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Unidade III

Unidade III
A arte contemporânea parece ser o “bicho de sete cabeças” do nosso tempo, a esfinge sedenta de
devorar-nos diante das diversas questões a que não sabemos responder. Reconhecemos o estranhamento
diante de certas “obras de arte”, às vezes duvidamos serem “arte”, dado o seu caráter aparentemente
banal, utilizando recursos, estruturas e objetos do cotidiano. A arte contemporânea tornou-se a tachação
mais rápida que o espectador faz quando não consegue estabelecer relação com uma obra de arte:
aquilo que não faz sentido vai para a “gaveta” da arte contemporânea.

Começaremos por abordar a difícil tarefa de definir arte contemporânea, apresentando a


complexidade da qual o termo deriva. São dois os contextos: a pós-modernidade e o regime de
comunicação em contraposição à noção de modernidade e seu respectivo regime de consumo.
Conheceremos mais a fundo o artista Marcel Duchamp, aqui apresentado como “embreante” da arte
contemporânea no interior da arte moderna. A seguir, observaremos algumas das diversas tendências
da arte contemporânea, apresentando suas características, ideias principais e os artistas mais
representativos de cada um deles.

Esperamos que o aluno obtenha com essa leitura uma ampliação de seu repertório sobre arte, artistas
e movimentos contemporâneos. Que aborde cada um deles sem receios, tocando-os com unhas, mãos
inteiras, braços e todo o seu corpo racional, sensorial e emocional. Que se deixe envolver, compreendendo
termos e conceitos de forma alargada e contextualizada, de modo que realize ele próprio a antropofagia.

A antropofagia é um termo oriundo do Manifesto Antropofágico, texto publicado em 1928 por


Oswald de Andrade, e é definido pela capacidade canibalesca de deglutir formas culturais diversas e, a
partir delas, produzir coisas novas.

7 A COMPLEXIDADE DO TERMO

Complexus significa o que foi tecido junto; de fato, há complexidade


quando elementos diferentes são inseparáveis constitutivos do todo (como o
econômico, o político, o sociológico, o psicológico, o afetivo, o mitológico), e
há um tecido interdependente, interativo e inter-retroativo entre o objeto de
conhecimento e seu contexto, as partes e o todo, o todo e as partes, as partes
entre si. Por isso, a complexidade é a união entre a unidade e a multiplicidade.
Edgar Morin

“Contemporâneo” é uma palavra que possui como sinônimos “coetâneo” e “coevo”, com o sentido
de ser do mesmo tempo ou da mesma época de algo ou alguém: por exemplo, pode-se dizer que Vincent
Van Gogh era contemporâneo de Paul Gauguin. Entretanto, por “contemporâneo” também podemos
compreender algo que seja do tempo atual, por exemplo, quando dizemos que uma peça de mobiliário é
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de design contemporâneo. Já a palavra “arte”, vista sob a perspectiva de sua origem do latim ars, significa
“técnica, habilidade, talento e saber fazer”. Contudo, o termo “arte” tem ganhado definições muito mais
abrangentes do que sua origem latina, de acordo com as épocas e as culturas que o abordam.

Arte contemporânea não abarca apenas uma justaposição dessas duas palavras. Em conjunto, estas
formam um conceito que, quando utilizado, refere-se a uma abordagem específica da história da arte e
à produção dos artistas. Para tentar dialogar com esse conceito e compreendê-lo ao menos em algumas
de suas faces, resolvemos assumi-lo como um termo que se constrói a partir do pensamento complexo.
Não nos referimos ao “pensamento complexo” como um pensamento “complicado”, mas trazemos para
a discussão a ideia de “complexidade” do antropólogo, sociólogo e filósofo francês Edgar Morin.

O pensamento complexo implica um modo de pensar em forma de rede, cujo conhecimento do mundo e
das coisas se dá a partir da relação entre os diversos contextos e as diversas partes que compõem o objeto de
estudo. Na complexidade, a lógica linear, ou seja, o pensamento etapista que pressupõe que se deva passar por
certas fases para se obter a resposta ou solução de um problema, é compreendida como simplificadora
e reducionista, pois elimina o objeto de seu contexto e aplica o mesmo método independentemente
das características do objeto estudado. Esse tipo de pensamento, que Morin chama de “pensamento
representacionista”, compreende o conhecimento como o processo da mente humana de absorver do
mundo externo informações e representá-las em nossa mente. Nesta perspectiva de conhecimento, há
verdades absolutas. Já o pensamento complexo de Morin propõe que o conhecimento seja construído
a partir da relação dinâmica entre o sujeito que aprende, o objeto de estudo e seus diversos contextos,
e esta relação, ao modificar-se, altera também a verdade ou conclusões alcançadas, não sendo estas,
pois, reconhecidas como “absolutas”, mas passando a existir como pluriverdades, válidas para aquele
determinado momento, diálogo e contexto.

Pensar a arte contemporânea a partir do pensamento complexo é assumi-la como termo em


constante mutação, que se altera na medida em que modificamos o contexto em que a enquadramos.
Aceitar a sua complexidade permite-nos abordá-la conscientes da sua infinitude, sendo a leitura que
travaremos a seguir, tal como os contextos que utilizaremos, apenas algumas das diversas relações
possíveis a se fazer sobre a arte contemporânea. Sobre essa característica do pensamento complexo:

Um pensamento complexo nunca é um pensamento completo. Não


pode sê‑lo, porque é um pensamento articulante e multidimensional.
A ambiguidade do pensamento complexo é dar conta das articulações
entre domínios disciplinares fraturados pelo pensamento desagregador
(um dos principais aspectos do pensamento simplificador). O pensamento
simplificador isola o que separa, oculta tudo o que religa. Para esse estilo
de pensamento, compreender e entender é interferir e mutilar a dinâmica
criadora da multiplicidade do real. Nesse sentido, o pensamento complexo
aspira a um conhecimento multidimensional e poiético. Sabe, porém, desde
o início, que o conhecimento completo é impossível: um dos axiomas da
complexidade é a impossibilidade, inclusive teórica, de uma onisciência. Torna
sua a frase de Adorno, “a totalidade é a não verdade”. Reconhece também
o estado transitório e quase esquemático de todo conceito. Pressupõe o
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reconhecimento de um princípio de incompletude e de incerteza. Pressupõe,


também, por princípio, o reconhecimento dos vínculos entre as entidades
que nosso pensamento deve necessariamente diferenciar entre si, mas não
isolar. O pensamento complexo está animado por uma tensão permanente
entre a aspiração a um saber não parcelado, não dividido, não reducionista
e o reconhecimento do inacabado e incompleto de todo conhecimento.
Poderíamos dizer que o caminho do conhecimento é para o pensamento
complexo o que para Paul Valéry era a elaboração de um poema, algo que
nunca se termina (MORIN; CIURANA; MOTA, 2003, p. 54).

Assim, adotamos aqui a arte contemporânea em seu estado transitório de formulação e reformulação
constantes. Posicionamo-nos desta maneira para que o leitor seja capaz de perceber o caráter de
incerteza e de incompletude que ronda o conceito de “arte contemporânea”, em que cada autor – os
que aqui apresentaremos e outros que os leitores poderão vir a conhecer – irá abordá-lo de maneira
diferenciada, cabendo ao leitor tecer a rede que conecta todos esses olhares.

Um bom exemplo para iniciarmos nosso estudo sobre arte contemporânea é o trabalho do escultor
Frans Krajcberg. Nascido na Polônia, adotou o Brasil como pátria e dele tornou-se cidadão. Naturalizado
brasileiro, é uma presença forte no cenário da arte contemporânea nacional, principalmente por adotar
elementos naturais em seus trabalhos. Sua arte representa a natureza brasileira utilizando diferentes
técnicas e materiais, como pedra, cipós trançados, troncos de árvores e os relevos naturais deixados pelo
mar na praia. No início, usou a pintura para se manifestar e procurava nas rochas e terras mineiras sua
coloração para pintar suas telas. Mais tarde, buscou nos troncos das árvores devastadas pelas queimadas
do Mato Grosso e nos cipós mortos por parasitas dos mangues da Bahia a inspiração para seus trabalhos
como escultor. O objetivo de suas esculturas é dar vida a algo morto da natureza.

Figura 91 – Esculturas de Troncos Queimados (2008), de Krajcberg, feita de árvores das queimadas do Mato Grosso

Fonte: Proença (2009, p. 261).

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7.1 Modernidade e pós-modernidade

Por que há de ser a arte contemporânea uma esfinge questionadora? O que dificulta ao público
ler e relacionar-se com esse tipo de produção artística? Talvez a perda de referências estéticas,
talvez a utilização de critérios válidos apenas para as obras do passado. Mudam-se os tempos e
reconfigura‑se a atuação do artista diante deste mundo mutável. Entretanto, sem compreendermos
aspectos dessas alterações, não visualizaremos nem a transição, nem as novas proposições.

Dois conceitos são basilares na transformação da arte mais recente: a modernidade e a


pós‑modernidade. As pesquisadoras em cultura visual estadunidenses Marita Sturken e Lisa Cartwright
apresentam em seu livro Practices of Looking: An Introducting to a Visual Culture a modernidade
e a pós-modernidade como formas de olhar distintas que promoveram transformações na esfera
artística. Iremos nos dedicar agora a falar sobre esses dois tópicos específicos, de modo a tentar
compreender a noção de pós-modernidade como intrínseca à arte contemporânea.

Segundo Sturken e Cartwright (2001), a transição da modernidade para a pós-modernidade


não se deu como um marco. Modernidade e pós-modernidade não são concepções separadas por
períodos específicos, mas coexistem no mesmo contexto. Isto se evidencia no próprio “pós-“ do termo
“pós‑modernidade”, que ainda dialoga com valores presentes na modernidade, dando-lhes respostas e
apresentando-lhes novos desenvolvimentos. Há outros autores que situam a pós-modernidade como
pertencente ao contexto surgido após a Segunda Guerra Mundial (1945), outros após Maio de 1968, e
outros ainda a partir da queda do Muro de Berlim (1989).

Observação

“Maio de 1968” foi a maior greve-geral da história, sendo iniciada


por um movimento estudantil, na França. Esse acontecimento marcou
uma série de conquistas sociais que persistem até os dias de hoje, como a
igualdade de direitos civis, a liberação sexual e o reconhecimento das lutas
dos estudantes e da diversidade cultural.

7.2 A modernidade

Sturken e Cartwright (2001) situam o surgimento da modernidade a partir do Iluminismo, alcançando


seu auge no final do século XIX e início do século XX. Esse auge foi marcado por um grande êxodo
rural observado nos países ocidentais, principalmente europeus, devido à crescente industrialização.
A experiência da modernidade foi marcada pelo crescimento da urbanização, industrialização e
transformação tecnológica, consequências do processo de industrialização capitalista e de sua fé
ideológica no progresso. Nesse enquadramento, a modernidade fazia crer num sentido linear de progresso,
em que as modificações tecnológicas e sociais eram imperativas e benéficas para toda a sociedade.

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Lembrete

O Iluminismo, também conhecido como “Século das Luzes”, foi um


movimento cultural do século XVIII que se caracterizou pela rejeição da
tradição e por um grande desenvolvimento no campo científico, tendo
como base o conceito da razão.

A esperança no futuro teve como consequência o rompimento com as tradições, pois estas
impediriam a concretização das mudanças. Diversos foram os movimentos artísticos – os “ismos”
– criados de modo a romper com as convenções do passado, todos eles com seus manifestos
publicados com a finalidade de garantir sua autenticidade e fixação. Havia a necessidade
de se enxergar a realidade de novas maneiras. Assim, novos modos de representar o mundo,
principalmente na pintura, foram criados, em que a materialidade da obra, a sua forma,
sobrepunha-se ao seu conteúdo.

A noção de sujeito na modernidade, segundo as autoras, pode ser definida a partir da ideia
proposta pelo filósofo francês do século XVII, René Descartes: “Penso, logo existo”. Disso resulta uma
noção de sujeito que adquirirá a sua presença individual a partir da ação do pensar, tornando‑se
portador de uma autoconsciência. O sujeito é uma entidade universal, portanto indiferente aos
enquadramentos políticos, sociais, econômicos e culturais nos quais poderia ter se desenvolvido
como pessoa. Para além disso, a obra artística na modernidade era tida como aurática, ou seja,
portadora de uma autenticidade normalmente relacionada ao gênio criador do artista, algo que,
na pós-modernidade, será posto em discussão.

Para as autoras, a obra de arte moderna, pintura, escultura ou cinema, possui um discurso
metalinguístico, cujas características principais ficam retidas nos aspectos plásticos do trabalho.
Metalinguagem é quando se utiliza uma linguagem para falar dela mesma. Assim, a pintura deixa
de fazer referência a um outro conteúdo – por exemplo, uma cena histórica – para passar a falar
sobre o próprio ato de pintar. Sturken e Cartwright chamam essa característica de reflexivity,
que aqui traduziremos como reflexividade, em que “a obra artística comenta em si o seu próprio
processo de produção” (STURKEN; CARTWRIGHT, 2001, p. 248, tradução nossa), sem fazer
referência ao contexto no qual foi elaborada. “Reflexividade é a prática de tornar os observadores
conscientes do significado material e técnico da produção ao evidenciá-los na imagem ou ao
utilizá-los como conteúdo da produção cultural” (STURKEN; CARTWRIGHT, 2001, p. 248, tradução
nossa ). O modernismo introduziu a reflexividade na esfera da arte, principalmente com relação
à forma e ao aspecto plástico da própria obra de arte. O pós-modernismo deu continuidade ao
processo, porém de uma maneira diferente, como veremos a seguir. A reflexividade possibilitou
que a obra de arte moderna se constituísse como autorreferencial, pois seu conteúdo e sua forma
fazem referência a ela mesma, conferindo-lhe a característica da mobilidade e a autonomia para
circular livremente.

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Saiba mais

Um bom exemplo da reflexividade modernista é o filme Um Homem


com uma Câmera, do cineasta russo Dziga Vertov. Vertov utiliza a linguagem
cinematográfica para falar dela mesma e da vida cotidiana da cidade.

UM HOMEM com uma câmera. Dir. Dziga Vertov. União Soviética, 1929.
68 min.

Na arte moderna a percepção de uma obra de arte por um observador era tida como direta, sem
considerar que existiria mediação entre obra e observador, ou seja, pouco interferindo nesse processo
de comunicação os contextos nos quais obra e observador estavam imersos. Essa ideia de imediação
entre a obra e seu fruidor reflete uma perspectiva que entende a existência de uma única verdade que
pode ser alcançada quando acessados os canais certos de conhecimento, dando-nos uma perspectiva de
que, naquele instante, as noções representacionistas da cognição eram dominantes – tal como falamos
anteriormente sobre o pensamento representacionista.

Outro fato que se desenvolveu junto com a autorreferencialidade da obra e o seu nomadismo foi que
a arte moderna, segundo Crimp (2005), surgiu presa em um movimento capitalista, mas camuflada por
um objetivo maior e global, tornando-se “mercadoria especializada de luxo”. A autonomia e o nomadismo
da arte moderna eram, pois, também a sua condição de circulação, “do estúdio para a galeria comercial,
dali para a residência do colecionador, desta para o museu ou para o saguão da sede de alguma grande
empresa” (CRIMP, 2005, p. 137).

7.3 A pós-modernidade

Na pós-modernidade, passa-se a desconfiar de diversas noções presentes na modernidade. Será o


progresso mesmo bom para todos? Será que aquilo que dizem ser o certo e a verdade realmente pode
ser aplicado para toda a sociedade? Será que o sujeito pode ser definido em termos universais? Será que
a experiência com a obra de arte é sempre pura e imediata?

Diversas são as relações que se modificam. Descobertas na ciência questionaram a noção de verdade.
A física quântica mostrou que o ponto de vista do observador altera o comportamento do objeto
observado, colocando em pauta a ideia de incerteza e indeterminação. Essa nova perspectiva nos diz
que verdades não são unânimes e que o contexto no qual o observador está inserido é também uma
variável de considerável importância.

O mundo Pós-moderno é percebido como complexo, tal como vimos em Morin, devido à ênfase
nas relações que se dão em padrão de teia entre as diversas partes que compõem a sociedade. Tais
relações podem ocorrer de maneiras diversas, permitindo conceber o sujeito como uma entidade plural
e diversificada. Isso gera a ideia de subjetividades múltiplas, concebidas a partir de variadas categorias
como raça, gênero, classe e idade, diferindo assim do sujeito moderno, universal e único. Da mesma
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forma, as ideias de autenticidade e gênio criador, tão presentes na arte moderna, são postas em discussão,
tornando complexos o processo criativo e a esfera da arte. A arte pós-moderna acredita que nada de
novo possa ser inventado e passa a utilizar a cópia com o mesmo valor que o original, colocando em
questão as ideias de originalidade e autenticidade.

