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50 SÉCULOS DE TRABALHO

A GRANDE DIFERENÇA ENTRE O TRABALHADOR DO PASSADO E O DE HOJE É


QUE ELES NÃO PODIAM TER FÉ EM SI MESMOS. E NÓSPODEMOS.

(REVISTA VOCÊ S/A, p. 82-87, ago. 2002.)

Pelo que se sabe, nos 365 dias do ano 3000 a.C. não aconteceu nada assim de
muito relevante no mundo. Ele só é o ponto de partida deste relato porque, sendo um
número bem redondo, é fácil de memorizar. Os povos que então habitavam a Terra, além
de não ter idéia de que ano era aquele, também não tinham noção de que estavam para
iniciar um revolucionário período na história, que mudaria definitivamente a cara do
mundo: a era das civilizações.

Civilização é uma palavra que derivou do latim civilic, "da cidade", ou, por
extensão, "urbano". E essa era a grande diferença entre o que estava começando a
acontecer e o que havia acontecido nos 3 milhões de anos anteriores, desde que um
ramo de primatas com pouco mais de um metro de altura, um pouquinho mais de massa
cinzenta e pernas e pés mais semelhantes aos dos humanos atuais do que aos de seus
primos, os macacos, deu o ar da graça no leste da África onde hoje fica a Tanzânia.

A evolução humana, pelos padrões atuais, foi de uma lentidão modorrenta.


Eternidades se passavam antes que qualquer idéia pudesse dar origem à outra. O estilo
das pinturas em cavernas e os materiais usados para pintá-Ias, por exemplo,
permaneceriam inalterados por milênios. Ninguém tinha pressa, até porque não havia
motivo para isso, já que não existia concorrência, nem cobrança por resultados, nem por
desempenho. Mas, bem devagarzinho, as coisas importantes iam acontecendo: nossos
ancestrais aprenderam a se comunicar por meio de palavras, a construir ferramentas, a
dominar o fogo (nessa ordem mesmo: as ferramentas vieram bem antes do uso
inteligente do fogo), a plantar e a colher, a domar animais selvagens e, finalmente a
desenvolver uma forma escrita de comunicação. E - ah! - a inventar a cerveja e o vinho,
que são anteriores à escrita. Então, finalmente, por volta de 3000 a.C., o ser humano já se
havia consolidado como o primeiro animal (no bom sentido) a conseguir uma proeza
notável: moldar o mundo com as próprias mãos, em vez de apenas aproveitar o que a
natureza lhe oferecia. Logo, estava pronto para encarar dois novos desafios: sua maior
aventura - a da civilização - e sua maior dor de cabeça - um bom emprego.

MANESH
Foi naquela região próxima do golfo Pérsico, onde hoje estão localizados o Irã e o
Iraque, que a civilização começou. Ali vivia Manesh, o primeiro mané de uma longa lista
de manés que vão nos ajudar a contar essa história. Ao contrário de seus antecessores,
que viviam em famílias isoladas e tinham de fazer tudo por conta própria - desde cuidar
das plantações e dos animais e construir moradias até costurar suas roupas, fabricar suas
ferramentas e manufaturar seus sapatos - Manesh era "da cidade". Em comparação com
as tribos, as cidades tinham uma massa crítica de habitantes que permitiram o
surgimento da especialização: algumas pessoas já podiam dedicar-se apenas a
produzir roupas, ou sapatos, ou ferramentas, ou armas, para todas as demais
pessoas, que assim teriam tempo para se dedicar exclusivamente a sua atividade
principal - à agricultura, à pecuária, ao comércio ou ao saque de propriedades
alheias.

