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STANTON, M. E. (1992). “El centro cultural de Polinesia:


Un modelo multi-étnico de siete culturas del Pacifico”. En
V. L. E. Smith (Ed.), Anfitriones e invitados (pp. 373-393). O TURISMO COMO OBJETO DE ESTUDOS
Madrid: Endymion. NO CAMPO DAS CIENCIAS SOCIAIS
STEBBINS, R. A. (1996). “Cultural Tourism as Serious
Carlos Alberto Steil*
Leisure”. Annals of Tourism Research, 23(4): 948-950.
SWEENEY, A. (1996). “Socio-cultural impact between visitors Vamos abordar neste texto o processo pelo qual o
and the local community”. En M. Robinson;N. Evans y P. turismo aparece no campo das ciéncias sociais como um
Callaghan (Eds.), Tourism and cultural change (pp. 257- objeto de estudo e passa a ser formulado como um fato
280). Sunderland (Gran Bretafia): Centre for Travel and social, constituindo uma drea especifica de pesquisa den-
Tourism. Business Education Publisher. tro da sociologia e da antropologia. Neste universo já bas-
TIERNEY, P. T.; DAHL, R. y CHAVEZ, D. (2001). “Cultural tante vasto de autores e trabalhos que tém enfocado o
diversity in use of undeveloped natural areas by Los turismo como tema, vamos destacar duas perspectivas de
Angeles county residents”. Tourism Management, 22(3): anilise que, embora em diálogo permanente, demarcam
271-277. diferengas significativas em termos do ponto de vista que
assumem: uma mais sociolgica e outra mais antropolégi-
VITTE, P. (1997). Tourisme en espace rural: le territoire 2
ca. Enquanto a sociologia tende a construir um olhar exter-
'épreuve. Revue de Géographie Alpine, 86(3): 69-85.
no sobre o turismo, pensando-o em termos do seu papel
WHEELLER, B. (1994). “Egotourism, sustainable tourism and na organizagio e no processo social como um todo, a an-
the environment - a symbiotic, symbolic or shambolic tropologia busca penetrar em sua dinimica interna,
relationship”. En A. V. Seaton (Ed.), Tourism. The state of enfocando as dimensdes culturais e interculturais e procu-
the art (pp. 647-654). Chichester: John Wiley and Sons. rando langar luz sobre um conjunto de priticas sociais que
WIGHT, P. (1994). “Environmentally Responsible Marketing estabelecem uma complexa rede de relagdes onde estão
of Tourism”. En E. Cater y G. Lowman (Eds.), Ecotourism: envolvidos diversos agentes individuais e institucionais.
A Sustainable Option? (pp. 39-55). Chichester UK: John Neste sentido, se a sociologia pensa o turismo como um
Wiley & Sons. “fato social” que “preexiste” ao individuo e se impoe des-
de o exterior, a antropologia vai considerd-lo preferencial-
WILLIAMS, P. W. (1992). “Desafios en el manejo del turismo
mente como um “fato social total”, ou seja, um dominio em
ecolégico”. Estudios y Perspectivas en Turismo, 1(2): 142-
149. que os individuos estão inteiramente implicados com seus
pontos de vista, interesses e motivacdes conscientes e la-
YIANNAKIS, A. y GIBSON, H. (1992). “Roles tourists play”. tentes.
Annals of Tourism Research, 19(2): 287-303.

* Doutor em Antropologia, professor da Universidade Federal do Rio


Grande do Sul.
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O TURISMO COMO OBJETO DA SOCIOLOGIA ¢lass, publicado em 1889 e que se apresenta como o pri-
meiro trabalho propriamente sociolégico sobre turismo,
A apresentagio, ainda que breve e esquemitica, das tornando-se um clissico na disciplina. Esse livro trata da
principais correntes sociolGgicas sobre o turismo torna-se evolução do lazer no processo de constituicio das classes
indispensivel a0 nosso estudo, ainda que de caráter antro- sociais, estabelecendo uma associagiio entre turismo e lazer
polégico, na medida em que, ao partilharmos de um con- que se tornard recorrente nos estudos posteriores na drea
texto intelectual comum, tendemos a incorporar em nosso (Veblen, 1994). Veblen constata que o lazer, que caracte-
olhar sobre os turista: interpretagdes e explicações pro- rizou a elite aristocritica pré-capitalista, também vai ser
duzidas pela sociologia'. E, para levarmos mais longe esta assumido pela nova elite, apesar da ideologia burguesa
observagio, poderiamos dizer que os préprios turistas aca- que fez do trabalho o valor central do seu sistema social,
bam assumindo em suas priticas e reflexdes tanto as ex- como o principal simbolo de distinção de um novo status,
plicagdes teéricas elaboradas pela sociologia quanto as in- adquirido nio pelo sangue, mas pela posse de riquezas. A
terpretagdes dos antrop6logos, em suas etnografias. Tendo imitação do antigos aristocratas, os burgueses vão procurar
presente a indissociabilidade entre estas duas áreas do co- ostentar sua “inatividade” (lazer) num mundo fundado so-
nhecimento e sobre a teoria e a pritica do turismo, procu- bre o valor absoluto do trabalho, como um signo de distin-
ramos elaborar um esquema que destaca trés correntes de ção. Segundo Veblen, na ideologia burguesa, o uso do
interpretação do turismo no campo da sociologia: uma pri- tempo de ociosidade não teria como finalidade o desfrute
meira que o toma como um simulacro do real; outra que o pessoal, mas seria antes um meio para mostrar aos olhos
analisa a partir do referencial teórico usado nos estudos da de todos um novo status que distingue os burgueses dos
religido, particularmente a teoria dos rituais; e uma última trabalhadores, permitindo aqueles deter um dominio sobre
que procura associar turismo e consumo, invertendo o sen- o tempo que é vedado a estes. Assim, o lazer e o consumo
tido que estas priticas e categorias possufam nas andlises ostentatdrio se tornam o principal simbolo da classe domi-
anteriores, propondo, assim, um sentido positivo para os nante?.
dois pólos da diade. A mesma questio relacionando lazer e trabalho apa-
Antes de entrarmos na caracteri; ção das correntes rece pela primeira vez na Franca, na década de 1950, no
acima referidas, faz-se necessdria algumas breves conside- trabalho de Friedmann (Friedmann, 1956). Este soci6logo
rações sobre dois autores que antecedem a formagio de destaca o papel do lazer como uma experiéncia criativa
uma drea de estudos sobre o turismo nas Ciéncias Sociais. de recomposi¢io da personalidade do trabalhador, frag-
O primeiro é Veblen, autor do livro The theory of the leisure mentada pelo trabalho “parcclado” e mecinico que se ge-

