Você está na página 1de 22

Corpo, Movimento

e Psicomotricidade
O Desenvolvimento Humano e a Aprendizagem

Responsável pelo Conteúdo:


Prof.ª Dr.ª Carmen Conti

Revisão Textual:
Prof.ª Me. Sandra Regina Fonseca Moreira
O Desenvolvimento Humano
e a Aprendizagem

• O Desenvolvimento Humanoe a Aprendizagem;


• Bases do Desenvolvimento Humano.

OBJETIVOS DE APRENDIZADO
• Apresentar a noção de como se desenvolvem e aprendem as crianças pequenas;
• Estudar como acontece o desenvolvimento das capacidades motoras, linguagem e habilidades
manuais na criança;
• Entender que na educação infantil, o desenvolvimento acontece no decorrer de três etapas:
maturação, desenvolvimento e aprendizagem de acordo com Bassedas, Huguet e Solé.
UNIDADE O Desenvolvimento Humano e a Aprendizagem

Contextualização
Reflita sobre as questões abaixo, permita-se divagar sobre elas e, dentro de
um contexto educacional, responda o que você acredita ser a verdade. Ou não há
verdades, apenas suposições?

É possível conhecer uma criança observando-a, colhendo informações sobre os movimentos


que ela executa, de maneira intencional ou reflexa?
Que linguagem ou que tipos de linguagens ela usa que permitem o seu conhecimento?
Ela expressa sua linguagem de maneira a se fazer entender? Como isso se processa? Ou não
se processa de maneira alguma e apenas inferimos informações dedutíveis?
Criança têm habilidades? Ou apenas movimentos reflexos a que denominamos habilida-
des manuais?

8
O Desenvolvimento Humano
e a Aprendizagem
Nesta unidade, estudaremos que, no ser humano, do nascer até os 6 anos, ocor-
rem as mais potentes e espetaculares mudanças, que se tornam visíveis e fazem
parte do dia a dia na vida de uma criança.

Nesta direção, os profissionais não deveriam ter somente conhecimentos voltados à


segurança e ao cuidar, esse profissional também passa a ter necessidade de conhecer
as fases de desenvolvimento de uma criança, para assim pensar nos melhores estímu-
los e avaliar as expectativas de respostas em cada uma das fases de desenvolvimento.

As pesquisas nesta área passam por fases de grandes descobertas e discussões.


Muitos pensadores da educação, ao investigar o desenvolvimento infantil, percebe-
ram que a inteligência se dá a partir do nascimento e se estende por toda a infância,
e, entender toda essa complexidade é fator essencial para um desenvolvimento de
sujeitos preparados para atuar no mundo.

Devemos estar prontos para atuar na área da educação, conhecendo todos os


direitos relacionados à infância, mas também as necessidades para um crescer em
toda a integridade do desenvolvimento humano.

Mas, afinal, quando falamos de desenvolvimento humano ou, mais especificamente,


do desenvolvimento infantil, a qual conhecimento estamos nos referindo para assim pla-
nejar e refletir sobre as nossas ações? Pois, na escola, as nossas ações devem ter inten-
ções e finalidades que levem em consideração a fase de desenvolvimento das crianças.

O desenvolvimento humano se dá pela aquisição ou aprendizagem de tudo aquilo


que o ser humano construiu ao longo da história da humanidade, da aquisição e da
interação com o seu meio (família, escola, crenças, costumes, entre outros aspectos),
mas esse desenvolvimento também se estabelece pela congruência destes estímulos
externos com toda a nossa complexidade interna, e tudo isso, como já estudamos em
unidade anterior, acontece pelo nosso corpo em movimento.

Hoje, a área da educação deve formar profissionais atentos à visão da complexida-


de humana, aos aspectos do desenvolvimento motor, cognitivo, afetivo, social, soma-
dos a nossa complexidade biológica, morfológica, emocional, física, muscular e ao
nosso meio ambiente. Tudo isso pode ser visto em cada ser humano, e esse conhe-
cimento deve ser familiar a todos que pretendem trabalhar no ambiente educacional.