Plurarismo, multiplicidade e diversidade, segundo as autoras, são termos que caracterizam a


pós‑modernidade e a noção de subjetividade. Reunidos, os sujeitos passam a lutar e a reivindicar por
causas coletivas. A segunda metade do século XX acolhe diversas revoluções sociais, como o feminismo,
as causas GLS, o ambientalismo e a contracultura. Busca-se questionar as estruturas da sociedade
traçando relações de força e controle, revelando ideologias e valores que justificavam a dominação de
um humano sobre outro. Essa nova compreensão sobre o sujeito se estendeu aos observadores-leitores,
que passam agora a ser abordados em sua complexa e distinta teia cultural, fazendo com que emerja
o entendimento de que as imagens são interpretadas de maneiras diferentes por sujeitos diferentes. A
obra adquire um campo polissêmico, ou seja, de muitos significados.

No pós-modernismo, os artistas “produzem obras que examinam reflexivamente sua própria posição
em relação à arte ou ao contexto institucional da obra de arte” (STURKEN; CARTWRIGHT, 2001, p. 254,
tradução nossa). A reflexividade ainda existe, mas não está centrada na linguagem e na plasticidade do
próprio trabalho: dialoga diretamente com o próprio sistema da arte em si e seu contexto de produção.
Por isso, “a arte pós-moderna não está preocupada em representar a realidade, mas sim em repensar
a função da arte e enfatizar o papel que o contexto institucional tem na produção de significado”
(STURKEN; CARTWRIGHT, 2001, p. 263, tradução nossa).

Para além dessas características, Sturken e Cartwritght (2001) colocam que a reflexividade na arte
pós-moderna passou a rever o papel do observador com relação à imagem ou à narrativa, por vezes
fazendo o trabalho artístico criar a consciência, no observador, de estar a observar e, por consequência,
a afirmar a existência e a recriação – por meio de sua compreensão – da própria obra. Podemos perceber
mais claramente essa situação quando os artistas minimalistas passam a utilizar o espelho como material
basilar do trabalho –abordaremos mais adiante o minimalismo.

Na pós-modernidade, as imagens estabelecem outro nível de relação com as pessoas. As autoras


trazem para o diálogo o pensamento do sociólogo e filósofo francês Jean Baudrillard, que nos
apresenta o paradigma da representação – que faz referência ao real – como sendo substituído pelo
paradigma da simulação – em que a imagem não busca mais representar o real, mas, sim, ser mais
real do que o real, borrando os limites entre o real e o virtual. Cria-se aí um novo ponto de situação,
o da hiper-realidade, em que “o hiper-real ultrapassa o real, e o simulacro cresce, em parte, através de
novas formas de mídia, como as novas formas de existência pós-moderna” (STURKEN; CARTWRIGHT,
2001, p. 237, tradução nossa).

O simulacro cria superfícies de mediação que, como foi dito, apresentam-se mais reais do
que o real. Na pós-modernidade, as experiências humanas são mediadas não somente pelas
superfícies de contato e tecnologias, mas também pelas linguagens, imagens, pelos contextos
sociais e históricos de vida que representam o lugar de imersão do observador. O modernismo não
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tinha essa perspectiva, pois ainda considerava a experiência como pura, clara e direta, na qual a
informação, ou conhecimento, chegava ao destinatário da forma que o emissor havia articulado,
desconsiderando todo o contexto.

Saiba mais

O livro O que é Pós-moderno, de Jair Ferreira dos Santos, fala de maneira


sucinta e clara sobre o pós-modernismo. Na parte intitulada “Bye, Bye, real”,
o autor apresenta uma síntese sobre o tema que acabamos de abordar.

SANTOS, J. F. O que é Pós-moderno. São Paulo: Brasiliense, 2004.

Com a ajuda de Sturken e Cartwright (2001) apresentamos pistas e indícios, iniciando um caminho
com alguns dos olhares possíveis para algumas das faces da modernidade e da pós-modernidade. Nossa
intenção é possibilitar a compreensão das manifestações de arte contemporânea a partir da ótica da
pós-modernidade, pois aquilo que é cunhado normalmente como “arte contemporânea” historicamente
se associa com o modo Pós-moderno de estar no mundo e olhar para ele, sendo para isso necessário
perceber também a modernidade que a antecede.

Caberá ao aluno continuar a percorrer esse caminho caso se interesse em abordar a arte contemporânea
a partir dessa perspectiva, conhecendo novos rostos da multifacetada pós-modernidade.

7.4 Regimes da arte

Acabamos de ver como o enquadramento na pós-modernidade contextualiza e amplifica o território


de atuação dos artistas no século XX, alterando, por consequência, os modos de produção e os produtos
artísticos na arte contemporânea. Traremos agora uma perspectiva proposta pela filósofa e artista
plástica francesa Anne Cauquelin. Temos como referência o livro Arte Contemporânea: Uma Introdução,
no qual a autora aborda a arte contemporânea a partir do próprio sistema da arte ao definir regimes
que determinam a distinção entre a arte moderna e a contemporânea, respectivamente denominadas
“regime de consumo” e “regime de comunicação”.

Cauquelin (2005) nos diz que há um “estado contemporâneo” para o sistema da arte e que “esse
sistema não é mais o que prevaleceu até recentemente; ele é o produto de uma alteração de estrutura
de tal ordem que não se podem mais julgar nem as obras, nem a produção delas de acordo com o
antigo sistema” (CAUQUELIN, 2005, p. 15). Assim, faz-se necessário compreender primeiro o sistema “do
passado”, ou seja, o sistema da arte moderna, para então perceber como o sistema atual da arte traz
reverberações, respostas e novidades, distinguindo-se do anterior.

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7.4.1 Regime de consumo ou arte moderna

Segundo Cauquelin (2005), a sociedade moderna formula-se durante a transição de um regime


industrial para um regime de consumo, em meados do século XIX. Essa sociedade ficou marcada pelo
valor do progresso – científico, tecnológico e social –, pela ideia do trabalho que possibilita o acesso
à propriedade e pelo aumento da importância da educação e das boas maneiras – que garantirá
oportunidades num futuro próximo –, desenhando assim o esquema produção-distribuição-consumo,
que passará a ser o esquema vigente de organização dessa sociedade. O seu culminar pode ser explícito
no termo criado pelo escritor francês Guy Debord: “a sociedade do espetáculo”.

O espetáculo não é um conjunto de imagens, mas uma relação social


entre pessoas, mediatizada por imagens […] O espetáculo, compreendido
na sua totalidade, é simultaneamente o resultado e o projeto do modo
de produção existente. Ele não é um complemento ao mundo real, um
adereço decorativo. É o coração da irrealidade da sociedade real. Sob todas
as suas formas particulares de informação ou propaganda, publicidade
ou consumo direto do entretenimento, o espetáculo constitui o modelo
presente da vida socialmente dominante. Ele é a afirmação onipresente da
escolha já feita na produção, e no seu corolário — o consumo. A forma e
o conteúdo do espetáculo são a justificação total das condições e dos fins
do sistema existente. O espetáculo é também a presença permanente desta
justificação, enquanto ocupação principal do tempo vivido fora da produção
moderna.­­[...] A sociedade que repousa sobre a indústria moderna não é
fortuitamente ou superficialmente espetacular, ela é fundamentalmente
espetaculista. No espetáculo da imagem da economia reinante, o fim não
é nada, o desenvolvimento é tudo. O espetáculo não quer chegar a outra
coisa senão a si mesmo. [...] Na forma do indispensável adorno dos objetos
hoje produzidos, na forma da exposição geral da racionalidade do sistema,
e na forma de setor econômico avançado que modela diretamente uma
multidão crescente de imagens-objetos, o espetáculo é a principal produção
da sociedade atual (DEBORD, 2010, p. 38-42, grifo do autor).

Há, portanto, uma grande máquina industrial, espetacular, que produz não apenas mercadorias, mas
também novas formas de consumo e mercado. Até então, na História, não se havia desenvolvido uma
sociedade estruturada no regime de consumo, por isso sua distinção gera também a sua nomeação.

Saiba mais
Guy Debord criou o filme A Sociedade do Espetáculo em 1967, feito a
partir de excertos do livro que leva o mesmo nome. Nele, você poderá ter
acesso às ideias-chave do autor, apresentadas de maneira resumida.
A SOCIEDADE do espetáculo. Dir. Guy Debord. França, 1974. 90 min.

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Cauquelin (2005) situa o início da arte moderna por volta dos anos 1860, marcada pela recusa,
por parte dos artistas, à hegemonia representada pela Academia e pelos salões anuais – o principal
deles, o Salão de Paris. A Academia era a instituição que legitimava ou deixava de legitimar os artistas,
concedendo prêmios e gerando encomendas. Essa situação surge a partir do desenvolvimento
industrial, em que:

O enriquecimento da classe burguesa provoca uma afluência de compradores


potenciais, ao mesmo tempo que os pintores reivindicam um estatuto menos
rigidamente centralizador, menos autoritário – liberando-os da imposição do
Salão de Paris, com seu júri reconhecendo o mérito das obras, ou excluindo
das paredes pintores que não agradam. Reinvindicação de um sistema mais
livre, mais maleável, do direito à exposição (CAUQUELIN, 2005, p. 34)

Em resposta, obteve-se a descentralização dos salões; porém, ainda assim, seria necessário
que de alguma forma as produções artísticas fossem legitimadas diante de um público comprador,
garantindo‑lhes reputação e a venda das obras: criou-se o mercado independente, configurado na
relação “marchand-crítico”. Portanto, a legitimação permanecia necessária, mas, com o crescente
aumento da demanda de obras artísticas e com o aumento do número de artistas, fazia-se imperativo
criar uma alternativa que desse uma resposta ao problema.

Observação
Marchand é a figura responsável por negociar e vender as obras de
arte. A figura do “crítico” de arte surge com a tarefa de “acompanhar com
seus comentários – apresentar, apoiar ou vituperar – determinado artista
ou determinada exposição”, fabricando a opinião e contribuindo para “a
construção de uma imagem da arte, do artista, da obra ‘em geral’ – e de
determinado artista ou grupo de artistas ao qual se ligará especialmente”
(CAUQUELIN, 2005, p. 37-38). Assim, o crítico fará a vez do júri dos salões,
promovendo alguns artistas para renegar outros. Como fica o artista nesse
cenário? “O artista se isola de um sistema que lhe garantia a segurança,
tornando-se uma figura marginal. Submetido às flutuações do mercado –
devidas em boa parte à concorrência, ao número crescente de artistas, ele
se aflige por sua sobrevivência e se coloca na dependência de marchands e
críticos” (CAUQUELIN, 2005, p. 46).

À espera da legitimação e das novas encomendas vindas do mercado, o artista aparentemente autônomo
em sua produção vê-se dependente do sistema de consumo. Posicionar-se em grupo permite que ele seja
mais facilmente consumido do que se permanecer sozinho, uma vez que “um produto único atrai menos
consumidores do que uma constelação de produtos da mesma marca” (CAUQUELIN, 2005, p. 47).

Por conta disso, às vezes as singularidades dos artistas eram construídas por meio de biografias
relatando extravagâncias e excentricidades, reafirmando a ideia do “espetáculo”. Contudo, o sistema
de consumo quer manter o seu ritmo e garantir a continuidade de produção e possibilita que o artista
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permaneça intacto como produtor, afastado de uma ideia de comercialização, para que sua credibilidade
com o público fique inabalável.

Os consumidores desse sistema de arte distinguem-se entre colecionadores, diletantes e público. Os


colecionadores são os grandes burgueses e aristocratas esclarecidos, agentes ativos do mercado que costumam
consumir variedade e qualidade. Por vezes, suas obras – as coleções – acabam tornando-se tesouro público por
meio de uma doação, fazendo a memória do colecionador permanecer para a posteridade. Os diletantes são
aqueles que compram por prazer e na intenção de fazer um bom negócio.

O público é formado pelos observadores passivos, que consomem as obras com o olhar e ajudam
a disseminá-la por meio de boatos, transformando a imagem do artista e da obra. Porém, esse público
se recusava a levar a sério as obras de vanguarda. Eles estranhavam a vanguarda – a arte moderna
– tal como nós estranhamos hoje a arte contemporânea. Eles abordavam a vanguarda, julgando-a e
olhando-a, com os mesmos critérios que utilizavam para a arte acadêmica. Vê-se que os problemas se
repetem cem anos depois.

Na intenção de levar o conhecimento da arte para o grande público, os governantes, juntamente


com os artistas, se esforçam para que o espectador comece a ter contato com a arte contemporânea e,
assim, tente entendê-la. Em São Paulo, na Praça da Sé, encontra-se uma escultura que, em uma primeira
impressão, se parece com duas enormes lagartas. Com um movimento dançante, uma lagarta levanta a
outra para um salto gigante em seu voo rumo ao céu.

O autor dessa obra é Caciporé Torres, escultor paulistano, que usa em seus trabalhos o ferro fundido e o
aço inox em estado de sucata. É com esses materiais que cria suas esculturas contemporâneas maciças, não
figurativas, que, segundo o próprio artista, devem ser acessíveis a todas as pessoas. Por essa razão, as esculturas
devem ser colocadas em grandes espaços públicos, como os parques e praças das cidades.

Figura 92 – Voo (1979), escultura de Caciporé Torres

Fonte: Proença (2009, p. 260).

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7.4.2 Regime de comunicação ou arte contemporânea

Cauquelin (2005) afirma que o sistema da arte contemporânea não pode ser considerado apenas
como o aumento do regime de consumo, pois houve mudanças estruturais que o regime não justifica.
Assim, a autora apresenta uma constatação: “nós passamos do consumo à comunicação” (CAUQUELIN,
2005, p. 56). Algo que talvez todos nós já soubéssemos, mas como isso repercute no sistema da arte?

A sociedade da comunicação realiza-se a partir de cinco elementos “efetuadores”, ou seja, elementos


possibilitadores de sua concretização: a noção de rede, o bloqueio ou autonomia, a redundância ou
saturação, a nominação ou prevalência do continente sobre o conteúdo e a construção da realidade em
segundo grau ou simulação (CAUQUELIN, 2005).

A noção de rede implica “um sistema de ligações multipolar no qual pode ser conectado um número
não definido de entradas, cada ponto da rede geral podendo servir de partida para outras microrredes”
(CAUQUELIN, 2005, p. 59). Estamos todos conectados feito um sistema neuronal, e pouco importa a
origem da informação, contanto que ela esteja circulando na rede. Logo, a noção do sujeito comunicante
desaparece, dando lugar a uma produção global – pela ação da rede inteira – de comunicação. A autoria
na rede representa dúvida, incerteza, chegando até a não existir.

Bloqueio ou autonomia quer dizer que a rede é um sistema de memória e repetição, pois a mensagem
circula pelos diversos pontos e nós da rede, indo, voltando e reproduzindo a mesma mensagem. Cada ponto,
nó ou interseção na rede representa a rede total, não sendo possível definir um começo nem um fim.

A redundância e a saturação são elementos que, ao mesmo tempo que garantem a circulação dos
conteúdos pelos diversos pontos da rede de forma instantânea, anulam o grau de diferença entre as
novidades que penetram na rede, pois todas se encontram no mesmo plano de circularidade. Este
grau de indiferenciação cria a necessidade de se nominar objetos dentro da rede de modo a diferi-los.
Segundo a autora, “uma sociedade nominativa se instaura, onde o nome funciona como identidade,
classifica e designa uma particularidade” (CAUQUELIN, 2005, p. 62).

O quinto elemento efetivador, a construção da realidade, está estritamente relacionado à linguagem:

É por intermédio da linguagem que se estruturam não somente os grupos


humanos, mas ainda a apreensão das realidades exteriores, a visão do
mundo, sua percepção e sua ordenação. Assim, apaga-se pouco a pouco
a presença positivada de uma realidade dada pelos sentidos, os sense data,
em favor de uma construção de realidade de segundo grau, até mesmo de
realidades no plural, da qual a verdade ou a falsidade não são mais marcas
distintas. […] Significa que as intenções dos sujeitos, a intencionalidade
– no sentido de vontades ou desejos próprios a um sujeito – cede a vez
à intenção única de utilizar a linguagem para comunicar, pois a sintaxe,
o léxico – em uma palavra, as regras da linguagem – se encarregam do
restante. […] o desenvolvimento de linguagens artificiais e o uso cada vez
mais generalizado delas alteram nossa visão da realidade. Constroem, pouco
a pouco, outro mundo (CAUQUELIN, 2005, p. 63-64).
111
Unidade III

Na sociedade de comunicação, a linguagem passa a ser o elemento indispensável para o seu


funcionamento. Fica difícil dissociar os conceitos de simulacro e hiper-real de Jean Baudrillard, que
vimos anteriormente, da proposição da autora de estabelecer novas realidades a partir da existência e
emergência de diferentes linguagens. Enquando Baudrillard se refere à utilização da imagem na criação
do simulacro, Cauquelin propõe o mesmo, porém com a linguagem.