! A mesma regra vale para outros ramos do conhecimento que tém


produzido conhecimento sobre o turismo. Se nos restringimos ao cam- ? Um outro trabalho que deve ser citado, destes primérdios em que se
po da sociologia, é porque esta drea está mais proxima a antropologia, vai construindo uma problemtica sobre o wrismo, e que busca sua
estabelecendo uma situação em que as fronteiras se apresentam borra- inspiração nos escritos de Simmel, data de 1930: é o de Léopold von
das e muitas vezes até mesmo imperceptiveis. Wiese (ver Amirou, 1995).
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neraliza na Franga depois da Segunda Guerra com a impo- social. Neste sentido, uma das primeiras e mais influentes
sição do modelo fordista na produção industrial®. Esta aná- formulagdes teéricas é a andlise que Boorstin [Borstein,
lise propde pela primeira vez a tese do “lazer compensa- 1964 #210] faz do turismo como um simulacro que, como
tório” e das férias como cano-de-escape para as tensdes aparece já no titulo do seu livro, Imagem: um guia para os
produzidas pela atividade produtiva. A tese do lazer com- pseudo-acontecimentos na América, remete a um sentido
pensatério, como uma variante do lazer alienado está pre- falso ou de fuga da realidade. Como afirma John Urry (1996),
sente ainda hoje, fazendo do lazer e do turismo um fend- a0 argumentar que os americanos contemporineos não po-
meno diretamente determinado pelo trabalho. dem vivenciar a “realidade” diretamente, recorrendo então
Nas sociedades ocidentais, no entanto, os padrdes de a “pseudo-acontecimentos”, Boorstin seria um precursor
lazer se tornaram nas Gltimas décadas muito mais comple- de Baudrillard (Baudrillard, 1988) que, ao analisar as for-
xos do que aqueles que os autores acima analisaram. O mas de simulacro na sociedade americana, refere-se ao
consumo de tempo livre ji nao se constitui num privilégio turismo como um exemplo fundamental desses “pseudo-
ou numa distingdo exclusiva de uma classe dominante. O acontecimentos”.
direito ao lazer e as férias foi incorporado ao cotidiano dos O turismo, especialmente na sua versão de turismo
trabalhadores e se tornou uma caracteristica do cidadao de massa, aparece na anilise desses autores como uma
moderno, que o associa diretamente 2 saúde e ao bem- prática social que carece de autenticidade. As viagens,
estar. “Eu preciso de férias” é uma reflexio que faz parte guiadas por agentes turisticos, criariam, assim, um ambien-
desta visio de mundo que de algum modo naturalizou o te artificial para seus participantes, não permitindo que
consumo de tempo fora do trabalho como uma necessida- estes tenham qualquer contato com o mundo “real” dos
de fundamental de todo ser humano. habitantes que os acolhem. Do ponto de vista dos nativos
e promotores do turismo, teriamos uma outra situagio de
inautenticidade, visto que estes sao induzidos a realizar
O TURISMO COMO SIMULACRO espeticulos e exibicdes, cada vez mais estereotipadas para
observadores ingénuos e “alienados”. O turismo estaria,
O inicio da formação de uma drea de estudos com assim, reforcando um sistema fechado de ilusoes que se
certa autonomia sobre turismo na sociologia contempora- perpetuaria através de simulacros que funcionam como
nea pode ser situado nos anos de 1960, quando aparece espacos de fuga. Boorstin fala das viagens turisticas como
um nimero significativo de trabalhos sobre o tema, na sua uma espécie de “bolha ambiental” que, ao invés de condu-
maioria de cariter bastante critico quanto a esta pritica zir ao encontro do outro ou do diferente, isolaria o turista
de qualquer experiéncia de estranhamento, refor¢ando,
inclusive, os valores e as estruturas de origem.
? Friedmann estabelece uma comparagio entre o contexto de produ- A idéia de que o turista moderno se encontra sempre
ção moderno e o trabalho do artesão, ressaltando as consequéncias num mundo circunscrito se torna o centro das anilises pos-
negativas do modelo fordista na formação da personalidade ¢ saúde
mental do trabalhador. teriores que reproduzem e refinam a tese relativamente
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simples que associa turismo de massa e inautenticidade. Pearce e Moscardo retomam, em suas anilises, o conceito
Neste sentido, pode-se citar o livro The Golden Hordes, de de autenticidade, afirmando que é pre: distinguir entre
Turner e Ash (Turner and Ash, 1973) que constr6i uma a autenticidade do cenirio e a autenticidade das pessoas
imagem do turista moderno em oposigio a do “viajante (Pearce and Moscardo, 1986). Aqui também a critica se
individual”. Enquanto este deixava seu pafs de origem dirige à construção idealizada de um turista que aparece
movido pela curiosidade e pelo espirito de aventura, o nas andlises sociolégicas destituido de seu contexto e das
turista moderno viaja protegido por intimeros promotores singularidades que podem revestir uma experiéncia
de viagens, mensageiros, gerentes de hotel que o aliviam diversificada e extensa como o turismo moderno. Por fim,
de qualquer responsabilidade. Tais autores observam, por- a critica de Pearce e Moscardo é radicalizada por Crick,
tanto, uma guinada histérica do viajante para o turista, que que assinala que não somente a experiéncia do turismo
teria empobrecido a experiéncia do encontro do outro. moderno é inauténtica, mas todas as culturas sio “encena-
Argumentam também que a sensibilidade e o senso das” ¢, em certo sentido, inauténticas (Crick, 1988). Se as
estético do turista não transcendem os limites do seu gru- culturas mesmas são inventadas, refeitas e os seus ele-
po, tendendo, inclusive, a serem reforgadas neste encon- mentos reorganizados continuamente, não se tem porque
tro, na medida em que o olhar sobre o nativo fica na su- considerar o turismo como um tropos privilegiado do
perficialidade de uma experiéncia em que o outro é ape- inauténtico. Ao contririo, pode-se ver, como o faz
nas um espelho no qual o turista reafirma seu cédigo e MacCannell, os “espagos turisticos como a autenticidade
hierarquia de valores. A conseqiiéncia disto é que os turis- encenada”, onde os promotores do turismo constréem os
