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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Reinaldo Augusto de Oliveira Ramos

Material Didático para Desenvolvimento de Jogos Digitais:


Experimento com Kit de Desenvolvimento para Consoles de
Videogame.

Tese de Doutorado
Programa de Pós-Graduação em Tecnologias da Inteligência e Design
Digital

SÃO PAULO
2016
Reinaldo Augusto de Oliveira Ramos

Material Didático para Desenvolvimento de Jogos Digitais:


Experimento com Kit de Desenvolvimento para Consoles de
Videogame.

Doutorado em Tecnologias da Inteligência e Design Digital

Tese de Doutorado apresentada à Banca


Examinadora, exigência parcial para obtenção do
título de Doutor em Tecnologias da Inteligência e
Design Digital pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, sob orientação do Prof. Dr.
Hermes Renato Hildebrand.

2
Banca Examinadora
______________________________
______________________________
______________________________
______________________________
______________________________

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Agradecimentos do aluno bolsista

Agradeço à Fundação São Paulo pela bolsa recebida durante o período


de execução desta pesquisa de doutorado em Tecnologias da Inteligência e
Design Digital, com início em 01/07/2014 e contrato número 1207210. Foi de
fundamental importância durante todo o processo.

4
Agradecimentos

Este trabalho seria impossível sem a ajuda de meus colegas professores,


que, juntos, trabalhamos para ter sempre a melhor universidade. Em especial,
Dr. Hermes Renato Hildebrand, meu orientador, cujas orientações foram únicas
e sempre com bastante aprendizado.

Também agradeço à minha amada esposa Paula Saldanha pelo suporte


incondicional e paciência. Sem sua ajuda este trabalho teria sido mais difícil.

A todos os professores do departamento de computação, especialmente


ao chefe do departamento, Dr. Davi Lemes, e ao Diretor da faculdade, Dr.
Daniel Gatti, por facilitar meus experimentos em sala de aula me dando apoio
incondicional e suporte.

À Edna Conti, secretária do TIDD, por todos os conselhos e auxílio nos


momentos de desencontros acadêmicos.

À Fundação São Paulo por financiar meus estudos através da bolsa


dissídio desta mesma instituição.

Aos colegas do laboratório do TIDD, agradeço por toda comunicação


oferecida e pontos de vista tão singulares, especialmente o Prof. Me. Alexandre
Vieira, Prof. Me. Fábio Musarra, e Prof. Me. Mario Fontes, que foram colegas
de estudo excepcionais e que deram muito apoio.

Enfim, a todos que direta ou indiretamente contribuíram para a


constituição e realização de minha pesquisa: minha gratidão a todos vocês.

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Resumo

Com esta pesquisa pretendeu-se observar o mercado de jogos digitais e


os cursos focados na formação de profissionais para esta área de atuação.
Este trabalho acadêmico buscou revelar os desafios que são encontrados nos
cursos que objetivam promover o ensino e a aprendizagem de produtos
computacionais de entretenimento e que possuem práticas laboratoriais
focadas em aspectos relativos à indústria dos jogos digitais. Esta pesquisa
abordou os cursos técnicos e de graduação de nível tecnólogo, bem como as
pós-graduações e os cursos de extensão universitários, além dos cursos livres
nesta área de atuação.

Pretendeu-se investigar e refletir sobre estratégias de ensino e


aprendizagem e, principalmente, considerar a implementação de ferramentas e
procedimentos práticos, particularmente os DevKits – Kits de Desenvolvimento
de Jogos Digitais –, que visam implementar ambientes colaborativos para
desenvolvimento de jogos eletrônicos digitais e, posteriormente, sua
viabilização comercial. Abordaram-se aspectos educacionais e práticos como
métodos de ensino relacionados à produção dos games e ferramentas que são
utilizadas, bem com plataformas desenvolvimento: DevKit.

Também se pretendeu realizar estudos sobre o domínio tecnológico


envolvendo game engines, além de ferramentas de autoração, de produção de
imagens tridimensionais e de edição gráfica. Por meio de pesquisas
qualitativas e quantitativas secundárias (FEP Games e BNDES) e revisão
bibliográfica, a metodologia empregada avaliou a utilização e integração de
ferramentas alternativas que pudessem ser equiparadas às ferramentas do
mercado de trabalho dos jogos eletrônicos.

Pretendeu-se expandir a base de conhecimento em torno do domínio


tecnológico das mesmas ferramentas, diminuindo, dessa maneira, a
dependência das instituições de ensino e das empresas de jogos no país.
Discutimos questões como: propriedade intelectual, autoria, dispositivos legais,
gerenciamento do desenvolvimento, processos de produção, métodos de
divulgação e disseminação do produto e métodos de avaliação.

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Partiu-se do processo criativo, observaram-se os aspectos relativos ao
design de interação, as questões tecnológicas e compatibilidades sistêmicas,
por fim, discutiram-se questões relativas aos meios de divulgação e distribuição
e, como resultado, propôs-se um método de ensino e aprendizagem para jogos
eletrônicos digitais.

Palavras-chave: Videogame; Material Didático; DevKit; Jogos Digitais.

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Abstract

With this research, we aim to take a look on the digital games market as
well as the courses related to professional training in this industry. This paper
focus on showing the challenges found on courses that target the teaching and
learning of entertainment computational products and that have laboratorial
practices centered on the digital games industry. This research tackles technical
courses, technologist level graduation courses, as well as post-graduations,
university extension courses, and free courses in this area.

We intend to investigate and reflect on the teaching and learning


strategies and, mainly, to consider the implementation of practical tools and
procedures, especially the DevKits – Digital Game Development Kits – that aim
to initiate collaborative environments to develop digital games and,
subsequently, their commercial viability. We touch on educational and practical
aspects as teaching methods related to game production and tools used, as
well as developing platforms: DevKit.

We also intend to undertake studies on the technology domain involving


game engines in addition to authoring, tridimensional images production, and
graphic editorial tools. By means of qualitative and secondary quantitative
researches (FEB Games e BNDES), and bibliographical review, the applied
methodology evaluates the use and integration of alternative tools that can be
matched to the ones used by the electronic game market.We intend,
futhermore, to expand the knowledge base around the technology domain of
said tools, reducing, that way, the educational institutions’ and game
companies’ dependence in this country. We discuss matters such as:
intellectual property, legal mechanisms, developing management, production
processes, advertising and promotion approaches, and evaluation methods. We
depart from the creative process, observe the interaction design related
aspects, the technology issues and systemic compatibilities, and, finally, we
discuss issues related to promotion and distribution. As a result, we suggest a
teaching and learning methodology for digital electronic games.

Keywords: Videogame; Didactic Material; DevKit; Digital Games.

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Sumário

Introdução ....................................................................................................... 12

Os cursos de jogos digitais e a realidade de mercado .................................. 16

As áreas de investigação .............................................................................. 18

O mercado brasileiro e a nossa dependência tecnológica ............................ 19

Papéis na cadeia de produção de jogos ....................................................... 20

Objetivo ......................................................................................................... 24

Objetivos específicos .................................................................................... 24

Estruturação da pesquisa ............................................................................. 26

Capítulo 1 – As Tecnologias Emergentes e os Jogos Digitais ................... 28

1.1. Caminho da indústria brasileira ........................................................... 28

1.2. Domínio tecnológico ............................................................................ 33

1.2.1. Modelagem ................................................................................... 37

1.2.2. Animação ...................................................................................... 37

1.2.3. Texturização ................................................................................. 38

1.2.4. Programação ................................................................................ 39

1.3. Dificuldades e dependência tecnológica ............................................. 46

1.4. Oportunidade tecnológica ................................................................... 50

1.5. Problemática do mercado educacional de jogos ................................. 54

Capítulo 2 – A Indústria de Jogos Digitais ................................................... 56

2.1. A indústria no mundo .......................................................................... 58

2.1.1. Third-party e publishers ................................................................ 58

2.1.2. Produção ou desenvolvedoras ..................................................... 60

2.1.3. Produção e ferramental ................................................................ 60

2.1.4. Hardware ou plataforma ............................................................... 61

9
2.2. Indústria brasileira ............................................................................... 61

2.3. Panorama atual ................................................................................... 64

2.3.1. Casual .......................................................................................... 65

2.3.2. Indies ............................................................................................ 66

2.4. A educação nos cursos de jogos – Histórico no Brasil ........................ 67

2.5. Modelos de educação ......................................................................... 68

2.6. Tecnologias disponíveis para a educação .......................................... 69

2.7. Ambiente de aprendizagem ................................................................ 70

2.8. Hardware de suporte ........................................................................... 73

2.8.1. PlayStation Academic Program .................................................... 76

2.9. Hardware livre ..................................................................................... 77

2.9.1. Hardwares .................................................................................... 78

2.9.2. Single-board computers ................................................................ 79

2.9.3. Arduino ......................................................................................... 79

2.9.4. Raspberry Pi ................................................................................. 81

2.9.5. Odroid ........................................................................................... 82

2.10. A importância do material didático nos sistemas educativos ........... 83

2.10.1. Burocracia da instituição de ensino ........................................... 84

2.10.2. Acesso à máquina e políticas de segurança ............................. 85

2.10.3. Atualização de material ............................................................. 86

2.10.4. Um jogo digital no laboratório de informática ............................ 89

Capítulo 3 – Materiais Didáticos para o Ensino e Aprendizagem de Jogos


Digitais ............................................................................................................ 93

3.1. Abordagem metodológica ................................................................... 95

3.2. Escolha do material ........................................................................... 100

3.3. Componentes do estudo de caso ...................................................... 101

10
3.4. Metodologia para o estudo ................................................................ 107

3.5. Procedimentos experimentais ........................................................... 109

3.6. Análise dos resultados ...................................................................... 117

3.6.1. Quantitativa ................................................................................ 117

3.6.2. Qualitativa ................................................................................... 118

Considerações Finais .................................................................................. 119

A experiência: fatos relevantes ................................................................... 123

Propostas para trabalhos futuros ................................................................ 127

Referências ................................................................................................... 131

Anexos .......................................................................................................... 137

11
Índice de Imagens, Tabelas e Gráficos
Imagens

Figura 01 – Jogo de boxe para o console Atari 2600. ...................................... 35

Figura 02 – Rascunhos de Shigeru Miyamoto durante a criação do personagem


Mario (na época era chamado Jumpman, para o jogo Donkey Kong). ............ 36

Figura 03 - Modelando usando Blender. .......................................................... 38

Figura 04 – Cartucho do Nintendo Entertainment System (NES)..................... 47

Figura 05 - Criadores do jogo Pong para Atari: Ted Dabney, Nolan Bushnell e
Al Acorn. ........................................................................................................... 56

Figura 06 – Pong versão console. .................................................................... 57

Figura 07 – Console Zeebo, da Tectoy. ........................................................... 63

Figura 08 – Um laboratório de aula típico do Senac São Paulo. ...................... 71

Figura 09 – iPhone 5S. ..................................................................................... 72

Figura 10 – Kit de Desenvolvimento do PlayStation 3, DECR-1000A. ............. 76

Figura 11 – Dispositivos Android. ..................................................................... 78

Figura 12 – Uma placa Arduino. ....................................................................... 80

Figura 13 – Console Gamebuino baseado em Arduino. ................................... 80

Figura 14 – Uma placa Raspberry Pi. .............................................................. 81

Figura 15 – Odroid. .......................................................................................... 83

Figura 16 – Compaq 5600s (1999). Sua CPU continha um processador AMD


K6-III 450MHz e na GPU, um Diamond Viper 550, 16MB RAM e 128MB
SDRAM. ........................................................................................................... 87

Figura 17 – Jogo Quake 3 Arena, de 1999. ..................................................... 87

Figura 18 – Dell Alienware Aurora. A CPU leva um processador Intel Core i7-
2600K 3.9GHz. Na GPU, um 2x AMD Radeon HD 6950 com 2GBRam e 4GB
DDR3 SDRAM.................................................................................................. 88

Figura 19 – Jogo Skyrim. ................................................................................. 89

12
Figura 20 – Placa do console Microsoft Xbox 360, composta por uma única
placa com todos os componentes. ................................................................. 102

Figura 21 – Console open-source Ouya. ........................................................ 104

Figura 22 – Processador IBM Cell, presente dentro de uma placa de Sony


Playstation 3. .................................................................................................. 106

Figura 23 – Etapas da metodologia para este estudo. ................................... 108

Figura 24 – Imagem do aplicativo Sonic 4 Episode II, da Sega. .................... 110

Figura 25 – Componente do direcional de um Joystick analógico.................. 113

Figura 26 – Console Ouya, baseado em Android. .......................................... 127

Figura 27 – Imagem da loja exclusiva do Ouya. ............................................. 128

Figura 28 – Compilado de consoles que compartilhavam a plataforma 3DO. 130

Tabelas

Tabela 01 – Plataforma de desenvolvimento de jogos nas indústrias. Percentual


de desenvolvimento atual e nos próximos 24 meses. ...................................... 29

Tabela 02 – Plataforma de desenvolvimento de jogos nas indústrias. Percentual


de desenvolvimento atual e nos próximos 24 meses. ...................................... 30

Tabela 03 – Dados de investimento em mercado de jogos digitais. ................. 53

Tabela 04 – Empresas de jogos por estado brasileiro. .................................... 62

Tabela 05 – Lista de comparação entre single-board computers. .................. 103

Tabela 06 – Lista de comparação entre single-board computers, organizada por


geração do processador, do mais novo ao mais antigo. ................................ 105

Tabela 07 – Critérios de avaliação usados pelos professores durante análise de


banca. ............................................................................................................ 116

13
Gráficos

Gráfico 01 - Previsão do desenvolvimento de jogos digitais, na indústria


brasileira, de 2009 a 2018, para diferentes plataformas. ................................. 31

Gráfico 02 – Projeção de crescimento de lucros dos consoles, 2009 a 2018. . 32

Gráfico 03: Atualizações da engine da Unity. ................................................... 91

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Introdução
A evolução da indústria e do ensino de jogos digitais no Brasil vem
impulsionando a criação e o desenvolvimento de cursos, institutos,
universidades e centros de ensino e pesquisa voltados para a formação de
profissionais nesta área de atuação. Isso tornou-se um fenômeno importante e
com várias consequências no meio acadêmico e, para discutirmos os impactos
industriais, sociais e educacionais nesta área, é preciso levar em conta os
avanços tecnológicos relevantes e as tecnologias disponíveis.

Nossa vivência acadêmica na docência em disciplinas de jogos digitais, a


experiência como desenvolvedor nesse mercado de entretenimento, a atuação
em análises de projetos com esse tema e a participação em bancas de
apresentação de trabalhos de alunos voltados à indústria de jogos digitais
tiveram influência significativa na escolha do tema desta pesquisa.

Essa experiência pessoal, acadêmica e profissional alertou-nos para


alguns problemas e incongruências que encontramos ao longo de nosso
percurso nesta área. A rigor, pretendemos discutir a qualidade do material
didático dos cursos de desenvolvimento de jogos digitais e sua relevância para
o meio industrial e profissional.

Nossas dúvidas giram em torno de três aspectos básicos para a área:

 Como se determinam as questões técnicas relativas às ferramentas e


plataformas de desenvolvimento;

 Como acontece a formação profissional dos alunos que irão atuar


como desenvolvedores neste mercado de trabalho; e

 Qual deve ser a profundidade do conhecimento adquirido durante as


disciplinas dos cursos de jogos digitais.

No que tange as considerações técnicas, nossas questões são:

 Os jogos digitais abordados nos cursos são apresentados da mesma


maneira com que os desenvolvedores profissionais de jogos os
enxergam?

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 O nível técnico dos cursos de jogos digitais é satisfatório? As
disciplinas ministradas atendem à formação de um futuro profissional
em jogos?

 As ferramentas disponíveis no mercado são utilizadas para o ensino e


a aprendizagem? Qual a importância desse aspecto?

 O material didático está de acordo com as ferramentas encontradas


nas empresas de desenvolvimento de jogos digitais?

Em relação à formação profissional, gostaríamos de saber se:

 Os cursos têm formado profissionais competentes para trabalhar no


mercado de jogos digitais com os mais diferentes tipos de jogos e
plataformas?

 Os profissionais formados conseguem atualizar seus conhecimentos


por si só e, com isso, manter sua competência de atuação nessa área
em que os avanços tecnológicos são dinâmicos?

 As pesquisas acadêmicas relativas à área têm produzido efeitos na


indústria e no mercado de desenvolvimento de jogos?

Essas perguntas evidenciam nossas dúvidas e questionamentos relativos


ao estudo que pretendemos realizar com esta pesquisa e a nossa intenção de
demonstrar como se comporta o atual momento da área de educação, ensino e
aprendizagem com jogos digitais e suas relações com esse mercado de
atuação.

Com o intuito de responder a essas questões, realizamos uma pesquisa


de campo com empresas, instituições e profissionais da área de jogos digitais,
além do estudo realizado pela FEP Games (2014). Também desenvolvemos
um experimento prático com alunos do Curso Tecnológico em Jogos Digitais da
PUC-SP.

Os cursos de jogos digitais e a realidade de mercado

O tema “jogo digital, educação e mercado de trabalho” tem provocado


inúmeras discussões em diversas áreas do conhecimento, porém, em nossa

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opinião, tais polêmicas, por vezes, ficam distantes dos professores que atuam
nas salas de aulas e dos planejadores de conteúdos programáticos destes
cursos.

Por ocasião deste estudo, foram feitas visitas e entrevistas a


universidades (SENAC-SP, PUC-SP, FMU e Faculdade Melies de Tecnologia),
empresas de desenvolvimento de jogos (QUByte Interactive, Messier Games &
Animations, Odin Game Studio e Webcore Interactive) e instituições voltadas a
desenvolvedores de games (Abragames e IGDA São Paulo), o que levou à
percepção da necessidade de interação mais profunda dos docentes e
coordenadores de cursos com os empresários e desenvolvedores –
principalmente no que tange a construção e adequação das tecnologias
necessárias ao desenvolvimento de jogos digitais. Vale comentar que a
escolha dessas empresas e instituições foi realizada seguindo critério de
participação assídua no relatório FEP Games (2014) e nos encontros da IGDA
São Paulo.

Este estudo também leva em conta o relatório de 2008 da IGDA, que


serve como guia para cursos relacionados à indústria de jogos (IGDA, 2008).

Portanto, oferecer aos alunos e professores subsídios para um contato


com as tecnologias disponíveis e os desenvolvedores profissionais – tendo em
conta a realidade de mercado –, é também nossa intenção neste trabalho.

Outro fator que influencia nossa pesquisa é a possibilidade de continuar


nossas reflexões e resgatar a temática de estudo que realizamos por ocasião
de nossa Dissertação de Mestrado1, quando estudamos a motivação dos
alunos em um curso de jogos digitais. Naquele trabalho, tratamos das
possibilidades de uso de sistemas informatizados interativos – também
conhecidos como jogos digitais – para o aproveitamento no ensino da lógica
computacional e na construção do raciocínio lógico.

Com a realização desses experimentos e análises em instituições de


ensino da cidade de São Paulo e as nossas experiências em sala de aula,
verificamos a hipótese de que o jogo e suas ferramentas de desenvolvimento

1 RAMOS, Reinaldo Augusto de Oliveira, e Hermes Renato HILDEBRAND. O uso de mídias


interativas na compreensão de conceitos da lógica computacional. Dissertação de Mestrado,
São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP, 2009.

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são recursos metodológicos de ensino e aprendizagem para a construção da
noção de lógica de programação, ao serem utilizados com essa
intencionalidade.

Ao desenvolver aquela metodologia de trabalho em nossa Dissertação de


Mestrado, constatamos alguns resultados importantes em relação ao ensino e
aprendizagem dos alunos, como, por exemplo, que eles demonstram cada vez
mais interesse na matéria quando desenvolvem produtos, no caso, jogos
digitais. Também foi observado que o método utilizado motiva,
espontaneamente, os alunos a continuarem a fazer exercícios para o conteúdo
dado nas disciplinas em outros horários fora da aula e das atividades
propostas.

Com os estímulos observados na pesquisa anterior, verificamos a


necessidade de continuar nossos estudos, visando integrar o processo
acadêmico que desenvolvemos, além de adaptar e facilitar o acesso à
tecnologia de jogos digitais e à indústria, uma vez que não podemos observar
os aspectos lúdicos somente como fator inerente aos jogos, mas também como
fator motivacional e comercial. Esses aspectos devem ser tratados pelos
professores e coordenadores dos cursos de jogos digitais, em consonância
com desenvolvedores e empresários dessa área de atuação.

As áreas de investigação

Além dos assuntos propostos até o momento, também pretendemos tratar


das discussões que visam compreender a prática nas disciplinas de jogos
digitais, principalmente as relativas ao Curso Superior de Graduação de
Tecnologia em Jogos Digitais da PUC-SP – Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo. Para tanto, fizemos análises de como as tecnologias eram
utilizadas e quais ferramentas eram escolhidas pelos cursos semelhantes ao
citado oferecidos em algumas escolas da cidade de São Paulo.

A discussão central estava voltada para a sinalização de um núcleo


comum que buscasse padronizar o uso das tecnologias como catalisador da
aprendizagem como um todo e observar se a direção tomada convergia com o
processo de produção da indústria de jogos digitais. Além disso, pretendíamos

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investigar sobre o material disponível na Internet; nas comunidades existentes
nas redes, que não só ensinavam a desenvolver games, como também
concentram alunos de diversos cursos e formações que compartilhavam
informações sobre jogos digitais.

Embora o acúmulo de informações seja significativo na Internet, hoje, os


estudantes possuem muito mais acesso às informações específicas e de
maneira extremamente rápida do que no passado. Com isso, tentamos traçar
uma linha no tempo e buscar observar a qualidade destes dados, como em
Valente (2002, p. 5), quando afirma que o fato de termos abundância de
informação não significa que as pessoas tenham mais conhecimento.

As informações são formas de armazenamento de dados e o


conhecimento adquirido depende de um processo de cognição e de elaboração
destas informações que, necessariamente, dependem de interações que, só
depois de processada por meio de agentes mediadores (homens e máquinas)
transformam-se em conhecimento. Portanto, é algo muito mais complexo que
simplesmente se obter dados.

O mercado brasileiro e a nossa dependência tecnológica

No Brasil, temos dificuldade para entender o mercado internacional de


jogos digitais, principalmente o desenvolvimento para interfaces de grande
porte. Esse mercado, embora englobe também os jogos de computadores
pessoais, tem nos consoles a base de sua história e sua principal força de
atuação.

O Fundo de Estruturação de Projetos do BNDES (FEP GAMES, 2014)2,


realizou uma pesquisa científica que consolidou as informações acerca da
indústria de games e contribuiu para o desenho de instrumentos e ações de
políticas industriais e tecnológicas para o setor.

No Brasil, a produção de jogos para consoles é praticamente nula:


não existem estúdios dedicados à produção de jogos para consoles
de mesa. Tal situação ocorre desde os primórdios da indústria,

2FEP GAMES. Mapeamento da Indústria Brasileira e Global de Jogos Digitais. São Paulo:
BNDES, 2014. Disponível em http://www.gedigames.com.br/fep-games/. Acessado em
07/11/2015.

19
fazendo com que o Brasil jamais tivesse relevância na produção de
jogos digitais no mercado mundial (FEP GAMES, 2014, p. 65).

O estudo aponta que um dos motivos para a situação de não


desenvolvimento da indústria de jogos digitais no Brasil é a falta de mão de
obra qualificada. Isso, provavelmente, deve-se ao desconhecimento e a falta de
acesso às tecnologias necessárias para o desenvolvimento desse tipo de
produção por parte dos educadores e instituições que atuam nesta área. De
fato, este é um obstáculo que faz com que não consigamos alcançar padrões
de qualidade aceitável e suficiente, que possam refletir nas indústrias de
desenvolvimento de jogos, especialmente para consoles.

Algo que vale a pena ser citado, a partir dos dados do relatório FEP
GAMES, é que a produção de jogos para consoles é dependente de licenças
dos proprietários dos hardwares, o que dificulta a penetração de produtores
nacionais nesse meio. A leitura que podemos fazer é relativa ao domínio
tecnológico e a que distância nossas instituições estão de poder suportar os
meios educacionais para que esses cursos desenvolvam jogos sem depender
das licenças dos proprietários dos hardwares disponíveis no mercado. De fato,
no ambiente de jogos digitais para computadores pessoais (PCs) e para
interfaces móveis, esses aspectos são notados, assim, podemos afirmar que o
domínio tecnológico no Brasil não será completo, pois as ferramentas de
desenvolvimento para essas plataformas são proprietárias, em sua maioria e,
portanto, dificultam a atuação de cursos e possíveis desenvolvedores nesta
área de atuação.

Papéis na cadeia de produção de jogos

Outro aspecto relevante que podemos extrair das informações da


pesquisa FEP Games é o foco dado à cadeia de produção de jogos,
determinado pelas instituições de ensino. No relatório, encontramos um dado
adaptado de Johns (2006, pp. 151-180), que demonstra que os
desenvolvedores de games estão divididos em diversos segmentos baseados
em atores específicos, tais quais:

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 Desenvolvedores: O segmento engloba os programadores e
produtores de jogos, também chamados de game designers, entre
outras áreas relacionadas.

 Arte e Animação: Essa área inclui os criadores de objetos artísticos


computacionais, ilustrações em geral e animações.

 Som e Dublagem: Aqui encontramos os editores de áudio,


compositores, músicos, sonoplastas e engenheiros de som.

 Profissionais de Comunicação: São os que trabalham com relações


públicas, elaboração e execução de estratégias de divulgação, ações
de promoção e merchandising.

É importante ressaltar que os cursos de jogos digitais não focam em uma


área específica de desenvolvimento; portanto, em geral, esses cursos atuam
de forma generalista, buscando dar conhecimento aos alunos de modo que
eles possam atuar em qualquer uma das áreas destacadas acima.

