimização das riquezas acumuladas do que “existe” com as exigências
alternativas do “novo”. A regeneração urbana apresenta-se assim como um processo
dinâmico e generativo de “cosedura no tempo” que procura conciliar os novos desafios no
tecido urbano existente numa gestão de proximidade das diferenças, tensões, conflitos e
incertezas.
Neste sentido, será irrealista pensar que se encontram as melhores respostas aos novos
desafios continuando a apostar no desenvolvimento de soluções alternativas e na criação de
novos tecidos urbanos. Para além da limitação de oportunidades sustentáveis que os
próprios territórios urbanos apresentam em termos de crescimento e desenvolvimento, esta
aposta reproduziria a agudização de dicotomias. Em última análise esta tendência induz ao
desperdício de todo o tipo de capitais entretanto acumulados e poderia conduzir a uma
morte lenta ou a uma “museulogização” de grande parte dos centros das cidades, ou em
contrapartida, a uma “sobreposição” em territórios adjacentes e num tempo diferente de
dinâmicas de descontinuidade.

O que é que implica de novo a regeneração urbana?


Liberdade – Deve existir uma pluralidade de soluções que permita a
diversidade de escolhas
Deve existir uma diversidade de soluções habitacionais que permitam, em cada momento,
um agregado escolher a solução que melhor se adequa às suas necessidades e aspirações no
quadro da sua posição e movimento no jogo social.
A qualidade residencial não se baseia em habitações optimizadas para uma determinada
família ou grupo social, mas na diversidade de escolha que é permitida aos cidadãos. A
diversidade de escolha deve ser concretizada pela mobilidade residencial e pela existência
de soluções residenciais com diferentes características.

Ecologia – Deve reduzir-se o impacto negativo no meio ambiente


As soluções habitacionais devem racionalizar o uso dos recursos existentes num
determinado contexto com vista a satisfazer as necessidades dos utentes e minimizar o
impacto no meio ambiente.
Pretende-se que as áreas residenciais sejam sustentáveis, isto é, que constituam um sistema
com capacidade de se auto-sustentar, produzindo os seus recursos, regulando os níveis de
poluição, e reciclando os seus recursos.

Integração – As decisões locais devem equacionar as questões da


vizinhança e da cidade
Na apreciação que os moradores realizam do seu cenário residencial, existe um contínuo
entre a escala doméstica, do edifício, da vizinhança e da cidade. Este alargamento significa
que a qualidade deve ser pensada, e promovida tanto no detalhe da habitação e do edifícios
como na globalidade da vizinhança ou da própria cidade.
A qualidade não pode ser o resultado da soma de diferentes partes, mas pelo contrário
devem procurar encontrar-se sinergias positivas através da forma como as iniciativas de
promoção da qualidade são pensadas politicamente e geridas colectiva e individualmente.

Participação – Devem fomentar-se novas forma de participação social


Devem fomentar-se novas formas de governo ou de regulação social ao nível local que
contribuam para a participação social. Pretende-se contribuir para o alargamento dos
intervenientes e a democraticidade das decisões que são tomadas sobre assuntos que estão
relacionados com a sua vida quotidiana na envolvente residencial imediata dos moradores.
A existência de informação sobre as decisões de gestão e a possibilidade de participar
nessas decisões são factores que contribuem para a satisfação dos moradores e portanto
para a qualidade residencial.

Identidade e coesão social – Devem reforçar-se as identidades locais e a


coesão social
Num mundo cada vez mais globalizado, a vizinhança deve ser um espaço de expressão
individual e colectiva que contribua para o reforço das identidades locais. A participação
dos moradores nas decisões de gestão e na manutenção dos espaços, a diversidade
equilibrada de proveniências sociais, e a existência de elementos e espaços com valor
simbólico para a comunidade são formas de contribuir para a desejada identidade e a
coesão social.

Autenticidade – Deve promover-se o valor estético e patrimonial


Deve promover-se o valor estético e patrimonial da vizinhança pela realização de
intervenções que respeitem a memória e a cultura dos lugares. No entanto, a promoção do
património não significa a reprodução acrítica e mimética da realidade pré-existente. A
imagem dos edifícios deve ser integrada no ambiente construído envolvente, criando
soluções genuínas e com identidade própria.

Inovação – Devem promover-se soluções inovadoras


Devem promover-se soluções habitacionais inovadoras que sejam adequadas aos novos
modos de vida e que integrem as novas tecnologias, de modo a contribuir para o
desenvolvimento e garantia de sustentabilidade da satisfação das necessidades.