E Manesh, que já havia nascido em uma cidade grande, precisava encontrar


trabalho para sobreviver, já que sua família era da chamada classe ínfima. Mas Manesh
sentiria os efeitos da chegada de um novo tempo logo no primeiro dia em que saiu à
procura de emprego, quando tinha 8 anos: a cidade estava coalhada de gente como ele,
necessitando trabalhar, e todos disputavam as mesmas e poucas vagas disponíveis. Para
piorar a situação, havia outro tipo de mão-de-obra, barata e abundante: os escravos. E,
para um patrão, era muito mais conveniente ter um escravo do que um empregado.
Manesh, então, teria de se sujeitar as regras vigentes de 50 séculos atrás: trabalhar
continuamente (não havia ainda o conceito da semana e, portanto, todo dia era dia útil),
trabalhar muito (cerca de 18 horas diárias), ganhar pouco (e sempre na forma de
alimentos para a subsistência imediata), torcer para que os deuses não conspirassem
contra (todas as primitivas civilizações dependiam inteiramente das safras agrícolas, e um
ano sem chuva era o suficiente para desencadear uma feroz crise de desemprego) e
morrer logo para abrir a vaga (a expectativa de vida andava por volta de 30 anos).

MANELIUS
Do Manesh e de todos os seus sucessores, que pouco ou nada puderam fazer
para subir na vida, ao Manelius do Império Romano, 3000 anos depois, ocorre uma
mudança radical, que os funcionários das empresas de hoje vão entender com facilidade:
aumentam as oportunidades, mas também aumentam os riscos. O surgimento de novas
civilizações e, como conseqüência, de imponentes cidades, começa a atrair a cobiça de
conquistadores. Se no início da era civilizada o importante era construir uma comunidade,
isso logo daria lugar ao desejo de anexar outras comunidades, não apenas para se
apossar das riquezas, mas também para evitar que continuassem crescendo e se
tomassem poderosas demais. Algo que hoje chamaríamos de "incorporação", como a HP
fez com a Compaq.

A sede de conquista deu origem a outro tipo de emprego: o militar. Impérios fortes
precisavam de grandes exércitos e, portanto, todo bebê do sexo masculino já
nascia com uma carreira garantida: o serviço militar compulsório e permanente,
que começava aos 14 anos e terminava, na melhor das hipóteses, com a invalidez.
Os soldados eram respeitados, bem treinados e tratados. Havia um único e pequeno
inconveniente na profissão: perder a vida no campo de batalha. Mas isso, na época do
Manelius, era encarado com a mesma despreocupação de quem hoje sai de carro sem
dar muita bola às estatísticas de acidentes: risco existe, mas... eles são insignificantes se
comparados com as vantagens de se ter um carro.

Mas essa longa era de conquistas (que perdurou, com maior ou menor furor, do
século 10 a.C. aos nossos dias - vide Hitler, Mussolini e assemelhados) permitiria o
surgimento de outros tipos de profissão que pouco ou nada tinham a ver com a pura
subsistência do povo. Assim, tanto a Grécia antiga quanto a Itália da Renascença,
separadas por quase 3000 anos de história, puderam usar parte das riquezas acumuladas
nas guerras para financiar artistas, filósofos, escritores, pensadores, escultores e
artesãos. Ou então para dar sustentação a profissões de educadores, diplomatas,
burocratas e políticos. E toda essa gente, por sua vez, usava parte dos fundos recebidos
para dar emprego a aprendizes.

Esse longo período permitiu o surgimento de "casos de sucesso" entre manés


nascidos fora dos círculos da nobreza, mas para isso eles precisavam demonstrar uma
genialidade incomum - casos de Michelangelo ou Da Vinci -, só que tal atributo era
privilegio de pouquíssimos. A vasta maioria dos funcionários continuava a ser, como
sempre tinha sido, formada por anônimos que recebiam o suficiente para continuar
sobrevivendo. Paradoxalmente, enquanto a humanidade progredia ao longo dos
séculos em termos de tecnologia e produtividade, as relações trabalhistas ficavam
praticamente estagnadas. Em 1800, o mundo inteiro ainda dependia da agricultura,
e os proprietários das terras se recusavam a abandonar um sistema que já durava
mais de três milênios: o da "posse permanente" de seus empregados.

