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SEMINÁRIO TEOLÓGICO EVANGÉLICO BETEL BRASILEIRO

Apostila de Panorama do Novo Testamento 2 – Epístolas e Apocalipse


Profº Mateus Soares

UNIDADE 1 - A LITERATURA NEOTESTAMENTÁRIA II


Formas epistolares na época neotestamentária
Os aspectos da literatura paulina- o corpus paulino
Modelo de pregação na igreja primitiva (kerigma)

Epistolografia Helenística
A estrutura simples das breves e singelas cartas helenísticas, mesmo quando
significativamente ampliada na forma ou na extensão, é responsável por uma maioria
considerável das cartas do Novo Testamento atribuídas a Paulo.
(1) Introdução, com (a) o nome do autor, (b) os destinatários e (c) uma breve saudação.
(2) Rápidas palavras de ação de graças e/ou um desejo ou oração pelo bem-estar dos
destinatários.
(3) Corpo da carta, (a) transmitindo as principais informações que o escritor queria
comunicar, (b) uma seção de pedidos ou exortações aos destinatários.
(4) saudações finais.
Os bons redatores de discursos
refletiam cuidadosamente sobre três
dimensões gerais de seu estilo
oratório: ethos, pathos e logos.
Ethos envolvia “um apelo ao caráter
moral do orador”;
Pathos, “um apelo às emoções”;
Logos, “um apelo à lógica”
Em um mundo de viagens e comunicações sem precedentes, mas ainda bastante distante
da tecnologia de hoje, as cartas, especialmente as de Paulo, substituíam a presença
pessoal de alguém. As questões sérias, sobre as quais acharíamos necessidade de
conversar pessoalmente com alguém, simplesmente não podiam, salvo raras exceções,
ser tratadas dessa maneira no antigo mundo mediterrâneo, caso a pessoa vivesse muito
longe. Blomberg, p. 139

As Cartas x As Epístolas
Qual a diferença de cartas e epístolas? Os escritores já imaginavam que seus escritos
chegariam até nós?

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Cartas - escritos ocasionais que tratavam de situações específicas para um público
temporal e restrito.
Epístolas - composições literárias destinadas à posteridade, ultrapassam gerações,
devido seu conteúdo ser produzido a partir de princípios.

Porém Luter Stirewalt a respeito das cartas de Paulo, diz: "É necessário dizer que nem
em forma, nem em função, nem em estilo as cartas de Paulo podem se restringir a uma
única categoria...... as cartas Paulinas surgiram num ambiente epistolar
extraordinário"

As Epístolas
No Período Helenístico era recorrente o uso da literatura epistolar tanto em função
privado como oficial. Os romanos usavam escravos de confiança pessoas contratadas
para o efeito ou amigo em viagem como correios. Augusto desenvolveu um sistema de
correios cujo serviço se prestava por jovens da idade Militar.
As epístolas na antiguidade demonstram ser o único meio de comunicação eficiente para
promover um dialogo com quem está longe. Sendo que este diálogo, muitas vezes
poderia conter mensagens que auxiliariam a uma comunidade ( a Igreja) ou uma pessoa
(cartas pastorais).

A redação das epístolas


Amanuense - secretário ou escriba profissional contratado ou de relação particular com
o autor, com a capacidade de produzir escritos a partir das palavras ditadas.

Três formas possíveis da utilização do amanuense:


1- Ditando-lhe palavra por palavra.
2- Ditando-lhe o sentido da mensagem e deixando e deixando a elaboração do
conteúdo por conta dele.
3- Instruindo-o a escrever em favor do interessado , sem indicação de conteúdo.
Textos que comprovam a presença de um amanuense nos escritos paulinos: Rm 16.22; 1
Co 16.21; 2Ts 3.17
Possíveis problemas encontrados nessa relação autor e amanuense: Interrupções e
ditados rápidos.

Formas e Tradição Nas Epístolas


Nas cartas do NT encontramos em muitas passagens profissões de fé, hinos, fórmulas,
indicações sobre o culto e exortações da vida da igreja do NT que o autor menciona no
seu escrito.
Denominamos isso de material da tradição. Encontramos as seguintes formas de
tradição:
1- Credos ou Hinos;
2- Profissões de Fé;
3- Palavras da Ceia;
4- Listas de Vícios e Virtudes;
5- Códigos domésticos;
6- Fórmulas; A) Homologias; B) Declarações de fé; C) Doxologias.

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Credos E Hinos
Cânticos da igreja primitiva. Podemos reconhecê-los na sua estrutura de estrofes e de
ritmos. Contém informações acerca da obra de Cristo, e considera essas verdades a base
da fé e da práxis evangélica. Exemplos: Filipenses 2.6-11; Colossenses 1.15-20; Efésios
1.3-14; 5.14; 1Timóteo 3.16; 1Pedro 2.22-24.

Profissões De Fé
São frases curtas e marcantes que resumem as convicções básicas da fé cristã. A
humanidade de Jesus, a morte vicária e a ressurreição são assim professadas.
Exemplos: Romanos 1.3s; 1Coríntios 15.3-5; 1Pedro 1.18-21; 3.18- 22.

Códigos Domésticos
São as responsabilidades recíprocas entre os membros da família: Marido e Mulher;
país e filhos; e senhor e escravo;
 Orientações para os diferentes grupos de pessoas como casados, pais e filhos,
escravos e senhores.
 Ressalta a relação de submissão
 Mostra que o Cristianismo não era subversivo Ex.: Efésios 5.22—6.9; Colossenses
3.18—4.1; 1Timóteo 2.8-15; Tito 2.1-10; 1Pedro 2.13—3.12.

AS FÓRMULAS
Homologias - Declarações com que Deus, é aclamado e anunciado. São o
fundamento das profissões de fé e dos hinos. Ex.: 1Co 8.6; Ef 4.5s; 1Tm 2.5; Fp
2.11; 1Co 12.3; Rm 10.9.

Declarações de Fé - Frases que formulam os aspectos da salvação em Jesus Cristo,


como a morte vicária de Jesus. A ressurreição de Jesus dos mortos. Ex.: Rm 5.8;
14.15; 1Co 8.11; Gl 2.20; 3.13, Rm 8.11; 10.9; 1Co 6.14; 1Co 4.14; Gl 1.1; Ef 1.2;
Cl 2.12; 1Ts 1.10; At 3.15; 4.10; 5.30; 10.40.

Doxologias - Frases curtas com que Deus é exaltado. O seu pano de fundo são as
orações do judaísmo primitivo no AT. As doxologias nos abrem a cortina para os
cultos da igreja primitiva. Ex.: 2Coríntios 1.3; Efésios 1.3; 1Pedro 1.3; Romanos
1.25; 9.5; 2Coríntios 11.31

Compilação E Canonização Das Cartas De Paulo


As cartas de Paulo começaram rapidamente a circular além das comunidades ou
pessoas a quem foram dirigidas. Logo se tornaria natural juntar duas ou mais delas
em pequenas coleções, em particular quando duas cartas foram escritas à mesma
igreja.
Quer o surgimento de um cânon paulino tenha sido gradual, quer tenha ocorrido
em vagalhões repentinos, quer tenha acontecido de uma só vez, o surgimento de um
cânon paulino se tornou necessário para combater as heresias do segundo século e
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desempenhou um papel decisivo nessa luta, assim como muitas das cartas de Paulo
enfrentaram heresias do primeiro século.

Cronologia Paulina: Atos Como Pano De Fundo


Por que as cartas de Paulo estão depois dos Evangelhos e Atos?
Elas se estabeleceram depois de Atos, que, do ponto de vista cronológico e temático,
era a posição em que faziam sentido, pois foram escritas depois dos acontecimentos
descritos nos Evangelhos, mas, de modo concomitante com muitos dos
acontecimentos de Atos, em muitos dos quais o próprio Paulo desempenha até
mesmo um papel direto.
Como confirma Marguerat (p.183):
"A dimensão eclesial e pública determina também a forma soba qual as cartas
paulinas foram desde logo transmitidas: como correspondência de muitos autores
antigos e modernos, as diferentes cartas de Paulo não foram conservadas,
recopiadas e divulgadas individualmente: elas foram editadas e transmitidas em
forma de coleção"

O modo em que o livro de Atos serve como base essencial para a leitura das
epístolas do Novo Testamento (sobretudo as de Paulo) pode ser demonstrado na
tabela a seguir:

A Natureza Apostólica Das Instruções Epistolares


Apesar do livro de Atos forneça o alicerce para a leitura canônica das epístolas do
Novo Testamento, estas vão além da simples descrição do progresso da igreja
primitiva. Cada uma dessas cartas nos oferece um relato dos problemas e questões
que determinada igreja enfrentava, além do julgamento dessas questões pelo autor
neotestamentário.

1. Pela natureza apostólica (das epístolas), muitas delas têm aplicabilidade


permanente, pelo menos no seu aspecto principal (embora às vezes fatores
culturais necessitem da transposição do princípio para um que seja adequado aos
dias de hoje).

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2. Fornecem uma teologia plenamente desenvolvida das implicações da obra de
Cristo para a vida do cristão, como o ensino de Paulo da união dos cristãos com
Cristo no nível individual e seu ensino sobre a igreja como o corpo de Cristo em
nível coletivo.

Doze Convicções Fundamentais Na Literatura Paulina


Michael Gorman (p.131) identifica “doze convicções fundamentais” da teologia de
Paulo:
(1) O único verdadeiro Deus criador do mundo elegeu peculiarmente Israel para ser
o principal veículo de bênção divina entre as nações do mundo e, para isso,
estabeleceu aliança com esse povo. (Aliança)
(2) O pecado humano separou pessoas e grupos daquele Deus que estabelece a
aliança; a lei judaica, apesar de seus muitos benefícios, é incapaz de libertar as
pessoas de seus pecados e suscitar a justiça que traz a vida eterna. (Superação do
Judaismo)
(3) A natureza justa de Deus leva-o a ser fiel à sua aliança e a exercer poder
salvador sobre seu povo, estendendo misericórdia aos gentios da mesma maneira
que faz com os judeus. (Os gentios)
4) Essa salvação é ensejada pela “crucificação reveladora, representativa e
reconciliadora de Jesus, o Messias” . (Salvação)
(5) A subsequente ressurreição e exaltação de Jesus vindica sua vinda e ensino e o
exibe ao cosmo como o Senhor de tudo. (Senhorio)
(6) Dessa forma, Cristo constitui o ponto culminante da aliança, cumprindo todas as
profecias de Deus. Contudo, ao contrário da expectativa judaica convencional, ele as
cumpre em duas etapas, que correspondem àquilo que hoje em dia se chama de
primeira e segunda vindas. Nesse ínterim, vivemos no “já, mas ainda não” , a
sobreposição entre a antiga e a nova era da história da salvação. ("O Já e ainda não")
7) Viver nesse período intermediário em um relacionamento reconciliado com Deus
acontece apenas mediante sua atividade justificadora, da qual os seres humanos se
apropriam pela graça por meio da fé. A obediência às obrigações estabelecidas na
aliança com ele vem em seguida como o desdobramento natural de um
relacionamento restaurado com Deus, e não como um meio de alcançá-lo.
(Justificação pela fé e Obras)
(8) E apropriado, aliás, é essencial, falar sobre Jesus (e sobre o Espírito Santo que o
capacitou e agora capacita os crentes) com um linguajar outrora reservado apenas a
Yahweh, Deus de Israel. Em outras palavras, Paulo enuncia um trinitarismo
incipiente. (Deus Trino)
(9) Seguir Jesus se concentra basicamente na “cruciformidade” , na abnegação, no
amor aos outros e até no sofrimento que também caracterizou a vida e a morte de
Cristo. (Vida Cristã)
(10) O Espírito também funciona em nossa vida como sinal daquelas promessas de
Deus que ele já cumpriu e como garantia da esperança de que no futuro agirá de

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modo parecido, de conformidade com suas outras promessas ainda não cumpridas.
(Espírito como Selo)
(11) Os cristãos devem se reunir para cultuar, para o exercício de seus dons
espirituais e para o incentivo mútuo, criando uma comunidade contracultural
convincente, contrária às instituições corruptas do mundo. (A igreja em adoração e
testemunho)
(12) Por fim, a história culminará na parousia (a volta de Cristo), na ressurreição de
todas as pessoas para a vida ou morte eterna e no triunfo final de Deus contra todos
os seus inimigos, humanos ou demoníacos. (Volta de Cristo)

O Modelo De Pregação Na Igreja Primitiva (Querigma)


Devemos limitar-nos a destacar os traços que as cartas do Apóstolo conservam do
querigma ("proclamação") que era anunciado antes dele e ao mesmo tempo que o
seu, e ao qual ele se refere constantemente na sua específica linguagem
querigmática.

A afirmação "Jesus é Senhor" (cf. Rm 10.9; ICor 12.3; F1 2.11) faz parte das
profissões de fé das comunidades primitivas, profissões que Paulo fez suas. Esta
afirmação encerra tanto a profissão de fé na ressurreição de Jesus por obra do Pai
quanto a sua constituição como Senhor da comunidade e do mundo.
A ressurreição de Jesus Cristo Estreitamente ligada com a profissão de fé no
Kyrios está a afirmação “Deus ressuscitou Jesus dos mortos" , frequente nas cartas
paulinas - adaptada de acordo com os diversos contextos - a qual deve ser lida à luz
da feliz conexão com a aclamação do Kyrios, de Rm 10.9: "Se confessares por tua
boca que Cristo é o Senhor e creres que Deus o ressuscitou dos mortos, serás salvo".

O Apóstolo pode, por exemplo, apresentá-la (ressurreição) como a afirmação central da fé


cristã, em conexão com a sua doutrina da justificação. p.ex. Rm 4.23. Schreiner p. 68

A fórmula de I Co 15.3 - Ressurreição de Jesus como ponto central da fé e da


pregação cristã primitiva, que gerou profissões e símbolos da fé.
A fórmula de I Co 15.3 - A profissão de fé citada tem como conteúdo a morte e a
ressurreição de Cristo. Para se avaliar a importância do nexo que Paulo estabelece
com a tradição, basta considerar que ele, em espírito de perfeita solidariedade,
introduz a profissão de fé afirmando que neste momento não fala com as suas
palavras, mas com as da tradição: "Transmiti-vos pois, em primeiro lugar, o que eu
mesmo havia recebido" (v. 3).

A parusia de Cristo - embora exercendo grande influência sobre Paulo


pessoalmente e sobre a sua atividade missionária e pastoral, ela, a parusia, não é um
dado próprio, mas foi recebida da tradição.
Logo no início das cartas o Apóstolo costuma chamar a atenção das comunidades
não só para o começo da sua existência de crentes, isto é, para a sua fundação, mas
também para o dia de Cristo, a saber, para o fim.

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O dia da parusia, que, segundo o Antigo Testamento, está ligado com o juízo da ira
de Deus, traz para a comunidade a salvação definitiva, esperada de Cristo, o
Salvador.
Em suma, a pregação do Apóstolo se concentra na cruz e ressurreição do Senhor, omitindo
dados mais concretos sobre o "Jesus histórico" . O fato de Paulo concentrar o seu
querigma no essencial, representado pela cruz, pela ressurreição e pela parusia de Cristo
se explica pela sua dependência da forma de pregação que ele conheceu nos seus primeiros
tempos de vida cristã. Schreiner, p. 78

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UNIDADE 2 – AS EPÍSTOLAS PAULINAS GERAIS

EPÍSTOLAS AOS ROMANOS


Circunstâncias Para Escrita aos Romanos
Como Paulo apresenta em Rm 15.13-29, seu objetivo é ao escrever a eles é:
 Organizar seu empreendimento missionário a partir de centros que lhe dão
suporte. Ele está, portanto, em busca de uma base para seu novo projeto de
Missão para a Espanha.
Assim como as comunidades de Antioquia e Éfeso lhe permitiram estabelecer uma rede
de novas igrejas na Ásia, na Macedônia e na Grécia, espera ser enviado por Roma como
Missionário na Espanha.
1. Desconhecido pelos cristãos de Roma como missionário e teólogo, Paulo quer
que conheçam seu Evangelho, e o Evangelho para qual lhes pede ajuda.
2. A argumentação pressupõe um auditório conhecedor da hermenêutica judaica
helenística, acostumado a refletir com termos clássicos da lei, da justiça e da
eleição. Pode se concluir que possivelmente havia um centro de oposição aos
projetos de Paulo e por isso, o auditório que ele pensa em dirigir sua carta.
3. A proximidade de sua viagem a Roma, marcam ao participar da coleta e aceitá-
la, as novas igrejas e comunidades de Jerusalém como, simbolicamente, sua
presença no mesmo corpo (12.3-8)
"A segunda grande etapa do ministério de seu apostolado está terminado e o resultado
da coleta é sinal de seu acabamento" Marguerat p. 220

Os Destinatários
Romanos é a primeira carta que sabemos que Paulo escreveu a uma igreja que não
fundou pessoalmente.
"É a carta de um missionário itinerante que, precedido de uma reputação mais ou
menos favorável, solicita acolhida e sustento de uma comunidade estabelecida, dotada
de suas próprias tradições e que possui uma história movimentada." p. 220

O édito de Claudio expulsou os Judeus do Roma em 41 dC porque incitados por


Chrestus, não cessavam de criar desordens (At. 18.2); dando a entender que o
surgimento desta igreja se deu cedo.
Após Pentecostes, Judeus de língua grega passavam nas cidades pregando a fé cristã,
responsáveis pela primeira implantação da fé cristãs nas sinagogas romanas.
Sobre a reconstituição interna após a expulsão, são apegados a seus ideias de santidade,
recusam-se comer carne e consumir vinho, e uma maioria de pagãocristãos de tendência
mais liberal. Agora, o cristianismo não se reúne mais nas sinagogas, mas nas casas da
comunidade.

Local E Data De Composição


Foi escrita em Corinto em 55/56 ou 556/57. Paulo acaba de chegar de Éfeso e da
Macedônia (2 Co 1.15).

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A evangelização da Parte oriental do império está terminada (Rm 15.23), na medida em
que Cristo foi anunciado nos centros urbanos donde o Evangelho poderá se espalhar.
O apóstolo juntou a coleta da Macedônia e da Acaia (Rm 15.26) e se prepara para
embarcar para Jerusalém.

A Intenção Teológica - Todos São Pecadores


A tese que fecha a primeira sessão de Romanos é de que ninguém pode ser justificado
diante de Deus pelas obras da Lei (3.20). Essa tese se afirma como dotada de alcance
universal (3.9-20), incluindo Judeus (1.32-3.8) como de pagãos (1.18-31).
A razão pelo qual os JUDEUS não podem ser justificados pela Lei é formulada: eles
tem a lei mas não a praticam.
A razão da injustiça dos PAGÃOS é mais complexa: Embora não tendo lei, eles são
indesculpáveis. O argumento é explicado em 1.19-23, 2.12-15: por um lado, Deus
revelou o que se pode conhecer dele em sua criação; de outro lado, a Lei, que os pagãos
não receberam de Moisés, está escrita em seu coração.
Ambas as ideias são necessárias para entender a argumentação.
1. O mundo e todos os seres que o habitam são dirigidos por uma ordem cósmica.
Diante da observação dessa ordem e regularidade, pode-se se chegar a conhecer seu
criador e suas leis.
2. Na medida em que se contém intuições verdadeiras, a filosofia grega é forçosamente
uma aproximação da revelação feita por Deus a Moisés.

A Intenção Teológica - Recusa Gera Idolatria


Nas duas ideias citadas que se baseia a crítica paulina do conhecimento de Deus em
Romanos 1-3.
1- Deus pode ser conhecido através de sua criação é por sua própria iniciativa; É o
próprio Deus que se faz conhecido a medida que o ser humano pode conhecê-lo
(1.19)
2- A tese paulina não é que os homens conheceram a Deus, mas que podendo
conhecê-lo não o reconheceram; é a tese do fracasso do conhecimento humano
de Deus.
Pela sabedoria, a sabedoria do mundo não reconheceu a sabedoria de Deus (I Co
1.18-25); Pelo conhecimento, os homens conheceram a Deus mas não o
reconheceram, confundiram criatura e Criador, divinizaram e adoraram criatura.
Abusando do conhecimento de Deus, o homem se diviniza e se toma por seu criador
(idolatria). Nisto, não há mais lugar para a justiça de Deus, e Deus aparece como o
Deus de Ira.
Essa ira de manifesta, no homem entregue a si mesmo (1.24), sendo entregues às suas
concupiscências.

A Intenção Teológica - A Justiça De Deus


A mensagem central de Romanos é a revelação da Justiça de Deus (1.17; 3.20).
O acontecimento da morte e da ressurreição de Jesus revelou que a justiça de Deus não
é "pelas obras da Lei" (3.20), é uma justiça "sem lei" (3.21), uma justiça por graça e

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uma justiça oferecida gratuitamente (3.24); Essa é uma Justiça pela fé (1.17; 3.26) ou
para a fé (1.17).

A compreensão Paulina da Justiça de Deus e da justificação decorre da descoberta de


que o Deus de Abraão se revelou na pessoa do Crucificado.

Justiça em Romanos se refere ao caráter adequado ou não de uma relação


interpessoal... A relação adequada que se pode estabelecer entre Deus e a existência
humana é que o ser humano vive e na confiança de ser amado e reconhecido, como
pessoa, por seu Criador. p. 225/26

EPÍSTOLA DE PAULO AOS CORÍNTIOS


Circunstâncias Para Escrita Aos Coríntios
 Na época de Paulo, a cidade mais rica da Grécia
 Constituía um importante centro de comércio.
 A cada dois anos Corinto sediava os Jogos ístmicos, ficando atrás apenas das
Olimpíadas em proeminência entre as competições de atletismo na Grécia. A cidade
abrigava um teatro com capacidade para dezoito mil pessoas, e um grande mercado
central para produtores rurais.
 Uma enorme montanha de pedra conhecida como Acrocorinto, com seu templo
dedicado a Afrodite e assentado no topo do monte, se destacava acima da cidade e
simbolizava o domínio de cultos pagãos.
Corinto é a Nova York, Los Angeles e Las Vegas do mundo antigo, todas reunidas em
uma única cidade. (Blomberg, p.227)

Em I Coríntios 16.8, Paulo ainda está em Éfeso, na esperança de voltar mais uma vez a
Corinto, mas querendo aguardar até depois da festa de Pentecostes, na primavera. Então,
dando margem para as viagens de Paulo e uma permanência de quase três anos em
Éfeso (At 19.10; 20.31), a data mais provável para essa carta é o final do inverno ou
início da primavera de 55 d. C.

Há na igreja acentuados problemas ideológicos estava o sectarismo da igreja de Corinto


e divisões na igreja (veja 1.10-12).

As explicações teológicas são explicações sociológicas, pois diferentes igrejas nas casas
refletirem a rivalidade da lealdade a diferentes líderes cristãos. Além disso, as censuras
de Paulo sugerem que a igreja estava permeada por uma espécie de triunfalismo — a
sensação equivocada dos crentes sobre sua própria maturidade.

Analisando somente I Coríntios, é possível que o sectarismo dos capítulos iniciais tenha
se assemelhado à disputa entre patronos rivais e seus apoiados. O único motivo
concebível para a igreja não ter disciplinado o homem que praticou incesto mencionado
no capítulo 5 era ele ser um patrono poderoso. Os objetivos de escrita foram então:
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1- Auxiliar uma igreja em perigo.
2- Fornecer aos Cristão respostas adequadas as situações mais adversas da vida
cotidiana.
3- Resolver problemas internos e externos que agridem a pureza da igreja.

Destinatários
Coríntio era uma cidade nova e rica. Destruída em 146 a.C. foi reconstruída por Julio
Cesar em 44 a.C. como colônia para seus veteranos.
Economicamente era uma cidade rica graças a sua situação geográfica. Do ponto de
vista religioso, a população, muito misturada, convive com pluralismo e sincretismo. A
cidade tem má reputação: Já Aristóteles fala de "corintianizar" com o sentido de levar
uma vida dissoluta.
A igreja era representada por pagão cristãos que no passado adoravam ídolos mudos. A
igreja era constituída de representantes de longa escala social, na maioria pessoas
simples (pequenos artesãos, pequenos comerciantes e escravos) e uma minoria de
personalidades influentes da cidade que tinham um peso particular na comunidade.