Como visto na descrição de objetivo do curso de pós-graduação do Senac


São Paulo (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial), encontrada no site
da instituição, o foco do curso é:

Capacitar o aluno para programar e produzir games interativos 3D.


Além da programação de games (3D, inteligência artificial, simulação
de física e jogos em rede), o estudante tem contato com modelagem
e animação, game cultura, game design e empreendedorismo,
voltados à produção de games. (SENAC SÃO PAULO, 2015).

Isso também é observado na graduação em Design de Games da


Universidade Anhembi Morumbi, que declara que o curso prepara os
profissionais para planejar e desenvolver:

Projetos e produtos para o segmento de games; Jogos para variadas


plataformas, incluindo PC e web; Produção de vinhetas;
Desenvolvimento de maquetes digitais; Roteiros, personagens e
cenários para games; Projetos relacionados à área de hipermídia e
interfaces digitais; Animação, áudio, programação ou design de
interface para o mercado de produção de jogos eletrônicos.
(UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI, 2015).

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Observamos algo parecido no Curso Superior de Tecnologia em Jogos
Digitais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP, porém se
pode notar uma possível solução diferencial. O curso de graduação oferecido
pela PUC-SP é mais curto e chamado tecnológico, dividido em módulos
temáticos, separados de acordo com os papéis da cadeia de jogos da indústria:

1. Fundamentos - O Módulo dos Fundamentos apresenta as


atividades pedagógicas relacionadas à base necessária e
fundamental de formação humanista geral e específica aos games.
[...]

2. Teoria e Projeto de Games - O Módulo de Teoria e Projeto de


Games apresenta as atividades pedagógicas relacionadas mais
estreitamente às teorias e a metodologia projetual de games. [...]

3. Design, Modelagem e Animação de Games - O Módulo de Design,


Modelagem e Animação de Games apresenta as atividades
pedagógicas relacionadas ao desenho audiovisual e às suas
questões de interface. [...]

4. Autoria e Produção de Games - O módulo de Autoria e Produção


de Games apresenta as atividades pedagógicas relacionadas à
efetiva implementação de um game, em seus aspectos mais
específicos de lide com a engine e programação específica. [...]
(PUC-SP, 2015).

Embora cada universidade ou curso tenha uma abordagem diferente,


podemos apontar possíveis acertos e desencontros com a indústria de acordo
com a pesquisa já mencionada. Por ser um mercado com um enorme
potencial, faz-se necessário enfatizar a importância do levantamento da
situação atual dos cursos de jogos no Brasil; não apenas avaliar os padrões de
qualidade exigidos pelo Ministério da Educação (MEC) para oficializar um curso
superior, mas também os padrões no que se refere às competências e
habilidades a serem adquiridas durante a formação do aluno, que sejam
relevantes à indústria local.

O MEC, na seção de “Informação e Comunicação” de seu Catálogo


Nacional de Cursos Superiores de Tecnologia, traz a seguinte descrição sobre
os requisitos necessários para um curso de tecnologia em jogos digitais:

O tecnólogo em Jogos Digitais atua no segmento de entretenimento


digital, desenvolvendo produtos tais como: jogos educativos, de

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aventura, de ação, de simulação 2D e 3D entre outros gêneros. Lida
com plataformas e ferramentas para a criação de jogos digitais e
trabalha no desenvolvimento e na gestão de projetos de sistemas de
entretenimento digital interativo – em rede ou isoladamente – de
roteiros e modelagem de personagens virtuais e na interação com
banco de dados. Pode atuar como autônomo ou em empresas
produtoras de jogos digitais, canais de comunicação via web,
produtoras de websites, agências de publicidade e veículos de
comunicação. Carga horária mínima 2.000 horas Infraestrutura
recomendada Biblioteca incluindo acervo específico e atualizado
Laboratório de arquitetura de computadores Laboratório de
informática com programas específicos e conectados à Internet
Oficina de criação. (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2010).

Essas questões, comuns aos cursos de jogos digitais, levam à análise da


estrutura, necessária para cumprimento de todas as recomendações,
considerando as especificidades do conteúdo e dos requerimentos da indústria.
O planejamento dessa estrutura é de fundamental importância para as
faculdades que pretendem lançar-se no ensino de jogos digitais, pois além de
ter que lidar com a complexidade do cenário nacional, ainda precisam se
preocupar com aspectos estruturais que garantam a certificação dos cursos,
conforme os requisitos exigidos pelo MEC. A partir dos aspectos abordados
nesta introdução, as questões formuladas por este estudo foram as seguintes:

 Quais as tecnologias emergentes que são utilizadas nos cursos de


jogos digitais?

 Quais as principais funcionalidades das ferramentas destas


tecnologias que são oferecidas aos alunos?

 Como são apresentados e utilizados os materiais didáticos e


conteúdos tecnológicos nesses cursos, particularmente no curso de
Graduação com Jogos Digitais da PUC-SP?

 Quais os critérios de avaliação adotados nos cursos de jogos digitais


no Brasil?

23
Objetivo

Nossa pesquisa tem como objetivo central indicar alternativas de acesso


à tecnologia e identificar como as tecnologias de desenvolvimento de jogos
digitais podem ser utilizadas nos processos de ensino e aprendizagem dos
cursos de jogos digitais nas instituições de ensino no Brasil.

Para tanto, neste estudo de campo, foram analisadas algumas


características e metodologias de ensino utilizadas por algumas instituições
brasileiras de ensino e as tecnologias adotadas que, atualmente, auxiliam na
formação dos profissionais desta área, respondendo, dessa forma, aos
questionamentos do item anterior.

Propusemos uma metodologia de acesso às tecnologias para


desenvolvimento de jogos digitais que permitirá o ensino e a aprendizagem
nesta área de atuação, a fim de formar profissionais para o mercado
profissional de desenvolvimento de jogos digitais. De fato, nosso objetivo é
fazer com que os cursos de formação em jogos digitais sejam mais alinhados à
realidade da indústria brasileira de jogos, considerando as tecnologias
utilizadas, o ensino e a aprendizagem e uma maior interação entre alunos e
professores nos cursos de jogos digitais com vistas ao mercado de
desenvolvimento destes produtos.

Por fim, tentamos validar essa metodologia através de critérios


identificados em bibliografia adaptada a sistemas de softwares educacionais,
seguindo parâmetros propostos por Rodden (1998). Também desenvolvemos
uma avaliação de motivação baseada na teoria de autodeterminação de
Vallerand (1993, pp. 159-172), como tentativa de mensurar a qualidade do
teste realizado.

Objetivos específicos

Os nossos objetivos específicos são identificar como os cursos de jogos


digitais estão se desenvolvendo nas instituições de ensino no Brasil e verificar
a adequação dos cursos às tecnologias disponíveis em relação às ferramentas
utilizadas pelas empresas de desenvolvimento de jogos no país, considerando:

24
 A construção e conteúdo dos cursos;

 A especificidade dos cursos oferecidos;

 Como se configura o ambiente de aprendizagem;

 Quais são as metodologias de ensino e aprendizagem, além das


tecnologias utilizadas; e

 Os custos envolvidos nesses cursos.

Nossa hipótese é supor que a educação de jogos digitais no Brasil esteja


mais focada na estruturação do conteúdo do que na realidade de mercado das
empresas de desenvolvimento de jogos. Esse foco pode ser notado na escolha
de tecnologia diversa daquela empregada nos jogos de ponta. Isso pode ser
decorrente de formas de ensino e metodologias conservadoras, que poderiam
ser atualizadas para as técnicas e tecnologias adotadas pela indústria
atualmente.

A possibilidade de desenvolvimento de currículos mais flexíveis é de vital


importância para uma área que tem uma evolução tecnológica e mercadológica
tão veloz. Também não podemos esquecer-nos das metodologias de ensino
que estão focadas no ensino tradicional e que não aproveita o potencial
interativo e de conhecimento proveniente dos alunos. Os cursos deveriam se
tornar mais participativos e interativos, principalmente em relação aos alunos
de jogos que não são passivos.

Através da leitura de bibliografias apropriadas e aproveitando a


experiência de ensino nessa área, foi possível perceber que as
maneiras tradicionais de abordagens para ensinar lógica
computacional, por vezes, não obtêm os efeitos esperados. Paralelo
a isso, no mercado de trabalho, entramos em contato com os
requisitos necessários para se desenvolver jogos profissionalmente,
as relações lógicas e o modo usado no dia a dia. Verificamos também
o enorme impacto que os jogos eletrônicos têm produzido nos
indivíduos e em nossa cultura, o que reforça a opção de utilizarmos
as mídias interativas para o processo de ensino e aprendizagem.
(RAMOS, 2009, p. 13).

Uma das características do estudo de tecnologias avançadas é o aluno


ser capaz de aprender de forma independente a partir de livros, websites, com

25
tutoriais e colaboração de material disponível nas redes. Dessa maneira, os
alunos devem ser incentivados a estudar e pesquisar de modo independente,
em caráter extraclasse, com o intuito de fortalecer o aprendizado colaborativo,
dinamizar a comunicação e a troca de informação entre os alunos e, ainda,
como forma de consolidar a aprendizagem através de atividades em grupo.
Com o aumento da concorrência dos cursos de jogos digitais através da
crescente disponibilidade de oferta (IGDA, 2008, p. 2) e, com a crescente
difusão de informação gerada pela própria comunidade via Internet, as
instituições de ensino estão sendo obrigadas a refazer seus currículos e cursos
de jogos digitais.

Assim, dentre os inúmeros cursos de jogos digitais oferecidos pelas


instituições de ensino dos diversos graus acadêmicos, estão circunscritos,
fundamentalmente, aos cursos de graduação, pós-graduação (stricto ou lato
sensu) e de ensino técnico relacionados à área, e que completem de maneira
satisfatória os requisitos estudados que encaminham os alunos para o mercado
de trabalho. Será dada ênfase às variáveis concernentes à infraestrutura
desses cursos, no âmbito pedagógico, da tecnologia utilizada, de formas de
interação e de relevância industrial com base na pesquisa realizada pela FEP
Games (2014).

Estruturação da pesquisa

A partir dos aspectos apontados nesta introdução, esta pesquisa tem a


seguinte estrutura:

 No Capítulo 1, abordaremos o caminho da indústria brasileira de jogos


digitais, a relevância do domínio tecnológico e suas implicações, a
dependência tecnológica como fator limitante, a oportunidade
tecnológica, novos dispositivos e, por fim, a problemática do mercado
educacional de jogos;

 No Capítulo 2, veremos tópicos como a indústria no mundo e no


Brasil, faremos reflexões sobre o panorama atual, estudaremos parte
da educação de jogos e seu histórico no país, veremos alguns
modelos de educação utilizados e analisaremos as tecnologias

26
disponíveis para a educação, seus ambientes de aprendizagem,
hardwares de suporte disponíveis para tal, soluções em hardware livre
e a importância do material didático nos sistemas educativos;

 No Capítulo 3, visamos demonstrar nosso experimento e procurar


ferramentas para validá-lo, dentre elas, uma observação sobre a
abordagem metodológica, métodos para a escolha do material
didático, componentes do estudo de caso, observações sobre a
metodologia para o estudo e os devidos procedimentos
experimentais;

 Na Conclusão, finalizamos este trabalho procurando analisar alguns


aspectos particulares da experiência e concluímos com uma sugestão
de continuidade do projeto relacionando a outros experimentos
passados.

27
Capítulo 1 – As Tecnologias Emergentes
e os Jogos Digitais

1.1. Caminho da indústria brasileira

Nos últimos anos, porém, nenhum estúdio nacional teve a


oportunidade de lançar um jogo para quaisquer das plataformas
lançadas no mercado, ainda que a disseminação de jogos digitais
pelas redes on-line signifiquem, na teoria, uma facilidade para os
produtores independentes. Tal cenário não é notado no ecossistema
de jogos para PC e smartphones. (FEP GAMES, 2014, p. 65)

Segundo o primeiro censo da Indústria Brasileira de Jogos Digitais (IBJD,


2014), o desenvolvimento do setor está massivamente focado no mercado de
interfaces móveis (mobile) e nos computadores pessoais (PCs). Inicialmente,
podemos verificar que, com o crescimento do mercado mobile, abriu-se uma
brecha estratégica na indústria brasileira de desenvolvimento de jogos: o
desenvolvimento de produtos está sendo realizado em plataformas modernas,
afinal, um mercado em ascensão como este tende a dar mais atenção e
espaço às produções que permitem a obtenção de grandes receitas. No
entanto, a seguir, destacamos alguns pontos que nos chamam a atenção:

 O mercado de PC e o de mobile, hoje, são os mais explorados pela


indústria brasileira;

 Existem poucos jogos desenvolvidos para as redes sociais;

 O desenvolvimento de jogos digitais está focado na indústria de


consoles;

 A complexidade dos jogos de computadores pessoais, em geral, é


maior do que os jogos mobile, mesmo assim temos muitos
desenvolvedores produzindo para computadores pessoais.

Para este tipo de cenário podemos ter como hipótese a seguinte


explicação: o interesse do público-alvo neste tipo de produção. O público
casual gamers, que é aquele que tem interesse pelos “joguinhos”, utiliza esses
jogos digitais para “passar o tempo”, ou seja, são usuários de jogos digitais que
querem ter a experiência de jogar sem se apegar as técnicas muito complexas

28
e histórias longas. Podemos fazer uma analogia destes jogos com os antigos
jogos de fliperama ou arcade, que eram usados em lugares determinados e por
um período de tempo específico e os jogadores tinham de se dirigir aos lugares
onde estavam as máquinas. Adicionalmente, alguns jogadores podiam
considerar esses jogos com mais entusiasmo passando horas e descobrindo
segredos e técnicas que não eram esperadas quando jogados normalmente.
Vale lembrar que esse comportamento era excepcional. O público para estes
tipos de jogos eram crianças, adolescentes, adultos e até idosos.

Tabela 01 – Plataforma de desenvolvimento de jogos nas indústrias. Percentual de


desenvolvimento atual e nos próximos 24 meses.
Fonte: FEP GAMES, 2014.

29
Tabela 02 – Plataforma de desenvolvimento de jogos nas indústrias. Percentual de
desenvolvimento atual e nos próximos 24 meses.
Fonte: FEP GAMES, 2014.

Ao observamos a curva de ascensão dos mercados, vemos que mobile e


PC estão em direções opostas. Assim, notamos uma tendência de crescimento
do mercado de jogos para os sistemas móveis.

30
Gráfico 01 - Previsão do desenvolvimento de jogos digitais, na indústria brasileira, de 2009 a
2018, para diferentes plataformas.
Fonte: FEP GAMES, 2014.

No Brasil, os equipamentos exclusivos para desenvolvimento de jogos


para console, os chamados de “Kits de Desenvolvimento”, ou “DevKits”, são
raros. Dificilmente vemos empresas de jogos digitais que possuem essas
ferramentas, seja elas de geração atual ou passada. Essa situação ocorre
apesar da maioria da receita deste mercado estar no setor de consoles, como
indica o índice PwC (2014).

Se observarmos a tabela anterior, vemos que, a partir de 2014, o que


temos é uma projeção, já que o relatório foi elaborado em 2013; no gráfico da
PwC de 2014, específico sobre consoles, vemos que a projeção analisada por
ambas as pesquisas, não foi a esperada e, portanto, foi atualizado pela PwC.

31
Gráfico 02 – Projeção de crescimento de lucros dos consoles, de 2009 a 2018.
Fonte: PwC, 2014.

Verificamos pelo Gráfico 02 acima que o mercado de console não só é o


mais rentável, como também mostra uma reação do setor em relação às
console em relação ao crescimento da participação de mobile na indústria;
segundo a última projeção realizada pela PwC, parece que esse cenário deve
continuar por mais alguns anos.

A indústria brasileira tem tomado o rumo dos jogos casuais (ou mobile
games) e, talvez, essa escolha tem sido equivocada. O foco em casual games
para mobile e jogos para PC talvez não tenha sido tão estratégico e, sim,
tomado por outros motivos, como, por exemplo, a falta de domínio tecnológico.

32
1.2. Domínio tecnológico

Com estes dados, podemos afirmar, que uma das características no


desenvolvimento de games (e da computação em geral), é que,
majoritariamente, desenvolvemos novas tecnologias com base em outras
preexistentes. Ou seja, a partir de um prévio conhecimento tecnológico ou de
uma plataforma tecnológica, construímos novas ferramentas e novos produtos.
Ao criar essas ferramentas e produtos, estamos realizando produção
intelectual, que são os jogos, e o conhecimento que deve ser adquirido com
eles. Por outro lado, ao construir ferramentas, estamos, cada vez mais,
aumentando a produção de novas tecnologias.

A criação de tecnologia, sendo própria ou adquirida, de certa forma, nos


faz obter novas habilidades e, com isso, toda a metodologia e sistemática para
a criação de cursos e treinamentos pode ser desenvolvida. Por exemplo, um
desenhista que usa pedras como suporte para seus desenhos em barro ou
carvão não depende de desenvolvimento tecnológico para a realização de seu
trabalho, mas ao decidir usar papel ao invés de pedra, passa a depender da
indústria e de tecnologias específicas e diversificadas para desenhar em papel.
No caso de um escultor de cerâmica, ele pode escolher utilizar um suporte de
madeira giratório para facilitar a produção e, assim, nesse caso, ele dependerá
de um carpinteiro.

Ao enfatizarmos que o desenhista evolui ao passar da pedra para o papel,


para a tela em tecido, além de ferramentas como lápis, tintas, pincéis,
esquadros, mesas de iluminação, computadores, mesas digitalizadoras, tablets
etc., ele passa a depender de outras ferramentas que necessitam de
desenvolvimento tecnológico. Observamos que o desenvolvedor de games não
é muito diferente: desenvolver jogos hoje requer conhecimentos de tecnologias
específicas.

No início da indústria dos jogos digitais, nos anos 80, um programador


deveria ter conhecimento prévio da arquitetura do hardware para desenvolver
games. Por exemplo, o desenvolvimento de jogos para o console Atari era feito
na linguagem de programação Assembly, que era uma linguagem de “baixo
nível”, porque lidava com o conhecimento das estruturas e funcionamento das
máquinas computacionais.
33
Essa linguagem era estabelecida pelo fabricante do processador que
estava sendo empregado no sistema, e que, no caso específico do Atari 2600,
era um microprocessador de baixo custo (conhecido como 6507)3, com
arquitetura baseada no microprocessador MOS Technology 65024. Essa
arquitetura era conhecida por MOS Technology 65xx e fazia referência à
tecnologia de processadores 8-bit5 desenvolvida pela MOS Technology, Inc.,
que, por sua vez, era baseada nos processadores Motorola 68006,
desenvolvidos em 1975. A arquitetura 6800 e suas diretivas também foram
baseadas em tecnologias anteriores, mas o set de desenvolvimento completo
de linguagem e ferramenta de desenvolvimento em Assembly7 foi um
diferencial que ajudou a difundir esta tecnologia.

Desenvolver jogos nessa época era diferente do que temos hoje,


principalmente no que se refere à divisão de tarefas. Desenvolver jogos para
Atari 2600 só requeria trabalho de programadores e não de designers, artistas
nem músicos, como é atualmente. Assim, ficava a cargo do programador tentar
representar o ator do jogo como ele melhor entendesse. Dessa maneira, os
gráficos que eram os elementos que constituíam os personagens, cenários, e
as imagens não dependiam de ferramentas específicas, somente comandos ou
códigos de máquina.

3 Disponível em http://marc.info/?l=classiccmp&m=110668039327589&w=2. Acessado em


17/11/2015.
4 Disponível em http://www.6502.org/. Acessado em 17/11/2015.
5 Disponível em http://ieeexplore.ieee.org/document/5392210/?arnumber=5392210. Acessado

em 17/11/2015.
6 Disponível em http://archive.computerhistory.org/resources/access/text/2015/06/102702020-

05-01-acc.pdf. Acessado em 17/11/2015.


7 Disponível em

http://www.ibm.com/support/knowledgecenter/SSLTBW_2.1.0/com.ibm.zos.v2r1.asma400/asmr
102112.htm. Acessado em 17/11/2015.

34
Figura 01 – Jogo de boxe para o console Atari 2600.
Fonte: Videogame Critic, 2001.8

Com a chegada dos jogos da seguinte geração – representada ao


máximo pelo Famicom, da Nintendo –, os sprites, figuras bidimensionais,
passaram a apresentar uma complexidade maior, demandando, assim, a
participação de artistas para criação da arte do jogo.

8 Disponível em http://videogamecritic.com/2600bb.htm. Acessado em 17/11/2015.

35
Figura 02 – Rascunhos de Shigeru Miyamoto durante a criação do personagem Mario
(na época era chamado Jumpman, para o jogo Donkey Kong).
Fonte: Nintendo, 1978.9

Com a tecnologia de elaboração de games desenvolvendo-se


rapidamente, o trabalho de elaboração de jogos digitais acabou ganhando cada
vez mais complexidade e novas oportunidades de trabalho foram surgindo,
entre elas, destacamos as novas demandas criadas para desenhistas,
texturizadores, modeladores, level designers, programadores de interface,
programadores de gameplay, músicos, engenheiros de som etc. e, assim, as

9 Disponível em http://www.dkwiki.com/mario. Acessado em 18/11/2015.

36
equipes de desenvolvimento de jogos foram crescendo e tornando-se mais
especializadas nas diversas áreas que compõem este tipo de produção. Todos
os desenvolvedores de jogos atuais utilizam alguma ferramenta tecnológica
computadorizada para trabalhar, por exemplo, os criadores de arte em três
dimensões (3D) que são conhecidos como modeladores 3D.

A criação de arte em 3D é uma área com muitas tarefas adjacentes.


Numa arte final para jogos digitais, a área deve ser composta de vários
trabalhadores diferentes e exigir a utilização de softwares de alta tecnologia.
Isso porque o objeto 3D é composto por um modelo formado por uma malha de
pontos espalhados em um ambiente também tridimensional em que as
superfícies exibem texturas de cobertura que necessita de desenhistas
especializados na tarefa de texturização. Se o objeto criado for animado, é
necessário um profissional e software dedicado para seu desenvolvimento da
animação. No que se refere às equipes de produção dos jogos digitais
atualmente, podemos citar várias áreas de conhecimento e softwares
específicos para realizarmos as atividades necessárias. A seguir, detalharemos
algumas delas.

1.2.1. Modelagem

A modelagem é o ato de criar um objeto ou ator utilizando uma técnica de


computação gráfica para exibição em vídeo; tipicamente chamamos de malha
3D, ou 3D mesh. A modelagem é feita com softwares criados para esse fim,
como os produzidos pela Autodesk (Maia, 3DStudio, XSI) e alguns softwares
livres, como o Blender. Existem outras técnicas e softwares para modelagem,
porém citamos os mais usados pela indústria, segundo a pesquisa FEP
GAMES (2014).

1.2.2. Animação

Esse processo consiste em mapear um objeto 3D e movimentar sua


estrutura de modo a termos a percepção de movimento. Ao contrário da
animação tradicional com desenhos – feita através de múltiplas imagens
colocadas quadro a quadro para dar ilusão de movimento - a animação de um

37
modelo 3D não exige a criação de uma “imagem” nova a cada quadro, mas,
sim, de sucessivas modificações do modelo principal.

A animação se divide em alguns métodos: keyframes, em que o animador


manipula os objetos baseado em quadros, que simulam a técnica tradicional de
desenhos animados – os softwares de modelagem tradicional costumam
oferecer uma ferramenta interna que possibilita essa criação; trilho para
navegação, que consiste na criação de curvas definidas matematicamente, que
guiam o movimento dos atores; e o motion capture, ou captura de movimentos,
é feito com dispositivo extra e com atores, o que aumenta ainda mais a
dependência tecnológica e adiciona um novo tipo de profissional à área.

1.2.3. Texturização

Técnica que consiste em mapear uma imagem sobre a superfície de um


modelo 3D. A texturização traz maior realismo ao modelo já que as cores
podem ser posicionadas de forma mais consistente ao objeto exibido.
Normalmente, uma textura é desenhada de maneira tradicional, usando um
software gráfico, por exemplo, o Adobe Photoshop. A textura final é mapeada
sobre a malha 3D original.

Figura 03 - Modelando usando Blender.


Fonte: Blender Foundation, s.d.10

10 Disponível em http://www.blender.org/. Acessado em 15/11/2015.

38
O trabalho de um artista 3D é semelhante ao dos escultores; tendo em
vista que ambos atuam para criar formas tridimensionais que pareçam
tangíveis. No entanto, a criação do artista 3D é feita para ser usada dentro de
ambientes virtuais tridimensionais. Essa tarefa exige o uso de softwares de
suporte tecnológico de alta complexidade que, por vezes, são proprietários e
caros. Essa dependência tecnológica pode ser muito onerosa ao artista 3D,
não somente em valores para ter a ferramenta, mas também em treinamento
para se manter atualizado.

Esses custos advêm da constante evolução tecnológica que modifica o


resultado esperado do trabalho do artista. A cada nova geração de
videogames, mais detalhes e efeitos visuais são esperados nos jogos; isso
demanda uma capacidade de criação e inovação muito rápida por parte dos
desenvolvedores das ferramentas de produção de arte, que, por consequência,
exige uma atualização de seus usuários. A exigência de atualização
apresentadas nesta pesquisa para os artistas 3D também acontece com os
programadores de jogos, em diferentes níveis e até maior complexidade.

1.2.4. Programação

Para entendermos o papel de cada programador dentro do processo de


produção e, assim, entender como acontece o domínio tecnológico dentro da
indústria de jogos digitais, classificaremos cada um dos tipos de
programadores, segundo Moore e Novak (2009, p. 74).

 Programador de game engine: Esse profissional é responsável pela


criação e manutenção do software de base dos jogos digitais - a
engine do jogo. Esse software pode ser comparado às ferramentas de
suporte tecnológico dos modeladores 3D mencionadas acima.
Incorporados a esse nível tecnológico, estão os programadores de
física e de gráficos. Esses especialistas estão na vanguarda da
tecnologia e inovação e seu trabalho é constante, para aumentar a
complexidade da game engine.