Embora o que hoje conheçamos como "salário" (o pagamento regular por um


serviço prestado por um funcionário efetivo) tinha sido instituído na Inglaterra por volta de
1500 - e adotado pela maioria das nações européias nos 100 anos seguintes -, em 1800,
os manés-colonos permaneciam apenas um degrau acima da escravidão: apesar de
teoricamente desfrutarem de liberdade, na prática, eles nem sequer podiam se casar sem
a permissão do dono da terra, além de serem proibidos de mudar (ou seja, sofriam um
tipo de vigilância policialesca que os confinava ao local de trabalho). Também estava
vedado o aprendizado da leitura, o que limitava seu conhecimento do mundo ao que o
patrão informava. Além disso, seus filhos menores estavam obrigados a prestar serviço
na residência dos patrões, sem nenhuma remuneração extra. Não existiam férias, nem
assistência médica, nem aposentadoria, nem resquício do que hoje chamamos
"benefícios trabalhistas". E essa relação desigual perpetuava o estado de servidão a que
os funcionários eram submetidos, o que no fim acabava sendo benéfico para os nobres,
que assim se perpetuava no poder.

MANÉ LIGHT
Mas as coisas começariam a mudar ainda durante o século XVIII, quando uma
nova palavra começou a se espalhar pela Europa: "luz", no sentido de "conhecimento". A
Itália batizou essa nova era de "lIuminismo" e daí a palavra chegou à Inglaterra, traduzida
como enlightment. Pela primeira vez na história, pessoas que se beneficiavam de um
sistema injusto de classes começaram a defender publicamente a tese de que mais
conhecimento para os manés poderia significar mais desenvolvimento para o país, e não
uma ameaça aos nobres encastelados em suas propriedades seculares. Essa nova
maneira de pensar, embora contestada pelos poderosos, resultaria, entre outras coisas,
na separação entre Igreja e Estado, na posterior derrocada das monarquias absolutistas
ocidentais e no fim da escravidão no mundo civilizado (o Brasil foi um dos últimos países
a abolir a escravatura, razão pela qual o apelido de "Redentora", conferido à princesa
Isabel, é uma piada de mau gosto). Como curiosidade, uma nova palavra seria
inventada em 1780, no auge do lIuminismo, para definir a visão que a humanidade
deveria ter sobre seu futuro: "otimismo". E seu antônimo, "pessimismo", surgiria
em 1850, quando uma severa depressão econômica assolou a Europa. Coisas da
humanidade: então, como agora, ou tudo ia bem ou tudo ia muito mal.

"Liberdade, Igualdade e Fratemidade", os princípios da Revolução Francesa - a


centelha que acendeu a consciência no mundo, em 1789 - pareciam feitos para as
classes que trabalhavam para produzir as riquezas de um país, mas não recebiam sequer
uma migalha dos lucros. Leis começaram a ser feitas para protegê-Ios, mas nada neste
mundo muda assim tão de repente. O Brasil, por exemplo, ingressaria no século XX com
uma nova legislação trabalhista incipiente, construída, ironicamente para proteger os
patrões.

MANÉ INDUSTRIAL
A grande mudança no mercado de trabalho, que faria o mundo dar um salto sem
precedentes no século XX, veio da Inglaterra. Ali começou a Revolução Industrial, mas
foram os franceses, sempre prontos para inventar palavras, que cunharam o termo que
definiria a nova era: "industrialização". Isso significava a transição do campo para as
fábricas: em 1901, apenas 10% da população da Inglaterra ainda estava empregada na
agricultura. Mas, no Brasil, na mesma época, 70% da população continuava na lavoura, e
as perspectivas de que esse número mudasse em curto prazo eram nulas. De fato, pelos
50 anos seguintes, a economia brasileira dependeria da exportação de um único produto,
o café. As idéias inglesas prosperaram mesmo foi nos Estados Unidos, que até o
século XIX eram um país agrícola e, em menos de 100 anos, se tornariam o maior
exportador de tecnologia (de empresas e de executivos) do mundo.