PRIMEIRA EPÍSTOLA DE PAULO AOS CORÍNTIOS


Temas Unificadores
Dualismo Na Igreja De Corinto
A filosofia grega dualista -> os mundos material e espiritual estavam separados,
originando dois grupos.
o gnosticismo -> a matéria era intrínsecamente má. Só o espírito poderia ser salvo.
Esse dualismo levou, paradoxalmente, a dois desdobramentos éticos diametralmente
opostos.

Gnósticos ascetas e Gnósticos hedonistas: Em sua maioria os gnósticos eram ascetas,


isto é, tentavam de várias maneiras negar o corpo (mal) e seus apetites naturais.

A minoria era hedonista, cedendo aos impulsos do corpo, já que este era
irremediavelmente corrupto. Parece que ambas as linhas de pensamento estavam
presentes em Corinto.

Identificando Os Grupos Em Corinto


Hedonistas em Corinto - Aqueles envolvidos nos problemas de incesto, ações judiciais
e promiscuidade (caps. 5—6); os cristãos “fortes” que comiam alimentos sacrificados a
ídolos (caps. 8—10); as profetisas descontroladas e os ricos excessivamente permissivos
à mesa do Senhor (cap. 11); e aqueles que, de um modo mais geral, abusavam dos dons
espirituais (caps. 12—14) — todos se encaixavam no campo hedonista.

Ascetas em Corinto - Aqueles que estavam promovendo o cefibato (cap. 7), as pessoas
temerosas de comer carne sacrificada a ídolos (caps. 8—10) e os membros da igreja que
negavam a ressurreição física (cap. 15) eram claramente ascéticos.

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IDENTIFICANDO OS GRUPOS EM CORINTO

Intenção Teológica - 4 Razões Da Unidade Epistolar


1- Ordem factual: nem a tradição manuscrita, nem as citações patrísticas conservaram
outra versão da epistola diferente de sua forma canônica. Interpretar 1 Coríntios
como uma combinação de diversas cartas de Paulo pressupõe que estas tenham
desaparecido sem deixar traços e que só resta atestada a edição da epistola inteira.

2- História das formas literárias: A Antiguidade conhecia bem o gênero literário de


coleção de cartas: as cartas de Platão, de Epicuro, de Isócrates ou de Demóstenes
foram editadas como livros, e autores como Cícero, Seneca ou Plinio publicaram
eles mesmos sua correspondência. Dessa maneira, mesmo curtas mensagens são
conservadas e postas à disposição do público. A Antiguidade não conhecia, ao
contrário, a existência de coleção ou de combinação de cartas sob forma de uma
carta.

3- Ordem metodológica: uma carta pode ser fragmentada indefinidamente em razão


das representações ideais da crítica literária. É por isso que os critérios empregados
devem ser definidos de maneira precisa. O corte de uma epístola em várias cartas só
é lícito caso se possa mostrar que o conjunto da argumentação não é compreensível
sem uma mudança do contexto de comunicação, e que ela pressupõe várias
situações históricas incompatíveis entre si. Ora, não é esse o caso de 1 Coríntios'.

4- Unidade formal e à coesão teológica de 1 Coríntios: o conjunto da argumentação


da epístola é dominado pela consciência apocalíptica, escatológica e missionária do
apóstolo; ela determina sua interpretação da cruz (1Cor 1,1-4,21) e sua cristologia
(1,18-25 e 15,12-28), sua antropologia e sua valorização do corpo como templo do
Espírito e membro de Cristo (3,16-17; 6,12-20), sua insistência na necessidade da
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ruptura da Igreja com o mundo antigo (5,1-6,11), sua compreensão da liberdade
cristã (6,12-8,13; 9,1-188).

Intenção Teológica - A Teologia Da Cruz


Nas cartas paulinas, a cruz é um termo técnico que interpreta não só a morte, mas o
duplo acontecimento da morte e da ressurreição de Jesus (1Cor 1.17.18: GI 5.11;
6.12.14, F12,8; 3,18). A cruz designa o acontecimento da salvação em Jesus Cristo em
seu conjunto, de sorte que Cristo pode ser designado como o Crucificado (ICor 1.23:
2,2a; 3,1) e a palavra da cruz é sinônima de Evangelho (ICor 1,18).
A palavra da cruz se apresenta como um paradoxo que provoca a fé ou o escândalo
(ICor 1.23; GI 5,11). O fato de a palavra da cruz ser paradoxal, de ser loucura para uns e
poder de Deus para outros, resulta de uma decisão de Deus de tornar louca a sabedoria
do mundo pelo paradoxo da cruz (ICor 1,21).
O que Paulo pressupõe é que a sabedoria do mundo teria podido reconhecer Deus. Mas,
assim como a existência que busca sua justiça "pelas obras da Lei" investe na Lei aquilo
que esta não pode dar e cai no desespero (GI 3,11-12 e 3,21), assim o mundo abusou da
sabedoria para encontrar nela seu sentido e sua origem, de sorte que a Lei e a sabedoria
se tornaram obstáculos para o reconhecimento e a compreensão de Deus.
Para a teologia da cruz o sofrimento adquire significado todo especial. Os cristãos têm
que se tornar iguais a seu Mestre em tudo e, por isto, têm de assumir a ignomínia de
Cristo. Cristo nos precedeu no caminho que rejeita toda grandeza humana.

Assim, conforme a teologia da cruz, a vida do cristão nada mais é do que “ser
crucificado com Cristo”. O batismo não está apenas no começo da vida cristã, mas no
ato do batismo temos o símbolo de toda a vida cristã: um constante morrer e ressuscitar
com Cristo.
A teologia da cruz conhece a Deus no próprio lugar onde Ele se ocultou – na cruz, com
os seus sofrimentos, todos eles considerados fraqueza e loucura pela teologia da glória.
Deus é conhecido e compreendido não na força, mas na fraqueza, não numa
demonstração impressionante de majestade e poder, mas na exibição de um amor que se
dispõe a sofrer a fim de converter o homem para si: “Sendo justificados gratuitamente,
por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus, a quem Deus propôs, no seu
sangue, como propiciação, mediante a fé, para manifestar a sua justiça” (Rm 3.24-25).

Intenção Teológica - A Liberdade Cristã


O termo "liberdade", usado como uma linguagem primariamente política e designa a
independência do cidadão e da cidade. A compreensão paulina da liberdade define-se
pelas seguintes características:
1) É Deus o autor da liberdade ou da libertação: é ele o autor da promessa da criatura
nova feita a Adão e a cada um que crê (GI 4,21-51; Rm 8,21).
2) Para Paulo, a liberdade é a libertação da existência antiga dos poderes que a
sujeitam: o pecado (Rm 6,18.22) e a Lei (Rm 8,2; Gl 2,4; 5,1.13).

13
3) Essa libertação não leva o sujeito à autonomia, porque ele se tornaria, então, escravo
do que é perecível, da carne e, portanto, de si mesmo (Rm 8.21): a existência nova é
precisamente livre porque está a serviço da justiça (Rm 6,15-23) e de Cristo (1Cor 7.17-
24).
4) Porque a liberdade é a existência nova e porque está sob o senhorio do Crucificado e
sob o único julgamento de Deus e de sua justiça, ela é nascimento da nova criatura,
amada e reconhecida como pessoa, independentemente de suas qualidades (Rm 14,1-
15.13).
5) É por essa razão que o programa da liberdade paulina não é simplesmente "tudo é
permitido" , o que levaria à existência na escravidão da carne e da corruptibilidade; a
liberdade, segundo Paulo, encontra seu limite no reconhecimento da pessoa e da
consciência do outro: "Tudo é permitido, mas nem tudo convém" ou "Tudo é permitido,
mas nem tudo edifica" (1Cor 6,12; 10,23).

Intenção Teológica - A Ressurreição


A epístola, que começava pela proclamação apocalíptica do Evangelho da cruz, termina
com o texto mais importante do Novo Testamento sobre a ressurreição dos mortos.
A ideia da ressurreição dos mortos vem da apocalíptica judaica.
 Se distingue de outras interpretações da vida após a morte porque, diferentemente da
imortalidade da alma ou da vida eterna, ela implica uma dupla descontinuidade com
a vida presente;
 Trata-se, de um lado, da destruição do ser pelo poder da morte e sua recriação por
um novo ato criador de Deus; de outro lado, esse novo ato criador de Deus é
compreendido como ressurreição dos corpos.
A ressurreição dos mortos tem um lugar importante na teologia paulina.
 Ela é objeto de controvérsia entre Jesus e os saduceus (Mc 12,18-27) e serve de
linguagem para a escatologia futurista do evangelho de João (Jo 5,28-29;
6,39.40.44.54; 11,23-26).

Os desenvolvimentos paulinos sobre a ressurreição dos mortos encontram-se no


contexto de duas argumentações diferentes:
1) Em 1 Tessalonicenses 4,13-18, a ressurreição dos mortos é, ao som da trombeta final,
o prelúdio do arrebatamento e da ascensão dos vivos e dos mortos para o Senhor. O fato
de saber que os mortos serão arrebatados, com os vivos, para ficar junto do Senhor é
próprio da esperança cristã. A explicação dada pelo apóstolo é a seguinte: ao som da
trombeta, Cristo vai descer do céu; primeiro, os mortos vão ressuscitar; depois, Cristo
vai levá-los para o céu, junto com os vivos.
2) Em 1 Coríntios 15,1-58, a ressurreição dos mortos faz parte da transformação final da
criação corruptível em criação incorruptível. A fé na ressurreição dos mortos é fundada
no querigma da morte e ressurreição de Jesus. Ao som da trombeta (ICor 15,52), os
mortos vão ressuscitar, a fim de que todos, vivos e mortos, possam ser transformados. O
último inimigo de Deus, a morte, será então vencido.

A construção dos dois textos é paralela:


14
Introdução: 1 Coríntios 15,1-3a // 1 Tessalonicenses 4,13
Fundamento no querigma da morte e ressurreição de Jesus: | Corintios 15,3b-11 // 1
Tessalonicenses 4,14
Argumentação teológica: 1 Corintios 15,12-50 // 1 Tessalonicenses 4,15
Revelação apocaliptica: 1 Corintios 15,50-57 // 1 Tessalonicenses 4,16-17
Recomendação final: 1 Corintios 15,58 // 1 Tessalonicenses 4,18

A força teológica e ética da argumentação paulina reside no fato paradoxal de que a


promessa da ressurreição tem por consequência uma valorização da realidade
presente, que torna o homem responsável em relação a seu corpo mortal e à criação
Vouga, p.255

SEGUNDA EPÍSTOLA DE PAULO AOS CORÍNTIOS


Razões De Escrita Da Segunda Carta
 Expressar alívio pela aceitação de seu ministério pela maioria dos Cristãos.
 Defender sua autoridade apostólica.
 Dizer a respeito da coleta para benefício do reino de Deus
Os dois grandes temas da epistola são a defesa do apostolado paulino e a coleta
empreendida pelo apóstolo, em favor de Jerusalém, nas comunidades pagão-cristãs
recém-fundadas.
A Segunda epístola de Paulo aos Coríntios atesta dificuldades encontradas pelo apóstolo
em Corinto. Paulo anunciou e adiou, diversas vezes, uma nova visita a Corinto (ICor
16,5-6; 2Cor 1,15-2,4), o que causou alguma decepção.
Razões De Escrita Da Segunda Carta
Inicialmente Paulo esperava visitar Corinto logo após terminar seu tempo em Éfeso,
provavelmente pouco depois do Pentecostes de 55 d.C. (lCo 16.8).
Porém, depois de receber l Coríntios, a igreja em Corinto não reagiu tão positivamente
quanto Paulo esperava. Assim, ele foi obrigado a fazer uma curta visita a Corinto,
enquanto ainda estava ministrando em Éfeso. Em 12.14, Paulo afirma: “Agora estou
pronto para visitá-los pela terceira vez”.
Estudiosos contemporâneos de todas as tendências teológicas são quase unânimes em
entender que esse versículo (2 Co 2.3,4) descreve uma carta escrita por Paulo a Corinto
no período entre as duas preservadas no cânon.

A Estrutura - A armação da epistola é feita pelos relatos de viagem do apóstolo e pelos


anúncios de sua próxima viagem a Corinto:
Relato de viagem I: 1,8. Paulo fala dos perigos que correu na Asia
Relato de viagem II: 1,15-17. O que foi projetado: Paulo queria ir a Corinto, antes de ir para a
Macedônia, e retornar a Corinto.
Relato de viagem III: 2,12-13. Paulo chegou a Troas, ficou preocupado por não encontrar Tito e
prosseguiu para a Macedônia.
Relato de viagem IV: 7.5-7. Paulo chegou à Macedônia, onde encontrou todo tipo de
dificuldades; mas a chegada de Tito e as boas-novas que trouxe de Corinto tranquilizaram-no.

15
Anúncio de visita l: 1,15-17. Paulo queria ir diretamente de Éfeso para Corinto.
Anúncio de visita II: 1,23-2,4. Paulo não embarcou logo para Corinto, porque queria, antes,
resolver por carta o conflito com os corintios (1Cor 5,1-11?).
Anúncio de visita III: 9.4. Paulo irá a Corinto, na companhia de delegados da Macedônia, para
buscar a coleta.
Anúncio de visita IV: 10,2-11. Paulo irá a Corinto e será tão forte nas palavras quanto nas
cartas. Anúncio de visita V-VII: 12,14; 13,1-2; 13.10. Pela terceira vez (cf. 2Cor 1,15-17?), Paulo
está prestes a ir a Corinto.

Argumento A Favor Da Unidade Epistolar


Considerar a epístola como a combinação e a edição de fragmentos de diferentes cartas de
Paulo se choca com diversas dificuldades:
a) As cartas paulinas são transmitidas pela tradição manuscrita só sob sua forma canônica;

b) Conforme a epistolografia antiga, a falta de sistemática e a ausência de unidade temática


fazem parte da definição da carta. A carta tem por intuito, com efeito, substituir um diálogo, e
por essa razão assume a forma de uma meio- conversa;

c) As cartas paulinas não pertencem ao gênero de cartas pessoais, mas ao de cartas didáticas.
A esse respeito, 2 Coríntios é comparável, por sua extensão, pela diversidade de temas
abordados e pelas mudanças de tom, com as epistolas de Platão, de Epicuro ou de Séneca.

d) A história da literatura conhece o gênero da correspondência ou da coleção de cartas, mas


não a coleção de cartas em forma de Carta única.
Considerar a carta uma unidade literária pressupõe levar em conta o caráter irênico (livros
destinados a apaziguar discórdias dos cristãos dos primeiros séculos) da apologia de 2
Coríntios 2,12-7,4, que prepara o pedido de coleta (8,1-9,15) e implica uma cordialidade
recíproca entre o apóstolo e a comunidade em seu conjunto; mas a unidade da carta faz
também aparecer uma intensificação da oposição antipaulina, que Paulo desvaloriza ao atacá-
la só no fim da carta (10-13).

O Âmago Do Ministério: Reconciliação (5.11-21)


Esse meio capítulo constitui O âmago teológico da carta. o tema de reconciliação
representa o centro de todo o pensamento de Paulo. A reconciliação envolve o
restabelecimento de um relacionamento amoroso entre partes anteriormente hostis. À
semelhança da justificação, ela se inicia na conversão, mas não se completa senão no
eschaton.
O grego diz literalmente “Se alguém [está] em Cristo, nova criação”! Em outras
palavras, se a era messiânica chegou, dando às pessoas condições de serem unidas ao
Messias, então o início da recriação do cosmo está em andamento. Está envolvido mais
do que apenas a renovação pessoal (cf. Rm 8.19-22).

Intenção Teológica - Compreensão Do Apostolado

16
A compreensão que o apóstolo tem de seu apostolado decorre imediatamente de sua
compreensão do Evangelho como revelação do poder da justiça de Deus, no acontecimento da
cruz.
Sua consciência apostólica encontra expressão imediata na forma que ele deu ao endereço e à
saudação de suas cartas: Paulo escreve como apóstolo de Jesus Cristo.

O Evangelho paulino é "palavra da cruz" no sentido em que atesta a revelação de Deus na


pessoa do Crucificado (Deus se manifesta na pessoa que perdeu toda qualidade) e em que essa
revelação põe em xeque tanto a Lei como a sabedoria, duas instâncias pelas quais a existência
humana espera encontrar em si mesma sua origem e seu sentido.

O apóstolo é apóstolo do Crucificado e não pode ser outra coisa senão o apóstolo do
Crucificado (1Cor 2,1-5; 2Cor 2,12-7,4).

O Evangelho é poder de Deus pelo fato de tornar contemporânea a força


transformadora da revelação da cruz. Segue-se daí que a força da pregação
apostólica não reside na força do apóstolo, mas no poder do Evangelho que ela
transmite. A fraqueza do apóstolo, conforme à loucura da cruz, é o veículo necessário
do poder libertador da pregação apostólica: ela implica uma clara distinção entre a
sabedoria de Deus, que só pode aparecer como loucura, e a sabedoria louca deste
mundo.
A consequência da compreensão do apostolado como pregação libertadora da cruz e do
Evangelho de Deus é uma necessária distinção entre a interioridade ("o homem
interior") do apóstolo, quer dizer, sua existência diante de Deus e por Deus, e sua
exterioridade ("o homem exterior"), quer dizer, sua aparência visível (2Cor 4,16-18;
12,1-10).
a) O apóstolo aparece em sua fraqueza. É por isso que seria absurdo e loucura
recomendar-se ou gloriar-se, como fa- zem os "superapóstolos" , que querem dar provas
de sua interioridade por demonstrações exteriores.

b) Em sua fraqueza se revela o poder libertador da graça de Deus; é por isso que o
apóstolo só pode se gloriar do Crucificado e de seus sofrimentos (11,16-12,10).

Intenção Teológica - Eclesiologia E Coleta


O batismo constrói simbolicamente a comunidade dos crentes que, mortos com Cristo,
nasceram para uma vida nova (Rm 6,1-14); que eles receberam o dom do Espírito (Gl 4,6-7) e
formam uma unidade onde não há mais judeus, nem gregos, nem escravo, nem homem livre,
onde não há mais homem e mulher (Gl 3,28).

Quer dizer o evangelho, que confere uma identidade nova ao sujeito individual enquanto
pessoa, funda também um tipo novo de sociedade humana.

O batismo define, com efeito, um espaço social caracterizado pelo reconhecimento mútuo de
seus membros, independentemente de suas qualidades, de sua pertença ou de suas lealdades.

Intenção Teológica - Eclesiologia E Unidade Pluralista

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A visão do corpo como templo, se encontra, em uma perspectiva mais ampla, em Romanos
12,3-8. Ela não define mais a comunidade local, mas a pertença comum do apóstolo dos
gentios e dos irmãos e irmãs da Igreja de Roma ao mesmo Senhor. A concepção fundamental
permanece a mesma: todos têm dons; esses dons são de rentes, mas eles constituem um só
corpo em Cristo.
Essas mesmas implicações da unidade pluralista em que crentes e Igrejas se reconhecem, em
sua diversidade, membros do onde mesmo corpo determinam a concepção paulina da coleta:
se os pagãos da Galácia, da Macedônia e da Acaia participaram dos bens espirituais dos santos
de Jerusalém, eles devem, por sua vez, prover às suas necessidades materiais (Rm 15,27).

EPÍSTOLA DE PAULO AOS GÁLATAS

As Circunstâncias Para Escrita


Igrejas da Galácia foram fundadas pela pregação paulina (GI 4.12b-14.19; cf. 1,9; 3,1b-
2; 4,11).
 O poder do Evangelho se manifestou, na Galácia como em Corinto (Cor 2,1-5; 2Cor
12,1-10), na fraqueza do apóstolo.
 Os membros dessas Igrejas eram pagãos que só conheceram o Deus judeu e cristão
depois de sua conversão (Gl 4,8-9; cf. 4,3).

É impossível saber se antes da carta Paulo lhes fizera uma segunda visita. O que é certo
é que ele está bem informado sobre a evolução da comunidade:

 Missionários apareceram na Galácia e perturbaram os gálatas.


 Tentaram persuadi-los a se fazer circuncidar (5,7.12; 6,12) e já tinham convencido
alguns (5,2-4), que agora pressionam os outros (6,13).

Destinatários
A carta enviada por Paulo tem por intuito, primeiramente, clarear o espírito dos
gálatas: o evangelho dos novos missionários não tem nada a ver com o Evangelho
de Deus; e objetiva, em seguida, afastar os gálatas dos novos missionários reforçando
suas convicções.

Dois problemas se apresentam:


1. Paulo estava se dirigindo a igrejas situadas na região menor daquilo que hoje seria o
norte e o centro-norte da Turquia, que incluía gálatas étnicos, isto é, pessoas que teriam
usado esse termo para se identificar, ou se ele tinha em mente a província romana maior
da Galácia, que incluía uma parte bem maior de território no centro e no centro-sul da
Turquia.
2. Paulo escreveu Gálatas antes ou depois do Concilio Apostólico?

Teoria do Norte Teoria do Sul

Primeira Viagem Missionária de Paulo Primeira Viagem missionária de Paulo.

18
Concílio de Jerusalém At 15 Composição de Gálatas.

Segunda viagem missionária de Paulo Concílio de Jerusalém

Composição de Gálatas. Segunda Viagem missionária de Paulo

Intenção Teológica - A Vocação E A Verdade Do Evangelho


Uma dupla convicção fundamental caracteriza a essência do Evangelho proclamado
pelo apóstolo.
1- A existência do seu apostolado é graças a revelação de Deus (GI 1,15-16), que o
faz portador de uma verdade à qual vai permanecer fiel, independentemente de
qualquer sistema de verdade existente, seja o do judaísmo fariseu, de onde ele
vem, seja o de outras tradições cristãs (1.1.10- 12).
2- A revelação, por Deus, do Crucificado como seu filho (1,12.16). Jesus, o que
comia com pecadores e por isso era um "transgressor da lei" é a revelação ao
mesmo tempo teológica e antropológica de que o Deus da promessa a Abraão
não é um Deus que reconhece o homem em virtude das obras da Lei, quer dizer,
de suas qualidades.

Intenção Teológica - Resultado Da Verdade Do Evangelho

Devido ao fato de ser a verdade revelada de Deus, há um UNIVERSALISMO no


Evangelho paulino: a verdade que constitui o apóstolo em sua nova identidade ("não sou
mais eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim", 2,19-20) não será verdade se não for
verdade para cada indivíduo.

É por isso que o Evangelho é incompatível com qualquer definição da pessoa segundo
o critério de categorias abstratas (judeu, grego, escravo, pessoa livre, homem, mulher)
ou em virtude de sua qualificação por uma eleição particular, como faz o "outro
evangelho" dos missionários (1,6-9). VOUGA, p.290)

Intenção Teológica - Chamado, Diversidade E Comunidade


O Pluralismo da eclesiologia paulina: o reconhecimento das pessoas como
subjetividades individuais implica, de um lado, que cada um é chamado com a
identidade e a condição que s próprias (3,28; ICor 7,17-24) e, de outro, que a
diversidade dos membros da comunidade dos batizados reforça sua unidade.

A ligação do Evangelho com revelação divina e com a certeza subjetiva da vocação do


apóstolo mostra que o Evangelho manifesta sua verdade e sua autoridade quando judeus
e gregos são libertados deste mundo mau (GI 1,4-5), quando recebem Espírito (4,6-7) e
são transformados em nova criação (6,15); mas faz também compreender que é vã toda
tentativa de legitimação no mundo antigo (2,1-21).