Os efeitos da comunicação no registro do mercado da arte constroem-se em relação aos efetuadores


que acabamos de abordar.

A rede do mercado da arte contemporânea possui a característica complexa – complexidade


que vimos anteriormente em Edgar Morin –, na qual surgem diversos atores que introduzem
informação. Dentre eles, destacam-se as redes internacionais de galerias e instituições culturais
que criam, elas mesmas, os preços e a avaliação estética das obras e dos artistas, resultando no
seu reconhecimento social. Será ressaltado o ator que, dentro da rede, possuir o maior número
de conexões diretas com outros atores; portanto, aquele que tiver mais informações, oriundas da
própria rede, o mais rápido possível.

Esses atores que lidam com a passagem e fabricação da informação – dentre elas a cotação
e o valor estético das obras – são considerados os produtores do regime de comunicação da arte
contemporânea. Eles são capazes de fazer aquilo que Cauquelin chamou “antecipação do signo
sobre a coisa” (CAUQUELIN, 2005, p. 68): antes mesmo de ter sido exposta, fazem a obra do artista,
na forma de signo, circular na rede. Isso acaba por legitimar o que será exposto, uma vez que já
estará em circulação.

Os produtores, portanto, são aqueles que alimentam e produzem a rede e, por consequência,
as obras. Serão considerados tanto mais ativos quanto maior o número e a diversidade de suas
conexões. Assim, uma grande instituição só terá força se estiver posicionada dentro e em toda
parte da rede.

Entretanto, essas instituições são também as que encomendam as obras aos artistas e
apresentam ao público o que é arte contemporânea, mas fazem-no a partir de um juízo de valor
sedimentado pelos críticos e marchands já inseridos e a laborar no interior da rede, legitimando‑se
como se estivessem também dentro do circuito. Nessa situação, Cauquelin nos apresenta com
clareza a formação de uma circularidade:

Nós vemos, portanto, com relação a esses que chamamos produtores,


estabelecer-se uma circularidade (um percurso em forma de anel):
os grandes colecionadores-marchands que intervêm nas cotações,
reconduzindo‑as aos conservadores, que são exatamente os colecionadores
do Estado e que são tidos como aqueles que intervêm no valor estético. Se
uns estão interessados no benefício propriamente econômico, os outros
trabalham em benefício da imagem cultural que valoriza a instituição que
dirigem e, por isso, o Estado que a subvenciona (CAUQUELIN, 2005, p. 71).

112
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

A esses produtores juntam-se a impressa especializada – com assessores de imprensa, agências,


jornalistas-críticos de arte –, experts e produtores e viajantes-comerciantes ­– estes últimos sempre
atentos ao que acontece ao redor do mundo, importando e exportando informação. Assim, a crítica, que
na arte moderna incorporava o juiz legitimador do circuito, sendo figura única e insubstituível, passa a
ficar dispersa com o início da atuação dos profissionais da publicidade.

O crítico começa a desempenhar diversos papéis, como curador, escritor ou expert. Na verdade,
todas as funções ficam diluídas entre todos os atores, e poderíamos dizer que quase todos nesse sistema
podem exercer a função de todos.

Mais uma vez, como fica o papel dos artistas nesse regime? Bem, diversos são os produtores que têm
os artistas e suas obras como seus objetos. Por isso, Cauquelin (2005) afirma que artistas e obras são
elementos constitutivos das redes de comunicação, ao mesmo tempo que são os seus produtos.

Ao vermos uma obra de arte contemporânea, estamos vendo a arte contemporânea no seu conjunto,
pois ela carrega consigo todo o sistema que a legitima como tal. Por vezes, o artista é valorizado de
acordo com o reconhecimento que obteve dentro da rede, contabilizando o número de exposições, se
pertence ao acervo de museus e coleções, se há artigos e catálogos produzidos com sua obra, por fim,
medindo o seu grau de visibilidade.

O artista deve estar ao mesmo tempo em toda parte. Esse é o princípio da saturação e nominação
que o faz ser absorvido pela rede, estar em circulação ao mesmo tempo que se diferencia. O artista passa
a desempenhar um papel complexo e contraditório, em que:

O artista que entra ou “é posto” na rede é obrigado a aceitar suas


regras se quiser permanecer nela. Ou seja, renovar-se e individualizar‑se
permanentemente, sob pena de desaparecer dentro do movimento perpétuo
de nominação que mantém a rede em ondas. Mas essa exigência de
renovação e de individualização contradiz constantemente outra exigência:
a da repetição, da redundância. Com efeito, para que sua obra sature a
rede e seja mostrada em toda parte ao mesmo tempo, é preciso que seja
reconhecida por um signo de identidade. É preciso, então, que se repita.
Que faça eco de si mesma. Entre inovação e repetição obrigatória instala‑se
então uma espécie de desgaste, não de seu talento – estamos supondo
que o artista o tenha –, mas de sua exposição cegante, exaustiva, sobre a
qual nenhuma exibição ou operação de descoberta pode mais ser feita. […]
Estratagemas de toda sorte entram então em ação […]. De artista ele pode
passar a curador de “exposição”, ou seja, produtor dessa vez, agente de sua
própria publicidade, assegurando assim um bloqueio completo (CAUQUELIN,
2005, p. 77-78).

Os consumidores da rede, os destinatários de todas essas informações, são os próprios gestores da


rede, aqueles produtores do artista e da obra, pois consomem a arte depois de tê-la fabricado.

113
Unidade III

Mais uma vez existe o bloqueio da rede, em que aquele que insere o elemento, criando conexões e
repercussão, legitima-o e atribui-lhe valor – monetário e artístico –, fazendo-o porque será ele mesmo
a consumi-lo, comprando e revendendo obras e artistas numa circularidade infinita.

Já o público, que Cauquelin chama de “cidadãos comuns”, “é convidado ao espetáculo e não


tem como não aquiescer” (CAUQUELIN, 2005, p. 79). O público não consegue julgar esteticamente
as obras, mas deve entender que aquilo é arte contemporânea, fato comprovado pelo valor da
obra e da cotação.

O lugar de exposição, museu ou galeria, reafirma a dúvida de que o que está exposto é arte. Assim,
o continente prevalece sobre o conteúdo: são a exposição e o lugar que afirmam “isto é arte”, e não as
obras. A rede legitima-se, protegendo-se contra qualquer intempérie.

E sobre a realidade de segundo grau e simulação? A arte contemporânea é a sua imagem, corresponde
ao sistema de comunicação, e não a um dado objetivo. Cauquelin (2005, p. 81) pergunta-nos: “a arte
continua sendo o que era ‘antes’, ligada a critérios estéticos, ou cedeu lugar a uma realidade que não
tem mais nada a ver com o gosto, o belo, o gênio, o único, ou o conteúdo crítico?”. Responde: “a
realidade da arte contemporânea se constrói fora das qualidades da própria obra, na imagem que ela
suscita dentro dos circuitos de comunicação”.

Assim, aqueles que tentam julgar a arte contemporânea a partir de critérios anteriores, fora
do sistema de comunicação, veem-se deslocados e sem saber como agir diante dos novos valores.
Os critérios do passado são “estéticos”, mas a arte contemporânea caracteriza-se pelo “artístico”.
A autora difere os dois termos, “estético” e “artístico”, em que “estética é o termo que convém
ao domínio de atividade onde são julgadas as obras, os artistas e os comentários que suscitam”
(CAUQUELIN, 2005, p. 82).

Em sua preocupação com o artístico, alguns artistas deixam para o espectador decifrar a mensagem
contida na obra, tornando-a estética perante os olhos alheios. A obra, na medida que vai sendo decifrada,
torna-se bonita ou feia pelo julgamento dos espectadores. Sem uma forma definida, o abstrato entra
como elemento principal das esculturas contemporâneas.

A obra de Felícia Leiner, por exemplo, polonesa radicada no Brasil desde 1927, caracterizou‑se
no início pela representação de figuras. Mais tarde, a escultora aderiu à tendência abstrata em
suas obras, criando projetos destinados a grandes espaços externos, como a Praça da Sé, na
capital paulistana. Há uma grande quantidade de esculturas da artista espalhadas nos arredores
dos jardins externos do auditório de Campos do Jordão, convivendo harmoniosamente com o
paisagismo realizado ali.

114
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

Figura 93 – Pássaros (1976), monumento de Felícia Leiner. Praça da Sé, São Paulo

Fonte: Proença (2009, p. 259).

A estética insiste em valores ditos “reais”, substanciais ou, ainda, essenciais da arte. Podemos
comparar essa definição ao estado da arte moderna como imediata, tal como discutimos anteriormente.
Já “artístico” delimita o campo das atividades da arte contemporânea. Será considerada artística
qualquer obra que for exibida no campo definido como domínio da “arte”. Portanto, será sempre o
próprio sistema da arte, por meio do regime de comunicação, a reconhecer aquilo que colocará em
circulação, nomeando-o ou não de arte.

7.4.3 Marcel Duchamp: um artista no regime de comunicação

Para exemplificar os desencadeamentos da arte contemporânea a partir do regime de comunicação,


Cauquelin nos apresenta três personalidades da arte como “embreantes”.

São “figuras singulares, de práticas, de ‘fazeres’, que primeiramente desarmonizam, mas que
anunciam, de longe, uma nova realidade” (CAUQUELIN, 2005, p. 87). São pessoas que anteveem uma
nova realidade, um novo estado das coisas.

A autora aponta Marcel Duchamp, Andy Warhol e Leo Castelli como embreantes do regime de
comunicação. Partilharemos, por meio da transcrição de alguns trechos, a análise que Cauquelin tece à
figura de Marcel Duchamp, por considerarmos que representa uma boa síntese daquilo que acabamos
de ver.

115
Unidade III

O embreante Marcel Duchamp (1887-1968)

O fenômeno Duchamp tem de interessante o fato de sua influência sobre a arte


contemporânea crescer à medida que passam os anos. De um lado, o número de trabalhos
que lhe são dedicados é cada vez mais importante; de outro, ele é a referência, explícita
ou não, de numerosos artistas atuais. Por quê? Porque esse artista – que declarava
não sê-lo – parece expressar o modelo de comportamento singular que corresponde às
expectativas contemporâneas [...].

Para fazer justiça à novidade delas, devemos, pois, proceder não à análise termo a termo
das obras, o que seria apropriado a uma história da arte, mas ao posicionamento global da
atitude de Duchamp.

1. Primeira proposição: a distinção estética/arte

a) A ruptura

Duchamp rompe com a prática estética da pintura: ele se declara “antiartista”. E aí


começa a aventura.

Essa ruptura não é uma oposição, que estaria ligada à sua antítese seguindo uma cadeia
casual, mas, sim, um deslocamento de domínio. A arte não é mais para ele uma questão
de conteúdos (formas, cores, visões, interpretações da realidade, maneira ou estilo), mas de
continente. É assim que Marshall McLuhan dirá, cinquenta anos mais tarde: “O meio é a
mensagem”, apagando a distinção clássica entre mensagem (conteúdo intencional) e canal
de transmissão (neutro e objetivo) para estabelecer a unicidade da comunicação através do
meio. É o mesmo apagamento feito por Duchamp do conteúdo intencional da obra diante
do continente, bastando este último para afirmar que se trata de arte.

b) Os ready-mades

Em 1913, Duchamp apresenta os primeiros ready-mades, Roda de Bicicleta; anos depois,


em 1917, Fonte, no Salão dos Independentes de Nova York. Ele deixou o terreno estético
propriamente dito, o “feito à mão”. Não mais a habilidade, não mais o estilo – apenas “signos”,
ou seja, um sistema de indicadores que delimitam os locais. Expondo objetos “prontos”, já
existentes e em geral utilizados na vida cotidiana, como a bicicleta ou o mictório batizado
de fontaine [fonte], ele faz notar que apenas o lugar de exposição torna esses objetos
obras de arte. É ele que dá o valor estético de um objeto, por menos estético que seja.
É justamente o continente que concede o peso artístico: galeria, salão, museu etc.

Em relação à obra, ela pode então ser “qualquer coisa, mas numa hora determinada”.
O valor mudou de lugar: está agora relacionado ao lugar e ao tempo, desertou o próprio objeto.
A divisão entre estética e arte se faz em benefício de uma esfera delimitada como palco,
onde o que está sendo mostrado é arte. Nesse caso, o autor desaparece como artista‑pintor,
ele é apenas aquele que mostra. Basta-lhe apontar, assinalar.
116
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

c) O acaso e a escolha

Se o fazer é impossível, resta a escolha, à qual está reduzida a parte do artista. Com
efeito, já que o continente espacial é importante, o continente temporal, o momento, o
é da mesma maneira, pois a escolha do objeto pertence ao acaso, ao encontro, à ocasião.
Duchamp chamará esse exercício temporal de “acaso em conserva”.

O ready-made, encontrado por acaso, escolhido e reservado, indica o estado da arte em


um momento determinado. Ele está em uma relação de fragmento com a totalidade dos
acontecimentos da arte. Em nenhum caso é uma obra à parte, uma obra em si dotada de
valor estético; é um indicador, um signo dentro de um sistema sintático. Ele manifesta essa
sintaxe apenas por seu posicionamento.

2. Segunda proposição: a indistinção dos papéis

Se a estética, o savoir-faire manual foram, assim, deixados de lado, se o artista é aquele


que mostra, se produz signos, toda a distribuição de papéis dentro do domínio da arte deve
ser reconsiderada. Duchamp dedica-se a isso.

a) O artista como produtor

O artista é, nesse novo jogo, aquele que produz, ou seja, que coloca à frente, que
exibe um objeto. Ele arranja o objeto e dispõe dele. Assim fazendo, identifica-se com o
galerista‑marchand, que também “produz” artistas no palco da arte. Ele os ordena e
também dispõe deles de alguma maneira. Identifica-se, além disso, com o fabricante do
objeto em questão. Num objeto fabricado, a intervenção do artista é, em resumo, mínima.
Ele “acrescenta” algumas vezes ao ready-made ou ao signo, mas a materialidade do objeto
continua fora dele. A atividade daquele que mostra, organizador da representação, é
exercida por meio do deslocamento do objeto: muda-o de lugar, de temporalidade. Assim,
está rejeitada ou afastada qualquer pretensão à criação de formas e cores. O artista não cria
mais, ele utiliza material.

O primeiro produtor da obra é o industrial; o segundo é o artista que escolheu utilizar um


objeto fabricado. O artista identifica-se com uma etapa da produção industrial, contribui com um
simples “coeficiente de arte”. Ele faz um aporte ao ready-made mas também ao fabricante.

b) O produtor como observador

Segundo deslocamento de papéis. A famosa proposição de Duchamp “É o observador


que faz o quadro” é para ser tomada ao pé da letra. Ela não se refere – como se crê com
muita frequência – a alguma metafísica do olhar, a um idealismo do sujeito que enxerga,
mas corresponde a uma lei bem conhecida da cibernética, retomada pelas teorias da
comunicação: o observador faz parte do sistema que observa; ao observar, ele produz as
condições de sua observação e transforma o objeto observado. Vê-se que não se trata mais
117
Unidade III

de separar o artista de seu consumidor virtual, mas de uni-los em uma mesma produção. O
lugar do artista se encontra então identificado, de um lado com o fabricante, de outro com
o observador.

c) O artista como conservador

Aqui, uma vez mais os papéis estão embaralhados: o intermediário – conservador,


galerista ou marchand – é o próprio artista. Não somente Duchamp “conserva” o acaso
posto em conserva, como preserva notas, textos e objetos fotocopiados nessas valises, nessas
caixas em valises. Ele as acumula e transporta consigo. Por outro lado, para perfazer o ciclo,
torna-se conservador do departamento do museu da Filadélfia, que apresenta 45 obras da
coleção Arensberg – suas próprias obras. É também membro de um júri, interpretando dois
papéis ao mesmo tempo: o de artista que apresenta seu trabalho e o de membro do júri que
recusa sua “fonte”.

A demonstração é perfeita: o artista não é um elemento à parte, separado do sistema


global; não há autor, não há receptor, há apenas uma cadeia de “comunicação” encerrada
em si mesma.

3. Terceira proposição: o sistema da arte é organizado em rede

As duas primeiras proposições conduzem diretamente à terceira. Com efeito, a relação


da arte com o sistema geral (social, político, econômico) é uma relação de integração e não
de conflito. Atuando em partições simultâneas, Duchamp desmonta a antiga ideologia do
artista exilado, recusado, contestador: o estético não é um domínio que tem leis diferentes
do sistema geral. É uma simples peça dentro de um jogo de comunicação, cuja entrada,
assim como a saída, não pode ser encontrada. Não há origem nem fim, é um círculo. As
operações que se desenrolam no interior de uma rede têm a ver com propriedades da rede,
não com a vontade do artista. Cada ponto da rede está ligado aos outros, cada interveniente
pode estar em toda parte ao mesmo tempo.