MANÉ DAS DORES


Em 1910, o Rio de Janeiro respondia por mais de 30% da produção industrial
brasileira. São Paulo e Rio Grande do Sul vinham em segundo, com 15% cada um. Mas a
receita das exportações de café representava mais que a soma da indústria dos três
Estados juntos. Na verdade, havia duas possibilidades de emprego para o Mané brasileiro
do começo do século: o funcionalismo público (salário de 150 mil réis mensais) e a
lavoura (30 mil réis por mês mais uns pés de repolho). E nenhum dos dois empregos dava
lá pra muita coisa: um terno de linho custava 40 mil réis, um gramofone da Victor - a
popular ''Victrola'' -, 700 mil réis. Assim, a esmagadora maioria dos assalariados
trabalhava apenas para subsistir (1 quilo de carne custava 500 réis). Mesmo o aluguel de
uma casa estava acima das possibilidades financeiras da maioria da população: 50 mil
réis, o que levou à proliferação de vilas operárias na periferia de São Paulo e de cortiços
no Rio de Janeiro (e ao "povoamento" dos morros, quando os cortiços foram erradicados
do centro da cidade, em 1908).

A opção brasileira (ou a falta dela) pela agricultura faria o país marcar passo pelas
cinco décadas seguintes. Enquanto, no norte da América, os Estados Unidos
caminhavam para ser a nação mais poderosa do planeta, o maior país Sul-americano
marcava passo. Pior ainda, enquanto a economia brasileira ressonava em berço
esplêndido, as mulheres argentinas iam dar à luz em Paris e o Uruguai ficava conhecido
como a "Suíça da América". Pior ainda, a população brasileira crescia (de 17 milhões, em
1990, para 22 milhões em 1910) sem que fossem gerados empregos de qualidade na
mesma proporção. O Brasil da alvorada do século XX ainda vivia no século XVIII, com as
oligarquias dominantes fazendo tudo para manter os manés confinados abaixo da linha da
pobreza.

Mesmo os que conseguiam trabalho tinham poucos motivos para comemorar: em


1910, as jornadas nas tecelagens e fundições era de 16 horas diárias, em semanas de
seis dias (ou, não raramente, de sete). Sem previdência social e sem assistência médica
para quem sofria acidentes durante o trabalho. Mas o que mais doía era ver as crianças
regredindo à época do Manesh da mesopotâmia: aos sete anos de idade, elas já eram
admitidas como auxiliares de produção, o que Ihes tiraria para sempre a chance de
estudar ou mesmo de aprender a ler. Na verdade, o que hoje chamamos de "História
do Brasil" é a história das elites brasileiras: o povão mesmo, pouco participava
dela. Em 1903, Rodrigues Alves seria eleito presidente da República, com 592.000 votos,
o que dava 3% da população da época. Isso porque mulheres, analfabetos e menores
não podiam votar (embora um menor, aos 17 anos, já estivesse trabalhando duro, havia
pelo menos dez).

O MANÉ ANARQUISTA
Essa situação pouco mudaria nas primeiras quatro cidades do século XX. A única
transformação visível foi de atitude: as levas de imigrantes europeus que aportaram no
Brasil, entre 1890 e 1920, começaram a perceber que seu sonho de fartura no novo
mundo seria impraticável se as condições de trabalho não fossem radicalmente alteradas.
E eles começaram a liderar movimentos sindicais - o que Ihes valeu o apelido de
"anarquistas". Mas seu esforço não renderia resultados imediatos por falta de massa
crítica: a maioria das indústrias era de pequeno porte - tinham em média 20 funcionários,
que podiam ser vigiados individualmente. Mesmo assim, em 1917, uma greve geral
paralisaria pela primeira vez São Paulo, com a cavalaria disparando tiros. José martinez,
um jovem de 22 anos, é morto e toma-se o primeiro mártir trabalhista do Brasil.

O resultado final das escaramuças é dúbio: entre 1917 e 1919, centenas de


estrangeiros - ou "anarquistas indesejáveis" - são deportados do Brasil, e o
movimento sindical se esvazia. Mas ficava nos operários a tênue consciência de
que algo estava errado nas relações entre patrões e empregados.