 Programador de física: É responsável por desenvolver os


comportamentos que simulam características do mundo físico, como

39
colisão, atrito, comportamento dos corpos, massa etc. Tipicamente,
um programador de física programa somente aspectos pertinentes ao
jogo. Simular aspectos de física com maior precisão e complexidade
custa poder de processamento, dessa maneira, os programadores de
física são especialistas em otimizar códigos para que sejam
computacionalmente leves. Programadores de física podem trabalhar
na vanguarda quando são responsáveis pela criação e manutenção
de engines de física, como a Nvidia PhysX.

 Programador gráfico: Também conhecido como programador 3D é


responsável por trabalhar com otimizações gráficas, de modo que
tenha o melhor resultado visual com o menor peso computacional.
Nos dias de hoje, os programadores gráficos trabalham fazendo uso
das tecnologias empregadas nas placas gráficas, que são
componentes de hardware que tratam exclusivamente da aceleração
da performance dos vídeos e dos dispositivos computacionais, sejam
eles videogames ou PCs. Normalmente, um programador 3D tem
avançado conhecimento de matemática, incluindo vetores, matrizes,
quatérnions e álgebra linear.

 Programador de inteligência artificial: Esse profissional desenvolve


a lógica de comportamento para oponentes ou personagens não
jogáveis (Non-Player Characters ou NPCs), que se apresentam
durante o jogo. Um programador de inteligência artificial pode usar
técnicas como pathfinding (busca pelo menor caminho), estratégias e
sistemas táticos etc. Conforme se necessita de comportamentos mais
inteligentes e realistas, esse trabalho tende a ter uma complexidade
cada vez maior. A tecnologia de Inteligência Artificial (IA)
desenvolvida para jogos digitais não pode ser confundida com a
inteligência artificial buscada na área da ciência da computação.
Embora ambas as áreas possam ter linhas de pesquisa equivalentes
e que se cruzam, elas são consideradas áreas distintas.

 Programador de som (ou de áudio): Normalmente, o programador


de som de jogos não é um profissional distinto; esse tipo de
programação costuma ser um trabalho acumulado por outro

40
programador. No entanto, com o aumento da complexidade dos
jogos, os programadores de áudio estão tornando-se
desenvolvedores com conhecimentos exclusivos. Muitos jogos
modernos usam técnicas de posicionamento de som em 3D, tornando
a programação de áudio em algo não trivial. O programador de áudio
também pode estar na vanguarda tecnológica, principalmente quando
se dedica à construção e manutenção de audio engines.

 Programador de gameplay: É responsável pela programação da


experiência de jogo. Seu foco é maior na mecânica e lógica dos
jogos, estratégia e jogabilidade em si. Este programador tem a função
de implementar estratégias de jogo – como puzzles, movimentos e
respostas ao jogador –, ou mesmo ser responsável pelos ajustes que
possam afetar o jogo como um todo, incluindo até mesmo áreas
pertinentes a outros programadores.

 Scripter: No início da indústria de videogames os programadores


eram responsáveis, como já foi mencionado, pelo desenvolvimento de
todo o jogo, tendo que escrever códigos de baixo nível, compilar e
verificar os resultados. Essa sequência de ações não é uma regra na
indústria atual; muitas das ferramentas de produção de jogos ou
engines são construídas a partir da aceitação dos scripts, que, de
certo modo, são linguagens de programação simplificadas para um
uso especifico e que dispensam compilação. Normalmente, nas
engines mais atuais, o núcleo do jogo é separado do gameplay; isso
traz algumas vantagens no desenvolvimento do jogo, como o
aumento na velocidade de desenvolvimento. Uma típica linguagem de
script trabalha com itens como eventos cinemáticos, comportamento
de inimigos e objetivos do jogo. Grandes equipes de desenvolvimento
têm grandes quantidades de scripters para implementar uma igual
quantidade de conteúdo de jogo e, normalmente, os scripters são
game designers. Assim, é mais fácil preparar um profissional com
esse tipo de conhecimento em scripts, do que um programador muito
qualificado nas áreas da vanguarda tecnológica. Scripters também
podem ser encontrados no meio da comunidade dos gamer.

41
Geralmente, são modders (RAMOS, 2009, p. 38), que desenvolvem
modificações para os jogos ou expansões, motivados pelo prazer de
jogar ou por ser um fã de uma determinada franquia de um título
original.

 Programador de interface: É o especialista em desenvolver


interfaces para games, que podem ser customizadas ou pode ser
criada em forma de ferramenta para serem utilizadas em diversos
jogos digitais. Usualmente, as interfaces com os usuários são
desenvolvidas em duas dimensões, mas interfaces modernas podem
ser criadas em 3D, usando as mesmas técnicas que o jogo 3D utiliza
técnicas avançadas de desenvolvimento de interfaces podem permitir
que sejam inseridos scripts que trazem novas funções para a
interface, deixando-a mais personalizável.

 Programador de dispositivos de entrada: É responsável pela


captação das ações do jogador e de como são transferidas para o
jogo. Esses profissionais escrevem códigos para teclados, mouses ou
joysticks. Esses códigos são desenvolvidos, tipicamente, no início da
produção do jogo e são melhorados ao decorrer de sua produção. A
tarefa de programar para dispositivos de entrada clássicos não é algo
que necessita de um profissional dedicado, porém, as novas
tecnologias exigem capacidades técnicas cada vez maiores dos
programadores. Um exemplo são os dispositivos de captura de
movimento em tempo real, como o Nintendo Wii Remote11, Sony
PlayStation Move12 ou Microsoft Kinect13, que têm alta complexidade
de desenvolvimento e são tecnologias emergentes. Entre essas
interfaces, podemos citar os dispositivos de reconhecimento de
imagem, realidade aumentada, toques na tela (touchscreen),

11 Disponível em
http://web.archive.org/web/20080212080618/http://wii.nintendo.com/controller.jsp. Acessado
em 07/11/2015.
12 Disponível em http://blog.eu.playstation.com/2010/09/07/everything-you-need-to-know-about-

playstation-move/. Acessado em 07/11/2015.


13 Disponível em http://blogs.msdn.microsoft.com/kinectforwindows/2012/01/09/starting-

february-1-2012-use-the-power-of-kinect-for-windows-to-change-the-world/. Acessado em
07/11/2015.

42
acelerômetros, giroscópios, sensores de GPS, magnetômetros,
barômetros etc.

 Programador de rede: Esses programadores escrevem códigos para


jogos em que os jogadores competem e/ou cooperam entre si,
conectados pela Internet ou por redes locais. Normalmente,
programadores de rede são dedicados a esse tipo de trabalho que é
tecnicamente avançado e está, certamente, na vanguarda do uso das
tecnologias. Esse tipo de profissional enfrenta problemas como a
velocidade de conexão das redes, compactação de dados, conexões
interrompidas, entre outros. Em algumas tarefas, os multijogadores
podem consumir a maior parte de seu tempo na produção do jogo,
assim, ferramentas com engines dedicadas auxiliam na tarefa de
elaboração destes jogos. Criar jogos que funcionam em rede pode
significar um trabalho de meses e muito tempo de desenvolvimento.

 Programador de ferramentas de jogo: É responsável por


desenvolver softwares que facilitam o processo de criação dos jogos.
Essas ferramentas podem ter funções diversas como interpretar
scripts, importar ou converter imagens e som, modificar
comportamentos, construir níveis etc. Algumas ferramentas, como
editores de imagem e softwares de modelagem 3D, são programas
desenvolvidos para todos os jogos, no entanto, muitas dessas
ferramentas são exclusivamente criadas para desenvolvimento de
jogos específicos. Algumas ferramentas criadas para jogos
específicos são, depois, incluídas neles. Isto permite que o jogador
modifique estes jogos aumentando o tempo de vida deles. Os
jogadores que modificam os jogos através destas ferramentas são
chamados de game modders.

 Programador de porting: Faz a tarefa de portar um jogo que foi feito


em uma plataforma específica para outra distinta (por exemplo, de
console para mobile). A tarefa de porting é extremamente importante,
pois viabiliza que um determinado jogo possa ser acessado por
jogadores que detêm outros tipos de hardwares. Normalmente, o
programador de porting tem que trabalhar em diversas plataformas,

43
simultaneamente, para poder garantir a compatibilidade de seu código
na maioria das plataformas possíveis. Para algumas plataformas, a
tarefa de porting pode significar reescrever o jogo desde o início em
outra linguagem de programação mais atual. O programador de
porting tem que ter amplo conhecimento da plataforma para a qual
converterá o jogo, assim como da plataforma na qual o jogo foi
desenvolvido. Ele também deve conhecer múltiplas linguagens de
programação e ter conhecimento de conversão de arquivos de arte,
som, entre outros, além de ser hábil em reduzir a memória
necessária. Esses programadores têm de ter alta capacidade na
vanguarda da tecnologia, às vezes para corrigir problemas (bugs),
que não foram descobertos na versão original.

 Programador de tecnologia: É encontrado em grandes estúdios que


possuem departamentos dedicados a pesquisa e desenvolvimento na
área de jogos (Research and Development, ou R&D). Diferente de
outros programadores, esse profissional não fica alocado em projetos
específicos, mas, sim, em lugares de destaque nas empresas como
um game producer. Esse trabalho implica num profissional com um
conhecimento de ponta em relação à tecnologia e com um
conhecimento profundo em plataformas mais avançadas
tecnologicamente. O programador de tecnologia é um pesquisador e,
dessa forma, busca constantemente novos métodos para realizar
tarefa, como, por exemplo, algoritmos de ponta, otimizações de
hardware, desafios de performance e novas descobertas científicas
que possam ajudar a inovar.

 Programador generalista: Normalmente, o programador generalista


é encontrado em empresas de menor porte. Esse profissional
costuma ser um programador que faz as tarefas de todos os
programadores, conforme necessário para o desenvolvimento do
jogo. No geral, programadores generalistas são focados na demanda
atual e aprendem conforme é exigido ou demandado.

 Programador líder: É o responsável pela gerência de toda a


programação do jogo. Seu trabalho é ter certeza de que todos os

44
profissionais de programação estão em sincronia e fazendo o trabalho
devidamente. Também são responsáveis por manter a agenda de
desenvolvimento. O programador generalista necessita de muita
experiência para compreender todas as etapas do desenvolvimento
da programação do jogo. Apesar de ser considerado um
programador, esse profissional não dedica muito tempo a escrever
códigos, mas, sim, a entender os requisitos do jogo e a encontrar a
melhor forma de sua implementação. Contudo, o programador líder
tem a responsabilidade mais alta entre todos os programadores e
deve garantir o bom andamento da produção, se necessário às vezes
até programando partes do jogo que outros programadores não
tiveram a perícia de desenvolver. Em conclusão, o programador líder
está na vanguarda da tecnologia.

Como citado em cada uma das descrições acima, algumas


especializações de programadores exigem um conhecimento técnico mais
avançado que outras; assim, é vital entendermos quais as necessidades
técnicas e o que significa vanguarda tecnológica nesse contexto. Segundo o
relatório FEP GAMES de Mapeamento da Indústria Global de Jogos Digitais,

Do ponto de vista técnico, os jogos são construídos usando quase


sempre as mesmas ferramentas e engines, como Maya, Photoshop,
Unity-3D, etc. Embora deva-se reconhecer que não exista mercado
para empresas brasileiras desenvolverem ferramentas semelhantes e
concorrer com as que já são padrão de mercado, é possível que elas
desenvolvam os chamados plug-ins. (2014, p. 97).

Nesse ponto, a pesquisa reconhece a falta de domínio tecnológico da


indústria brasileira no desenvolvimento de ferramentas de vanguarda
tecnológica. Dessa maneira, sobre os programadores de alto nível tecnológico,
podemos inferir duas situações: esses profissionais não conseguem espaço
como especialistas em uma equipe brasileira por serem muito mais qualificados
do que a indústria ainda é capaz de suportar; outro problema também pode ser
a dificuldade de se encontrar cursos e recursos específicos que lhe permitam
se especializar na carreira que mais lhes convêm.

Ao analisarmos tecnicamente esses aspectos, podemos afirmar que eles


são vitais para a produção tecnológica nas seguintes especializações de
45
programadores: de game engine, gráfico, de física, de porting e de
ferramentas.

Para a indústria de jogos digitais do país, é necessário que os cursos


especializados atentem, principalmente, para as transformações tecnológicas,
para os processos sociais e para as polêmicas contemporâneas como, por
exemplo, as questões que envolvem a formação dos profissionais diante dos
processos de reestruturação produtiva global.

Com isso em mente, devemos dar atenção para a formação de usuários


de ferramentas e refletir sobre a produção da própria tecnologia, fazendo com
que os alunos sejam capazes de conhecer as ferramentas hoje existentes e
aprender a dominar as tecnologias que estão por trás delas.

1.3. Dificuldades e dependência tecnológica

Uma cadeia produtiva, segundo Mielke, (2002, p. 15) citando Chevalier


(1978, pp. 149-158) e Selmani (1992, p. 200), é um conjunto articulado de
atividades integradas, que também atua como uma interação consecutiva às
articulações do mercado, da tecnologia e do capital. A cadeia produtiva
consiste de uma sucessão de estágios técnicos de produção e de distribuição,
devidamente alinhados ao mercado com a demanda final, sendo integrada a
esses estágios.

Analisando esse contexto, a cadeia produtiva é um conjunto de atividades


que busca suprir o consumidor final com produtos que sejam
mercadologicamente competitivos, sendo que a tecnologia atua como
catalisador desses processos produtivos, gerando oferta que sacie a demanda.

Na indústria de jogos digitais, esse cenário é evidente quando se toma a


influência do consumidor final (o jogador) sobre os componentes da cadeia
produtiva. Dado isso, é importante conhecer as tendências desse mercado
consumidor para garantir a viabilidade dessa cadeia, como já foi feito por
Clements e Ohasi (2005, pp. 515-542), durante estudo realizado entre 1994 e
2002, que gerou um modelo que calcula a disposição do consumidor para
comprar um determinado console, diante da oferta disponível. Nesse estudo,

46
os autores apontam o número de títulos disponíveis (softwares ou jogos) para
um console como variável importante na decisão de compra.

O software é, antes de tudo, um não-objeto, uma não-coisa, que


pelas suas propriedades satisfaz necessidades humanas de qualquer
espécie. Essas necessidades podem ser de natureza individual ou
coletiva. As soluções em software podem satisfazer imediatamente as
necessidades dos indivíduos, como bens finais de consumo ou,
indiretamente, como “meio de produção”. (ROSELINO, 2006, p. 6).

Jogos digitais são softwares, assim sendo, cada jogo digital caracteriza-se
como um produto singular, não físico, que não possui representação material
no mundo real. Quando desenvolvido, não exige matérias-primas que sejam
consumidas ou empregadas ao longo de seu ciclo de produção. Mesmo o jogo
não tendo elementos físicos em sua cadeia de produção, essencialmente, a
indústria de jogos apresenta-o com uma existência mercadológica similar aos
bens manufaturados: o jogo digital é vendido como um produto associado a um
meio físico – a mídia – disponível em prateleira, nas mais diversas formas:
fitas, cartuchos, disquetes, CDs, DVDs e BDs (Blu-Ray Discs).

Figura 04 – Cartucho do Nintendo Entertainment System (NES).


Fonte: Nintendo, 1985.14

Jogos, assim como softwares diversos, podem ser adquiridos sem sua
mídia física original nos dias de hoje, mas nem sempre foi assim. Cartuchos e
discos de videogame têm uma diferença inerente sobre os outros tipos de
mídia: a alta complexidade de reprodução e cópia. Assim, para se ter acesso a
um determinado jogo, o consumidor deveria, necessariamente, ter em mãos a
mídia física do produto, que só funcionaria em um aparelho (console) para o
qual foi especificamente produzido. Da mesma forma que disco de vinil, cuja

14Disponível em http://legendsrevealed.com/entertainment/2016/07/08/did-blowing-on-
nintendo-video-game-cartridges-help-them-work/. Acessado em 20/11/2015.

47
cópia amadora era altamente complexa e cara, uma mídia física de videogame
atua da mesma forma, assim ele recebe características de um produto físico.

Essas características de um jogo digital dão-se, em parte, pela alta


tecnologia empregada, que os torna exclusivos e de difícil acesso a outras
empresas ou indivíduos que os queiram copiar. Considerando a dificuldade
tecnológica, podemos inferir que, de certa forma, essa complexidade moldou a
indústria dos jogos digitais em seu começo, pois apenas as empresas que
detinham o domínio tecnológico do dispositivo podiam permitir a participação
de outras companhias ou indivíduos desenvolvedores de jogos no processo.
Podemos afirmar que os videogames de cartucho inauguraram a indústria dos
videogames, já que consoles como o Atari 2600 e similares dispunham desse
tipo de mídia.

Tipicamente, quando um videogame é lançado, uma nova tecnologia


proprietária emerge com ele. Essa tecnologia não fica ao alcance de todos os
desenvolvedores e é exclusiva de seu desenvolvedor. Isso faz com que os
detentores da nova tecnologia tenham um monopólio sobre ela, sendo eles
mesmos responsáveis por produzir conteúdo para seus videogames ou para
licenciar terceiros para fazê-lo.

Obviamente não existe apenas um fabricante de console; também não


são empresas de apenas um único país que produzem jogos digitais. Nos dias
de hoje, podemos facilmente dizer que os maiores players estão nos Estados
Unidos e no Japão, porém não podemos afirmar que são os únicos. China,
Canadá e França são alguns dos países que despontam na produção de jogos.
O Brasil tem feito esforços para participar desta indústria.

Em geral, o controle de publicação dos jogos fica a cargo do


desenvolvedor, que tem a exclusividade garantida em função de patentes e de
dificuldades tecnológicas introduzidas por eles. Como o desenvolvimento de
consoles estaria na vanguarda da tecnologia, outras empresas ou concorrentes
não teriam condições tecnológicas de desenvolver jogos que não fossem
permitidos pelo criador da tecnologia.

Esse tipo reservado de indústria é baseado em DRMs (Digital Rights


Management, ou Gerenciamento de Direitos Digitais), que, segundo o

48
Escritório Oficial do Comissário de Proteção à Vida Privada do Canadá (EC-
COUNCIL, 2009, pp. 9-26), possuem o controle do acesso e limitam o uso e a
transferência de material com direitos autorais. DRM pode se aplicar a qualquer
tipo de conteúdo digital, mas é mais comum em música, computadores e
videogames.

A DRM também pode ser representada como uma restrição de hardware


(hardware restriction), um tipo extra de proteção à tecnologia; vale dizer que
proteções de hardware possuem base em tecnologia de componentes
eletrônicos, sistemas de criptografia e assinaturas eletrônicas.

O sistema de restrição pode funcionar como um complemento ao domínio


tecnológico, que pode ser implementado via software ou hardware. Alguns
exemplos de restrição por hardware são videogames, smartphones (STROSS,
2007), tablet computers e computadores da Apple (CHARTIER, 2008), entre
outros. Usando esses tipos de restrição, o fabricante recebe o faturamento de
seu console à venda, além de ter receita sobre o licenciamento da produção de
jogos.

Podemos fazer um paralelo com um modelo de negócio parecido, que é a


indústria da música. As gravadoras detinham a tecnologia de produção e tinha
as ferramentas para replicar os meios físicos de divulgação – o disco de vinil e
o CD –, assim, somente os artistas selecionados e licenciados poderiam
vender suas músicas.

Embora a indústria de música também possa ter se aproveitado da


dependência tecnológica (afinal, gravar um disco e duplicá-lo não era uma
coisa trivial) durante muitos anos, essa relação não é tão forte e significativa
como é na indústria dos jogos digitais. Uma vez que um usuário decidisse
gravar uma música, por exemplo, bastava usar uma fita cassete ou, anos
depois, um CD ou DVD. Vale dizer que gravação em fita cassete foi uma forma
de divulgação de artistas independentes. Com a inovação tecnológica e a
diminuição nos custos de produção de gravadores de mídia digital, tornou-se
menos custoso e descomplicado para pessoas comuns reproduzirem, copiarem
e, até mesmo, criarem conteúdo musical. Por conta disso, a dependência
tecnológica para a reprodução e cópia de música diminuiu e possibilitou um
maior número de artistas divulgando seus próprios trabalhos.
49
Na indústria de jogos digitais, também temos nossas “gravadoras”: as
publishers, empresas licenciadas pelos detentores da tecnologia dos consoles.
As publishers obtêm o direito de publicar jogos definidos pelas empresas
detentoras. Embora, para os pequenos players e desenvolvedores
independentes, encontrar uma publisher disposta a publicar seu material seja
um obstáculo no desenvolvimento de jogos digitais, a existência dela é, em
pequena parte, devida à dependência tecnológica e, em grande parte, às
questões legais e aos meios de distribuição.

O domínio tecnológico na indústria de games servia como uma garantia


extra de exclusividade e também criava um mercado novo baseado no
lançamento de produtos para as novas plataformas. Na época dos cartuchos
poderíamos garantir que o domínio tecnológico seria a construção de
tecnologias em relação aos hardwares, ou seja, os detentores das tecnologias
que comandavam o mercado eram aqueles que tinham a capacidade de criar
novos hardwares para os videogames, denominados consoles.

Esse tipo de indústria é conhecido como “closed platform”, “walled


garden” ou “closed ecosystem” (PC MAGAZINE, s.d.). Nesse sistema, o
fabricante ou provedor do serviço tem o controle sobre todas as aplicações,
conteúdos e mídias, de modo que, dependendo de sua conveniência, ele
aprova ou não novos conteúdos.

Criar novos concorrentes em uma indústria que se vale de plataformas


fechadas em relação ao hardware, demanda uma tecnologia muito mais difícil e
custosa de se produzir. Ela depende de fatores, como fábricas de chips de
silício e processos de manufatura de componentes eletrônicos, além de
equipes altamente capacitadas de programadores e engenheiros de software.

1.4. Oportunidade tecnológica

Em contraste ao closed plataform, está a indústria de plataformas abertas


ou livres, também chamadas de open platform, em que terceiros ou até
consumidores têm acesso irrestrito a aplicações e conteúdos, podendo
reproduzi-los ou modificá-los como bem entender.

50
Atualmente, embora ainda tenhamos consoles muito avançados, a mídia
física – seja cartucho ou CD, DVD e BD – deixou de ter a mesma importância,
abrindo, assim, uma lacuna tecnológica que pode ser preenchida com
tecnologias baseadas somente em software. Seguindo esse raciocínio, os
jogos digitais, assim como softwares diversos, podem ser adquiridos sem sua
mídia original nos dias de hoje.

Isso acontece porque o software não depende da mídia física ou


hardware para existir. Nesse aspecto, Pressman (2011, pp. 3-5) contrapõe o
software ao hardware e aponta que, apesar de possuir semelhanças com o
hardware, em sua fase inicial em relação ao design e a engenharia, o software
não chega a adquirir um formato físico, permanecendo como um produto
lógico. Segundo ele, são três as principais características que distinguem o
software do hardware:

 O software é planejado e desenvolvido, mas não é manufaturado, o


que faz com que os custos de produção fiquem concentrados, em sua
maior parte, na fase de engenharia;

 O software não sofre desgaste ou depreciação física, as falhas no


funcionamento são consequências de deficiências em seu design; e

 O software é produzido manualmente.

Essas características do software materializam-se em vantagens que


abrem caminho para que plataformas de desenvolvimento sejam criadas
pensando somente em software. Isto se dá, principalmente, baseado em
tecnologias de hardware que são abertas, ou seja, que não demandam licença
do desenvolvedor do hardware. Essa filosofia é adotada há muito tempo nos
computadores pessoais e industriais, sendo conhecida como open standards.

Na computação, o termo open standards pode ser usado em uma ampla


gama de tipos de aplicação, que têm como princípio disponibilizar
documentações de uso de programação ou ferramentas que permitem seu uso
por terceiros da maneira que lhes seja conveniente, sem acesso ou
modificação interna.

A definição da ITU-T, agência ligada à Organização das Nações Unidas,


define o termo "open standard" da seguinte forma:

51
Open Standards são padrões disponíveis ao público geral e são
desenvolvidos (ou aprovados) e mantidos por meio de um processo
colaborativo e consensual. “Open Standards” facilitam a
interoperabilidade15 e o intercâmbio de dados entre diferentes
produtos e serviços e são planejados para serem adotados em
massa16 (ITU-T, s.d). (Tradução nossa).

Com o open standards, a tecnologia torna-se acessível sem dependência


de royalties ou de aprovação específica do fabricante. Assim, ela pode ser
utilizada por diversos desenvolvedores, eliminando um custo importante
tecnológico, de design e engenharia. Essa facilidade também pode ser
aproveitada por países que não tenham a dominação tecnológica do hardware
e, desta forma, podem ter a possibilidade de evoluir numa cultura de
desenvolvimento de software sobre plataformas open standards, criando,
assim, uma indústria própria e forte, com soluções que ultrapassam a barreira
tecnológica vigente. Podemos citar alguns exemplos de plataformas “open” e
populares de desenvolvimento, baseadas em software:

 Open Specifications Dev Center (MICROSOFT, s.d.) - Por meio do


programa Open Specifications, a Microsoft ajuda os desenvolvedores
a criar novas oportunidades, disponibilizando documentos técnicos
relacionados com a interoperabilidade para determinados produtos
populares da empresa;

 MSDN (MICROSOFT, 2015) - A Microsoft também disponibiliza o


canal MSDN, uma das principais fontes de documentação técnica da
companhia. Essa documentação inclui protocolos, linguagens de
computador, suporte de padrões e portabilidade de dados. Embora
uma grande parte dos documentos técnicos seja livremente
disponível, muitos deles incluem tecnologias patenteadas, sendo que
algumas dessas patentes estão disponíveis sem custos sob os termos
de uso específico ou sob contrato pontual;

15 “Interoperabilidade é a habilidade de dois ou mais sistemas de interagir e de intercambiar


dados de acordo com um método definido, de forma a obter os resultados esperados”, segundo
Santos (2008, p. 42).
16 Open Standards are standards made available to the general public and are developed (or

approved) and maintained via a collaborative and consensus driven process. "Open Standards"
facilitate interoperability16 and data exchange among different products or services and are
intended for widespread adoption.

