Brasileira Autor: João Vitor de Lima Ferreira. Igreja Batista em Bela Vista (IBBV), Vitória de Santo Antão – PE.
(Introdução) O que é Soteriologia?:
“Soteriologia” é uma palavra que tem origem na língua grega, que por sua vez, provém de outras duas palavras: σωτήριος (Soterios), que significa "salvação" e λόγος (logos), que significa "palavra", "princípio", ou "ensino". Essa palavra é usada para designar a área da Teologia Sistemática que estuda a Salvação do homem. A discussão sobre a Salvação humana é demasiada antiga, e percorre por toda a trajetória da humanidade, além é claro, de trazer uma série de polêmicas infindáveis que nos alcançam até os tempos hodiernos. Afinal, qual o fim do homem? Qual a finalidade do ser humano e como alcançá-la? De acordo com a cultura judaico-cristã, o fim último do homem É Deus, e n'Ele alcançamos a Salvação. Mas salvação de quê? O que está acontecendo conosco, ou o que fizemos para ser necessário que sejamos salvos? A resposta é o pecado, estamos mortos em delitos e pecados de acordo com a Palavra de Deus (Efésios 2:1). E segundo a mesma, o salário do pecado é a morte (Romanos 6:23), podemos concluir portanto que estamos encrencados, afinal somos todos pecadores. O nosso pecado nos levará ao Inferno, que é a morte espiritual (Apocalipse 21:8), é justamente disso que precisamos ser salvos. Salvos dos erros que nós mesmos cometemos. O homem herdou a natureza pecaminosa de Adão, o primeiro pai da humanidade, primeiro homem criado, ancestral de tudo que se denomina como ser humano. Temos uma genética apodrecida pela péssima escolha do nosso ancestral, que juntamente com sua esposa, Eva, a primeira mulher, feita dos mesmos ossos que seu marido, caiu no engodo da antiga serpente (Apocalipse 12:9), Satanás, que vem mentindo e levando a humanidade à morte desde o início dos tempos (João 8:44). Adão, ingênuo, porém desobediente, aceitou alimentar-se do fruto da Árvore do conhecimento do bem e do mal, que já havia sido ofertado e aceito por sua esposa que o induziu à dar a mordida fatal, tendo ambos caído na armadilha da cobra, o Inimigo de nossas almas. Havendo eles de imediato perdido sua branda inocência, O castigo dos Altos Céus recaíram sobre a Toda a Criação, que agora está fadada a sempre perecer; a morte passou a ser então, uma realidade inescapável... (Gênesis 3) Essa tragédia cósmica, a mãe de todas as tragédias, é chamada na Teologia de “Queda". Os efeitos da queda foram terríveis. Mas Deus se revelou à humanidade, para que esta não se perdesse por completo, pois é imensa sua misericórdia (Salmos 51:1). Após o dilúvio nos tempos de Noé, que não abordaremos, Deus se revela a Abraão e com ele faz uma aliança. Abraão seria o pai de muitas nações (Gênesis 12:1-2; Gênesis 26:4), e essa aliança se estendeu à Nação de Israel. Não é o objetivo deste estudo abordar a Soteriologia veterotestamentária, tendo em vista que não somos Judeus e sim Cristãos, e que vivemos nos tempos da Maravilhosa Graça de Nosso Senhor Jesus Cristo. Mas é justamente acerca de Cristo, Nosso Senhor, que Deus se refere ao dizer que por meio de Abraão, todas as famílias da Terra seriam abençoadas (Gênesis 12:3), afinal Jesus veio ao mundo Encarnado como um judeu, legítimo descendente de Abraão, e da linhagem real do rei Davi e Cumpridor de todas as profecias messiânicas. Jesus É a Salvação das nossas almas, antes, a expiação (purificação de crimes ou faltas cometidas. Meio usado para expiar(-se); penitência, castigo, cumprimento de pena; sofrimento compensatório de culpa.) se era feita através do sacrifício de animais puros, porém hoje, temos Salvação por meio do sacrifício de Cristo na Cruz do Calvário (João 3:16) e esse Evangelho, ou seja, essa excelente notícia é uma mensagem de salvação universal, que alcança todos os povos da terra (Romanos 1:16). Tendo isso em vista, sabemos agora o que é a Salvação, e por meio de quem ela se dá. Os filósofos gregos, como o ateniense Arístocles, mais conhecido como Platão, brilhante pensador que irá influenciar o grande filósofo cristão Agostinho de Hipona, já discutiam acerca do tema. A verdade é que existe um vazio no homem, e há uma necessidade de sanar esta crise existencial. Por isso, mesmo esses povos, que apesar de possuírem a reflexão filosófica mais sofisticada para