Intenção Teológica - A Lei Na Epístola Aos Gálatas

19
A afirmação central de Gálatas sobre a Lei é que ninguém será justificado pelas obras
da Lei se não for pela fé de (ou em) Jesus Cristo (2,16);

Essa confiança na confiança de Jesus Cristo é a atitude existencial pela qual a existência
se vê transformada em nova criatura ("não sou mais eu que vivo, é Cristo que vive em
mim", 2,19-20) e pela qual recebe o Espírito (4,6-7).
Desdobramentos deste pressuposto
 Concepção Apocalíptica Da História Desenvolvida Pela Epístola - A revelação
de Deus em Jesus Cristo, dividiu a história em dois: significa uma mudança de
época, o fim do tempo antigo no qual reinava a Lei (3,19) e o início dos novos
tempos que são os tempos do Espirito (4,6-7).
A consequência é que os crentes não estão mais sob a Lei, mas no Espírito, e que
são chamados a se deixar conduzir pelo Espirito e a produzir os frutos do Espirito
(5,16-24; 6,7-10)

O que fez da existência sob a Lei uma existência sob a maldição (3,10-14)? O que
vem a ser a Lei na nova época (5,13-15)?
A existência sob a Lei está condenada ao desespero porque ela supervaloriza a Lei:
se tivesse sido dado à Lei o poder de dar a vida, então a Lei teria o poder de
justificar (3,21). A lei foi dada por um tempo limitado e para ordenar a cidade
(3,19).
A existência sob a Lei se vê infeliz e maldita, seja porque não consegue cumprir
toda a Lei, seja porque consegue cumprir toda a Lei, pois nem por isso ela é
justificada, visto que só Deus, e não a Lei, tem o poder de dar a vida e de justificá-
la.

Intenção Teológica - O Cumprimento Da Lei


A Lei se vê cumprida no duplo mandamento do amor a si mesmo e do amor ao
próximo.
O sentido dessa "palavra" (GI 5.14) não é outro senão o de tornar real a justificação
pela confiança: aquele que se sabe justificado por Deus é autorizado e chamado a se
amar a si mesmo;
A descoberta de si mesmo como pessoa independentemente das próprias qualidades
é inseparável do reconhecimento do outro.
Mas qual é a relação entre essa palavra e a Lei? O conceito de cumprimento implica
uma dupla relação de continuidade e de descontinuidade, que Gálatas esclarece
distinguindo os três conceitos de Escritura (3,8.22; 4,30), promessa e Lei.

Intenção Teológica - A Carne E O Espírito


A oposição antitética carne/Espírito equivale à oposição homem Deus que domina a
argumentação desde Gálatas 1,1; 1,6-9 e 1,10-12 homem e a carne são passageiros e
pertencem ao mundo da cria ao passo que Deus e o Espírito têm a força de fazer
viver (3.21). justificar e de dar a vida eterna (6,8-9).

20
 Carne e o Espírito apare cem como duas forças contraditórias que determinam
duas atitudes existenciais contrárias (3,1-5).
A existência que recebe sua justiça pela fé encontra-se sob o poder do Espírito, ao
passo que viver sob o poder da carne é sinônimo de procurar ser justificado pelas
obras da Lei.
 A carne e o Espírito caracterizam duas épocas da história da salvação (4,1-7): a
carne é o poder deste mundo que passa, ao passo que o Espírito é o da nova
criação.
 A decisão de crer e de se deixar conferir uma nova identidade, simbolizada pelo
batismo, cria uma mudança sem retorno: os gálatas que creram e se fizeram
batizar tornaram-se filhos e vivem no Espírito (3,26-29).
A consequência é que aquele que creu e quer voltar a viver sob a Lei se vê em tensão, preso
entre os campos de força dos dois poderes; perde o controle de sua existência (5,16-24).
A consequência, os gálatas, que estão no Espírito, devem se deixar conduzir pelo Espirito e
deixar o Espírito produzir seus frutos neles (5,16-6,10).

EPÍSTOLA DE PAULO AOS EFÉSIOS


Circunstâncias Para Escrita
Há três problemas-chave ou peculiares na Carta aos Efésios que a destacam de todos os
outros textos atribuídos a Paulo.
1- Variedade de aspectos parece incomum em uma carta dirigida a uma igreja que
Paulo conhecia tão bem:
Paulo ministrou em Éfeso por cerca de três anos durante sua terceira viagem
missionária, e mesmo assim, , Efésios soa mais como Romanos, com um caráter
mais sistemático como se ele não conhecesse pessoalmente seus leitores, mas
pressupunha que soubessem de seu comissionamento peculiar (3.2) e o autor não
está nem mesmo inteiramente certo de que toda a sua igreja conhece o Senhor, ou
pelo menos de que todos conhecem o evangelho ortodoxo. (4.21).

2- Efésios e Colossenses se mostram bem mais parecidas no conteúdo, na estrutura


e, às vezes, até mesmo em fraseologia exatamente igual do que qualquer outro
par de cartas atribuídas a Paulo.
Ambas as cartas refletem o mesmo estilo peculiar, com frases longas e construções
intricadas (e.g., Ef 1.3-14; Cl 1.9-17). Ambas as obras contêm a mesma cristologia
elevada (e.g., Ef 1.5-10; Cl 1.15-20); a mesma eclesiologia universal (a igreja como
o corpo mundial de crentes judeus e gentios agora unidos em Cristo); e a mesma
escatologia realizada (com bênçãos celestiais disponíveis no presente e não no
futuro;
Esta epistola (Efésios) se caracteriza sobretudo por uma reflexão aprofundada
sobre a natureza e a tarefa da Igreja una e universal; essa reflexão teológica não
tem nada comparável no cânon neotestamentário.

21
Relação Colossenses E Efésios - A relação foi definida, por exemplo, como
transição de um esboço (Colossenses) para uma realização plenamente acabada
(Efésios). ressaltando que a última seria teologicamente mais coerente e mais
sistemática do que a primeira. Essas duas epistolas constituem, assim, a coluna
vertebral daquilo que chamamos de escola paulina, a saber, um grupo de discípulos
ou colaboradores de Paulo que assumem a tarefa de pre- encher o vazio deixado
pela morte do grande apóstolo. Dettwiler, p. 357

Destinatários
A dificuldade de situar o meio histórico de produção é agravada pelo fato de o
endereço ("aos efésios") ter sido acrescentado posteriormente; ele não figura nos
manuscritos mais antigos. Somos obrigados, portanto, a extrair as informações sobre
os destinatários somente do texto do escrito, fazendo abstração do titulo.

Uma explicação desse fato perturbador poderia ser a seguinte: tratava-se de uma
carta circular, e uma lacuna permitia escrever o nome dos destinatários. Cada Igreja
recebia seu exemplar, sendo o nome do lugar acrescentado pelo portador da carta.

Seja como for, o caráter geral desse escrito leva a supor que se trata de uma carta
aberta, destinada não a uma única Igreja, mas a um grupo mais vasto de Igrejas,
provavelmente situado na Ásia Menor.

Data, Local De Composição E Autoria


 Efésios foi escrita depois de Colossenses. As cartas de Inácio de Antioquia (por volta de
110) parecem refletir um conhecimento da epístola.
 A datação entre 80 e 100 é, portanto, plausível.
 O lugar da redação permanece desconhecido; pensa-se, de modo geral, na Ásia
Menor, mais precisamente em Éfeso, se o autor faz parte da escola paulina.
Esta epístola está dentro das deuteropaulinas, que não são de autoria Paulina (incluem
também colossenses e segunda aos tessalonicenses)

Intenção Teológica – A Cristologia Cósmica


Efésios é marcada por uma visão espacial do mundo. Deus, o criador de toda realidade visível e
invisível, e Jesus Cristo reinam sobre todas as coisas desde a esfera celeste.
Os éons (período de tempo muito longo, porém impreciso), os anjos e os poderes demoníacos
dominam uma esfera intermediária, ao passo que o mundo dos seres humanos e dos mortos
constitui a região inferior.
No contexto dessa concepção do cosmo, Efésios desenvolve uma cristologia do senhorio.
Ressuscitado, Cristo está sentado à direita de Deus (1,20; cf 4.8.10); Deus "pos tudo sob seus
pés" (1,22) e encheu o cosmo com sua plenitude de vida (1,23). Entretanto, essa cristologia de
senhoro é um tanto contrabalançada ou, antes, aprofundada pela referência à cruz.
Conforme 2,13.16, a cruz de Cristo é compreendida como um ato de reconciliação de judeus e
pagãos com Deus em um só corpo, a Igreja. Note-se que a concepção cristológica de Efésios é
claramente influenciada por Colossenses (ver, p. ex., CI 1,15-20 // Ef 1,20-23).

22
Intenção Teológica - A Igreja
O tema teológico central de Efésios é a Igreja. Quando o autor fala da Igreja, trata-se sempre
da Igreja universal e não da Igreja local.
Essa mudança de perspectiva já fora preparada por Colossenses. A unidade da Igreja é
fortemente acentuada (4.1-16). As principais metáforas eclesiológicas utilizadas pela epístola
são as seguintes: a Igreja universal é compreendida como a "construção" ou o "templo santo"
(2,20-22), como o "novo ser humano" ou "o homem perfeito" (2,14-16), como a "esposa" de
Cristo (5,22-23), como a "plenitude de Cristo (1,23 etc.) e, sobretudo, como o "corpo" cósmico
de Cristo, corpo do qual ele é a "cabeça" (1.22-23, 4.15-16).
A Igreja é portanto, percebida como um "ser em Cristo" e não, prioritariamente, como uma
entidade empírica, institucional ou sociologicamente identificável. A Igreja universal não é a
soma de todas as comunidades cristãs locais, mas uma entidade à qual elas estão
subordinadas.
A questão suscitada por essa impressionante concepção eclesiológica é se a Igreja se torna,
assim, a mediadora entre o mundo terrestre e o céu, se ela é provida de uma função
soteriológica. Baseada no fundamento dos apóstolos e dos profetas, ela seria o espaço
exclusivo no qual a salvação é oferecida ao mundo. É preciso, entretanto, estar atento para
não opor exageradamente a eclesiologia de Efésios ao cristocentrismo das epistolas
protopaulinas: Efésios defende igualmente a primazia cristológica em relação à eclesiologia.
Um elemento novo, importante na eclesiologia de Efésios, comparada com a de Colossenses,
salta aos olhos. Cristo reconciliou os dois grupos da humanidade, judeus e pagãos, e fez deles
"um só homem novo": a Igreja (2,11-22).

Este texto (2,11-22) é capital para a compreensão da relação entre Israel e a Igreja em Efésios.
Duas compreensões são possíveis aqui. Conforme uma primeira interpretação, os pagãos são
integrados em Israel por Cristo, o Messias de Israel (2,12), e participam, doravante, das
promessas e da esperança de Israel. Nessa leitura, a Igreja é a nova manifestação de Israel ou
constitui, com Israel, o atual povo de Deus (M. Barth, E Mussner). Uma outra interpretação
acentua o fato de que é na Igreja que os pagãos, outrora "sem esperança e sem Deus" (2,12),
são reconciliados com Deus. Segundo esta segunda leitura, a Igreja seria uma nova relação ao
paganismo e a Israel, como parece sugerir a metáfora de um "homem novo" (2,15).

Intenção Teológica - A Escatologia


A concepção escatológica de Efésios está intimamente ligada à visão de mundo do autor e à
sua cristologia eclesial. O escrito põe toda a ênfase no presente: "Cristo nos ressuscitou e nos
fez sentar nos céus" (2,5-6; cf. CI 2,12-13; a diferença é clara em relação a Rm 6,5.8). Não há
mais reserva escatológica no sentido paulino (tensão dialética temporal entre o "ja" e o "ainda
não").
O futuro não trará nada de novo, mas apenas revelará o que já é realidade. Efésios
compartilha, portanto, o conceito escatológico da epistola aos Colossenses. O que resta a fazer
no presente é que a Igreja histórica venha a ser o que ela já é, teologicamente, em Cristo. As
expressões "cumprir", "crescer", "construir" (cf. 4.12 s. etc.) sublinham esse aspecto dinâmico.

Intenção Teológica - A Ética

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A longa parte parenética (coletânea de discursos morais) da epístola se caracteriza pela ênfase
na ideia da unidade da Igreja e pelo necessário distanciamento em relação ao mundo
ambiente pagão. O comportamento ético, consequência da nova identidade religiosa dos
cristãos, é considerado uma batalha contra os poderes sobrenaturais "deste mundo de trevas
(6,10-17); a impressão de uma imagem triunfalista ou exaltada da Igreja é, assim, atenuada.

O autor retomou e recompôs integralmente os códigos da vida doméstica (Ef 5,21-6,9) de


Colossenses 3,18-4,1° . A nova ênfase do texto de Efésios reside na importância e na
interpretação nitidamente teológica do casamento (Ef 5,22-33).
Por que tal insistência no casamento? Segundo U. Luz, o autor queria fazer frente à
desqualificação ascética do casamento, atitude que devia estar difundida nos círculos judeu-
cristãos e pré-gnósticos da Ásia Menor (cf. I Tm 4,3) e noutros lugares (cf. Mt 19,12)7. Mas
deve-se notar que a concepção do casamento é, aqui, sensivelmente diferente daquela
pregada por Paulo em 1 Coríntios 7. Enquanto Paulo tinha uma atitude mais pragmática em
relação ao casamento (1Cor 7,9: "é melhor casar-se do que ficar ardendo") e preferia
pessoalmente permanecer celibatário, o autor de Efésios concede ao casamento um estatuto
teológico eminente: a relação conjugal é análoga à relação CristoIgreja e se compreende a
partir dela.

EPÍSTOLA DE PAULO AOS FILIPENSES


Circunstância Para Escrita - A Cidade E Aspectos Gerais
 Fundada por Filipe II, pai Alexandre, o Grande.
 Colônia Romana e importante centro mercantil.
 Estava localizada no cruzamento das rotas comerciais que unia a Europa e a Ásia.
 De todas as cartas paulinas Filipenses se assemelha mais a uma carta normal antiga
ou moderna.
 Não apresenta uma argumentação teológica centrada numa questão fundamental,
conceitos teológicos só estão presentes de maneira alusiva.
A unidade desta epístola encontra-se no tom confiante em relação:
 Participação dos filipenses na obra do apóstolo;
 Reflexão sobre a condição do crente que vive sob o senhorio do Crucificado
 Repetição paradoxal da felicidade e de apelos de alegria nas eventualidade da vida
cotidiana

Circunstância Para Escrita – A pessoa e as preocupações do Apóstolo


Os temas que se referem à pessoa e às preocupações do apóstolo são:
 Agradecimento pela participação dos filipenses na obra apostólica de Paulo e,
particularmente, por seu apoio financeiro (1,2-11; 4,10-20);
 O anúncio do envio de Timóteo (2,19-24);
 O anúncio do retorno de Epafrodito (2,25-30);
 As notícias pessoais da prisão de Paulo (1,12-26).

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Quanto a Edificação da comunidade
 O tema constante da epístola é a continuidade da obra de Deus na comunidade
até o dia de Cristo (1,6).
 Esta se efetua na lembrança da obra realizada por Deus em seu favor (1,2-11),
nas recomendações que faz o apóstolo de se colocarem sobre o senhorio do
Crucificado (2.27-2.11).

Destinatários
Em 358/357 a.C., Filipe da Macedónia se apossa da região dos Crenidos, habitada
originalmente pelos trácios, para aí fundar uma cidade grega sob o nome de Filipos.
Desde 27 a.C. a cidade leva o nome de Colônia Julia Augusta Philippensis. A maior
parte das inscrições aí descobertas é em latim: embora trácios e gregos ainda nela
habitem, trata-se de uma cidade essencialmente romana, regida pelo ius italicum
(significa ser governada pelas leis romanas).
Sua importância não decorre de seu papel administrativo (Filipos não era nem capital de
província, nem cidade principal), mas de sua situação geográfica na via Egnatia, que
liga a Ásia Menor a Roma.

Data E Local De Composição


Paulo escreve da prisão (FI 1,7.13.17); já ocorrera uma primeira série de
comparecimentos diante do tribunal (1,7.13), e Paulo antecipa ter logo clareza de seu
destino (2,23).
No cativeiro, parece que ele não só goza de contatos relativamente fáceis com o
exterior, mas também pode manter correspondência regular com Filipos: Epafrodito lhe
foi enviado com o apoio financeiro e espiritual dos macedônios e Paulo o envia de volta
para casa. Paulo, ademais, tem certeza de poder fazer em breve uma nova visita aos
filipenses (1,26; 2,24).
Três localizações e datas teoricamente possíveis são discutidas, A epistola data:
 Do cativeiro romano e dos últimos anos do apóstolo (cf. At 28,30);
 Dos anos da prisão em Cesareia (cf. at 23,23-26,32);
 Da estada em Éfeso, onde parece que Paulo também este- ve preso e se viu em
perigo de morte (1cor 15,32; 2cor 1,8).

O Hino De Filipenses - 2. 6-11


Os versículos 6 a 11 abrangem aquilo que é frequentemente chamado de hino filipense.
Essa passagem é altamente poética no original grego, encontra-se estruturada de modo
simétrico, está repleta de um denso ensino cristológico fundamental e é separável de seu
atual contexto assim que o pronome relativo introdutório é substituído por seu
antecedente, “Cristo Jesus”.

Intenção Teológica - O Apóstolo E Sua Comunidade


A argumentação da epístola estabelece entre o apóstolo e sua comunidade uma relação
sistematicamente mediatizada pela obra de Deus. Se os filipenses são fiéis, se

25
participam ativamente da obra apostólica, Paulo se alegra e dá graças a Deus, que
continua, neles, o que ele começou.
Do mesmo modo, o apóstolo não agradece os filipenses por seu apoio financeiro (FI
4,10-20), mas se alegra (4,10) pelo fruto que cresce a crédito deles (4,17); é, com efeito,
de Jesus Cristo que vem o fruto de justiça (1,11) e é Deus que é o destinatário real da
generosidade deles e que os cumula de bens (4,18-19). O objetivo tanto da primeira
(1,3-2,18) como da terceira parte da carta (4,10-23) é incluir o apóstolo e sua
comunidade na história de uma relação triangular da qual Deus é, ao mesmo tempo,
o autor e a origem, e da qual Jesus é o fim.

O que vale para os filipenses vale, de fato, também para o apóstolo. Paulo convida seus
destinatários a imitá-lo (FI 4,17). Ora, a argumentação põe imediatamente em evidência
que o apóstolo não se apresenta nem como modelo, nem como ideal de perfeição. Com
efeito, aquilo em que o apóstolo é exemplar e no que deve ser imitado pelos filipenses é
a obra que Cristo realizou nele (3,7-11).

Portanto, é entender Paulo de modo totalmente errado pensar que ele se apresenta
como o ser perfeito, por sua fé e por seu comportamento. Se a existência do crente e do
apóstolo consiste em ser achado em Cristo (3,9a), com uma justiça que só pode vir de
Deus e da confiança posta nele (3,9b), então o conhecimento do poder da ressurreição,
a comunhão nos sofrimentos de Cristo e em sua morte (3,10) são o questionamento
radical e a inversão de todo ideal de perfeição. (Vouga, p. 312)

Intenção Teológica - A Existência Em Cristo E O Paradoxo Da Alegria


Tanto o tempo do Apóstolo como o de seus destinatários são determinados por um ato
passado de Deus, que lhes concedeu a graça de crer ou de conhecer Jesus Cristo (F129;
3,12); são também determinados pelo senhorio presente do Crucificado (2,6-11) e pela
expectativa do Dia de Cristo (1.6.10-11; 1.19-26; 2,14-18; 3.11; 3.14), pela expectativa
da ressurreição dos mortos (FI 3,11) e da transformação dos corpos humilhados em
corpos de glória (3,20-21).
Essa tríplice marcação da existência, estruturada pelo passado fundador no qual ela foi
alcançada por Jesus Cristo (3.12) e pelo chamado do alto que Deus dirige em Jesus
Cristo (3.14) - isto é, pela obra de Deus nela-, lhe dá o sentido de um caminho em
direção a um fim e, por outro lado, define sua verdadeira perfeição (3,16) e constitui sua
alegria.

A alegria que caracteriza o apóstolo e à qual ele convida os filipenses (FI 1,18.25;
2,2.17.18.28.29; 3,1; 4.1.4.10) não é a do fim do caminho; Ao contrário, ela é a de
conhecer a ressurreição de Jesus (3,10) e de esperar estar com Cristo (1,23, cf.
3,11.20-21), na comunhão com seus sofrimentos e com sua morte (3,10). Vouga, p. 312

Intenção Teológica - O Passado Fariseu

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A renúncia ao ideal de perfeição no intuito de produzir os frutos da justiça que Cristo faz brotar
em nós (FI 1,11; 4,17) constitui o essencial do relato que o apóstolo faz de sua conversão em
3,4b-11.
Duas compreensões da existência são opostas uma à outra, simbolizadas:
 Por duas maneiras de se gloriar (gloriar-se em Cristo Jesus ou por sua confiança na
carne, 3,3)
 Por duas concepções da justiça (sua própria justiça, que é pela Lei, e a justiça de Deus,
que é pela fé. 3,6.9).

A primeira compreensão se qualifica e encontra sua perfeição nos três ideais, definidos e
sancionados pela Lei, da origem, da obediência e do zelo (3,4b-6). A segunda se apresenta
como um progresso do conhecimento (3,8); para ela, essas três qualidades não têm valor,
porque o sentido da vida não se atinge por ideais de perfeição, mas é oferecido como um dom
(3,7-11)

EPÍSTOLA DE PAULO AOS COLOSSENCENSES


Circunstâncias Para Escrita
 A epístola aos Colossenses se apresenta como um escrito de Paulo, porém a carta
não foi escrita pelo próprio Paulo, mas por alguém muito familiarizado com seu
pensamento.
 Esse personagem desconhecido ambicionava prosseguir a reflexão teológica no
espírito de seu mestre.
 O autor empreende este trabalho de anamnese para fortalecer a fidelidade da
comunidade no que concerne à herança paulina e para adverti-la contra uma corrente
de pensamento a "filosofia colossense" - que, ele estava persuadido, destruira a
liberdade cristã.
 A epístola aos Colossenses testemunha, assim, a segunda presença de Paulo após a
morte do apóstolo

Colossenses é uma carta de circunstância que, muito provavelmente, revela uma


situação conflituosa específica. O escrito tem por finalidade:
 Imunizar a comunidade destinatária contra uma corrente de pensamento chamada
"filosofia" (2,8).
 A corrente de pensamento atacada por Colossenses comporta traços ascéticos. A ascese
propagada pela "filosofia" QUE trata-se, antes de tudo, de um tipo particular de
abstinência alimentar permanente (ver 2,16,21-22), tem um valor religioso e, mais
particularmente, soteriológico.

A Prática Ascética
A prática ascética, compreendida como um ato religioso de purificação, condiciona o
acesso ao mundo celeste. Tem por finalidade o distanciamento das pressões do mundo
e, finalmente, a libertação delas.

27
Mas e a veneração dos anjos, mencionada em 2,18, que parece ligada a experiências
visionárias? Uma possível leitura dessa passagem difícil consiste em admitir que os
seres angélicos têm por função soteriológica decidir sobre o acesso ao mundo
superior, função que justificaria sua veneração.
Qual a consequência disso para a questão da identificação da "filosofia colossense" no
contexto religioso da época? Sublinha-se, frequentemente, que a "filosofia" revela
traços sincréticos.

As Influências Pagãs
De um lado, 2,16 mostra que os adversários foram influenciados por tradições
judaicas: "que ninguém vos condene por questões de comida ou bebida, a respeito de
uma festa, de uma lua nova ou do sábado". Nesse caso, não se trataria do judaísmo
majoritário da diáspora, mas de um grupo judeu que sublinhava a importância da ascese.

De um outro lado, pensou-se em influências pagãs:


 Abstinência alimentar, cujo sinal distintivo é precisamente um comportamento de vida
ascética (vegetarianismo etc.);
 A influência de cultos de mistérios (2.18), muito difundidos na Ásia Menor.
 A veneração dos anjos é igualmente atestada nos textos judaicos e parece bastante
difundida na piedade popular judaica da época.

