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FACULESTE – FACULDADE DO LESTE MINEIRO

JOSÉ CARLOS DE CARVALHO DO NASCIMENTO

ASPECTOS DA CONTEMPORANEIDADE DA COZINHA BRASILEIRA.

BALSAS – MARANHÃO
2024

1
FACULESTE – FACULDADE DO LESTE MINEIRO
JOSÉ CARLOS DE CARVALHO DO NASCIMENTO

ASPECTOS DA CONTEMPORANEIDADE DA COZINHA BRASILEIRA.

Artigo Científico apresentado à FACULESTE –


Faculdade do Leste Mineiro, como exigência para a
obtenção do título de Pós-graduação em
Gastronomia Contemporânea.

BALSAS – MARANHÃO
2024
2
ASPECTOS DA CONTEMPORANEIDADE DA COZINHA BRASILEIRA.

José Carlos de Carvalho do Nascimento

RESUMO

No presente artigos buscamos evidenciar importantes aspectos da contemporaneidade da


cozinha brasileira e o que alguns autores consideram como resgate, renovação e/ou revitalização da
culinária nacional. A pesquisa foi realizada através da revisão bibliográfica de livros, artigos e internet,
circunscrito na última década; são citados fatos e momentos históricos julgados fundamentais e que
muito influíram na constituição da cozinha brasileira atual. A contemporaneidade da cozinha brasileira
envolve múltiplos e variados aspectos, incluindo dentre eles a sua própria definição. A singular dinâmica
da culinária brasileira moderna, por si só, estabelece um caminho difícil à sua perfeita compreensão e
conceituação. Assim não podendo vê-la por si mesmo, necessitamos tentar entende-la através do ponto
de vista e particularidades de quem a produz, consome e aproveita. A nova cozinha brasileira tem uma
grande aceitação no universo da gastronomia mundial e inúmeros chefs brasileiros já receberam
importantes premiações e reconhecimento internacional. Renovar a cozinha brasileira depende da
capacidade de coloca-la, através de múltiplos expedientes, no centro das atenções e esperanças
daqueles que buscam no ato de comer uma atividade lúdica. Acreditamos que seja esse o mais
adequado caminho para um bom entendimento do que vem a ser, e o que representa a
contemporaneidade da cozinha brasileira. Na pesquisa identificou-se estilos e dimensões que a través
do homem, entendem e conceituam a gastronomia contemporânea brasileira a partir da culinária
praticada.

Palavras chaves: 1) Gastronomia; 2) Contemporaneidade, 3) Estilos e 4)


Dimensões.

3
Introdução

Ao buscarmos refinar o entendimento sobre a Gastronomia Contemporânea no


Brasil “atual”, nos deparamos com um grande número de reflexões sobre aspectos
inerentes à procura de um “padrão ou perfil conceitual”, próprio e singular, daquilo que
desejamos definir e entender por cozinha brasileira na atualidade, dado à
complexidade do Tema.

Essa dinâmica conceitual torna-se mais atraente e complexa, quando


observamos as crescentes e peculiares mudanças, inovações ou renovações nas
características dos comensais e chefs que vem contribuindo na construção e
composição da Gastronomia Contemporânea Brasileira.

A jovialidade da gastronomia nacional, sob um ponto de vista particular, nos


permite um olhar contemporâneo inserido na sua miscigenação, provida pela culinária
europeia e apresentada aos tupiniquins no interior das caravelas portuguesas, como
consta na carta de Pero Vaz de Caminhas.

No Brasil contemporâneo é possível identificar com grande precisão, porém


em algumas regiões de alguns Estados brasileiras, a influência das culinárias
Francesa, Italiana, Árabe, Espanhola, Portuguesa e Oriental e se podemos dividir para
fins didático, também a presença da Gastronomia Brasileira com suas peculiaridades
simbólicas.

No presente artigos buscamos evidenciar, através de alguns aspectos


importantes à contemporaneidade da cozinha brasileira, o que alguns autores
consideram como resgate, renovação e/ou revitalização da culinária nacional.

A pesquisa foi realizada através da revisão bibliográfica de livros, artigos e


internet, circunscrito na última década; no entanto são citados fatos e momentos
históricos julgados fundamentais e que muito influíram na constituição da cozinha
brasileira atual.

4
Desenvolvimento

A contemporaneidade da cozinha brasileira envolve múltiplos e variados


aspectos, incluindo dentre eles a sua própria definição. A singular dinâmica da
culinária brasileira moderna, por si só, estabelece um caminho difícil à sua perfeita
compreensão e conceituação. Assim não podendo vê-la por si mesmo, necessitamos
tentar entende-la através do ponto de vista e particularidades de quem a produz,
consome e aproveita.