Para começar, vamos esclarecer alguns aspectos para facilitar a organização do


nosso conhecimento. Alguns conceitos importantes neste momento: desenvolvimen-
to humano, aprendizagem, maturação e complexidade.

Estamos repetidamente falando sobre “desenvolvimento humano”, primeiro, é impor-


tante lembrarmos que o desenvolvimento humano é um campo em constante evolução,
assim, o que apresentamos hoje deve ser constantemente atualizado pelas suas pesquisas.

9
9
UNIDADE O Desenvolvimento Humano e a Aprendizagem

Desde o momento da concepção, tem início nos seres humanos um processo de


transformação que continuará até o fim da vida. Uma única célula se desenvolve até se
tornar um ser vivo, e, apesar de sermos singulares , únicos, as transformações que as
pessoas experimentam durante a vida apresentam padrões em comum, assim, o cam-
po que estuda o desenvolvimento concentra-se no estudo científico dos processos
sistemáticos de mudança e estabilidade que ocorrem nas pessoas.

Devemos estar atentos ao fato de que esse desenvolvimento acontece por várias
dimensões ou domínios, entre eles, a área educacional precisa conhecer a dimensão
motora, a dimensão cognitiva e a dimensão afetivo/social.

O desenvolvimento relacionado à dimensão motora está relacionado ao movimen-


to, ao corpo, ao domínio físico. Esse desenvolvimento refere-se ao corpo, às capaci-
dades sensoriais, e às habilidades motoras.

O desenvolvimento relacionado à dimensão cognitiva refere-se às mudanças nas


habilidades mentais (relacionadas ao conhecimento), tais como aprendizagem, atenção,
memória, linguagem, pensamento, raciocínio e criatividade.

Já o desenvolvimento afetivo/social observa os padrões de mudanças nas emoções,


na formação da personalidade e nas relações sociais.

Os autores que estudaram essas dimensões passaram a verificar quais são os


padrões em comum no desenvolvimento de cada fase do ser humano, isso quer
dizer o que devemos esperar de evolução em cada fase e assim planejar nossas
ações para os melhores estímulos.

Figura 1 – Imagem ilustrativa sobre o desenvolvimento humano


Fonte: Freepik

O segundo conceito que vamos entender se refere ao termo aprendizagem.


Existem várias abordagens ou teorias sobre o conceito de aprendizagem, e cada
abordagem apresentará uma concepção diferente do termo. Porém, um ponto de
vista comum entre essas abordagens é que aprendizagem indica mudança, trans-
formação do sujeito, isso quer dizer que a aprendizagem se dá através da assimila-
ção de informações que podem ser utilizadas posteriormente.

10
Para os futuros professores(as), é impossível falar em aprendizagem sem men-
cionar Jean Piaget (1896-1980). O biólogo, psicólogo e epistemólogo suíço estudou
com profundidade as etapas do desenvolvimento humano, pois, sim, desenvolvi-
mento humano e aprendizagem estão totalmente relacionados. Ao longo dos anos,
PIAGET foi responsável por estabelecer teorias que abordassem esse importante
aspecto da vida de todos nós, que é a aprendizagem.

Para o pesquisador, os organismos vivos tendem a se adaptar a um novo meio a


partir do momento em que passa a existir uma relação entre eles e o ambiente. Adquiri-
mos conhecimentos através de experiências com o contexto no qual estamos inseridos.

Segundo Piaget (1964), a interação entre o indivíduo e o ambiente é responsável


pela formação do conhecimento humano. O equilíbrio de uma ação com outras
ações pelo homem (ser humano) propicia a adaptação aos ambientes. A assimilação
é o elemento-chave que determina a base de todo esse processo de aprendizagem.

Sendo assim, Jean Piaget trouxe aos seus experimentos a constatação de que a
criança vivencia diferentes fases de desenvolvimento para adquirir habilidades funda-
mentais para sua vida, como o pensamento e a linguagem.