O MANÉ URBANO
Em 1929, enquanto no Brasil ainda se discutia se era melhor investir na
industrialização do país ou priorizar a produção agrícola para exportação, a crise
econômica mundial, que começou com a derrubada da bolsa de Nova York, forçou a
economia brasileira a tomar um novo rumo. Da noite para o dia, o preço de nossa
principal fonte de renda, o café, desabou 60% no mercado mundial. Os trabalhadores
rurais começam a migrar para as cidades. E o setor industrial, por falta de opções, toma-
se a principal prioridade brasileira. No período entre 1933 e 1939, a produção industrial
cresce à média de 11 % ao ano, e as metrópoles se enchem de gente. Nessa altura, o
Brasil já tinha um novo mandatário, o ditador gaúcho Getúlio Vargas, que havia tomado o
poder à força, em 1930. Getúlio chamado de "Pai dos Pobres" - montaria sua base de
sustentação nas camadas populares e começaria a sancionar leis para melhorar a vida do
trabalhador. Em 1940, é instituído o salário mínimo. Em 1943, surge a CLT, a
consolidação das Leis do Trabalho, que pela primeira vez obriga os patrões a garantir
benefícios a seus funcionários. Não deixava de ser um começo, embora com atraso.

O MANYÉS
A segunda Guerra Mundial (isto é, a segunda numerada da história, já que
existiram outras, antes e depois) mudaria os destinos do mundo. Uma de suas
conseqüências foi à imposição dos padrões econômicos e culturais dos Estados Unidos
aos povos ocidentais. Isso foi bom? Depende de como cada um enxerga. Dessa nova
ordem mundial vieram o capitalismo e a concorrência desenfreada (e nem sempre leal).
Do outro lado, boas notícias para os manés:

Na segunda metade do século XX, pela primeira vez em 5 milhões de anos, pessoas
comuns acumularamm bens trabalhando. Algumas conseguiram tomar-se milionárias.

Um vasto leque de possibilidades se abriu para gente nascida nas camadas mais
baixas: esportistas e artistas, por exemplo, mesmo com pouco estudo, tiveram a chance
de ganhar mais dinheiro em alguns anos do que as 20 gerações familiares que os
precederam.

Uma classe média emergiu e pôde proporcionar aos filhos o ensino que os pais jamais
sonharam em ter.

O MANÉ 21
Assim, em meros 30 anos, o mercado mudaria mais do que mudara em 50.000. E
as regras para o mané do século XXI são elementares:

Gerar resultados práticos em curtíssimo prazo - a regra básica para a


sobrevivência profissional.

Nunca parar de estudar - a dita "educação continuada". É até irônico, mas é


verdade: com 30% da formação acadêmica de um jovem de hoje, um de 1960 já
conseguiria entrar em uma empresa na função de gerente.

Estabelecer uma sólida rede de contatos profissionais - o tal networking. Com


os currículos acadêmicos cada vez mais iguais, o que vai desempatar a disputa por uma
vaga ou por uma promoção é o relacionamento com quem decide. Ou seja, tudo ficou
muito mais difícil, certo? Muito pelo contrário. Meus avós eram lavradores. Meu pai,
mecânico. Minha mãe, tecelã. Quando eu tinha oito anos, ela dizia: "Pára de encher
o sapicuá e vai trabalhar, Mané." Parecia uma condenação, mas não era. Minha família
foi a primeira a entender que ser mané podia ser uma vantagem, e não uma vergonha. Já
era hora. Afinal, já lá iam 50 séculos em que os manés vinham construindo o mundo sem
ganhar nada com isso. Nós, os manés, estamos apenas começando a desfrutar o direito
de ter oportunidades. Ainda com muita dificuldade, é certo, mas é sempre bom lembrar
que bilhões de manés antes de nós, talvez com mais vontade, e até mais brilhantes,
jamais chegaram a ter uma simples oportunidade na vida. A enorme diferença é que eles
não podiam ter fé em si mesmos. E nós podemos.

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