tas acabam transitando por “um pequeno mundo monóto- bastidores.
no, que, em todos os lugares, mostra sua prépria ima- A questão da autenticidade vai aparecer novamente
gem... a procura do exdtico e do diverso acaba em unifor- em Harkin como uma questão a ser abordada a partir da
midade” (Turner e Ash, 1975: 292). dialética entre o exótico e o familiar que, segundo este
A critica a esta análise é feita por Cohen (Cohen, autor, seria inerente à prépria experiéncia turistica (Harkin,
1972; Cohen, 1979; Cohen, 1988), que procura desconstruir 1995). A busca da autenticidade, na perspectiva de Harkin,
essa visdo idealizada do trista enquanto tal, mostrando, ndo diz respeito ao objeto ou espetdculo a ser apreciado
em contrapartida, que existe uma variedade de tipos de pelo turista, mas à experiéncia que o torna capaz de con-
turistas ou formas pelas quais a experiéncia turistica é frontar o seu mundo familiar a partir do encontro com o
vivenciada. Nesta mesma dire¢io vai a critica de diferente e o exdtico. Por isso mesmo, para o autor “a
MacCannell, também preocupado com a questao da busca da autenticidade é essencial, se não a todo turismo,
inautenticidade e da superficialidade da vida moderna ao menos às suas formas mais prestigiosas” (1995: 653),
(MacCannell, 1999 (1976)). Para este autor, como veremos nas quais o turista se torna capaz de apreender a diferenga
em seguida, todos os turistas personificam a busca da au- como uma alternativa em relação às suas crengas e costu-
tenticidade, e essa busca é uma versio moderna da preo- mes. Nesse sentido, assim como a antropologia, o turismo
cupação humana universal com o sagrado (Urry, 1996: 24). se apresentaria como um discurso possivel e singular so-
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bre o ex6tico. Mas, se a contribuição de Harkin em deslo- para o mundo moderno (Chambers, 1997).
car a questão da autenticidade de uma perspectiva moral e Ao relacionar turismo e religido numa perspectiva
estética para a dialética entre o exético e o familiar foi durkheimiana, a questão do sagrado e do profano niao pode
muito positiva, a sua generalizagao de que as formas pres- deixar de ocupar um lugar central na análise desses auto-
tigiosas de turismo refletiriam a inautenticidade da vida res. MacCannell refere-se a um processo de sacralizagio
moderna, parece reiterar o mesmo problema das generali- no turismo que seria semelhante ao que acontece no cam-
zagdes que criticamos acima. po religioso, fazendo com que determinados artefatos, na-
turais ou culturais, sejam erigidos como objeto de venera-
ção e respeito através de ritos turisticos que os cercam de
O REFERENCIAL RELIGIOSO NA INTERPRETACAO um poder e for¢a para retirá-los do mundo profano ou do
DO TURISMO cotidiano das pessoas. Elevacio, veneração, respeito, ad-
miração etc. são sentimentos que pertencem ao dois cam-
A aplicação de forma sistematica do referencial dos pos, do religioso e do turismo, e são produzidos pelo mes-
estudos da religiao e dos rituais para interpretar o fenôme- mo mecanismo social de elei¢io e divisao do mundo em
no do turismo moderno aparece pela primeira vez nos sagrado e profano.
trabalhos de MacCannell (MacCannell, 1973-1976). Sua ins- Sua imagem do turista, no entanto, ainda se constr6i
piração, no entanto, pode ser atribuida à influéncia de em oposição a de um peregrino idealizado, como pode-
Durkheim, que via nas grandes procissdes do turismo mo- mos ver na sua afirmacio de que este presta homenagem
derno um ritual, celebrado em datas fixas e cumprido com a um único centro sagrado, enquanto o turista presta ho-
o objetivo de intensificar o lago social nas sociedades con- menagem a um enorme conjunto de centros de atração.
temporaneas. Foi Durkheim, justamente, quem primeiro Nossa pesquisa, por sua vez, vai no sentido contririo, na
mostrou que certos ritos religiosos servem para consolidar medida em que pudemos observar que o peregrino mo-
o sentimento de pertencimento comunitirio. Na esteira de derno, deslocando-se, participa de um extenso mapa de
Durkheim, MacCannell afirma que “o turista é uma espécie lugares que são visitados e consumidos, borrando as fron-
de peregrino contemporaneo, procurando autenticidade em teiras entre o turista e o peregrino.
outras épocas e em outros lugares, distanciados da vida A simples inversio que observamos em MacCannell
cotidiana. (1976: 107). Nesse sentido, a citagio de do inauténtico para a busca da autenticidade como o ele-
Durkheim, feita por MacCannell, é bastante elucidativa: “o mento definidor da experiéncia turistica parece também
turismo é uma forma de respeito ritual para com a socieda- nao dar conta do que seria efetivamente o turismo moder-
de e absorve algumas das fungées da religido no mundo no. Na verdade, se por um lado a busca da autenticidade
moderno” (1973: 13). Para estes autores, portanto, o turis- pode compor a experiéncia do turista, por outro a propria
mo aparece como um substituto moderno da religido tradi- inautenticidade de que se revestem algumas experiéncias
cional, de modo que deve ser considerado nio apenas turisticas pode se tornar o seu objeto de atragio. Como
como uma atividade, mas sobretudo como uma orientagio observamos em relação ao turismo de Natal em Gramado e
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Canela, o espeticulo e a imitação dos natais europeus, defrontar-se com o “outro”, tomarem um distanciamento
inclusive com a simulagio de neve caindo nas ruas da critico em relação aos valores, as idéias e às instituicoes
cidade sob a temperatura de 30 graus, é central para a que regem suas vidas cotidianas. Como afirmava Lévi-Strauss
reprodugio do evento. Feifer denomina estes visitantes de num artigo no Le Nouvel Observateur, intitulado Tristes
poés-turistas, caracterizando-os como “aqueles que se vacances, as férias seriam como que o momento em que
deliciam com a inautenticiade dos jogos turisticos” (Feifer, uma vez por ano a cultura do turista é colocada entre
1985). Nossa compreensio do fendmeno, no entanto, aponta parénteses, para, em última instancia, a confirmar, de modo