Comentando sobre propostas para a renovação da culinária brasileira DÓRIA


(2022. Pág.221), refere que “... é possível identificar alguns estilos mais amadurecidos
que parecem propor uma linguagem de tratamento da nossa cozinha para o presente
e o futuro.” Outros autores que acompanham a dinâmica da cozinha brasileira,
observaram que diversos “aspectos”1 próprios da contemporaneidade tem produzido
mudanças efetivas na culinária brasileira; para SOARES et al (2020. pág. 152)“... a
gastronomia contemporânea não deve ser entendida sob o viés do refinamento e
acredita que esta deve se abrir à pluralidade de sabores expostos nas diversas
cozinhas.”

Ao final do século XVIII, SAVARIN (1995, pág. 61), em seu livro a Fisiologia do
Gosto, conceituou Gastronomia como sendo: “... o conhecimento fundamentado de
tudo o que se refere ao homem, na medida em que ele se alimenta.” Deste modo o
objetivo da gastronomia é o de zelar pela conservação do homem através da sua
alimentação. Em todas as épocas da humanidade, o homem não apenas procurou
meios e modos de sobreviver ou apenas preservar a sua saúde física, buscou da
mesma forma, a sanidade mental. Muito embora o citado conceito2, tenha sido criado
no início da era contemporânea da história da humanidade, período de grande
efervescência social, política e de mudanças culturais, trata-se de uma definição
elaborada no período moderno da gastronomia, que ao final, muito bem vem retratar
as fundações da Gastronomia Contemporânea Brasileira, pois, para SAVARIN (1995,
pág. 65) a gastronomia atinge seu objetivo “... dirigindo, mediante princípios seguros,

1
Alguns aspectos de caráter simbólico.
2
Conceituação dada por Brillat Savarin
5
todos os que pesquisam, fornecem ou preparam as coisas que podem se converter
em alimentos.”

SOVATI (2009) comentando sobre aspectos culturais e questões simbólicas


relacionadas ao alimento cita que para DaMATTA (1987-1989 apud)3 a “comida não
é apenas uma substância alimentar, mas é também um modo, um estilo e um jeito de
se alimentar.” Sugerimos que para se entender os aspectos que envolvem a
contemporaneidade da cozinha brasileira é necessário considerar que a forma, o jeito,
o lugar e o momento em que a pessoa encontra-se ingerindo o alimento, tem também
a propriedade de definir “aquele que está se alimentando.” CRUZ, MATTE,
SCHNEIDER (2016. pág. 95) ao tratar da alimentação na sociedade contemporânea,
cita que: “O que comemos é hoje, em grande parte, objeto daquilo sobre o que
falamos, o que assistimos, lemos, discutimos, militamos politicamente, combatemos,
curtimos, defendemos, regulamos e com que nos identificamos.” 4 Para POULAIN5
(2013) apud SOARES et al (2020) “... o ato alimentar não é somente biológico, mas
também uma representação concreta dos valores fundamentais de uma cultura e de
uma época.”

Segundo FRANDIN (2020 pág. 757 e 758) “... a Revolução, permite que a alta
cozinha abandone a corte.” Referindo-se aos chefs de cozinhas que foram forçados,
a época da Revolução Francesa, pelo desemprego, a estabelecerem-se por conta
própria e ao consequente aumento do número de restaurantes em Paris: “Em Paris, é
possível contar 100 restaurantes para cada livraria.”

Sobre a formação da cozinha brasileira DÓRIA (2022 pág. 22) cita “Alguns
autores, como Câmara Cascudo6, entendem que entre os séculos 16 e 18 um
substrato comum se estabilizou, formando um “gosto” nacional que ele chama de
“cozinha brasileira”. O autor salienta que esse gosto, anteriormente citado, foi

3
DaMATTA, Roberto. Sobre o simbolismo da comida no Brasil. Correio da Unesco, ano 15, n.7, julho.
1987.
4
“Tudo e qualquer tema de interesse contemporâneo nos remete hoje à alimentação.” CRUZ,
MATTE, SCHNEIDER (2016. pág. 95)
5
POULAIN, J.P. Sociologia da alimentação: os comedores e o espaço social alimentar.
Tradução de Rossana Pacheco da Costa Proença. Carmen Sílvia Rial e Jaimir Conte. 2.ed.
Florianópolis; UFSC, 2013.
6
Luís da Câmara Cascudo. HISTÓRIA DA ALIMENTAÇÃO NO BRASIL.
6
constituído pela miscigenação entre as culinárias indígena, portuguesa 7 e a culinária
africana, o que chamou de culinária brasileira, sofre, ao longo dos séculos 19 e 20 um
afrancesamento.

