Os dicionários trazem muitas de nições da palavra “conceito”.
Conceito pode ser sinônimo de pensamento: “isso não entra no meu conceito”. Ou compreensão de uma palavra: “seu conceito de moral é an quado”. Ou o equivalente da reputação de uma pessoa: “ela não goza de bom conceito”. Ou ainda, forma de se referir à avaliação escolar: “só ra conceito A”. Em loso a, o conceito é “a representação mental de um objeto abstrato ou concreto”. O lósofo André Comte-Sponville dis ngue conceito de noção: enquanto a noção é dada, o conceito é produzido; enquanto a noção resulta da experiência ou da educação, o conceito resulta do trabalho; enquanto a noção é um fato, o conceito é uma obra. Logo, “o conceito é uma ideia abstrata, de nida e construída com precisão: é o resultado de uma prá ca e o elemento de uma teoria”. O conceito, portanto, é uma construção ou uma elaboração. Quem constrói ou elabora um conceito, torna-se responsável por ele. Essa responsabilidade é dividida com quem usa o conceito elaborado por outrem, assim como uso o conceito de “conceito” elaborado por Comte-Sponville. Essa responsabilidade demanda que se faça manutenção constante do conceito, re nando-o e elaborando-o melhor a cada vez que se retorna a ele, assim como fazemos a manutenção permanente de uma casa ou de uma obra, para que ela não se deteriore. Posso dizer, então, que o conceito é um “work in progress”, ou seja, um trabalho em progresso constante, demandando sempre mais trabalho do pensamento e do discurso. Para o lósofo Hans Blumenberg, no livro “Teoria da não conceitualidade”, o conceito “cons tui um produto da razão, se ti fi fi fi ti ti fi fi ti fi fi ti não é exatamente o seu triunfo”. Mas triunfo sobre o quê?, pode-se perguntar. Talvez sobre a percepção e os sen dos, pode-se responder. Enquanto os sen dos nos dizem o que se encontra aqui e agora, a razão especula sobre o que possa estar lá e acolá. Quando o homem se torna bípede, passa a ver mais longe. Exatamente por isso, passa a querer ver mais longe ainda, mesmo onde sua vista não alcance. Ele quer olhar para cima e ver o céu estrelado. O ser humano é a criatura da “ac o per distans”, a saber, da ação à distância. Por isso mesmo, “não é acidental que a história da ação humana seja dominada pelas máquinas de arremesso e de ro”. O homem lida com objetos e possíveis presas que, todavia, não percebe. Por isso, desenha nas paredes de pedra da caverna objetos que não estão ali, porque são os objetos do seu desejo e da sua luta pela vida. Os desenhos na pedra são a imagem no lugar da coisa: encontram-se no lugar dos animais que ainda não foram caçados. Logo, os desenhos na pedra são os primeiros conceitos. O conceito é uma armadilha simbólica. Construo uma armadilha orientado pela forma e pelo tamanho, pelo modo de se comportar e de se mover da presa que desejo capturar. Enquanto construo a minha armadilha, porém, a presa ainda não se encontra presa dentro dela. A minha armadilha constrói um vazio que pretende, no futuro, conter a presa que desejo prender. Como me encontro distante da presa no espaço e no tempo, construo a armadilha que pretende trazer o que desejo para perto de mim, tanto no tempo quanto no espaço. A armadilha, diz Blumenberg, “é uma ação na ausência tanto da presa como também, com transferência temporal, do caçador. A armadilha atua para o caçador no momento em que, estando ele ausente, a presa está presente, ao passo que a confecção da armadilha mostra as relações inver das”. Por isso, “a armadilha é o primeiro triunfo do conceito”. Quando o homem se levanta sobre as duas pernas, amplia seu campo de visão mas não ca sa sfeito. Ele levanta também a fi ti ti ti ti ti ti cabeça para olhar as estrelas no céu escuro, pensando que armadilhas pode construir para capturá-las, bem como aos demais mistérios do cosmos – por exemplo, o mistério do amor. Tenho uma vaga noção do que seja o amor, resultado das minhas experiência e educação. Quero saber o que é o amor para mim. Preciso então construir uma armadilha simbólica que ao mesmo tempo atraia o amor e o capture, contendo-o nas suas paredes. Essa armadilha é o conceito de amor. O amor