Destinatários
Os destinatários são, em primeiro lugar, os membros da Igreja de Colossos. "Paulo" se
dirige a uma comunidade que não foi fundada por ele, mas por Epafras (1.7: 4.12).
A cidade de Colossos estava situada na Ásia Menor, mais precisamente no vale do Lico,
na Frígia, cerca de 170 quilômetros a leste de Éfeso. Outrora cidade grande e próspera,
tinha perdido importância sob o império romano; Laodicea, a cidade vizinha (a cerca de
quinze quilômetros de Colossos; cf. Cl 2,1; 4,13-16), havia assumido o papel
preponderante na região. A existência de comunidades judaicas nas cidades da região da
Frígia é atestada (Flávio Josefo, Antiguidades judaicas 12,147-153; Cicero, Pro Flacco
28). Mas Colossenses se dirige prioritariamente a pagãocristãos (cf. p. ex. 1,21.27;
2,13).

Local de Composição
Se a carta foi escrita pelo próprio Paulo ou por um colaborador durante a vida do
apóstolo, três possibilidades se apresentam:
 Se o autor se encontra na prisão, Colossenses 4,18 (cf. 1,24; 4,3):
Trata-se do cativeiro de Paulo em Cesareia, em Roma ou em Éfeso (a última não é
mencionada nos Atos, mas pode, até certo ponto, ser reconstruída com base em 1Cor
15,32; 2Cor 1,8 s.; 11,23)? A proximidade de Colossenses com Filemon pleiteia em
favor de um cativeiro durante a estada em Éfeso, entre 53 e 55.
 Se, pelo contrário, a carta foi escrita por um membro da escola paulina, depois da
morte de Paulo, o lugar da redação permanece incerto:

28
Pensa-se na Ásia Menor, mais precisamente em Éfeso, lugar presumível da escola paulina. A
data mais provável seria, então, 70-80. Seja como for, Colossenses foi escrita antes de Efésios,
com a qual mantém laços estreitos.

Intenção Teológica - A Cristologia - O Hino A Cristo (Cl 1,15-20)


Colossenses acentua a dimensão cósmica da figura de Cristo. O senhorio universal de
Cristo constitui, de fato, arma decisiva para combater a "filosofia" adversa. O solus
Christus (Cristo só) torna caduca toda pretensão dos poderes sobrenaturais sobre o
homem.
A primeira estrofe do hino (vv. 15-18a) descreve Cristo, "imagem do Deus invisível,
primogênito de toda criatura" , como mediador da criação, ao passo que a segunda
estrofe (vv. 18b-20) louva Cristo como mediador da reconciliação universal.
Cosmologia e soteriologia, protologia (estuda as origens do universo e da vida) e
escatologia estão assim estreitamente ligadas.
Existencialmente, o hino traz uma mensagem de reconforto diante da convicção, muito
difundida no mundo helênico, de que os elementos e os poderes do cosmo se
confrontam em permanente conflito; essa convicção se alimenta da experiência
angustiante de viver em um mundo instável e frágil.

O hino propõe, então, uma espécie de contraexperiência religiosa que consiste em dizer
que o cristo preexistente e ressuscitado garante e mantém a coerência do cosmo. torna
possível, assim, uma nova experiência do mundo como criação boa de Deus.

Intenção Teológica - A Igreja


A metáfora eclesiológica central de Colossenses é a do "corpo" com Cristo como
"cabeça" (1.18: 2,19; cf. 1,24; 3,15). É evidente que a concepção colossense da Igreja
decorre diretamente da eclesiologia cosmológica de Colossenses (ver o hino a Cristo,
1,15-20).
Qual é a relação entre a Igreja e o mundo?
Cristo é Senhor de todo o Cosmo (1.15-20; 2,10), mas é só a Igreja que, propriamente
falando, constitui seu corpo. Pois a Igreja é esse espaço, no mundo, que reconhece a
primazia de Cristo sobre todos os elementos do universo. Entretanto, Igreja e mundo
não são esferas completamente isoladas uma da outra: o Evangelho deve ser proclamado
"a toda criatura debaixo do céu" (1.23); ele deve crescer e produzir fruto, como indicam
as metáforas sobre o crescimento (1.6.10; 2,19)

Intenção Teológica - O Batismo E A Escatologia


Colossenses acentua fortemente o presente da fé.
 A comunidade cristã já está salva por seu batismo e já participa do mundo celeste
(1.13 s.21 s: 2,10-12; 3,1; ver, sobretudo, 2,12-13 comparado com Rm 6,3-11).
 A tensão dialética entre o presente e o futuro, que estrutura de modo fundamental a
teologia de Paulo, não existe mais - ou não mais da mesma maneira.

Qual é então a compreensão do futuro?

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 Colossenses não defende uma compreensão exaltada do homem. A vida nova
da comunidade é uma experiência escondida; ela só será inteiramente manifesta
no tempo da epifania de Cristo (3,3-4).
 O futuro não vai trazer nada de qualitativamente novo (compare-se ICor
15,12 ss. com esta concepção). O futuro manifestará unicamente o que já existe.
O futuro será, assim, a epifania do presente.

Intenção Teológica - A Ética


Segundo Colossenses, a ética tem um valor eminentemente teológico (3.5-17)
 Ela é o espaço no qual a realidade da ressurreição, que é principalmente uma
realidade escondida (cf. 3,1-3), torna-se, de modo fragmentário, uma realidade
que se exprime na vida cotidiana da comunidade. Nesse sentido, o autor de
Colossenses revela-se um fiel discípulo de Paulo, fato que se verifica pelo
enraizamento da ética na cristologia e na primazia do amor.

Intenção Teológica - A Ética: Os Códigos Domésticos


Para descrever os deveres mútuos dos membros da casa cristã, o autor de Colossenses
utiliza uma tradição que aparece aqui pela primeira vez no corpus paulino: os códigos
domésticos (3,18-4.1; ver em seguida Ef 5,21-6,9).

Os códigos são marcados por uma tradição helenística da época, a gestão da casa. Essa
tradição defende um modo de vida social que, considerada em seu contexto, se
caracteriza por uma visão patriarcal e um conservadorismo moderado; ela ocupa uma
posição intermediária entre a concepção patriarcal romana clássica e as tendências
emancipadoras mais recentes. Colossenses retoma essa tradição e a retoca muito de
leve.

PRIMEIRA EPÍSTOLA AOS TESSALONICENSES


Circunstâncias Para Escrita
Por sua aparência, é uma carta anterior às grandes cartas de Paulo aos Coríntios, aos
Romanos e aos Gálatas.
 O prefácio epistolar, ao qual falta o "da parte de Deus nosso Pai e de nosso
Senhor Jesus Cristo" paulino, ainda não é o das cartas apostólicas, mas uma
variação das cartas sinagogais, e se apresenta como uma carta pré-apostólica;
 Faltam os conceitos teológicos-chave: justiça, cruz, lei, pecado, morte, corpo,
liberdade. vida. Também não há nela qualquer citação do Antigo Testamento.
 Como a epístola toda é escrita com o pronome "nós" , à exceção de 2,18, 3,5 e
5,27, em que o "eu" distingue Paulo dos cossignatários da carta, e, por outro
lado, devido a seu caráter pouco paulino e em virtude dos parentescos literários e
teológicos que a ligam a I Pedro, e se ela não teria sido redigida por Silvano, em
nome de Paulo.

A razão pela qual a carta foi escrita aparece em suas duas partes complementares.

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De um lado, ela reside:
 Na insegurança criada pela ausência prolongada do apóstolo (ITs 2,17- 20)
 Em sua preocupação paternal com a nova comunidade (2,1-12)
 Vontade de confirmar seus destinatários em sua fidelidade ao Evangelho (3,1-10).
Por outro lado, a carta quer reforçar suas convicções:
 Os apelos à santidade (4.1-8) e à edificação mútua na vida comunitária (5,12-22), que
visam a confirmar a Igreja em sua identidade própria, enquadram a resposta a três
questões que podem ter sido, talvez, propostas pelos tessalonicenses (4,9-12; 4,13-18;
5,1-11). Duas delas dizem diretamente respeito à parusia (volta de Cristo)

Os Questionamentos Da Igreja
 1 Tessalonicenses 4,13: qual vai ser a sorte dos mortos?
Os autores entendem que serão surpreendidos, ainda vivos, pelo som da trombeta e
transportados, nas nuvens, ao encontro do Senhor (4,17). A incerteza a que dá lugar
essa convicção concerne ao futuro: morreram eles cedo demais para ser salvos com
os vivos?
 1 Tessalonicenses 5,1: Se irmãos e irmãs, ou parentes, dentro ou fora da
comunidade, morrerem antes que intervenha a parusia, esta acontecerá
efetivamente?
Põem em dúvida a credibilidade da mensagem dos apóstolos, de modo que o
conjunto da carta poderia ter sido escrito para refutar a dupla objeção
formulada por elas. A resposta se encontra no anúncio da ressurreição dos mortos
(4.15-16), no apelo à vigilância (5,1-11) e na exortação à edificação mútua dos
membros da comunidade (4,18; 5.11).

Destinatários, História E Composição Da Comunidade


 A cidade foi fundada em 315 a.C.
 Capital da província da Macedônia com porto importante
 Situado na via Egnatia, Tessalônica, era uma grande cidade cosmopolita
habitada por uma diversidade de povos.

História e composição da comunidade


Diferente das demais epístolas, em 1 Tessalonicenses o "nós" representa os três
signatários da carta (ITs 1,1); a comunidade foi fundada por Paulo e seus dois
colaboradores, Silvano e Timóteo. Parece que os três apóstolos ficaram por algum
tempo em Tessalônica:
 Aí trabalharam até com as próprias mãos para prover ao seu sustento (2,9, cf.
4,11)
 Converteram um pequeno grupo de crentes bastante restrito e íntimo, e
podiam tratar cada um deles como um pai a seus filhos (2,11).

Local de Composição
Que lugares são nomeados na carta?

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 Filipos (onde esteve Paulo antes de fundar a Igreja de Tessalônica: ITs 2,2),
Atenas (de onde Paulo, não podendo ir ele mesmo à Macedônia, enviou
Timóteo: 3,1-2) e Macedônia e Acaia, isto é, a Grécia inteira (onde a fé dos
tessalonicenses se tornou modelo para todos: 1,7-8).
 Timóteo está, agora, de volta de Tessalônica (3,6-10) e se junta a Paulo e
Silvano para escrever a carta. Pela menção de "todos os crentes da Acaia" (1,7),
pode-se pensar que eles se encontram em Corinto, onde, provavelmente, a Igreja
acaba de ser fundada.
 A estada de Paulo em Corinto, que segundo Atos 18,11 durou dezoito meses,
deu-se entre fins de 49 e início de 52; consequentemente, a carta foi, sem
dúvida, enviada em 50-51.

Intenção Teológica
Em seu conjunto, a carta parece ser uma repetição dos temas da pregação
apostólica:
1) A confissão do Deus vivo (1,9-10).
2) A ética. Interpretação metafórica e moral das categorias de santidade e pureza e,
por outro lado, no apelo à concórdia (philadelphie) como a uma forma helenística do
mandamento do amor (4,1-12).
3) A certeza da salvação diante da morte (4,13-18). 4) A determinação escatológica
do presente (5,1-11)

Intenção Teológica - Conversão Ao Deus Vivo


 A conversão do paganismo à fé cristã não é compreendida como uma
decisão pessoal, individual e confessante de romper com o monoteismo
racional do helenismo, para só adorar o Deus vivo.
 No ecumenismo monoteista, pressupõe, antes de tudo, a recusa de uma
concepção avançada do monoteísmo:
1- Rejeita a ideia geral da existência de um deus único, que integra em si mesmo a
pluralidade de divindades que aparecem nas diversas religiões, para afirmar que
o mundo é povoado de deuses e que, entre os deuses, é preciso escolher.
2- É preciso escolher porque Deus se manifestou no paradoxo da morte e da
ressurreição de Jesus (ITs 4,14);
3- Ele é o Deus verdadeiro e o Deus vivo, porque escolheu aqueles que creem nele
e os santificou (1,2-10).

Intenção Teológica - A Existência Cristã: Eleição E Santidade


A descrição da existência cristã nas categorias da eleição (ITs 1,4) e da santidade
(4.3.4.7) conferidas pelo poder do Espirito Santo (1,5.6; 4,8) parece estranha à
teologia do apóstolo.
 Santidade implica a ideia de uma dissidência no mundo, fundada na consciência
de ser posto à parte e encarregado de uma responsabilidade particular.
 Eleição, diferentemente da compreensão do Antigo Testamento e do judaísmo, é
incondicional: resulta da decisão pessoal de renunciar aos ídolos para escolher o

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Deus vivo (1,2-10). A descrição da existência cristã nas categorias da eleição
(ITs 1,4) e da santidade (4.3.4.7) conferidas pelo poder do Espirito Santo (1,5.6;
4,8) parece estranha à teologia do apóstolo.
A eleição liberta o indivíduo dos poderes que o escravizam; ela o obriga ao amor e ao
respeito mútuo aos irmãos e irmãs no interior da comunidade, à solidariedade com as
outras Igrejas (4.9-12)

Na eleição em tessalonicenses a existência pessoal e a vida comunitária se veem assim


estruturadas de uma maneira que corresponde à concepção da justiça ou da
justificação das grandes epistolas. Vouga, p. 326

Intenção Teológica - O Caráter Comunitário Da Parênese (Discurso Moral)


Os ensinamentos de I Tessalonicenses 4,9-5,11 termina com uma recomendação que
remete os leitores à vida comunitária:
 Os membros da Igreja são chamados a viver uma vida decorosa aos olhos das pessoas de
fora, provendo às suas necessidades com o seu próprio trabalho - e não com a
mendicância dos pregadores itinerantes (4.1-12);
 Eles hão de se reconfortar uns aos outros com o ensino escatológico do Evangelho (4.13);
eles hão de se edificar e se aconselhar mutuamente (5,11).
 As condições da existência comunitária são definidas pelas exortações que enquadram
esses ensinamentos dos apóstolos (4.1-8 e 5,12-22): importante que os crentes
permaneçam fiéis à sua eleição (4.8) e se mantenham longe de todo mal (5,22).

O espaço da comunidade, que é o lugar do amor fraterno, do reconhecimento das pessoas, da


edificação mútua e de uma solidariedade espiritual e material, e o espaço do mundo que tem
suas próprias leis, e em relação ao qual a comunidade é chamada a exercer suas
responsabilidades Vouga, p. 326

A ÉTICA PAULINA
I Tessalonicenses: Ética fundamentada na eleição e na santidade
1 Coríntios: Ética fundamentada na Liberdade
Romanos e Gálatas: Ética fundamentada na justiça de Deus e vida no espírito

SEGUNDA EPÍSTOLA AOS TESSALONICENSES


Circunstâncias Para Escrita
Em três passagens, o autor de 2 Tessalonicenses revela como ele vê a situação da
comunidade destinatária:
 Fanatismo a respeito da volta iminente de Cristo e perseguição (1.4)
 Tal fanatismo resultou da atitude de fuga da perseguição.
 Incertezas quanto ao momento da vinda de Cristo (2,2) e necessidade de
esclarecer a escatologia.
 Presença "desordenados" (3,6-11).
Em três passagens, o autor de 2 Tessalonicenses revela como ele ve a situação da
comunidade destinatária: As indicações sobre as perseguições permanecem muito vagas
(ver, como comparação, ITs 2,14-16). O problema ético dos "desordenados" é
33
igualmente difícil de situar. Resta a questão escatológica de 2 Tessalonicenses 2, que
permite concretizar as circunstâncias históricas e a finalidade do escrito

Circunstâncias Para Escrita - A Parusia


O anúncio profético da presença do "dia do Senhor" , isto é, a parusia do Cristo celeste,
provocou preocupação e incerteza entre os destinatários.
Os representantes dessa escatologia presencial baseiam-se em revelações espirituais,
mas também em uma palavra (provavelmente da pregação) e numa carta (fictícia ou
real) de Paulo. 2 Tessalonicenses 2,1-2.
A finalidade de 2 Tessalonicenses é acalmar essas agitações mediante o
desenvolvimento de um contramodelo escatológico, uma espécie de "horário
apocalíptico" que refuta a posição adversa (2,3-12)

Circunstâncias Para Escrita - Os Adversários


Retomemos o problema ético dos "desordenados" . Têm-se frequentemente visto uma
ligação entre a problemática escatológica e a advertência contra os que vivem
"uma vida desordenada (3,6-12).
Esses membros da comunidade destinatária não seriam, então, simplesmente
"preguiçosos", mas crentes a tal ponto entusiasmados com a iminência dos
acontecimentos escatológicos que teriam mudado radicalmente seu modo de vida.
Essa interpretação de 2 Tessalonicenses seria possível, mas choca-se contra o fato de o
próprio texto não estabelecer explicitamente essa ligação; não há nenhum traço
perceptível de uma "desordem carismática".

O Autor, Destinatários, Lugar E Data De Redação


Caso se admita a hipótese deuteropaulina, o autor e seus destinatários nos são
desconhecidos.
De qualquer forma, o autor de 2 Tessalonicenses se distingue consideravelmente,
pelas escolhas literárias e teológicas, das outras epístolas deuteropaulinas,
Colossenses e Efésios. A identificação histórica da comunidade destinatária deve
permanecer em aberto. Não é necessário pensar que se tratava da comunidade de
Tessalônica; poderia ser qualquer comunidade ou região familiarizada com a tradição
paulina, e que conhecesse ou se lembrasse ainda de 1 Tessalonicenses.
O lugar da redação de 2 Tessalonicenses permanece desconhecido para nós.

Data De Redação
O problema principal em 2 Tessalonicenses, a saber, a efervescência escatológica e a
consciência da demora da parusia, leva a situar a data da redação por volta do fim do século
I, entre 80 e 100 (problemática análoga em 2Pd 3,1-13).
Mas não se deve excluir uma datação mais antiga-entre 70 e 80. O terminus ad quem é, em todo
caso, o fim do primeiro século, porque 2 Tessalonicenses foi integrada na coleção das cartas
paulinas.

Intenção Teológica – A Questão Escatológica

34
A intenção de 2 Tessalonicenses concentra-se inteiramente na vontade de reavaliar o
tempo presente. A ênfase principal recai na questão escatológica.

Ordem provável dos acontecimentos apocalípticos segundo 2 Tessalonicenses 2,3-12:

1) Aparecimento da apostasia (3b) e atividade do homem da impiedade'; o


'mistério da impiedade já está em ação' (7a). mas se exerce de maneira oculta
pois algo ou alguém ainda o retém (6a, 7b: poder retardador)

2) Revelação pública do “ímpio' (8a; idêntico a 'o homem da impiedade'),


acompanhada de sinais miraculosos, porém enganadores (9-10)

3) Revelação do Senhor (o Cristo) celeste e destruição do ímpio (8b,c) 4) Condenação


escatológica dos ímpios (12; cf. 1,8)

O autor de 2 Tessalonicenses quer criar um espaço para o momento presente que tenha
uma qualidade sui generis (original e peculiar).
Por um lado, o tempo presente não pertence aos "últimos tempos" , mas é
claramente distinto deles. Por outro, o tempo presente não é, de alguma forma, um
tempo vazio; ele está sujeito ao agir poderoso do "mistério da impiedade" (2,7).

O presente da fé é, portanto, qualificado não como o tempo da realização, mas como o


tempo da espera e da decisão, ou ainda como o tempo da perseverança; carrega,
portanto, intrinsecamente, uma distinta ênfase ética. Dettwiler, p. 388
EPÍSTOLA DE FILEMOM
Circunstâncias Para Escrita
Esta epístola demonstra a função de um apaziguador com a proposta de resolução de
conflitos no corpo de Cristo. Esta epístola é objeto de estudo para explicar a relação do
apóstolo Paulo com questões do seu contexto social, neste caso a escravidão.

O Argumento De Paulo
A estratégia argumentativa da epistola consiste em opor, umas às outras, três hierarquias
que presidem as relações entre Filemon, Paulo e Onésimo.
1- Ordem jurídica, Onésimo não só é escravo de Filemon, mas também seu
devedor pelo tempo passado junto de Paulo. Quanto a Paulo, ele é, em princípio,
o igual de Filêmon, mas é co-responsável pela ausência de Onésimo (Fm 18).
2- Ordem eclesiástica, Paulo gerou Onésimo na prisão (Fm 10); mas Filêmon lhe
deve, também, a fé (v. 9b), de sorte que o apóstolo tem autoridade sobre o
senhor (v. 8) assim como sobre o escravo, que são seus filhos (v. 9).
3- Ordem cristológica, enfim, Paulo e Filêmon (Fm 17 e 20) são irmãos, tanto
quanto Paulo e Onésimo, bem como Filêmon e Onésimo (v. 16).

Reflexos Da Argumentação

35
 Dá a compreender a Filêmon que Paulo está pronto, se necessário, a pagar-lhe o
que ele e Onésimo lhe devem (Fm 18-19a).
 Dupla reestruturação de valores. De um lado, Paulo sugere a Filémon que, em
razão de sua autoridade de apóstolo, poderia ordenar que deixasse Onésimo a
seu serviço (vv. 8 e 13- 14); assim ele opõe a hierarquia eclesiástica à ordem
jurídica, e em nome da primeira suspende a segunda.
 De outro lado, Paulo se apresenta como irmão de Filêmon e, como tal, renuncia
à sua autoridade apostólica (vv. 8-9) para lhe pedir que receba Onésimo,
convertido nesse entremeio, como irmão e não mais como escravo (vv. 16-17);

Paulo se opõe à hierarquia eclesiástica uma outra hierarquia, que a fundamenta,


segundo a qual tanto Paulo e Filêmon como Onésimo são os servidores de Cristo;
segundo essa hierarquia, a única relação possÍvel entre Paulo, Filêmon e Onésimo
é a de irmãos

Destinatários
Curiosamente, os nomes de Filêmon e Onésimo constituem um programa em si
mesmos: Filêmon significa "amável" e Onésimo, "útil" . De Filemon, não se sabe
nada além das informações fornecidas pela epístola.
Segundo as informações dadas por Colossenses 4,17, Arquipo faz, novamente, parte
dos destinatários de Colossenses, ao passo que, conforme Colossenses 4,9, Onésimo
é também de Colossos e se reuniu ao apóstolo e seus colaboradores no lugar de seu
cativeiro; estes são, em grande parte, os mesmos que o cercavam por ocasião da
redação de Filemon.
Conforme o enredo proposto por Colossenses, Filemon acolhe em sua casa a
Igreja ou uma comunidade da Igreja de Colossos. Tendo recebido bem a carta do
apóstolo trazida por Onésimo, enviou este de volta a Paulo, como lhe fora sugerido.

Local De Escrita
Em razão das repetidas menções do cativeiro do apóstolo (Fm 1.9.13.22), a carta
pode ter sido escrita, como a epistola aos Filipenses, em Éfeso, ou na Cesareia, ou
em Roma.
A tradição manuscrita pleiteia Roma, mas a proximidade geográfica necessária para
que Onésimo pudesse, sem dificuldade, ir buscar refúgio junto a Paulo torna Efeso
mais plausível. Filemon provavelmente data, portanto, da estada do apóstolo na
Ásia, entre 51/52 e 54/55.

Intenção Teológica - Casa Cristã E Escravatura


O pedido da carta, que se refere ao reconhecimento fraterno de Onésimo por
Filemon e à libertação do escravo, é coerente com o princípio paulino de Gálatas
3,28, segundo o qual não há mais, em Cristo, nem judeu nem grego, nem escravo
nem homem livre, nem homem nem mulher.
A comunidade que vive sob o senhorio do Crucificado distingue-se do mundo
que o cerca pelo fato de que, nela, as diferenças são constatadas e nomeadas,

36
mas cada um é reconhecido e amado como uma pessoa, independentemente de
sua condição ou de suas qualidades. O reconhecimento e o amor mútuos não são,
entretanto, compatíveis com as relações senhor escravo; o batismo de Onésimo
acarreta, portanto, sua libertação por Filêmon.

Confessando Jesus Cristo como Senhor, são todos escravos de Cristo; é a pertença a
Cristo que, no interior da comunidade, estabelece, entre os membros, relações de
irmãos e irmãs, e que no exterior da comunidade permite viver, na liberdade, as
obrigações da vida cotidiana.
A fé leva os cristãos a inventar novos comportamentos em sua existência e no
espaço de liberdade constituído pela Igreja; ela não lhes permite transformar a
sociedade.

Como ficam pessoas que cometeram crimes e se convertem a Jesus, como recebê-las?