A singularidade de Duchamp – com a incompreensão que ele frequentemente suscita –


é ter “posto a nu” um funcionamento, ter esvaziado do artista e da obra seu conteúdo
intencional, emocional. O Grande Vidro ou A Noiva Despida por Seus Celibatários, Mesmo, é
a própria arte, desembaraçada de seus falsos brilhos estéticos. Por meio de O Grande Vidro,
frio, e de seus mecanismos trituradores, é o regime novo da arte contemporânea, sua lógica
impecável, que se delineia.

4. Quarta proposição: a arte pensa com palavras

Último efeito dentro da ordem axiomática: a importância da linguagem. Em um jogo


de designação e demonstração, que consiste em escolher um objeto já existente no uso
comum e conceder-lhe um coeficiente de arte, o “aporte” (ou “acréscimo”) pode vir de uma
nova montagem, mas também, e mais necessariamente, dos títulos que o acompanham.
118
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

Expor um objeto é intitulá-lo. O mictório é fonte, o porta-casaco colocado no chão é


alçapão; quando o objeto é reconhecível como objeto estético (como a Monalisa), o título
“acrescentado” desloca o valor estético: LHOOQ o dessacraliza.

Como o conteúdo físico da pintura – cores e formas – é rejeitado, e a arte não é mais
retiniana, é não óptica, então deve utilizar outro suporte. Mas as palavras são signos
impalpáveis, pouco pesados, que a cadeia de comunicação pode fazer circular dentro dessa
leveza. Elas servem simultaneamente de lugar e de tempo aos objetos aos quais são título,
e substituem a matéria: o título é uma cor.

5. O transformador Duchamp

Duchamp como obra contém em germe os desenvolvimentos que os artistas que virão
depois dele impulsionarão, em um sentido ou em outro: a arte conceitual, o minimalismo, a
Pop Art, as instalações, até mesmo os happenings, que ele tanto apreciava. Mas não é nessa
sequência histórica, nessa continuidade de desenvolvimento de um conteúdo estético que
se deve procurar a transformação de Duchamp. Seria um contrassenso fundamental. É nas
proposições axiomáticas que anunciam e fundam o regime da arte contemporânea que seu
trabalho é verdadeiramente transformador. É nesse ponto que a esfera da arte se articula
com a era da comunicação todo-poderosa.

Vejamos um resumo breve dessas articulações:

• passagem da mensagem intencional, com emissor e receptor, ao signo produzido pela


rede e dentro da rede e suscetível de nela circular (anonimato ou disfarce de assinatura,
banalidade do objeto, inexistência de qualquer emoção de origem retinida).

• paralelamente, desaparecimento do autor como sujeito livre e voluntário. A


descoberta ao acaso, a escolha, substituem o fazer.

• importância da linguagem, não como expressão de um pensamento, mas como


fundo radical dele próprio. A língua pensa sobre si, como a arte o faz por meio dela.

• desaparecimento das vanguardas e da mensagem sociopolítica. […] Se nos situamos


com Duchamp fora da história da arte estética, não há mais tomada de posição que
tenha valor por sua novidade formal, e, consequentemente, não há mais vanguarda
(nem, aliás, “retaguarda”). Outro fenômeno é a recuperação quase instantânea do que
poderia ter passado por vanguarda. Como tudo é admitido, recebido e reconhecido
como atual, a vanguarda não pode mais se destacar do pelotão.

• busca das condições mínimas de transmissão de um signo: a assinatura se torna a


garantia da arte, seu coeficiente de valor artístico: a obra pertence ao gênero do cheque.

119
Unidade III

• apresentação do continente espacial que coloca o objeto em situação de obra.

• esboço de um desnudamento da rede formada pelos profissionais da arte.

O modelo Duchamp, tão discreto que só alguns iniciados tomaram conhecimento


dele, oferece não tanto “novas imagens”, mas a única imagem possível de um exercício
da Arte em um sistema que já começa a ser instaurado, o da comunicação, à qual sua
obra serve de analisador.

A partir desse momento, o domínio da arte não é mais o da retirada e do desentendimento,


do conflito com a sociedade, mas de um aclaramento, circunstanciado, dos mecanismos que
a animam.

Fonte: Cauquelin (2005, p. 89-105).

Figura 94 – A Roda da Bicicleta (1913), de Marcel Duchamp

Fonte: Proença (2009, p. 148).

120
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

Figura 95 – A Fonte (1917), de Marcel Duchamp

Fonte: Strickland (2004, p. 148).

Cauquelin (2005) nos possibilita compreender a arte contemporânea a partir do interior do próprio
sistema da arte, seguindo o regime de comunicação que envolve toda a sociedade. Assim, a arte
contemporânea não começa a existir a partir de determinado momento da história, nem substitui a
chamada arte moderna, mas vai coexistindo com ela, consolidando-se conforme as tecnologias de
comunicação e a economia reestruturam o próprio sistema da arte.

Assim, abordamos a arte contemporânea a partir de duas perspectivas que se pretendem


complementares. Por um lado, o pós-modernismo como contexto sociocultural que possibilita,
sobretudo, compreender os conteúdos e a subjetividade dos artistas com seus processos criativos, num
enquadramento muito distinto do da arte moderna. Por outro lado, vimos o regime da comunicação que
possibilita olhar a arte contemporânea a partir da sua estrutura organizacional, observando e analisando
o próprio sistema da arte.

Esperamos que o aluno apreenda essas perspectivas como primeiras abordagens à arte contemporânea
e possa, autonomamente, num futuro próximo, conhecer novos ângulos dessa esfinge que agora só nos
observa a querer devorar-nos.

7.5 Pós-modernismo: a Segunda Guerra Mundial como o divisor de águas da


Arte Moderna

Com o término da Segunda Guerra Mundial, novas tendências foram surgindo no interior das
lutas sociais, buscando melhorar as condições de vida destruídas no período de conflito. As economias
europeia e norte-americana fortaleceram-se, pois os meios de produção estavam a todo vapor.
121
Unidade III

Nesse contexto histórico surge a Op Art (optical art), ou arte óptica. Sua principal função é explorar
as sensações de movimento com o uso de formas geométricas e cores monocromáticas.

Os principais artistas dessa tendência são o húngaro Victor Vasarely (1908-1997), que estudou em
Budapeste e teve contato com o movimento Bauhaus, e a inglesa Bridget Riley (1931), com um estilo
considerado semi-impressionista.

O artista Alexander Calder (1898-1976) mantinha estritas relações com o Brasil e era conhecido por
fazer festas de samba em seu estúdio nos Estados Unidos. Calder trabalhou com a ideia de movimento
da Op Art, com móbiles manipulados pelos próprios observadores que interagiam com sua obra.
Posteriormente, utilizou a suspensão para deixar que o ar tivesse a função de manipular os objetos.

Nos Estados Unidos, em 1960, um movimento se propôs a transformar a vida cotidiana em arte e
fazer que não houvesse distinção entre ambas. Esse movimento vem da expressão inglesa Pop Art, ou
Arte Popular.

A produção da época foi importante para o movimento, pois os artistas utilizavam muito os recursos
da televisão, do cinema e das propagandas, comuns nos meios de comunicação em massa.

Esse retorno aos temas pictóricos figurativos estava longe de ser


um retorno à tradição. A arte pop elevou a ícones os mais crassos
objetos de consumo, como hambúrgueres, louça sanitária, cortadores
de grama, estojos de batom, pilha de espaguete e celebridades como
Elvis Presley. “Não há motivo para não considerar o mundo um grande
quadro”, disse Rauschemberg. Os artistas pop também faziam arte
impessoal, reproduzindo garrafas de Coca-Cola ou caixas de sabão em
pó num estilo anônimo, lustroso como em um impresso. Com espírito
bem-humorado, a nova arte apagava a pretensão da pintura de ação
(STRICKLAND, 2004, p. 174).

O grande símbolo que está no inconsciente coletivo, quando se fala dessa tendência artística, é
a obra que utiliza o rosto da atriz americana Marilyn Monroe, atriz de muito sucesso em Hollywood
na época.

Marilyn Monroe, de Andy Warhol (1928-1987), com certeza representa a mensagem dos artistas da
Pop Art: o ser humano, que se transforma em uma celebridade, torna-se um produto a ser consumido
pela massa. Nos dias atuais, a atriz é considerada um ícone pop e é reconhecida como uma estrela
mesmo anos após a sua morte, em 1962.

122
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

Figura 96 – Marilyn Monroe (1967), serigrafia de Andy Warhol

Fonte: Strickland (2004, p. 175).

O universo de propagandas, quadrinhos e anúncios se mistura na obra de Roy Lichtenstein


(1923‑1997). O artista se inspirou nas formas de impressão do século XIX, utilizando os pontilhados, que
foram sumindo conforme aprimoraram-se as técnicas de impressão. As figuras preenchidas por pontos
tornaram-se sua marca registrada.

Como podemos observar na obra The Melody Hunts My Reverie, o artista não só utiliza o recurso dos
pontos para preencher a face da personagem, como também o balão com a frase transcrita, típico
dos quadrinhos.

Figura 97 – A Melodia Persegue minha Fantasia (1965), tela de seda de Roy Lichtenstein

Fonte: Strickland (2004, p. 174).

123
Unidade III

Outro quadro com base em uma propaganda feito pelo artista chama-se Moça com Bola, inspirado
num anúncio real, em que alguns detalhes originais foram mantidos, como a cor escura do maiô da
personagem e a posição dos braços ao segurar a bola. Contudo, quando se observa a obra, a primeira
ideia que se tem é a de um desenho de história em quadrinhos.

Assim, diante de tanta atividade artística rompendo com os padrões tradicionais de se produzir arte,
o movimento passou a ser questionado.

Joseph Beuys, artista plástico alemão, produziu vários tipos de sentimentos em sua obra controversa
e provocativa chamada Como se Explicam Quadros a uma Lebre Morta, de 1965. Trata-se de uma
fotografia em que o artista questiona sobre como é inútil explicar quadros a qualquer pessoa.

Figura 98 – Como se Explicam Quadros a uma Lebre Morta (1965), fotografia de Joseph Beuys

Fonte: Strickland (2004, p. 184).

Com artistas como Beuys se inicia o questionamento sobre o que é arte e sobre a necessidade de
conservá-la em local propício, como um museu ou uma galeria. Passa-se a questionar onde a arte
de fato acontece e se somente as peças que estão nesses locais podem ser consideradas como tal.

Duchamp (1887-1968) comprou um típico vaso sanitário de banheiro masculino, colocou a data
1917, assinou como R. Mutt e enviou para uma exposição. Com isso, ele influenciou outros artistas, que
começaram a utilizar objetos industrializados em suas composições.

A exposição de um objeto industrializado fora de seu local comum, para ser observado de forma
diferente e até mesmo sob aspectos variados, passou a constituir uma tendência a que se deu o nome
de ready-made.
124
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

Outro artista que buscou elementos industrializados para suas composições foi David Schmidt
(1906-1965). Metalúrgico de profissão, ele desenvolveu a ideia de movimento e equilíbrio a partir de
objetos conectados.

Com o avanço do capitalismo industrial e das novas tecnologias de produção em massa, ficou claro
que os objetos produzidos em larga escala não seriam considerados obras de arte, mesmo que um ou
outro fosse utilizado isoladamente numa composição artística. A multiplicidade de cópias produzidas
pelas máquinas de um mesmo objeto é que o caracteriza como não sendo uma obra de arte.

Joseph Beuys, com sua obra Terno de Feltro, pendura um terno comum em um cabide e o leva para
a exposição. O tecido de feltro provoca sensações táteis no observador, com a ideia de tranquilidade e
segurança. Explorar esses conceitos foi além dos objetos industriais e passou também pela pintura.

Observação

Joseph Beuys foi um dos precursores de uma tendência de vanguarda


intitulada Work in Progress. Seus adeptos utilizavam o recurso da
performance para apresentar seus trabalhos, com a mescla de diferentes
formas de representação, como teatro, artes plásticas, música e videoarte,
entre outros. Os nomes mais significativos desse gênero são Beuys, Robert
Wilson e Gerald Thomas.

O tema Solidão foi retratado por diversas vezes pelo artista Edward Hopper (1882-1967). A sua obra
mais emblemática é uma pintura de diversos personagens sentados em cadeiras de sol: fica nítido que
eles compartilham o mesmo espaço, mas sem nenhuma interação entre si.

O artista Frank Stella (1936) propõe uma forma diferente de sustentar um quadro que não seja por
cavalete. A ausência da superfície foi substituída por uma grade que dá a sustentação, e os vãos entre a
pintura nos permitem visualizar a parede onde a obra está apoiada.

A partir do século XX, vivemos num contexto histórico ímpar, com avanços científicos e tecnológicos
impressionantes, que rapidamente influenciam o ambiente humano.

Nesse contexto, os grandes movimentos artísticos que duram anos e são seguidos pelos artistas
contemporâneos passam a ser substituídos por uma série de movimentos convivendo entre si e
mostrando a aceitação da diversidade. Com isso, percebemos o rompimento concreto do que pode ser
considerado arte, e as diferentes tendências passam a coexistir e dialogar umas com as outras.

O Pós-Modernismo surge depois dos anos 1960. As tendências pós-modernas perpassam pelos
conceitos de questionamento da arte pela própria arte, e a definição dos movimentos se torna cada vez
mais complexa. Podemos citar a Arte Conceitual, o Happening, a Arte de Computador, a Minimal Art e
a Body Art, que surgiram tanto na Europa como nos Estados Unidos no final da década de 1960 e início
de 1970.
125
Unidade III

Esses movimentos vão além das artes plásticas, incorporando outras formas de expressão artísticas,
como cinema, teatro, literatura, música e até as questões políticas.

As obras não são um objeto único a ser apreciado, mas um conjunto de elementos e atividades
interagindo entre si, permitindo até que os artistas improvisem nos espaços de exposição.

Com os avanços tecnológicos dos sistemas de computação, a própria arte vai incorporar as
possibilidades e os potenciais artísticos que a informática pode proporcionar: desde a substituição de
pincéis e tintas por dispositivos de luz e sons até a reprodução visual de elementos nos espaços onde
esculturas, ou até mesmo pinturas, estejam expostas e interagindo.

Essas novas linguagens se tornam verdadeiros espetáculos, proporcionando vários tipos de


sensações e formas de comunicação com os observadores, que, em alguns casos, deixam de ser meros
observadores e interagem com as obras. Tais linguagens revelam que a arte incorpora as formas de
vida, relacionando-se com a tecnologia nos tempos atuais.

A obra Caveira, do pintor Jean Michel Basquiat (1960-1988), apresenta a aparência de um grafite
que poderia ter sido feito nas ruas de qualquer cidade. Tem a proposta de trazer a diversidade artística,
reconhecendo que as obras de arte podem representar o espírito das ruas sem necessariamente
estarem em um museu. Esse artista expressa bem em seu traço a arte das ruas da cidade cosmopolita
de Nova Iorque.

Anselm Kiefer (1945), artista alemão, explora diferentes materiais em sua obra, como fotografia,
chumbo e até mesmo palha. Sua obra Canção de Wayland, de 1982, expressa a preocupação com
os efeitos da Segunda Guerra Mundial. A contextualização histórica e política se torna necessária
para compreender a obra. A Alemanha sofreu grandes transformações com os impactos da guerra
e a compreensão da realidade da fragilidade humana diante dos conflitos se torna tema das peças
do artista.

Outra obra relativa às questões políticas permeando o tema e a compreensão da mensagem do


autor é do japonês Hiroshi Sugito, cuja forma de representação se aproxima do abstracionismo e tem
um clima de sonho.

O pintor belga Luc Tuymans (1958) recriou em suas pinturas efeitos do cinema, que se torna uma
influência latente em suas obras. Exemplo disso é a obra Diagnostische Blick, de 1992, na qual vemos
um close-up de um rosto pintado a óleo.

A utilização das técnicas de serigrafia e de diferentes materiais está presente na obra de Steven
Sorman (1948). As cores são passadas para tela através da pressão empregada pelo artista. Para que
as cores não se misturem, ele precisa criar máscaras e aplicá-las individualmente. A técnica pode ser
empregada em tecido, madeira ou papel e surgiu inicialmente no século XX para estampar tecidos.

O sul-africano Willian Kentridge (1955) também trabalhou com diversas técnicas de gravura.
Em sua região é o mais importante no gênero. Teve obras expostas na 24ª Bienal de São Paulo e um
126
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

vídeo produzido pela Associação Videobrasil, com o título Certas Dúvidas de Willian, dirigido por Alex
Gabassi, em 2000.