capturado nesse conceito, entretanto, parece inquieto dentro da minha armadilha. Ele se mexe e se rebela, testando a resistência das paredes da armadilha até o dia em que consiga rompê-las. O amor que se liberta já se tornou diferente daquele amor que capturei, porque aprendeu a sair da armadilha. Preciso então construir outra armadilha, isto é, um conceito mais elaborado, para capturar novamente o amor. Sabe-se, desde o trabalho do sociólogo Niklas Luhmann, que a ideia do amor como paixão é uma construção rela vamente recente, datando do m da Idade Média. Antes, casava-se por obrigação e por imposição familiar, não porque as pessoas se apaixonassem. A paixão até acontecia, mas nas relações fora do casamento. Amavam-se amantes, não cônjuges. Os escritores dos primeiros romances de amor são os pedreiros da reconstrução do conceito “amor”. A literatura captura uma nova espécie de amor, logo, ensina uma nova forma de amor. A literatura reelabora o conceito de amor. Na verdade, a metáfora que cons tui a literatura é o próprio conceito, devidamente lapidado, bem como vice-versa: o conceito é a própria metáfora, devidamente lapidada. Ao ar cular campos distantes de signi cado, comparando, por exemplo, conceito a armadilha e abstrato a concreto, a metáfora não apenas captura o imprevisível e quiçá o inominável, mas também o domes ca. A domes cação, todavia, não é permanente. A fera, ou seja, a coisa, se encontra sempre prestes a se rebelar e se tornar... outra coisa. Como posso, por exemplo, construir um conceito de mundo? ti ti fi ti ti fi ti O lósofo Ludwig Wi genstein de ne “mundo” de maneira sinte camente brilhante: “o mundo é tudo o que acontece”. Sua de nição parte não da noção de espaço, mas sim da noção que temos de tempo. Para ele, “mundo” não é o planeta que me envolve, mas sim os acontecimentos que me cercaram, cercam e cercarão. O lósofo Hans Blumenberg também tem uma boa de nição de “mundo”: “o mundo é o lugar geométrico de todos os pontos”. Assim como Wi genstein constrói uma elaborada metáfora temporal para de nir o mundo, Blumenberg elabora uma interessante metáfora espacial. Entretanto, ele mesmo não gosta muito da sua de nição, preferindo esta outra: “mundo é uma expressão com a qual a tenta va de encontrar as regras de determinação das palavras está cons tu vamente condenada ao naufrágio”. Nesta de nição, ele ques ona sua própria vontade de de nir todas as coisas, devidamente representadas pelo mundo. Ele leva seu ques onamento até à metáfora do naufrágio, vale dizer, até a necessidade de voltar à tona para rede nir todas as coisas. Isto acontece porque “a razão desperta as expecta vas do entendimento e, ao mesmo tempo, as frustra”. Entre o momento em que quase se realiza o entendimento e o momento em que se admite a frustração da compreensão, caminha a humanidade pensante, amante e errante.
ANDRÉ DEMARCHI Armadilhas
O percurso percorrido por Gell até a noção de armadilha como um
fi fi ti ti fi fi ti ti ti tt fi tt ti fi fi fi fi ti fi modo de compreender as obras de arte constitui o início de um caminho mais longo no sentido de estabelecer uma teoria “verdadeiramente” antropológica da arte, fundada no entendimento do objeto de arte (e de sua produção e circulação) enquanto função de seu contexto relacional,da matriz de relações sociais na qual está inserido (GELL, 1998). O importante para Gell é compreender os objetos enquanto índices numa cadeia de relações e interações sociais onde ocupam o lugar de agentes ou pacientes dependendo de sua posição nessa cadeia. O conceito de índice, retirado da semiótica peirceana, torna-se importante porque permite a Gell fugir da análise do significado de uma obra de arte ou do que ela quer comunicar, e se preocupar em compreender para onde determinado objeto aponta, qual a sua capacidade de agir sobre o mundo e transformá-lo. Neste ponto, outros conceitos importantes são o de agência e o de sua abdução. Um índice, segundo Gell gera necessariamente a abdução de agência, uma operação cognitiva particular que permite uma inferência causal de algum tipo a respeito de intenções e capacidades de objetos e pessoas (GELL, 1998, p. 13).