52
 Open Handset Alliance (2007) - É um grupo de 84 empresas de
tecnologia em dispositivos móveis que se uniram para acelerar a
inovação de sua indústria e oferecem uma experiência melhor e mais
econômica. Dessa parceria, foi desenvolvido o projeto Android, uma
plataforma móvel aberta e livre para uso comercial em aparelhos e
serviços mobile.

Embora no passado existisse uma enorme barreira tecnológica que


bloqueava tanto física quanto tecnologicamente a entrada dos desenvolvedores
iniciantes, hoje o quadro está mudando de maneira significativa, assim
permitindo o acesso de empresas e indivíduos de produção de jogos que, de
outra maneira, não conseguiriam participar do mercado.

Tabela 03 – Dados de investimento em mercado de jogos digitais.


Fonte: NewZoo Games Market Research, 2015.

Esse alcance é notavelmente mais visto em países em que o


desenvolvimento de jogos digitais não faz parte das indústrias mais
tradicionais, ou seja, mesmo nas nações pobres e emergentes, vemos um
crescimento na participação na indústria de jogos digitais. Podemos notar um
progresso na indústria de jogos digitais brasileira, porém ainda estamos longe

53
de alcançar a mesma posição potencial de lucro atingido pelos países com
mais tradição na indústria.

Na tabela 03 (NEWZOO, 2015) acima, vemos que, entre os 15 maiores


produtores de jogos digitais, estão países desenvolvidos – como Estados
Unidos e Japão – e emergentes – China, Brasil e México, por exemplo. Isso
evidencia o potencial de crescimento da indústria de jogos digitais. O país com
maior produção são os Estados Unidos e a receita proveniente dos jogos
digitais ultrapassa a marca dos US$20 bilhões, enquanto, no Brasil, a receita
não ultrapassa US$1,4 bilhão.

De acordo com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas


Empresas - SEBRAE (2014), o setor brasileiro de games cresceu a uma taxa
de 30% entre os anos de 2011 e 2012 e, naquela época, já representava o
quarto maior mercado mundial. E as perspectivas de ampliação do segmento
são de quadruplicar o faturamento até 2016.

1.5. Problemática do mercado educacional de jogos

O potencial desta indústria reflete-se na procura, cada vez maior, por


desenvolvedores, programadores, engenheiros, entre outros, para atuar na
área e, consequentemente, a procura de cursos em jogos. Observamos que
um dos cursos mais procurados é o de jogos digitais.

Em uma pesquisa básica, podemos encontrar inúmeros cursos de jogos


digitais nas mais variadas localidades do país. Esse é um curso que,
particularmente, depende do uso das novas tecnologias, como forma eficaz de
inserir profissionais capacitados no mercado. Apesar de muitos desses cursos
serem custosos, existem iniciativas para ampliar o acesso de alunos, como o
Pronatec, do Governo Federal, e as FATECs, do Governo do Estado de São
Paulo, que oferecem a formação técnica ou tecnológica de forma gratuita.

Com o objetivo de facilitar o acesso ao ensino de qualidade para os


brasileiros de todo o país, o Programa Nacional de Acesso ao Ensino
Técnico e Emprego (Pronatec) foi criado pelo Governo Federal, em
2011, ampliando a oferta de cursos técnicos. O Pronatec tem como
objetivo democratizar a educação profissional e técnica, através do
aumento do número de vagas, ampliação de instituições pelo país e
bolsa de estudos aos interessados. Uma excelente oportunidade para

54
iniciar a carreira no mercado de trabalho, o Pronatec visa o seu
crescimento profissional (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2015).

Apesar de existir muitas faculdades e escolas que estão desenvolvendo o


ensino de jogos digitais, somente nos últimos anos esses cursos tornaram-se
alvos de estudos e pesquisas acadêmicas de forma sistematizada.
Observamos um exemplo desse dado quando olhamos os estudos realizados
pela FEP GAMES, que afirma que

O mercado de trabalho apresenta desequilíbrio entre a oferta e a


demanda. Ao mesmo tempo em que as empresas do setor sofrem
com a carência de profissionais experientes, os profissionais recém-
formados em cursos específicos do setor sofrem com a baixa oferta
de posições. (2014, p. 45)

55
Capítulo 2 – A Indústria de Jogos Digitais

A indústria de jogos digitais começa a se desenvolver a partir dos anos


60, com experimentos de entusiastas utilizando dispositivos eletrônicos. No
entanto, somente nos anos 80, quando surgem as tecnologias digitais, é que o
setor, realmente, se destaca. Ralph Baer, conhecido como o “pai dos
consoles”, foi o primeiro a desenvolver videogames.

Podemos dizer que, com o desenvolvimento do Odyssey, em 1972, a


partir do protótipo “Brown Box”, subsidiado pela Magnavox, a indústria de
videogames surge. Em 1972, a Atari desenvolveu “Pong”, um jogo de arcade
simples com uma tela escura que simula, de maneira bem primitiva, uma
partida de tênis.

Figura 05 - Criadores do jogo Pong para Atari: Ted Dabney, Nolan Bushnell e Al Acorn.
Fonte: Buzzfeed, 2012.17

Na época, o Pong da Atari fez bastante sucesso, tornando-se a base do


desenvolvimento de um console de videogame que mostrava um único jogo,
mas que, a partir de então, podia ser jogado em qualquer aparelho de TV
doméstico.

17Disponível em http://www.buzzfeed.com/chrisstokelwalker/atari-teenage-riot-the-inside-story-
of-pong-and-t?utm_term=.qlyRGEppY#.wk2vkRzzJ. Acessado em 15/11/2015.

56
Figura 06 – Pong versão console.
Fonte: Atari, 1975.18

Ao desenvolver o jogo Pong, a Atari começava a desenvolver uma


indústria que, até então, não tinha mercado (UOL, 2011). Ao mesmo tempo em
que o Pong fazia sucesso, talvez pelo baixo padrão tecnológico utilizado, a falta
de proteção digital ou legal permitiu que dezenas de outros fabricantes de
jogos fizessem videogames similares. No entanto, o modelo da indústria como
a conhecemos hoje foi realmente iniciado pela empresa Atari, em novembro de
1977, com o console Atari VCS (Video Computer System).

O modelo Atari VCS foi a base de negócio que viabilizou a indústria de


videogame e transformou os ícones culturais da década de 1980. Mesmo não
sendo uma novidade, o conceito da Atari explora melhor uma tecnologia vista
apenas no console Channel F, da Fairchild Semiconductor: a capacidade do
videogame de ser programável, ou seja, através de cartuchos, o console
poderia receber jogos novos.

No entanto, o modelo de mercado ainda não tinha sido formatado. Com


pouca valorização de seu trabalho e pensando em melhores condições, quatro
programadores da Atari deixaram a empresa em 1979 e fundaram a Activision,
que foi a primeira produtora third-party19 do mundo (MILWAUKEE JOURNAL,
1982).

18Disponível em http://www.atari.com/history/dedicated-consoles. Acessado em 22/11/2015.


19Eles desenvolveram o tema “third-parties”. Mais detalhes sobre o conceito tratado no item
2.1.1 a seguir neste texto.

57
2.1. A indústria no mundo

Segundo Ben Sawyer (FLEW e HUMPHREYS, 2005, p.101-114), da


Digitalmill, a indústria de jogos digitais é dividida em seis segmentos distintos:

 Financeiro e Publicadora: Está envolvido com o financiamento de


novos desenvolvimentos de jogos e buscando retorno de seu
investimento através de licenciamento de títulos.

 Produção e Talentos: Inclui desenvolvedores, designers e artistas,


que podem estar trabalhando sob contratos individuais ou como parte
de times dentro das publicadoras.

 Produção e Ferramental: Responsável por criar ferramentas de


produção, softwares de meio (middleware), game engines e
ferramentas de gerenciamento.

 Distribuição: É envolvido na criação de propaganda, catálogo de


jogos para venda no varejo e distribuição on-line.

 Hardware ou Plataforma: É responsável por criar e controlar as


plataformas de jogos específicos, como consoles, dispositivos móveis,
ou mesmo sistemas de vendas on-line e lojas virtuais. Essa camada
também inclui provedores de infraestrutura, rede de computadores e
provedores de tecnologia específica, incluindo máquinas virtuais ou
softwares de plataforma, como web browsers e redes sociais.

 Usuário Final: Aqui ficam os jogadores dos jogos digitais, gamers ou


players.

2.1.1. Third-party e publishers

Na indústria dos videogames, os desenvolvedores terceirizados (os third-


party) ou os publicadores (os publishers) participam ativamente dentro da
cadeia de produção. Um desenvolvedor terceirizado pode publicar jogos ou
trabalhar para uma produtora para desenvolver um título. Ambos, publicadora e
desenvolvedora, têm participação considerável em design e conteúdo do jogo.

58
Um publicador de videogame é uma empresa que publica jogos
desenvolvidos internamente ou através de subcontratação de um
desenvolvedor de jogos. Podemos fazer uma analogia às editoras de livros ou
gravadoras de filmes e música, uma vez que os publicadores de jogos são
responsáveis pela fabricação e comercialização dos produtos, incluindo
pesquisa de mercado e todos os aspectos da publicidade.

Eles costumam financiar o desenvolvimento, por vezes, contratando um


desenvolvedor de jogos externo ou uma equipe interna de desenvolvedores. As
grandes publicadoras de jogos podem ser responsáveis pela distribuição dos
jogos que publicam, enquanto publicadoras menores podem subcontratar
distribuidores ou publicadoras maiores.

Outras funções, normalmente desempenhadas pelo publicador, incluem


decidir pelo uso e pagar por qualquer licença que o jogo possa utilizar, como:
localização, layout, impressão, manual do usuário, criação de elementos de
design gráfico, projeto de embalagem etc.

Grandes editoras também podem tentar aumentar a eficiência em todas


as equipes de desenvolvimento internas e externas, oferecendo serviços como
o design de som e pacotes de código para funcionalidades comuns
necessárias.

Muitas vezes, a editora financia o desenvolvimento do jogo. Dessa


maneira, como o risco fica nas mãos da publicadora, a mesma também conta
com uma equipe de produtores e gerentes de projeto para monitorar o
progresso do desenvolvedor e prestar a assistência necessária.

Os jogos digitais que são criados por desenvolvedores externos são


pagos com os avanços periódicos sobre royalties e, para que eles trabalhem
juntos, normalmente, é criado um acordo comercial entre o desenvolvedor e o
publicador, regido por um contrato que especifica uma lista de marcos
destinados a serem entregues ao longo de um período de tempo. Com base no
contrato, o publicador verifica se o trabalho está progredindo e confere suas
metas.

59
2.1.2. Produção ou desenvolvedoras

Existem diversos tamanhos e tipos de empresas de desenvolvedores: as


grandes que podem manter várias equipes trabalhando ao mesmo tempo em
jogos distintos para múltiplas publicadoras, até as pequenas com poucos jogos
em desenvolvimento.

Segundo levantamento FEP Games (2014, p. 61), essas empresas têm


competência técnica para conduzir e/ou coordenar totalmente o
desenvolvimento dos jogos. Normalmente, as atribuições delas compreendem:
definir a arquitetura técnica dos jogos; conduzir a criação artística visual do
jogo; e selecionar e usar ferramentas, linguagens, frameworks e elementos
técnicos condizentes com as plataformas para as quais os jogos serão
desenvolvidos.

Essas empresas contam com profissionais de programação e arte, sendo


muito comum que as organizações contratem e coordenem a ação de terceiros
para suprir competências adicionais específicas, tais como serviços de arte e
animação, som e dublagem, captura de movimentos etc.

Existem, ainda, desenvolvedores de pequeno porte que partem para um


caminho alternativo, os chamados desenvolvedores independentes, ou indie
devs. Esses desenvolvedores são pessoas físicas ou jurídicas e podem
assumir, além das atividades descritas acima, todas as atribuições de uma
publicadora, com o objetivo de publicar seus próprios títulos.

2.1.3. Produção e ferramental

Neste item, estão incorporadas empresas que desenvolvem ferramentas


de auxílio ao desenvolvimento de jogos. Essas ferramentas podem ser
sistemas operacionais, drivers, componentes, engines, frameworks, IDEs
(Integrated Development Environments, ou Ambientes de Desenvolvimento
Integrado em tradução livre) e diversos outros softwares específicos para
ampliar a experiência dos usuários na criação de jogos eletrônicos.

Empresas como a Microsoft, Apple e Dolby Labs disponibilizam seus


SDKs (Software Development Kits, ou Kits de Desenvolvimento de Software

60
em tradução livre) gratuitamente aos desenvolvedores de jogos. Também
temos empresas, como Unity e Epic Games, que disponibilizam engines de
jogos com pacotes prontos para resolver as demandas mais comuns dos
desenvolvedores de jogos digitais. Essas organizações também podem
fornecer suporte técnico especializado e contar com o auxílio da comunidade,
para que novos recursos técnicos sejam explorados em novos jogos. Essas
companhias atuam, portanto, como parceiros técnicos dos desenvolvedores.

2.1.4. Hardware ou plataforma

Empresas como a Microsoft e Apple também fornecem hardwares para


jogos, ou seja, a plataforma onde funcionarão. Dessa forma, todo software é
desenvolvido para funcionar por meio de uma plataforma. De acordo com o
Free On-Line Dictionary of Computing (FOLDOC, 1994), hardware de
computador como plataforma pode referir-se a uma combinação específica de
hardware e sistema operacional e/ou compilador. Ele também é usado para
servir de suporte de software a uma determinada atividade. Dessa forma,
temos que os fabricantes de hardwares e plataformas são, basicamente, os
detentores da tecnologia necessária para desenvolver seus produtos e, assim,
poder trabalhar com os desenvolvedores como parceiros técnicos, por vezes
assumindo o lugar dos publicadores.

2.2. Indústria brasileira

No Brasil, há um grande número de empresas que desenvolvem jogos,


porém, podemos afirmar que a maioria delas se concentra no segmento de
desenvolvedores e estão localizadas nos polos comerciais do país. Poucas se
arriscam nos demais segmentos. Segundo a pesquisa sobre a indústria
nacional feita pelo FEP Games, podemos encontrar bons suportes para essa
afirmação, como o trecho e a tabela a seguir indicam:

Há concentração de empresas no estado de São Paulo, seguido


pelos estados do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro, o que
mostra que a maior parte das empresas se localiza nas regiões Sul e
Sudeste (FEP GAMES, 2014, p. 12).

61
Tabela 04 – Empresas de jogos por estado brasileiro.
Fonte: FEP Games, 2014.

Segundo o mesmo relatório da FEP Games, a maior parte das empresas


é composta por desenvolvedoras de pequeno porte, com faturamento anual de
até R$ 240 mil. A falta de atores nos níveis de publicador e de plataforma é
latente e, a partir de conclusões das pesquisas feitas pelo FEP Games, vemos
que a indústria nacional de jogos, no que diz respeito à sua cadeia de
produção, não está adequadamente estruturada, por apresentar ausência ou
insuficiência dos outros atores participantes da indústria.

Ainda segundo o mesmo relatório, a indústria brasileira tem pouca


expressão internacional, porque conta com poucas empresas desenvolvedoras
e editoras locais, que estão voltadas à produção de jogos de baixa
complexidade. Até o momento, podemos afirmar que não existe qualquer
empresa fornecedora de alguma plataforma que seja relevante ao mercado.
Existiram, porém, tentativas, como o Tectoy Zeebo, lançado em 2009,
considerado um console brasileiro promissor, mas que acabou fracassando
comercialmente.

62
A revista Época Negócios (FELITTI, 2011) afirmou que o Zeebo, até
então, havia vendido apenas 30 mil unidades, um número 20 vezes menor do
que o esperado pela companhia, o que causou enormes prejuízos à Tectoy.

Figura 07 – Console Zeebo, da Tectoy.


Fonte: UOL, 2014.20

Indo além do Zeebo, também há no país iniciativas em outros setores,


como o de ferramentas. Inclusive, algumas empresas brasileiras têm sua
própria engine, como a Ethanon Engine.

A Ethanon Engine (2014)21 é uma ferramenta gratuita e multiplataforma


de desenvolvimento de jogos 2D, focada na produção de um estilo de jogo
único: com visão partindo de cima para baixo, como visto em alguns Role-
Playing Games (RPGs) ou outros scrollers, sendo esses, jogos que seguem
uma narrativa evolutiva.

Podemos também citar a Ploobs Game Engine (2012)22, brasileira,


desenvolvida na linguagem C# usando XNA 3.1. As principais características

20 Disponível em http://jogos.uol.com.br/ultimas-noticias/2014/05/27/5-anos-de-zeebo-conheca-
os-bastidores-do-videogame-brasileiro.htm. Acessado em 17/11/2015.
21 Disponível em http://ethanonengine.com/. Acessado em 17/11/2015. Última atualização em

01/09/2014.
22 Disponível em http://ploobsengine.codeplex.com/. Acessado em 17/11/2015. Última

atualização em 13/06/2012.

63
incluem física integrada, inteligência artificial, luzes dinâmicas e sombra,
sistema de partícula, vegetação, tipos de materiais, som 3D etc. É uma engine
para ambientes 3D com diversas possibilidades.

2.3. Panorama atual

Nossa indústria tem uma trajetória ascendente notável. Os


computadores e jogos de videogame são formas de entretenimento
utilizadas por uma base de consumidores diversa e disseminada
mundialmente que demonstra imensa energia e entusiasmo para os
jogos. Com uma nova e estimulante geração de hardwares, softwares
excelentes, criatividade inigualável, tecnologia e conteúdo, a nossa
indústria continuará a prosperar nos próximos anos. (Michael D.
Gallagher, president and CEO, Entertainment Software Association).
(ESA, 2014). (Tradução nossa).23

A indústria de jogos vem modificando-se. Diferentemente da tradicional


venda de games em caixa, que tem seu lucro basicamente da comercialização
de cópias vinculadas e protegidas em sua mídia física, hoje temos diferentes
opções de compra que permitem a total desagregação da parte física,
anteriormente necessária, para carregar os dados digitais. A partir da
distribuição digital (também conhecida como entrega digital ou distribuição
eletrônica de software), o setor vem modificando-se ao usar a prática de prover
conteúdo em puro formato digital, baixado via Internet.

Vale dizer que a distribuição digital não teve seu nascimento no mercado
de jogos digitais, mas tem grande influência nas transformações ocorridas no
setor nos últimos anos, tendo como maior atrativo seu caráter direto; o
consumidor compra o game diretamente do produtor e imediatamente pode
baixá-lo para a plataforma escolhida (console, smartphone, PC, para citar
algumas). Dessa maneira, a distribuição digital aumentou muito e tem
caminhado para se tornar cada vez mais a regra do negócio, também
incentivada por novas plataformas, como dispositivos móveis.

23 Our industry has a remarkable upward trajectory. Computer and video games are a form of
entertainment enjoyed by a diverse, worldwide consumer base that demonstrates immense
energy and enthusiasm for games. With an exciting new generation of hardware, outstanding
software, and unmatched creativity, technology, and content, our industry will continue to thrive
in the years ahead.

64
Segundo a pesquisa da ESA (2014), smartphones e dispositivos portáteis
em geral tiveram um aumento de 22% e 37%, respectivamente, perante os
números de 2012. Segundo o relatório da NewZoo (2014), a expectativa é a de
que o mercado de dispositivos móveis ultrapasse o de consoles em
faturamento já em 2015.

Esse novo mercado de jogos não é apenas considerado novo pelas


mudanças na forma de venda ou no modelo de negócio, mas também pela
nova forma de criar e desenvolver jogos, como é o caso dos games casuais em
oposição às desenvolvedoras indie que adotam o modelo de desenvolvimento
baseado em suporte de publicadora.

No entanto, para realizar um trabalho comercial, os produtores precisam


entrar na cadeia produtiva da indústria tradicional. E, muitas vezes, esses
desenvolvedores encontram-se restritos às publicadoras, o que faz com que,
em diversos casos, sintam-se incapazes de fazer o conteúdo que desejam.

2.3.1. Casual

Um jogo casual é um jogo digital voltado para o público em geral, que não
é “gamer”, ou seja, jogador experiente. Essa categoria explora um tipo
específico de consumidor: o jogador casual. Jogos casuais podem variar em
estilo de jogabilidade e encaixam-se em diversos gêneros. Normalmente, são
distinguidos por suas regras simplificadas e pela falta da etapa de aprendizado
para jogar, além de contrastar com jogos tradicionais por não exigirem do
jogador uma dedicação de longo prazo. Esses games requerem menos prazos
para serem criados, o que leva a uma redução de custos de produção.

Em 2008, durante um dos eventos da GDC (Game Developers


Conference, ou Conferência de Desenvolvedores de Jogos em tradução livre),
em São Francisco, o CEO da PlayFirst, John Welch, afirmou que jogos casuais
são realmente um grande negócio e acredita que, embora o telefone celular
seja a plataforma ideal para a categoria, por alguma razão, ele ainda não se
estabeleceu. Sobre smartphones, Welch disse: “Todo mundo tem um, todo
mundo tem um em todos os momentos. Mas quem está realmente usando o
celular para baixar jogos? Pessoas comuns não baixam jogos; ainda” (BOYES,

65
2008). Hoje vemos que está é uma análise acertada, se observamos os
números da pesquisa FEP Games (2014, pp. 31-33).

2.3.2. Indies

Os desenvolvedores independentes são os criadores dos jogos chamados


indies. Eles são jogos digitais, normalmente criados por um indivíduo ou
pequenas equipes e, geralmente, sem apoio financeiro formal de um editor ou
de outra fonte externa. Esses jogos podem levar anos para serem construídos
a partir do zero ou concluídos em questão de dias ou horas, dependendo da
complexidade, dos participantes e do objetivo do projeto.

Segundo Chris Swain, professor da Escola de Artes Cinematográficas da


Universidade da Califórnia,

o movimento indie tem se expandido nos últimos anos. Dois fatores


estão levando a isso. Um deles é que existem programas de
formação de estudantes que incentivam a originalidade na
jogabilidade, porque equipes pequenas não conseguem diferenciar-
se graficamente. O segundo fator é que a distribuição digital
finalmente está presente, graças à penetração da banda larga em
grande escala e ferramentas onipresentes. (IRWIN, 2008).

O aumento da popularidade dos jogos independentes tem permitido o


desenvolvimento da difusão em plataformas populares de jogos como Xbox
Live, PlayStation Network, Steam e Nintendo eShop. Ao mesmo tempo, a
distribuição digital ajuda a impulsionar ainda mais o desenvolvimento
independente de jogos digitais, uma vez que não há custos com a parte física,
como embalagem, mídia digital e ponto de venda.

Essa mudança do modelo de negócios é vista no mundo todo como uma


chance de novas desenvolvedoras conseguirem alcançar um mercado
milionário e de, até então, poucos players.

Vemos que o incentivo à educação, junto com as inovações tecnológicas,


pode ser uma importante base para o mercado brasileiro de desenvolvimento
de jogos crescer e diferenciar-se.

66
2.4. A educação nos cursos de jogos – Histórico no Brasil

A educação relacionada a desenvolvimento de jogos digitais pode ter


vários focos, indo de game design à programação e pode incluir jogos
tradicionais como meta ou para serem usados na educação formal, inteligência
artificial, simulação de usos médicos etc. Em geral, os cursos de jogos digitais
têm como objetivo a imediata entrada no mercado de trabalho da indústria de
videogames, em constante expansão.

O ensino de desenvolvimento de jogos digitais não é recente nem um


novo fenômeno. Na realidade, o ensino de jogos digitais existe há mais de uma
década, iniciado nas universidades de computação próximas ao Vale do Silício.
O que é novo é o desenvolvimento e a adoção de tecnologias cada vez mais
sofisticadas de desenvolvimento e o estudo sobre os diversos tipos de
mercados.

Com o advento das tecnologias emergentes, os programas de formação


em jogos digitais estão expandindo-se em uma taxa crescente. Entretanto, com
frequência, aqueles que elaboram os projetos dos cursos tornam-se
apaixonados pelas tecnologias e desconsideram importantes assuntos,
especialmente as necessidades de aprendizagem dos alunos e o foco no
mercado de trabalho.

Pelo fato do Brasil ser um país de grandes dimensões, o desenvolvimento


de uma indústria sólida de jogos digitais será determinante para vencer o atual
atraso tecnológico. O ensino de jogos digitais é apenas mais um curso com
modelo educacional voltado ao ensino de tecnologia. Esse modelo tem, como
uma de suas nascentes, o estado de São Paulo, região historicamente mais
industrializada do país.

Em 1963, o Conselho Estadual de Educação do estado de São Paulo


(CEE-SP), aprovara o parecer 44/63, onde são levantadas as
primeiras justificativas para a criação de uma nova modalidade de
profissionais, constituída por estudantes para ocuparem funções
chamadas de auxiliares de engenheiros, na indústria. (PETEROSSI,
1980, p. 35).

Destacamos também as experiências vindas de outros países, onde


existiam instituições específicas para esse tipo de curso, como Colleges of

67
Advanced Technology, na Inglaterra, Juniors Colleges, nos EUA, Instituts
Universitaires de Technologie, na França entre outros.

Visando atender à demanda de uma sociedade em contínuo


desenvolvimento tecnológico e com grande capacidade para abrigar novos
estudantes nesta área de atuação, foi criado, em 1969, o Centro Estadual de
Educação Tecnológica de São Paulo que, mais tarde, passou a se chamar
Paula Souza (CEET-PS).