Por trás do processo de aprendizagem estão algumas etapas que são imprescin-
díveis para o progresso da mente e também para o fortalecimento da capacidade de
lidar com os desafios e as descobertas do conhecimento e aprendizado.

Figura 2 – Processo de aprendizagem


Fonte: Getty Images

Outro conceito importante é o termo maturação, pois o desenvolvimento e a aprendi-


zagem só podem acontecer em um período onde a criança apresenta certa maturação.

A Maturação diz respeito às mudanças que ocorrem ao longo da evolução, existente


no sistema nervoso central, sendo que o indivíduo se prepara para que todas suas condi-
ções e conexões nervosas cresçam e se adaptem às necessidades futuras do ser humano.

A maturação está vinculada ao corpo e ao cérebro, assim, podemos entender


que existe uma sequência natural de mudanças físicas e padrões de comportamento.
Essa informação tem total conexão com os conceitos de desenvolvimento humano
e aprendizagem, afinal uma criança só pode dar uma resposta a um estímulo caso
tenha áreas necessárias a essa resposta em uma fase de maturação apropriada.

11
11
UNIDADE O Desenvolvimento Humano e a Aprendizagem

[...] quando falamos de maturação, estamos referindo-nos às mudanças que


ocorrem ao longo da evolução dos indivíduos, as quais se fundamentam na
variação da estrutura e da função das células. (BASSEDAS, 1999, p. 20)

Bases do Desenvolvimento Humano


Utilizaremos o conceito de desenvolvimento integral para compreendermos as dife-
rentes dimensões que atuam no desenvolvimento de um ser humano, fazendo aqui uma
referência ao que comentamos anteriormente sobre o pensamento complexo. A di-
mensão motora, cognitiva e afetiva/social considera as principais. Todas as dimensões
se interpenetram, por exemplo, um corpo limitado na sua expressão ou com dificulda-
des nas relações sociais compromete e impacta diretamente nos processos cognitivos.
Assim, apesar da disciplina ter uma nomenclatura que parece tratar o desenvolvimento
do corpo, nossa referência sempre será pautada no desenvolvimento integral desse cor-
po. Desse modo, em cada área do desenvolvimento, podemos verificar as influências
da genética, da maturação, da aprendizagem e do meio ambiente em geral.

Quando estudamos teorias que tratam do desenvolvimento devemos ter uma con-
vicção de que toda mudança desenvolvimental, em qualquer dimensão, só pode ser
compreendida após uma visão dos padrões entre idades, assim, devemos conhecer
quais são as características de desenvolvimento previstas em cada fase.

Muitos autores verificaram que os domínios do desenvolvimento de cada dimen-


são são observados pelas habilidades e respostas comuns entre as crianças em uma
determinada fase do seu corpo.

Nos estudos de desenvolvimento humano, os fatores internos e externos devem ser


compreendidos. Embora muito do desenvolvimento inicial seja controlado pela matu-
ração (fatores internos), um mínimo do estímulo ambiental (fatores externos) é neces-
sário para um desenvolvimento considerado bem-sucedido. Ambientes empobrecidos
em estímulos podem retardar o desenvolvimento de diversas maneiras. A estimulação
do ambiente pode ter um impacto a longo prazo sobre o desenvolvimento motor,
das percepções da criança, das habilidades cognitivas e das relações sociais.

Neste momento, você já compreendeu que vamos precisar conhecer fatores do


desenvolvimento interno e identificar quais são os melhores estímulos para tornar o
desenvolvimento da criança dentro das expectativas de resposta para a fase do corpo
em que ela se encontra.

O crescimento e o desenvolvimento físico não podem ser ignorados quando pen-


samos no desenvolvimento integral da criança. Para uma criança desenvolver sua
dimensão motora que está relacionada ao seu movimento, temos que compreender
que as habilidades motoras dependem do crescimento muscular, cerebral, ósseo,
e que cada criança, apesar de ter as mesmas estruturas, apresenta ritmo de cresci-
mento e uma constituição corporal única. Assim, vamos observar como essa singu-
laridade de cada criança pode exercer profundas influências sobre a maneira que a
criança desenvolve sua autoimagem, bem como alguns aspectos comportamentais.

