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Manejo Médico-hospitalar do Paciente Felino

Profa. Dra. Fernanda Vieira Amorim da Costa


Clínica Médica de Felinos Domésticos
Departamento de Medicina animal
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
fernanda.amorim@ufrgs.br

1.Introdução:

Resultados recentes:

• cães são levados ao vet 2x + do que gatos


• 72% dos gatos são vistos < 1x/ano por vet
• 42% dos cães são vistos < 1x/ano por vet

Motivos?

• falta de preparo dos vets para minimizar medos


• falta de preparo dos vets para atender gatos!

Objetivos:

• Busca da excelência no atendimento


• (Proprietários muito exigentes)
• Experiência com a espécie
• Preparo do ambiente (Cat Friendly)
• Treinamento da equipe!

Como tornar a experiência da hospitalização menos traumática para o gato?

Cat Friendly Practice!

www.catvets.com

Pontos – chave:

1. Educação do cliente antes da consulta


2. Ambiente hospitalar
3. Técnica de exame e contenção
4. Hospitalização
5. A volta pra casa

Maiores dificuldades:

ü Colocar o gato na caixa


ü Ida até o veterinário
ü Lidar com o gato assustado
ü Possibilidade de estresse & agressões
§ Possibilidade de perda do cliente
§ Diagnósticos errados
§ Preparo da equipe para atender gatos

Então, como fazemos para atenuar os fatores de estresse antes da internação?

1. Antes da Consulta
ü Acostumar a sair desde pequeno
ü Deixar o transporte aberto em casa
ü Alimentar o gato dentro do transporte
ü Usar feromônio no transporte
ü Trazer roupas com cheiro do responsável
ü Sempre recompensar positivamente
ü Cogitar atendimento a domicílio

ü Treinar o gato para usar a caixa de transporte em casa:


• Associar com experiência positiva
• Tornar a entrada voluntária
• Tornar a caixa atraente e aconchegante
• Usar catnip, brinquedos, alimento
• Ferormônio facial sintético 30 min antes

No transporte até a clínica:


• Orientar quanto a caixa ideal
• Considerar limitar a visibilidade (toalha)
• Colocar a caixa no chão atrás do banco da frente
• Jejum, anti-eméticos & ansiolíticos prévios

o Alprazolam: 0,125 a 0,250 mg/kg PO 60 min. Antes


§ Vantagem: causa amnésia
§ Sedação, ataxia, sialorreia, relaxamento muscular, aumento
do apetite, excitação paradoxal
o Gabapentina: 50 a 100 mg/gato 90 a 120 min antes
§ Sedação, ataxia, sialorreia, vômito
o Trazodona: 50 mg/gato 90 min antes
§ Sonolência

2. Ambiente hospitalar

ü O mais importante:
• Evitar barulhos
• Evitar odores
• Manter limpeza
• Segurança (fugas)
• Recepção para o atendimento
ü Separar cães de gatos
ü Ter lugares calmos e seguros p/ os gatos
ü Não deixar o gato esperando para atendimento
ü Marcar hora sempre (- em emergência)
ü Sempre recompensar positivamente
ü Evitar gatos residentes
ü Impressione e ofereça conforto
ü Deve ser calmo e aconchegante para o cliente & gato
ü Caixa de transporte no alto, protegida e coberta (minimizar o estresse)

• Equipe
ü Calma, treinada, gostar de gatos, paciente com os proprietários

• Consultório
ü Pequeno, sem locais para o gato se esconder
ü Seguros: trancas em portas e janelas
ü Verticalização: prateleiras
ü Evitar entrar e sair do ambiente
ü Remover odores entre consultas:
§ Lavar mãos
§ Limpar aonde os gatos estiveram
§ Remover lixo
ü Usar feromônio facial sintético
ü Evitar contato visual entre gatos
ü Iluminação reduzida
ü Evitar falar alto e barulhos

• Abrindo a caixa de transporte


ü Abrir a porta da caixa e realizar histórico & anamnese
ü Não realizar contato direto com os olhos, piscar lentamente
ü E o gato não sair, abrir a tampa e a porta
ü Colocar gentilmente a toalha por cima
ü Evitar movimentos bruscos e barulhos
ü Nunca despejar o gato na mesa
ü Evitar redes, luvas e agressividade
ü Colocar mão por baixo e trazer para fora