No entanto, o tipo de índice valorizado por Gell é o que permite a
abdução de agência social, na medida em que são portadores de intencionalidades complexas. O papel do antropólogo nessa nova antropologia da arte seria descobrir para onde essas intencionalidades apontam; como agem sobre sua “vizinhança”; quais as lógicas de ações, reações e relações sociais desencadeadas por, ou localizadas em, um determinado objeto. Aqui podemos retomar a idéia da armadilha como obra de arte, ou da obra de arte como armadilha.
Ela foi proposta por Gell no contexto de um debate a respeito da
exposição Art / Artifact (realizada em Nova York no ano de 1988), em que a artista plástica, curadora e antropóloga Susan Vogel, expôs na entrada da exposição uma rede de caça do povo Zande (África), provocando a reação do público que não sabia ao certo se se tratava de uma instalação ou de um mero artefato. Gell aproveita-se da discussão em torno desse fato e polemiza com o filósofo da arte Arthur Danto, defensor da idéia de que a rede Zande não é uma obra de arte devido ao seu caráter utilitário, ou seja, ela não é uma obra de arte porque não permite “uma interpretação historicamente fundamentada” que, para o filósofo, diferenciaria a obra de arte do artefato. Gell (2001) contra- argumenta no sentido de aproximar instrumentalidade e arte, definindo a armadilha pela sua capacidade de condensar idéias, significados e conceitos tal como as obras de arte conceitual:
Esses dispositivos incorporam idéias, veiculam significados, porque
uma armadilha, por sua própria natureza, é uma representação transformada de seu fabricante, o caçador, da presa animal, sua vítima e de sua relação mútua que, nos povos caçadores, é fundamentalmente social e complexa. Isso significa que essas armadilhas comunicam a noção de um nexo de intencionalidades entre os caçadores e as presas animais, mediante formas e mecanismos materiais. Creio que essa evocação de intencionalidades complexas é o que serve para definir as obras de arte, e que, adequadamente emolduradas, as armadilhas para animais poderiam evocar intuições complexas a respeito do ser, da alteridade, do relacionamento (GELL, 2001, p. 184-5; grifo meu).
Gell questiona com esse argumento toda uma visão moderna, ou
modernista, baseada em princípios estéticos enraizados na concepção de arte ocidental (e também na antropologia da arte), que, segundo ele, já foram questionados pela própria arte contemporânea. Uma nova antropologia da arte deveria ser construída contra os princípios estéticos enraizados na arte moderna ocidental, se aproximando assim da arte contemporânea que “não se define mais pela lógica do belo, e sim pela lógica do trocadilho ou da armadilha conceitual, pelo complexo entrelaçamento de intencionalidades sociais” (LAGROU, 2006, p. 05).
Para os objetivos deste trabalho é preciso reter a idéia da evocação de
intencionalidades complexas propiciada pelas armadilhas como o ingrediente central de sua agência; que está próximo o bastante para não ser percebido da noção de condensação ritual (ou condensação de conotações contraditórias, por isso complexas) expressas por Severi e depois reelaboradas para o estudo das imagens quiméricas. Aqui, nota-se uma primeira aproximação entre as duas abordagens e ela parece ser proveniente de duas outras idéias centrais para os autores que são a presentificação (ou o caráter não representativo das imagens e obras de arte e sua ação cognitiva). Esses três elementos tornam-se os pressupostos fundamentais destas duas formas de abordar a imagem, no caso de Severi, e os objetos no caso de Gell. Para ambos, a presença é fundamental para que ocorra a saliência cognitiva. Na abordagem de Severi, o contexto de comunicação ritual e as imagens geradas nele não representam certo aspecto da sociedade: oque importa em sua análise é a pragmática, o conjunto de ações que permite a uma imagem ser contra-intuitiva. Severi localiza na pragmática ritual a explicação de como ocorre cognitivamente esse processo de presentificação. Ele acontece porque as imagens, textos, cantos, enfim todo o conjunto de intencionalidades e ordens que compõe um ritual além de estarem prenhes de conotações paradoxais e complexas, são formulados em contextos contra-intuitivos de comunicação e por isso, tornam-se eficazes cognitivamente.
