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RESENHA CRÍTICA

Poulain, Jean Pierre. Sociologias da alimentação: os comedores e o espaço social


alimentar. Florianópolis, Editora da UFSC,2004, 311 páginas. Obra traduzida juntamente com
Rossana Pacheco da Costa proença e Carmen Silvia Rial.[Título original: Sociologies de
l’alimentation: Les mangeurs et l’espace social alimentair. Obra publicada originalmente pela
PUF, Paris, 2002. Edição original 288 páginas.

Esta obra faz o inventário das contribuições da sociologia para a compreensão da


alimentação. Recorrendo à história da sociologia, ela mostra como, em torno de
problemáticas consideradas como mais fundamentais, esta disciplina deparou-se com a
alimentação.

A obra é dividida em capítulos, totalizando 10, e estes são divididos em um esquema de


seção e subseção. Sendo narrado na 3ª pessoa, e a obra completa possui 311 páginas.

Está resenha pretende tratar apenas sobre o capítulo 10 da obra Sociologias da


alimentação: os comedores e o espaço social alimentar, de Jean-Pierre Poulain, considerado
um dos principais estudiosos da alimentação no interior das ciências humanas. E que tenta
interligar questões sociais alimentares importantes, como, o papel que o alimento tem em
uma certa sociedade, como por exemplo, definir a classe social.
Poulain, acredita que a sociologia da alimentação, deveria ser estudada sim, e no
desenvolvimento de seu texto, explica que o surgimento e aprimoramento da gastronomia
(principalmente a francesa) visando elevar o padrão da comida, com o auxílio de técnicas de
preparo e cocção, almejando a qualidade máxima do alimento, algo que definirá sua
condição social, e não apenas alimentação a alimentação biológica, isso muda. O alimento saí
da linha biológica, e torna-se algo, que definirá sua classe social, seu comportamento à mesa,
e em alguns casos, até mesmo a sua religião, quebrando com natural essencial à vida apenas,
e tornando-se uma forte ferramenta social.

No início do capítulo, o autor afirma que, a gastronomia francesa é um obstáculo em