Oportuno é, de imediato referir, que os primeiros restaurantes no Brasil


surgiram a partir da segunda metade do século XIX; antes, pequenas estalagens ou
hospedarias familiares serviam comida simples. Segundo FREIXA (2017 pág. 211) “A
partir da metade do século XIX, tanto em São Paulo como no Rio de Janeiro, surgiram
os primeiros hotéis com restaurantes de cozinha francesa e serviço à la carte.” 8 A
prática de vender alimentos nas ruas é descrita em vários países e em todas as
épocas.

FRANDRIN (2020 pág. 752), através da pergunta: ... onde é que na Europa
dessa época, seria possível tomar uma refeição fora de casa? comenta sobre o
nascimento do restaurante moderno na França ao final do século XVIII e cita:
“Essencialmente, nos estabelecimentos que vendiam bebidas alcoólicas e que
propunham pratos simples e baratos – preparados no próprio local ou fornecidos por
uma estalagem ou boutique de alimentação vizinha – além de vinho, objeto principal
para o seu comércio.”

Na realidade os restaurantes e as “cozinhas”9 de rua surgem, de um modo


geral, da necessidade das pessoas se alimentarem fora do seu domicílio. Convém
salientar a existência, no século XVIII, além de restaurantes e cozinhas situadas em
ponto fixo, os restaurantes e cozinhas “móveis” de rua providas, inclusive, de locais
para que as pessoas pudessem se sentar e aproveitar a refeição.

7
A culinária portuguesa que aportou ao Brasil na verdade representa a culinária europeia, uma vez
que já recebera influência de outros país e culturas.
8
Segundo FREIXA (2017 pág.213: “Com a abertura dos Portos, a elite usufrui de novos produtos
alimentícios e de grande requinte com influência francesa marcante. Mas a alimentação popular, nas
zonas rurais, não mudou muito em relação ao Brasil-Colônia.”
9
MACIEL (2004 apud SAVATI, 2009) esclarece a estruturação conceitual das chamadas “cozinhas
como formas culturalmente estabelecidas, codificadas e reconhecidas de alimentar-se” e “uma cozinha
faz parte de um sistema alimentar - ou seja, de um conjunto de elementos, produtos, técnicas, hábitos
e comportamentos relativos à alimentação -, o qual inclui a culinária, que refere-se às maneiras de fazer
o alimento transformando-o em comida”,
7
Com a Proclamação da República a política brasileira volta-se à
industrialização do País, apoiada fortemente pela cafeicultura. São criadas Metrópoles
e Parques Industriais, gerando um grande movimento populacional e de circulação de
pessoas oriundas de todos os pontos do país e do mundo. Registra-se o surgimento
de duas classes sociais importantes, a Classe Trabalhadora e a Classe Média,
resultando no surgimento de um mercado consumidor importante e com muitas
peculiaridades. Segundo DÓRIA (2022 pág. 23) “... é preciso notar que a culinária
moderna de qualquer povo submetido às várias formas de dominação logo se divide
em duas ementas: a popular e a das elites.” De acordo com FRANDIN (2020 pág.
759)” No final do século XIX começa a desenhar-se uma segunda revolução na arte
de comer fora de casa. Ela está associada ao desenvolvimento dos transportes
rápidos e do turismo de luxo.”

“Formada por pequenos comerciantes, intelectuais e artistas, a classe média


passou a ter certo poder de consumo no século XIX e também começou a frequentar
restaurantes.” (FREIXA. 2017 pág. 138). A partir do surgimento das metrópoles
brasileira, já no século XX, é que os restaurantes passam a ser considerados como
um local de lazer pela elite. “Para os operários surgiram bares e botecos, com os
chamados “pratos feitos” (ou PF).” (FREIXA (2017 pág. 215). Portanto, ao buscarmos
refinar o entendimento sobre Aspectos da Contemporaneidade da Cozinha Brasileira,
vamos nos deparar com um grande número de reflexões inerentes à procura de um
“padrão ou perfil conceitual”, próprio e singular, daquilo que desejamos definir e
entender por cozinha brasileira na atualidade, dado à complexidade do Tema. Para
CRUZ, MATTE, SCHNEIDER (2016. pág. 98) “... comer relaciona-se hoje, mais do
que em qualquer outra época, com o nosso estilo de vida e identidade, na medida de
que aquilo que comemos pode ser um elemento de classificação social...” ocasião em
que introduz o discurso sobre “capital culinário.” 10