Em 1970, o Conselho Federal de Educação, através do Parecer n. 278/70


CFE/CESu (MOTOYAMA, QUEIROZ, TAIRA, NAGAMINI, & SOUZA, 1995),
reconheceu os planos de curso propostos por esta instituição e, desse formato
novo, podemos destacar os seguintes pontos:

 A nomenclatura específica usada neste tipo de formação foi definida


como “cursos técnicos de nível superior”; e

 Os cinco cursos aprovados foram: Técnico de Nível Superior em


Construções Civis, modalidade Edifícios; Técnico de Nível Superior
em Construções Civis, modalidade Movimento de Terra; Técnico de
Nível Superior em Construções Civis, modalidade Obras Hidráulicas;
Técnico de Nível Superior em Mecânica, modalidade Desenhista-
Projetista; e Técnico de Nível Superior em Mecânica, modalidade
Oficinas.

Esses pontos destacados demonstram que não se tratavam de cursos de


engenharia específicos, mas, sim, de perspectiva mais ampla. Tratavam-se, na
verdade, de cursos com uma duração menor do que os cursos de nível
superior até então existentes. Conforme o parecer de 1970, esses novos
cursos teriam um total de 2.450 horas-aula, em dois anos de estudos. Os
cursos de jogos digitais no Brasil seguem esse modelo de curso tecnológico,
para serem desenvolvidos em menor tempo de duração.

2.5. Modelos de educação

Os vários modelos de curso de jogos digitais não só diferem nos graus de


aprofundamento e tipos de tecnologias que são usados, mas também na forma

68
de aplicação do conteúdo e no local de instrução. Em alguns modelos, os
professores têm disponível uma sala teórica, um ambiente de sala de aula
tradicional. Em outros, os professores têm acesso a um laboratório, ou um
misto das duas aplicações.

De modo geral, as faculdades de tecnologia em jogos digitais procuram


ser multidisciplinares, como o próprio desenvolvimento de jogos sugere que o
seja, mas dada a característica tecnológica e o pouco tempo do curso,
podemos observar três padrões identificáveis nos modelos educacionais das
faculdades de tecnologia em jogos digitais, que são:

 Foco em programação: São conteúdos especialmente estruturados


para o aprendizado de programação, com matérias que envolvem
lógica e linguagens de programação desde os primeiros semestres.
Normalmente, possuem, em sua maioria, docentes que pertencem ao
departamento de computação e professores programadores.

 Foco em design: São conteúdos criados com ênfase no design dos


jogos, ou seja, as matérias são mais voltadas às áreas de humanas
nos semestres iniciais e as aulas práticas são feitas com software
normalmente utilizado para design. Em geral, possuem, em sua
maioria, professores ligados a design digital e áreas de humanas em
geral.

 Foco em negócios: São conteúdos com foco na indústria de jogos,


em que, nos primeiros semestres, os alunos têm contato com
conceitos de jogos digitais e ferramentas de mercado, também com
maior quantidade de aulas de gestão, publicação, administração e
empreendedorismo.

2.6. Tecnologias disponíveis para a educação

O perfil de quem ingressa nos cursos de jogos é diferente do aluno de


análise de sistema ou ciência da computação. O ingressante no curso
de jogos vem com uma motivação diferente dos outros alunos de
informática, normalmente baseada em grandes jogos de última
geração, que despertam uma espécie admiração. (RAMOS, 2009,
p.32)

69
As tecnologias disponibilizadas para o uso no ensino de tecnologia de
jogos digitais são de vital importância para o desenvolvimento do curso. Os
alunos de jogos digitais são pessoas constantemente atualizadas com a
vanguarda da tecnologia, estando a par das últimas novidades da indústria de
jogos digitais. Por esse motivo, o uso de tecnologia de ponta é vital.

Entre os desafios, podemos citar o fato de o docente correr o risco de se


desatualizar tecnicamente referente a alguma tecnologia, dada a velocidade de
sua expansão. A tecnologia disponível inclui ferramentas de desenvolvimento,
fruto da criação e transformação humana, e assumem grande relevância na
maneira como o homem se relaciona com o mundo e como se relaciona com
os outros indivíduos.

Temos que entender que a criação de jogos digitais é uma tarefa de alta
complexidade e de vanguarda tecnológica; não se pode considerar a
implementação de um curso desse nível sem total aporte tecnológico. As
tecnologias de vanguarda vão desde engines atualizadas até ferramentas de
modelagem e criação artística, frequentemente em sua última versão. Essa
necessidade de atualização frequente é um dos maiores problemas para as
instituições de ensino, pois há um custo de licença de software quando se
atualiza para uma versão crítica, e, com frequência, são essas versões que
trazem o maior número de inovações.

2.7. Ambiente de aprendizagem

O ambiente de aprendizagem também influencia muito na qualidade que


o curso de desenvolvimento de jogos pode apresentar. Temos que ter em
mente que o aluno de jogos digitais já não vê o laboratório de informática com
os mesmos olhos de antes, ou seja, os computadores não são mais objetos
estranhos que precisam ser explorados e compreendidos; estamos falando de
uma geração que já nasce digital.

Garotas e garotos da Geração Z, em sua maioria, nunca conceberam


o planeta sem computador, chats, telefone celular. Por isso, são
menos deslumbrados que os da Geração Y com chips e joysticks.
Sua maneira de pensar foi influenciada desde o berço pelo mundo

70
complexo e veloz que a tecnologia engendrou (SCHULTZE, 2001, p.
14).

De certa forma, os laboratórios das faculdades, em geral, têm aparência


obsoleta, mesmo que disponham de desktops de último tipo e projetores de
boa qualidade. Tendo isso em mente, é possível traçar um paralelo com a
chamada geração Z (SCHULTZE, 2001, p. 14), que está acostumada com
produtos que estão muito à frente do que um laboratório normalmente
disponibiliza e que têm afinidade com a tecnologia e facilidade em se atualizar.

Figura 08 – Um laboratório de aula típico do Senac São Paulo.


Fonte: Senac São Paulo, 2015.24

Como podemos observar, o laboratório de aula possui computadores


tradicionais com mouse, teclado e monitor de LCD típico. Podemos até estimar
uma configuração padrão para essas máquinas: um processador da Intel, como
o Core i5 de quatro núcleos, em torno de 4GB de memória RAM, placa de
vídeo NVidia 3D de baixa tecnologia, teclado comum, mouse óptico tradicional
e, por fim, monitor FullHD de resolução típica de 1080x920 pixels.

24 Disponível em
http://www.sp.senac.br/jsp/default.jsp?newsID=a514.htm&testeira=367&unit=TIT&sub=1.
Acessado em 17/11/2015.

71
No entanto, não podemos nos basear em apenas suas configurações
para dizer que esse laboratório pode ser perfeitamente usável nos cursos
relacionados à computação, mas não para o de jogos digitais. Afinal, é possível
desenvolver jogos digitais de qualidade usando esse padrão. Não podemos
esquecer que são necessários equipamentos especializados para produzir
games de plataformas diversas.

Figura 09 – iPhone SE.


Fonte: Apple, 2015.25

Por exemplo, no smartphone mais vendido em 2014, o Apple iPhone 5S


(THE TELEGRAPH, 2014), podemos observar os seguintes aspectos: o
hardware dessa interface eletrônica possui um processador cyclone (baseado
em ARM v8) de duplo núcleo e 1GB de memória RAM, placa de vídeo
PowerVR e tela de 640 X 1136 pixels.

Se fizermos uma análise detalhada da resolução da tela do celular,


veremos que é impossível simularmos toda a tela do celular dentro do monitor.
Embora as resoluções não sejam discrepantes, podemos observar que, devido
às dimensões físicas e ao modo de uso de um smartphone e de um
computador tradicional, tentar desenvolver um jogo digital para o celular
possuindo apenas o PC como referência, é algo difícil.

25 Disponível em http://www.apple.com/iphone-se/. Acessado em 02/02/2016.

72
Outra tecnologia que é complicada para desenvolvimento em um
laboratório típico são os consoles. Tomemos o Sony PlayStation 4, videogame
mais vendido em 2014; são enormes os desafios para se desenvolver para
esta plataforma por meio dos PC. De fato, o equipamento possui as seguintes
especificações: processador AMD Jaguar de oito núcleos, 8GB de memória
RAM, placa de vídeo AMD Radeon de alta tecnologia. Por causa da alta
resolução das telas, podemos inferir que o PlayStation 4 pode ser ligado em
televisores FullHD.

Embora, nesse caso, a resolução não seja problema, é fácil perceber que
o console de videogame tem vantagens sobre computadores típicos. Outra
coisa que vale ser salientada é o tipo de dispositivo de entrada; nos
videogames temos exclusivamente o joystick.

Além de óbvia a diferença tecnológica entre consoles e computadores


típicos, ainda esbarramos em outro obstáculo, que é a dificuldade de adquirir
os Kits de Desenvolvimento para os consoles, que permitem aos alunos o
desenvolvimento de jogos para plataformas dedicas.

2.8. Hardware de suporte

De fato, uma das etapas cruciais para se desenvolver jogos são as


interfaces apropriadas e dedicadas que são conhecidas como consoles ou
videogames. Existem diversas vantagens de se jogar em um console:

 Jogos podem ser otimizados para o aparelho: Criar um software


feito especificamente para uma plataforma é bem mais simples do
que fazê-lo pensando em milhares de dispositivos diferentes com
configurações diversas. Utilizar uma plataforma dedicada permite que
os desenvolvedores tenham custos fixos de produção e, assim,
possam lançar seus jogos com mais segurança e mais rapidamente
no mercado. Também significa que o jogo funcionará com sua
performance máxima sem problemas, pois o desenvolvedor testa seu
aplicativo em um equipamento idêntico ao do usuário.

 Padronização dos controles: Dispositivos diferentes têm controles


diferentes. Isso implica que o desenvolvedor deve gastar parte de seu

73
processo pesquisando e testando diferentes métodos de entrada,
como telas de toque, teclados, diferentes tipos de mouse,
acelerômetros etc., enquanto que o desenvolvimento para um console
específico tem o joystick padrão do aparelho como base. Isso significa
que o jogador não precisa configurar botões ou trocar seu dispositivo
de entrada para conseguir jogar.

 Compartilhamento de jogos: Jogos de console são intercompatíveis


entre si e, frequentemente, não possuem mídia física similar, não
podem ser emprestados e compartilhados. Também não é uma
pratica comum a compatibilidade para jogos comprados on-line em
outras plataformas, como smartphones. No entanto, algumas
empresas entendem o compartilhamento de jogos como uma ameaça
para a venda de seus produtos. A Microsoft, por exemplo, propôs um
sistema de proteção e compartilhamento de jogos para o Xbox One
para evitar a pirataria.

 Confiabilidade do equipamento: É bem comum que um jogador de


PC compre seu sistema de maneira personalizada, ou seja,
escolhendo peças individualmente e customizando o seu computador
antes de pagá-lo. Como esse sistema é composto de peças de
fabricantes diversos, por vezes, o computador sofre com a
inconsistência de desempenho, o que exige que o próprio jogador
seja capaz de resolver a maioria dos problemas que possam
acontecer, desde defeitos no sistema operacional, incompatibilidade
de drivers e peças com performance comprometida. Esse tipo de
obstáculo é inimaginável em um console, em que bugs foram testados
e sanados, tanto em nível de hardware como de software, e o jogador
não tem quase nenhum trabalho sobre a manutenção do mesmo.

 Seu console pode jogar qualquer jogo: Quando um novo jogo de


última geração é anunciado, a primeira coisa que um jogador de PC
ou de celular costuma pensar é se seu dispositivo suportará o
aplicativo. No caso dos jogadores de PC, muitos já pensam em mudar
sistemas ou mesmo fazer trocas de componentes em seus
computadores, como colocar mais memória e trocar placas de vídeo.

74
Para os jogadores de videogame, isso não existe; se um jogo novo
saiu para o console, basta ir a uma loja física ou virtual e adquiri-lo.

Por conta dos benefícios de se ter um console, esse aparelho ainda


possui uma grande procura. Esse fenômeno não é muito diferente com o aluno
de jogos. O desenvolvimento de consoles é visto como algo misterioso fora do
alcance do desenvolvedor comum, o que gera certa curiosidade e, às vezes,
até um sonho de se produzir “jogos de verdade”.

Vale dizer que, antes da mais recente geração de consoles (ou seja, Sony
PlayStation 4, Microsoft Xbox One e Nintendo Wii U), o método para produção
de jogos, mais precisamente sua programação, era significativamente diferente
do que para PCs. No entanto, nas últimas gerações, os consoles passaram a
usar a mesma arquitetura de software encontrada nos PCs, tornando o
desenvolvimento de jogos muito semelhante entre os dois formatos.

Determinar hoje qual formato é o mais fácil de desenvolver é uma


resposta a uma pergunta não muito clara, já que ambos têm vantagens e
desvantagens distintas, mas ainda podemos citar a vantagem dos consoles
terem um padrão de hardware como um dos fatores que aumentam a
simplicidade de produção. Para computadores, ao contrário, há uma infinidade
de processadores, placas de vídeo e placas de som, entre outros tipos de
hardware, para se preocupar. Por outro lado, o hardware fixo pode ser visto
como um ponto negativo para o console, uma vez que jogos desenvolvidos
para videogames têm uma limitação técnica mais baixa (AULETTO, 2014).

Para se desenvolver para console, como já foi mencionado, é necessário


um hardware específico em conjunto com seu software específico, conhecido
como DevKit – Kit de Desenvolvimento para videogames. Um Kit de
Desenvolvimento é tipicamente um conjunto de ferramentas de
desenvolvimento de software e hardware que permite a criação de aplicações
para um determinado pacote de software, estrutura de software, plataforma de
hardware, sistema de computador, console de videogame ou sistema
operacional.

Para criar jogos específicos para uma plataforma como as mencionadas


acima, deve-se baixar o Kit de Desenvolvimento de software (um Software

75
Development Kit, ou SDK) e, talvez, adquirir um hardware proprietário de
acesso restrito. Por exemplo, caso o desenvolvedor queira criar um aplicativo
para a plataforma Android, precisará de um SDK específico, para aplicativos
iOS, é necessário um iOS SDK, e, para o PlayStation 3, o Sony PlayStation 3
Development Kit DECR-1000A é indispensável.

Figura 10 – Kit de Desenvolvimento do PlayStation 3, DECR-1000A.


Fonte: Sony, s.d.

O kit da figura acima está disponível na Edinburgh Napier University como


um recurso de seus cursos de graduação e pós-graduação (EDINBURGH
NAPIER UNIVERSITY, 2015) ligados ao desenvolvimento de jogos digitais.
Esse DevKit também é encontrado na Universidade de Newcastle
(NEWCASTLE UNIVERSITY, 2015) para seus cursos de mestrado.

2.8.1. PlayStation Academic Program

A presença desses kits dentro das universidades é possível, pois a Sony


possui um programa de inclusão de desenvolvimento para consoles nas
faculdades, chamado PlayStation Academic Program (SONY COMPUTER
ENTERTAINMENT, 2013). O objetivo é estabelecer parcerias com
universidades e instituições acadêmicas seletas, incluindo as tecnologias
PlayStation como uma parte crítica de seu currículo de ensino. Dessa maneira,
a Sony disponibiliza acesso ao Kit de Desenvolvimento de hardware e
software.

Os Kits de Desenvolvimento são bem difíceis de se conseguir e, como a


Microsoft expôs em um de seus FAQs (Frequently Asked Questions, ou
Perguntas Feitas com Frequência, em tradução direta):

Atualmente, não oferecemos dev kit para estudantes ou


universidades. Licenças de dev kits são oferecidas apenas para

76
empresas profissionais de desenvolvimento de games que passaram
por nosso processo rigoroso de qualificação (MICROSOFT, 2015).
(Tradução nossa)26

Em geral, os Kits de Desenvolvimento não são disponíveis ao público ou


mesmo para universidades; apenas para empresas que passam por rigorosos
processos de qualificação. Esses obstáculos são os padrões da indústria e,
dificilmente, vemos um programa como esse da Sony, de modo que é
extremamente raro para os alunos e pesquisadores terem acesso a
ferramentas de desenvolvimento de jogos profissionais.

Mesmo com o programa da Sony, poucas universidades têm acesso aos


DevKits, como a mesma diz em seu site27: “Nosso objetivo é estabelecer
parcerias com universidades e instituições acadêmicas selecionadas e
inspiradas pelas tecnologias do PlayStation®” (SONY COMPUTER
ENTERTAINMENT, 2013).

Outra restrição são as fortes amarras de direitos autorais. Mesmo que se


tenha o DevKit em universidades, nas salas de aula dos cursos brasileiros de
graduação em jogos digitais não é encontrado nenhum tipo de console de
desenvolvimento ou laboratório preparado para produção de jogos em console.

2.9. Hardware livre

Para a limitação de hardware e para o acesso aos SDKs, existe


alternativa que pode ser explorada, por exemplo, o Open Handset Alliance
(2007), um grupo de 84 empresas de tecnologia que se juntaram em busca de
um padrão de plataforma aberta e desenvolvimento para Android.

Com hardware livre, podemos desenvolver para plataformas específicas


sem a burocracia de um Kit de Desenvolvimento, ou seja, não há limites
técnicos nem restrições de direitos autorais.

26 We currently do not offer dev kits to students or Universities. Dev kits licenses are only
offered to professional game development companies that have passed our rigorous
qualification process.
27 Our aim is to establish partnerships with select universities and academic institutions inspired

by PlayStation® technologies.

77
O exemplo mais comum é a plataforma Android, que tem como
característica ser open source sob a licença comum Apache. Isso significa que
ela tem um licenciamento que aceita que o software seja livremente modificado
e distribuído por fabricantes de aparelhos, operadoras, desenvolvedores e
entusiastas.

O desenvolvimento para Android não necessita de hardware específico,


podendo ser utilizado o SDK disponibilizado pela Google ou Open Handset
Alliance. Assim, o custo para se adquirir e desenvolver nessa plataforma
consiste apenas da aquisição do hardware em si.

2.9.1. Hardwares

Entre os participantes do Open Handset Alliance temos muitos


fabricantes. Entre eles, temos a Acer, Dell, LG, Motorola, Samsung, Sony,
Toshiba, só para citar alguns mais conhecidos. Dessa maneira, vários
hardwares são produzidos, facilitando o acesso à plataforma específica, pois os
custos do hardware diminuem dada a oferta de aparelhos ser tão grande. Em
sua maioria, esses aparelhos são dispositivos móveis do tipo smartphones ou
tablets.

Figura 11 – Dispositivos Android.


Fonte: Google, 2015.28

28 Disponível em http://www.android.com/intl/pt-BR_br/. Acessado em 17/11/2015.

78
Também há a disponibilidade de Kits de Desenvolvimento para os
desenvolvedores avançados e entusiastas, baseados em hardwares mais
básicos, chamados de single-board computers.

2.9.2. Single-board computers

Um single-board computer é um sistema computacional completo


construído em apenas uma placa de circuito integrado que, normalmente, já
inclui microprocessador, memória e dispositivos de entrada e saída de dados,
além de outras especificidades necessárias para um computador funcional.
Normalmente, essas placas são utilizadas como sistemas de demonstração e
para desenvolvimento ou uso educacional.

Diferente de um computador tradicional, single-board computers são mais


parecidos com sistemas integrados, pois não oferecem slots de expansão para
periféricos. Um single-board computer pode ser baseado em plataforma aberta
ou não. Um exemplo bem conhecido que é usado para desenvolvimento de
cursos de computação e para produção de material didático, é a placa Arduino.

2.9.3. Arduino

Arduino é uma plataforma de prototipagem de código aberto e faz parte


de uma comunidade de usuários que projetam e produzem kits
microcontrolados para construção de aparelhos digitais e objetos interativos.
Para desenvolver produtos com Arduino utilizamos a linguagem de
programação Arduino (baseada na linguagem de programação do Processing),
e o software Arduino (IDE).

79
Figura 12 – Uma placa Arduino.
Fonte: Arduino, 2015.29

Embora o desenvolvimento de jogos com Arduino seja possível e até


estimulado com projetos como o Gamebuino (2013)30, a qualidade e a
sofisticação desses jogos ainda são muito rudimentares e não suprem todas as
necessidades de um curso de jogos digitais, tampouco da indústria, já que esse
é um single-board de baixo custo que não tem esse objetivo.

Figura 13 – Console Gamebuino baseado em Arduino.


Fonte: Gamebuino, 2015.31

29 Disponível em http://www.arduino.cc. Acessado em 12/11/2015.


30 Disponível em http://gamebuino.com/. Acessado em 08/11/2015.
31 Disponível em http://gamebuino.com/. Acessado em 12/11/2015.

80
2.9.4. Raspberry Pi

Rapsberry Pi (BUSH, 2011) é um single-board computer desenvolvido


pela Raspberry Pi Foundation, também de código aberto, com a intenção de
promover o básico da ciência da computação nas escolas. O Raspberry Pi
possui uma grande quantidade de usuários e sua comunidade gigantesca
concentra esforços de desenvolvimento e documentação.

Figura 14 – Uma placa Raspberry Pi.


Fonte: Raspberry Pi, 2015.32

Assim como com o Arduino, uma das características mais importantes do


Raspberry Pi é a grande comunidade (ELINUX, 2014) de desenvolvedores, que
oferecem diferenciação nas opções de desenvolvimento, o que faz com que
seja um dos mais requisitados single-board computers entre desenvolvedores
de sistemas e estudantes.

Já há um grande número de blogs e fóruns florescendo para fomentar


discussão sobre o projeto e a convergência para essa
intercomunicação foi recentemente destacada por Jamie Ayre, diretor
de marketing da AdaCore, uma provedora de soluções de software
comercial para a linguagem de programação Ada tipicamente usada
no desenvolvimento de aplicações grandes e de longo prazo. Ayre diz
que, possivelmente, uma das partes mais empolgantes do projeto

32Disponível em http://www.raspberrypi.org/blog/raspberry-pi-2-on-sale/. Acessado em


12/11/2015.

81
Raspberry Pi é a comunidade RPi em si. (BRIDGWATER, 2012).
(Tradução nossa).33

O Raspberry Pi é um single-board computer muito mais poderoso do que


o Arduino e os dois são comercializados por valores muito próximos. Possui
saída de vídeo que permite desenvolvimento de jogos mais avançados.

2.9.5. Odroid

Odroid (HARDKERNEL CO. LTD., 2015) é uma série de single-board


computers criada pela Hardkernel Co. Ltd., empresa localizada na Coreia do
Sul. O nome é um trocadilho com as palavras Open (de Open Source ou Open
Platform) e Android. O Odroid possui uma comunidade grande, mas ainda não
é comparável em tamanho às comunidades do Raspberry Pi ou do Arduino.

O hardware mais avançado até a publicação deste trabalho e usado nos


experimentos é o modelo XU4, que conta com processador ARM Cortex de oito
núcleos e placa gráfica aceleradora 3D com total suporte a OpenGL ES 3.0.
Assim, a capacidade de executar aplicativos Android e contar com hardwares
que estão disponíveis no mercado torna essa plataforma ideal para o
desenvolvimento de jogos de alta qualidade.

33There are already a number of blogs and forums blossoming to fuel discussion around the
project and the "hub" for this intercommunication has recently been highlighted by Jamie Ayre,
marketing director at AdaCore, a provider of commercial software solutions for the Ada
programming language typically used in design for large, long-lived applications. Ayre says that
possibly one of the most exciting parts of the Raspberry Pi project is the RPi Community.

82
Figura 15 – Uma placa Odroid.
Fonte: Hardkernel, 2015.34

2.10. A importância do material didático nos sistemas educativos

A partir de agora, vamos focar nossas reflexões no uso de materiais


didáticos e plataformas computacionais para o ensino e aprendizagem e o
desenvolvimento de jogos digitais. Segundo o glossário do Webeduc do MEC
(2015), material didático é “todo material que serve de apoio/recurso para o
processo de ensino e aprendizagem”35. Ou seja, podemos classificar os
laboratórios de informática da instituição de ensino e suas ferramentas
complementares como materiais didáticos disponíveis para os alunos de jogos
digitais.

As faculdades e escolas devem possuir meios de dar suporte aos


ensinamentos transmitidos aos alunos. Livros, apostilas, ebooks, equipamentos
eletrônicos de última geração, computadores, tudo isso faz parte de um
processo de aprendizagem mais sólido que ajuda o aluno a reter melhor o
conteúdo.

Materiais didáticos são mediadores entre professor, alunos e o


conhecimento. [...] Além dos tradicionais livros, existem outros
materiais didáticos produzidos em diferentes suportes e com

34 Disponível em http://www.hardkernel.com/main/main.php. Acessado em 17/11/2015.


35 WEBEDUC. Glossário Geral. MEC, 2015. Disponível em
http://webeduc.mec.gov.br/linuxeducacional/curso_le/glossario.html. Acessado em 08 Nov.
2015.

83
diferentes funções, cujos resultados no ensino e aprendizagem ainda
precisam ser avaliados. [...] Se forem assim entendidos, não é difícil
compreender que um dos elementos fundamentais da relação que
estabelecemos com eles está na intencionalidade que guia a escolha
e a utilização dos materiais didáticos, em diferentes situações e com
diferentes finalidades. [...] Segundo entendo, a produção de
conhecimentos sobre os materiais didáticos, que havia perdido
espaço na pesquisa educacional, ganhou centralidade nos últimos
anos, em grande parte pela abertura de um vastíssimo campo de
produção de materiais escritos para os cursos de educação a
distância e de materiais para uso em computadores. (GARCIA, 2011).

Garcia ainda menciona que, nos últimos anos, o material didático tem
ganhado espaço com o desenvolvimento de plataformas diversas e a facilidade
de criação de novos materiais utilizando as tecnologias. Segundo Kenski:

O uso das tecnologias na educação não é algo recente, nada que


esteja necessariamente ligado ao uso dos computadores como
mediadores do processo de ensino-aprendizagem. A linguagem
configura como uma das principais tecnologias utilizadas como
ferramenta de ensino. (KENSKI, 2005, p. 9).