Os museus não serão descartados pelos artistas Pós-modernos, embora conseguissem ampliar o
espaço expositivo para além das galerias. O museu precisa ser valorizado e reconhecido como um espaço
importante para preservação das obras de arte no mundo; com programações e atividades culturais
constantes, ele não pode ser considerado um local onde se depositam artefatos do passado. Suas peças
estão em constante diálogo com passado e presente, pois obras de arte revelam um tempo histórico e
não perdem seu significado.

Podemos citar como principais museus do mundo: Museu do Vaticano, em Roma; Prado, em Madri;
Louvre, na França; Museu Britânico, na Inglaterra; Galeria Nacional, em Washington; Museu Egípcio, no
Cairo; Museu de Arte Moderna e Metropolitan Museum, em Nova Iorque; Museu Hermitage, em São
Petersburgo; e o Museu Nacional de Antropologia, no México. Estes, entre tantos outros museus em
diversos países, preservam as preciosidades produzidas pelo homem ao longo da história da humanidade.

Na modernidade, levantou-se a seguinte questão: as obras de arte contidas nos museus pertencem a
quem? Pergunta pertinente, já que muitas delas foram trazidas aos museus por motivos de colonização,
furto ou até mesmo vendas e negociatas. As obras pertenceriam ao país de origem? Alguns profissionais
defendem que o fato de as obras estarem espalhadas pelo mundo pode facilitar o acesso a elas. Do
contrário, se estivessem todas reunidas no país de origem, isso não permitiria que diversas culturas
pudessem apreciá-las.

Longe de ter um fim, esse debate persistirá, já que todos os países detêm alguma obra de outro, o
que pode ser considerado riqueza cultural.

7.5.1 A fotografia, o cinema e a arquitetura pós-moderna

Com o progresso tecnológico, duas formas de expressar arte ganham força, alterando seu conceito
e o modo de se relacionar com ela.

O cinema teve sua primeira exibição pelos irmãos Lumière, em 1895. A fotografia teve seus
primórdios em 1826, com Niépce, e a invenção dos daguerreótipos em 1839. Daguerreótipo, do francês
daguerréotype, foi o primeiro processo fotográfico da história. A fragilidade do material e os custos para
mantê-lo sem oxidação fez que fosse rapidamente substituído.

Na fotografia, o artista não precisa utilizar as mesmas técnicas de um pintor para capturar uma
imagem. Ela não é feita artesanalmente, mas ele precisará de inúmeras outras habilidades para capturar
o momento, absorvendo seus conhecimentos de propagação de luz e sombras, assim como o pintor.

Henri Cartier-Bresson (1908-2004) acredita que um fotógrafo tenha de estar atento ao momento
único. Suas fotografias mais emblemáticas são a de um homem saltando de uma poça d’água e de
um casal se beijando em um café. Momentos que são tão rápidos quanto o piscar de olhos e que, se
o fotógrafo não estiver atento ao mundo que o rodeia e ao potencial de cada instante, poderá perder
127
Unidade III

uma grande imagem. A imagem se torna imutável ao ser traduzida na fotografia, como um momento
único, muito difícil de se recompor novamente. Bresson chamará esse momento de “momento decisivo”.
Estar atento permite que o artista saiba reconhecê-lo e, dependendo do caso, até prever quando esse
momento se dará.

Barbara Kruger expressou sua arte por meio da fotografia, expandindo-a para as instalações, para
a escultura e também para os vídeos. Seu conteúdo questiona os modos de vida da modernidade e o
consumismo desenfreado. Suas fotografias, na maioria em preto e branco, intercalam uma mescla de
frases com as imagens para provocar os observadores.

Dorothea Lange (1895-1965), com a crise de 1929, dedicou seu trabalho a registrar os estragos
causados pelo período da Grande Depressão. Sua obra resultou em fotografias muito fortes, com alto
apelo social, revelando a fragilidade humana diante de um mundo que enfrentava grandes conflitos
e que estava imerso na incerteza de um futuro melhor. Exemplo dessas características é a obra Mãe
Migrante, uma das mais emblemáticas da artista.

Figura 99 – Mãe Migrante (1936), fotografia de Dorothea Lange

Fonte: Strickland (2004, p. 185).

Com suas fotografias, Lange obrigou o povo americano a olhar para as pessoas mais pobres atingidas
pela crise. O impacto dessas imagens provocou a reflexão sobre a situação do país naquele momento.

Poucos artistas se dedicaram a obras de cunho social em forma de protesto, pois os possíveis
compradores dificilmente teriam interesse por esse tema. Temos aqui uma lista com os nomes de alguns
dos artistas que propuseram reflexões sociais através de suas obras: Francisco de Goya, com a pintura
Três de Maio de 1808; Honoré Daumier, com Rue Transnonain, 15 de abril de 1834; Pablo Picasso, com
Guernica; e Anselm Kiefer, que denunciou os horrores do holocausto.
128
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

No cinema, com a produção de filmes em larga escala, não é possível prever qual público terá
contato com a obra e quais as reações que ela provocará.

O avanço das tecnologias de captura de imagens em vídeo também foi moldando ao longo dos anos
os tipos de cena que podem ser reproduzidos e os diferentes estilos para capturá-las.

O cinema, sem dúvida, representa a principal arte moldada pela vida moderna, pois sua produção
em larga escala tem altos custos. Contudo, ao ser vendida para o grande público, seus custos devem ser
acessíveis para atingir o maior número de pessoas possível. Esse caráter faz do cinema a arte que mais
se aproxima do processo de industrialização.

Saiba mais
Como exemplo latente do quanto as tecnologias interferem na forma
de capturar as cenas, podemos citar o filme 300 de Esparta, de 2006. O
ator brasileiro Rodrigo Santoro, além de estar com uma maquiagem que
modificou completamente sua aparência real, a maior parte do tempo,
contracenou com um estúdio vazio. Ele seguia apenas as orientações do
diretor. Todos os cenários e cenas que compõem o filme nas aparições desse
personagem foram feitos por computação gráfica.
300. Dir. Zack Snyder. EUA: Warner Bros. Pictures, 2006. 117 min.

Desde a primeira sessão aberta de cinema, em 1895, ficou claro que esta seria uma arte burguesa.
Na ocasião, os espectadores viram a cena clássica do trem que foi filmado num ângulo que o fez parecer
invadir a tela, assustando o público. Não era esse o resultado esperado, já que os presentes já haviam
andado de trem e a imagem não tinha som e era em preto e branco. Contudo, o que causou espanto
nos expectadores foi o fator ilusão. Esse conceito tem sido fundamental para o sucesso dessa arte que
perdura até os dias atuais, mesmo quando produzida em escala industrial.

A videoarte é uma linguagem originária do cinema e guarda com ele suas semelhanças, mas não
pode ser confundida com programas de televisão nem com cinema experimental. Nascida no ano
1960, suas técnicas foram se desenvolvendo, ficaram em alta e depois foram abandonadas. Com os
Happennings, a videoarte tem sido muito utilizada nas instalações de artes plásticas, com vídeos que
visam complementar ou até mesmo contestar a própria arte ou a política. O fato é que, com o acesso
mais facilitado aos equipamentos de vídeo, tornou-se possível o surgimento cada vez mais frequente
de vídeos independentes.

Esses elementos permitiram uma maior integração dos observadores com a instalação, e, muitas
vezes, o movimento das pessoas permeando o espaço faz do observador parte da obra.

Os principais nomes do videoarte são: Joseph Beuys, Vito Acconci, Wolf Vostell e o coreano Nam
June Paik, entre outros, precursores ao utilizarem esse recurso nos trabalhos artísticos.

129
Unidade III

Outro movimento que passa a se desenvolver é o das histórias em quadrinhos. Apesar de já haver
durante muitos anos a literatura com ilustrações, a utilização do formato de quadrinhos remonta ao
ano de 1930.

O primeiro personagem no formato de quadrinhos é Yellow Kid, criado por Richard F. Outcault
(1863-1928) nos Estados Unidos. Após seu surgimento, tornaram-se comuns as tirinhas de jornal que
mostravam histórias curtas do referido personagem.

Flash Gordon foi o primeiro personagem reconhecido como ícone das histórias em quadrinhos e
criado por Alex Raymond em 1934. Tarzan, que já foi adaptado para filmes e desenho animado de
longa metragem, foi criado por Edgar Rice Burroughs (1937). Em ambos vemos formas bem diferentes
de estética para o traço do desenho: no caso de Tarzan, exige-se muito mais vigor para dar ideia de
movimento; em Flash Gordon, as linhas tracejadas dão ideia de preenchimento de sombreado. Ambas
influenciaram os criadores de história em quadrinhos no mundo todo.

Além desses, outros personagens se tornaram muito famosos: Batman, Superman, Fantasma e, no
segmento infantojuvenil, Tintin, Gato Felix e Pato Donald, que foram para as telas de cinema ou para a
televisão e hoje fazem parte da cultura de crianças, jovens e adultos.

Art Spiegelman (1948), criador de quadrinhos, ganhou uma exposição no Museu de Arte Moderna
com a série Maus, que conta a história de seus genitores presos nos campos de concentração e
sobreviventes da Segunda Guerra Mundial.

Frank Miller (1957) tem dois trabalhos em destaque: Batman – O Cavaleiro das Trevas e Sin City, cuja
adaptação para o cinema foi feita por Robert Rodriguez e trouxe elementos dos quadrinhos em efeitos
especiais no filme.

O japonês Katsuhiro Otomo (1954) se tornou conhecido pela personagem Akira e por produzir filmes
de animação e mangás, nos quais suas histórias retratam o Japão do pós-guerra já muito modernizado.

Nos mangás, em geral, as histórias são longas, e os quadrinhos não são lineares como os quadrinhos
do Ocidente, que geralmente têm o mesmo número de quadros por página. De acordo com o destaque
da cena, os quadrinhos variam e podem até chegar a ocupar uma página inteira.

O nascimento da arquitetura contemporânea

Nos anos de 1970 e 1980, vários movimentos tentavam mostrar que os estilos modernistas do
Bauhaus estavam ultrapassados. Assim, começaram a se multiplicar na Espanha os prédios com modelos
internacionais e suas folhas de vidro e grades. Espalharam-se de tal forma que, nos anos 1990, já
eram sinônimos de vanguarda dos quartéis-generais das empresas e corporações do mundo todo. Cai o
Modernismo, e, dentro do Pós-Modernismo, nasce a arquitetura contemporânea.

A arquitetura contemporânea é marcada por prédios cada vez mais arrojados, cumprindo mais que
a simples função de destacar uma beleza, mas também de possuir uma funcionalidade que permita o
acesso por todas as pessoas e a preservação dos objetos ali contidos.

130
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

Para melhor ilustrar, vamos passear por várias joias arquitetônicas conhecidas não só por sua beleza,
mas também pela estrutura funcional que facilita os acessos.

Exemplo de prédio que se tornou o símbolo de uma cidade é o Teatro de Ópera de Sidney. Esse prédio,
que nos lembra o formato de um barco à vela, foi projetado por Jörn Utzon (1918-2008) e construído
entre 1957 e 1973, com várias salas de espetáculo. Suas estruturas em vidro permitem que a luz externa
seja projetada no ambiente para deixá-lo mais agradável.

O Centro Pompidou tem a função plena de um prédio projetado para abrigar eventos culturais, como
apresentações de teatro, instalações e exposições de artes plásticas. Sua estrutura metálica com vidro
permite a entrada de luz externa e a integração entre o ambiente interno e o externo. Foi inaugurado
em 1977, na cidade de Paris, França, e projetado por dois arquitetos Richard Rogers e Renzo Piano.

O Museu Guggenheim Bilbao merece destaque: projetado por Frank O. Gehry (1929), foi construído
entre 1991 e 1997 na cidade espanhola de Bilbao. Sua estrutura tem características que o tornam muito
especial. Sua estrutura externa é composta de formas metálicas curvas e retas. A princípio, chega a
causar certa estranheza, considerando que, para o espectador, trata-se de um edifício, e não de uma
escultura, em especial porque não é possível encontrar linhas simétricas. Áreas envidraçadas enriquecem
o espaço interno com a luz natural. O museu tornou-se um símbolo que pode ser visto de diferentes
pontos da cidade.

Figura 100 – Museu Guggenheim Bilbao, projetado pelo arquiteto Frank O. Gehry
e construído entre 1991 e 1997, em Bilbao, na Espanha

Disponível em: https://bit.ly/3oWEBJG. Acesso em: 16 ago. 2016.

131
Unidade III

Outro espaço que também possui aberturas no teto para captar a luz natural é o Museu de Arte
Romana, projetado por Rafael Moneo (1937) e construído em Mérida, entre 1980 e 1984, na Espanha.
Todas as alamedas que conduzem os visitantes para as obras de arte são como passarelas, e estão
descobertos os tijolos que compõem a estrutura das paredes. Os arcos do edifício trazem forte referência
aos arcos romanos.

Um escritório suíço de arquitetura construiu, em 2000, um museu que tem a função de guardar
obras de arte moderna, especificamente uma coleção britânica. Esse projeto visava modernizar um
edifício antigo na cidade londrina, chamado Bankside Power Station. Atualmente chamado de Museu
Tate Modern, foi projetado pelo escritório Herzog e De Meuron, mantendo várias partes do prédio
antigo, como a chaminé. Com a colaboração do artista Michael Craig-Martin, recebeu uma iluminação
especial que foi intitulada “luz suíça”, tornando-se o símbolo do museu. Seu espaço amplo permite a
exposição de esculturas de grande porte.

Em Portugal, Álvaro Siza (1933) é um arquiteto muito celebrado por suas obras. Siza é conhecido por
conceber suas obras com o que há de mais moderno. Exemplo típico é a Igreja de Santa Maria, construída
entre 1990 e 1996, na cidade de Marco de Canavezes. Tanto a igreja quanto o centro paroquial são
referências arquitetônicas, pois coexistem harmoniosamente, no mesmo espaço, o passado e o presente,
o tradicional e o novo.

Saiba mais

Para conhecer outros trabalhos e um pouco mais da vida desse renomado


arquiteto português, acesse:

Disponível em: http://alvarosizavieira.com. Acesso em: 16 ago. 2016.

No Japão, Toyo Ito (1941), é responsável pelo Centro Cultural Sendai Mediateque, projetado na
cidade de Sendai. Esse espaço abriga diversos tipos de manifestações culturais, como shows, projeção de
filmes, apresentações teatrais, conferências e salas de reunião e espaço interativo com acesso à internet,
biblioteca e um acervo de CDs.

7.5.2 O Brasil no pós-modernismo e a arquitetura contemporânea

Com a saída do Modernismo e as transformações do Pós-moderno, com a entrada do conceito


contemporâneo, experimentamos um florescente período democrático, que deu às artes um novo vigor.
A arte brasileira começa a ter contato com o Abstracionismo e com o Concretismo, e a relação com o
espaço onde as obras estão expostas começa a mudar. Iniciam-se as instalações artísticas e a utilização
de recursos de outras áreas das artes para compor uma obra mais refrescante e nova.

Tomie Ohtake (1913-2015), embora tenha começado na pintura, em 1952, dedicou-se também à
gravura e à escultura. Nasceu no Japão e veio para o Brasil ainda muito jovem. Suas obras contêm
132
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

grande valor pictórico, mas não têm a pretensão de questionar a realidade social; elas são abstratas, mas
o foco está relacionado a cores e composição. O Monumento aos 80 Anos da Imigração Japonesa é uma
das obras mais famosas de Ohtake e está no bairro japonês da Liberdade, em São Paulo.

O Instituto Tomie Ohtake, também em São Paulo, tem proporcionado aos cidadãos muitos momentos
artísticos excepcionais. Como exemplo, em 2015, abrigou a exposição de Salvador Dalí.

Manabu Mabe (1924-1997), também japonês, veio para o Brasil com apenas 10 anos de idade, e suas
primeiras representações começaram a surgir em 1940. Assim como Ohtake, Mabe tinha forte tendência
para o abstracionismo e trabalhava as cores e composições. Outra característica de sua obra, além das
cores vivas, são as pinceladas que lhe conferem maior expressividade e a tornam instigante.

Concretismo

Oriundo da expressão “arte concreta”, o Concretismo era considerado uma evolução do abstracionismo.
Essa expressão foi primeiro utilizada pelo artista holandês Theo van Doesburg (1883‑1931). Para
Doesburg, todo animal ou elemento natural que seja pintado torna-se uma abstração, e a expressão
“arte abstrata” veio para denominar a arte não figurativa.

Posteriormente, Max Bill (1908-1994), artista suíço, passa a usar a expressão arte concreta de forma
a associar uma obra construída de forma objetiva.