12
No início, embora a gestação e o parto, com suas histórias específicas, tragam
diferenças, o processo de nascimento é muito semelhante para a maioria dos bebês.
Assim, quando nasce uma criança, já podemos determinar se seu crescimento e
desenvolvimento pode evoluir dentro das expectativas dos padrões desejados?

Atualmente, observamos que a constituição e crescimento do feto podem receber


influências ambientais com grande impacto durante a fase pré-natal e, posteriormente,
durante todo o desenvolvimento da criança. As influências ambientais são diversas,
e, dentre elas podemos citar as doenças que podem acometer a mãe (rubéola e sífilis),
as drogas utilizadas, o estilo de vida (sedentarismo, obesidade, fumo, bebida), a idade
da mãe, dietas pobres que podem afetar o desenvolvimento das células do cérebro
e dos tecidos do sistema nervoso, o estado emocional da gestante, entre outros.
Durante o desenvolvimento pré-natal, há períodos durante os quais o organismo em
desenvolvimento é particularmente vulnerável a essas influências. Durante o nasci-
mento, existem também alguns riscos que podem interferir no desenvolvimento de
uma criança, provenientes da falta de oxigênio, ou no caso de crianças prematuras,
que têm algum comprometimento durante sua fase de desenvolvimento (BEE, 2012).

Após o nascimento, as crianças continuam o seu desenvolvimento pela matura-


ção e pelo contato com o ambiente. Os bebês utilizam as primeiras semanas para
muita exploração visual.

Na tabela abaixo, vamos observar características de desenvolvimento nas três


grandes dimensões, assim, podemos pensar nas respostas esperadas em cada fase.

Tabela 1 – Principais Desenvolvimentos Típicos da Infância


Desenvolvimentos Desenvolvimentos Desenvolvimentos
Faixa Etária
Físicos Cognitivos Psicossociais
• Ocorre a concepção; • As capacidades de aprender • O feto responde à voz da mãe
• A dotação genética interage e lembrar estão presentes e desenvolve uma preferência
com as influências ambientais durante a etapa fetal. por ela.
desde o início;
• Formam-se as estruturas e os
Período Pré-Natal órgãos corporais básicos;
(Concepção ao • Inicia-se o crescimento cerebral;
Nascimento) • O crescimento físico é o mais
rápido de todo o ciclo vital;
• O feto ouve e responde os
estímulos sensórios;
• A vulnerabilidade a influência
ambientais é grande.
• Todos os sentidos funcionam no • As capacidades de aprender • Desenvolve-se um apego aos
nascimento em graus variados; e lembrar estão presentes, pais e a outras pessoas;
• O cérebro aumenta de mesmo nas primeiras semanas; • Desenvolve-se a autoconsciência;
complexidade e é altamente • O uso de símbolos e a • Ocorre uma mudança da
Primeira Infância
sensível à influência ambiental; capacidade de resolver dependência para a autonomia;
(Nascimento aos • O crescimento e o problemas desenvolvem-se ao • Aumenta o interesse por
3 Anos)
desenvolvimento físico das final do segundo ano de vida; outras crianças.
habilidades motoras são rápidos. • A compreensão e o uso
da linguagem
desenvolvem-se rapidamente.
Fonte: Adaptada de PAPALIA e FELDMAN (2013)

13
13
UNIDADE O Desenvolvimento Humano e a Aprendizagem

Para Gallahue e Ozmun (2005), os seres humanos apresentam a capacidade de


interagir com o meio ambiente através dos movimentos. Essa capacidade sofre alte-
rações ao longo do desenvolvimento da criança e durante todo seu ciclo de vida, de-
vido a características como crescimento, maturação, capacidades físicas, e aspectos
ambientais, como espaços, superfícies, inserção sócio cultural, além de, por último,
as exigências das tarefas.