Para Gell, a presentificação concentra-se no próprio estatuto de
pessoa concedido a objetos e obras de arte. Se os objetos são também pessoas, então eles agem e não representam. Ou no caso da armadilha,
uma armadilha feita especialmente para capturar enguias, por
exemplo, poderia muito melhor representar o ancestral, dono das enguias, do que sua máscara, visto que não representa somente sua imagem, apesar da forma da armadilha ter a forma de uma enguia, mas presentifica, antes de mais nada, a ação do ancestral; sua eficácia tanto instrumental quanto sobrenatural e a relação complexa entre intencionalidades diversas postas em relação como aquelas da enguia, do pescador e do ancestral (LAGROU, 2007, p. 44).
Embora fique evidente o efeito cognitivo que as armadilhas
proporcionam à presa ou ao espectador, parece haver aqui um ponto essencial que diferencia a abordagem de Gell e a de Severi. Lagrou (2007) afirma que a análise de Severi estaria voltada para a compreensão do
poder das imagens de afetar as pessoas emocionalmente. A teoria
de Gell sobre agência, por outro lado, não exclui absolutamente a emoção como um dos efeitos possíveis da agência dos índices de arte, mas ele está mais interessado em entender cognitivamente o poder da forma e dos objetos de agirem em relações sociais do que em explorar a imaginação humana (LAGROU, 2007, p. 58; grifo da autora).
Nota-se então que, embora as duas abordagens contenham princípios
cognitivos, elas apontam para caminhos diferentes. A preocupação que move Severi na direção de uma antropologia cognitiva é a compreensão de formas distintas de memória social ou como colocado acima, o porquê de certas imagens tornarem-se parte da memória de um povo e outras não. Uma preocupação muito mais voltada para o entendimento das “artes da memória”, através da articulação de imagens e narrativas num contexto de comunicação ritual, do que para a compreensão cognitiva do “poder da forma dos objetos”, ou mesmo para a compreensão do poder das imagens em afetar emocionalmente as pessoas.
Para Gell (1998), diferentemente, os princípios cognitivos parecem se
colocar como condição do funcionamento de seu sistema de ação:
For the anthropologist, the problem of ‘agency’ is not a matter of
prescribing the most rational or defensible notion of agency, in that the anthropologist’s task is to describe forms of thougt which could not stand up to much philosophical scrutiny but which are none the less, socially and cognitively praticable (GELL, 1998, p. 17).
Essa preocupação com a descrição de formas de pensamento social e
cognitivamente praticáveis parece ter sido, para Gell, um aspecto importante de um ambicioso projeto de entendimento antropológico da mente humana.
Ele se unia na London School of Economics a Maurice Bloch na
ambição de transformar a antropologia numa ciência cognitiva com capacidade de fazer afirmações universais sobre o funcionamento da mente humana, nas suas manifestações externas. E não é de se estranhar que entre os autores que mais influenciaram o pensamento de Gell destacam-se Lévi-Strauss e (...) Edmund Leach. Estes autores gostavam, como Gell, de modelos e diagramas e, pelo menos Lévi-Strauss pensava, como Gell, que existia uma isomorfia entre a estrutura do mundo cognitivo, mental e sua objetificação no mundo. Ou seja, era possível estudar a mente humana através de suas manifestações sociais, culturais, materiais (LAGROU, 2006, p. 02).
Deve-se considerar que a ênfase na forma e em sua capacidade de
ação cognitiva está ligada a importância atribuída ao índice na trilogia peirceana do signo. Abandonando o ícone e o símbolo, e concedendo total importância ao índice enquanto elemento de agência, Gell queria impor uma visão formal dos grafismos ou da arte, que embora fosse entendida dentro de seu contexto de relação, possuía certa independência do seu significado, já que sua ação ocorreria através da abdução de agência. Este conceito, também retirado da semiótica torna-se importante por designar uma “classe de inferências semióticas que são por definição, totalmente distintas das inferências semióticas que usamos no entendimento da linguagem” (GELL, 1998, p. 14). A abdução de agência livraria Gell do significado, da interpretação e da representação. Mas sua lógica não invocaria também certos sentidos inferidos pelo receptor?
Tratarei desta questão adiante. Neste ponto é preciso reter a idéia de
que a abordagem de Gell, centrada na capacidade agentiva da obra de arte, em sua capacidade de capturar o receptor por meio de processos cognitivos, trouxe grande tempestade para os mares calmos da antropologia da arte provocando apropriações e criticas de suas idéias 6 no entendimento das artes dos ameríndios .