DÓRIA (2022 pág. 21) refere sobre a facilidade de se exemplificar a cozinha


brasileira e a dificuldade em explica-la, segundo ele, isto acontece “Não por falta de

10
Capital culinário pode ser definido como um conjunto de práticas, conhecimentos, ideologias e representações
sobre alimentação, comida e comer que são utilizados em determinados contextos, para desafiar valores e
ideologias prevalecentes, ou para indicar posicionamentos sociais, econômicos e culturais, que fornecem, nessas
circunstâncias, um sentido de identidade.
8
conhecimento histórico. Falta-nos o conceito que unifique a coleção de receitas ou
pratos rememorados, obrigando-nos a esse exercício de exemplificação.” Uma das
características da contemporaneidade da cozinha brasileira encontra-se na arte de
combinar11, de um lado, e de “associar”12, do outro, o classicismo das diversas
cozinhas com adoção de novos conceitos culinários e inovações tecnológicas. Alguns
restaurantes já buscam, na produção ou criação de um prato novo, associar e/ou
combinar técnicas, culturas e ingredientes diferentes; trata-se do conceito de Fusion
Cuisine (inglês); Cuisine fusion (francês); Cozinha de Fusão ou Cozinha Integrativa
(Brasil).

A nova cozinha brasileira tem uma grande aceitação no universo da


gastronomia mundial e inúmeros chefs brasileiros já receberam importantes
premiações e reconhecimento internacional.

Buscando esclarecer a composição da Cozinha Contemporânea BACHAT


(2020) define- a como:

“A cozinha contemporânea consiste em uma especialidade da gastronomia


que une o conhecimento técnico da área (harmonização de sabores e
aromas, formas de preparo etc.) e o conhecimento sobre hábitos alimentares
das mais diferentes culturas, a fim de estabelecer uma ampla base para criar
combinações que resultarão em novos pratos e bebidas. BACHAT (2020)”.

MELLO et al (2018) delimitando o surgimento da gastronomia contemporânea


no Brasil cita a definição dada por Weber e Lamderdiére (2008)13, na qual: “A
gastronomia contemporânea se refere à alta gastronomia que se desenvolveu a partir
das experiências de grandes chefs na década de 1960 e 1970.”

Até a década de 1950, a cozinha internacional exerceu grande fascínio sobre


a elite. Mas com a influência norte-americana e a emancipação feminina, os
fast-food também se espalharam pelas capitais brasileiras. Em contrapartida,
a cozinha profissional se renovou, com a vinda de chefs franceses para
trabalhar nas grandes redes de hotéis, que passaram a dominar o mercado
de hospitalidades desde a década de 1970. Esses profissionais estrangeiros
de forno e fogão fundamentaram as bases da alta cozinha do País. (FREIXA
(2017 pág. 215 - 216).

11
Combinar nos traz o sentido de harmonizar
12
Misturar com o sentido de compor e estruturar
13
WEBER-LAMDERDIÉRE, M. As revoluções de Ferrán Adrià: o chef de cozinha que transformou a culinária em
arte. Tradução Luciane Ferreira. Porto Alegre: Editora L & PM editores, 2008.
9
No entanto os diferentes modelos de inovações, inclusive a tecnológica, que
muito tem influenciando na contemporaneidade da cozinha brasileira motiva a sua
renovação conceitual. O fato é que a gastronomia contemporânea brasileira tem por
característica ser intensamente dinâmica e renovadora. Para DÓRIA (2022 pág. 218)
“Renovar a cozinha brasileira depende da capacidade de coloca-la, através de
múltiplos expedientes, no centro das atenções e esperanças daqueles que buscam
no ato de comer uma atividade lúdica.” Acreditamos que seja esse o mais adequado
caminho para um bom entendimento do que vem a ser, e o que representa a
contemporaneidade da cozinha brasileira.

Os atuais brasileiros, assim como tudo o que lhes constitui o gosto pelo o que
comem, buscam no cotidiano da cozinha, além da renovação da beleza do cozinhar
através dos sotaques da terra, sobre tudo um reencantamento da culinária brasileira.
Com um jeitinho brasileiro, chegamos até a adotar o conceito de “cuisine du terroir”
dos franceses, uma vez que não deixamos de mesclar em nossa gastronomia, as
bases históricas de diversas cozinhas com as consequentes inovações, porém,
mantendo e recuperando em novos pratos e preparações, as influências culturais e a
diversidade regional que compõe a culinária contemporânea brasileira.