É importante destacar que, em 20 de outubro de 1951, foi criada a 1ª Bienal Internacional de São Paulo,
em um pavilhão na Avenida Paulista, que depois viria a ser transformar no Museu de Arte de São
Paulo. O evento reuniu 1.854 obras, representando 23 países. A iniciativa do Museu de Arte Moderna
(MAM) foi inspirada na Bienal de Veneza, tendo como mentor o industrial Francisco Matarazzo Sobrinho,
que era de origem italiana. Essa iniciativa foi decisiva para colocar o Brasil no circuito internacional dos
grandes eventos de arte.

Sem dúvida a Bienal também foi importante para influenciar artistas nacionais perante as formas e
concepções que os artistas internacionais propunham.

Destacamos, como representantes dessa “nova ótica”, Lygia Clark (1920-1988) e Hélio Oiticica
(1937‑1980), que, além de terem obras importantes, influenciaram outros artistas.

Lygia Clark criou o conceito do não objeto, pois não definia suas obras como quadro, escultura ou um
objeto de utilidade doméstica. A artista desconstruiu a forma como uma pintura pode ser representada
ao agir sobre a obra fora de seus limites moldurais e transformá-la em algo novo.

Hélio Oiticica ficou conhecido por questionar o espaço onde as obras serão construídas e sua
relação com a sociedade. Sua obra questiona o cotidiano, o homem, seu espaço de convívio e os
problemas sociais sofridos por este homem nas diferentes épocas em que foram elaboradas as
obras artísticas.

133
Unidade III

Ele tinha um pensamento inovador para as décadas de 1950 a 1970. Foi o pioneiro em apresentar
obras que não se limitavam ao espaço do objeto exposto, transformando o próprio espaço para que a
obra fizesse parte dele.

Oiticica chama essas obras de “penetráveis”, pois os observadores passam pelo meio das peças.
Citamos como exemplo o Relevo Espacial, de 1960, em que os visitantes podiam explorar completamente
o espaço, pois as peças estavam suspensas por toda a sala.

Figura 101 – Relevo Espacial [s.d.], instalação com formas geométricas tridimensionais
de Hélio Oiticica, exposta na Galeria Nacional de Jeu de Paume, França

Fonte: Proença (2009, p. 257).

Com esse conceito estético, o artista ainda criou uma série de obras intitulada Manifestações
Ambientais, de onde surgiram a obra Tropicália, O Grande Penetrável e Parangolés, que apresentam
elementos de dança, poesia e música, dentre outras manifestações artísticas.

Outros artistas que trabalharam diversas ideias do movimento Pós-moderno foram: Hermelindo
Fiaminghi (1920-2004) explorou o conceito de movimento utilizando poucas cores; Lothar Charoux
(1914‑1987), utilizou linhas e quadrados e trabalhou a ideia de movimento com a variação de cores, tal
qual os artistas da Op Art; Luiz Sacilotto (1924-2003), utilizou triângulos com cores monocromáticas
apontando para cima e para baixo, de sorte que quem observasse a obra tivesse a sensação de movimento
devido à posição dos elementos. Willys de Castro (1926-1988) também explorou as cores monocromáticas
e as formas geométricas.

Saiba mais

Para entender melhor o Pós-Modernismo, acesse:

LIMA, R. Para entender o pós-modernismo. Revista Espaço Acadêmico,


n. 35, abr. 2004. Disponível em: https://bit.ly/3cFI21J. Acesso em: 15 jan. 2016.

134
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

Franz Weismann (1911-2005), explorando o ferro, fez uma combinação de figuras geométricas
em planos horizontais e verticais e entrelaçados por suas aberturas, como na obra A Ponte, de 1958.
Ainda nessa perspectiva de entrelaçar as formas com efeito tridimensional, temos a artista Mary Vieira
(1927‑2001), que fez uma obra repleta de arcos giratórios, na qual o observador poderia movimentá-los
e deixar sua aparência diferenciada durante o processo de interação.

Sérgio de Camargo (1930-1990) explorou materiais como madeira e cilindros pintados, dando a
ideia de um agrupamento que, ao ser observado, salta aos olhos como uma nuance de relevo, mas, na
verdade, os objetos estão dispostos sobre uma superfície plana.

Outro artista a utilizar elementos diversificados como ferro fundido e aço inox em suas obras é
Caciporé Torres (1935). A popularidade desses materiais faz sua obra estar em locais como parques
e praças das cidades.

Francisco Stockinger (1919-2009), nascido na Áustria, veio ao Brasil quando criança e se estabeleceu
em Porto Alegre. Desenvolveu suas obras em metal, o que se tornou a sua marca registrada.

Vasco Prado (1914-1998) tornou sua obra famosa por criar formas estilizadas de cavalos e cavaleiros
e várias séries deles em materiais como o bronze.

A obra do colombiano Fernando Botero (1932), Homem a Cavalo, em que tanto o homem quanto o
cavalo são gordos, tem a função de questionar o conceito de beleza da sociedade atual. Para aprofundar
a questão, o pintor explorou esse senso estético também em cenas de guerra.

Frans Krajcberg (1921), artista polonês naturalizado no Brasil, é conhecido por representar
artisticamente elementos da natureza de forma estilizada. Elementos como pedras, pedaços de
tronco queimado, galhos quebrados, cipó, areia de praia e terras coloridas, estão muito presentes
na sua obra. O próprio artista classifica esse processo como o de dar vida a objetos naturais que
estejam “mortos”.

O artista baiano Rubem Valentim (1922-1991) fez carreira como pintor, escultor e gravurista
e expôs suas obras também fora do País, na África. A simbologia das tradições populares dos
negros no Estado da Bahia é frequente em sua obra, mas o artista utiliza as figuras geométricas
para representá-las.

Na cidade de Recife, em Pernambuco, podemos apreciar em diversas partes as obras de Francisco


Brennand (1927). Dominando diferentes técnicas, como cerâmica, tapeçaria e gravuras, é pintor e
escultor renomado, que tem por característica fazer obras imponentes. Figuras da mitologia grega
aparecem em suas obras de forma estilizada e de forma clássica. Algumas esculturas são muito perfeitas
na semelhança com os traços humanos, e outras são tão estilizadas que exigem do observador maior
acuidade de percepção para compreender seus elementos. A obra Palas Atena, de 1987, é um dos
exemplos de uma figura clássica representada de forma estilizada.

135
Unidade III

Figura 102 – Palas Atena (1987), cerâmica vitrificada de Francisco Brennand

Fonte: Proença (2009, p. 248).

Arcangelo Ianelli (1992) explora as possibilidades de trabalho com cores na pintura abstrata, buscando
o máximo de efeitos com as variações de cores, além de experimentar os conceitos de luminosidade
e transparência.

João Câmara (1944), de João Pessoa, Paraíba, representou muitos aspectos da vida brasileira na era
Vargas com obras que variavam entre painéis e liturgias, que se tornaram a marca registrada do trabalho
do artista. Suas obras, além do caráter histórico, ilustram questionamentos de sua época.

Um artista que explorou não só as artes plásticas, mas também o cinema, foi Marcello Nitsche
(1942), que manteve exposições em solo nacional e internacional. Além de ser cineasta, é pintor e
escultor, e algumas de suas obras são características, pois exploram pinceladas simples, mas que dão a
ideia de movimento ao observador.

Iole de Freitas (1945) começou sua carreira nas artes plásticas na Itália, mas antes chegou a trabalhar
com desenho industrial e dança contemporânea. Suas obras são do campo da escultura; explorou
materiais como tubos de aço inox e policarbonato e traspassou os ambientes, dando a ideia de que a
peça não podia ser contida em uma sala e por isso invadia as demais.

136
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

Waltercio Caldas (1946) ficou conhecido por suas instalações serem expostas em espaços públicos,
explorando formas de objetos do cotidiano em diversos materiais. Também produz fotografias e
esculturas que considera como “comentários” sobre outras obras de artistas renomados, como Matisse
e Mondrian.

Um artista que resolveu não só explorar diferentes materiais, mas também estabelecer relações
entre eles, é Antônio José de Barros de Carvalho e Mello Mourão, o Tunga (1952). Dentre os materiais
dos quais se utiliza, podemos elencar seda, vela, laços, madeira e vidro, reunidos pelo artista,
descaracterizados de sua utilidade e constituídos de um novo significado.

O artista Daniel Senise (1955) começou seus trabalhos explorando o conceito de volume e depois
passou para diferentes técnicas de transferir as cores, permeando os diversos materiais. Por exemplo,
utilizando um tecido ou uma superfície plana para misturar as tintas e depois sobrepô-las em diferentes
materiais, como madeira ou cimento, para modificar o traço da transcrição. Esse artista teve suas peças
expostas na XXIV Bienal de São Paulo. Ele não se limitou à pintura: algumas de suas obras mais celebradas
são esculturas.

Beatriz Milhazes (1960) dedicou suas obras às formas ornamentais e à utilização das cores,
compondo peças bem coloridas e ricas em pequenos padrões. Além de pintora, é ilustradora,
gravadora e professora.

Outro artista que explorou as técnicas de colagem e a utilização de camadas grossas de tintas para
trabalhar com o conceito de volume é Nuno Ramos (1960). Muito conhecido por suas instalações,
Ramos, além de pintor, é escultor, desenhista, ensaísta, cenógrafo e videomaker. Em suas instalações
explora materiais como pedras e espaços diferenciados ao ar livre, em áreas rurais do interior paulista.

No campo da gravura, os artistas brasileiros merecem destaque, pois aprimoraram ao longo dos anos
as diferentes técnicas. Além de criarem figuras abstratas, questionaram a realidade social e política.

Vinda do Oriente para a Europa no século XIV, a gravura inicialmente servia para estampar tecido,
e sua estrutura era em madeira ou metal. Derivada dessa técnica, temos a xilogravura, que vem da
palavra grega xylon – madeira e consiste em uma matriz que é talhada pelo artista e deve ser coberta
de tinta. Quando o papel sobrepõe a matriz, ele deve ser pressionado para absorver a tinta, e, assim,
a imagem é reproduzida.

Na técnica de gravura em metal, a matriz pode ser construída a partir de duas formas diferentes:
talho-doce e água-forte. A forma na qual a matriz é construída determinará a forma do desenho,
derivando em três denominações para o processo: ponta seca, gravura a buril e à maneira negra. Tais
denominações correspondem à matriz talho-doce. Para a segunda, os processos são chamados verniz
mole, água-tinta, verniz brando e à maneira do lápis.

A segunda matriz proporciona maior liberdade para o artista, pois não exige maior precisão dos
utensílios – parece que o artista está desenhando sobre a tela.

137
Unidade III

A madeira e o metal não são as únicas formas de produzir gravuras: temos também a litogravura
e a serigrafia. A primeira vem da palavra grega lithos – pedra e tem como base para matriz uma pedra
específica, a pedra da bavária, que absorve água; nesse processo são utilizadas tintas oleosas para
transferir as imagens.

Na serigrafia, a matriz é feita por uma tela de nylon ou seda, usando-se cola para permitir que
somente a área desejada receba tinta. Entretanto, independentemente da técnica de gravura utilizada,
citaremos alguns artistas que representaram a gravura brasileira.

Oswaldo Goeldi (1895-1961) estudou na Suíça, mas produziu suas obras no Brasil. Trabalhou
também como professor e ilustrador e expôs obras no território nacional e no exterior. As características
principais de sua obra eram a predominância de cores escuras e parcos traços claros para definir a linha
do desenho. Com o tempo foi aumentando a quantidade de cores.

Figura 103 – O Ladrão (1955), xilogravura com cores de Oswaldo Goeldi

Fonte: Proença (2009, p. 260).

Em Porto Alegre, o Clube da Gravura foi criado em 1950, pelo artista Carlos Scliar (1920-2001),
na companhia de outros artistas gaúchos. Os membros desse clube tinham objetivos profundamente
sociais permeando suas obras, queriam que os observadores pudessem questionar seu contexto político
138
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

e social através de temas regionais. As obras do Clube da Gravura tiveram várias fases, desde tendências
expressionistas, como realistas, até experimentar trabalhos com colagens, texturas e mistura de cores
em busca de efeitos diversos.

Fayga Ostrower (1920-2001) era polonesa, mas veio muito jovem ao Brasil e foi naturalizada.
Exerceu diversas atividades, como gravadora, ceramista, ilustradora, professora, desenhista e escritora,
tornando-se teórica da arte e publicando vários livros sobre o tema. Na área da gravura, suas tendências
eram abstracionistas, com peças em preto e branco e, posteriormente, incluindo mais cores.

Um artista que sempre retratou a diversidade brasileira em suas gravuras foi Aldemir Martins
(1922‑2006). Entre os objetos retratados estão frutas, paisagens, animais, flores, sol, mar, entre outros.

Marcelo Grassman (1925-2013) foi o artista que mais produziu gravuras em diferentes técnicas,
como litografia, água-tinta e água-forte. Nas Bienais de São Paulo expôs várias de suas obras,
bem como nas cidades italianas de Florença e Veneza. Foi considerado internacionalmente como
um dos melhores gravadores do país. Entre as figuras representadas em suas obras havia animais e
cavaleiros medievais, com um universo fantástico e rico em detalhes que estimulava a imaginação
dos observadores.

A gravadora e professora de desenho Renina Katz (1925) aprendeu suas técnicas com dois artistas
que eram referências das técnicas de gravura: Carlos Oswald (1882-1971) e o austríaco Axl Leskoschek
(1889-1975), na xilogravura. Estudou na Escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro e deu aula
no Museu de Arte de São Paulo. Devido a suas influências técnicas, tinha uma obra única em relação à
delicadeza do traço.

Lívio Abramo (1903-1992), artista da gravura brasileira, começou como autodidata e participou de
várias exposições nacionais e internacionais, após estudar com grandes nomes, como Oswaldo Goeldi. Em
suas gravuras adotava tanto elementos fantásticos da cultura nordestina quanto elementos religiosos
presentes nas narrativas populares. Com muita riqueza de detalhes, suas gravuras contam histórias e
revelam traços precisos.

Maria Bonomi (1935) veio com nove anos para o Brasil e aprendeu as técnicas de gravura e pintura
aqui. Depois de permanecer um período estudando artes gráficas e gravura nos Estados Unidos, sua
obra foi bastante reconhecida e frequentemente premiada.

O artista mineiro Rubem Grilo (1946) teve contato com importantes nomes da gravura quando foi
ao Rio de Janeiro para estudar com Oswaldo Goeldi, Iberê Camargo e Lívio Abramo. Chegou a atuar no
ramo da imprensa como ilustrador, e isso de certa forma influenciou o conteúdo de suas obras, que
visam refletir sobre as relações sociais e o consumo.

Sérgio de Moraes (1951) dominava a técnica de linoleogravura, que consiste em uma aplicação
sobre uma chapa de linóleo. Teve suas obras expostas tanto no Brasil quanto no exterior e também
se tornou professor.

139
Unidade III

O artista Alberto Martins (1958), por sua formação como escritor e poeta, incluiu na gravura
elementos literários que podem ser apreciados em conjunto ou separadamente, mas o consenso é que
muitas de suas poesias se relacionam com as gravuras, conferindo uma ideia de cumplicidade.

Cláudio Mubarac (1959) trabalhou muito com detalhes do corpo humano em ouro e prata. Ensina
gravura em universidade e é reconhecido por utilizar diferentes técnicas para executar suas obras.

Arquitetura contemporânea

O prédio do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM), foi projetado pelo arquiteto Afonso
Eduardo Reidy (1909-1964), que contou com grandes nomes, como Oscar Niemeyer e Lúcio Costa, e
com a influência de Le Corbusier.

Na fachada do prédio, podem-se notar as colunas retas do edifício como um contraponto às linhas
onduladas da paisagem carioca repleta de morros sinuosos. O prédio tem uma ampla área envidraçada
que permite a integração do espaço externo com o interno e vice-versa, além de reproduzir internamente
a luz natural. Foi fundado no ano de 1948 e sofreu um incêndio, em 1978, que destruiu boa parte das
obras que ali se encontravam expostas.

Outro ícone da arquitetura contemporânea brasileira é o Museu de Arte de São Paulo (Masp),
cartão‑postal da cidade. Projetado pela italiana Lina Bo Bardi (1914-1992), foi construído entre 1956
e 1968. O grande destaque arquitetônico é o vão livre embaixo do edifício. Esse espaço, aos finais de
semana, abriga uma feira de antiguidades, bem como artistas de rua, que ali fazem suas apresentações.
O museu é referência pela riqueza de seu acervo.

Em João Pessoa, na Paraíba, o Hotel Tambaú, projetado por Sergio Bernardes (1919-2002) em 1966,
tem a forma arredondada e faz parte do cenário das praias do litoral. Uma parte dos quartos do hotel
circunda a parte externa, e no núcleo há outro prédio circular ligado por quatro passarelas; quando vista
do alto, a construção lembra uma roda de motocicleta ou uma nave espacial. O projeto ganhou vários
prêmios importantes do segmento, inclusive internacionais.