A próxima seção demarca um esforço no sentido de compreender uma
dessas apropriações através do trabalho de Els Lagrou (2007), sobre a arte Kaxinawa. Vejamos então, entre quimeras e armadilhas, quais os caminhos propostos pela autora.
Segundo Alfred Gell (1998:134)
“a obra de arte pode ser comparada a uma armadilha, pois a obra
sendo vista reativaria as qualidades colocadas intencionalmente pelo artista, justamente para ativar todas as capacidades
presentes na mente das pessoas”. Leonardo da Vinci alertava que
“a pintura é coisa mental” e temos aqui uma nova forma de entender essa a rmação. Quando Gell (1998:112) aponta que olhar para uma obra de arte é “como encontrar alguém”, faz referência ao poder que a obra de arte tem de cristalizar as intenções do artista e, ao mesmo tempo, de concretizar uma “rede de intenções” que leva o público a cair na armadilha. Se a obra fala pelo artista, o público tem que sentir, ouvir e ver para descobrir as intenções em jogo na obra. Para entender e sentir uma obra é preciso se jogar na armadilha, cair na rede de in(tensões) e nalmente, tal como um animal preso, debater-se com as signi cações simbólicas presentes na obra. Esta metáfora nos instiga a analisar uma obra de arte tal qual uma armadilha; a obra de arte necessita de um cenário de captura, de uma vítima (o público) e de um mecanismo de captura da atenção: uma isca, uma “estét-isca”. Gell esclarece que “as armadilhas comunicam a idéia de uma rede de intenções e de relações entre os caçadores e as suas presas através do material utilizado” (1999:50). Procurando desenvolver uma “teoria universal da arte”, teoria que seja capaz de tratar tanto da arte ocidental como da arte tribal, Gell(1999:78) trabalha com os conceitos de produção, circulação e recepção da obra de arte, para de nir uma antropologia da arte capaz de interpretar tanto uma obra contemporânea de Damien Hirst como uma armadilha Zandé da África Central.Nesse sentido, o autor concebe a arte como um “sistema de ação” que procura primordialmente mudar o mundo a ser o mero suporte de proposições simbólicas. A noção central dessa nova teoria, a 2 “intencionalidade”, coloca em xeque os debates clássicos sobre a de nição da arte a partir de uma dinâmica fundada sobre a rede de intenções entre o agente (o artista/a obra), o paciente (o público) e o contexto (espaço de exposição). De certa maneira, Gell sobrepõe o conceito de comunicação ao conceito de estética, considerando a obra de arte como um elemento de comunicação (e de comunhão) entre os indivíduos. Para Gell, “as obras de arte nos fazem imaginar as diferente intenções ligadas as suas produções e nos obrigam as representar-las com intenções próprias” (1999:148). Ao invés de pensar a arte em termos de beleza deveríamos, segundo ele, concebê-la em termos de intenções, sejam imaginárias ou reais: “O que chamamos de objeto de arte, e muitos outros objetos que não classi camos como arte, possui uma força ou um poder de fascínio porque fi fi fi fi fi fi consideramos esses objetos como indicadores do que as pessoas que o fabricaram e utilizaram tinham em mente. Assim a Joconde nos permite apreender tanto as intenções do pintor de produzir um belo objeto que vai impressionar algumas pessoas, as intenções da mulher, ela mesma, de seduzir e de ironizar, as da mulher sendo representada como sedutora irônica, a vontade ou a resistência do artista a ilustrar o humor que o modelo quer ver representado, a intenção do colecionador de encomendar o objeto, de mostrar a sua riqueza ou a beleza das mulheres sobre as quais ele exerce o seu poder, as intenções do estado francês de mostrar seu poder e sua riqueza através da aquisição e da exposição deste objeto... Todos estes espíritos são, conscientemente ou inconscientemente , representados aqui através da obra de Leonardo Da Vinci” (GELL,1999:163). E, é assim que se vê, de acordo com Gell, o poder do objeto de arte. Se as obras são “redes de intenções”, vemos que um objeto de arte continua de abrir ou de abrir-se a novas redes enquanto ele é visto e/ou utilizado.
A Consciência interior (Traduzido): Um curso de lições sobre os planos internos da mente, intuição, instinto, mentação automática e outras fases maravilhosas dos fenômenos mentais