Intenção Teológica - A Comunidade Cristã Como Lugar De Discussão Ética


Um paradoxo formal se manifesta no contraste entre o objeto da epístola, que requer
uma decisão pessoal de Filêmon, e o contexto de comunicação que ela estabelece.
Os autores da carta são Paulo e Timóteo, mas também, indiretamente, Epafras,
Marcos, Aristarco, Demas e Lucas. O circulo de destinatários engloba, à volta de
Filemon, Ápia, Arquipo e toda a Igreja que se reúne em casa dele. Esse duplo
alargamento do círculo de autores e de leitores não é, em si mesmo, surpreendente:
é, ao contrário, característico do género da carta apostólica tal como inventada por
Paulo. Aqui, entretanto, causa espanto, em virtude do objeto particular, e
aparentemente limitado, do pedido do apóstolo.

Esse pedido necessitava ser oficializado por uma carta apostólica?


 O gênero literário da carta apostólica institui a comunidade em lugar de
discussão e de decisão ética de seus membros.
 A relação de Filemon com Onésimo não é um assunto privado; implica um
reconhecimento que define a identidade da Igreja cristã como corpo, ou
como lugar do senhorio de Cristo.
 A atitude tomada por Filemom não se restringe à sorte particular de
Onésimo, mas concerne à atitude tomada em relação à escravidão no
interior das comunidades cristãs.

37
UNIDADE 3 – AS EPÍSTOLAS PAULINAS PASTORAIS
I e II Timóteo e Tito

Características Gerais e Particulares das Epístolas Pastorais


 Contêm instruções para um responsável por uma comunidade: as qualidades
necessárias, como organizar, os desvios a evitar.
 Timóteo e Tito são exortados a exortar, convidados a ensinar, a recuperar
quem se desviou.
 Paulo intervém em suas comunidades não diretamente, mas por intermédio de seus
dois colaboradores convidados a representar, tanto por seu ensinamento como por
seu comportamento, um modelo De vida coerente com a mensagem do apóstolo
para as comunidades pelas quais eles se tornaram responsáveis.

Nas pastorais, a relação com Paulo muda.


 De itinerantes enviados por Paulo em missão especial, ou acompanhando-o em
seus deslocamentos, Timóteo e Tito aparecem agora como ministros residentes,
deixados por Paulo quando de sua partida para a Macedônia ou para Nicópolis (ITm
1,3; Tt 1,5).
 Embora sejam convidados a ir ter com ele, assumem, por um período, a
responsabilidade da comunidade. Na perspectiva pseudepigráfica, essa qualidade
de ser colaborador e enviado pelo apóstolo, que se deduz da correspondência de
Paulo, predispõe Timóteo e Tito a se tornar, por um lado, as figuras da presença
do apóstolo quando sua ausência se tornou definitiva e, por outro, os modelos de
ministros fiéis à origem apostólica, capazes de ensinar também a outros o que
receberam de Paulo (2Tm 2,2).

Intenções Teológicas Nas Pastorais


As pastorais têm pouco espaço nas teologias do Novo Testamento. Por um lado, porque são
consideradas sobretudo exortações, é o caráter prático de suas instruções que tem sido
ressaltado, a ética, os ministérios; por outro lado, duvida-se de que as diferentes fórmulas
soteriológicas constituam uma teologia. Os estudos recentes sobre a teologia das pastorais
retomaram esses dois aspectos
1- Primeiramente, a teologia das pastorais se exprime justamente na articulação da
exortação com a soteriologia que a motiva.
2- A teologia das pastorais, certamente determinada pelo conflito com “aqueles que
ensinam outra coisa" (1Tm 1,3), apresenta- se como sã doutrina e bom depósito,
transmissão fiel da doutrina do apóstolo (1Tm 1,18; 6,20; 2Tm 1,12.14). Ela não
somente utiliza as tradições como pretende ser a tradição.

 Responsabilidades Administrativas nas igrejas  Questões de conduta Pessoal


 Advertência contra heresias

Datação Das Pastorais


38
Sobre a datação das epístolas pastorais, Bloomberg (p.463) diz:
Continuaremos a falar que o autor dessas obras é Paulo. Quanto à data e ao contexto
histórico, não vemos motivo algum para rejeitar a ideia dominante ao longo da história
da igreja, incluindo o testemunho de diversos dos primeiros escritores cristãos, que dá
respaldo à abordagem da “libertação e segundo encarceramento” . Isso nos deixa
aproximadamente os anos de 63 a 67, dependendo do ano exato em que Paulo faleceu,
para situar essas três cartas. No entanto, reconhecemos que uma data anterior, durante
ou logo após o tempo de Paulo em Efeso (55-56), também poderia funcionar
exegeticamente.

PRIMEIRA EPÍSTOLA DE PAULO A TIMÓTEO


Propósito Do Escrito:  Fornecer diretrizes claras sobre o ministério pastoral da igreja
Local e Encorajar a perseverança no ministério em dias difíceis.
Conteúdo do Escrito  Organização Eclesiástica e Administração da Igreja.

O Autor E Os Destinatários
Timóteo é o colaborador de Paulo mais conhecido. Enviado, em nome do apóstolo, a
Tessalônica (ITs 3,2), a Filipo (FI 2,19-22), e a Corinto como seu "filho querido e fiel
no Senhor" (1Cor 4,17; cf. 16,10), Timóteo é corremetente em 2 Coríntios 1,1,
Filipenses 1,1 e 1 Tessalonicenses 1,1 (C11,1; 2Ts 1,1); ele saúda em Romanos 16,21.
Nascido de pai grego e mãe judia, segundo os Atos, encontrado em Listra (At 16,1-2),
Timóteo se torna colaborador de Paulo depois que este se separou de Barnabé (At 15,37
ss.).

Características Gerais
Partindo para a Macedônia, Paulo saiu de Éfeso, onde deixou Timóteo com o encargo
de dirigir a Igreja e lutar contra os que ensinam uma outra doutrina (1,3).

As instruções contidas na carta deveriam permitir a Timóteo:


 Enfrentar a tarefa, mesmo no caso de Paulo prolongar sua ausência (3,15; 4,13).
 No mandato de Timóteo contra os falsos doutores (1,3-11).
 Uma última instrução substitui a saudação final (6,20 ss.).

Paulo E Natureza Das Instruções


As sequências marcadas pela polêmica (1,3-20; 4,1-16; 6,3-16) alternam com instruções
relativas à organização da comunidade se (2.1-3.16: 5,3-6,2).
Nas primeiras INSTRUÇÕES:
 Denúncia virulenta dos falsos doutores (1,3-10; 4,1-5; 6,3-10) precede uma
exortação, em contras te, a Timóteo
 Exercício de sua responsabilidade e de seu ensino, a resposta decisiva às ameaças de
desvio (1.3.18-20: 4,6-16; 6,11-14).
Nas segundas INSTRUÇÕES:

39
 Conforme os grupos da comunidade (episcopos, diáconos, homens, mulheres,
viúvas, anciãos, escravos, ricos).

O Caráter Das Admoestações


Essas admoestações recebem sua motivação teológica de duas maneiras:
1. Por fórmulas tradicionais (credo, catequese, hino: 1,15; 2,5 s.; 3,16; 6,14 ss.)
2. Por uma lembrança da figura fundadora de Paulo, a quem foi confiado o Evangelho
da iniciativa salvifica de Deus (ITm 1,11: 2,7; 3,14 s.).

Primeiro Método:
CONTROLE CUIDADOSO SOBRE O CULTO E A LIDERANÇA DA IGREJA
(2.1—3.16)

Atitudes apropriadas para com autoridades de fora (2.1-7)


O texto de 3.14 demonstra que, ao longo dessa seção, Paulo está pensando na prática e
na organização da igreja local. O princípio básico que ele enuncia é oração e submissão
pacífica à autoridade como 0 melhor testemunho para um mundo não salvo (2.1-7).

Papéis De Gênero Apropriados Para A Liderança (2.8-15)


Com frequência as mulheres greco-romanas abastadas passavam horas cuidando do
penteado, prendendo pedras preciosas e semipreciosas no cabelo esmeradamente
trançado e, com isso, anunciando a todo o mundo sua riqueza e posição social. Esse
vestuário ou adorno de ostentação não deve caracterizar os adoradores cristãos — mais
uma vez, um princípio atemporal.

Critérios Apropriados Para A Liderança Da Igreja (3.1-13)


 Supervisores (3.1-7). A posição de supervisor é nobre e é correto aspirar por ela,
conforme demonstrado pelo próximo “dito confiável” de Paulo (v. I). A ideia é que
eles não devem dar motivo legítimo algum para essas acusações. O critério da
boa administração da família (v. 4,5) não pode exigir que filhos de supervisores
sejam cristãos, pois é uma decisão que cada pessoa precisa tomar sem coerção dos
outros, nem se pode culpar os pais por escolhas erradas que os filhos adultos fazem
depois de terem se tornado independentes.

 Diáconos (3.8-13). Os critérios bastante parecidos para diáconos devem nos


desestimular de escolher esses líderes com base em habilidades práticas. Eles
precisam ser igualmente espirituais, mesmo que o exemplo mais antigo dessa
divisão de trabalho tivesse sido feito com base em certa oposição entre as esferas
“espiritual e prática” (At 6.1-6). O máximo que podemos dizer é que esse é algum
tipo de ofício subordinado de “ajuda” ou “serviço”.

40
Segundo Método:
DEDIQUE-SE À VERDADEIRA PIEDADE EM VEZ DO ASCETISMO (4.1-16)

Critérios Apropriados Para A Liderança Da Igreja (3.1-13)


 Em vez de promover o ascetismo incentivado pela heresia, a qual, em última instância, é
de origem demoníaca (v. 1-5), Timóteo precisa alimentar a igreja de Éfeso com a sã (lit.,
“saudável”) doutrina (v. 6,7).
 O treinamento físico tem algum valor, mas o exercício espiritual deixa a pessoa bem mais
saudável (v. 8-10). Se Timóteo se mostrar fiel no ensino e no exemplo dessas verdades,
pode esperar que a situação melhore (v. 11-16).

Terceiro Método:
RESPEITO E REGRAS APROPRIADOS PARA OUTROS GRUPOS DE
PESSOAS NA IGREJA (5.1—6.2)
A natureza da heresia em Éfeso sugere que os líderes infectados por ela haviam
adotado uma mentalidade elitista, de maneira que atitudes apropriadas a todos os
grupos de membros da igreja se tornaram essenciais.
 O texto dc 5.1,2 insiste no respeito pelos idosos e em intenções puras para com os
jovens, princípios ainda extremamente necessários em nossos dias e época.
 Os versículos 3 a 16 introduzem outra categoria de pessoas para a qual se enumeram
critérios formais (v. 9,10):

O “ofício” de viúva, claramente limitado a um seleto grupo de todas as viúvas da


igreja. Em uma cultura que insistia em que o marido ou pai cuidasse financeira e
legalmente da maioria das mulheres, tornar-se viúva poderia ameaçar a própria
subsistência.

O texto de 5.17-25 passa a tratar do sustento dos presbíteros, que de novo são
associados ao ensino e ao exercício de autoridade na direção dos assuntos da igreja (v.
17; lit., “estão sobre ela”), bem como honrá-los corretamente é protegê-los de acusações
falsas ou prematuras. Uma maneira de evitar ter de disciplinar esses líderes é não
ordená-los para esse ofício antes que estejam preparados para isso (v. 22).

Por fim, Paulo fala sobre os escravos cristãos (6.1,2), Assim como nas regras da casa de Efésios
e Colossenses, ele ordena que respeitem seus senhores. Tal como em Tito, ele destaca o
impacto positivo que esse comportamento terá sobre os de fora.

SEGUNDA EPÍSTOLA DE PAULO A TIMÓTEO


Propósito
 Fortalecer e advertir a um jovem ministro sucessor de Paulo.
 Preocupação de Paulo com o Evangelho e sua continuidade na transmissão fiel.

Características Gerais

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 Segunda 2 Timóteo, Paulo está na prisão em Roma, devido a perseguição de Nero
contra os cristãos entre 64 e 68 d. C (1.8.16 s.) e seu fim está próximo (4,6-8).
 À exceção de Lucas (4,11) e de Onesiforo (1.16 s.), todos os seus companheiros o
abandonaram (1.15).
 Foi sozinho que ele já apresentou sua primeira defesa (4,16).
 Paulo, então, convida Timóteo, que se supõe encontrar-se ainda em Efeso, a vir ter
com ele (4.9.21) junto com Marcos (4.11), ao passo que Timóteo e Marcos estavam
com Paulo em Roma pelo menos durante uma parte de sua prisão domiciliar (Cl 1.1;
4.10; Fm 21).

O Tom Pessoal Da Carta E A Autorrecomendação


De tom mais pessoal (1,3-5; 2,1-3; 3,10-17; 4,1-2.6-8.9-22), 2 Timóteo apresenta todas
as características de uma carta.
A ação de graças motivada pela fé do destinatário e de sua família (1,3-5) segue-se
regularmente à saudação inicial (1,1-2).
O preámbulo continua com a exortação a Timóteo, que apresenta certos aspectos de
autorrecomendação no lugar certo, no início da carta.
Em conclusão, após alguns traços testamentários em 4,6-8, as informações pessoais
(4,9-18) precedem, conforme as regras epistolares, a saudação final.

Dessa maneira, ele (Paulo) escreve com o intento de passar para Timóteo o bastão de seu
ministério em Éfeso, em uma incumbência final de dar testemunho ousado do evangelho. Essa
carta tem sido chamada de o "testamento” final de Paulo, semelhante aos discursos de
despedida de personagens importantes do Antigo Testamento. De forma mais técnica, a carta
se enquadra na categoria de "carta parenética pessoal" . A carta também revela a fé e a
esperança de um valoroso apóstolo diante da solidão e da adversidade, pouco antes de ser
executado. Bloomberg, p. 497

O Conteúdo Epistolar
É mais difícil encontrar uma acentuação para o corpo da carta.
 2 Timóteo não contém instruções para os grupos da comunidade.
 Encontram-se, de novo, a alternância de denúncias contra os falsos doutores
(2.14.16-18,26; 3,1-9) e exortações a Timóteo para se tornar o modelo oposto a eles
(1,6-8; 2,1-7.15.22-25; 3,10-4,5).

A motivação teológica se exprime segundo as duas formas indicadas


 Enunciados tradicionais (1,9-10; 2,8-13)
 Paulo como fundamento e modelo para o responsável pela comunidade e para o
crente (1,11 ss.; 2,8b.9; 3,11b; 4,6-8).
 2 Timóteo desenvolve o motivo do sofrimento de Paulo (1,8.12.16; 2,3.8-13; 3,10-
12; 4,6.9-10.14-18).

O COMPROMISSO QUE A FÉ EXIGE (2.1-26)


Suportar As Adversidades (2.1-13)

42
O texto de 2.1,2 resume a tese dessa carta. Ao passar o bastão do ministério para seu
discípulo, Paulo quer que, em termos gerais, Timóteo seja fortalecido pela graça de
Deus e, de modo específico, não deixe quebrar a cadeia da liderança piedosa.

 Em qualquer ministério de ensino e discipulado, resultados duradouros requerem o


treinamento de sucessores fiéis que, por sua vez, passarão aquilo que aprenderam a
outros, a fim de que esse padrão continue se repetindo.
Três analogias baseadas em situações humanas comuns deixam bem claro o argumento:
Soldados que evitam se envolver com questões não militares, atletas que gastam tempo
adicional em treinamento e lavradores que trabalham longas horas em seus campos (v. 3-6).

Trabalhar arduamente para ser aprovado (2.14-26)


O incentivo de Paulo à perseverança continua nessa seção. Aqui a metáfora
controladora é o operário que trabalha arduamente e é aprovado por Deus. Em questões
espirituais, o antecedente essencial para todo serviço aceitável é a interpretação e
aplicação responsáveis da Palavra de Deus (v. 15).

 Aqui Paulo se concentra no fato de ela (a igreja) negar a ressurreição:


Tendo afinidades com pessoas de pensamento gnóstico plenamente desenvolvido, eles
também podem ter desenvolvido uma “escatologia excessivamente realizada”,
afirmando que o único tipo de ressurreição com o qual um crente poderia contar era
uma ressurreição espiritual que já ocorria nesta vida à medida que as pessoas
compreendiam o conhecimento libertador dessa seita elitista (v. 18b).

DESCRIÇÃO E CONTESTAÇÃO DA IMPIEDADE (3.1-17)


A Depravação Nos Últimos Dias (3.1-9)
 O falso ensino específico em Éfeso lembra Paulo de que pensamento e
comportamento ímpios caracterizarão o período que precede a volta de Cristo (v. 1).
 O pensamento-chave que une esses pecados é o do amor direcionado para o foco
errado — direcionado a si mesmo como o centro de cada aspecto da vida. A luz da
heresia de Éfeso, parece que os versículos 6 a 9 tornam a particularizar os
problemas, ao assinalarem que mulheres espiritualmente imaturas se mostraram
particularmente suscetíveis às artimanhas dos falsos mestres .
O Antídoto Para A Depravação (3.10-17)
 Para combater os pecados perpetuados pelos falsos mestres, Paulo ressalta a
fidelidade ao evangelho.
43
 Mais cedo ou mais tarde, todos os crentes piedosos experimentarão algum tipo de
hostilidade ou ostracismo por causa de sua fé (v. 12).
 Os versículos 15b a 17 estão entre os mais importantes no Novo Testamento
sobre a natureza e o propósito da Bíblia. O propósito básico das Escrituras é levar
as pessoas à salvação disponível em Cristo. Aqui a ênfase básica de Paulo está na
relevância e na capacidade delas para produzir maturidade espiritual.
2 TIMÓTEO 3.10-16

ULTIMA INCUMBÊNCIA (4.1-22)


Passando O Bastão (4.1-8)
 Paulo começa a concluir a última carta que, pelo que sabemos, ele chegou a
escrever, ao conclamar Timóteo uma vez mais a usar seus dons fielmente, não
importando as circunstâncias (v. 1-5).
 Acima de tudo, Timóteo precisa permanecer fiel ao seu ministério Passando o
bastão (4.1-8) de pregação e evangelização (v. 2,5)

Assuntos pessoais (4.9-18)


“O final da última carta de Paulo é uma mistura de tristeza e gloria, de exasperação e
exultação.” Ogden, p. 223
 Justamente porque sabe que seu tempo é curto, ele espera que Timóteo Assuntos
pessoais (4.9-18) “O final da última carta de Paulo é uma mistura de tristeza e
gloria, de exasperação e exultação. ” Ogden, P. 223 possa muito em breve ir até ele
em Roma. Com a chegada do inverno (v. 21), ele precisará de sua capa e também
pede pergaminhos, provavelmente uma referência às Escrituras hebraicas. Ficamos
felizes em saber que ele se reconciliou adequadamente com Marcos a ponto de
querer que ele também venha.

De particular importância é, apesar de tudo, a afirmação triunfante de Paulo de que o


Senhor o resgatará, não da morte, mas para seu reino eterno. Um “Amém” retumbante
enfatiza sua explosão de louvor (v. 18)

RESUMO DOS CAPÍTULOS


Capítulo 1 — Primeira Exortação: Guarda o Evangelho! Guarda o bom depósito,
mediante o Espirito Santo que habita em nós (1:14).
Capítulo 2 — Segunda Exortação: Sofre pelo Evangelho! Participa de meus
sofrimentos, como bom soldado de Jesus Cristo. Lembra-te de Jesus Cristo . . . segundo
o meu evangelho, pelo qual estou sofrendo até algemas, como um malfeitor (2:3, 8, 9).
Capítulo 3 — Terceira Exortação: Persevera no Evangelho! Mas os homens perversos
e impostores irão de mal a pior, enganando e sendo enganados. Tu, porém permanece
naquilo que aprendeste e de que foste inteirado . .. (3:13, 14).
Capítulo 4 — Quarta Exortação: Proclama o Evangelho! Conjuro-te, perante Deus e
Cristo Jesus.. ..prega a palavra, insta, quer seja oportuno, quer não, corrige, repreende,
exorta com toda a longanimidade e doutrina (4:1, 2).

44
EPÍSTOLA DE PAULO A TITO
Propósito
 Instruir um ministro na organização de uma igreja local com sérios desvios da
verdade.
 Fundamentar a base experimental das instruções na regeneração operada pelo
Espírito Santo.
 A Proposta de resolução da vida moral decadente de uma igreja aparentemente
seduzida por heresias.

Tito
 Foi em Creta que Paulo deixou Tito com a tarefa de lá completar a organização da
Igreja (1,5).
 De Nicópolis (em Épiro?), de onde escreve, Paulo pede a Tito que venha a ter com
ele, quando Ártemas ou Tíquico o tiverem substituído (3,12-15).

Do ponto de vista epistolar, ressalta-se a ampla saudação, que se torna um verdadeiro


enunciado teológico (1,1-4), e a ausência de ação de graças.
 O corpo da carta se organiza em duas sequências centrais de exortações, de
extensão desigual e próximas quanto aos temas: os adversários, a comunidade, a
motivação soteriológica, a tarefa de Tito. (2,7.15; 3,8).
 Enfim, dos três enunciados soteriológicos (1,1-4; 2,11-4; 3,3-7), só o primeiro é
posto em relação explícita com Paulo.

Circunstâncias Para A Escrita


As semelhanças entre as circunstancias e o conteúdo de Tito e os de I Timóteo indicam
que essas duas cartas talvez tenham sido enviadas praticamente ao mesmo tempo, mas
na realidade não temos como saber com certeza. E possível que a introdução mais longa
e mais formal em Tito, possivelmente abreviada em 1 Timóteo, sugira que ela foi escrita
primeiro.

Introdução Da Carta
A ênfase na piedade permeia as Pastorais; o que distingue essas cartas é a descrição
de Deus como Salvador, o que pode até mesmo constituir o tema unificador de Tito?
Assim como em Gálatas, não aparece ação de graças alguma. Os problemas de
imaturidade e impiedade são suficientemente sérios para que Paulo tenha de ir direto ao
assunto. Essa saudação formal funciona logicamente como uma legitimação pública de
Tito em seu papel de delegado de Paulo.

INSTRUÇÃO AOS VÁRIOS GRUPOS DA IGREJA (1.5 - 2.15)


Ao que parece, parte do problema em Creta envolvia a confusão de papéis, de modo que
Paulo tenta ajudar Tito a ajustar as coisas. Essas comunidades recém-evangelizadas
ainda precisam da cooperação substancial de presbíteros, de maneira que Tito é
incumbido de “nomear” (ou, menos provavelmente, “ordenar”) essas pessoas (v. 5).
45
O termo “presbítero” (= “supervisor”) reflete o respeito, em todo o mundo antigo, pela
idade e pela sabedoria que com frequência vinha com ela. Chamá-lo de supervisor
(episkopos; também traduzido por “bispo”) indica sua função. Presbíteros já existiam
nas sinagogas judaicas como líderes leigos, de modo que a essa altura o cristianismo
estava simplesmente mantendo a prática do judaísmo.
O versículo 9 introduz uma expressão característica e própria das Pastorais — “um dito
confiável” (pistos logos) — e descreve as tarefas teológicas positivas e negativas dos líderes
eclesiásticos de todas as épocas:
 Incentivar os crentes mediante o ensino de doutrinas sadias (lit., “saudáveis”)
 Desestimular a heresia mediante a refutação de ensino falso. Precisamos de um
equilíbrio adequado entre ambos.

Os Falsos Mestres (1.10-16)


 Elemento judaizante, que envolve a circuncisão (v. 10) e mitos e mandamentos
judaicos (v. 14)
 Dimensão gnosticizante (ou pelo menos helenizante), pois os hereges afirmam
“conhecer” Deus (como na palavra gr.,gnõsis), mas o negam com suas ações (v. 16).
 Buscar ganhos desonestos (v. 11). Paulo cita um provérbio nada lisonjeiro que,
apesar disso, todos reconheciam como verdadeiro, pelo menos como generalização
(v. 12)!
 Já no primeiro século Creta era conhecida como “refúgio de ladrões e piratas”,
enquanto “cretizar” havia se tornado, em grego, sinônimo de mentir, dada a
afirmação pelos cretenses de que tinham o túmulo de Zeus (o qual, é claro, sendo
deus, não podería ter morrido).
 A principal preocupação de Paulo é que a igreja em Creta se mantenha afastada do
ascetismo (v. 15).