Bernardes era conhecido por sua visão inovadora e um tanto excêntrica de conceber seus projetos
arquitetônicos. Criou no Rio de Janeiro um centro de pesquisas chamado Laboratório de Investigações
Conceituais (LIC), de onde saíram muitos trabalhos importantes.

O arquiteto João Batista Vilanova Artigas (1915-1985) projetou a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
da Universidade de São Paulo em 1948. João Batista estudou arquitetura na Fundação Guggenheim e
exerceu grande influência na arquitetura contemporânea brasileira. Construiu prédios, edifícios e até
casas residenciais, com o conceito de que a sociedade e a arte convivem e são inseparáveis. Possui obras
espalhadas pelo País, mas a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo merece destaque.

O arquiteto Acácio Gil Borsoi, embora carioca, tem a maioria de seus trabalhos na Região Nordeste.
Dentre suas obras constam residências, prédios comerciais e edifícios. Dedicou-se também a projetos
que visam a restaurar prédios antigos de valor histórico. Sua obra de maior reconhecimento é o Fórum
de Teresina, no Piauí, todo feito em material pré-fabricado.
140
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

O teatro Ópera de Arame, do arquiteto Domingos Bongestabs (1941), é o exemplo de um prédio


que interage bem com o ambiente a sua volta. Sustentada sobre o lago, como uma casa de palafita,
a construção é feita em estrutura metálica e vidro. Essa aparência permite maior integração entre o
espaço externo e o interno. Aberto ao público em 1992, tornou-se um dos símbolos de Curitiba.

O arquiteto Severiano Porto (1928) foi responsável pelo projeto da sede amazonense das Aldeias
Infantis SOS Amazonas Brasil, que se integra perfeitamente ao meio ambiente da Amazônia e foi
inaugurado em 1997. É um conjunto de pequenas casas onde acontecem atividades culturais, cursos
com objetivo de gerar renda e programas educativos.

A Pinacoteca do Estado de São Paulo, que inicialmente pretendia abrigar a sede do Liceu de Artes
e Ofícios, foi projetada pelo arquiteto Ramos de Azevedo, em 1897. Passou por um longo período de
reforma entre os anos 1993 e 1998, mas como museu foi palco de exposições muito importantes para
a arte no Brasil, acolhendo obras de artistas nacionais e internacionais. O arquiteto Paulo Mendes da
Rocha, ganhador de vários prêmios e conhecido como uma das referências de sua área, foi o responsável
pela reforma.

A Ponte JK, construída sobre o lago Paranoá, em Brasília, tem características grandiosas, tanto
por seus arcos quanto por seus pilares de sustentação. Foi projetada pelo arquiteto Alexandre Chan,
ganhador de vários prêmios aqui e no exterior.

Figura 104 – Museu de Arte de São Paulo – Masp, projeto da arquiteta Lina Bo Bardi

Fonte: Fonte: Proença (2009, p. 260).

8 TENDÊNCIAS ARTÍSTICAS CONTEMPORÂNEAS

Vimos anteriormente algumas maneiras de abordar a arte contemporânea a partir de diferentes


contextos. Agora, iremos apresentar de forma resumida algumas de suas tendências, movimentos
artísticos e um artista representativo de cada um desses movimentos.
141
Unidade III

Por vezes, alguns artistas, a depender do autor que os aborda, poderão ser considerados como
pertencentes ainda à arte moderna. Tal como falamos anteriormente, a passagem da arte moderna para
a contemporânea não se deu como uma viragem em toda a esfera artística.

Por terem existido concomitantemente uma à outra, alguns dos movimentos a seguir poderão
ser compreendidos como mais modernos ou mais contemporâneos. Resolvemos adotá-los como
contemporâneos, tendo na consciência a possibilidade de serem lidos de outras maneiras.

Faz-se importante também ressaltar que aquilo que aqui chamamos de tendências artísticas
não correspondem ao mesmo teor dos movimentos artísticos da arte moderna. Essas tendências
representam contextos de atuação dos artistas, que, na maior parte dos casos, não se unem em grupos,
não formulam “-ismos” – tal como aconteceu na modernidade da arte. Esses artistas trabalham a
partir de certo contexto em comum, sem supor com isso que criem uma “escola” de estilo ou mesmo
que tenham convivido uns com outros.

Vale a pena lembrar que a arte moderna emerge no círculo de artistas das capitais europeias,
principalmente Paris, enquanto na arte contemporânea o processo de globalização já está
consolidado, descentralizando a produção artística e permitindo que uma mesma temática possa
ser elaborada em diferentes pontos do globo. Portanto, temos de olhar para o que virá a seguir
com olhos contemporâneos.

Utilizaremos como referência o conteúdo disponível no website da Tate, instituição cultural britânica,
uma das mais importantes no que se refere às artes moderna e contemporânea internacionais.

8.1 Arte conceitual

Arte conceitual é um termo aplicado a obras de arte para as quais o conceito (ou a ideia) por trás
da obra e a maneira de produzi-la são mais importantes do que a própria obra acabada. Temos como
período de destaque na emergência dos artistas conceituais as décadas de 1960 e 1970.

A arte conceitual consolida a divisão entre os caracteres estético e artístico. Nesse enquadramento,
a obra não poderá ser lida sob critérios estéticos, como formas, cores, representações da realidade,
maneira ou estilo, pois estes não são elementos primordiais na obra. Deverá ser lida a partir do ato
artístico que possui, sendo pensada como objeto inserido no sistema da arte que, ao mesmo tempo que
a produz, qualifica-a como arte, assim nos remetendo a Marcel Duchamp como seu predecessor.

Como o próprio nome diz, na arte conceitual, o conceito é o elemento prioritário da obra,
transformando-se na sua própria estrutura em seu fim único, sobrepondo-se a qualquer tipo de
materialidade e linguagem, e, por vezes, resultando em obras inacabadas. Há também o interesse em
refletir sobre a esfera comercial da arte, de modo que muitos trabalhos não se baseiam no objeto para
que não sejam facilmente comprados ou vendidos.

142
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

Cildo Meireles

Figura 105 – Dados (1970-1996), de Cildo Meireles

Fonte: Cildo (2001, p. 28-29).

Cildo Meireles (1948) é reconhecido como um dos mais importantes artistas brasileiros
contemporâneos, tendo já exposto, com direito a retrospectivas, nas mais renomadas instituições culturais
do mundo. Seu trabalho Inserções em Circuitos Ideológicos correspondia a alterações sistemáticas em
objetos do cotidiano apropriados, modificados e postos novamente em circulação, como é o caso da
nota de dinheiro, da garrafa retornável de Coca-Cola e da obra Dados.

Suas alterações continham mensagens contra o governo militar ditatorial brasileiro e contra o
imperialismo norte-americano, tais como “Yankees go home!”, “Marca registrada de fantasia”, “gravar
nas garrafas informações e opiniões críticas e devolvê-las à circulação”.

As mensagens eram grafadas nas garrafas retornáveis de Coca-Cola com adesivos em silk-screen.
Essas mensagens só poderiam ser lidas quando a garrafa estivesse cheia, pois a tinta vitrificada em
branco só aparecia quando em contraste com o líquido escuro do refrigerante. Cildo Meireles fez a
ação artística, o ready-made, circular no exterior do sistema da arte pelas mãos da própria população,
depositando no trabalho forte carga política.

8.2 Minimalismo

O minimalismo nasceu entre escultores norte-americanos durante as décadas de 1960 e 1970.


Destacam‑se Carl Andre, Dan Flavin, Donald Judd, Sol LeWitt, Agnes Martin e Robert Morris. O minimalismo:
143
Unidade III

Pode ser visto como uma extensão da ideia abstrata de que a arte deve ter
sua própria realidade, e não ser uma imitação de alguma outra coisa. Nós
normalmente pensamos sobre a arte como a representação de um aspecto
do mundo real (uma paisagem, uma pessoa, ou mesmo uma lata de sopa!);
ou refletindo uma experiência como uma emoção ou sentimento. Com o
minimalismo, nenhuma tentativa é feita para representar uma realidade
exterior, o artista quer que o espectador responda apenas ao que está
na frente dele. O meio (ou material) a partir do qual é feito e a forma do
trabalho são a sua realidade (MINIMALISM, [s.d.], tradução nossa).

Assim, no minimalismo, importam mais a forma e a materialidade da obra do que o seu conteúdo e
a sua capacidade representacional. O trabalho artístico deixa de ter a função de mímesis do mundo, ou
seja, deixa de ter a função de imitar a realidade, qualquer que seja ela.

Os artistas minimalistas tentaram reduzir a obra de arte à sua forma básica, negando a expressão
gestual do artista – apagando o vestígio do autor – e buscando alcançar uma forma pura de beleza.
Utilizavam para isso materiais pré-fabricados, tintas e materiais industriais e formas geométricas simples.

Os minimalistas foram importantes também por introduzirem o observador como elemento


conscientemente essencial para a existência da obra, criando a triangulação obra-observador-contexto.

Posteriormente, o historiador e crítico de arte norte-americano Michael Fried, em sua obra Art and
Objecthood, de 1967, irá declarar como o legado do minimalismo algumas características. Vejamos quais
são elas de acordo com o exemplo que segue.

Robert Morris

Figura 106 – Sem título (1965/71), espelho sobre madeira de Robert Morris

Fonte: Lippard e Chandler (2013, p. 150).

144
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

Os cubos espelhados de Morris amplificam a percepção do espaço, mas também introduzem a


visão do próprio espaço como constituinte da obra, assim como dão ênfase ao observador como
elemento que se reflete na própria obra. Nela, a pessoa ficará consciente do seu próprio corpo à
medida que ficar consciente da obra. Conforme o espectador caminha ao redor dos quatro cubos,
suas superfícies espelhadas produzem interações complexas e mutáveis entre a galeria e o espectador.
Portanto, o observador deixa de ser elemento neutro, mas dele dependerá a experiência da obra.

8.3 Land Art

A Land Art é um dos desdobramentos da arte conceitual. Como vimos anteriormente, no


pós-modernismo, o artista passa a criar trabalhos que questionam sua posição em relação ao
fazer artístico e às instituições de arte (STURKEN; CARTWRIGHT, 2001). Como resposta àquela
mobilidade comercial da obra de arte modernista, surgiram os site-specifics. Neles, os trabalhos
eram concebidos intrinsecamente com lugares físicos específicos, estabelecendo a relação triádica,
denunciada por Fried, entre obra, lugar e observador, e não mais apenas entre obra e observador
da modernidade.

A Land Art foi uma vertente cujos trabalhos artísticos, na forma de site-specific, contestavam a
transformação da obra de arte em objeto comercial através de uma prática que se faz inseparavelmente
de seu lugar de concepção e também por situar-se fisicamente em lugares afastados dos centros
urbanos, longe de galerias e espaços institucionalizados de arte.

É com relação à crítica materialista que os land-artistas se diferenciam fortemente dos minimalistas.
Para Crimp (2005), os minimalistas desenvolviam site-specifics em que a incorporação do lugar dentro
do território da percepção da obra conseguiu apenas estender o idealismo da arte para o seu entorno,
no qual a localização era considerada como específica apenas no sentido formal.

Ao aceitar os “espaços” institucionalizados de circulação mercantil da arte como um fato consumado,


a arte minimalista não foi capaz nem de expor as condições materiais ocultas da arte moderna, nem de
resistir a elas, afirma Crimp (2005).

Já os earthworks, como foram chamados os trabalhos da Land Art, na tentativa de se


desvencilhar das amarras mercantilistas às quais a arte se via sujeita, aconteciam isoladamente
na natureza e em escala monumental com a utilização de materiais e instrumentos que não
pertenciam à materialidade modernista: retroescavadeira para desenhar sobre a terra, pedra e
cascalho para modelar uma forma etc.

Por estarem isolados na natureza, os trabalhos eram perecíveis, realizados sem a presença
do público, restando deles apenas os documentos: matéria orgânica ou mineral, fotografias,
reportagens, vídeos, entre outros. A este material, o artista estadunidense Robert Smithson dá o
nome de non-site. Por meio desses documentos é que os trabalhos podem ser exibidos em galerias.
Site e non-site coexistem em diálogo, o que supõe dinâmicas que promovam a transformação
recíproca entre ambos.

145
Unidade III

No non-site, as informações estão de tal forma concentradas – frutos da edição e elaboração – que
passam a representar a densidade conceitual abstrata que a esfera física pode não abarcar, assim como
o site possui características próprias de percepção espacial.

Robert Smithson

Spiral Jetty talvez seja o earthwork mais conhecido dentro da Land Art. A alteração da paisagem por
Robert Smithson, no Grande Lago de Sal em Utah, EUA, foi feita com 6.783 toneladas de terra, movida
com ajuda de retroescavadeiras e tratores.

Kastner e Wallis (2005) apresentam a Spiral Jetty de maneira esclarecedora, permitindo-nos


compreender parte do processo criativo dos land-artistas a partir dessa obra específica:

Levou mais de 292 horas de caminhão, 625 horas-homem, para


movimentar 6.650 toneladas de terra. Dois caminhões basculantes, um
trator e um grande carregador frontal foram levados para o site. Basalto
e terra foram escavados da praia no início do molhe; os caminhões
depositavam este material fazendo o contorno da espiral. A forma do
trabalho foi influenciada pelo site, que já havia sido utilizado para minar
óleo; a forma espiral do molhe derivou a partir da topografia local, tendo
também relação com o mítico redemoinho no centro do lago. A espiral
reflete também a formação circular dos cristais de sal que revestem as
rochas. Smithson foi inicialmente atraído para o local por causa das
colorações vermelhas do lago de sal. O trabalho foi alterado pelo seu
ambiente, o que reflete o fascínio de Smithson por entropia, as forças
transformadoras inevitáveis da​​ natureza. Posteriormente submersa na
água, esta estrutura monumental é um testemunho do domínio do
homem sobre a paisagem e um comentário sobre esta relação com os
monumentos. O trabalho reemerge periodicamente a partir do lago
(KASTNER; WALLIS, 2005, p. 58).

8.4 Pop Art

A Pop Art surgiu na década de 1950 e floresceu na década de 1960 nos Estados Unidos e na
Grã‑Bretanha, inspirando-se em fontes de cultura popular e comercial, como a publicidade, os
filmes de Hollywood e a música pop. Alguns artistas-chave da Pop Art incluem Andy Warhol, Roy
Lichtenstein, Richard Hamilton, Peter Blake e David Hockney.

A Pop Art iniciou-se com o interesse dos artistas em questionar a cultura e as visões tradicionais
relacionadas com a arte e seus critérios de definição:

[...] jovens artistas sentiram que o que lhes ensinavam na escola sobre artes
e o que viam em museus não tinha nada a ver com suas vidas ou com as
coisas que eles viam ao seu redor todos os dias. Em vez disso, eles buscaram
146
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

em outras fontes, tais como filmes de Hollywood, publicidade, embalagens


de produtos, música pop e histórias em quadrinhos, o enquadramento
imagético para suas produções (POP..., [s.d.]).

A Pop Art deixou de lado a estética – tal como o minimalismo, ambos com origem em Duchamp –
para dedicar-se ao sistema de comunicação em si – falamos isso a partir do que vimos com Cauquelin
(2005). Assume-se a estrutura de propaganda e repetição dos signos já popularizados na sociedade de
consumo, transformando tudo em espetáculo, em objeto para ser consumido várias vezes.

Na Pop Art, o autor/artista volta ao estrelato, e sua assinatura vale milhões – não mais seguindo a
“lição” de Duchamp em relação ao anonimato, como em A Fonte. Veremos agora o artista estadunidense,
“papa do pop”, Andy Warhol.

Andy Warhol

Figura 107 – 100 Latas de Sopa Campbell (1962), serigrafia de Andy Warhol

Fonte: Strickland (2004, p. 175).

Andy Warhol pintou uma série de latas de sopa, individualmente ou em grupos. Quando perguntado
sobre o porquê, Warhol uma vez respondeu: “Porque eu estava acostumado a beber. Eu costumava ter o
147
Unidade III

mesmo almoço todos os dias, por 20 anos, eu quero dizer a mesma coisa sempre. Alguém me disse que
a minha vida me dominou. Eu gostou dessa ideia” (STRICKLAND, 2004, p. 175).

Na década de 1960, Campbell estava gastando uma grande quantidade de dinheiro em publicidade,
fazendo que as suas latas de sopa estivessem em todos os locais da mídia. Warhol nos pede para dar
uma olhada mais de perto nessas latas, criadas para atrair a nossa atenção no supermercado.

A obra 100 Latas de Sopa Campbell foi pintada à mão com o auxílio de estêncil. Um olhar mais
atento revela o fato de que as latas não são idênticas, nem são uniformemente espaçadas. A última
linha é cortada, sugerindo que elas continuam para além dos limites da tela, o que leva a outro aspecto
do trabalho: o interesse de Warhol nos processos maquinais, como a produção em massa.