época não tinham a revelação do Verbo-λόγος (João 1:1), pararam para analisar o motivo da existência do homem, para quê ele foi criado, e como ser salvo da desvirtuação desse propósito. E por não possuírem a revelação nem terem sido alcançados pelo Evangelho, eles não entenderam que a resposta de suas indagações é que o homem, assim como tudo que existe, foi criado para a Glória de Deus, (Colossenses 1:16) e que a humanidade está distante desse propósito por causa de nossas ofensas ao Altíssimo (João 9:31; Isaías 59:2). Hoje em dia, no meio evangélico, não há dúvida (Ao menos assim espera-se!) do meio por qual se obtém a Salvação da alma. Jesus subjugou a morte, o pecado e o inferno, sendo o holocausto Perfeito (1 Coríntios 15: 55-57; Hebreus 10:12); e sua Vitória também se estende aos seus santos, justos e salvos; à sua amada Igreja(Romanos 8:37; Mateus 16:18). Em contrapartida de não se haver mais dúvidas de quem nos provê a Salvação, ainda existe acaloradíssima discussão acerca de como Cristo opera essa Salvação em nós. É preciso cauteloso estudo para responder alguns questionamentos sobre essa questão tão importante para a nossa Fé, e certamente, os dois colossos soteriológicos que tem tenebrosamente assombrado a História da Igreja, são justamente estes: A Salvação é Monergista, ou Sinergista?! Ou seja, Deus nos Salva de modo fatalista e nos condena de maneira determinante, ou nós temos direito de escolher o caminho da Salvação e da perdição de maneira livre e sem a interferência divina nessa escolha? Deus faz tudo Sozinho, ou permite nossa interferência? Como pode Soberania divina e liberdade humana? “Livre-arbítrio ou predestinação"? Ponderemos essas questões de maneira sóbria e equilibrada, evitando os diversos “espantalhos" que costumam surgir. Como Batistas nossa única regra de fé e prática é a Bíblia Sagrada, o que as Escrituras determinam é o que seguiremos livremente, exercendo nossa plena liberdade de consciência, que por nossa própria escolha, “está cativa à Palavra de Deus" (AGOSTINHO. Cit. LUTERO). Porém é necessário que a Bíblia seja estudada com a devida atenção e zelo; por isso, vamos estudar o tema na perspectiva interpretativa da Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira, um documento completamente pautado na Bíblia, que é subscrito por todas as comunidades eclesiásticas autônomas que estão filiadas à essa denominação. Além é claro, de também analisarmos um pouco de História e todo o transcorrer deste tão famigerado debate, suas consequências sobre a Igreja de Cristo, principalmente as diferentes visões soteriológicas, até chegarmos nas conclusões da Convenção Batista Brasileira. (Obs.: Nós não repudiamos as visões que se opõem à nossa. Nós batistas consideramos irmãos em Cristo todos (quase todos, não temos o poder de sondar os corações.) os que se dizem lavados e remidos pelo Sangue da Nova Aliança. Se você não é Batista Brasileiro, se não faz parte desta convenção evangélica tradicional, e teve acesso a esse estudo, deixo claro que não consideramos nenhum irmão de outra tradição obrigado a concordar com a nossa visão. E se por acaso faz parte, também não é, mas aconselho que pondere a questão e esteja aberto a mudar de opinião e ficar de acordo com o sua identidade denominacional. Com cordial e fraterno afeto, de seu irmão em Cristo: João Vitor de Lima Ferreira, o autor.) (História e Teologia) O Debate de Agostinho e Pelágio: No quarto século surge no ceio da Igreja uma controvérsia iniciada por um monge ascético chamado Pelágio da Bretanha. No pensamento de Pelágio, o homem não herdava o pecado original, fruto da natureza adâmica. Segundo ele, o homem nascia puro e a sociedade o corrompia, (Lembra um pouco o pensamento do filósofo J. J. Rousseau.) contaminando através dos maus exemplos. O que fazia o homem pecar era o seu livre-arbítrio, ele simplesmente peca, não por fazer parte da sua natureza o pecado, mas porquê assim o escolhe. Para ele, Adão foi simplesmente um mal exemplo e Jesus foi um bom exemplo em contrapartida. Nós deveríamos seguir os exemplos de Jesus, através do nosso livre-arbítrio e essas boas obras nos salvariam, tornando assim, a Salvação algo completamente meritório, o que anula teoricamente a necessidade da Graça do Senhor. Para os pelagianos, o livre-arbítrio