Por volta do 2° mês, ao menos de acordo com alguns pesquisadores como Jean Piaget,
existe sim, uma grande mudança na direção de comportamento em direção a ações mais
propositais, contudo, é por volta dos 6 meses que a criança ganha um maior controle mo-
tor. Essa evolução é gradativa, por volta de 1 mês o bebê ergue o queixo, aos 2 meses pode
levantar o pescoço e aumenta assim a sua exploração visual, a manipulação para agarrar e
para alcançar objetos começa a se desenvolver. Por volta de 5 meses, ele busca os objetos
e o desenvolvimento segue, na medida em que o controle motor se torna melhor, outros
tipos de exploração tornam-se possíveis, fazendo o processo de aprendizagem e desenvol-
vimento se manifestarem como algo estreitamente relacionado (BEE, 2012). O ápice do
refinamento da dimensão motora acontece por volta dos 6 anos de idade, ainda que todas
as dimensões se desenvolvam até o final da vida.

Recordando o conceito, as mudanças que ocorrem em um indivíduo desde sua


concepção até a morte denominam-se desenvolvimento humano. O desenvolvimento
é composto por mudanças comportamentais e estruturais. O processo de desenvol-
vimento motor revela-se por alterações no comportamento motor, o que proporciona
o processo de aprender a mover-se com controle e competência para interagir com o
ambiente (GALLAHUE e OZMUN, 2001).

O processo de desenvolvimento motor é apresentado por Gallahue e Ozmun (2001)


em uma forma de ampulheta. Os autores caracterizam o desenvolvimento da dimensão
motora por fases e expectativas de respostas.

Utilização Utilização Utilização


Permanente Permanente Permanente
na Vida Diária Recreativa Competitiva

FAIXAS ETÁRIAS APROXIMADAS OS ESTÁGIOS DE


DE DESENVOLVIMENTO DESENVOLVIMENTO MOTOR
14 anos e Acima Estágio de Utilização Permanente
De 11 a 13 Anos
FASE MOTORA Estágio de Aplicação
De 7 a 10 Anos ESPECIALIZADA Estágio Transitório
De 6 a 7 Anos FASE MOTORA Estágio Maduro
De 4 a 5 Anos Estágio Elementar
De 2 a 3 Anos FUNDAMENTAL Estágio Inicial
De 1 a 2 Anos FASE MOTORA Estágio de Pré-Controle
do Nascimento
Até 1 Ano RUDIMENTAR Estágio de Inibição de Reflexos

De 4 Meses a 1 Ano FASE MOTORA Estágio de Decodificação de Informações


Dentro do Útero e Até Estágio de Codificação de Informações
4 Meses de Idade REFLEXIVA

Figura 3 – Fases do desenvolvimento motor


Fonte: Adaptada de GALLAHUE e OZMUN (2001)

14
Para os autores, as fases são divididas em:
• Fase motora reflexiva: os reflexos são as primeiras formas de movimento humano.
Esses são involuntários e formam a base para as fases do desenvolvimento motor.
A partir da atividade de reflexos, o bebê obtém informações sobre o ambiente;

Nesta fase existem os estágios de codificação de informações (movimentos mais


aleatórios) e a decodificação de informações (movimentos mais propositais);

Reflexos do bebê, disponível em: https://bit.ly/2XAWJg6

• Fase de movimentos rudimentares: os movimentos rudimentares são determi-


nados de forma maturacional e caracterizam-se por uma sequência de apareci-
mento previsível. Esta sequência é resistente a alterações em condições normais.
Elas envolvem movimentos estabilizadores, como obter o controle da cabeça,
pescoço e músculos do tronco, as tarefas manipulativas de alcançar, agarrar
e soltar, e os movimentos locomotores de arrastar-se, engatinhar e caminhar;

Figura 4
Fonte: Getty Images

• Fase de movimentos fundamentais: as habilidades motoras fundamentais


da primeira infância são consequências da fase de movimentos rudimentares.
Esta fase do desenvolvimento motor representa um período na qual as crianças
pequenas estão envolvidas ativamente na exploração e na experimentação das
capacidades motoras de seus corpos;

Figura 5
Fonte: Getty Images

15
15
UNIDADE O Desenvolvimento Humano e a Aprendizagem

• Fase de movimentos especializados: esse é um período em que as habilida-


des estabilizadoras, locomotoras e manipulativas fundamentais são progressi-
vamente refinadas, combinadas e elaboradas para o uso em situações crescen-
temente exigentes.