Um outro aspecto da contemporaneidade da cozinha brasileira, nascido ou


criado pelo seu particular dinamismo é a “propensão dos indivíduos em modificar
hábitos já estabelecidos” (BARBOSA et al 2020), esta característica também
sinonimiza a gastronomia contemporânea brasileira com termos como: releitura,
reconstrução, fusão e outros. Assim a “Gastronomia, pode ser composta e construída
pelo conhecimento de diversas áreas, especialmente agronomia/agricultura, cultura,
política, ciências dos alimentos, ciências sociais, nutrição e saúde, sensorialidade e
finalmente epistemologia.”, conforme SOARES et al (2020. pág. 156)

É inegável que a globalização ao longo dos anos e o fast-food na atualidade,


em especial, vem modificando a forma do homem se alimentar e a relação que
estabelece com o alimento. Na contemporaneidade da cozinha brasileira já é possível
perceber uma diluição nas particularidades e singularidades das culinárias regionais.

10
Comentando sobre a influência e consequências do cosmopolitismo da culinária em
São Paulo, DÓRIA (2022) chama a atenção para um importante fato:

“... São Paulo é singular em seu cosmopolitismo e na dimensão que sua


culinária acabou por adquirir, por obra e graça do gigantismo metropolitano,
que levou a cidade a perder os vínculos com qualquer cozinha regional
própria (caipira ou caiçara) e deu livre curso a vários estilos de comer entre
seus habitantes. Houve, de maneira involuntária, a perda dos enraizamentos
étnicos na culinária brasileira, à medida que a cidade passou a oferecer várias
outras opções já distantes dos sentimentos que ancoravam o “genuíno”
pratos nacionais.” (DÓRIA, 2020 pág. 220)

O que se nota é que as cozinhas tradicionais no Brasil, miscigenadas deste a


sua origem, vem tendo a sua essência cada vez mais distanciadas no seu dia a dia.
A dinâmica, ágil e simples, que é exigida na atualidade pela culinária brasileira no
cotidiano urbano, é um fator que distancia a culinária contemporânea brasileira urbana
das culinárias clássicas, lentas e elaboradas, ditas cozinhas inspiradas.

Considera-se que alguns estilos encontrados na contemporaneidade da


cozinha brasileira vem mostrar a existência de um processo de renascimento da
culinária brasileira; outros, entendem esses estilos, como uma forma de reação contra
o cosmopolitismo culinário ou como um processo contrário ao que compõe e incorpora
o fast-food a dinâmica econômica, social e cultural urbana do cotidiano. DÓRIA (2022)
cita cinco estilos seguidos por restaurantes nacionais que representam a
contemporaneidade da nossa cozinha, voltada à “... promover o reencantamento da
culinária brasileira ... Estilo Naïf; ... Estilo Etnográfico; ... Estilo Alegórico; ... Estilo
Experimental ... e ... Estilo Juscelinista.”

A característica de cada um dos estilos define um olhar e uma forma de


preservar e resgatar nos seus fundamentos históricos e culturais a gastronomia
brasileira.

Estilos encontrados em alguns restaurantes.

Fundamentos
Estilos Característica
É cozinha brasileira sem grandes “Manutenção das tradições e das raízes da
Estilo Naïf
inovações”, a comida “é como sempre cozinha brasileira.

11
foi ... ou ... é assim como sempre se
comeu no Brasil”
Resgate cultural da culinária “A modernidade tem destruído formas de
Estilo
brasileira. “combina o tradicional com comer que tradicionalmente respondem
Etnográfico
o erudito sobre a culinária do país.” pela individualidade da cozinha brasileira.”
Apresenta cozinha brasileira através “O intuito é apresentar, de modo
Estilo uma atividade figurativa e estilizada exemplificado, uma realidade brasileira
Alegórico que não é aquela vivenciada
cotidianamente pela clientela.”
Representa uma “ruptura com a Exibir técnicas modernas da cozinha
Estilo
forma tradicional a qual são tratados nacional.
Experimental
os ingredientes brasileiros.
Remete a uma cozinha generosa de Optado por um cardápio brasileiro
Estilo
fazenda ou dominical, de grande tradicional, mas não “popular, enraizado no
Juscelinista
legibilidade a mesa burguesa gosto das elites nacionais.
Fonte adaptada de DÓRIA (2022.pág 222 -225).