era o que nos faria ir até Deus; as pessoas poderiam escolher em todo o tempo ir ao Senhor, quando bem quisessem, e o livre-arbítrio já seria a maior graça, pois ele nos salvaria, quando escolhêssemos deixar de cometer pecados. Ou seja, não existe predestinação ou eleição alguma, o ser humano sempre pôde salvar-se a si mesmo, a partir do momento que decidisse parar de pecar, e essa era uma realidade completamente possível, segundo essa herética linha de pensamento que ficou conhecida como Pelagianismo que é considerado como heresia desde o primeiro concílio de Éfeso em 431. Existe uma versão moderada, porém também equivocada, deste pensamento, chamada de semi-pelagianismo, que apesar de não negar o pecado original, prega que o livre-arbítrio do homem ainda está intacto, portanto o homem pode dar o primeiro passo até Deus, ao invés de ser Deus quem vai atrás do pecador; esse pensamento também problematiza a Graça, pois consegue fazer da própria escolha humana uma obra salvífica. Em resposta ao Pelagianismo, se levanta o bispo africano, Agostinho de Hipona, um dos maiores filósofos e teólogos da história do Cristianismo, para debater a questão. Não é de se admirar que esse “doutor da Igreja” foi terminantemente contra essas ideias. O pensamento agostiniano diz que Pelágio torna a cruz de Cristo “algo inútil", fazendo com que qualquer tipo de Graça, seja apenas um mero acréscimo ao livre-arbítrio, que se torna basicamente o único fator salvífico do ser humano. Para Agostinho, que desenvolveu uma teologia bastante completa, a Salvação se dá unicamente pela Graça, mediante a Fé do ser humano (Romanos 2:8), e a Fé para ele, é colocada no homem por Deus. O homem apesar de ter livre- arbítrio, não teria acesso a ele enquanto não fosse liberto pelo Sangue de Jesus. O homem está totalmente depravado pela contaminação da natureza de Adão, e por isso o homem tem liberdade pra escolher o pecado que cometerá, mas não pode escolher fazer o bem ou salvar-se. O homem não perdeu o Imago Dei (“Imagem e semelhança de Deus.” Gênesis 1:26) completamente, mas por ser pecador naturalmente, mesmo sendo remido por Cristo, não pode parar de pecar, mas sendo convertido, pode obter perdão pelos seus pecados e não mais sentir prazer neles; agora o homem foge do pecado ao invés de correr atrás dele para satisfazer-se. Para Agostinho o homem não escolhe a Salvação, sendo claramente um monergista, apesar de não negar a liberdade humana. Portanto o livre-arbítrio como fator salvífico é tido como heresia, e apenas a Graça misericordiosa do Nosso Senhor pode salvar o pobre pecador de si mesmo (Efésios 2:8). O Calvinismo e o Arminianismo (Sua História e do que se trata.): Com o advento da Reforma Protestante, movimento iniciado pelo monge agostiniano Martinho Lutero, o Cristianismo passa por aquela que pode ser considerada sua fase mais caótica. Com o protestantismo não há mais magistérios ou Sumos Pontífices, então está em voga o direito à liberdade de interpretação da Bíblia, o que culminará em diferentes e novas tradições, diversos sistemas teológicos e um número crescente de denominações, cada uma com algum ponto em particular, ou com alguma divergência. Mas certamente, nenhuma divergência foi maior, mais polêmica, ou mais duradoura, do que o debate entre as Soteriologias Calvinista e Arminiana. Os dois sistemas teológicos que polarizam o protestantismo até os dias de hoje, mesmo já tendo se passado quase 500 anos de discussão. É evidente que existem muitas linhas soteriológicas distintas no protestantismo e algumas no catolicismo, mas só nos aprofundaremos naquelas que mais tem nos influenciado como Batistas. Do lado Calvinista, geralmente se tem as tradições Presbiteriana, Congregacional e Batista, e do lado Arminiano, são adeptas as tradições Metodista, Pentecostal e é claro, Batista também. Os Batistas desde suas mais remotas origens já divergiam neste aspecto. Os Batistas que criam no livre arbítrio eram os Batistas Gerais, e os que acreditavam no determinismo eram chamados de Batistas Particulares. Até hoje existem muitos grupos que se consideram de tradição batista que são calvinistas, e outros que se consideram arminianos. Para entender os dois lados, devemos nos situar no período das Reformas religiosas na Europa. Naqueles tempos