Figura 6
Fonte: Getty Images

Guedes e Guedes (1997) referem-se ao desenvolvimento motor como sendo não


apenas aspectos biológicos de crescimento e maturação. Os autores acreditam que o
desenvolvimento depende das experiências vividas pelo indivíduo e das relações com
o ambiente que o cerca. Le Boulch (1982) deixa evidente a preocupação de estudiosos
da área em identificar os mecanismos e variáveis que influenciam o d
­ esenvolvimento
motor e as fases específicas em que cada indivíduo é mais suscetível às influências
de determinados estímulos.

Nesta direção, compreendemos que o crescimento e maturação do ser humano


é um processo natural, ainda que o ambiente pode afetar de maneira diferente o
desenvolvimento das dimensões para cada indivíduo.

O pesquisador Lev Semenovitch Vigotski, importante psicólogo russo, revolucio-


nou o pensamento de sua época quando apresentou a sua particular compreensão do
desenvolvimento humano na perspectiva histórico-cultural (BRANDOLISE, 2018).

Lev Vigotski se opôs às concepções de desenvolvimento de sua época e acredita-


va que o processo, ou as fases de desenvolvimento, estavam atrelados às condições
de aprendizagem. Para o autor, aprendizagem e desenvolvimento não são sinônimos
nem se antagonizam, mas estabelecem profundas relações. (BRANDOLISE, 2018).
A teoria de Vigotski descreve que o desenvolvimento, acontece por uma dupla for-
mação, ou seja, a dos planos biológico e cultural, que conduzem a esse processo.

Retomando a Jean Piaget, a pergunta fundamental que ele formulou, em 1911, e que
orientou suas pesquisas foi: como o ser vivo consegue se adaptar ao meio ambiente?

Essa foi a pergunta que levou o pesquisador a duas situações problema, a da


adaptação biológica e ao problema do conhecimento. Piaget chegou a duas ideias
centrais, a primeira que a adaptação biológica de todo organismo vivo, assim como
toda aquisição de repertório intelectual, se faz através da assimilação de um dado

16
exterior (ambiente) e o conhecimento não pode ser uma cópia, mas uma integração
em uma estrutura mental pré-existente que, ao mesmo tempo, vai ser mais ou menos
modificada por esta integração. A segunda ideia central é que os fatores normati-
vos do pensamento correspondem às relações, às necessidades de equilíbrio que se
observam no plano biológico. Assim, quando aprendemos algo novo precisamos
organizar nossas estruturas (CAVICCHIA, 1993).

Para o autor, o conhecimento acontece pelas trocas entre o organismo e o meio.


Essas trocas são responsáveis pela construção da própria capacidade de conhecer,
já que as informações do ambiente produzem estruturas mentais que, ainda que sejam
orgânicas, não estão programadas no desenvolvimento do ser humano, mas apare-
cem como resultado das solicitações do meio ao organismo, assim sua adaptação
biológica (CAVICCHIA, 1993).

A essa adaptação biológica entre o estímulo do ambiente e organização do or-


ganismo para uma resposta, Piaget chama de processo de adaptação, e o autor
complementa com dois aspectos: a assimilação e a acomodação. A adaptação do
ser humano ao meio ambiente se realiza através da ação (organização de nossas es-
truturas), elemento central da teoria piagetiana, indicando o centro do processo que
transforma a relação com o objeto em conhecimento.