Seguindo esse raciocínio, podemos inferir que os laboratórios de


informática apresentam como finalidade básica servir de apoio didático-
pedagógico a docentes e discentes da instituição, por meio da disponibilização
de serviços e recursos específicos, proporcionando aos alunos testar seus
algoritmos na prática e, assim, ver instantaneamente seus erros e acertos de
compilação. Nesse contexto, podemos definir que o laboratório é vital para os
cursos de computação.

Por ser um curso que, de certa forma, deriva dos cursos de computação,
as graduações, pós-graduações e cursos técnicos de jogos digitais estão
ligados aos departamentos e faculdades de computação porque necessitam
dos laboratórios de informática.

2.10.1. Burocracia da instituição de ensino

Em muitas instituições que possuem os cursos de jogos digitais e


laboratórios de informática, encontramos os departamentos responsáveis pela

84
manutenção dos equipamentos que são os departamentos de tecnologia de
informação ou de TI. Essa área é responsável por administrar o ambiente de
laboratório, mantendo em funcionamento os hardwares como os softwares.

O departamento de TI gera um custo para faculdade, pois, de certa forma,


há o consumo de hardware, que são constantemente adquiridos, e de software,
que precisam estar atualizados. Também não podemos esquecer-nos dos
funcionários responsáveis por identificar problemas e solucioná-los a fim de
que esteja tudo funcionando para as aulas.

2.10.2. Acesso à máquina e políticas de segurança

Nas universidades com departamento de computação, que lecionam


cursos como os de Tecnologia da Informação, Ciência da Computação, Jogos
Digitais e similares, como é o caso da PUC-SP, a dependência de profissionais
da área de TI não é tão grande, pois consideramos que os professores dessas
faculdades de computação são os formadores dos futuros profissionais que
trabalharão nessas áreas de atuação. Os docentes, portanto, estão no estado-
da-arte36 do conhecimento de informática, não só das disciplinas que lecionam,
como também da informática básica em geral.

Diferentemente do que vemos em escolas primárias,

A introdução de computadores nas escolas, antes mesmo de


apresentar os primeiros resultados desejados, coloca em evidência a
necessidade de se refletir sobre uma série de problemas, que vão
desde a preparação dos professores até a falta de recursos para a
compra de equipamentos. (BRANDÃO e TEIXEIRA, 1993, p. 2).

Podemos inferir aqui que o conhecimento básico é aquele que permite a


correta manutenção e uso dos aparelhos sem que esses causem danos ou
mesmo que consigam corrigir por si só algum erro que possa ocorrer. Dessa
maneira, poderíamos considerar que o apoio técnico é menos necessário, o
que faz com que se diminua a dependência da equipe de TI, diferentemente do
observados nas escolas primárias.

36 Estado-da-arte, ou experiência e arte, é o nível mais alto de desenvolvimento, seja de um


aparelho, de uma técnica ou de uma área científica, alcançado em um tempo definido. A
origem da expressão está no Livro I da Metafísica de Aristóteles.

85
2.10.3. Atualização de material

Existe uma demanda em alguns mercados de tecnologia por softwares


atualizados. Isso se deve, entre outras coisas, à velocidade com a qual esse
setor desenvolve-se; precisamos das últimas versões de sistemas
operacionais, editores de imagem, game engines etc.

Segundo a Lei de Moore, que diz que o “número de transistores dos chips
teria um aumento de 100% a cada período de 18 meses” (MOORE G. E., 1998,
pp. 82-85), os hardwares ficam cada vez mais potentes em um espaço muito
curto de tempo e os softwares precisam acompanhar esse estado, correndo o
risco de ficarem obsoletos.

Sabemos que o mercado de games frequentemente esteve no topo dos


avanços tecnológicos do TI também devido ao uso constante da computação
gráfica, exigindo, dessa maneira, placas gráficas e hardwares em geral cada
vez mais potentes. Por esse motivo, os cursos de jogos digitais necessitam de
constante atualização constante em seus laboratórios, que não devem tornar-
se reféns de burocracias para a aquisição de equipamentos, que, por mínimas
que sejam, pode deixar todo o recém-adquirido equipamento já obsoleto.

Um dos indícios da diferença da evolução tecnológica diferenciada


impulsionada pelos jogos digitais são os hardwares dedicados a jogos
construídos pelas maiores fabricantes de PCs durante as últimas décadas.
Como exemplo, podemos citar o Compaq 5600s, de 1999, modelo que tinha
uma especificação muito alta para seu ano de lançamento, além de contar com
uma dedicada placa gráfica 3D (CASTLE, 2011).

86
Figura 16 – Compaq 5600s (1999). Sua CPU continha um processador AMD K6-III 450MHz e
na GPU, um Diamond Viper 550, 16MB RAM e 128MB SDRAM.
Fonte: MaximumPC.com, 1999.

Figura 17 – Jogo Quake 3 Arena, de 1999.


Fonte: Rock Game Steam, 2015.37

Podemos ver o exemplo gráfico do jogo Quake 3 Arena, considerado um


dos jogos de ponta na época. A imagem acima demonstra a máxima
capacidade visual do hardware que é dedicado para jogos da plataforma
Compaq. Já com uma comparação direta, em 12 anos de evolução dos
hardwares, temos computadores como o Alienware Aurora, de 2011, com uma

37Disponível em http://rockgamesteam.blogspot.com.br/2013/07/quake-3-arena-download-
pc.html. Acessado em 17/11/2015.

87
diferença muito grande do hardware para relativamente pouco tempo de
desenvolvimento. Dessa vez, a fabricante é a Dell, que possui uma
especificação muito alta e apoia-se em uma placa gráfica dedicada e topo de
linha.

Figura 18 – Dell Alienware Aurora. A CPU leva um processador Intel Core i7-2600K 3.9GHz.
Na GPU, um 2x AMD Radeon HD 6950 com 2GBRam e 4GB DDR3 SDRAM.
Fonte: Dell, 2011.38

Essa máquina tem o poder de fazer funcionar um jogo como o Skyrim, de


2011, com muito detalhe gráfico e que demanda um processamento maior do
que o Quake 3 Arena.

38Disponível em http://www.dell.com/us/p/alienware-aurora-r4-desktop/pd. Acessado em


10/11/2015.

88
Figura 19 – Jogo Skyrim, da Bethesda.
Fonte: Tecmundo, 2015.39

2.10.4. Um jogo digital no laboratório de informática

Desenvolver jogos digitais é uma tarefa que inclui diversas ferramentas:


editores de texto, ferramentas de modelagem, editores de som, ambientes de
codificação, game engines, entre outros. Dessa maneira, para que possamos
iniciar o processo de criação de um jogo, seja como exercício de alguma
disciplina específica ou como projeto integrador dos cursos de tecnologia de
jogos digitais, é necessário que, além das especificidades do laboratório em
funcionamento, tenhamos pleno acesso ao seu uso.

As ferramentas mais usadas no desenvolvimento de jogos digitais são as


engines. Elas são ferramentas muito populares entre desenvolvedores. Este
fato pode ser constatado no relatório FEP Games (2014, pp. p.97-108), que
afirma que:

Do ponto de vista técnico, os jogos são construídos usando quase


sempre as mesmas ferramentas e engines, como Maya, Photoshop,
Unity-3D, etc. […] As ferramentas mais utilizadas são Unity (79,7%),
tecnologia própria (18%) e Cocos 2D (13,53%).

Entre as engines mais usadas em laboratórios, encontramos a Unity e a


Unreal. Segundo documentação da Unity, a engine sofreu, entre 2005 e 2013,

39Disponível em http://games.tecmundo.com.br/noticias/produtora-elder-scrolls-v-skyrim-diz-
favor-cobrancas-mods_809020.htm. Acessado em 17/11/2015.

89
50 atualizações, com uma média de 43,5 dias de intervalo entre elas (UNITY
TECHNOLOGIES, 2014).

A Unity é muito utilizada no meio acadêmico de ensino de jogos digitais,


compartilhado com a indústria. Sua interface é amigável e suas características
de multiplataforma são bastante úteis para o meio acadêmico e industrial.

A Unity não requer grandes permissões de usuário ao ser executada e


isso é uma grande vantagem quando se faz uso de laboratórios compartilhados
que não permitem acesso completo à máquina. Outra vantagem da ferramenta
é que, até a versão 4.0, a engine exigia moderada capacidade de hardware.
Embora seja capaz de grande qualidade gráfica, ela sozinha, a princípio, não
vem carregada de funções de alta capacidade gráfica, deixando a cargo do
desenvolvedor ou aluno seu posterior desenvolvimento.

Como vemos na documentação da ferramenta os requisitos mínimos são:

OS: Windows XP SP2+, 7 SP1+, 8, 10; Mac OS X 10.8+. GPU:


Graphics card with DX9 (shader model 2.0) capabilities. Anything
made since 2004 should work. The rest mostly depends on the
complexity of your projects. (UNITY TECHNOLOGIES, 2015).

Essas características não são compartilhadas com a ferramenta


concorrente mais significativa, a Unreal, na versão equivalente, como podemos
ver a seguir (Gráfico 03)40:

40
Recommended Hardware: Operating System Windows 7/8 64-bit; Processor Quad-core Intel or AMD,
2.5 GHz or faster; Memory 8 GB RAM; Video Card/DirectX Version; DirectX 11 compatible graphics card.
(EPIC GAMES, 2016).

90
Gráfico 03: Atualizações da engine da Unity.
Fonte: Unity Technologies/ Reprodução.

Como foi citado na pesquisa FEP Games:

A engine Unity se destaca pois possui grande capacidade de


simplificar o desenvolvimento, facilitando a criação de novos projetos,
de forma mais simples e com interface amigável. A grande maioria
das ferramentas citadas possui uma versão básica gratuita e uma
versão premium paga, tais como a Unity, a Coronoa, a Cocos 2d e a
Unreal. (FEP GAMES, 2014, p. 108).

Para fins acadêmicos, a Unity cobra uma licença específica com


atualizações gratuitas nas suas subversões, que deve ser atualizada a cada
virada de versão majoritária, como por exemplo, da versão três para quatro,
feita, em média, a cada 906 dias, o que dá dois anos e meio de custo extra,
aproximadamente.

A Unreal 4 não apresenta esses custos, sendo gratuita para fins


acadêmicos. A proposta da ferramenta é cobrar royalties sobre o faturamento
bruto dos jogos produzidos e vendidos, onerando, assim, apenas a indústria e
o desenvolvedor profissional.

Os custos sobre a ferramenta de desenvolvimento, sejam engines ou


outros softwares, geram custos, que, por vezes, chegam a milhares de dólares,
fazendo com que muitas faculdades não consigam acompanhar o avanço
tecnológico tão rapidamente. Custos de licença, no caso da Unity, e custos de
hardware, na Unreal, podem ser altos demais para um curso de jogos digitais.

91
Some-se a isso a falta de hardwares e ferramentas específicas de
desenvolvimento de jogos, como DevKits de consoles, que são extremamente
caros quando acessíveis, além de jogos para dispositivos móveis que
necessitam de celulares e tablets para serem desenvolvidos.

Esse último item também esbarra nas políticas internas da faculdade, pois
poderiam ser utilizados os dispositivos móveis dos próprios alunos, que não
têm permissão para instalarem seus aparelhos nos computadores da instituição
por regras do departamento de TI.

92
Capítulo 3 – Materiais Didáticos para o Ensino e
Aprendizagem de Jogos Digitais

Neste capítulo, pretendemos sistematizar alguns princípios que devem


nortear a elaboração do material didático para as aulas e oficinas de jogos
digitais. A análise realizada até o momento mostrou que as necessidades
levantadas pela indústria de jogos digitais e os cursos para a formação de
profissionais para essa área de produção possuem direcionamentos diferentes.

Observamos que as tecnologias disponíveis nos laboratórios onde


acontecem as disciplinas de jogos digitais são obsoletas e insuficientes para
que os alunos tenham um conhecimento à altura do que é exigido pelas
empresas de desenvolvimento de jogos digitais.

Como vimos nos capítulos anteriores, as instituições de ensino utilizam os


seguintes materiais didáticos para os cursos de jogos digitais:

 Livros técnicos;

 Computadores e laboratórios de informática; e

 Salas de aula teóricas e equipadas para desenvolvimento de cursos


de jogos.

Por outro lado, verificamos que as indústrias utilizam como base de suas
pesquisas e desenvolvimento os seguintes materiais:

 Livros técnicos;

 Apoio técnico de fabricantes das tecnologias;

 Computadores e laboratórios de informática;

 Kits de Desenvolvimento para consoles; e

 Dispositivos móveis.

A alternativa óbvia para tentar aumentar a disponibilidade de material


didático para os cursos, de modo a igualar ao material teórico disponível para
as indústrias, seria obter os mesmos tipos de equipamentos e materiais para os
alunos. Esses instrumentos deveriam ser a diferença entre o observado em

93
ambiente educacional e o verificado em ambiente profissional, ou seja: Kits de
Desenvolvimento e dispositivos móveis equivalentes aos das indústrias.

No entanto, como pudemos constatar nesta pesquisa, esbarramos em


muitos obstáculos para a obtenção desses materiais e, em particular, a
dificuldade de aquisição dos Kits de Desenvolvimento e o custo dos mesmos,
que é um dos objetivos de reflexão desta pesquisa. De fato, este trabalho
acadêmico tem como objetivo central mostrar os problemas que encontramos e
apontar possibilidades de solução para o desenvolvimento de cursos de jogos
no Brasil.

Esses dispositivos devem ser adquiridos diretamente com os fabricantes,


que costumam ter sede fora do Brasil e contato restrito, além do que, por
muitas vezes, demandam investimentos relativamente altos, visto que cada kit
chega a custar muito caro sem considerar os impostos de importação. Outra
barreira que observamos é a burocracia das instituições de ensino para a
aquisição de materiais didáticos e em relação à política de acesso de docentes
e discentes às tecnologias.

Por conta da rápida evolução tecnológica da indústria de jogos, é de vital


importância que as instituições de ensino tenham sempre material atualizado.
Os problemas de atualização de softwares e hardwares não são encontrados
na indústria de jogos digitais ou mesmo nas empresas de desenvolvimento de
softwares – embora as políticas de segurança sejam uma preocupação
constante nesse mercado. Essas restrições tendem a ser menos burocráticas
para as empresas de desenvolvimento. Vale lembrar que o tamanho da
empresa influencia nessas políticas: uma grande empresa tende a ser mais
burocrática do que uma pequena empresa; o mesmo ocorre em relação a
instituições de ensino.

Analisando esse contexto, nosso objetivo é traçar um caminho mais


simples para tentar evitar esses problemas. Ao buscar uma solução, pensamos
em softwares e hardwares livres que permitam que instituições de ensino e
alunos tenham acesso a equipamentos de ponta sem grandes investimentos
nem burocracias. Assim, nosso objetivo com esta pesquisa é apresentar
princípios orientadores na construção de materiais didáticos tecnológicos,
sendo o corpo docente quem melhor conhece a realidade da indústria dentro
94
da instituição de ensino. Qualquer tentativa de modificação ou restrição de
acesso às novidades tecnológicas tem de se levar em conta que um diálogo
com os professores é necessário e deve ser fundado em suas experiências
como educadores, além de seu percurso acadêmico e profissional.

Ao longo deste capítulo, partimos de dados colhidos em algumas


universidades, empresas e instituições de ensino a que temos acesso, levando
em consideração teorias já apresentadas, para uma proposta de construção de
materiais didáticos específicos para os cursos de jogos digitais, com enfoque
em graduação e pós-graduação.

3.1. Abordagem metodológica

A intenção de se compreender os benefícios de se produzir jogos com


material dedicado conduziu à adoção da abordagem metodológica da pesquisa
qualitativa, compreendida como uma investigação com o objetivo de perceber o
que os desenvolvedores experimentam, como produzem seus jogos, quais são
suas experiências e como enfrentam as dificuldades. Os dados foram
selecionados a partir de experimentos realizados em um laboratório
experimental criado na PUC-SP sob supervisão do Grupo de Estudo em
Computação Semiótica e Games (CSGames), incluindo alunos selecionados
do último período do Curso Tecnológico de Jogos Digitais, em 2015 e 2016.

A instituição já realizava avaliação e metodologia próprias dos alunos


baseadas em uma lista de tarefas coordenadas e compiladas em um rol
submetido ao professor orientador para que, assim, esse pudesse ter uma
fundamentação para melhor avaliação dos orientandos.

Essa lista de material didático, hardwares e softwares, anexada neste


trabalho, foi utilizada em nossa pesquisa como uma das bases para avaliação
dos trabalhos entregues pelos alunos e comparação daqueles que utilizaram o
DevKit.

Os métodos de pesquisa estudados e adotados nesse experimento foram


centrados nos usuários e a pesquisa baseada no teste de motivação
acadêmica, que pode ser uma boa estratégia para assegurar a qualidade do
material proposto neste trabalho.

95
Quando falamos em material didático digital, referimo-nos não somente
aos hardwares e softwares específicos empregados, mas também aos
instrumentos de apoio, como bibliotecas de suporte (API) e softwares
adicionais (midware).

Embora o foco de avaliação deste trabalho seja o hardware, que é


basicamente composto por um console de desenvolvimento, pesquisas que
comprovam a eficiência de um hardware por si só no ensino são muito raras.
Portanto, cabe a nós executarmos a transposição de alguns conceitos de
qualidade de software para o hardware.

Também vale observar que o hardware não funciona sozinho e depende


do conjunto de bibliotecas de suporte. Da mesma forma, podemos observar
que as pesquisas sobre qualidade de software são muito aprofundadas e,
assim, seguimos essa base como guia de nossa proposta para avaliação
qualitativa da ferramenta.

As pesquisas oficiais e não oficiais sobre qualidade de software, que


estabelecem normas, critérios, recomendações e requisitos para avaliação da
qualidade e usabilidade de qualidade de software, são uma boa guia para
podermos avaliar a capacidade do material didático digital proposto.

Para fundamentar nossas análises, observemos os objetivos


estabelecidos por Dix:

Uma avaliação tem três objetivos principais: deve-se analisar a


extensão, acessibilidade e funcionalidade do sistema, a fim de avaliar
a experiência da interação dos usuários para identificar quaisquer
problemas específicos com ele (2009, p. p.319). (Tradução nossa).41

Dix apresenta três objetivos principais para avaliar um sistema:

 Funcionalidade do sistema;

 Interface e seus efeitos sobre o usuário e

 Problema específico do sistema.

41Evaluation has three main goals: to assess the extent and accessibility of the system’s
functionality, to assess users’ experience of the interaction, and to identify any specific
problems with the system.

96
Dessa maneira, levando ao contexto educacional, podemos medir
momentos distintos de sua aplicação. Como estamos falando de materiais
didáticos, obviamente os efeitos sobre o usuário ganham ênfase em detrimento
de outras fases. Assim, podemos deduzir que a avaliação de material didático
digital é uma tarefa que deve ser observada pelo entendimento do aluno e deve
ser efetuada tanto na fase de desenvolvimento quanto na fase de utilização do
DevKit em sala de aula.

Para melhor compreensão, classificaremos as diferentes etapas de


interação, chamando-as de camadas de interação, que separam o aluno ou
desenvolvedor do hardware proposto, ou seja, o DevKit.

Essas camadas são:

 Ferramentas de autoração (game engines);

 Bibliotecas de comunicação com hardware (SDKs);

 Hardware dedicado (DevKit).

Essas três camadas compreendem todas as relações do desenvolvedor


com o ambiente de produção de jogos digitais para videogames ou consoles,
que se relacionam com os objetivos deste trabalho.

Optamos por apresentar os critérios identificados na literatura de


metodologia científica já adaptados para sistemas educacionais, seguindo e
fazendo ligações entre as camadas e as três categorias de parâmetros
propostas por Rodden (1998, pp. 21-22), adaptados em Silva (2005, p. 18) e
em Godoi e Padovani (2009, p. 448), que são a ergonomia, a pedagogia e as
comunicações.

Autores de diversas áreas do conhecimento propõem uma série de


critérios de diferentes naturezas. (..) optamos por apresentar os
critérios identificados na literatura conforme as três categorias de
critérios.

Ainda segundo Godoi e Padovani, os critérios ergonômicos asseguram


que o aluno possa utilizar o material didático digital com segurança, conforto e
produtividade. Dessa maneira, veremos que as definições ergonômicas são
premissas que podemos utilizar para o contexto da avaliação do DevKit.

97
Referente à ergonomia, nos referimos aqui a como o aluno interage
intuitivamente com a ferramenta de desenvolvimento. Podemos fazer uma
referência desta qualidade com a eficiência da interface da ferramenta de
produção dos games usada em sala de aula (game engine).

Podemos também avaliar a quantidade de trabalho para executar as


ações que relacionam todos os elementos da interface de que participam,
simplificando, dessa maneira, os aspectos visuais de modo que, na perspectiva
do aluno, ele entenda para que as ferramentas servem, sem muito auxílio.

Avaliamos também o controle do usuário, que se refere ao feedback de


suas ações no sistema; essa parte pode ser análoga ao editor presente em
algumas game engines e à sua capacidade de mostrar os resultados do
trabalho em tempo real, isto é, o fruto de seu trabalho pode ser testado
imediatamente.

Com a adaptabilidade, temos aqui a capacidade do sistema de reagir


conforme as necessidades e preferências do discente. Dessa forma, com o
DevKit podemos observar como uma tarefa de emulação, ou seja, a
capacidade da ferramenta em demonstrar aspectos referentes a
comportamentos específicos do software ao funcionar no DevKit, mostra-se
presente tanto na camada de engine quanto na de SDK.

Observamos também a gestão de erros disponível ou os mecanismos que


evitam ou reduzem a ocorrência de defeitos e favorecem sua correção quando
essas falhas ocorrem. Podemos observar isso nas camadas de engine e SDK,
como ferramentas de debug ou console de erros conectadas ao DevKit.

Avaliamos também os critérios pedagógicos para assegurar que as


estratégias didáticas do uso das ferramentas e equipamentos estejam em
conformidade com o objetivo educacional e as características do aluno.

Critérios de ensino e aprendizagem compreendem medidas didáticas e de


conteúdo, como a condução do aluno no uso do DevKit, a estruturação do
conteúdo oferecido, os sistemas de ajuda disponíveis em todos os níveis, o
desenvolvimento e os objetivos de aprendizagem, como clareza dos conteúdos
emocionais/afetivos e cognitivos.

98
Obviamente, o trabalho com DevKit deve conter critérios de dispositivos
da formação como conformidade, compatibilidade e coerência com o conteúdo
proposto do curso. Também são observados critérios de controle e gestão do
processo de aprendizado como práticas e experimentos, avaliações e tutoria.

Para finalizar, foram observados critérios comunicacionais que asseguram


que os dispositivos usados nesse processo de trabalho do DevKit sejam
eficazes do ponto de vista da interatividade e da qualidade da informação,
incluindo documentação e material de apoio, como: informações referentes às
camadas do desenvolvimento, tanto quanto à engine, ao SDK e ao console em
si, e suas condições de uso material impresso, manual on-line, entre outros.
Também usamos para avaliar o critério de interatividade que se refere ao grau
de controle da camada pelo aluno e até onde ele pode agir para modificá-lo ao
fazer uso da ferramenta.

Por fim, temos o critério da organização das mensagens, que nos orienta
quanto ao equilíbrio de comunicação linguística e audiovisual, favorecendo o
entendimento das representações pertinentes à interação do aluno com as
camadas.

Levando em consideração os métodos avaliadores possíveis


apresentados acima, foi realizada uma pesquisa sobre as melhores
ferramentas de forma que suprissem a maior quantidade de critérios possível.
Dessa forma, uma investigação compreendendo as ferramentas mais usadas
no mercado e nas universidades foi observada, baseada também na pesquisa
FEP Games (2014).

Uma investigação qualitativa baseada nessa pesquisa foi observada em


seu desempenho em sala de aula junto a considerações durante a elaboração
dos projetos de conclusão de curso ou trabalhos integradores finais dos alunos
do curso de jogos digitais, mapeando, assim, algumas das ferramentas
utilizadas e contemplando o espaço para a aplicação de novas técnicas que
têm como objetivo contribuir com a formação dos discentes.

Essa pesquisa foi feita principalmente dentro do ambiente da PUC-SP e


levada à construção de um diálogo crítico entre o CSGames e os formandos e
docentes da mesma instituição.

99
3.2. Escolha do material

É necessário escolhermos os materiais de acordo com os critérios


observados e, também, com base no mercado e na própria universidade.
Dessa maneira, foram levantadas questões pertinentes às camadas de
interação do trabalho com o desenvolvimento de jogos e, assim, pudemos
eleger o melhor material para trabalho em consonância com as mesmas.

Para a camada de game engine, observamos que os laboratórios das


universidades estudadas contam, de maneira geral, com algumas ferramentas
que possuem similaridades às usadas no mercado de trabalho. Verificamos os
softwares disponíveis no laboratório de três universidades que possuem cursos
superiores de jogos digitais no estado de São Paulo: Senac São Paulo, PUC-
SP e Fatec. Em pelo menos duas delas, vemos a mesma engine sendo usada
por 80% das empresas, segundo a pesquisa FEP Games (2014): a Unity3D,
que, pela facilidade de acesso, grande poder tecnológico e baixo custo (gratuita
para o público em geral) tem grande aceitação na indústria.

Como a engine já está presente nas instituições, não cabe, neste


momento e nesta pesquisa, sugerir outra ferramenta para ser utilizada. De fato,
devemos adaptar as ferramentas da melhor forma possível nas outras duas
camadas, que compreendem a íntegra do Kit de Desenvolvimento de jogos.

A segunda camada, Software Development Kit, ou SDK, é um conjunto de


bibliotecas de software que eleva o nível de programação, isto é: cria uma
interface de software que traz à produção do jogo uma proximidade maior da
linguagem humana, design do jogo ou da game engine em si, ou seja, ela é
responsável por proporcionar e elevar os recursos de um hardware específico
para um nível facilitado de produção para que o jogo seja desenvolvido.