para a idéia de que nao se trata de “pés-turistas”, ao con- que, longe se ser simplesmente uma invengio dos promo-
tririo, acreditamos que a experiéncia turistica não existe tores do turismo, as férias são um signo da sacralizagio
como algo que transcenda o imbricado jogo de interesses anual (Lévi-Strauss, 1967)
e textos que podem ser exercitados ou interpretados nos Assimilando o novo paradigma proposto por Victor
diversos e variados contextos em que uma massa de pes- Turner, Cohen dá um passo adiante em relagio às andlises
soas se posicionam como turistas [Urry, 1995, 1996). A de MacCannell, incorporando o conceito de communitas
perspectiva antropol6gica vai chamar atenção justamente na sua interpretagio dos contextos turisticos que observa.
para esta dimensao etnogrifica do turismo. Esscs, por sua vez, seriam marcados por uma certa
Cohen (1983; 1972, 1973, 1979 e 1988) é outro au- permissividade e alegria que conduziria a uma maior pro-
tor que tem procurado estabelecer esta mesma compara- ximidade social e cultural. Tal argumentacio parece colo-
ção entre turismo e peregrina¢do. Sua andlise do turismo, car em questdo a idéia de que existe simplesmente uma
no entanto, se faz a partir do modelo estrutural, enfatizando rotina no turismo ou uma ação habitual. Ao contririo, o
a experiéncia do distanciamento do cotidiano como um que se encontra, com freqiiéncia, como observa Urry, “é
elemento comum 2 peregrinagio e ao turismo. Na tentativa uma ação semi-rotineira ou uma espécie de não rotina que
de definir o que produz o olhar turistico diferenciado, pro- acaba se tornando rotina”.
cura perceber os aspectos do lugar a ser visitado que o A interpretação do turismo com base no paradigma
distinguem daquilo que é encontrado convencionalmente de Victor Turner pode conduzir tanto a uma interpretagio
na vida cotidiana. O turismo resulta, desde a perspectiva de cunho funcionalista, onde o cariter lidico é tomado
estruturalista, de uma divisao bindria básica entre o ordini- como um momento compensatério, revitalizando os turis-
rio/cotidiano e o extraordindrio. tas para poderem voltar a0 seu cotidiano, quanto a uma
Evocando a etimologia da palavra “peregrino”, lem- interpretagio que vê nos eventos turisticos uma ocasião
bra que este termo designa o estrangeiro, aquele que vem impar para entrar em contato com os padrdes sociais e
de outro lugar, que nio pertence à sociedade autéctone. culturais da existéncia cotidiana dos turistas que ai apare-
Traz, portanto, como sentido original a alteridade, o cem invertidos. Desde esse ponto de vista, o que o pes-
surgimento do “outro” e a criagdo do estranho. No jogo dos quisador procurara detectar nos contextos turisticos é a
espelhos invertidos, afirma que a peregrinagiio e o turismo vida de todos os dias, que aparece encenada e dramatiza-
reiventam uma experiéncia que permite às pessoas, ao da.
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Mas, talvez seja Rachid Amirou, em seu livro pela imposicao de dogmas religiosos e morais ou de um
Imaginaire touristique et sociabilités du voyage (1995), quem corpus ideolégico e doutrindrio, mas por uma performance
leva mais longe esta linha de anilise. Para este autor, turis- (ue se expressa através dos corpos, das emoções e dos
mo e peregrinação são tomadas não apenas como expe: aletos que circulam entre os peregrinos nas viagens e nos
ências históricas de múltiplas formas de deslocamento es- locais sagrados. Performance esta que nos remete imedia-
pacial, mas sobretudo como categorias explicativas e de tumente ao cardter festivo, lidico e transgressivo das pere-
compreensão da realidade que condensam estruturas de Brinações, enfatizado pelos autores que tém escrito sobre
significados, que estão sendo atualizadas e reavaliadas na este fendmeno (Sanchis, 1983, Fernandes, 1982, Steil,
prática social. Trata-se, portanto, de idealizações opostas, 1996).
ou tipos ideais, no sentido weberiano. Ou seja, a tese de Em contrapartida, o turismo, na medida em que está
Amirou é que, enquanto a peregrinação evoca o modelo relacionado com o modelo da societas, reafirma um ethos
convivial da comunidade emocional e religiosa, que Victor moderno, muito préximo a0 que encontramos noutros do-
Turner chamou de communitas (1978), o turismo remete- minios da vida contemporinea, que se caracteriza pela
nos fundamentalmente ao modelo da sociedade de corte, construcio de diferenciacdes sociais a partir de valores
marcado por um tipo de convivência que poderia ser ex- como o bom comportamento, a higiene, o uso correto das
presso pela idéia de societas, da forma como a entende etiquetas, as condigdes materiais etc. De modo que, ao
Norbert Elias (1985)í. Procedendo desta forma, o autor contrdrio da peregrinagao, o turismo acaba reforcando uma
toma as peregrinações € o turismo como duas narrativas sociabilidade de corte que se instituiu através de um pro-
meta-sociais que demarcam fronteiras e condensam traços cesso pedagégico que visa integrar o individuo, de uma
fundamentais de duas formas diversas de sociabilidade. maneira sutil, ritualizada e codificada, na sua sociedade de
Dentro deste modelo construido por Victor Turner, origem’.
Amirou vai falar de uma estrutura peregrinica, que remete Uma das condições basicas para ser reconhecido ou
necessariamente 2 experiéncia da communitas, produtora reconhecer-se como turista é adquirir este saber-ver ou
de um espago simbólico onde as regras sociais, as hierar- este olbar exótico de ordem cultural que possibilita um
quias e os constrangimentos morais são abrogados. O que distanciamento simbélico em relação aos outros que não
faz da peregrinação, na sua forma tradicional, uma critica à compdem o préprio grupo. Viaja-se, portanto, não apenas
sociabilidade do cotidiano e 2 vida moderna, que se orga- para conhecer o modus vivendi de outros grupos sociais
niza a partir da divisão social do trabalho e da produção de ou regides, mas também para iniciar-se na forma de ser
miiltiplos status sociais. Esta critica, contudo, não se di de sua classe ou grupo social. Trata-se, na verdade, de
uma aprendizagem relacional, onde a transação cultural