A capacidade de organizar e estruturar a experiência vivida por cada ser humano


é um processo das estruturas mentais que funcionam seriando, ordenando, classifi-
cando e assim estabelecendo relações, porém, como apresentamos anteriormente,
muitos aspectos estão envolvidos neste processo (maturação, ambiente, influências na
gestação, momento do nascimento). Para Piaget, todo esse processo é denominado de
desenvolvimento cognitivo. Nesse desenvolvimento, o autor elencou diferentes estágios
que expressam as etapas pelas quais se dá a construção do mundo pela criança.

Nas suas pesquisas, Piaget acreditava que para acontecer os estágios de desenvol-
vimento é necessário, em primeiro lugar, que a ordem das aquisições seja constante.
Trata-se de uma ordem sucessiva e não apenas cronológica, isso quer dizer que
existe a dependência da experiência do sujeito, e não apenas de sua maturação ou
do meio social.

Além desse critério, Piaget propõe uma divisão por períodos ou fases para carac-
terizar estágios no desenvolvimento cognitivo. Sendo assim, o pesquisador distinguiu
quatro grandes períodos no desenvolvimento das estruturas cognitivas relacionados
ao desenvolvimento da afetividade e da socialização da criança: estágio da inteligên-
cia sensório-motora (de 0 a aproximadamente 2 anos); estágio da inteligência sim-
bólica ou pré-operatória (2 a 7-8 anos); estágio da inteligência operatória concreta
(7-8 a 11-12 anos); e estágio da inteligência formal (a partir, aproximadamente,
dos 12 anos), (CAVICCHIA, 1993).

Os estágios propostos por Piaget estão relacionados a degraus de equilíbrio, pois


quando a criança recebe um estímulo todo o seu organismo deve se reestruturar para
se reequilibrar, e, assim que o equilíbrio é atingido num ponto, a estrutura é integrada
em novo equilíbrio em formação.

17
17
UNIDADE O Desenvolvimento Humano e a Aprendizagem

Os diversos estágios ou etapas surgem, portanto, como consequência das suces-


sivas equilibrações de um processo que acontece no decorrer do desenvolvimento.
Essa construção só pode acontecer quando as competências cognitivas do ser humano
estão preparadas para o próximo estímulo.

A equilibração é, pois, o processo pelo qual se formam as estruturas cognitivas


e constitui, em última análise, a expressão da lei funcional que afirma a atuação
das estruturas. O processo que conduz desequilíbrios e reconstruções de estru-
turas mentais é o fator determinante no progresso do desenvolvimento cognitivo
(CAVICCHIA, 1993).

Na teoria de Piaget, a concretização ou realização dessas possibilidades dependerá


do meio no qual a criança se desenvolve, uma vez que a capacidade de conhecer é
resultado das trocas do organismo com o meio. Da mesma forma, essa capacidade
de conhecer depende, também, da organização afetiva, uma vez que a afetividade e a
cognição estão sempre presentes em toda a adaptação humana.

O desenvolvimento integral é um emaranhado de aspectos que envolvem a com-


plexidade do ser humano. Esses aspectos, como vimos, são compostos pela nossa
complexidade interna e nossa interação e relação com o ambiente (externo), com
seus espaços, objetos e pessoas.

É importante recordarmos que, quando falamos em desenvolvimento integral,


estamos afirmando que o desenvolvimento nunca acontece em dimensões isoladas,
e sim em conexão com toda sua complexidade.

Figura 7 – Imagem referente ao desenvolvimento


integral, com todas as dimensões atuando
Fonte: sxc.hu

18
Agora, vamos conhecer a importância do corpo neste desenvolvimento integral.
Assim como todos os nossos aspectos, a dimensão motora é parte integrante do
ser humano e da sua experiência humana. Portanto, mais do que um deslocamento
do corpo no espaço, o movimento constitui-se como uma linguagem, em algumas
fases de desenvolvimento, como a única forma de comunicação e interação com o
ambiente. Por meio do corpo e do movimento, a criança interage e se comunica.
Conhece mais sobre si, sobre o outro e o mundo que a cerca. Expressa sentimentos,
emoções e pensamentos, aprimorando seus gestos e posturas corporais e, nessa
direção, se desenvolve.