sua pesquisa, levando em consideração sua temática alimentar, a grande complexidade e
sua influência sobre o campo da gastronomia mundial. Afirmando que, a gastronomia é um
fenômeno pouco abordado pela sociologia (apesar da clara influência social que ela possui).
E enfatiza a diferença entre a gastronomia e a alimentação, onde classifica a gastronomia
como uma estetização da cozinha, e que nem de longe, refere-se ao objetivo biológico da
alimentação. O autor deixa claro que são coisas distintas, a partir deste, fala da influência
social que a gastronomia francesa tem, pois dentre tantas experiências gastronômicas que a
Europa possui, existe um consenso, de que a gastronomia francesa é a mais importante.
Neste momento, o autor tenta explicar de forma mais simples, qual é o seu objeto de pesquisa
e a causa para seu interesse no assunto, no caso, o obstáculo que ele é para a continuação de
seu estudo.
O autor aborda também a real complexidade da gastronomia francesa, que ao seu ver, não
é reconhecida pelos franceses, e para tal afirmação, ele trás ao texto um pensamento de
Goody que acredita tratar-se de um “ fenômeno de miopia” pelos que estão inseridos na
cultura francesa, e que devido a essa apropriação eles ficam impedidos de ver a real
dimensão, e os fatos de sua complexidade. O autor descreve ainda, duas características que a
diferencia : seu grau de complexidade e sua capacidade de se impor como modelo as demais
elites culturais. Em seguida o autor explana, sobre a gastronomia europeia em si, explicando
que, até meados do século XVI as cozinhas européias quase não se diferenciavam e contavam
com algo entre 300 e 400 receitas originais, e que a partir de um livro publicado na França o
cuisinier royal et bourgeois de Massialot (1691) esse número foi aumentando, e a
gastronomia desenvolveu-se desde a metade do século XVII, e era caracterizada pela
multiplicação das receitas, e pelo enredo das maneiras à mesa. Mas apesar disso, o termo que
a designa só surge em 1800, Desde então, sua característica foram aprimoradas entre
técnicas, receitas e um código de combinações que regia a gastronomia, até atingir a marca
de 7000 receitas diferentes retratado pelo livro lê repertoire de lá cussine de Gringoire e
saulnier , considerado dicionário prático da gastronomia francesa. Com a revolução, a
monarquia exilada começam a conquistar novos territórios com a gastronomia trazida por
seus chefs, e na frança, com os chefs que não seguem seus mestres para o exílio, surgem os
primeiros conceitos de restaurante e café, que logo se espalham pelo mundo e assim a frança
fica reconhecida pela excelência de sua gastronomia. Neste trecho, o autor busca de forma
mais histórica, fundada em pensadores da época, explicar o por quê de um fenômeno tão
marcante na sociedade, não é enxergado como algo complexo, que merece uma atenção
especial. Afirmando que, para entender o porquê da gastronomia ser francesa, e necessário
vê-la como um instrumento social importante, por falar não apenas da cultura que lhe deu
origem, mas sim de todos que a seguem, e para isso, é necessário estudar sobre a sociologia
europeia.
Trazendo de forma mais histórica as questões que envolvem a gastronomia socialmente, o
autor explica que, o que inicialmente era considerado como um gênero literário menor, logo
foi expulso pelo pensamento cartesiano por não ser considerada parte da cultura erudita, e
assim, a gastronomia passou também pela filosofia, no qual também não foi bem aceito, mas
ali continuou durante 400 anos, tendo pequenos encontros com as demais áreas do saber, mas
sem legitimação. Afirma também que, a gastronomia faz parte de um lapso do pensamento
francês e poderia ser a via real para seu inconsciente cultural. E que nesse campo ele recorre a
uma série de interpretações como, o processo de civilização de Norbert Elias, que se torna o
modelo de distinção social, a alquimia como estrutura de pensamento de criatividade
culinária, e também, as relações que a gastronomia tem com a moral religiosa francesa.
Neste ponto, o autor tenta, alertar, sobre as mazelas literárias pelas quais a gastronomia
passou, ao longo dos séculos, rastejando para ser legitimada por algumas áreas do
conhecimento, e que mesmo sem o sucesso pretendido, ela consegue se desenvolver, e ganhar
forma, como um potente influenciador social.
Nesta sessão, o autor refere-se ao surgimento do termo civilidade, e a seu significado.
afirmando que a civilidade permite definir, o comportamento do homem, isso inclui a
maneira como come, se veste e se comporta;, com o objetivo de distinguir a camada social ao
qual o indivíduo pertence. E narra que na frança a civilidade chega de forma particular,
somente surgindo com a instalação da corte em versaille próximo ao fim do século XVII, e
com as manutenções sociais determinantes. Que atrai uma aristocracia que não cumpre seus
papel, e assim, a burguesia assume essa lacuna fazendo subir seu valor social, e começa a
imitar a nobreza, que logo garante uma forma de diferenciar-se elevando seu padrão de
qualidade em todos os sentidos, e nessa dinâmica de manter as características que definem
sua posição social, surge a moda. E somente em 1691, surge a primeira literatura referente a
gastronomia burguesa, que com a revolução, a chega ao tão desejado patamar social, e
liberam o que antes era restrito aos nobres, a todas as classes, com os primeiros serviços de
alimentação. O autor mais uma vez, recorre a fatos históricos para situar o leitor, do por quê
que a “civilidade” chegou a algumas sociedades, como a França. E que não necessariamente
tinha o significado real, e que muitas vezes, a interpretação genérica, era adaptável ao que o
detentor do poder queria.
Nesse trecho, o autor descreve como surgiu a necessidade de sentir o real sabor dos
alimentos, narrando que no final do século XVI com os avanços das navegações, as
especiarias tornam-se cada vez mais baratas, e começam a fazer parte do cotidiano da
burguesia, e a aristocracia, começa a desprezá-las, com isso começam a surgir a necessidade
de uma comida mais pura, que tenha o gosto de seus ingredientes base, e não um sabor
mascarado por temperos. A partir desse princípio revolucionário, Massialot cria o caldo
universal , somando 23 caldos diferentes marcados por um único sabor, e que serão utilizados
em preparações precisas. E com isso, afirma o autor que os chefs continuaram a busca pelo
melhoramento, não em busca da receita ´perfeita, mas de uma busca com o progresso do
espírito humano, sendo a frança a melhor no quesito de comer o que é bom, ela se desenvolve
pela linha do gosto, e o universo católico lhe somará, com o divino.
Nessa sessão, o autor fala sobre o obre a gastronomia nos rituais sagrados da igreja, e
como ela também tem suas vaidades e diferenciação, demonstrando sob diversas visões
religiosas motivos que são considerados essenciais tanto para a igreja católica, como suas
subdivisões protestantes, e que até mesmo no meio religioso, existem regras sobre como deve
ser feito o consumo do corpo e do sangue de cristo ( e suas variantes entre os movimentos
religiosos), e que também existem formas de distinguir as classes sociais na igreja, os pobres
só tinham direito ao pão, e os ricos direito ao pão e ao vinho; e que também, a igreja buscaria
sua forma de diferenciar-se dos movimentos protestantes. E assim como a aristocracia rompe
o consumo de especiarias, a igreja católica, deixa o uso do pão e começa a utilizar hóstias
para diferenciar-se. criando também regras, para não ser comparada aos pagãos do novo
mundo, não mastigando a hóstia mas sim derretendo a na boca e engolindo a por inteiro.
Na última subseção do texto, o autor fala um pouco sobre o que era na um crítico
gastronômico na época, e segundo o texto, nada mais era que uma pessoa com um pouco a
mais de conhecimento sobre as regras à mesa, e não necessariamente um cozinheiro, era um
cargo mais ligado a sua posição social. E com isso surge o primeiro livro L’almanach des
gourmands de Grimond em 1802 que tem como missão guiar a burguesia pelas regras
gastronômicas criadas pela aristocracia. A obra faz sucesso e ganha várias edições entre os
anos 1802 a 1812. Grimond cria simultaneamente a literatura gastronômica, os guias e os
indicativos de qualidade quando se trata da gastronomia.
Brillat-Savarin é a segundo peça chave na articulação dos códigos alimentares, e cria a obra
Fisiologia do gosto, editada em 1824, adotando a mesma posição que Grimond. Assim
criando o primeiro conceito de crítico gastronômico adotado até hoje. O autor conclui
dizendo que o porquê da gastronomia ser francesa, é que os diferentes elementos, foram
conjugados nela.