* Communitas e societas sio, na verdade, dois modelos ou “tipos ideiais”


abstratos ou duas virtualidades. Não se pode tomd-los como formas 5 Segundo Norbert Elias, o turismo retira sua legitimidade das antigas
empiricas de sociabilidades, embora se atualizem em determinadas so- “sociedades de corte”, que é o dado constante não falado dos compor-
ciedades ou grupos sociais. tamentos turisticos.
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com o outro permite estabelecer uma melhor definição de


Bião uma estrutura turística de significados e valores que
si e reforgar o sentimento de pertencimento a0 seu pré- ba encompassando, mesmo que inconscientemente, a
prio grupo. O estatuto de turista cria, assim, um contexto tradição peregrínica, produzindo um outro evento, que
especifico de distanciamento simbólico onde as nuances poderíamos chamar de turismo religioso.
ão transformadas em contrastes, as diferencas relativas
em absolutas e o seu “lugar social” passa a ser visto como
definitivo. Como afirma Amirou, “o olhar turistico torna-se
O TURISMO COMO OBJETO DE CONSUMO
uma máquina de produzir a diferenga” (1995: 224).
O distanciamento produzido pelo turismo, no entan-
A associação do turismo ao consumo enquanto tal,
to, não acontece apenas em relação ao outro, mas também aparece particularmente nos trabalhos de Campbell
a0 seu proprio passado. O distanciamento temporal opera
(Campbell, 1987) e de Urry (Urry, 1995). Em sua instigante
do mesmo modo que o distanciamento cultural e simbóli-
análise do consumo moderno, Campbell relaciona o deva-
<o, estabelecendo diferengas e reforgando contrastes. Via-
neio e a expectativa como os mecanismos fundamentais
jar é revisitar memérias e evocar tempos nostalgicos, de
por meio dos quais se instaura na sociedade contemporã-
modo que o passado se transforme numa visio de sonho,
nea aquilo que ele chama de “espírito do consumismo”. Os
de inocéncia perdida e de simplicidade natural. O que é indivíduos não procuram a satisfação nos produtos, mas
evocado também é idealizado, fazendo desenhar-se diante através deles. A satisfação nasce da expectativa, da procu-
dos olhos a imagem de um mundo que se recompde com
ra do prazer, que se situa na imaginação. Os turistas não
os fragmentos positivos de sua prépria biografia.
consomem lugares ou “olhares” (sightseeings), mas através
No entanto, se podemos distinguir em termos analiti-
dos lugares e dos olhares buscam a realização de um dese-
cos duas estruturas de valores e sentidos associados ao
jo que os transcende e povoa sua imaginação. Sua contri-
campo da peregrinagio e do turismo, em nivel empirico,
buição mais inovadora, portanto, está em desconstruir a
estes campos aparecem sempre imbricados, tornando suas visão dominante nas análises sociológicas do consumo, que
fronteiras bastante fluidas e indefinidas. O que torna, se- O associa de forma imediata e direta ao materialismo indi
gundo Alphonse Dupront, a tentativa de estabelecer limi- vidualista. Mas, como entende Campbell, os consumidores
tes objetivos, neste “wuniverso do coletivo panico’, uma ver-
de produtos materiais e simbélicos, de lugares e espeticu-
dadeira ficgio. Mesmo porque, entendemos que nio se los, sabem que jamais vão encontrar o prazer nos objetos
trata de experiéncias justapostas como pontos contiguos em si, mesmo porque sua experiéncia repetida mostra que
numa linha espacial ou temporal, mas de estruturas de
cada nova compra ou viagem conduz à desilusio e ao
significados que se articulam, dando origem a múltiplas
anseio por novos produtos e novos lugares. É esta dialética
possibilidades de combinações e arranjos sincréticos. Lógi-
da novidade ¢ da insaciabilidade que move os sujeitos
cas contemporâneas que emergem em determinadas situa-
modernos, não como uma ilusão ou alienação, mas como a
ções, dando aos eventos diferentes configurações e senti-
base de uma experiéncia que está no centro da vida mo-
dos. De modo que podemos ver surgir no campo da reli-
derna.
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Se a caracterizagio da sociedade contemporanea pelo mo moderno como se fosse historicamente imutivel e au-
consumismo faz sentido desde a perspectiva de Campbell, tônomo, separado de dispositivos institucionais especifi-
entdo o turismo se constitui na experiéncia paradigmatica cos que produzem o desejo e o devaneio humano, tais
do “bedonismo imaginativo’ que ele define como sendo o como a propaganda e a midia. “E dificil conceber a nature-
dispositivo central do processo social. Mais do que qual- za do turismo contemporineo — escreve Urry — sem ver
quer outra atividade humana, o turismo envolve o deva- como suas atividades são literalmente construidas em nos-
neio, o deleite do prazer imagindrio e a expectativa de sa imaginagdo pela propaganda e pela midia, bem como
novas e diferentes experiéncias que conduzem ao consu- pela competigao consciente entre diferentes £rupos soci-
mo de algo que permite transcender o cotidiano. Esta pers- ais” (1996: 30). Portanto, o que se consome na sociedade
pectiva do autor radicaliza a disjunção absoluta, presente contemporinea, particularmente em termos turisticos, de-
nas ciéncias sociais desde Durkheim, entre sagrado e pro- pende de processos complexos de produção social de sig-
fano, que se traduziu, no campo das anilises do turismo, nos e significados que são disponibilizados no mercado
entre a experiéncia interior, de cardter cognitivo e estético das trocas econômicas e simbélicas, mas também da pro-
(o “real”, o “belo”), e o consumo superficial de produtos dução da subjetividade desejante.
inauténticos e das encenações da cultura. O lugar que Embora esteja preocupado em compreender as trans-
Campbell reserva ao consumo em sua teoria conduz à idéia formagdes que vém ocorrendo paralelamente tanto no pélo
de que as pessoas precisam da mercadoria para produzir do consumo quanto no da produgio, Urry vai enfocar no
significados espirituais e estéticos. Neste sentido, seria pos- consumo a sua anilise, buscando assim superar um viés
sivel concluir, com o autor, que eliminar o consumo seria “produtivista” dominante na literatura das ciéncias soci
privar os individuos modernos de seu principal meio de Ao situar o consumo de massa como parte de um movi
acesso ao desejo e 2 imaginação. mento mais abrangente que envolve a transicio do capita-
John Urry é outro autor que vai centrar sua anilise do lismo organizado para o capitalismo desorganizado, esta-
turismo na questão do consumo. Seu livro Consuming places belece dois tipos ideais de consumo que estariam apon-
(1995) não só traz uma referéncia explicita 2 questio no tando para esta transição: o consumo de massa fordista e o
próprio titulo, mas devota atengio particular sobre os mo- consumo diferenciado pés-fordista (Lash and Urry, 1987).
dos pelos quais os lugares são consumidos e suas implica- Enquanto o primeiro reflete sobretudo os interesses dos
ções sobre as comunidades e as pessoas envolvidas em produtores, o segundo caracteriza-se pela prevaléncia dos
contextos turisticos. Numa posição critica em relação a consumidores na determinação dos interesses e sentidos
perspectiva de Campbell, sua anilise explora as mudangas investidos na atividade®. No campo do turismo, estas mu-
na “natureza” do consumo, que resultam sobretudo das dangas teriam produzido, na avaliagio do autor, o
tensOes entre a mercantilização dos produtos e signos e a arrefecimento de um “velho turismo”, que envolvia
elaboração continua de sentidos por aqueles que integram
os grupos que visitam os lugares turisticos. Segundo Urry
(1996), o problema de Campbell é que ele trata o consu- 6 Para uma melhor caracterizagio destes dois momentos na andlise do
autor, ver Urry 1996, p. 30-32.
68 69