A produção em massa tem a característica impessoal, e os Estados Unidos estavam se tornando


cada vez mais despersonalizados. Entretanto, a produção em massa também é eficiente, o que
Warhol admirava.

“Eu quero que todos pensem da mesma forma... Eu acho que todo mundo deve ser uma máquina”
(STRICKLAND, 2004, p. 175). Claro que essas afirmações de Warhol eram feitas de modo a escandalizar
a própria sociedade de consumo. O artista era ele mesmo o espetáculo.

8.5 Performance Art

A Performance Art, assim como a Land Art, é um desdobramento da arte conceitual: muitos
autores veem sua origem nas ações dos artistas dadaístas e surrealistas. A Performance Art como
fenômeno desponta nas décadas de 1960 e 1970. Os artistas trabalhavam interdisciplinarmente
com diversas linguagens artísticas – pintura, escultura, gravura, vídeo, desenho, poesia, teatro,
música etc. – utilizando o seu próprio corpo como meio e executando ações que se tornam a obra
de arte.

A Performance Art pode ser cuidadosamente planejada, seguindo até um roteiro, mas também
pode ser espontânea e aleatória. Muitas vezes o público é convidado a participar da ação,
contando para isso com uma orquestração realizada pelo artista. Outras vezes, a performance
acontece em lugares privados, passando a existir para o público apenas em suas formas de
registro, como fotos e vídeos.

Marina Abramovicc

Marina Abramovic é uma artista de origem sérvia, considerada uma das pioneiras da Performance
Art. Destaca-se por testar os limites físicos e mentais do corpo humano.

Na obra Rhythm 0, Abramovic testa a relação entre a artista e os participantes. A artista tentou
deixar‑se ser um objeto – atribuindo a si um papel passivo – permitindo que o público fizesse o
que queria com seu corpo no decorrer de seis horas, utilizando para isso setenta e dois objetos
disponibilizados sobre uma mesa. A artista colocou uma placa autorizando a utilização dos objetos,
148
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

da maneira que o público escolhesse, dentre os quais estavam incluídos uma rosa, uma pena, mel, um
chicote, uma tesoura, um bisturi, uma arma e uma única bala.

Alguns desses objetos poderiam dar prazer, enquanto outros poderiam ser manejados de modo a
causar dor, ou para prejudicá-la.

Durante seis horas, a artista permitiu que os membros da audiência manipulassem seu corpo e
realizassem ações. Esse experimento mostra quão vulnerável e agressivo pode se tornar o ser humano quando
omitidas as suas consequências sociais – pois a artista permitiu as diversas intervenções em seu corpo.

Ao final da performance, seu corpo estava despido, atacado e desvalorizado, ficando com
marcas de agressão – houve cortes no pescoço da artista feitas por membros da audiência, e
suas roupas foram rasgadas. Assim, Abramovic questiona os limites da ética humana e também a
objetificação do corpo feminino.

A artista disse mais tarde que sentiu-se violentada, pois a audiência cortou-lhe as roupas, prenderam
espinhos em seu estômago e apontaram a arma em sua cabeça; outro participante levou a arma embora.
Abramovic afirma que o que aprendeu com a performance é que, sendo possível, as pessoas podem matar.

8.6 As relações da arte com a atualidade

A vertente arte e tecnologia desenvolve-se à medida que os artistas vão se apropriando das
novidades tecnológicas, principalmente com o advento do computador, das ferramentas de
comunicação e das mídias digitais, que transformam-se no meio e na linguagem a partir da qual
se cria a obra.

A vertente arte e comunidade inclui práticas artísticas criadas a partir dos anos 2000 e que estão
cada vez mais presentes na nossa atualidade. Nelas, o artista atua como desencadeador de um processo
colaborativo e participativo junto com diferentes comunidades – grupos socialmente desfavorecidos,
minorias étnicas, refugiados, cooperativas de artesãos entre outros.

As práticas artísticas da arte e comunidade demandam engajamento e envolvimento por parte dos
envolvidos, que, mais do que participar, colaboram na criação do próprio projeto, horizontalizando o
papel criador que se move do artista para todos os integrantes do grupo.

A questão da autoria fica dissipada. Agora o artista não está interessado na manutenção do seu
status de gênio criador e da preservação da aura da “obra”. A responsabilidade pela criação do projeto
artístico fica partilhada com todos os integrantes do grupo.

8.6.1 Arte e tecnologia

Mail Art, Web Art, Video Art e Bio Art são algumas das tendências encontradas no interior desta
vertente. Abordaremos como exemplo o trabalho do artista brasileiro Eduardo Kac, pioneiro da Bio Art e
referência mundial nessa área de produção.
149
Unidade III

Eduardo Kac

Figura 108 – Genesis (1999), instalação de rede transgênica (detalhe), dimensões variáveis, de Eduardo Kac

Fonte: Kac (2007, p. 167).

Gênesis é uma obra de arte transgênica que explora a intrincada relação


entre biologia, sistemas de crenças, tecnologia da informação, interação
dialógica, ética e internet. O elemento-chave do trabalho é o “gene do
artista”, um gene sintético que foi criado ao traduzir uma frase do livro
bíblico do Gênesis em código Morse, e converter o código Morse em pares
de bases de ADN de acordo com um princípio de conversão especialmente
desenvolvido pelo artista para este trabalho. A sentença diz: “Que o homem
tenha domínio sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus, e sobre todo
ser vivente que se move sobre a terra”. Ela foi escolhida por implicar uma
noção duvidosa – divinamente sancionada – da supremacia da humanidade
sobre a natureza. O código Morse foi escolhido porque, por ser o primeiro
exemplo do uso de radiotelegrafia, representa a aurora da era da informação
– a gênese da comunicação global. O gene do Gênesis foi incorporado em
bactérias, que foram exibidas na galeria. Os participantes via web poderiam
ligar uma luz ultravioleta na galeria, causando mutações biológicas reais nas
bactérias. Isso mudou a sentença bíblica para as bactérias. Após o evento,
o DNA das bactérias foi traduzido para o código Morse, e depois de volta
para o inglês. A mutação que ocorreu no DNA tinha alterado a sentença
original da Bíblia. A sentença modificada foi postada no website do projeto
Gênesis. No contexto deste trabalho, a capacidade de mudar a sentença é
um gesto simbólico: significa que nós não aceitamos o seu significado na
forma que o herdamos, e que novos significados emergem à medida que
procuramos mudá-lo”.

Enquanto apresentava o Gênesis, eu também dei uma palestra no simpósio


“Life Science”, apresentado pela Ars Electronica ’99. Minha palestra foi focada
na proposta do “GFP K-9” Para contextualizar a minha apresentação, eu revi
a longa história da domesticação do cão pelo homem e sua parceria. Apontei a
influência humana direta e forte na evolução do cão até hoje. Enfatizando

150
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

que não existem matilhas de poodles e chihuauhas no mundo selvagem, e


que a criação do cão, em relação à do lobo, era um avanço – fato que parecia
ter se perdido de vista –, passei a apontar a complexa relação entre cães e
seres humanos ao longo da sua história juntos, que remonta a pelo menos
14 mil anos, de acordo com registros arqueológicos. Enquanto alguns mostraram
apoio e apreço pelo trabalho, outros reagiram contra o projeto e exprimiram
sua posição. O palco estava montado para um diálogo muito produtivo, que
foi uma das minhas intenções originais. A meu ver, o debate deve ir além
de políticas oficiais e pesquisa acadêmica para abranger o público em geral,
incluindo os artistas. O “GFP K-9” foi discutido em publicações em revistas
de arte, livros e resvistas científicas. Jornais diários e revistas de interesse
geral também discutiram o trabalho em andamento. Enquanto publicações
especializadas mostraram maior apreço pelo “GFP K-9”, a resposta dos meios
de comunicação de massa abrangeu toda uma gama de rejeição direta à
consideração de múltiplas implicações para apoio inequívoco. O choque
gerado pela proposta, curiosamente, causou uma crítica a declarar “o fim da
arte”. A meu ver, não há nenhuma razão para ver o início de uma nova arte
como o fim de qualquer coisa (KAC, 2007, p. 164-5).

8.6.2 Arte e comunidade

Nesta vertente, a arte alcança uma função social de intervenção na sociedade por meio de processos
artísticos e educativos. Assim, são vários os projetos criados a partir de convites de instituições culturais
para artistas trabalharem com grupos locais.

Esses tipos de trabalho potencializam a atuação das instituições, buscando promover inclusão
social na comunidade local, democratizar o acesso à arte e romper com as barreiras entre popular,
erudito e contemporâneo.

Rastilho

Figura 109 – Rastilho (2012), projeto colaborativo

Fonte: Pinheiro (2013, p. 65).

151
Unidade III

O Rastilho foi um grupo de produção artística coletiva, autogestionado, iniciado pela artista
portuguesa Carla Cruz em finais de 2011. Define-se como um grupo que trabalha a espontaneidade,
a informalidade e a experimentalidade, sem se preocupar com o tempo nem com os lucros das obras
acabadas. Seu principal objetivo é a promoção da cultura e da arte coletiva.

Teve como um dos produtos do seu viver a reativação da antiga Escola Básica Primária de
Pevidém – fechada desde o ano letivo de 2010, quando os alunos foram transferidos para um novo
pavilhão – durante os meses de setembro de 2012 a janeiro de 2013. Foram criados espaços de
aprendizagem e convívio por meio de diversas oficinas, festejos e momentos de partilha.

As pessoas envolvidas no grupo eram, em sua maior parte, mulheres desempregadas e com idade
superior a 45 anos, antigos amigos e conhecidos da freguesia de Pevidém.

O Rastilho vai sendo gerado a partir do convite feito à artista visual Carla Cruz por parte da “Capital
Europeia da Cultura – Guimarães 2012”, em Portugal. O projeto inicialmente concebido pela artista
tinha como objetivo alertar para as questões que levavam a arte por um caminho de produção industrial
em Portugal. Além desse alerta em torno da produção industrial artística, outro problema era o trabalho
precário ao qual as obras estavam sendo sujeitas e sua pobreza criativa. Todos os alertas e novas
produções do grupo liderado por Cruz eram realizados por meio de uma criação artística coletiva.

A abordagem inicial ancorava-se no contexto de “desindustrialização” do Vale do Ave, área geográfica


de atuação da artista, e suas consequências para o sistema econômico e social local. Tendo em conta esse
interesse, a artista conheceu o grupo Tecer Outras Coisas, constituído majoritariamente por mulheres
desempregadas e em formação profissional, sediado nas instalações de uma indústria têxtil local. Carla
Cruz começou a dialogar com esse grupo, e, a partir dele, foi tomando corpo a constituição de outro
grupo para conceber a ação artística coletiva.

Nos primeiros encontros, a artista propôs algumas ações que se desdobravam em discussões e
reflexões coletivas, partindo do interesse inicial e constante sobre o alerta dos problemas da produção
industrial da arte em Portugal, sua produção precária e a pobreza artística.

Algumas dessas ações envolveram o apresentar-se ao outro – gerando partilhas profundas, com o
resgate de memórias da infância, da escola e outros momentos da vida –, o relembrar e apresentar aos
outros os gestos do trabalho que cada um exercia, a criação de poemas coletivos etc.

Os encontros aconteceram sem regularidade e guiando-se a partir da flexibilidade do grupo e do


desenvolvimento do projeto.

Com o direcionamento que o grupo foi ganhando no interesse em reutilizar a Escola Primária, os
encontros passaram a responder às mudanças. O objetivo do projeto foi sendo alterado, e o próprio
grupo passou a definir novas orientações e novos objetivos.

O Rastilho possibilitou aos seus integrantes direcionarem o seu fazer em grupo para responder às
necessidades do contexto local, em que os integrantes foram os construtores da prática artística no qual
atuavam, partindo das demandas escolhidas por eles.

152
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

A artista passou a desempenhar um papel tão importante quanto os outros integrantes, em que
todos juntos, como uma unidade, possuíam poder de decisão e de criação, tornando o processo dialógico
não apenas horizontal, mas também circular.

Assim, vimos como uma abordagem à arte contemporânea pode se estruturar a partir da emergência
da pós-modernidade e do regime de comunicação. O cruzamento minucioso entre as tendências que
acabamos de apresentar com esses contextos mais amplos poderá clarificar a relação entre teoria e
prática artística, pois evidenciará suas origens, consequências e o emaranhado relacional em que os
artistas estão imersos.

Resumo

Esta unidade apresentou alguns conceitos e definições que


possibilitaram ao leitor realizar uma primeira abordagem à arte
contemporânea. Deu-se ênfase para as distinções entre arte moderna e
arte contemporânea, para que, por meio de uma estrutura comparativa,
o leitor pudesse compreender parte do contexto que afeta e designa a
reorganização do sistema artístico contemporâneo.

Foram apresentados os mais significativos movimentos artísticos e


tendências que podem vincular-se à arte contemporânea, focalizando as
suas características e ideias principais e dando especial atenção a artistas
e projetos mais representativos de cada um deles, esperando assim poder
contribuir para a expansão do repertório visual.

O entendimento dos conceitos de modernidade e pós-modernidade,


assim como os regimes de arte e as tendências artísticas contemporâneas,
permitirão ter uma boa medida da profundidade e da abrangência dessas
terminologias, garantindo navegar com mais propriedade nesse universo,
porque não se trata apenas de entender teoricamente conceitos, mas
também de encarná-los, para ser capaz de apreciar a obra de arte.

Essa compreensão e essa percepção devem, tanto quanto possível,


perpassar por todas as escolas e obras, de tal sorte que a expressão de arte
possa ser vista e entendida também a partir da real perspectiva do artista,
de sorte que se valorize de fato o que ele produziu. Não é sem motivo que
a ensaísta, filósofa e esteta francesa Anne Cauquelin (2005) afirma que
artistas e obras são elementos constitutivos das redes de comunicação, ao
mesmo tempo que são os seus produtos.

153
Unidade III

Exercícios

Questão 1. (Enade 2011) O Minimalismo é um movimento artístico que surgiu nos Estados Unidos
da América na década de 1960 e foi denominado de arte “ABC” ou Minimal Art. Influenciado pelas
correntes abstracionistas das vanguardas artísticas do início do século XX – tais como o suprematismo e
o neoplasticismo, entre outros – o Minimalismo se expandiu pela arte e pela arquitetura. Para Giulio Carlo
Argan (1909-1992), historiador e teórico da arte, o objetivo da Minimal Art seria realizar uma síntese de
volume e cor, criando formas elementares a partir de estruturas geométricas primárias, capazes de se
impor na paisagem das megalópoles industriais, ao mesmo tempo apinhada e desolada. Considerando
as relações estabelecidas com outras manifestações artísticas, conclui-se que o Minimalismo:

A) Adotou, como o Neoplasticismo, a ideia de que uma obra de arte deve ser concebida durante
sua execução.

B) Celebrou o racionalismo e um modo matemático de pensar, tal como o Expressionismo Abstrato.

C) Compartilhou com o Construtivismo um compromisso com o rigor conceitual, relacionando a arte


com a ciência e a tecnologia.

D) Descreveu o ambiente consumista e sua mentalidade, assim como a Pop Art na década de 1950.

E) Substituiu a instantaneidade perceptiva de base gestáltica pela leitura sequencial e relacional


do Cubismo.

Resposta correta: alternativa C.

Análise da questão

O Minimalismo procurava, por meio da redução formal, transmitir ao observador uma percepção da
realidade. A influência construtivista é observada no caráter geométrico.

154
ARTES VISUAIS BRASILEIRAS E MODERNAS

Questão 2.

A imagem acima, obra de Andy Warhol, pertence a uma série que faz referência a outros ícones do
século XX. Sobre o artista e a obra é correto afirmar que:

A) Che Guevara, Pelé e Marilyn Monroe são referências em suas áreas de atuação e foram retratados
por Warhol porque o artista queria que os jovens os imitassem.

B) O artista denunciava as ações do regime cubano, por meio da imagem de Che Guevara, ao mesmo
tempo em que criticava o predomínio cultural americano, ao fazer trabalho semelhante com
Marilyn Monroe.

C) A Pop Art, na qual se insere Andy Warhol, é um movimento de valorização da cultura midiática,
daí sua predileção por representantes de esquerda e de minorias, como mulheres e negros.

D) A proliferação de imagens produzidas pela publicidade, cinema, TV e jornais estimulou uma


pintura que trouxe para a tela, com a Pop Art, referências conhecidas.

E) A Pop Art, na qual se insere Andy Warhol, é um movimento de valorização da política americana.

Resposta correta: alternativa D.

Análise da questão

Andy Warhol foi um dos principais nomes da Pop Art, movimento artístico que se vale de imagens
populares, presentes na indústria cultural, para apresentar uma crítica social. A repetição dos signos
sugere o consumismo.
155
Unidade III

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