renascentistas vigorava a escolástica católica, uma linha filosófica medieval com teor profundamente Tomista (Tomás de Aquino), que deu vazão ao pensamento semi-pelagiano que até hoje rege a Igreja de Roma; ela crê que a Salvação se dá por fé e obras, e não somente pela Fé. Essa foi a porta de entrada para outros problemas ainda mais graves, como a famigerada venda de indulgências, um dos estopins que provocaram a grande Reforma. Por isso, o pensamento Luterano, inspirado na teologia agostiniana, era monergista, e o sinergismo passou a ser visto com maus olhos. Isso fica notável nas discussões entre Lutero e o reformador católico Erasmo de Roterdã, Lutero era contra a ideia de que o homem possui livre- arbítrio, possuindo uma livre agência, que na verdade é como uma espécie de “livre- arbítrio compatibilista" que não tem poder pra escolher o bem, apenas como fazer o mal até ser liberto pela redenção de Cristo, assim como pensava Agostinho. Graças a isso, surgiu o pensamento Reformado, ou seja, Calvinista, que será ainda mais radical na rejeição do sinergismo. Calvinismo: Essa linha teológica muito rica, tem sua origem com o reformador francês João Calvino. Sua atuação se deu na Reforma de Genebra, onde exerceu uma influência grandiosa, sendo considerado o maior reformador depois de Martinho Lutero, além de brilhante teólogo e um dos maiores exegetas da História da Igreja; As igrejas ditas “Reformadas" são as denominações que seguem a tradição calvinista, tradição esta, que foi muito importante para o avanço do protestantismo e pela propagação do Evangelho, tendo sido adotada por alguns dos maiores pregadores e avivalistas da História, como por exemplo, o grande avivalista, pastor e gênio filósofo norte-americano, Jonathan Edwards, que iniciou o “Primeiro grande despertamento” dos EUA. A teologia de Calvino era muito abrangente em diversos assuntos, incluindo inclusive questões econômicas. A sua Soteriologia era muito mais monergista que a Luterana, enfatizando que a predestinação era fatalista; desde a eternidade Deus já haveria decretado quem seria Salvo e quem seria condenado, tendo Cristo morrido apenas pelos seus eleitos, escolhidos de forma soberana de acordo com a vontade misteriosa do Senhor, e não com base em sua presciência. Desta forma surgiu a doutrina que ficou conhecida como “dupla predestinação”. O eleito em algum momento de sua vida acabaria por não resistir à Graça de Deus e cederia à conversão, e isso se evidenciaria aos frutos do Espírito, e a mudança de vida, que só é encontrada nos santos; enquanto o réprobo teria seu coração endurecido por Deus, e mesmo que viesse a frequentar uma igreja, jamais se converteria verdadeiramente. A Fé é colocada por Deus no homem escolhido, e jamais é colocada no rejeitado. O homem não tem livre-arbítrio algum, ele sequer tem capacidade de aceitar a Salvação para este pensador; toda a obra salvífica é operada tão somente por Deus, o homem por estar morto em delitos e pecados não tem liberdade alguma, a queda e a depravação total, fizeram do ser humano uma criatura completamente incapacitada. Ele cria na livre agência, que como no Luteranismo, só serviria para escolher qual pecado praticar, só podendo operar boas obras após a regeneração; sendo assim, tudo que existe foi decretado pelo Altíssimo. A evangelização portanto não seria uma forma de convencer os homens a aceitarem a Cristo, mas uma forma de despertar os eleitos de Deus, que após se converterem jamais perderiam a sua Salvação, os verdadeiros salvos jamais se desviariam do Evangelho, e se viessem a desviar por certo tempo, acabariam por retornar, sendo impossível cair da Graça segundo as ideias de Calvino. A obra mais importante deste reformador são as Institutas da Religião Cristã, um tratado teológico genial. Sua importância fez com que seus discípulos batizassem essa linha teológica de Calvinismo, após a morte de João Calvino. E é após seu falecimento que surge um sistema teológico oponente chamado de Arminianismo. No Sínodo de Dort, onde o Arminianismo tornou- se réu da Igreja Reformada Holandesa, e foi rejeitado oficialmente pelo Calvinismo, foram criados os 5 pontos do Calvinismo que resumiriam esta doutrina (“TULIP” é o acrônimo em inglês destes tais pontos.), sendo eles: • Depravação Total. • Eleição