Homens, Mulheres, Moços E Anciãos


 Homens e mulheres mais velhos precisam levar uma vida moral digna e se tornar
bons exemplos para os cristãos mais jovens (v. 1-5).
 Parece que nas igrejas de Tito as mulheres eram particularmente suscetíveis ao falso
ensino (cf. 2Tm 3.6,7), de modo que Paulo incentiva as mais maduras a instruir as
menos maduras.
 A maior necessidade dos homens mais jovens era o autocontrole (v. 6). Em suas
instruções tanto a mulheres quanto a homens, Paulo generaliza ao se referir a ensinar
e a fazer “o que é bom” (v. 3,7). No segundo desses contextos, não somente o
ensino/a doutrina precisa ser são/sã ou saudável; mas agora esse atributo é aplicado
a tudo o que é dito (v. 8).
Exortações Finais
 Paulo incentiva Tito a lembrar suas igrejas a serem submissas a todas as autoridades
devidamente constituídas e a demonstrar humildade diante de todos (v. 1,2).
 Depois de advertências em particular e em público que visavam pôr as pessoas na
linha, é melhor deixar que aquelas que dividem a igreja em questões teológicas
fundamentais causem danos em outro lugar (V.10).

46
 Paulo acrescenta mais um incentivo a “fazer o bem” , em um contexto que poderia
respaldar a interpretação financeira da expressão (v. 14).
 O problema de uma vida “improdutiva” (lit., “infrutífera”), que poderia ser um
problema de clientes viverem às custas de seus antigos patronos também existisse
em Creta.
 Paulo conclui com suas saudações finais e sua costumeira graça (v. 15).

47
UNIDADE 4 – AS EPÍSTOLAS UNIVERSAIS

EPÍSTOLA AOS HEBREUS

Circunstâncias Para Escrita


Hebreus se apresenta como um sermão ou uma homilia (urna "palavra de exortação" ,
Hb 13,22): entre uma breve introdução (1-4) e uma bênção final (13,20-21), o autor
ordena sua argumentação em sequências temáticas. Reúne, a cada etapa, uma série de
textos bíblicos (Antigo Testamento) que cita e, depois, comenta e atualiza, com a
finalidade de lembrar a seus leitores a importância e a significação da obra de
salvação realizada em Jesus Cristo.

Apresentação
Primeira Parte: doutrinal, soteriológica e cristológica.
 Apresenta sistematicamente o acontecimento da salvação (1,5-10,18).
 Faz exposição geral de Jesus, logo de início, como o Filho de Deus que traz a seus
irmãos, os homens, o repouso escatológico e como o sumo sacerdote fiel e
misericordioso (1,5-5,10).
Segunda Parte: Parenética (10,19-13,21)
Faz referência à situação dos destinatários (ver 10,32-34 e, de modo mais convencional,
12.4);
A segunda seção da Exposição doutrinal é consagrada à significação da morte e da
elevação de Jesus, sumo sacerdote segundo a ordem de Melquisedec: Jesus é, como
sumo sacerdote escatológico e celeste, o mediador da nova aliança (9,15) que abre aos
crentes o acesso ao mundo do Pai (7,1- 10,18).
O final epistolar (13,22-25) com um postscriptum (aquilo que se acrescenta a uma carta
depois de assinada) (13,22), sai do quadro literário do sermão.
 Ao mencionar Timóteo (12,23), liga Hebreus ao corpus das cartas paulinas; ao
apresentar as saudações aos irmãos da Itália (13,24), transplanta o livro para a bacia
ocidental do cristianismo.

Destinatários
A localização tradicional da epístola situa seus destinatários na Palestina ou em
Jerusalém mesmo. Uma proposta alternativa sugere uma comunidade particular no
interior da Igreja de Roma. Aqui também a ausência de dados no próprio texto
provoca a multiplicação de conjecturas: pensou-se em Samaria, Antioquia, Chipre,
Éfeso, Colossos, Bitínia e Ponto, ou ainda em Corinto.
 A epístola é conhecida em Alexandria desde a metade do século Il como epístola
"aos Hebreus", antes mesmo de esse título ter sido atestado pela tradição manuscrita

48
 As repetidas advertências sobre a impossibilidade de uma segunda conversão
(6,4-6; 10,26) e a perspectiva de um possível afastamento do Deus vivo (3,12)
tendem a confirmar a hipótese de destinatários pagão-cristãos
 As informações fornecidas pelo próprio escrito são, de novo, extremamente
modestas.
 Os destinatários não são cristãos da primeira geração (2,3-4; 10,32). Eles
aprenderam os rudimentos do catecismo há muito tempo (a fé em Deus, a doutrina
do batismo e da impoção das mãos, ressurreição e último julgamento).
 Parecem perder a convicção e têm necessidade, segundo o autor, de alimentos
sólidos 34) pode, é verdade, fazer alusão às perseguições dos cristãos em Roma,
por Nero (64 d.C.)

Local De Composição
 Com toda probabilidade, a redação de Hebreus se deu entre os anos 60, data da
morte dos apóstolos da primeira geração, e os anos 80-90.
 Hebreus não é um escrito da primeira geração cristã. De um lado, o próprio autor se
apresenta como pertencente à segunda geração dos apóstolos: as testemunhas da
primeira geração confirmaram a salvação anunciada pelo Senhor (Hb 2,3).
 De outro lado, os destinatários se converteram há muito tempo (5,12) e o autor o
exorta a se lembrar dos inícios de sua existência cristã (10,32).

Autoria
 A questão do autor constitui um enigma desde os inícios da recepção da epistola no
cristianismo antigo. A impossibilidade de encontrar seu traço na historiografia cristã
provocou a multiplicação de hipóteses plausíveis mas pouco convincentes.

Autoria de Paulo
 A segunda bênção final (13,22-25) colocam a epistola sob a responsabilidade
literária do apóstolo Paulo. Na tradição manuscrita tradição patrística mais antiga
Clemente de Alexandria (c. 150-215) e Origenes (185-253) sugerem que o apóstolo
seja o responsável pelo conteúdo, enquanto a redação teria sido assegurada por um
tradutor (que Clemente identifica com Lucas). Ambos constatam que nem a forma
literária nem o estilo são os das outras epístolas paulinas.

Argumentos Contra A Autoria Paulina


 A Ausência de todos os principais temas paulinos (teologia da cruz problema da justiça,
questão da Lei, discussão sobre a liberdade), bem como a presença de categorias cultuais
totalmente ausentes das cartas paulinas (Melquisedec, Jesus como sumo sacerdote), A
interpretação sacrifical da morte de Jesus);
 Modo de argumentar sem paralelo no Novo Testamento.
 Para Clemente e de Orígenes, o cristianismo ocidental (a epistola aos Hebreus não é
mencionada no Cânon de Muratori, por volta de 200 d.C.), a ideia da autenticidade
paulina, assegurada por Agostinho e por Jerônimo, se impôs até o Renascimento e a
Reforma.

49
Autoria de Barnabé e Paulo
Uma primeira alternativa à atribuição tradicional foi proposta por Tertuliano (c. 155-
220, De Pudicita 20): Barnabé. Em favor dessa hipótese pleiteia a origem helenista
do primeiro companheiro de Paulo;

 Uma outra proposta emana de Martinho Lutero: Apolo.


As raras informações sobre ele dadas por Paulo (Cor 1,12; 3.4.5.6.22; 4,6; 16,12) e o
retrato que dele faz Lucas (At 18.24; 19,1). Apolo vinha da Alexandria, era versado na
interpretação das Escrituras e atraía a adesão por sua inteligência e sua arte oratória.
Eles não bastam, entretanto, para estabelecer uma identidade entre os dois. Tentou-
se acrescentar os do círculo ligados à missão paulina: Silvano, Priscila,, Aristion. Timóteo,
Maria, mãe de Jesus, etc.

Autoria Anônima
 O autor se apresenta como homem (e não mulher, como demonstra o particípio
dunyúuevov em 11,32)
 Como um pagão-cristão ou judeu-cristão, experiente na leitura alegórica da
Escritura tal como era praticada no judaísmo helenístico, influenciado pelas escolas
filosóficas estoicas e neoplatônicas.
 Talvez originário da Alexandria ou de um outro centro intelectual do Mediterrâneo
oriental.
 Ele faz parte da segunda geração cristā (Hb 2,3) e trabalha com base em tradições
teológicas das quais outros traços se encontram em Filon, em Qumran ou na
gnóstica do Egito.

O autor é, antes de tudo, um exegeta e um pregador. Ele trabalha com a ajuda de certos
métodos de leitura aplicados a textos e temas que escolheu pregar, comentar e atualizar.
VOUGA, p. 427

Composição Literária – Elementos


 Alegoria
Os métodos exegéticos utilizados correspondem ao sistema de convicção desenvolvido
no sermão. Herança hermenêutica das escolas filosófica helenísticas, a leitura do Antigo
Testamento: o mundo perceptível e terrestre não é mais que a imagem (10,1), a figura
(8,5), a parábola (9,9), a cópia (9,24) ou a sombra (8,5; 10.1). ler significa procurar a
verdade do espírito através e além da aparência apenas da letra.

 Melquesedeque
Hebreus não é o primeiro escrito judaico ou cristão a explorar a figura de
Melquisedeque. Melquisedeque aparece duas vezes, de modo enigmático, no Antigo
Testamento (Gn 14,18-20) e Salmo 110: o Messias anunciado será sacerdote para toda a
eternidade, à maneira de Melquisedeque (SI 110,4).

50
MELQUESEQUE (GN 14,18-20 E SL 110)
 Nesses textos há uma caracterização de jesus como sumo sacerdote.
 Melquisedeque é uma figura messiânica, seu sacerdócio é eterno e o sumo sacerdote
de sua ordem é eterno, santo e sem pecado: melquisedec é a figura do enviado
celeste do altíssimo.
 A combinação desses dois textos faz de melquisedeque o protótipo ideal de um
sacerdócio celeste e perfeito que se opõe à ordem sacerdotal, terrestre e imperfeita,
das ordens levíticas.
 A ordem celeste e perfeita de melquisedeque, conforme à qual jesus, sumo
sacerdote, celebra de uma vez por todas o sacríficio de sua vida (10,10), é o modelo
do qual o culto veterotestamentário era a parábola imperfeita e terrestre.

Intenção Teológica - O Sermão, Palavra De Exortação


O ponto de partida do sermão é o texto bíblico.
 O texto veterotestamentário é o da Septuaginta, isto é, da Biblia cristã, que o autor
presenta como a palavra de Deus (Hb 1,1; 4.12 s.).
 Essa palavra é o ponto de partida daquilo que o autor, ou seu editor, chama em
13,22 de uma "palavra de exortação" (λóyoç thc пαрaкλnow).
 A função dessa pregação é definida explicitamente pelo autor: trata-se de restituir
a razão de crer e de esperar a cristãos que os elementos da teologia que
receberam não alimentam mais (5.11- 6,12). Como se esgotou uma teologia, a fé
deve ser reanimada por uma nova ideia.

Intenção Teológica - A Nova E A Primeira Aliança


O tema do sermão é o acontecimento salvífico ligado ao envio e ao sacríficio do Filho
(1.3-4). O método alegórico da leitura dos textos é posto a serviço de uma estrutura
sistematicamente cristológica da Escritura.
O método da alegorização que consiste em ler alegoricamente textos não alegóricos, é
um empreendimento especulativo: o texto e seu conteúdo são as figuras terrestres das
realidades celestes.

1. Princípios hermenêuticos - paradoxo temporal: a morte de Jesus sela uma nova


aliança (8,8; 9,15; cf. 12,24), mas essa nova aliança é o modelo ideal e celeste
segundo o qual foi instituída a primeira aliança (8,5; 9.15). A primeira aliança e a
ordem veterotestamentária do culto são a sombra e a parábola da aliança celeste e
eterna selada de uma vez por todas pelo Filho (7.27; 9,12; 10,10).
2. Princípios hermenêuticos - interpretação radicalmente antissacrifical da morte
de Jesus: A nova aliança foi selada de uma vez por todas, de maneira definitiva e
perfeita; ela proclama, portanto, o fim da primeira aliança, a dos ritos sacrificais
(8,13), doravante abolida.

Intenção Teológica - Promessa E Realização: A Fé E A Esperança


Os patriarcas, Moisés e os profetas são os heróis da fé.

51
 Eles creram (11.1-38), operaram prodÍgios (11,33-35a) e pagaram o preço de suas
convicções (11,356-38).
 São, no sermão, os modelos de fé e a nuvem de testemunhas (12.1), dados como
exemplo para os destinatários.
 A razão pela qual são o protótipo da existência crente decorre da definição da "fé"
dada pela epístola (4.2; 6.1.12; 10,22.38 s.; 12.2; 13,7, 25 ocorrências em Hb 11):
"A fé é um modo de possuir desde agora o que se espera, um meio de conhecer
realidades que não se veem" (11,1).
 A fé é a condição indispensável para a obtenção da paz escatológica; ela é a visão do
mundo divino e, por isso, o conhecimento é a base sobre a qual repousa a esperança
(3,6; 6,11.18; 7,19; 10,23).

Diferentemente de Paulo, que pode considerar Abraão como uma figura contemporânea
da fé cristã (Rm 4,1-25), o autor de Hebreus mantém uma clara distância entre seus
destinatários e si mesmo, de um lado, e os "ancestrais" do outro (Hb 11,2). Essa
distância é devida à sua concepção das duas alianças e à visão da história que dela
decorre:
1. Os ancestrais creram, mas não obtiveram a realização da promessa. Deus
previa melhor ainda: o envio de seu Filho, de sorte que os ancestrais não
conheceram a realização antes do autor e de seus destinatários cristãos (11,39-40).
2. À superioridade do Filho sobre os anjos e à da nova aliança sobre sua réplica
(doravante abolida) corresponde a superioridade da salvação anunciada em relação
ao período das testemunhas antigas.

EPÍSTOLA DE TIAGO
Circunstâncias Para Escrita
 Tiago constitui, sob muitos aspectos, um texto único no Novo Testamento. Parece
estar ausente nela qualquer reflexão explícita sobre a cristologia, sobre a paixão, a
morte e a ressurreição de Jesus e sobre o anúncio da salvação. Por essa razão, às
vezes até mesmo se duvidou de sua proveniência cristã.
 A epístola de Tiago lança um olhar abrangente sobre a vida econômica e social que
envolve o cristianismo primitivo. Ela oferece as comunidades cristãs uma lição de
ética social. Sua linguagem não é especulativa; parte de uma observação precisa da
vida cotidiana dos cristãos, mas também do homem do início do império.
 A cultura única e a unidade de língua herdadas do helenismo fazem do mundo
ocidental um grande espaço de prosperidade econômica e de trocas intensivas de
mercadorias, ideias e pessoas.
 Engajadas, material e espiritualmente, na mobilidade de uma sociedade que promete
tanto as ascensões vertiginosas como a miséria, as pessoas cuja existência Tiago
evoca perdem sua identidade e deixam esboroar-se o que constitui o essencial
de sua vida (Tg 4,13-5,6). Enraizado numa espiritualidade veterotestamentária

52
e numa tradição de palavras de Jesus, frequentemente semelhantes às do
Sermão da Montanha (Mt 5-7).
 Tiago opõe à ideologia dominante uma ética da pobreza; a quem a ela aderir ele
promete não somente a salvação escatológica (1,21; 2,14; 4,12.15; 5,20), mas o
lucro da vida e da felicidade presente.

Destinatários
O endereço designa os destinatários como as "doze tribos": os leitores aos quais se dirige a
argumentação não são judeus, mas cristãos. A ausência na epístola de qualquer alusão às
problemáticas próprias do judeucristianismo permite pensar que ela é escrita para pagão-
cristãos ou para comunidades nas quais a origem judaica ou paga não cria mais conflitos
de identidade.
A noção de dispersão na diáspora implica o universalismo da carta. O endereço não constrói um
círculo de destinatários reunidos geograficamente, como o fazem todas as epistolas paulinas ou
a primeira epístola de Pedro, mas implica, ao contrário, sua difusão no mundo pagão.

Data Da Composição
A datação da epístola é sugerido pela argumentação de 2,14-26; essa passagem retoma
tão maciçamente a terminologia das grandes cartas paulinas que é difícil não supor no
autor um conhecimento da epistola aos Romanos e, talvez, da epistola aos Gálatas.
A epístola de Tiago muito provavelmente for redigida, no mínimo, no fim dos anos 50
ou no início dos anos 60.

Intenção Teológica - A Fé E As Obras: Tiago E Paulo


Para Tiago, a fé sem as obras é inútil, vazia, morta (2,18.20.26); ela não pode salvar
(2,14) e, segundo a fórmula provocativa e paradoxal de 2,26, ela é como o corpo sem a
alma. Para entender o sentido da argumentação, é importante observar quais são suas
premissas.

 Fé designa a confiança ativa dos crentes (1,3.6; 2,1.5; 5,15), torna-se em 2,14-26 a
demonstração verbal de uma confissão puramente formal, à qual os próprios demônios
podem se associar (2,19).
 Uma posição que poderia ser estabelecida pelos irmãos entre fé e obras. Essa oposição é
estranha ao pensamento paulino.
 A epístola de Tiago, ao opor justificação "pela fé somente" (2,24) e justificação "pelas
obras" (2,21), se revela como elo indispensável entre a teologia paulina da justiça de Deus
e a doutrina luterana da justificação.

Paulo fala da fé cristã (confiança em Cristo) e obras judaicas (obedecer à lei para se
justificar), ao passo que aqui Tiago trata da fé judaica (monoteísmo puro) e obras
cristãs (boas ações que decorrem da salvação) Bloomberg, (Apud JOACHIM
JEREMIAS p. 568)

Intenção Teológica - O Cristianismo Dos Pobres

53
Não há ortodoxia para a epístola de Tiago; há uma ortopraxia da fé cristã. A linha
de demarcação passa pela escolha existencial e real da pobreza. Não se trata, em Tiago,
de um "pauperismo sentimental" , como é eventualmente o caso na obra lucana, mas de
uma atitude existencial que tem valor de confissão de fé e se exprime na realidade
da prática cotidiana.
Tiago retoma Três ideias de pobreza.
1. Tradição espiritual veterotestamentária e judaica dos "pobres de Deus", que vivem da
mão do Criador.
2. Doutrina dos filósofos cínicos e estoicos, segundo a qual aquele que abandonou tudo
e não tem nada a perder está livre de tudo.
3. Tradição evangélica do ensino de Jesus, que convida a multidão e os discípulos a
segui-lo, abandonando suas posses para entrar na liberdade convivial do Reino.

A injustiça econômica é, de fato, para Tiago, uma consequência da desgraça existencial a que a
riqueza condena (5,1-6). A análise de Tiago é mais de ordem antropológica. A busca da riqueza
é uma procura de instabilidade (1,5-8), porque a posse da riqueza é um bem perecível (1,9-11),
que leva as pessoas a passar ao largo da vida (4,13-17); ao mesmo tempo em que lhes dá a
ilusão da segurança e do conforto, ela os consome e os embota por dentro (5,1-6).
O convite à pobreza é, ao contrário, a oferta evangélica de viver na liberdade que resulta da
confiança na providência de Deus; é ela que dá o fruto precoce e o fruto temporão (5,7-11).
Essa certeza é a força que permite manter sua identidade em face do conformismo social, da
ambição e do arrivismo; ela torna capaz de resistir à fascinação dos poderes do mundo (4,1-
10); ela permite enfrentar fielmente, e na perseverança, a precariedade do real (1,2-4; 5,7-11).

EPÍSTOLAS DE PEDRO
A PRIMEIRA EPÍSTOLA DE PEDRO
Circunstâncias Para Escrita
O vocabulário do estrangeiro, tão característico de 1 Pedro (1,1.17; 2,11), é posto a
serviço de uma espiritualidade do homo viator (homem viajante) a caminho da pátria
verdadeira, a pátria celeste, ou na verdade indica, logo de saída, a dura condição de
pessoas que não se sentem em casa onde habitam?
Conforme 5,12, Pedro escreveu sua carta circular para exortar e para testemunhar. Esses
dois verbos correspondem bem ao conteúdo e à maneira da carta: ela mistura a
exortação ética e a recordação dos grandes eixos do querigma cristão.

Destinatários
As precisões geográficas fornecidas por 1 Pedro 1,1 situamos destinatários nas
províncias romanas (de preferência a regiões não administrativas) que abrangem uma
grande parte da Ásia Menor, (Ásia, Galácia) são terras da missão paulina.

54
A imagem do perfil sócio-religioso dos destinatários estabelecem claramente sua
proveniência pagã, marcada-segundo uma terminologia tradicional por ignorância,
imoralidade e idololatria (1.14.18; 2,25; 4,3 s.; ver 2,10).
Mas certos críticos tendem a admitir que a comunidades a que se dirigia eram mistas
(pagão-cristãs e judeu cristãs);

Local E Data De Composição


Rigorosamente, não há por que empregar aqui a palavra "perseguição" no sentido
preciso que ela assumiu na história do cristianismo, porque as perseguições maciças e
organizadas pelo poder central só começam com Décio, em 240-251.
Entretanto, o termo pode também referir-se a uma ação oficial, mas circunstancial, que
pode chegar até a morte dos cristãos. E manifestamente o caso da repressão de Nero aos
cristãos em 64; simplesmente local, essa perseguição não pode ser usada para datar I
Pedro.

Autoria
Na própria carta, nada confirma diretamente que o apóstolo Pedro seja o autor.
As referências às palavras de Jesus (p. ex. IPd 2.12 // Mt 5,16; 1Pd 3,14 + 4,14 // Mt
5,10-12) não supõem nada mais do O que um contato com a tradição evangélica.
Quanto à forte pretensão do autor de ser "testemunha do sofrimento de Cristo" (IPd 5.1),
ela é expressa mediante uma longa aposição ao sujeito, desprovida de verbo; não
comporta, portanto, referência explicita ao passado e designa, sem dúvida, o testemunho
existencial do confessor mais do que o testemunho ocular daquele que se encontrava lá
na hora certa.

Intenção Teológica
Dirigindo-se a destinatários que sofrem a opressão do meio ambiente em sua vida
cotidiana, o autor os "encoraja" (5,12) ao sublinhar, principalmente, dois pontos: o
sentido do sofrimento e o valor e a dignidade da existência cristã aos olhos de Deus.
Entre os diversos termos que evocam o que os cristãos têm de sofrer em sua
existência, o verbo "sofrer" e o substantivo correspondente "sofrimento" se destacam
nitidamente. O verbo é empregado oito vezes (2.19.20; 3.14.17; 4,16.15.19; 5,10) a que
se junta o emprego do substantivo (5,9). As mesmas palavras designam a paixão e
morte de Cristo, três vezes o substantivo (1,11; 4,13; 5,1), sugere uma ligação entre
Cristo e os crentes. Mas nosso autor não se priva de explicar essa relação.

Intenção Teológica - O Sofrimento De Cristo E Os Crentes


No âmbito de uma grande unidade, ele o faz ao articular o sofrimento nas unidades
menores:
 O sofrimento não merecido deve ser aceito porque essa foi a atitude de Cristo (3,17
s), o que importa é ter a mesma convicção que tinha Cristo para aceitar a
necessidade da passagem pelo sofrimento; sobretudo, e é aqui que Pedro mais se
aproxima de Paulo (FI 3,10)

55
 As provações suportadas são uma "participação" (kotvwéw) nos sofrimentos de
Cristo, e essa via desemboca também na glória (4,13), como no caso de Cristo (4,13;
5,1).
Essa perspectiva escatológica é, aliás, um reconforto que Pedro não hesita em
propor a seus destinatários desde a entrada no assunto (1,3-5.7.9.13) e em
relembrar no fim de sua carta (5,6.10).