“empacotamento e padronização”, € o surgimento de um lurismo no campo da antropologia pode ser situada na


“novo turismo”, segmentado e flexível. Ou seja, o turismo década de 1970. Os primeiros estudos antropológicos vão
vem se diversificando mais a partir dos interesses especí- Qcupar um espaço vazio entre a completa condenação das
ficos de grupos e segmentos sociais, do que dos lugares conseqliéncias negativas do turismo sobre as consciências
sacralizados ou de signos universais de consumo. dos sujeitos modernos e o reconhecimento da natureza
permeável e complexa da indústria turística. As pesquisas
sociológicas, como vimos acima, estavam voltadas para
A PERSPECTIVA ANTROPOLOGICA definir as motivações de caráter funcional e estrutural que
deram origem e mantinham em curso as atividades turísti-
A drea dos estudos sobre turismo na antropologia é cas, dando pouca ou nenhuma atenção para as comunida-
relativamente recente, não ultrapassando a marca de trés des que recebiam os turistas e os modos pelos quais estas
décadas. Sua produção, no entanto, já é bastante extensa, mesmas comunidades se engajam nessas atividades. O foco
assim como a contribuicio que tem prestado ao campo nas comunidades e nas experiéncias coletivas e individu-
antropolégico. Dois trabalhos recentes de avaliação da drea ais dos turistas e moradores locais serd o que vai distinguir
no ambito da disciplina apontam para avangos ¢ lacunas os estudos antropol6gicos no campo das Ciéncias Sociais,
que podem ser observadas neste sentido. Malcolm Crick independente do viés que assumem suas interpretagdes.
(Crick, 1989), ao fazer uma revisdo critica da contribui¢io Essa contribui¢io singular serd fundamental para o enten-
dessa produgdo, reconhece que, embora tenham havido dimento do turismo como um “fato social total”, no qual
ganhos efetivos nestas décadas na compreensio desta estd implicada uma rede complexa de priticas e sentidos
temitica, a natureza complexa e culturalmente difusa do que emergem nesses contextos.
turismo estd exigindo abordagens etnogréficas mais criati- As tentativas de definição do turismo como objeto de
vas. Nelson Graburn e Roland Moore (Graburn and Moore, pesquisa antropolégica vao aparecer já no inicio da forma-
1994) também observam um desenvolvimento significati- ção da area de estudos sobre o tema. Para Dennison Nash,
vo na drea, e registram que, enquanto os primeiros traba- por exemplo, seria o encontro intercultural que fundaria a
lhos tendiam a considerar quase que exclusivamente os abordagem antropolégica do turismo (Nash, 1981). Amirou,
aspectos negativos do turismo, as pesquisas mais recentes no entanto, ao comentar a proposição de Nash, observa
têm mostrado que o impacto do turismo sobre as comuni- que sua definição acaba excluindo um extenso campo de
dades locais pode produzir conseqiiéncias negativas e po- atividades turisticas que ocorrem no interior de paises e de
sitivas, dependendo de circunstancias e apropriagoes que regides com uma certa homogeneidade cultural (Amirou,
podém variar de caso para caso. Em suma, as pesquisas 1995: 50). Graburn, por sua vez, apresenta uma proposta
recentes indicam que as dimensões sociais e culturais do que vai incorporar as nogdes de jogo, peregrinagio e ritu-
turismo são extremamente difusas e difíceis de serem al, definindo o turismo como “um ritual moderno”, nos
julgadas. marcos referenciais da perspectiva que vimos acima e que
O surgimento de uma área de conhecimento sobre retira sua inspiração fundamental da função social da reli-
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gião no pensamento de Durkheim, do modelo dos ritos de turismo em comunidades. A perspectiva dominante nestes
passagem de Von Gennep, e do conceito de “drama soci- estudos € de dentincia das consequências negativas que o
al” elaborado por Victor Turner (Graburn, 1983). Se a di- turismo provoca sobre as comunidades, desagregando as
mensão intercultural desaparece na defini¢io de Graburn, suas bases sociais e desintegrando os padrdes de cultura
08 aspectos internos constitutivos da pratica turistica sio que mantinham o equilibrio local®. Os aspectos econômi-
enfatizados. Assim, já em 1977, Graburn propés uma cos ocupam um lugar central nas etnografias reunidas nes-
tipologia dessas práticas, distinguindo o turismo de nature- te livro, na medida em que seus autores privilegiam um
za do turismo cultural (Graburn, 1977). Para além de suas enfoque materialista em suas anilises, chamando a aten-
tipologias, limitadas e arbitrarias, há que se destacar que ção para as transformacdes que ocorrem no local com a
Graburn foi um dos primeiros teéricos do turismo a insistir vinda de turistas, o que gera novos investimentos ¢ redefine
na ancoragem antropolégica deste fenémeno. as hierarquias e o sistema de relações estabelecidos.
Serd, contudo, a primeira edigio do livro Hosts and O conceito de comunidade com que estes primeiros
guests: the anthropology of tourism, publicada em 1977 — antrop6logos operam, no entanto, esti marcado por um
da qual participou Graburn — o grande marco nos estudos viés funcionalista que tende a consider4-la como uma tota-
de turismo desde uma perspectiva antropolégica. O livro lidade substancializada que se sustenta sobre um sistema
teve sua génese no primeiro simpésio académico de âmbi- social de relagdes que a mantém em equilibrio. Qualquer
to nacional, promovido pela Associagio Americana de An- elemento externo que adentra as suas fronteiras passa en-
tropologia, em 1974. Vamos encontrar em suas paginas tão a ser visto como uma ameaça 2 sua estabilidade e 2
dois ensaios teéricos de cunho antropolégico, seguidos da manutengio de seus padrdes culturais. O acimulo de tra-
apresentacdo de doze estudos de caso sobre o impacto do
balhos etnogrificos na área, no entanto, vai levar a um
questionamento desta perspectiva na medida em que os
estudos de caso vao revelando a diversidade que existe
7 O wrismo cultural incluiria, na sua classificagio, o turismo histérico
dentro da maioria das comunidades, indicando que os seus
(visitas a museus, catedrais, lugares arqueoldgicos ¢ monumentos),
enquanto na categoria de turismo de natureza estariam o turismo eco- membros e os diferentes grupos que compõem as comuni-
lógico e o turismo ambiental. Este seria composto pelo turismo recrea- dades não participam de modo equinime nas atividades
tivo (esportivo, ludico, balnedrio) e o turismo convivial (de férias, volta-
turisticas, nem os diferentes tipos de turistas e de turismo
do para o encontro da familia, dos amigos ou para participar de con-
gressos e festivais). Entre estes dois tipos de turismo, estaria o turismo têm o mesmo impacto sobre o local. Como em outras dreas
étnico, que buscaria o conhecimento dos usos ¢ costumes de popula- da pesquisa social, as nogdes homogéneas e substantivas
ções exóticas e comunidades rurais Graburn, N. (1977). The sacred de comunidade parece dar lugar a abordagens que privile-
journey. Hosts and guests: the antbropology of tourism. V. L. Smith
Philadelphia, University of Pennsylvania Press.
Convém observar, no entanto, que, mesmo partindo de um referencial
religioso, a sua tipologia, assim como muitas outras que serão construidas
em trabalhos posteriores, não inclui o turismo religioso, embora seja $ No prefécio 2 edição de 1989, Smith reconhece que apesar da “mio-
pia etnocéntrica da descoberta dos impactos do turismo nos anos de
este talvez o mais recorrente no mundo contemporineo e o que mobi-
1970, os trabalhos publicados em Hosts and guests mantém a vivo o
liza o maior contingente de pesst