Acreditamos que através desses aspectos da contemporaneidade da cozinha


brasileira nos seja permitido manter relacionados, através dos diferentes estilos, as
mais diversas criações e produções da gastronomia contemporânea com a sua
origem, preservando assim as bases da cozinha brasileira.

O estilo Naïf é também denominado estilo ingênuo. Fundamenta-se no


entendimento de que a comida “é como sempre foi ... ou ... é assim como sempre se
comeu no Brasil”. O objetivo deste estilo é de manter as tradições e as raízes da
cozinha brasileira, é uma culinária considerada ingênua, uma vez que nesse estilo,
não se aplicam as mudanças, combinações, desconstruções ou releituras, muito
frequentes no dinamismo da cozinha contemporânea. No estilo etnográfico a cozinha
brasileira é igualada a qualquer outra cozinha, combina-se o tradicional com o erudito
sobre a culinária do país, assim a “Memória do fazer” é preservada e resgatada; esse
estilo tem por base a pesquisa etnográfica de tudo o que envolve a comida, pesquisa-
se todos os ingredientes, técnicas e métodos para a produção.

O estilo alegórico apresenta a cozinha brasileira como uma atividade figurativa


e estilizada. Um grande número de brasileiros desconhece a culinária nacional. A
representação alegórica é um bom meio de chamar a atenção para uma realidade e
propor reflexões e mudanças. Este estilo tem sido muito utilizado na atualidade pelos
meios de comunicação de massa. É muito comum encontramos restaurantes que
adotam o estilo experimental, demonstrando modernas técnicas existentes na cozinha
brasileira tão importante quantos as das demais cozinhas tradicionais. Este estilo
12
busca romper com o tradicionalismo ao qual são tratados os ingredientes brasileiros.
Por este estilo a culinária nacional é universalizada. Outros restaurantes tem optado
por um cardápio brasileiro tradicional, mas não popular, enraizado no gosto das elites
nacionais, como aquele que remetem a uma cozinha generosa de fazenda ou
dominical, de grande legibilidade a mesa burguesa. Esses restaurantes possuem o
estilo chamado de Juscelinista.

SOARES et al (2020. pág. 157) cita que alguns autores, na


contemporaneidade, buscam definir a gastronomia como um novo elemento que
nasce da culinária em função de seus “novos contornos científicos e artísticos”. Sob
este contexto gastronomia para eles é: “... uma evolução da culinária, sendo
composta de 5 dimensões essenciais: (1) Artística-Criativa; (2) Científica-Técnica;
(3) Cultural-Social; (4) Hedônica-Experimental e (5) Alimentar – Fisiológica.

Conclusão

O presente trabalho evidencia aspectos históricos, culturais, sociais e


conceituais inerentes a contemporaneidade da cozinha brasileira, que influem na
construção de um conceito culinário nacional. Na pesquisa identificou-se estilos e
dimensões que através do homem, buscam entender e conceituar a gastronomia
contemporânea brasileira a partir da culinária praticada.

Pelas dimensões e estilos culinários encontrados é possível compreender o


processo pelo qual se procura resgatar, renovar, preservar e/ou revitalizar aspectos
fundamentais e singulares da gastronomia brasileira. Não se trata apenas de um
processo reativo ao cosmopolitismo gastronômico que muitas das vezes desconstrói
a culinária regional brasileira, mas ao final, os aspectos da contemporaneidade da
cozinha brasileira vêm demostrar esforços praticados pelos chefs não somente
relativos a manutenção do dinamismo e da criatividade, mas inerentes a preservação
dos fundamentos históricos e culturais e as bases da culinária nacional.

13
REFERÊNCIAS

BACHAT. Franco. Cozinha contemporânea: entenda as principais


características. Site: Servir com Requinte. Artigo publicado em 2 de março de
2020.Disponível em : https://servircomrequinte.francobachot.com.br/cozinha-
contemporanea-entenda-as-principais-caracteristicas/. Consultado em 20/12/2023 às
15:37

BARBOSA, Lívia. A ÉTICA E A ESTÉTICA NA ALIMENTAÇÃO


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LqNg6AWT6nYImg__&Key-Pair-Id=APKAJLOHF5GGSLRBV4ZA.Consultado em
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Revista Confluências Culturais. V.9. n.2: Alimentação nio contexto de
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VIANA, M. TENDÊNCIAS DO SETOR DE ALIMENTOS E BEBIDAS PARA 2023.


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