Isso nos traz uma dependência entre o hardware e o software, ou seja,


não se pode separar o SDK do hardware para o qual ele foi planejado. Por
isso, devemos escolher a segunda e terceira camadas ao mesmo tempo,
sendo assim, o SDK é um fator importante na escolha da terceira camada.

Essa terceira camada, a escolha do console, baseou-se na facilidade de


obtenção do produto, levando-se em conta que estamos falando aqui de
tecnologia física, ou seja, da obtenção do material, que depende dos meios

100
físicos que o transportam. Também consideramos a facilidade de replicação, o
que permite que esse hardware possa ser construído e melhorado por qualquer
pessoa, instituição ou empresa que queira dar continuidade ao projeto.
Buscamos, ainda, a popularidade do dispositivo e a quantidade de
documentação e, por fim, mas não menos importante, seu poder de
processamento. Essas características, estando disponíveis, nos oferecem o
acesso tecnológico do console.

Vale dizer que o poder de processamento é um dos pontos relevantes


para este projeto, pois, para simular com precisão o desenvolvimento de jogos
para consoles, como Sony PlayStation e Microsoft Xbox, é necessário um
hardware que tenha as capacidades de processamento, no mínimo, próximas
às desses equipamentos.

3.3. Componentes do estudo de caso

Podemos observar que consoles de videogame são hardwares


dedicados, pois servem exclusivamente para a finalidade de rodar softwares de
jogos. Também podemos afirmar que são compostos únicos, normalmente
montados em uma única placa de sistema integrado, diferentemente de um
computador que, comumente, é composto de diversas placas de hardware,
como dispositivos de memória, placas de vídeo, de som e rede etc.

101
Figura 20 – Placa do console Microsoft Xbox 360, composta por uma única placa com todos os
componentes.
Fonte: Bill Detwiler / CBS Interactive, 2010.42
Esses hardwares compostos por uma única placa são definidos como
single-board computers e foram criados para reduzir o custo total de um
sistema, diminuindo o número de placas de circuitos necessárias e eliminando
conectores e circuitos controladores de portas. Os conectores são uma fonte
frequente de problemas de confiabilidade, então um sistema single-board
elimina esses defeitos (ROSCH, 1999, pp. 50-51).

De um modo geral, podemos dizer que, ao colocar todas as funções de


um computador em uma única placa, um sistema menor pode ser obtido, como
é o caso dos notebooks e laptops.

Com essas vantagens, os single-boards têm se tornado muito populares,


principalmente com o crescimento da participação de dispositivos como
Raspberry Pi. Indo mais além, desde o aparecimento do Raspberry Pi Modelo
B, os single-board computers tornaram-se uma força predominante no mundo
do desenvolvimento.

Esses dispositivos de bolso criaram uma enorme comunidade on-line,


fornecendo desde típicas funcionalidades de computador pessoal a uma
infinidade de projetos de código aberto em plataformas com baixo consumo de

42Disponível em http://www.techrepublic.com/blog/cracking-open/cracking-open-the-xbox-360-
s-slim/. Acessado em 17/11/2015.

102
energia, incrivelmente compactos e com excelente custo-benefício (ATWELL,
2013).

Tendo isso em mente, é natural que nosso foco gire em torno de


dispositivos como esses, já que custo, documentação e facilidade de acesso
são critérios comuns nesse tipo de tecnologia. Assim, os hardwares disponíveis
foram pesquisados usando a lista aberta feita pela comunidade livre da
Wikipedia (2015). Esse projeto mantido pela comunidade de desenvolvedores
consiste em uma relação de quase todos os dispositivos classificados como
single-board computers, o que contribuiu para nossa tomada de decisão.

Tabela 05 – Lista de comparação entre single-board computers.


Fonte: Wikipedia
CPU RAM
Name SoC GPU Data
Architecture Cores Frequency Size rate Bits Type
[MT/s]
Qualcomm
Inforce Adreno 420
Snapdragon Krait 450 4 2.5 GHz 2 GB ? ? LP-DDR3
6540 @600 MHz
805 (APQ8084)
ARM Cortex-A15 2.3 GHz Nvidia GK20A
Nvidia 5 (192CUDA
Nvidia Tegra K1 “low-power 2 GB 933 64 DDR3L
Jetson TK1 (4+1) ? cores) @950
core” MHz
Samsung ARM Cortex-A15 2 GHz ARM Mali-
ODROID- 8
Exynos 5 Octa T628@695 2 GB 933 32 DDR3L
XU3 ARM Cortex-A7 (4+4) 1.4 GHz
(5422) MHz
Samsung ARM Cortex-A15 2 GHz ARM Mali-
ODROID- 8
Exynos 5 Octa T628@695 2 GB 933 32 DDR3L
XU4 ARM Cortex-A7 (4+4) 1.4 GHz
(5422) MHz
Samsung ARM Cortex-A15 1.8 GHz ARM Mali-
ODROID- 8
Exynos 5 Octa T628@695 2 GB 933 32 DDR3L
XU3 Lite ARM Cortex-A7 (4+4) 1.3 GHz
(5422) MHz
Firefly- Rockchip ARM Mali-
ARM Cortex-A12 4 1.8 GHz 2 GB ? 32 DDR3
RK3288 RK3288 T764
Arndale Samsung Mali-
ARM Cortex-A15 2 1.7 GHz 2 GB ? ? DDR3L
Board Exynos 5 T604MP4

Qualcomm
Inforce Snapdragon Adreno 320
Krait 4 1.7 GHz 2 GB 1066 ? DDR3
6410 600 @400 MHz
(APQ8064M)
Qualcomm
Inforce Snapdragon Adreno 320
Krait 4 1.7 GHz 2 GB 1066 ? DDR3
6410plus 600 @400 MHz
(APQ8064M)

ODROID- Samsung Mali-400MP4


ARM Cortex-A9 4 1.7 GHz 2 GB 880 ? LPDDR2
U3 Exynos 4 Quad @440 MHz
Samsung ARM Cortex-A15 1.7 GHz PowerVR
ODROID- 8
Exynos 5 Octa SGX544MP3 2 GB 800 32 LPDDR3
XU ARM Cortex-A7 (4+4) 1.2 GHz
(5410) @600 MHz
Nvidia Tegra 3 Nvidia ULP
Ouya ARM Cortex-A9 4 1.7 GHz 1 GB 1600 ? DDR3
T33-P-A3 GeForce

103
Ao observamos a lista anterior, notamos que, entre os processadores, o
predominante é o ARM Cortex em suas mais diversas gerações. Dessa
maneira, ao classificarmos a lista de acordo com a velocidade de seus ciclos de
processamento (clocks), temos que os single-boards tendem a ser mais
rápidos do que os computadores tradicionais.

Podemos, ainda, observar que a arquitetura dos hardwares da lista acima


é predominantemente ARM, com 2GB de memória RAM como padrão.
Notamos que todos os single-boards executam programas em uma faixa acima
de 1.7GHz. Além disso, vemos a presença bastante grande dos single-boards
chamados de Odroid e também podemos observar a presença de um console
de videogame dedicado, o Ouya.

A presença do Ouya nessa tabela é um fato por si só interessante, pois


não apenas ajuda a fortalecer o laço entre single-board computers e consoles
de videogame, como também é um marco qualitativo; podemos constatar a
qualidade dos jogos desenvolvidos para esse hardware e utilizá-lo como
referência para os consoles com padrão comercial.

Figura 21 – Console open-source Ouya.


Fonte: Ouya Inc, 2015.43

43 Disponível em http://androidcommunity.com/tag/ouya/. Acessado em 17/11/2015.

104
Embora o Ouya seja uma ótima referência, esse hardware foi lançado em
2013 e já é considerado pela indústria de jogos um dispositivo antigo, que se
utiliza de uma arquitetura ultrapassada, a ARM A9. Tendo isso em vista,
podemos considerar que a geração do processador é um aspecto muito
importante na seleção do hardware.

Ao fazermos uma filtragem por gerações mais novas, observamos que o


processador mais atual é o ARM Cortex-A15, na seguinte disposição:

Tabela 06 – Lista de comparação entre single-board computers, organizada por geração do


processador, do mais novo ao mais antigo.
Fonte: Wikipedia.
CPU RAM
Name SoC GPU Data
Architecture Cores Frequency Size [bits] Type
rate[MT/s]
Arndale Samsung ARM Cortex- Mali- 2
2 1.7 GHz ? ? DDR3L
Board Exynos 5 A15 T604MP4 GB
Samsung ARM Cortex-
A15
2 GHz ARM Mali-
ODROID- Exynos 5 8 (4 + 2
T628@695 GB 933 32[72] DDR3L
XU3 Octa ARM Cortex- 4)
A7
1.4 GHz MHz
(5422)
Samsung ARM Cortex-
A15
2 GHz ARM Mali-
ODROID- Exynos 5 8 (4 +
T628@695 2GB 933 32[72] DDR3L
XU4 Octa ARM Cortex- 4)
A7
1.4 GHz MHz
(5422)
Samsung ARM Cortex-
A15
1.8 GHz ARM Mali-
ODROID- Exynos 5 8 (4 +
T628@695 2GB 933 32[72] DDR3L
XU3 Lite Octa ARM Cortex- 4)
A7
1.3 GHz MHz
(5422)
Samsung ARM Cortex-
1.7 GHz PowerVR
ODROID- Exynos 5 A15 8 (4 + 2
SGX544MP3 800 32 LPDDR3
XU Octa ARM Cortex- 4) @600 MHz
GB
1.2 GHz
(5410) A7

Nvidia
ARM Cortex-
Nvidia Nvidia 2.3 GHz GK20A
A15 5 (4 + 2
(192CUDA 933 64 DDR3L
Jetson TK1 Tegra K1 1) GB
cores) @950
“low-power
? MHz
core”
Allwinner ARM Cortex- PowerVR
Tronsmart 4
A15x4/ARM 8 1.3 GHz 64-core 1600 64 DDR3
Draco Telos A80 GB
Cortex-A7x4 6230

Cubieboard Allwinner ARM Cortex- PowerVR


2
A15x4/ARM 8 1.3 GHz 64-core 1600 64 DDR3
4 / CC-A80 A80 GB
Cortex-A7x4 6230

Novamente, notamos a predominância das placas Odroid e da


padronização em 2GB de memória RAM. Outro fator importante no que tange a

105
velocidade do dispositivo é a quantidade de cores, ou núcleos, que o
processador nos disponibiliza. Assim, podemos observar que um processador
com oito núcleos tem se tornado o padrão contemplado.

Vale dizer que um processador ser multiprocessado com oito núcleos é


uma vantagem adicional ao nosso projeto, pois aproxima o desenvolvimento
dos softwares para nosso console aos hardwares de mercado, como o Sony
PlayStation 3, conhecido pelo seu processador Multicore IBM Cell de sete
núcleos (VALDES, 2012).

Figura 22 – Processador IBM Cell, presente dentro de uma placa de Sony Playstation 3.
Fonte: Daily Tech, 2007.44

Dos single-boards computers acima listados, o único que se mostrou


declaradamente de arquitetura aberta, ou seja, que disponibiliza os esquemas
de montagem para o público, foi o Odroid.

Outro fator de definição é a lista de Brown (2013), disponível em um artigo


publicado para a revista Linux.com, em que estão relacionados os dez
melhores single-board computers de arquitetura open source com custo inferior
a 200 dólares; novamente, vemos uma placa Odroid nesse rol.

Fator adicional à escolha é a compatibilidade plena com o sistema


Android, que, como já citado, leva vantagem por já possuir SDK robusto, vasta
44 Disponível em
http://www.dailytech.com/IBM+Engineers+Stepin+to+Help+PS3+Game+Developers/article6192
.htm. Acesado em 21/11/2015.

106
biblioteca de aplicativos e padronização com base no Open Handset Alliance.
Com esse respaldo, a placa Odroid em sua versão mais atual, a XU4, foi
escolhida como plataforma para testes e emulação dos Kits de
Desenvolvimento de jogos baseados em consoles.

3.4. Metodologia para o estudo

Após determinado o material a ser utilizado é necessária a montagem de


uma diretriz metodológica para prosseguimento dos estudos. Para tanto,
propusemos uma metodologia de etapas com o objetivo de tornar factível o
alcance dos objetivos almejados.

Como estamos tratando de uma pesquisa que usa materiais inéditos, não
conseguimos assim prever e controlar com exatidão seus resultados. Dessa
maneira, as etapas foram continuamente reformuladas e reinventadas ao longo
da aplicação do material.

Os testes foram aplicados levando-se em conta a finalização dos


trabalhos de conclusão de curso dos alunos do Curso Tecnológico em Jogos
Digitais. Assim, ao final do semestre foram selecionados dois grupos, sendo
que um teria de finalizar seu jogo de modo que funcionasse a plena capacidade
no novo DevKit e o outro teria de finalizar seu trabalho de modo que
funcionasse também em sua plena capacidade no computador disponível no
laboratório.

As etapas foram dispostas da seguinte forma:

107
Figura 23 – Etapas da metodologia para este estudo.
Fonte: Acervo pessoal, 2015.

108
3.5. Procedimentos experimentais

As etapas experimentais seguem a seguinte descrição:

 Etapa 1 – Teste piloto e identificação das limitações e


impedimentos do material

Nesta primeira etapa, o equipamento foi submetido para análise técnica


da equipe de professores do CSGames. Com isso, foram testadas as
capacidades do hardware usando, primeiramente, games disponíveis no
mercado. Utilizamos jogos digitais encontrados na loja Google Play.

Esse teste foi realizado de maneira muito conveniente, pois o dispositivo,


sendo compatível com Android, permitiu a instalação do Open Gapps (2015),
que é um projeto de código aberto para a geração automática de um código
para atualização e instalação dos pacotes do Google Apps. Ou seja, com essa
ferramenta podemos colocar todas as ferramentas facilitadoras que a Google
disponibiliza para tablets, smartphones e outros dispositivos também
disponíveis para o DevKit e, assim, temos acesso à Google Play, que é a loja
de aplicativos para Android do Google com milhões de programas, inclusive os
jogos mais populares.

Para o teste preliminar, foi escolhida a instalação e comparação de


desempenho de um jogo bastante popular e que seguia alguns pré-requisitos:
utilizar de joystick como padrão de dispositivo de entrada, ser disponível
gratuitamente, ter boa qualidade gráfica e apresentar-se de forma plena em
outras plataformas, incluindo outros videogames.

Após uma breve pesquisa, o jogo escolhido foi a versão de demonstração


do Sonic 4 Episode II Lite, da SEGA.

109
Figura 24 – Imagem do aplicativo Sonic 4 Episode II, da Sega.
Fonte: Google Play, 2015.45

O jogo Sonic 4 Episode II Lite foi usado como parâmetro para teste de
desempenho do DevKit pela equipe do CSGames e, como esse jogo está
presente tanto para Android, quanto PC, Playstation 3, Xbox 360, arcades
(fliperamas), dispositivos Apple (com sistema iOS), Ouya e NVidia Shield,
conseguimos ter um bom parâmetro para fazer a avaliação do dispositivo.

Nos testes realizados pela equipe, foi observada uma taxa constante de
frames (60 quadros por segundo) e um feedback bem responsivo do joystick,
quando rodando o jogo em resolução HD (720p).

Dessa maneira, pudemos comparar essa qualidade à do console


PlayStation 3, que teve desempenho similar com a mesma resolução de tela.
Outra característica observada foi que a taxa de frames (quadros por segundo)
em FullHD (resolução máxima, típica das televisões e monitores de alta
definição, que equivale a 1080p), embora não tenha caído em nossos testes,
foi sentida pelos pesquisadores com um grande prejuízo nas respostas dos

45 Disponível em
http://play.google.com/store/apps/details?id=com.sega.sonic4ep2lite&hl=pt_BR. Acessado em
17/11/2015.

110
controles, demonstrando que na resolução FullHD talvez possamos ter
limitações.

Obviamente, existem diferenças entre versões e não devemos crer que os


jogos sejam portados entre as plataformas conservando todos os aspectos
originais. A equipe do CSGames observou facilmente que o background
(desenho do fundo) da versão do Android não apresenta o mesmo nível de
detalhes observado em outras versões como a de PC. Dessa maneira, o teste
não é totalmente fidedigno, sendo apenas um indício de sua viabilidade.

 Etapa 2 – Pré-teste motivacional

Nesta etapa, foram feitos testes de motivação. Considerando que jogos


digitais são, por si só, bastante atrativos para os alunos, fizemos uma prévia
com alguns deles a partir de um pré-teste, que teve a função de identificar se o
aluno estava motivado a produzir jogos e se essa motivação aumentava com a
oportunidade de desenvolver para um console de videogame, simplesmente
porque os videogames são atrativos por si só.

Para tanto, podemos fazer uma analogia à teoria de autodeterminação de


Vallerand (1993, pp. 159-172), que cita dois tipos básicos de motivações: a
motivação intrínseca, em que se faz algo pelo interesse e prazer inerentes à
ação; e a motivação extrínseca, em que se faz algo por causa de consequência
ou desfecho distinto da ação. Nosso objetivo aqui é relativo à motivação
extrínseca, pois podemos levar em consideração que o DevKit gera uma
consequência ou desfechos relativos à publicação e visualização de seu jogo
em algo muito próximo aos consoles de videogame.

Esse teste foi feito por meio da escolha aleatória de questões com cada
tipo de motivação observada por Vallerand. Assim, os alunos demonstraram
seus níveis de motivação para a realização do projeto de uma maneira prévia.

O nível prévio de motivação para o desenvolvimento de jogos foi avaliado


levando-se em consideração a expectativa do uso do material já disponibilizado
para os alunos, abrindo, assim, a possibilidade de, mais tarde, comparar com

111
os índices posteriores ao contato com o DevKit. O teste foi realizado por meio
do Google Forms46.

O método de avaliação foi uma pontuação simples, baseada na somatória


de total, parcial ou nenhuma correspondência das respostas dos alunos, com a
média calculada entre essas respostas. Posteriormente, comparamos os
resultados dos dois grupos testados, tanto no pré-teste como no pós-teste.

 Etapa 3 – Teste empírico

O teste empírico do DevKit foi aplicado durante o desenvolvimento do


TCC dos alunos de jogos digitais da PUC-SP.

Os discentes foram separados em dois grupos: alunos que deveriam


realizar seus jogos para funcionarem nos computadores da instituição; e alunos
que deveriam realizar seus jogos para funcionarem no Kit de Desenvolvimento
de jogos (DevKit). A escolha dos alunos se deu por sorteio das vagas
disponíveis no laboratório do CSGames.

Os selecionados receberam orientações práticas sobre os procedimentos


a serem realizados. Esses mesmos procedimentos foram realizados também
com os alunos que deveriam desenvolver os jogos para o laboratório da
faculdade e faziam parte de uma lista de entregáveis, ou seja, de exigências
que os jogos têm de apresentar para serem considerados aceitáveis, em
formato de lista47, que foi apresentada no início do teste empírico.

A primeira semana marcou o primeiro contato dos alunos selecionados


com o DevKit. Assim, cada aluno estabeleceu o conhecimento de como o Kit
de Desenvolvimento funciona e suas características, tais quais: conexão com a
televisão, joysticks suportados, conexão com a rede e Internet, integração com
o SDK do Android e, por fim, a conexão da mesma à engine utilizada na
universidade, no caso a Unity.

O outro grupo de alunos não necessitou de apoio e suporte às maquinas


da universidade, pois as mesmas já eram conhecidas dos alunos no momento

46 Ficha de teste anexa e também disponível em http://goo.gl/forms/vXRqrd29fZ.


47 Lista de entregáveis anexa.

112
em que esse teste se iniciou, portanto, nesse aspecto, não temos uma
equivalência imediata.

Durante a segunda semana de trabalho com o DevKit, o aluno foi


instruído a portar seu protótipo ou pré-projeto de TCC ao Kit. O trabalho de
portar o jogo compreende em adaptar ou repensar como o jogador interage
com o game, de modo que o jogo antes elaborado para um microcomputador
comum, dotado de mouse e teclado, seja jogado agora em um dispositivo
dotado de joystick.

Grande parte desse processo foi acompanhada pelo professor orientador,


já que o joystick compreende uma tecnologia diferente das já apresentadas em
aula durante o curso, como, por exemplo, o direcional analógico, que permite
uma precisão maior de movimentos.

Figura 25 – Componente do direcional de um Joystick analógico.


Fonte: Solarbotics, s.d.48

O aluno precisava adaptar-se ao ambiente de desenvolvimento


multiplataforma, que consiste em desenvolver em um equipamento para
executá-lo em outro, o que representa um importante elemento de aprendizado
dessa ferramenta, pois, quando se produz para a maioria das plataformas
existente para jogos, sejam consoles ou smartphones, usualmente desenvolve-
se em microcomputadores e testa-se nos dispositivos. Esse desenvolvimento
multiplataforma é uma operação bem conhecida dos programadores de

48 Disponível em http://solarbotics.com/product/50514/. Acessado em 22/11/2015.

113
dispositivos móveis e consoles, mas no curso de Jogos Digitais é encontrada
apenas na matéria de Desenvolvimento de Jogos para Dispositivos Móveis.

Essa diferença de plataforma pode ser, por vezes, fator de extrema


dificuldade para o desenvolvedor ou aluno, de modo que a ajuda do orientador
se faz necessária para orientar e explicar os motivos de uma eventual
incompatibilidade e alertar sobre problemas que possam aparecer.

Paralelamente, os alunos do grupo que desenvolvia jogos para os


computadores da faculdade enfrentaram problemas mais leves, pois a maioria
já utilizava os equipamentos para desenvolverem seus jogos. As exceções
foram alunos que traziam seus próprios dispositivos, como notebooks, que, por
vezes eram mais potentes do que os computadores da universidade. Nesse
caso, o projeto do jogo para o computador era mais focado nas limitações das
capacidades do equipamento, forçando o aluno a aperfeiçoar seu jogo.

Na terceira semana, os alunos do grupo dos DevKits trabalharam com a


adaptação das diferenças entre o monitor e a tela de televisão. Como o Kit de
Desenvolvimento simula um videogame tradicional, o mesmo conecta-se a um
televisor HD comum, portanto o aluno tinha de resolver questões de resolução,
saturação de cor, tamanho dos objetos na tela e problemas relativos à
navegação pela interface.

Consideramos esse um passo crítico, pois aqui o aluno perde a


disponibilidade do dispositivo apontador, como o mouse (ou o dedo, nos
dispositivos touchscreen), tendo que adaptar sua interface para ser navegada
apenas sob o joystick. É importante notarmos que essa é uma característica
exclusiva dos videogames, que recebe uma ênfase muito grande ao ser
enfrentada pelo aluno diante de um DevKit.

Nesta fase, inicia-se também a correção de erros e depuração remota,


que consiste em observar, através de computador remoto, a saída de debug ou
console de erros gerado pelo DevKit. Dessa maneira, pode-se capturar erros
que só ocorrem durante a execução no DevKit.

Paralelamente na mesma semana, o outro grupo teve um tempo maior


para iniciar a correção dos erros de seus jogos e fazer a depuração dos

114
mesmos. Assim, o desenvolvimento nos computadores da faculdade tendia a
ficar um pouco mais adiantado.

Durante a quarta semana, ambos os grupos adiantaram-se em otimizar


seus jogos. Pudemos observar a etapa de testes e listagem de bugs, melhora
dos elementos observados e listagem das melhorias que poderiam ser feitas.
Essa parte do processo é chamada de “polimento” do jogo e é comum para
todas as plataformas.

Com a edição dos jogos para dispositivos móveis e computadores


pessoais, caso o aluno estivesse produzindo para os mesmos, essa etapa
também incluiria uma rodada de testes nas mais variadas marcas e tipos de
dispositivos, para garantir o funcionamento livre de problemas.

Por serem os consoles dispositivos padronizados, quando o


desenvolvedor garante sua execução plena, sem os chamados bugs e usando
as ferramentas suportadas, é esperado automaticamente que qualquer versão
dos videogames feita sob a base do mesmo DevKit funcione sem problemas.

 Etapa 4 – Teste de motivação

De acordo com Vallerand (1993, pp. p.159-172), dois fatores são


observados neste teste: a motivação extrínseca, que analisa a regulação por
identificação com o curso e a motivação intrínseca, que verificou a satisfação
de aprender, explorar ou compreender e vivenciar estímulo, também
analisando a desmotivação, que implica ausência de percepção de
contingências entre as ações e seus desfechos.

Como a motivação extrínseca depende de fatores que vão além deste


estudo, o foco desta pesquisa foi na motivação intrínseca, já que ela é a mais
relacionada com a aplicação deste conteúdo. Os resultados desse teste são
comentados em seguida neste trabalho.

 Etapa 5 – Pós-teste, apresentação e análise da banca

Esta etapa consistiu em questionar e avaliar a apresentação dos alunos


perante uma banca de professores. Esse era o momento em que o

115
pesquisador tinha a oportunidade de observar os fenômenos tais como eles se
produziriam em seu contexto natural, ou seja, o resultado do produto e suas
dificuldades eram percebidos pelo professor, que, então, analisava os
resultados de forma mais crítica, atribuindo um teor qualitativo ao trabalho.

Posteriormente, os resultados obtidos pela banca de uma forma


multimodal e multidisciplinar consideraram a comparação entre os alunos que
utilizaram o Kit de Desenvolvimento de jogos e aqueles que utilizaram os
materiais didáticos comumente aplicados em seus respectivos cursos
(laboratório normal disponibilizado pela instituição). Além disso, foram
comparados os resultados de cada aluno com os apresentados por ele mesmo
(pré-teste versus teste oficial), antes e após o contato com o DevKit.

No que concerne à quantificação dos dados estatísticos, não podemos


afirmar que pode trazer conclusões definitivas, pois como somente
dispúnhamos de um Kit, ele ficou de difícil acesso a todos os discentes,
restringindo a quantidade de alunos disponíveis para o experimento.