sentido e a força do seu pioneirismo.
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giam “as fronteiras como o local da cultura” — para usar prios produtos e vivenciarem situações famili
ares em pai-
uma expressão de Homi Bhabha — ao invés de isolarem ou sagens que muito vagamente lhes parecem estran
geiras ou
congelarem as comunidades em identidades fixas e diferentes, os promotores do turismo de massa
excludentes. acabam
deixando poucos pontos de contato entre a
comunidade
A publicacio de Tourism and Culture (1997), vinte local e os seus visitantes. Em muitas situag
des, pode-se
anos depois de Hosts and Guests, apresenta-se como uma falar da invengio de comunidades turisticas,
que criam
revi critica da perspectiva inaugurada por este cldssico estilos de vida e padroes culturais, que difere
m tanto da-
dos estudos antropolégicos sobre turismo, mostrando justa- queles que predominam em suas comunidades
de origem
mente a contribuigao das pesquisas na drea do turismo quanto daqueles que deveriam conformar
a vida de uma
neste periodo para a desconstrução de uma visio comunidade local . Se isto é verdadeiro para
tantos exem-
funcionalista e substancializada de comunidade. Na intro- plos referidos pelos autores de Tourism and cultur
dução de Tourism and Cultures, seu editor, Erve Chambers,
e (bal-
nedrios, resorts, ecoturismo etc.) também o é para contex-
ao situar os trabalhos reunidos nesse livro em relagio aos tos de turismo religioso, onde um evento “extra
ordindrio”,
publicados em Hosts and Guests, afirma que “as pesquisas como as apari¢des da Virgem Maria, pode dar
origem a
na drea do turismo também comegam a contribuir para uma “comunidade difusa” que conforme seu estilo
alargar a visio de como as comunidades sio realmente de vida
dentro de um modelo comum a uma extensa rede
construidas, e de que maneira as identidades grupais e as de de-
votos que partilham da mesma crenca em diferentes luga-
tradigdes são inventadas e autenticadas, em parte como res.
resultado de tentativas deliberadas de atrair o interesse dos Observa-se aqui, em relação ao turismo, uma ten-
turistas ou ainda apelar para imaginação dos outsiders” déncia semelhante aquela que vem sendo registrada no
(1997)°. campo religioso, no sentido de uma crescente
A idéia de que as comunidades sdo inventadas nio é desubstancializacdo da comunidade (Amaral, 1996; Steil,
nova (Benedict, 1983). A sua aplicação aos estudos sobre 1999). Pode-se ver em curso, no contexto especifico do
turismo, no entanto, apenas recentemente passou a exer- turismo, o mesmo deslocamento de um sentido forte de
cer um papel significativo nas interpretacdes dos proces- comunidade, percebido em termos de pertenga
a um gru-
sos turisticos. Alguns trabalhos mais recentes tém aponta- PO substantivo — situado num espaco definido
por frontei-
do inclusive para uma crescente dissociacio entre os turis- ras geogrificas e éticas — para um “sentido
fraco”, onde a
tas e os residentes locais, através de uma série de media- comunidade é vista como um amplo movimento
no mun-
dores e instancias que se interpdem entre estes dois pólos. do, que Amaral identifica na Nova Fra e Steil
aplica as
Ao fretarem seus proprios avides, construirem suas com- mudangas que vém ocorrendo no catolicismo
brasileiro atual
plexas cadeias de resorts e hotéis, comprarem seus pró- (Steil, 1999). De modo que, as transformagées que
os estu-
dos contemporineos sobre turismo pontuam nas
relagoes
entre turistas e residentes nao resultam simplesmente
? Esta mesma perspectiva vamos encontrar nos trabalhos de Handler do
desenvolvimento das facilidades turisticas,
(1988) ¢ Nordunas (1993). ou de uma re-
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flexdo dos turistas quanto as suas ambições e desejos, mas dutor apresenta um capitulo intitulado “Turistas e vagabun-
devem ser situadas nesse movimento mais abrangente de dos: os berGis e as vitimas da pos-modernidade” (Baumann,
desubstancializagdo de estruturas sociais fixas e de 1998) Em suas péginas o turista e o vagabundo se tornam
desterritorializagdo da cultura™. metiforas para descrever o estilo de vida de homens e
Enfim, o turismo se apresenta na atualidade nao ape- mulheres que, como habitantes de um tempo e lugar pós-
nas como uma atividade que envolve bilhdes de pessoas modernos, estão imersos numa experiéncia comum que,
em todo o planeta, mas também como uma orientação para na parifrase do filésofo do escritor, se caracterizaria pela
o mundo moderno. O turista tornou-se, assim, o protétipo insustentavel leveza do ser... Assim, se os homens e mulhe-
do que deveria ser um cidadio do mundo. Mas de um res modernos viveram num tempo-espaco rijo, sólido e
mundo que se pretende globalizado e detentor de uma durável que podia ser situado dentro da estrutura, as cir-
cultura sem sujeitos, constituida por “espectadores” que o cunstincias que são dadas à experiéncia pés-moderna são
observam sem uma perspectiva particular (Boltanski, 1993). as de um espago social destemporalizado, no qual o fluxo
Essa disposição para a imparcialidade parece estar na ori- do tempo tende a se aplanar num presente continuo! .
gem do que se propde o turismo na atualidade, ou seja, Na metáfora do turista, Bauman vé refletida a ima-
substituir a experiéncia fundante do encontro com o outro, gem do sujeito pés-moderno idealizado, que evita fixar-se
o diferente, o exótico pela do convivio entre iguais em em qualquer identidade durdvel, detentor de uma mobili-
espagos cada vez mais protegidos de qualquer impacto em dade que lhe permite proteger-se contra a incleméncia
relação ao outro, onde se partilha de uma sensibilidade dos lugares estrangeiros sempre que “as coisas ameagam
comum. A segmentação do turismo em grupos e categorias escapar do controle, ou quando seu potencial de diversio
sociais especificos, associada 2 instauração de inúmeras parece ter-se exaurido, ou quando aventuras ainda mais
instincias e mediagdes garantidas pelos promotores turisti- excitantes acenam de longe” (Bauman, 1998: 114). O mun-
cos, tem alimentado uma ideologia turistica que permeia do, como o turista o conhece, portanto, parece infinita-
as estruturas da vida social, redefinindo as expectativas e mente flexivel e décil, sem qualquer configuragdo perma-
o estilo de vida dos sujeitos modernos. nente, como uma sucessio de presentes que têm em si
Num plano filoséfico, ou melhor, poético, convém
trazer aqui a contribuição de Zygmunt Bauman para a com-
preensio das transformagdes na sociedade contemporanea
' Convém aqui trazer a citação do autor que relativiza esta oposição
no seu livio O mal estar da pés-modernidade, no qual o entre estes dois momentos histéricos. “Não estou dizendo que eles (os
bomens e mulberes modernos) viveram diariamente com o conbecimento
do tempo-espago severamente estruturado e da solidez, e durabilid
ade, do
mundo — mas que nGs vivemos diariamente com a consciéncia cada
vez
19 Os trabalhos publicados em Tourism and Culture, por exemplo, co- maior de que não podemos tampouco confiar. Estou Jalando, portanto,
incidem quanto ao reconhecimento da tendéncia comum aos diferen- acima de tudo, acerca do choque presente, ndo da trangiiilidade passa-
tes contextos analisados, que as fronteiras entre tur; e residentes da. A experiéncia passada, como agora tendemos a reconstruir, retrospec-
têm se tornado cada vez mais borradas, se não irrelevantes (Chambers, tivamente, veio a ser-nos conbecida, principalmente, mediante seu desa-
1997: 4-6). parecimento” (Bauman, 1998: 111).
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77