Na próxima unidade, vamos conhecer a Psicomotricidade, uma ciência que estuda


o homem em seu desenvolvimento integral, com suas relações internas e externas.

19
19
UNIDADE O Desenvolvimento Humano e a Aprendizagem

Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

Livros
Compreendendo o Desenvolvimento Motor
Obra mundialmente reconhecida, apresenta um texto acessível com base descritiva
e explicativa para os processos e produtos dinâmicos do desenvolvimento motor.
Abrangendo todas as fases da vida a partir de uma perspectiva das restrições,
o livro enfoca as fases do desenvolvimento motor, proporcionando uma sólida
introdução aos aspectos biológicos, afetivos, cognitivos e comportamentais de cada
fase. Os autores trazem o que há de mais atual em termos de teoria e pesquisa,
utilizando o Modelo de Ampulheta Triangulada como estrutura conceitual que
auxilia o leitor no entendimento do desenvolvimento motor do bebê, da criança, do
adolescente e do adulto.
GALLAHUE, D. L.; OZMUN, J. C. D.; GOODWAY, J. Compreendendo o
Desenvolvimento Motor. 7 ed., Amgh Editora.

Vídeos
D-14 - O movimento do corpo infantil - uma linguagem da criança
Neste vídeo, você verá uma escola que utiliza o movimento como base para o
trabaho pedagógico, e o quanto é importante o seu uso para o desenvolvimento
infantil, pois é considerada uma linguaguem de cominucação que a criança utiliza.
https://youtu.be/X1UzQjKZVUA
PhD. David Gallahue na FSG - FSG Comunica 39ª Edição
Neste vídeo você verá uma pequena entrevista realizada com o Prof. David Lee
Gallahue, um dos mais importantes pesquisadores sobre o desenvolvimento motor.
O Curso de Educação Física da Faculdade da Serra Gaúcha (FSG) promoveu o
3º Congresso Internacional de Motricidade da Serra gaúcha.
https://youtu.be/1_R9-BBKyLM

Leitura
A importância do movimentar-se e suas contribuições para o desenvolvimento
A didática do professor nas aulas de educação física infantil: a importância do
movimentar-se e suas contribuições para o desenvolvimento da criança. Autores:
Lillian dos Santos Belo Oliveira e Carolina Petruy.
https://bit.ly/2yk5GQp

20
Referências
BASSEDAS, E.; HUGUET, T.; SOLE, I. Aprender e Ensinar na Educação Infantil.
Porto Alegre: Artes Médicas, 1999.

BEE, H.; BOYD, D. A criança em desenvolvimento. Porto Alegre: Artmed. 2011.

BRANDOLISE, F. M. Desenvolvimento Humano, Brincadeira, Educação Infan-


til e as Contribuições de Vigotski e Winnicott. Piracicaba: UNIMEP, 2018.

CAVICCHIA, D. de C. O Cotidiano da Creche: um projeto pedagógico, São Paulo:


Loyola, 1993.

GALLAHUE, D. L.; OZMUN, J. C. Compreendendo o Desenvolvimento motor:


bebê, criança, adolescente e adulto. 1 ed., São Paulo: Phorte Editora, 2001.

________. Compreendendo o desenvolvimento motor: Bebê, Criança, adoles-


cente e adulto. 3 ed., São Paulo: Phorte Editora, 2005.

GUEDES, D. P.; GUEDES, J. E. R. P. Características dos programas de educação


física escolar. Revista Paulista de Educação Física, v.11, n.1, p.49-62, 1997.

LE BOULCH, J. Educação psicomotora: a psicomotricidade na idade escolar.


Porto Alegre: Artes Médicas, 1987.

PIAGET, J. Seis estudos de psicologia. Editora Forense: 1964.

SALLES, V. O.; MATOS, E. A. S. Á. de. A Teoria da Complexidade de Edgar Morin


e o Ensino de Ciência e Tecnologia. Revista Brasileira de Ensino de Ciência e
Tecnologia, v. 10, n. 1, 2017.

21
21

Você também pode gostar