Na penosa situação em que se encontram, os cristãos da Ásia Menor devem encontrar


reconforto na consciência de pertencer a um vasto conjunto, mais exatamente, a
uma fraternidade, que é das dimensões do mundo (5,9).
 Mais profundamente, o sofrimento representado pelo fato de ser "sem verdadeira
morada" é neutralizado pela consciência de terem se tornado, pela união com Cristo,
uma morada espiritual, templo e família ao mesmo tempo (2,5).
 À rejeição contrapõe-se uma separação benéfica, à marginalização sofrida no plano social
corresponde antiteticamente a eleição divina, à desonra acarretada pelas calúnias e
injúrias se opõe a participação na glória de Cristo. Seu nome é, sem dúvida, para eles uma
fonte de dificuldades, mas eles o carregam com alegria e orgulho (4.14), porque ele abriga
sua esperança.

SEGUNDA EPÍSTOLA DE PEDRO


Circunstâncias Para Escrita
O autor de I Pedro recomendava a seus leitores que fizessem a apologia de sua fé "com
mansidão e respeito" . Esse não é, manifestamente, o clima da segunda epístola de
Pedro, em que a polêmica assume um tom muito violento.
 Quanto ao fundo, o autor "Simão Pedro (1.1), parece responder a um
questionamento de elementos fundamentais da fé recebida. A contestação, ao
que parece, provém de meios cultos da sociedade helenística;
 O autor, sensível ao choque de culturas, toma emprestado algo de seu vocabulário
(por exemplo, "e conhecimento") e categorias (por exemplo, a "natureza divina)
para responder ao desafio e tentar exprimir a fé tradicional com uma Iinguagem
nova.

Autoria
Usando o nome de "Simão", decalque do nome semítico do personagem (1,1), o autor se
diz Pedro, "o apóstolo de Jesus Cristo" . Com poucas exceções, a crítica moderna não dá
crédito a essa informação; a carta é considerada, quase unanimemente, pseudepigráfica.
O autor real tinha também demonstra:
 Algum conhecimento das ideias e da espiritualidade helenística (uso de
"conhecimento")
 Interesse pelas virtudes gregas, bem como o emprego de um termo técnico dos
mistérios (1,16).
 Certa qualificação para a filosofia popular.

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Destinatários
Os destinatários da carta são "aqueles que receberam, pela justiça de nosso Deus e
Salvador Jesus Cristo, uma fé do mesmo valor que a nossa" (1,1), o que quer dizer: o
conjunto dos cristãos, numa perspectiva decididamente "católica".
 Mas o conhecimento das cartas de Paulo, atribuído indiretamente aos destinatários, e
a referência de 2 Pedro a I Pedro dão a entender que o autor se dirige, de fato, aos
cristãos das terras paulinas (Grécia e Asia Menor).
 Algumas indicações, na verdade muito gerais, levam a pensar que se trata de antigos
pagãos (1.4; 2.18.20).

Local De Composição E Data


O lugar de composição só pode ser determinado por via indireta As opiniões favoráveis
são mais frequentes para Roma ou Alexandria.
 Como a data desses mesmos escritos ainda é discutida, a dependência literária de
nossa carta em relação a Judas e seu conhecimento de 1 Pedro não permitem fixar
uma data muito precisa para 2 Pedro, e não pode ir muito além de 200.
 A referência a "todas as cartas" de Paulo (3,16) dá a entender a existência de uma
coleção já pronta, o que é impensável antes do fim do século 1.
 Propõe-se como data provável os anos 125-130.

Intenção Teológica - Os Falsos Doutores


Em 3,4, o autor reproduz, em estilo direto, o questionamento da parúsia que ele
atribui aos "enganadores" (3,3); para tratar das intenções teológicas do escrito,
convém, portanto, evocar conjuntamente a questão dos opositores. Estes são
qualificados de "falsos doutores" (2,1).
Por falta de indicações mais concretas e porque nosso autor não argumenta, realmente,
com eles, suas teses permanecem inapreensíveis; seu perfil espiritual e seus
pressupostos não podem ser definidos com precisão.
 Por um lado, eles parecem ser animados por concepções de tendência gnóstica:
insistência na realização já plena da salvação e reivindicação de uma liberdade
(2,19) que leva à indiferença no que diz respeito às exigências éticas da fé. Mas isso
não explica tudo.

Intenção Teológica - Os Fundamentos Do Falso Ensino


 Efeitos de uma filosofia popular, marcada sobretudo pelo epicurismo, que
prescindia da transcendência e não se interessava por especulações sobre o além;
 As correntes judaicas próximas dos saduceus, como ilustram, por exemplo, os
termos que o Targum de Gênesis 4,8 põe na boca de Caim: "Não há nem julgamento
nem um outro mundo! Nada de re- compensa para os justos, nem de castigo para os
maus" . Em vez de imaginar um grupo definido de opositores, vindos do exterior
para criar confusão nas comunidades cristãs, devemos contar com objeções
nascidas no interior delas.
Intenção Teológica - Os Falsos Mestres E Negação Da Parusia

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 Os "falsos doutores" negadores da parusia são opostos aos apóstolos cuja
mensagem dizia respeito, precisamente, a "o poder e a parusia [entenda-se: a
manifestação no poder] de nosso Senhor Jesus Cristo" (1,16);
 A transfiguração do Senhor é lida aqui como uma figura antecipada dessa poderosa
parusia final. Longe de aparecer como um traço particular ou mesmo marginal, a
insistência na parusia, com sua dupla dimensão de salvação realizada e de
condenação definitiva, é incontestavelmente o tema teológico central de 2 Pedro; ele
já está presente nas "grandes promessas" de 1,4. Para o autor, negar esse ponto
significa solapar os fundamentos mesmos da teologia.

Intenção Teológica - IMPLICAÇÕES Da Negação Da Parusia


A julgar pelas conexões por ele tecidas, a negação da parusia implica, de fato, uma
desconfiança fundamental de Deus:
 Duvida-se de sua fidelidade;
 Questiona-se sua capacidade de intervir na história do mundo;
 Não se crê mais no poder do juiz (2,10) nem em sua vontade de agir com justiça
(2,5-9);
 A prática do bem perde seu fundamento, e a redenção já realizada por Jesus Cristo
parece ser, ela mesma, esvaziada de sua substância cristológica: a morte é bem
evocada (2,1).

Intenção Teológica - A Soteriologia


A soteriologia encontra uma expressão forte na valorização do título cristológico
"salvador" (1.1.11; 2,20; 3,2.18);
 A unidade do ser e da ação de Cristo e de Deus é marcada de diversos modos, e já
pela atribuição, absolutamente excepcional no Novo Testamento, do título 0eóç a
Cristo (1,1); o "dia de Deus" (3,12) se confunde, muito provavelmente, com "o dia
do Senhor" (3,10);
 O lugar da salvação escatológica é, também aí de maneira inabitual, designado como
reino de Cristo (1,11); a doxologia final também é cristológica.

AS EPÍSTOLAS JOANINAS - O CORPUS JOANINO


A PRIMEIRA EPÍSTOLA DE JOÃO
Características Gerais
O corpus joanino compreende não somente um evangelho, mas ainda três cartas. João é
conhecido e lido na Igreja primitiva, desde a metade do século II. Seu texto é bem
conservado e sua admissão no cânon se efetuou muito rapidamente.
 É difícil discernir uma estrutura clara em 1 João. A hipótese mais
frequentemente sustentada na crítica recente repousa em duas observações:

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1- Convém distinguir o corpo central da carta (1,5-5,12) de seu prólogo (1,1- 4) e
de sua conclusão-epílogo (5.13-21)
2- O corpo central assim delimitado pode ser dividido em três partes principais:
A primeira parte (1,5-2,17) mostra que comunhão com Deus e conhecimento de
Deus só se tornam realidade autêntica no amor ao irmão.
A segunda parte (2.18-3,24) situa o aparecimento dos opositores no contexto da
expectativa do fim e convida os destinatários a permanecer firmes em sua
confissão de fé e na esperança.
A terceira parte (4,1-5,12) estabelece intima ligação entre amor e fé.

Destinatários
1 João é provavelmente dirigida a um grupo de destinatários que adotou o quarto
evangelho como escrito de referência. Mais ainda:
 I João só é plenamente compreensível para os leitores que veem no evangelho
de João o escrito fundador de sua fé. Ao imitar alguns elementos característicos
do evangelho, o autor de I João justifica a ideia de que ele se mantém na esteira
do evangelho, de que reconhece sua autoridade e cultiva sua herança.

Circunstâncias Para Escrita


Um inegável parentesco une I João a João. Essa proximidade não tem nada de
surpreendente, já que tanto João como 1 João emanam de uma mesma escola
teológica e partilham, portanto, a mesma linguagem — uma linguagem muito
original, aliás, no ambiente do cristianismo nascente.
Essa grande afinidade entre os dois escritos suscita a questão do autor: terá sido a
mesma pessoa que escreveu as duas obras? Ou estamos diante de duas personalidades
distintas?
A crise das Igrejas joaninas
Se a maior prudência é recomendável quando se trata de reconstituir a situação histórica
na qual foi escrita uma carta pertencente ao Novo Testamento, nem por isso deixa de
ficar claro que 1 João se faz eco de um conflito que assolou as comunidades
joaninas.

Quais são os dados da carta que sustentam a hipótese de uma crise?


Precisamos analisar 1 João 2,18. Essa passagem fala de dois grupos em conflito no
cristianismo joanino:
 Um lado, o círculo do qual I João se faz porta-voz;
 Outro lado, um círculo acusado de ter abandonado a fé autêntica e rompido a
unidade eclesial.
Não é mais possível saber quem tomou a iniciativa da ruptura, nem que relação de
forças prevalece entre os dois grupos. O que é claro, em compensação, é que a
pertença a um ou outro grupo se decide com base no conteúdo da confissão de fé à
qual se adere (cf. 4,2 s.). A retidão da confissão de fé se torna o critério da
autenticidade da fé.

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A Confissão De Fé Ortodoxa
1 João é um dos primeiros testemunhos do nascimento da noção de ortodoxia.
Em I João, o que distingue a confissão de fé "ortodoxa" da do opositores? A questão é
de natureza cristológica: a significação exata da encarnação e da pessoa do Jesus
terrestre.

ESCOLA JOANINA  importância decisiva da encarnação e o fato de que o


Cristo de Deus é indissociável do homem Jesus.

OS OPOSITORES  Cristo enviado por Deus DIFERENTE do homem Jesus.


Segundo eles, o enviado do Pai teria feito sua morada na pessoa de Jesus, no batismo, e
o teria abandonado desde antes da cruz (cf. 5,6). A pessoa do homem Jesus teria sido
o mero veículo da revelação do Filho de Deus, só ela decisiva, assim sua morte na
cruz não teriam nenhuma importância soteriológica (1,7: 2.1: 4,10: 5,6).

O Conflito Cristológico
Esse conflito cristológico parece ser a questão central.
 O direito de pensar que os opositores se prevaleciam da presença do Espírito,
conferido no batismo (2,27), para pretender ter um pleno conhecimento de Deus e
uma plena comunhão com ele.
 Essa certeza da inabitação do Espírito lhes dava a convicção de estar sem pecado
(1,8.10; 3.4-6);
 Para eles, o universo da carne - e, com isso, o lugar da ética - tinha perdido qualquer
importância, e tinham se tornado seus próprios profetas e mestres (4.1.5.6).

Intenção Teológica - Uma Confissão De Fé


A concepção teológica desenvolvida em I João tem objetivo explicitar e esclarecer
certos aspectos da tradição joanina e resolver um conflito de interpretação. Nesse
sentido, I João opera o reenquadramento "ortodoxo" da teologia.
Fórmulas Joaninas utilizadas:
 Invocação da origem fundadora: trata-se de relembrar o sentido que tinha tradição
"no princípio" (1.1; 2,7.13.14.24; 3.11).
 Oposição entre concepção justa e falsa permite precisar a correta interpretação da fé.
 Expressão "nisto sabemos que" (2,3.5; 3.16.19; 4.2.13; 5,2), traduz a firme intenção
de formular com exatidão a importância da fé
 Fórmula "aquele que diz" (p. ex. 4,2 s.): uma tese teológica se encontra assim citada
para imediatamente, ser sublinhada a sua conformidade ou mostrado seu erro

Elementos Da Confissão De Fé Comunitária


Concerne À Cristologia: O Cristo não é outra pessoa diferente do homem Jesus (2,22;
5.1.15). sua morte se reveste de uma significação decisiva: é o lugar onde se manifesta a
salvação. A reaparição de fórmulas expiatórias sublinha esse aspecto (1,7; 2,2; 4,10;
5,6).

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Concerne à ética: Os opositores parecem ter pretensão à impecabilidade (1,6.8.10) e
negligenciado ética (2,3 s.). Assim como o Cristo cumpriu sua missão, acontece com os
crentes: sua impecabilidade não é um estado, mas uma vocação que a eles cabe
concretizar na fidelidade e, particularmente, no amor ao irmão (3.23 s.; 5.2 s.). A fé
desconectada do amor é uma ilusão.

Concerne À Escatologia: O autor de 1 João está como o evangelho e como os


opositores convencido de que a salvação se manifestou plenamente no presente
(escatologia presenteista). Mas sua insistência em apresentar a crise que afeta sua Igreja
(2,18.22: 4,1), sua referência à parusia futura do Cristo (2,28; 3,2; 4,17) , enfim, sua
acentuação da escatologia tradicional objetivam sublinhar a importância da história
como espaço de vida e de fidelidade.

Concerne Ao Papel Do Espírito: O conhecimento que salva não é fruto único da


experiência imediata do Espírito, mas deve estar de acordo com a tradição transmitida e
interpretada na escola joanina (4,2 s.); ele também não deve pôr em perigo a comunhão
eclesial.

SEGUNDA E TERCEIRA EPÍSTOLAS DE JOÃO

Características
 A existência e a leitura de 2 João e 3 João só tardiamente são atestadas na Igreja
antiga. Sua admissão no cânon gerou controvérsia.
 2 João e 3 João são escritos extremamente breves. Trata-se de verdadeiras cartas.
 2 João é uma carta parenética dirigida a uma comunidade. Após uma breve
recordação da fé joanina, o Ancião formula uma advertência contra os heréticos.
Ele ordena, em seguida, que se recuse entrada na comunidade aos enviados
itinerantes que não partilhem sua concepção teológica.

Autoria
O autor não é designado por seu nome, mas, o autor se nomeia "o Ancião", um titulo.
 A pessoa do "Ancião" deve ser considerada uma terceira figura eminente da
escola joanina.
 Essa figura tem grande autoridade, pois ela se considera legitimada para se dirigir
às Igrejas joaninas e doutriná-las, 2 João e 3 João são de sua lavra e constituem
um bom exemplo de sua atividade pastoral.
 Este título "Ancião" pode ser considerada a marca do respeito de que goza essa
figura nas comunidades joaninas. A identificação, frequentemente proposta, do
Ancião com o presbítero João permanece pura conjectura.

Local E Datação De Composição


 2 João e 3 João são, provavelmente, o último estágio da produção da escola
joanina de nosso conhecimento.
61
 Essas cartas são também oriundas da Asia Menor, talvez de Efeso, e foram
redigidas por volta de 110.
 2 João e 3 João se inscrevem no contexto da crise descrita em 1 João.
 2 João se situa, entretanto, depois de 1 João (2Jo.5-7 retoma IJo 2,7 s. 18 s.; 4,1
s.). Não é mais possível saber se 3 João foi escrita antes ou depois de 2 João

A Relação De 2 E 3 João Com 1 João


Os dois temas principais de 1 João, a saber, a explosão de uma crise no seio das Igrejas
joaninas e a exortação a amar o irmão, reaparecem em 2 e 3 João.
 Enquanto 1 João é uma carta destinada a defender a autêntica interpretação da
tradição joanina, 2 e 3 João tratam de questões de política eclesial.
 Em seu primeiro Escrito João utiliza uma argumentação teológica substancial, 2
e 3 João recorrem a argumentos formais e institucionais

A Problemática De 2 João
 Provavelmente dirigida a uma Igreja distante da comunidade de Éfeso, talvez a uma
Igreja doméstica. Essa comunidade local não foi ainda tocada pela crise
denunciada em I João.
 Pregadores itinerantes, oriundos do campo dos opositores denunciados em 1 João
(cf. 2 Jo 7), estão a carinho.
 Invocando a fé tradicional, ele convida os destinatários a recusar todo contato
com os representantes de uma leitura "desencarnada" da tradição joanina, com
a intenção de impedir toda propagação do que julga ser uma heresia. À
argumentação teológica sucede o gesto disciplinar.

É totalmente diferente a situação refletida por 3 João.

 A despeito de um pedido expresso formulado pelo Ancião, o dirigente de uma


Igreja local, Diótrefes, recusa-se a dar acolhida aos pregadores itinerantes
próximos da escola joanina. E ameaça com as mais severas sanções os
membros de sua comunidade que infringirem essa ordem.
 O Ancião também é vítima da crítica de Diótrefes. Ele se vê, então, obrigado a
se dirigir a uma pessoa particular, Gaio, membro de uma Igreja vizinha (?),
para providenciar acolhida para os missionários itinerantes e, mais
particularmente, para um chamado Demétrio. Como interpretar esse conflito.

O Ancião E Diótrefes
A disputa entre o Ancião e Diótrefes não é de natureza doutrinal.
 3 João não acusa Diótrefes de heresia em matéria cristológica, mas denuncia seu
gosto pelo poder, seu menosprezo pelo ancião e sua recusa a acolher os missionários
itinerantes, particularmente os da escola joanina.
 Mais fundamentalmente, o conflito entre o Ancião e Diótrefes anuncia a maneira
de dizer a verdade de fé nas Igrejas joaninas.
 À escola joanina, que privilegia a ação do Espírito, conferido a todos os crentes (1
Jo 3,10-24) e intérprete vivo da tradição, se opõe, doravante, a autoridade do

62
dirigente que guia sua comunidade, afastando-a das influências exteriores,
especialmente das ameaças de cisma.

EPÍSTOLA DE JUDAS
Circunstâncias Para Escrita
A carta de Judas é o escrito do Novo Testamento mais negligenciado pela pesquisa:
pode-se supor que ela não prenda muito a atenção na leitura individual.
 Por causa da abundância de elementos bíblicos em Judas, há alguma razão de
aproximar o escrito do comentário bíblico.
 "vos escrever" (v.3) confirma, no entanto, a indicação fornecida pelos versículos 1-
2: o gênero literário é o da carta.
 O autor, por assim dizer, mudou de assunto no meio do caminho 9.3-4): ele queria
escrever a seus correspondentes a propósito de "nossa salvação comum" , mas a
urgência leva-o a reagir à situação criada nas comunidades por agitadores.

Composição
 A integridade de Judas não é questionada. A hipótese do caráter secundário do
contexto epistolar não conseguiu se impor, e a unidade do escrito é comumente
admitida.
 Para Judas 5-7, a fonte é o Antigo Testamento: o pecado dos anjos (Gn 6) e o
crime de Sodoma e Gomorra (Gn 18) são facilmente reconheciveis, o castigo do
povo infiel, depois da saída do Egito (Jd 5), evoca, sem dúvida, os acontecimentos
de Números 14.

Uma Leitura Do Antigo Testamento À Luz Da Tradição Judaica


a) a tradição judaica manifestava um vivo interesse pelos julgamentos exemplares, entre
os quais figuravam precisamente Sodoma e o dilúvio;
b) A leitura de l Enoque 6-19 é indispensável para a compreensão do texto de Judas;
c) a tradição judaica também oferece um esclarecimento precioso para o retrato dos
indivíduos evocados em Judas II, particularmente para Balaão, que se tornou o tipo do
profeta venal;
d) nosso autor, caso único no Novo Testamento, chega até a propor (Jd 14) uma citação
formal de / Henoc 1,9. Deve-se, pelo menos, reter que Judas se inspira em especulações
apocalípticas do judaísmo antigo.

O Autor E Data Da Composição


 O autor de nossa epístola se apresenta, portanto, implicitamente como irmão de
Jesus.
 Boas razões para confiar nele são seu conhecimento global da tradição bíblica e
judaica, sua familiaridade com a Biblia hebraica e até com a versão aramaica de 1
Enoque;
 A data de composição mais provável situa-se entre 80 e 100.

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Destinatários E Os Opositores
 Nossa epístola não oferece nenhum dado concreto que permita identificar os
destinatários e situá-los no espaço
 A maneira que o autor se refere à história bíblica e a suas releituras bíblicas leva a
pensar que os leitores se sentem em casa nessa tradição e a identificá-los como
judeu-cristãos, mas também a comunidades mistas, e se fossemos nos arriscar a
indicar um lugar ele seria a Ásia Menor.
A crítica mais fundamentada aos opositores diz respeito às deficiências morais dos
adversários:
1- não dão frutos (v. 12)
2- deixam-se guiar por suas paixões (vv. 16.18)
3- vivem uma sexualidade desenfreada (vv. 7 s.10).
Estes, de certa forma, ameaçavam, seduzir os cristãos de origem pagā na comunidade.

Intenção Teológica – Escatologia


Qual é, então, a fé na qual e pela qual os destinatários devem se engajar firmemente?
Os dissidentes parecem ter posto em dúvida a importância do futuro na
soteriologia; teriam negado, particularmente, o julgamento e contestado a fé
tradicional na parusia de Cristo.

Sem dúvida, em reação à posição dos adversários que insistem no presente e


desvalorizam o futuro, nosso autor compartilha a discrição escatológica de Paulo.
Schlosser, p. 565

Intenção Teológica – Soteriologia


 Nota-se de maneira repetida no escrito a associação de Jesus Cristo e Deus Pai na
obra salvifica (vv. Ib 4cd; 21)
 O Espírito Santo aparece numa fórmula ternária digna de interesse (v. 20 s.).
 Diferentemente do que se constata em 2 Pedro, o próprio Cristo não recebe os
títulos de Deus e salvador; eles permanecem reservados a Deus (v. 25), a quem é
dirigida a doxologia final.

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UNIDADE 5 – APOCALIPSE
GÊNERO APOCALÍPTICO E PRINCÍPIOS HERMENÊUTICOS

O Surgimento dessa Literatura


• A literatura apocalíptica abrange, primeiramente, os scritos judaicos e cristãos
compreendidos entre 250 a.C. e 100 d.C., época em que esse tipo de literatura floresceu
abundantemente, embora traços dela possam ser encontrados em escritos anteriores e
posteriores.
• O Interesse pela Literatura apocalíptica Cresce nos momentos de crise.

“Em linha geral, essa literatura inclui conflito, escatologia e universalismo. A história
humana e a cósmica pertencem conjuntamente a um desdobramento do grande e
dramático conflito entre Reino de Deus e Reino de Satanás. A era do conflito será
difícil e amarga, mas se encerrará brevemente. O triunfo de Deus está assegurado, e
junto com ele o triunfo de seu povo. Essa vitória se alcançará não por desenvolvimento
natural, mas por revolução ou, preferivelmente, por uma intervenção catastrófica e
sobrenatural. O próprio Deus dominará sobre a história em um ato poderoso de
julgamento e estabelecerá seu reino. Essa noção de final da história é um tema
constantemente repetido nessa literatura, e é esse fim que dá sentido ao presente e ao
passado; e, também nele, todas as coisas, na Terra e no Céu, receberão sua
recompensa merecida.”