Apesar de ser uma obra enriquecedora, para quem busca conhecer um pouco mais sobre a
sociologia da alimentação, e até mesmo um pouco mais sobre a história da gastronomia em
si, a tradução com alguns erros, e a complexidade do texto, que exige conhecimento prévio
sobre o assunto, principalmente pelo uso de termos que necessitam de pesquisa constante ao
dicionário, a leitura se torna bem complicada. Mas, ainda assim é um capítulo bem completo,
que abrange muito da história da gastronomia sob uma visão mais sociológica, abre a mente
para os fatores históricos sociais pelos quais o alimento passou durante os séculos, até chegar
ao patamar atual, e que é algo muito importante para a sociologia compreender alguns
comportamentos sociais, apesar de não parecer.

Estudioso da socioantropologia, Jean Pierre Poulain é PhD, na Universidade de Paris VII e


um HDR, na Universidade de Paris IV-Sorbonne. Depois de 15 anos na escola Toulouse
Hotel, ele voltou-se para a carreira acadêmica na Universidade de Toulouse com foco em
"Sociologia da Alimentação" e "Estudos de Alimentos". Tornou-se professor associado em
1997 e professor titular em 2007. Realiza pesquisas sobre as relações entre Alimentação,
Culturas e Saúde no âmbito do CERTOP UMR-CNRS 5044, e lidera, desde 2012, a
presidência de “Food Studies” em conjunto pela universidade de Toulouse (França) e pela
universidade de Taylor (Kuala Lumpur, Malásia). Ele é o co-diretor do Laboratório
Internacional Associado (LIA-CNRS) "Alimentos, Culturas e Saúde".

Ynglides Natasha Feliciano de Souza, discente do curso bacharelado em gastronomia da


Universidade Federal Rural de Pernambuco.
Livro: sociologias da alimentação. Disponível em:
https://www.livrariacultura.com.br/p/livros/ciencias-sociais/sociologia/sociologias-da-aliment
acao-2501749
Acessado em 24 de Agosto de 2019

Jean Pierre Poulain. Disponível em:


https://www.researchgate.net/profile/Jean_Pierre_Poulain
Acessado em 24 de Agosto de 2019

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