Para a coleta dos resultados, foi realizada entrevista com os professores


presentes nas bancas de apresentação dos trabalhos com os alunos. Para
tanto, foi entregue uma lista de avaliação das qualidades presentes nos
trabalhos realizados para cada professor, definindo assim a questão qualitativa
da pesquisa. Essas questões foram elaboradas voltando a Dix (2009, p. 319),
principalmente para analisar se os objetivos principais do jogo digital, como a
funcionalidade do sistema, interface e seus efeitos sobre o usuário e o
problema específico do sistema foram alcançados. A tabela a seguir apresenta
as escolhas dos docentes participantes da banca para avaliação dos alunos:

Tabela 07 – Critérios de avaliação usados pelos professores durante análise de banca.


Fonte: PUC-SP.
Avaliação PIV PPT GDD Jogo Plataformas extras

Valor 10% 10% 20% 60% +10%49

49PIV equivale a Projeto de Identidade Visual; PPT é Projeto de Identidade Visual da


Apresentação do Jogo; GDD se refere ao Game Development Document (Documento de
Desenvolvimento de Jogo). Cada critério é mais desenvolvido na lista de entregáveis anexa a
este trabalho.

116
A tabela acima apresenta os critérios submetidos para os professores
participantes baseados na lista pré-construída pela coordenação do curso,
incluindo a pontuação por plataformas extras, que aqui inclui o
desenvolvimento no DevKit. Outra fonte desta pesquisa veio dos resultados
coletados pelas respostas da escala de motivação acadêmica, que
corresponde à parte quantitativa da pesquisa, já citada e anexada a este
trabalho.

3.6. Análise dos resultados

Os resultados obtidos a partir da realização dos experimentos, tanto


estatísticos (relacionados à parte quantitativa da pesquisa), quanto da
entrevista (parte qualitativa da pesquisa), gerou parâmetros que podem ser
utilizados para dar respostas de aproximações de nossos objetivos de
utilização de hardwares e softwares específicos para desenvolvimento de jogos
em cursos de jogos em instituições de ensino, como funcionalidade, efeitos
sobre o usuário e os problemas específicos citados por Dix.

3.6.1. Quantitativa

Os resultados das etapas dois e quatro foram coletados e filtrados para


somente levarem em conta as questões relacionadas à motivação intrínseca
que tem relação com a aplicação do material proposto.

A taxa de amostragem desta pesquisa inclui oito grupos com uma média
de três alunos em cada um. Desses grupos, apenas dois participaram da
experiência com o DevKit. Todos os alunos responderam à escala de
motivação acadêmica.

Durante a segunda etapa, a diferença de pontuação das questões


relacionadas à motivação intrínseca entre os seis grupos que utilizaram o
material didático tradicional e os dois selecionados para trabalho com o DevKit
não deveria exceder 5%, mostrando uma certa uniformidade nas respostas dos
alunos durante esta etapa.

117
As respostas das questões durante a quarta etapa mostraram um
incremento de aproximadamente 30% na diferença a favor do nível de
aprovação das respostas do teste de motivação acadêmica para os alunos que
trabalharam com o DevKit.

Embora a amostragem seja pequena, ela ofereceu-nos uma boa


perspectiva sobre o trabalho, indicando que o uso de equipamentos
diferenciados, mais próximos aos encontrados no mercado de trabalho, traz
uma motivação extra para os alunos.

3.6.2. Qualitativa

A banca avaliadora, usando os critérios apontados para avaliação já


mencionados, julgou a qualidade dos trabalhos propostos. Dentre os grupos
que não participaram da experiência com o DevKit, obtivemos uma média na
avaliação de 80% de aproveitamento. Já os dois grupos que trabalharam
usando o DevKit obtiveram avaliação de 100%.

Obviamente, não podemos afirmar que o uso do DevKit aumenta a


qualidade dos trabalhos dos alunos, porém temos uma indicação de que talvez
a disciplina com o uso da ferramenta traga uma certa qualidade durante o
desenvolvimento do mesmo.

118
Considerações Finais

Os cursos de jogos digitais mostram-se cursos de graduação muito


atrativos para os alunos no atual momento educacional em que vivemos, pois
além de estarem na ponta de desenvolvimento com as Tecnologias
Emergentes, também são impulsionados pelo seu fator lúdico. Também
podemos citar a participação crescente na composição da cultura das pessoas,
sua pervasividade e transversalidade manifestam-se nas mais diversas
atividades como elemento dinamizador e promotor de produtividade.

O ingressante no curso de jogos vem com uma motivação diferente


dos outros alunos de informática, normalmente baseada em grandes
jogos de última geração, que despertam uma espécie admiração.
Esta motivação normalmente é colocada de lado pelos professores,
tentando trazer o aluno para a realidade atual: a de que eles ainda
não estão aptos a produzir um grande jogo. Esta postura pode ser
indicada para tentar aproximar o aluno da realidade, mas não pode
ser totalmente radicalizada a ponto de descartar este fator
motivacional. (RAMOS, 2009, p. 34).

Mais importante que a participação dos jogos digitais na composição da


indústria é, portanto, seu papel primordial entre as demais tecnologias de
informação e comunicação, penetrando diversas cadeias produtivas e
modificando qualitativamente atividades, que se transformam com a
incorporação de suas funcionalidades lúdicas.

Alguns segmentos (especialmente no caso de jogos digitais) apresentam


mercados fortemente internacionalizados desde os primórdios da indústria. No
caso de jogos digitais, identifica-se uma clara hegemonia, como observado na
pesquisa FEP Games (2014, pp. 17-28), da indústria americana e outros polos
como Japão e alguns países europeus, que, apoiados em seu pioneirismo no
desenvolvimento da indústria de jogos e das tecnologias de informação,
impuseram padrões dominantes no mercado internacional.

As vantagens das empresas desses países estão fundadas no


pioneirismo do desenvolvimento, domínio tecnológico e na conquista de

119
vantagens competitivas, decorrentes dos atendimentos dos maiores e mais
sofisticados mercados consumidores do mundo.

A hegemonia advinda do modelo originário dos países supracitados


persiste acentuada e suas empresas comandam, em grande medida, os rumos
do desenvolvimento tecnológico da indústria de jogos digitais. Essa liderança
manifesta-se inclusive no processo de internacionalização produtiva dos jogos
a serem desenvolvidos, que é capitaneado pelas empresas dominantes como
as fabricantes de hardware e software globais.

No entanto, graças ao movimento de códigos e plataformas de livre


acesso, observados por uma das iniciativas como o Open Handset Alliance
(2007), estamos caminhando para a equalização da indústria de jogos digitais.
Esse movimento representa a constituição de relações produtivas
geograficamente distribuídas, criando, assim uma relação entre os países
emergentes da indústria e os grandes polos de desenvolvimento. Essas
relações constituem a emergência de um modelo exportador, ou seja, como a
tecnologia é acessível a todos e de interesse e atratividade de muitos,
podemos criar um jogo em uma escola localizada no interior do Amazonas e
publicá-lo para qualquer jogador do mundo.

Essa redução de barreiras de mercado pode explicar as expressivas


taxas de crescimento alcançadas por algumas empresas de desenvolvimento
de jogos. As atividades desenvolvidas em qualquer configuração nacional
estão vinculadas, na condição de partes associadas e dependentes, às redes
produtivas globais.

Embora essas relações produtivas demonstrem também a existência da


divisão do trabalho na alocação das funções “menores no desenvolvimento”,
que são funções hierarquicamente inferiores do processo produtivo dos jogos
digitais, direcionando a países emergentes as liberdades do mercado e
tecnológicas, por outro lado, permitem que o desenvolvedores de jogos digitais
possam competir em igualdade de oportunidades com os grandes
desenvolvedores. De fato, isso construiu um fenômeno interessante, que são
os jogos de desenvolvedores independentes.

120
[...] jogos independentes existem em algum lugar fora do domínio
cultural popular de jogos digitais, enquanto presume-se que a
produção de jogos indie, ao mesmo tempo, incorpora um processo de
inovação criativa que deverá entregar o próximo grande salto cultural
(e financeiro) no mercado de videogame e jogos de computadores.
(MARTIN & DEUZE, 2009). (Tradução nossa).50

Nos países dominantes, preservam-se os jogos mais intensamente


tecnológicos e de maior potencial econômico, os chamados Triple A ou AAA.
Embora sejam de altíssima qualidade, esses jogos, por vezes, sofrem de falta
de inovação criativa e também de dificuldade de se aproximar de nichos de
jogadores, por falta de representatividade com o jogador. Essas considerações
permitem o exame crítico de diferentes trajetórias de desenvolvimento da
indústria de jogos em países emergentes, realizado como recurso analítico
para o posterior diagnóstico da indústria e academia brasileira de jogos digitais.

É importante que as faculdades de jogos digitais sejam conectadas aos


alunos e à indústria de jogos, sempre se atualizando e tendo em vista novos
dispositivos e mídias. Assim, observamos perspectivas neste trabalho como um
início de um projeto maior que possa ser criado a partir de nossa proposta,
além de novas possibilidades de evolução da mesma.

Vale acrescentar que, ao desenvolver este trabalho, conseguimos um


resultado bastante interessante: os alunos espectadores que estavam
presentes na banca final demonstraram, em conversas pessoais e em sala de
aula, mais interesse pelo curso. Observamos também, de maneira similar, uma
motivação no corpo docente com o uso da tecnologia: alguns professores
sugeriram modificações e outros levaram este projeto para outras
universidades nas quais lecionam.

Acreditamos que o objetivo principal de elaboração de uma proposta de


aplicação destas ferramentas – hardwares, softwares e material didático em
curso de jogos eletrônicos – foi alcançado. Conseguimos prender a atenção e o
interesse dos alunos mesmo antes de entrarem em contato com a ferramenta,
desenvolvemos uma expectativa lúdica e motivadora inerente aos games que

50[…] independent games exist somewhere outside the mainstream cultural domain of digital
games, whereas indie game production is at the same time assumed to embody a process of
creative innovation that will deliver the next great cultural (and financial) leap forward in the
computer and video game market.

121
também pode ser observadas de maneira similar se pensarmos em
profissionais quando iniciam seus trabalhos em uma empresa de jogos.

A hipótese principal dos efeitos dessa aplicação é diminuir a evasão dos


estudantes nos cursos de jogos, por conta de alguma deficiência dos
laboratórios ou materiais didáticos disponíveis. No entanto, ao desenvolver
mais estudos sobre o tema, a ferramenta pode alcançar efeitos maiores e,
desta maneira, ser melhorada, estimulando cada vez mais a motivação das
pessoas para aprender usando ferramentas de criação de jogos eletrônicos.

O retorno que tivemos dos alunos foi muito positivo e motivou a


elaboração desta pesquisa e a possibilidade de continuar avançando no
sentido de pensar em outras propostas de metodologia para desenvolvimento
de aplicativos para celulares e tablets.

O processo de analisar a eficácia de aprendizagem para o


desenvolvimento de jogos digitais não se mostrou simples. Além do fato de não
existir trabalho anterior que analise exatamente o mesmo perfil de aluno,
tivemos problemas burocráticos em algumas universidades. No entanto, talvez
o fator mais complicador seja o fato deste trabalho não ter amostragem
suficiente para medições quantitativas mais confiáveis. Por outro lado, o
processo de avaliação qualitativo foi facilitado, pois a instituição escolhida já
possuía metodologia própria criada pelos professores do curso de jogos.
Assim, foi mais facilmente aceito e adaptado às novas tecnologias disponível.

Os cursos de jogos digitais no Brasil já possuem mais de uma década de


história e, durante este período, tem sido bastante comum observar que os
alunos normalmente aprendem a desenvolver jogos utilizando laboratórios de
departamentos de computação. Em nossas pesquisas, não constatamos
nenhum grupo que tenha como objetivo a criação de algum ambiente
educacional de uso exclusivo para cursos relativos aos jogos digitais. E,
quando observamos que um laboratório tinha algum preparo para os mesmos
era apenas levada em conta sua capacidade gráfica, não importando outros
aspectos relevantes ao desenvolvimento de jogos.

Uma ação a ser sugerida após a elaboração desta metodologia é a


necessidade de manutenção do laboratório destinado ao Grupo de Pesquisa

122
CSGames, que contém o Kit de Desenvolvimento, televisor, joysticks e sistema
próprio de rede e independente, sendo assim um ambiente propício ao
desenvolvimento de jogos.

Outro fator de dificuldade que refletiu na amostragem do experimento é


relativo ao custo do equipamento, que, embora tenha um dos menores custos
relativos a seus concorrentes, é ainda bastante impactante por ser um
elemento importado, sujeito a taxas e variações cambiais, o que impossibilitou
a compra em massa do produto.

Outro elemento que poderia ter sido uma dificuldade e que pode ser um
obstáculo de implantação em outras instituições foi a questão dos televisores.
Os videogames atuais rodam majoritariamente em televisores de alta definição,
as HDTVs, que, embora tenham se tornado razoavelmente comuns nas
residências brasileiras, não são encontrados tão facilmente em universidades,
tampouco instalados em sala de aula. Dessa maneira, a dependência de um
televisor poderia ser um ponto de falha deste projeto. Felizmente, a
universidade PUC-SP contava com três televisores de alta definição
disponíveis para uso, sendo que dois deles ainda tinham suportes móveis,
podendo ser levados para qualquer lugar dentro da universidade.

A experiência: fatos relevantes

Durante o desenvolvimento dos jogos para a plataforma escolhida,


pudemos observar algumas dificuldades que acabaram por se tornar um
aprendizado extra, tanto para o aluno quanto para os professores orientadores.

 Shaders51 e precisão: Durante o desenvolvimento de um dos jogos


foi notada a inconsistência de imagens em movimentos no
background do jogo, isto é, no fundo do jogo havia imagens que
piscavam aleatoriamente. Isto foi notado apenas quando se rodava o
jogo no DevKit. Durante a simulação no computador, o jogo rodava
estável e sem inconsistências. Mais tarde, foi descoberto que o
problema ocorria devido à diferença de como a placa gráfica dos

51Shaders são códigos de baixo nível que rodam no processador da placa gráfica,
responsáveis por efeitos visuais.

123
dispositivos móveis trabalhava diferentemente com a precisão das
variáveis de ponto flutuante encontrados nos shaders. Esse problema
específico disparou entre os alunos e professores tarefas de pesquisa
para encontrar uma solução. O resultado não só resolveu o problema
do jogo do aluno, mas também gerou conhecimento para o professor
e conteúdo para ser aplicado em sala de aula.

Um obstáculo do uso das variáveis float/half/fixed é que a compilação


delas nas GPUs de PC é em alta precisão. Isso quer dizer que, para
todas as GPUs de PC (Windows/Mac/Linux), não importa
absolutamente se você escreve float, half ou fixed no seu shader.
Elas sempre vão compilar como uma variável de ponto flutuante de
precisão de 32 bits. Os tipos half e fixed somente são relevantes
quando você está projetando para GPUs de dispositivos mobile, tipos
que existem primariamente para reduzir consumo de energia e, em
alguns casos, limitações de performance. 52 (UNITY
TECHNOLOGIES, 2015).

 Dispositivos de entrada: Também durante o desenvolvimento, foi


observada a dificuldade de se trabalhar com uma interface controlada
puramente por joystick, ou seja, sem a utilização de dispositivos
apontadores como caneta, mouse ou mesmo touchscreen. Assim, o
desenvolvimento da interface gráfica do jogo teve que ser repensada,
pois, quando existia apenas o computador dos laboratórios para
trabalhar, tanto os alunos quanto os professores apenas utilizavam
interfaces interativas com dispositivo apontador, coisa que em
videogame não é comum.

Dessa maneira, também toda uma pesquisa aconteceu em torno desse


obstáculo com um estudo intenso sobre a interface dos jogos antigos e atuais
de videogame e, ainda, menus de DVDs, já que estes sofrem de um problema
similar aos videogames: a navegação através de botões direcionais do controle
remoto/ joystick. Como resultado da pesquisa, esse obstáculo também trouxe

52 One complication of float/half/fixed data type usage is that all PC GPUs are always high
precision. That is, for all the PC (Windows/Mac/Linux) GPUs, it completely does not matter
whether you write float, half or fixed data types in your shaders. They will always compute
everything in full 32 bit floating point precision.
The half and fixed types only become relevant when targeting mobile GPUs, where these types
primarily exist for power, and in some cases performance, constraints.

124
conhecimento para o professor e posterior conteúdo para ser aplicado em sala
de aula.
Desenvolvedores de DVDs têm falhado em tirar proveito das lições de
mídias anteriores: softwares de computador, web pages de Internet e
até telefones WAP (...)53 (NORMAN, 2001). (Tradução nossa).

 Debug remoto: Utilizado também durante o experimento, o debug do


jogo, que se define como a forma de se depurar o código de erros,
teve que ser repensado. Enquanto que, ao desenvolver o jogo no
computador do laboratório, o equipamento oferecia uma engine capaz
de testar o jogo na mesma plataforma que se desenvolve e, assim,
permitia a leitura dos dados de debug e visualização do jogo em
tempo real. Ou seja, o uso de memória, mensagens de erro,
performance gráfica, entre outros itens, são de comportamento
totalmente previsível e de fácil visualização. Ao usar um DevKit
conectado remotamente, esse cenário muda bastante, tirando os
alunos da zona de conforto.

Os desenvolvimentos no DevKit são diferentes em precisão de variáveis,


como já mencionamos e apresentam também diferença de desempenho geral,
como as já mencionadas variações de entrada, de arquitetura de processador
e, principalmente, gráfica.
Quanto à variação gráfica, inúmeros fatores podem influenciar, mas o
principal é o uso de uma televisão HD ao invés de monitores de computador
tradicionais. Para o agravo do problema, a televisão disponível era de uma
tecnologia de tela completamente diferente da dos monitores disponíveis no
laboratório: a televisão era de tecnologia de tela de plasma enquanto que os
monitores eram de cristal líquido (LCD). Desta maneira, foi iniciada uma
pesquisa em torno do assunto equilíbrio e saturação de cores, restrições de
desempenho e teste remoto.
É importante mudar a maneira de pensar não só dos professores,
coordenadores ou diretores, como também dos profissionais de tecnologia dos
departamentos de computação. A liberdade do docente deve ser preservada

53Designers of DVDs have failed to profit from the lessons of previous media: Computer
software, Internet web pages, and even WAP phones (…)

125
tanto em sua didática dentro da sala de aula e também sua liberdade quanto ao
uso e tipo de uso dos computadores e hardwares em geral da instituição.
O excesso de burocracia gerada por algumas instituições para acesso às
ferramentas de ensino é, muitas vezes, desestimulador. Tomados por
argumentos que vão desde a segurança dos laboratórios até o mau uso dos
equipamentos, os professores são sistemicamente tirados de sua liberdade
dentro de sala de aula. Por vezes, parte do conteúdo de uma disciplina não
pode ser lecionado e isto torna-se pior quando a disciplina precisa de conexão
de rede ou Internet, como as de desenvolvimento de jogos multijogadores
(multiplayers).

Um exemplo de cerceamento que afeta a edição é a falta de liberdade


imposta ao professor de poder instalar os softwares utilizados no ensino da
disciplina. Uma vez que o processo de instalação pode ser complexo, este
pode também fazer parte do conteúdo de aula.

Assim como um processo de construção de ambiente de produção, a


preparação de um ambiente desse pode implicar na instalação não de apenas
um software específico, mas de uma coleção deles, como compiladores,
editores de imagem, ferramentas de autoração, game engines etc. Para
agravar, por vezes a instalação é tão complexa que, normalmente, o
departamento de tecnologia das universidades não tem competência para fazê-
lo, necessitando de ajuda do professor fora do horário de aula normal para
auxiliar.

Sabemos que os motivos para estas situações são diversos e envolvem


também a postura dos departamentos de tecnologia com relação à própria
indústria de games e sua academia. Também sabemos que a área de estudos
sobre jogos digitais sofre ainda com alguns preconceitos, tornando assim difícil
a inovação dentro da mesma.

Já foi verificado que alguns professores, inclusive de lógica de


programação, fizeram "pouco caso" da área de jogos, pois, como foi
dito, a indústria nacional ainda não tem uma significância comparável
a outras áreas da tecnologia. (RAMOS, 2009, p. 84).

126
Propostas para trabalhos futuros

Durante o período de estágio dos alunos, vimos que não somente o


método aprendido em sala de aula foi suficiente, como ainda necessitamos de
uma continuação dele de modo mais focado no trabalho do aluno do que antes.

Outra proposta que está sendo estudada é a de se modificar inteiramente


o sistema operacional do DevKit. Como o sistema usado nesta pesquisa é
baseado na plataforma Android, passível de ser modificada, uma sugestão é
que se desenvolva um projeto de criação e gestão de um sistema operacional
próprio, tendo como base o Android original. Assim, poderíamos ter o controle
de partes do desenvolvimento dos jogos mais profundas e também poderíamos
simular ambientes de sistemas operacionais vistos em consoles de
videogames de outras plataformas, tal qual Sony Playstation ou Microsoft Xbox.

Isto nos levaria a um maior conhecimento e domínio tecnológico, retirando


algumas amarras impostas pelo sistema operacional original. Esse tipo de
criação de sistema operacional não seria um fato inédito, já que pode ser visto
em algumas fabricantes de celular e também observado em um videogame
com base Android como o OUYA.

Figura 26 – Console Ouya, baseado em Android.


Fonte: Ouya, 2016.54

54 Disponível em http://androidcommunity.com/tag/ouya/. Acessado em 17/11/2015.

127
Outra proposta é a criação de uma loja virtual própria do dispositivo, que
atualmente tem contato com a loja Google Play Store original do sistema
Android. Dessa maneira, a seleção dos softwares disponíveis para o DevKit é
bem grande, porém massivamente não projetada para um dispositivo que se
assemelha a um console de videogame, e sim a um telefone com tela de toque
ou um tablet. Assim, encontramos com bastante frequência softwares que
simplesmente não funcionam com o nosso hardware de estudo.

Outro problema encontrado é em relação à seleção dos jogos da loja. A


Google Play Store trata-se de uma loja mundial com uma gama imensa de
aplicativos, ou apps, com cerca de 1,6 milhão de títulos (STATISTA, 2015).
Assim, encontrar aplicativos relevantes e compatíveis torna-se uma tarefa
hercúlea.

Com isso, a proposta de criar uma loja específica para rodar projetos e
jogos desenvolvidos nessa plataforma torna mais acessíveis jogos e apps
desenvolvidos no projeto para todas as partes envolvidas.

Essa loja, posteriormente, poderia funcionar como uma rede de


distribuição, armazenamento e consulta de todos os trabalhos de
desenvolvimento de jogos, podendo atingir outras universidades e níveis de
cursos relativos, tornando-se, assim, uma plataforma completa de
desenvolvimento e distribuição de jogos.

Figura 27 – Imagem da loja exclusiva do Ouya.


Fonte: Ouya, 2015.55

55
Disponível em http://www.ouya.tv/games/. Acessado em 02/02/2015.

128
Ao atingir todos esses objetivos, este projeto pode vir a se tornar uma
plataforma, que é, basicamente, a definição de um padrão de conjunto de
hardware e software para se produzir um determinado software.

Se essa plataforma conseguir ter um conteúdo relevante, de boa


qualidade e adaptado especificamente para a mesma, ela pode servir como
base para a iniciativa privada desenvolver produtos com acesso a esse padrão,
tendo, assim, acesso ao conteúdo disponibilizado e colocando os trabalhos dos
alunos ainda mais em evidência.

Estamos falando aqui de uma nova plataforma de videogame análoga ao


Ouya, porém de código e hardware inteiramente abertos a modificações e
evoluções da própria indústria ou academia, seguindo um padrão como a GNU,
que segue as premissas do software livre.

A liberdade de rodar o programa como você quiser, tendo qualquer


propóstio (liberadade 0). A liberdade de estudar como o programa
funciona e adaptá-lo para suas necessidades (liberdade 1). A
liberdade de redistribuir cópias e ajudar o próximo (liberdade 2). A
liberdade de melhorar o programa e lançar suas melhorias ao público,
para que toda a comunidade se beneficie (liberdade 3).56 (GNU
OPERATING SYSTEM, 2016). (Tradução nossa).

Esta plataforma poderia servir como uma nova base de produção de


videogame e jogos digitais, sendo compartilhada com várias empresas para
desenvolver consoles compatíveis entre si, em que cada um teria sua própria
vantagem e desvantagem. Já vimos isso ocorrer em consórcios fechados de
desenvolvimento de consoles de videogame, como a plataforma 3DO, que teve
em sua fundação a participação de sete desenvolvedoras de hardware e
software, que trabalharam em conjunto para o desenvolvimento de um padrão
de videogame comum (3DO, 2001).

56 The freedom to run the program as you wish, for any purpose (freedom 0). The freedom to
study how the program works, and adapt it to your needs (freedom 1). The freedom to
redistribute copies so you can help your neighbor (freedom 2). The freedom to improve the
program, and release your improvements to the public, so that the whole community benefits
(freedom 3).

129
Figura 28 – Compilado de consoles que compartilhavam a plataforma 3DO.
Fonte: 3DO, 2001.57

Ao concluir esta pesquisa, pretendemos divulgá-la junto às universidades


e demais instituições de ensino, para estabelecer e implementar o processo de
desenvolvimento com o DevKit. Procuraremos investimentos para a compra de
mais dispositivos para poder ter uma quantidade numérica relevante para
avaliação e validação dos conhecimentos, saberes, competências, habilidades
e aptidões profissionais dos envolvidos. Também procuraremos adaptar
processos de aprendizagem formais e estabelecer padrões e procedimentos
metodológicos para o uso da ferramenta.

57Disponível em http://web.archive.org/web/20010309111332/http://www.3do.com/index.html.
Acessado em 29/03/2015.

130
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136
Anexos

Anexo A: Lista de entregáveis

137
138
139
140
Anexo B: Teste de Motivação

141
142
143
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