mesmos a sua chave de interpretagio. Nas palavras do


o objeto de nossa pesquisa. Mas, desloca o seu eixo da
autor, “as olhadas tomam o lugar das configuragdes: agora, dicotomia tradição (peregrinacio) e modernidade (turismo)
são os interesses errantes do turista, sua atenção inconstan-
para o da modernidade (peregrino) e p6s-modernidade
te, e o dngulo mével de sua visio que dio ao mundo sua (turista). O que parece confirmar a compreensio que te-
estrutura — tão fluidos e tao ‘até segunda ordem’ quanto a mos dessas dicotomias, enquanto categorias abstratas ou
contemplação que os levou a existir” (Bauman, 1998: 115- “tipos ideais”, que servem mais para pensar a historicidade
116). da experiéncia humana, com suas contradições e incoe-
As duas imagens invertidas — a do peregrino e a do réncias internas, do que para descrever ou classificar os
vagabundo - trazidas na oposigio, referem-se, na lente do
eventos que observamos. A pertinéncia do uso dessas ca-
autor, a dois mundos diferentes. Enquanto o peregrino re-
tegorias para pensar a experiéncia, no entanto, nio estd
mete às configuragdes e estruturas espaco-temporais do
dissociada da relevancia social desses eventos, nem do
mundo moderno, o vagabundo aparece como contempora- desenvolvimento da pesquisa sobre peregrinacio e turis-
neo do turista, seu alter ego. Como metiforas da experién- mo na sociedade contemporinea. A possibilidade de ope-
cia pés-moderna, os turistas e os vagabundos se tornam as rar com esta dicotomia como um recurso heuristico e de
duas categorias centrais com as quais Bauman quer pensar
um modo criativo estd diretamente associada ao imenso
a divisao social fundamental na sociedade contemporanea. avango da inddstria do turismo e dos estudos na área, mas
Assim, estariamos todos situados entre estes dois pélos também ao reavivamento e diversificagio das priticas e
numa linha continua, onde o nosso lugar está marcado pelo
interpretações da peregrinagio em nossos dias.
grau de liberdade que possuimos para escolher nossos iti-
nerdrios de vida.
No que pese o sentido metaférico e poético do texto
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de Bauman, convém lembrar aqui que a metifora só se
torna possivel a partir de um contexto social e intelectual AMARAL, L. (1996). “As implicagdes éticas dos sentidos
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implica uma lógica de identificagio e valorizagio dos re-
cursos existentes, do chamado potencial endégeno (cujo
aproveitamento exige a combinagao/articulagio com re-

! O autor agradece a leitura atenta, os comentirios ¢ sugestdes dos


seus colegas Manuela Ribeiro e Manuel Luis Tibério, que muito ajuda-
ram a melhorar a qualidade da primeira versio do trabalho.

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