Conhecimento – Deve existir um “Empowerment” colectivo


Não se consegue intervir sobre aquilo que não se conhece. As opções políticas e
estratégicas, bem como as medidas de gestão e as soluções organizacionais devem permitir
incorporar o conhecimento sobre as dinâmicas em que intervêm. A promoção do
conhecimento deve permitir compreender as dinâmicas e a complexidade dos processos
com que lida e de integrar abordagens territoriais holistas, desde o planeamento à
promoção, gestão e vivência do habitat. Deverá também, este conhecimento, fomentar uma
abordagem multi e interdisciplinar que assegure uma visão integrada do conjunto. A
promoção e a divulgação do conhecimento sobre a qualidade residencial deve envolver
todos os actores que participam na tomada de decisões.

Como pensar a regeneração urbana?


Neste sentido apresentam-se cinco contributos essenciais para uma abordagem de
regeneração urbana:

As questões do alojamento: entre as escolhas individuais e as suas


expressões metropolitanas
As questões do alojamento são questões âncora na definição das políticas da cidade, na
medida em que fixam ou repelem população; acompanham ou não os processos
migratórios; premeiam ou não, com qualidade e percepção de bem-estar, os territórios de
vivência em proximidade e a imagem e representação que deles se constrói. A
procura/oferta de alojamento e a sua monofuncionalidade ou diversidade em termos de
soluções obriga a uma leitura metropolitana e o equacionar das potencialidades e fraquezas
em termos de posicionamento estratégico das cidades.

A sustentabilidade económica das micro-unidades residenciais


Mas, comportando uma dimensão económica em si, as questões do alojamento e dos usos e
apropriações dos territórios a que convidam são susceptíveis também de desencadear o
florescimento ou atrofiamento económico à escala micro-local (vizinhança). Para além das
dimensões económicas intrínsecas ao funcionamento do próprio mercado imobiliário, as
configurações socio-territoriais a que o seu funcionamento induz podem apresentar-se mais
ou menos habilitadas para uma maior ou menor reprodução de dinâmicas económicas
adjacentes. E esta habilitação é raramente contabilizada na programação e gestão dos
territórios, mas essencial para se pensar a regeneração dos espaços de vivência quotidiana.

A domesticidade da cidade: o público e o privado


Os espaços públicos complementam os espaços domésticos na configuração dos territórios
de habitabilidade e de vivência das cidades. De facto eles integram os espaços de
domesticidade das cidades. Neles se encontram referências de conforto, memória colectiva,
motivo de permanência e uso, configuração de afectos e sentimentos de segurança e bem-
estar. Os espaços públicos são também, na complementaridade com os espaços domésticos,
os espaços relacionais que apoiam a configuração e actualização dos modos de vida. Numa
lógica de abordagem residencial, a relação estabelecida entre espaços públicos e privados
deve ser equacionada como um objecto uno de análise, planeamento e gestão.

Os fazedores da cidade
A cidade e os territórios fazem-se com a participação directa e indirecta de uma
multiplicidade de actores. Nas cidades existe normalmente um predomínio claro das
actividades dos actores privados sobre os actores públicos. Os actores privados tomam
quotidianamente decisões com influências directas e estruturantes na configuração
ecológica dos territórios. Numa lógica de regeneração urbana, a optimização dos potenciais
destes sistemas de acção colectiva configura-se não apenas como uma necessidade, mas
sobretudo como uma urgência em termos de garantias de sustentabilidade e
operacionalidade da própria acção pública.

Saberes e Fazeres: desafios de uma abordagem territorial


Um dos grandes desafios da abordagem territorial relativamente à abordagem sectorial é
propor um “olhar” integrado sobre a multiplicidade de relações que se actualizam nos usos
e vivências que configuram as dinâmicas das cidades. Ao elegerem a complexidade como
objecto de análise, as abordagens territoriais exigem novos instrumentos para identificar,
caracterizar, estruturar e operacionalizar esta nova forma de olhar. Estes instrumentos
exigem novas formas de organização e utilização da informação bem como mecanismos
que permitam manter essa informação activa e actualizada. Também a prioridade atribuída
à consolidação de instrumentos de planeamento e gestão com base no desenvolvimento da
estratégia europeia de consolidação de uma “knowledge base society”, tem aberto e
obrigado a um investimento colectivo na produção de novos “know-how” para a gestão dos
territórios. Os desafios inerentes ao desenvolvimento de políticas orientadas para a
regeneração urbana, não serão, também neste aspecto, excepção.

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