GÊNERO APOCALÍPTICO E PRINCÍPIOS HERMENÊUTICOS


 Inicialmente, faz-se necessário afirma o desafio de compreender um gênero literário
puramente apocalíptico.
 Há claras modificações e acréscimos de outros gêneros literários presentes na
literatura apocalíptica. Seja Gênero (Todo livro) Ou forma (pequenas parcelas)
Veremos alguns elementos quanto a forma do gênero apocalítico, as características
formais dizem a respeito do propósito explícito em cada parte integrante do todo

Gênero Apocalíptico - Elementos Formais


1- Comunicação Reveladora: A comunicação reveladora está presente na maioria
dos escritos apocalípticos. Com exceção de Mt24; 2T 2;2 Pe 3. que empregam o
estilo e tema apocalíptico. Exemplos No A.T. Zacarias 1-6; Is 6; Ez 2; Amós 7.
2- Mediação Angelical: As revelações divinas vêm por meio da visão, mediação
angelical ou em tábuas celestiais, e revelam as verdades a muito tempo ocultas,
relacionando-as ao passado, presente e futuro, até os últimos dias. Ez. 40:
Convite para um passeio; Zc 1; Ap 10,11-1,2; Dn 7-8,Anjo interpreta visão ou
sonho; Esta participação angelical comunica ideia de unidade.
3- Ciclo de discursos: O Escritor apocalíptico conduz o leitor por uma fase de
demonstrações e realidades seguidas, ressaltando o progresso da mudança do
cosmo efetuada em 1/3 , 1/4 e até alcançar todo o mundo. Sempre conduzindo a
seguinte conclusão: “o controle soberano de Deus sobre a história. ”

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4- Discurso ético: Há constantes pronunciamentos éticos, mas eles são mais
positivos, chamando o povo de Deus para resistência e para a vida justa à luz das
visões. Sendo o apocalipse um literatura inicialmente de encorajamento a
resistência e perseverança, entretanto, faz-se necessário a sua perspectiva
presente dos vencedores terem um padrão correto de conduta. Ap16.15;22,7
5- Simbolismo Esotérico: Há diversidade de símbolos grotescos. Sendo retirados
do mundo da fantasia e do mito, como bestas de muitas cabeças, dragões,
gafanhotos com rabos de escorpiões. Assim, isto tornou-se um modo
convencional de comunicar as verdades, Exemplo: Animais representando
Homens, Sinais cósmicos nos lugar de fenômenos sobrenaturais e números
significando o controle de Deus sobre a História.
O significado da numerologia é particularmente notável.
Números: 3,4,7,10,12 e 70.
O Número 666 Ap. 13.18. Como desvendar estas informações?
6- Relato Histórico: A Literatura apocalíptica constrói uma percepção no seu
leitor da realidade soberana de Deus sobre a história. Ao Refletir sobre o
controle que Deus tem do passado , pede-se a Israel ou a igreja para confiar nele
no presente. Dn 2; 7—12- União da história passada com realidade futuras que
explicam aos problemas
7- Pseudonímias: Os escritos apocalípticos intertestamentários e os que pertencem
a Cânon são postos em dúvidas quanto a sua autoria. Isto advém de uma prática
comum no passado da produção literária Judaica. Os escritores com objetivo
religioso de ressaltar a revelação do escritos, expunham o mesmo a autoridade
um herói da fé. Exemplos: Enoque (1Enoque), Moisés (Assunção de Moisés),
Esdras (4Esdras) e Baruque ( 3 e 4 Baruque)

Gênero Apocalíptico – Características


1- Pessimismo quanto à era presente: Os Escritores apocalípticos tem uma
percepção pessimista da era presente, de modo que não acreditam em aspectos
de restauração por parte da humanidade. Apresentam o quadro da história como
irreversível, não podendo voltar a trás. Sendo que um filho de Deus somente
pode esperar uma intervenção divina.

A Sitz im leben (expressão alemã utilizada no contexto da exegese, significa a trama


Linguística-contexto-cultural que envolve o texto) do gênero apocalíptico acredita-
se que desenvolveu-se em uma realidade de crise da nação de Israel ou da igreja.

2- Promessa da restauração: Ao Longo das visões de Daniel e apocalipse esta


característica torna-se normativa, de modo que o tema da restituição é destacado
em cada parte. Ap 6. 9-11; Ap 8.3-5

3- Uma visão da realidade transcendente centrada na presença e no controle


de Deus: Os escritores apocalípticos centralizam suas ações e crenças em duas
bases.

66
O controle e presença de Deus são traduzidos:
1- A Mediação por um ser divino;
2- A comunicação transcendente com um eixo temporal (por vir)
3- Eixo espacial (A Nova ordem a ser estabelecida por Deus na Terra).
Expectativas apocalípticas: A) Catástrofes cósmicas, colocando fim ao pecado e
a desordem; B) intervenção divina por meio de Deus ou de uma figura
messiânica; C) Julgamento associado ao Castigo; D)Punição do mal; E) salvação
daquele

4- Determinismo, Deus controla toda a História: Na verdade um livro de gênero


apocalíptico poderia ser rotulado, como revelação da história futura preordenada
por Deus. A visão da predestinação da história, demonstra o controle divino.
Assim o conteúdo da mensagem traz um conforto aos seus leitores que notam o
triunfo do bem.
5- Dualismo modificado: Esta perspectiva contempla duas realidades, a era
presente e a era por vir. Em o presente momento há uma batalha incessante entre
o bem e o mal (Deus e Satanás), em a era vindoura haverá o triunfo do bem
sobre o mal, assim constituindo uma nova ordem. Para o apocalipse a batalha já
foi vencida na Cruz Ap.5.5-6
Outros tipos:
Dualismo ético (Bem vs. Mal)
Psicológicos (Duas forças lutando em um indivíduo)

Gênero Apocalíptico - Os Símbolos Apocalípticos


A Interpretação Dos Símbolos: Os símbolos são frutos do imaginário coletivo
dos tempos antigos. Para compreende-los faz-se necessário observar o contexto
maior da representação do símbolo. Isto é, o conceito aplicado na realidade
passada, no caso do Ap. a linguagem precisa ser vista dentro da perspectiva do
primeiro séc. da era Cristã.
Ex. O “666” não pode ser decodificado à luz do nosso tempo, concedendo um
nome ao Possível anticristo.
Os símbolos esotéricos frequentemente conduzem o Leitor ao significado
teológico dos termos implícitos, regados de um contudo obscuro.

1- Símbolos milagrosos Externos - (A sarça ardente, coluna de nuvem e fogo,


a ascensão.)
2- Visões - (as oliveiras em Zacarias 4, o lençol cheio de animais em Atos 10,
As visões do apocalipse).
3- Símbolos materiais - (Sangue = vida; o querubim no trono de misericórdia
= santidade de Deus; a videira e os ramos = o poder sustentador de Deus).
4- Os números emblemáticos - sete e doze no AP; os nomes, os filhos de
Isaías Is.7.3- 8.3; Joias, as doze pedras fundamentais do muro da nova
Jerusalém em Apocalipse 21; os metais, a lista hierárquica do ouro ao ferro e
o barro em Dn 2.

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5- Ações emblemáticas - Ezequiel e João comendo o Rolo, Ez. 2 e Ap.10.
Ágabo amarrando a si Mesmo com um sinto em Atos 21.
6- Rituais emblemáticos - As festas judaicas celebrando a colheita ou o
Êxodo, a circuncisão como sinal da aliança, a eucaristia como celebração da
morte de Jesus.

Princípios Hermenêuticos - Abordagem Canônica


1- Observe o Tipo de Literatura.
Diferença entre literatura profética e apocalíptica. Segundo Ladd os livros canônicos são
profético-apocalípticos, pois não há existente algum que seja plenamente apocalíptico.
 Faz-se necessário o trabalho por meio da análise comparativa, considerando os
contextos. Ex: Zc. 1-6 Apocalíptico, 7-14 Apresenta-se como profético. Daniel uma
mistura dos dois.
 O Ap. De João pode ser considerado uma mistura de três Gêneros: Profético,
apocalíptico e epistolar
Isso torna o Apocalipse uma literatura desafiadora a compreensão. Há
desenvolvimentos conjuntos entre o futuro e o presente.

2- Observe a Perspectiva da passagem.


A observação dos aspectos enfatizados, e de forma específica, o padrão pelo qual eles se
desenvolvem. Ex: Ez 38-39 - Gogue e Magogue, segue o padrão comum:
 Narra os pecados do mau
 Uma catástrofe cósmica Ez: 38. 19-20,22
 Manifesta publicamente o julgamento do mal Ez. 38.23; 39.7,21-23
 Destruição total, Ez:39. 9-20,
 Engrandece o nome santo de Deus 39. 7,22
 Demonstrar a iniquidade de Israel
 Restabelece o remanescente. 39.25-29

3- Observe a estrutura da passagem ou do Livro


Os conteúdos apocalípticos dos livros, segundo Osborne, não são compilações sem
unidade temática e teológica. Na verdade, a abordagem canônica considera as visões, os
discursos, entre outros, como parte do mesmo desenvolvimento estrutural. As visões de
Zacarias 1-6 Fornecem uma reinterpretação escatológica do retorno do exílio, rumo à
libertação última no fim dos tempos.

4- Observe a função e o significado do símbolo


A função e o significado do símbolo precisam ser interpretados dentro do seu contexto
histórico.
Pano Fundo de Ap. 13.14-15
 Uma estátua do imperador romano (Tito ou Domiciniano), em Éfeso, com Sete metros de
altura.
 O Símbolo pode ser interpretado no contexto imediato ou em outra parte do livro.
 Sentido Sincrônico - Símbolos na literatura do mesmo período;

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 Sentido Diacrônico - o uso dos símbolos no passado.

5- Afirmando o teológico, e observando com cuidado a predição


Para Osborne, O gênero apocalíptico não está interessado prioritariamente no futuro,
especificando de forma linear os acontecimentos. Mas sua prioridade está no sentido
teológico presente, pois este será usado para edificar e encorajar a igreja, na
perspectiva do controle e soberania de Deus na história.
 As profecias também pertencem a esta literatura, entretanto, são fatores secundários
e não prioritários.
 A dificuldade está na compreensão dos símbolos, que neste caso comtemplam
fatores históricos circunstâncias. Sendo readaptado a cada realidade presente do
povo de Deus.

A EPÍSTOLA DE APOCALIPSE
Estrutura, composição literária, conteúdo histórico, panorama teológico, panorama
hermenêutico e intenção teológica.

Estrutura
Torna-se nítida por parte dos autores e pesquisadores do N.T. que o apocalipse de João,
contém um desafio de identificar, de modo claro e objetivo, a estrutura bem
elaborada e organizada do seu texto. Assim, alguns formam uma simples estrutura
baseada em três visões. Estas articulam a compreensão temática do livro, facilitando
sua interpretação em alguns pontos.
A Estrutura aqui proposta, visa apenas um referencial, compreendendo que há outras
propostas estruturais.

Visão Inaugural E As Cartas Às Igrejas 1.4; 3.22


Primeira Série De Visões: O Cosmos E A Criação. 4.1;11.19
A Segunda Série De Visões: A História Da Humanidade. 12.1;22.5

Estrutura - Fontes Originais


A principal fonte de inspiração do apocalipse é o A.T., ao qual se faz alusão, direta ou
indiretamente, mas de quinhentas vezes. (Ezequiel, Isaías, Daniel, Jeremias e alguns
Salmos).
Fontes secundárias são as tradições orais da igreja primitiva. Doxologias 1.6; as
Aclamações 4.11; orações de ações de graças 11.17; as lamentações de mártires 6,10;
Hinos de louvor 12,10.

Estrutura – Simbolismo
Devido a presença ampla do simbolismo no livro do Apocalipse, torna-se impraticável a
interpretação literal.
O Fim perseguido pelo autor não é a descrição de um desenvolvimento cronológico dos
acontecimentos.

69
Mas fundamentalmente ele anuncia, na história dos homens a história de Deus e de
Seu Cristo sobre o mal e sobre Satanás.
 Cordeiro contra besta Cristo
 Contra satanás Grande;
 Prostituta/Babilônia - Roma e o sistema;
 Anticristo contra a Esposa – Igreja;
 O dragão e a serpente - alusão ao texto das origens Gênesis;
 A trindade diabólica - dragão, besta e o Falso profeta;
 O mar é símbolo do mal
 Israel é um povo camponês, não haverá mar na nova Jerusalém - Do mar vem os invasores,
no mar reside a besta, O Abismo.
 Ao contrário o céu onde Deus reside;
 Quanto a terra é lugar onde se defronta no horizonte o céu e o mar, Deus e Satanás.

CONTEÚDO HISTÓRICO - PROPOSTA DE RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA


1- Nenhuma perseguição sistemática contra os cristão é atestada sob o reinado
de Domiciniano.
Os Especialistas em império Romano, reexaminando os testemunhos dos historiadores
do séc II, evidenciam os seguintes pontos.
A) o reinado de Domiciniano é marcado por um absolutismo caracterizado
particularmente pela incrementação do culto imperial.
B) Esse absolutismo provoca a oposição dos intelectuais e senadores, com os quais
começará no final do seu reinado a prova de força: perseguição sangrenta, expulsão de
filósofos de Roma e da Itália.
C) Tanto no plano da administração como nos planos militar e econômico, seu reinado é
marcado pela continuidade, isto é, pela consolidação da instabilidade, da Pax Romana.

2- Sobre a Questão das perseguições, o próprio apocalipse leva a fazer duas


observações:
A) Se a presença de João em patmos for considerada o resultado de um exílio
forçado, então a perseguição que ele sofreu está ligada a prática, corrente sob
domiciniano, que consiste em afastar dos centros políticos as personalidades
cujas palavras podem parecer incômodas. Isto prova que Jão é um personagem
importante e, sem dúvida, relativamente conhecido da administração Romana da
Ásia menor. Isto não demonstra um perseguição sistemática contra os
cristãos.
B) O João de Patmos não parece ser capaz de mencionar outro nome de mártir além
do de Antipas 2.13. As alusões aos mártires não parecem se referir ao presente
dos ouvintes de João.

3. O culto imperial se apoia numa certa piedade popular cuja a importância


religiosa não deve se superestimar.

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Ele é antes de tudo e principalmente um fator de estabilidade social e política. As
afirmações sobre a divindade do imperador não têm, aliás o sentido teológico forte que
os cristãos judeus terão tendência a lhe atribuir.
O recurso a palavra “deus” denota apenas que uma ação, uma conduta humana
Excepcional manifestam uma inspiração um impulso extraordinário e sobrenatural.
Parece, realmente, que a administração romana limitava suas exigências ao
cumprimento de determinadas ações ligadas ao culto imperial. De seu ponto de vista,
tais imperativos não podiam afetar a convicção religiosa de ninguém.

4- A atitude apocalíptica, muito crítica em face do sistema imperial, não é a


única voz que o novo testamento faz ouvir.
As Epístolas pastorais, escritas na mesma época e no mesmo espaço geográfico, fazem
apologia de uma integração das comunidades cristãs na sociedade romana.
Essas posições diferentes mostram que as comunidades cristãs nascentes se viram
confrontadas com a difícil questão da atitude a ser adotada em relação ao poder romano.
Numa situação caracterizada pela precariedade, elas sofriam provavelmente pressões
tanto sociais quanto políticas, e estavam divididas entre um desejo de adaptação e a
preocupação com a fidelidade ao Evangelho que pode levar ao martírio.

5- Enfim, o tom geral da obra deve ser levado em conta. é mais do que um
encorajamento a uma comunidade perseguida:
João de Patmos não cessa de censurar seus ouvintes uma instalação na sociedade da
época. Ao convidar seus ouvintes a olhar de maneira muito crítica a sociedade romana e
o poder imperial, João de Patmos toma em sentido contrário a própria vida das
comunidades, tal como a carta às igrejas permitem reconstruir. O Apocalipse de João é
uma tentativa de responder às pressões que sofrem as comunidades cristãs e , ao mesmo
tempo, ao desejo que elas têm de se conformar às práticas sociais tradicionais nas
províncias romanas da Ásia Menor.

PANORAMA TEOLÓGICO
Fundamento Apocalíptico e Cristológico
O Fim Do Mundo Antigo  A Vinda De Um Mundo Novo Inaugurado No Advento Pascal
 A Dimensão Cristológica é a Chave Para a Compreensão Do Apocalipse

Revelação de Jesus Cristo. Diferente de todos os de literatura apocalíptica  Ap. 5.6


demonstra a proclamação da pascoa como eixo central dos acontecimentos  O eixo
central do ap. não é a segunda vinda, mas sua encarnação já ocorrida. Este acontecimento
muda radicalmente o curso da história e da sentido ao presente e ao futuro.

PANORAMA HERMENÊUTICO
Interpretação Passadista
A) Valoriza apenas a mensagem como produto de uma realidade passada, sem
previsões proféticas. Comtemplou a necessidade do sofrimento das igrejas

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passadas e contemplará a necessidade de resposta ao sofrimento das igrejas
contemporâneas.
B) Produzida na perseguição de Roma a Igreja, simplesmente para fornecer
encorajamento e esperança.

Interpretação Histórica
A) Aborda o apocalipse e suas realidades ao longo da história da Igreja. Os
reformadores contra o papado e toda colisão com o iluminismo etc.
B) A dificuldade deste método compreende-se pela busca na história da Igreja, por
seus fatores e acontecimentos, que não são respondidos de modo ordenado.

Interpretação Simbólica ou Idealista


A) Para este método o livro do apocalipse, comunica símbolos que afirmam realidades
espirituais, não comprometidos em retratar o passado ou o futuro.
B) Os Símbolos são retratados dentro das condições que apresenta-se em cada realidade
nova.

Interpretação Futurista Extrema


A) Fragmenta o Apocalipse em dois períodos distintos, primeiro para Israel e outro para
Igreja. Assim, articula os capítulos ordenados dentro destas duas perspectivas.
B) As sete igrejas representam os sete períodos sucessivos da História da Igreja, o
último é a apostasia, que conduz ao fim de todas as coisas.

Interpretação Futurista moderada


A) Divide os pontos de vista. As sete igrejas são históricas, cuja a mensagem foi real e
destinadas a estas, que existem.
B) Entende que o Apocalipse a partir do Cap. 7 comunica realidade futura com o
desafio de organizar todos os processos.

RESUMO DO QUE VIMOS ATÉ AQUI


O Fundamento Apocalíptico
Teologicamente, a literatura apocalíptica e o movimento que lhe é ligado são
caracterizados pela:
 Convicção de que o mundo antigo chegou ao seu fim e o mundo novo está
prestes a advir. A linha divisória entre os dois é a intervenção escatológica de
Deus, que julgará os ímpios e recompensará seus eleitos, que passaram pela
tribulação dos últimos tempos.
 No contexto específico do Apocalipse de João, a apocalíptica é posta a serviço de
uma convicção: o fim do mundo antigo (aquele no seio do qual vivem João de
Patmos e seus ouvintes) e a vinda de um mundo novo são inaugurados no
acontecimento pascal. Essa convicção constituiu João e os crentes como
testemunhas. A dimensão cristológica é, portanto, uma chave de entrada
privilegiada para compreender o Apocalipse de João.

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O Fundamento Cristológico
Mais do que revelar o futuro ou o fim dos tempos como realidade objetiva, o que o
Apocalipse de João procura é proclamar o advento desse fim dos tempos no
acontecimento Jesus Cristo, com a crítica do mundo presente que isso implica.
 Em Jesus, o Cristo, o "Cordeiro imolado que se encontra no trono" (Ap 5,6), o
crente é convidado a reconhecer aquele que venceu as potências de morte, das quais
Roma
 Para João, o fim dos tempos, compreendido como o fim das potencias, é, sem
dúvida, uma expectativa futura, mas igualmente uma realidade presente na fé. O
eixo central do apocalipse de joão não é, portanto, a volta de cristo, mas sua
encarnação já ocorrida. esse acontecimento muda radicalmente o curso da
história e dá sentido ao presente e ao futuro.

O eixo apocalíptico Não se trata de fixar o olhar no futuro a ponto de esquecer a


realidade do mundo presente mau; trata-se, antes, de estimular a esperança e a
perseverança no presente. Para João, a esperança se ancora nessa certeza: o
mundo antigo mau já está vencido, e Roma não passa de uma potência em
decadência. Cuvillier, p. 439

A Escatologia E O Julgamento
O Apocalipse de João se propõe, contudo, "mostrar o que deve acontecer em breve"
(1.1). Embora a visão de Apocalipse 21-22 marque realmente o coroamento da ação de
Deus, é impossível descobrir um desenvolvimento cronológico coerente na parte central
da narração (Ap 4- 20).
A vitória de Cristo: ela está presente desde o primeiro capítulo, mas se repete ao longo
do livro (no culto celeste, nos capítulos 7.11.12.19 e 20).
A condição da Igreja: ela reina com o Cordeiro e, no entanto deve lutar neste mundo
(1.9; 7; 14; 20).
O julgamento do mundo e é iminente, já se realizou e é futuro (comparar 6 e 7:8-9:18).

A Eclesiologia
O Apocalipse de João é escrito "às Igrejas" (1.11). Ele se apresenta não só como um
texto de encorajamento, mas, em primeiríssimo lugar, como uma interpelação radical
às comunidades cristãs.
 No final do século I, João de Patmos constata que nas comunidades asiáticas a
proclamação do advento do tempo novo dá lugar a uma preocupação de
compromisso.
 O que constitui o sujeito cristão é o testemunho dado ao acontecimento pascal
como contestação do mundo. Essa proclamação institui o crente em ruptura com a
sociedade.

A dimensão cultual do Apocalipse dá a chave: é a comunidade cultual que atualiza e


torna presente ao mundo a vitória do Cordeiro sobre os poderes (cf. Ap 4-5)

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Estudos têm mostrado o enraizamento da escritura de João de Patmos na liturgia da
Igreja antiga:
 Dimensão simbólica, própria da linguagem litúrgica, permite olhar de maneira
diferente a realidade: a liturgia não é desinteresse ou fuga do mundo. Elas
constituem uma linguagem que faz uma ruptura mas assume a história com toda a
sua complexidade (contra uma lógica do puro afastamento).
 A linguagem litúrgica do Apocalipse é uma outra maneira de habitar o mundo.
Trata-se de se manter em um lugar simbólico, que não é geográfico, mas espiritual:
estar no mundo, participando do que não é do mundo, isto é, da liturgia celeste
de adoração do Cordeiro, cuja importância política não deve ser ocultada.

A Crítica Do Político
João de Patmos desenvolve uma leitura crítica da sociedade na qual vive. Em suas
linhas gerais, ela pode ser definida assim:
 No mundo romano, e particularmente na cidade romana, toda a existência humana
se resume à ordem política e econômica imperial. Não é uma ordem forçosamente
persecutória, mas certamente sedutora. Ela convence todos de que não há vida
possível fora dos limites do império e fora das esferas do político e do
econômico, entendidos como englobando a totalidade da existência humana.

João afirma que é possível e necessário habitar o mundo, Roma e o império de uma
outra maneira.
Ele nos convida a habitá-lo como pessoas "de todas as nações, tribos, povos e línguas"
(Ap 7,9) cujo nome só é conhecido daquele que o recebe (2,17) isto é, cuja integridade
está protegida contra os poderes e está inscrito "no livro da vida" (3,5; 13,8; 17,8; 20,15;
21,27).
Indivíduos cuja identidade reside em outro lugar fora da realidade da cidade, do Império
e das hierarquias compartimentadas que isso implica. Esse outro lugar é situado por
João "nos céus", na "Nova Jerusalém" (21.2.10), expressões que não designam
espaços geográficos, mas lugares simbólicos.

O caráter profundamente litúrgico do Apocalipse indica que para João não se trata de
opor um lugar ao outro, mas de afirmar que existe uma linguagem, a da fé, que
permite ao crente habitar a cidade de uma outra maneira.

De tal maneira que "sair" de Babilônia (cf. 17,4) tem uma dimensão antes de tudo e
essencialmente simbólica trata-se, para o crente que habita na cidade (na época, as
comunidades cristãs eram comunidades urbanas), de não se deixar seduzir pelo
discurso ideológico sobre o poder e o sucesso da cidade e, mais ainda, do império.
Trata-se, para as comunidades asiáticas, de viver no coração mesmo das cidades
imperiais sem sucumbir à sedução que o império exerce através delas, sabendo que
a cidade verdadeira está noutro lugar.

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Bibliografia Básica

BLOOMBERG, C. Introdução de Atos a Apocalipse. Vida Nova, São Paulo – SP.


2019.

KÖSTENBERGER, A.J. PATERSON, R.D. Convite a interpretação Bíblica: A


tríade Hermenêutica. Vida Nova, São Paulo – SP. 2015.

MARGUERAT, D. [Org.]. Novo Testamento: História, linguagem e teologia.


Edições Loyola, 3ª Ed., 2015.

SCHREINER, J. Formas e Exigências do Novo Testamento. São Paulo: Editora


Teológica, 2004.

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