• Durante o atendimento
ü Examinar o gato em lugar aconchegante (caixa, colo ou prateleira)
ü Mesa morna e não escorregadia
ü Abordagem lateral ou caudal
ü Usar toalhas sempre
ü Não usar métodos agressivos
ü Distrair e oferecer recompensas
ü Não retirar o gato do consultório
ü Cuidado com odores de outros animais
ü Feromônio na parede

Com medo e reativo: não conseguirá fugir – agressão defensiva


• Orelhas deitadas e rotacionadas para trás da cabeça
• Cauda batendo
• Pupilas dilatadas
• Músculos faciais tensionados e dentes à mostra
• Patas prontas pra bater com garras expostas
• Deitados para um lado para melhor expor as garras
• Bufando e/ou gritando

Manejo do gato medroso:


ü Prever momentos de medo, ansiedade e agressividade
ü Utilizar medicamentos em casa, antes de sair
o Alprazolam: 0,125 a 0,250 mg/kg PO 60 min. antes
o Gabapentina: 50 a 100 mg/gato 90 a 120 min antes
o Trazodona: 50 mg/gato 90 min antes
ü Contenção química: segurança para equipe
o Sinais de medo, ansiedade ou agressão
o Procedimentos prolongados
o Situações de dor ou desconforto
» Cetamina (Vetaset®) 100 mg/mL: 0,5 a 1,0 mL/gato PO (2,0 a 3,0 mL numa
seringa acoplada a uma sonda Tom cat) - cuidado com a córnea
• Leva 10 min pra fazer efeito, que é leve e dura em média 30-40 minutos.
• Causa sialorreia profusa, se necessário atropinizar via IM ou IV (nunca PO
– acentua ainda mais a sialorreia).

• Alterações fisiológicas devido ao estresse


ü Neutrofilia, linfopenia
ü Hiperglicemia (até 600 mg/dL), glicosúria
ü Hipertensão,hipertermia
ü Taquicardia, taquipneia
ü Sopros cardíacos
ü Hipocalemia, ↑CK
ü Liberação dos sacos anais, defecação com muco/sangue
ü Resposta inesperada durante sedação e anestesia

• Postura veterinária
ü Seja paciente, calmo, positivo e seguro
ü Tenha respeito e seja eficiente
ü Nunca atenda com pressa, gera ansiedade
ü Nunca encare o gato nos olhos
ü Dar tempo para o gato se acalmar
ü Nunca lute ou use força com o gato
ü Nunca tente "aplicar corretivos"
ü Cuidado com os sons que parecem bufos
ü Está nervoso ou inseguro do que está fazendo: pare tudo e recomece com outra
técnica, com anestesia e segurança. Ou desista de algum procedimento
naquele dia e deixe para uma próxima consulta.

3. Técnicas de exame & contenção

A colheita de materiais biológicos….

ü Menos é mais
ü Contenção com toalhas
ü Evitar agarrar o cangote
ü Estar no mesmo nível
ü Avaliar a possibilidade de dor pela contenção
ü Concentração, planejamento e calma
ü Lugar aconchegante pro gato
ü Proprietário participa
ü Considerar anestésicos locais

Considerar sempre que:


ü Deve-se utilizar a menor contenção possível
ü Todos os gatos vão tentar escapar
ü Todos os gatos podem morder (medo, cheiros, barulho, dor, pessoas
estranhas)
ü Quanto menos movimentos bruscos melhor
ü Surpresas podem ocorrer
ü A concentração previne acidentes
ü A lei do tudo ou nada previne acidentes

Segurar no Cangote:
ü Estão muito estressados
ü A ideia é não piorar a situação
ü É intimidador e doloroso
ü Precisam ter controle da situação
ü Causa medo & ansiedade
ü Gera mais acidentes

O gato como paciente:

Þ Anamnese de rotina:
ü Queixa principal & resenha (idade!!!)
ü Hábitos alimentares & hídricos
ü Frequência e detalhes micção e defecação
ü Número de gatos no ambiente
ü Tipo de moradia, acesso à rua
ü Relacionada ao problema
Þ Alteração na rotina
Þ Interferência de infecções virais graves
Þ Metabolismo particular de fármacos
Þ Metabolismo energético diferente
Þ Muito sensíveis ao estresse
Þ Tratamento antes do diagnóstico
Þ Uma única chance
Þ Cada um é diferente

Þ Comportamento independente
Þ Territorialidade não-hierárquica
Þ Brigas e disputas entre machos
Þ Facilidade de reagir ao estresse
Traumas mais comuns: Acidentes automobilísticos, quedas de grandes altitudes e
feridas por combate

4. Hospitalização

ü Separar gatos de cães


ü Não podem ver outros gatos
ü Material, esconderijos
ü Ciclos de luz e escuridão
ü Temperatura entre 30 a 38°C
ü Usar feromônio no gatil, ambiente e nas mãos
ü Tecidos e objetos dos proprietários
ü Rotina previsível de cuidados
ü Tornar o gatil aconchegante e quente
ü Ter gatis largos e pouco profundos (70Lx70Cx90A)
ü Sempre recompensar positivamente
ü Soltar para sessões de brincadeira com segurança

• Fatores Estressantes:
Þ Outros animais & pessoas
Þ Barulhos (conversas, latidos, telefone)
Þ Cheiros e odores (animais, desinfetantes)
Þ Falta de esconderijo
Þ Pessoas não familiares
Þ Rotina de alimentação não familiar
Þ Superestímulo sensorial no hospital

• Como eles respondem:


Þ Suprimem comportamentos normais
Þ alimentação & descanso
Þ Aumentam a vigília
Þ Se escondem
Þ Demonstram sinais como:
Þ anorexia, vômito, diarreia, constipação

Sinais de medo na internação:


• Não se mexe
• Não come
• Não bebe
• Não interage
• Não dorme

Sinais de medo extremo:


• Vocaliza
• Morde
• Arranha
• Sente que não restam outras opções

Þ Pessoas treinadas e gentis (gateiras)


Þ Baixa iluminação e silencioso (40dB x 100dB)
Þ Rotina de alimentação e medicação
Þ Alimentação x medicação
Þ Música!
Þ Cuidado com esparadrapos
Þ Atenção, visitas dos proprietários

Cats prefer species-appropriate music


Applied Animal Behaviour Science
Volume 166, May 2015, Pages 106-111

ü Entre as escápulas apenas soro!!!


ü Aplicar medicações e vacinas o mais distal possível nos membros e cauda!

Empatia = sucesso da prescrição

✤ O proprietário entendeu?
✤ O proprietário está seguro?
✤ O proprietário tem condição de fazer o tratamento?
✤ O proprietário quer fazer o tratamento?

Comunicação com o cliente

✤ Tenha tempo!
✤ Explique....se for preciso, desenhe!
✤ Tenha tempo!
✤ Dê as opções
✤ Telefone, envie e-mail, torpedo, mensagem
✤ Tenha um “cat advocate”
A ida pra casa:
O gato não é reconhecido pelos outros gatos!
ü Bandagens, esparadrapos e anestésicos (24-48 hs)
ü Usar roupas, camas, panos de casa
ü Considerar feromônio facial sintético
ü Não forçar as interações
ü Aproximar aos poucos
ü Se for preciso, utilizar medicações

Conclusões:

Þ O gato não é um cão pequeno


Þ Busca por conhecimento específico
Þ Prezar pelo atendimento diferenciado
Þ Atenção para particularidades
Þ Quem ganha é o nosso paciente!!!

Livros recomendados:

1. LITTLE, S. E. The Cat: Clinical Medicine and Management. Elsevier Saunders,


2012.
2. NORSWORTHY, G.D. The Feline Patient. Fifth Edition. Wiley-Blackwell
Publishing, 2018.
3. AUGUST, J.R. Consultations in Feline Medicine. Volumes 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7. W.B
Saunders, 1991, 1994, 1997, 2001, 2006 e 2010 e 2016.
4. Harvey, A. BSAVA Manual of Feline Practice: A Foundation Manual. Wiley,
2013.
5. Fabián G. Minovich. El gato no es un perro chico. León, México: Imprenta Rayo,
2017.

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