Incondicional. • Expiação Limitada. • Graça Irresistível. • Perseverança dos Santos. Arminianismo: Essa linha teológica é oriunda do pastor holandês Jacó Armínio, inteligentíssimo teólogo e professor Universitário, cuja influência nos alcança até os dias de hoje, pois a teologia idealizada por ele, influenciou grandes movimentos evangélicos, como o Movimento de Santidade e o Pentecostalismo, além de ser o pensamento adotado por John Wesley, grande avivalista anglicano, “pai do metodismo”, que difundiu bastante o pensamento de Armínio, construindo inclusive uma vertente própria conhecida como Arminianismo Wesleyano. Infelizmente, as ideias de Armínio, um tanto revolucionárias para época, lhe custaram muito caro, sendo que por causa disto, ele foi demitido de sua universidade e morreu muito pobre. Poucos anos depois de sua morte, os seus discípulos, chamados de Remonstrantes, foram exilados da Holanda devido à rejeição desta linha, pela Igreja Reformada no Sínodo de Dort (1618-1619), que teve uma forte interferência política, devido aos embates entre Católicos e Protestantes, nos quais a Holanda tomou partido pelos Calvinistas. No pensamento de Armínio, era possível existir uma teologia que cresse no livre-arbítrio do homem e mesmo assim ser protestante, diferente do que a maioria dos crentes pensavam na época, devido a influência Luterana e Calvinista. Diferente do que muitos pensam, o Arminianismo não se resume apenas na defesa do Livre-arbítrio, na realidade, ele foca na defesa da Justiça e do amor de Deus pela humanidade. Apesar deste grande pensador admirar muito João Calvino —Que já era falecido— pelo seu impressionante legado exegético, ele discordou veementemente do seu pensamento monergista. Para os arminianos o fatalismo calvinista, que decreta a redenção de uns e a danação de outros, fere o princípio da justiça de Deus, tornando-o parcial. Além de que Deus estaria decretando o pecado, ou seja, o homem, se não for livre, não teria culpa pelo pecado segundo eles. É claro que nenhum irmão calvinista acredita que Deus é o Autor do pecado e do mal, mas segundo a linha arminiana, o Calvinismo acaba por assim o fazer consequentemente, ao dizer que Deus decreta o pecado do réprobo e gera nele a rejeição do Evangelho para que este não se salve. Armínio não concordava com esse pensamento calvinista, apesar de ser pastor de uma igreja reformada e professor de uma universidade que seguia esta teologia. Deus dá a todo os seres humanos a oportunidade de salvação através da chamada Graça Preveniente, que é a mensagem da Cruz; ela desperta a oportunidade do homem decidir se deseja que a Maravilhosa Graça opere em seu coração, ou se quer continuar morto em delitos e pecados. A Graça Preveniente provê a Fé no ser humano mas ele decidirá se quer ser regenerado. A depravação total da queda não fere completamente o Imago Dei, ou seja, com o auxílio da Graça o homem ainda pode arbitrar. O homem nada pode fazer para ser salvo ou merecer a Salvação, mas sendo sinergista, a Teologia Arminiana diz que Deus em sua Justiça e Misericórdia concede ao homem a capacidade de escolha, uma obra da Graça que é imerecida. A Graça, diferente do que prega o Calvinismo é resistível, nessa linha de pensamento, e a expiação de Cristo na Cruz foi por toda a humanidade, inclusive aqueles que jamais se salvariam; para os arminianos, essa ideia preserva o Amor e a Justiça do Senhor. Porém, uma vez salvo o homem, que após ser regenerado tem sua liberdade restaurada, apesar de não poder escolher parar de pecar por ser de sua natureza que ainda não foi glorificada, ele não está livre da possibilidade de completa apostasia; por ser livre, o homem pode escolher, mesmo já tendo sido genuinamente justificado, se vai perseverar em Cristo até o fim, ou se abandonará a Salvação ao longo da carreira. Assim pensa o Arminianismo, que recebeu este nome dos remonstrantes, discípulos de Jacó Armínio, após seu falecimento. A Remonstrância, que tinha este nome por querer rever os posicionamentos oficiais das igrejas Reformadas, composta pelos alunos de Armínio, formulou 5 pontos (“FACTS” é o acrônimo em inglês destes pontos.), que são: • Eleição Condicional. • Expiação Ilimitada. • Depravação Total. • Graça Resistível. • Segurança em Cristo.
Qual a Posição da Convenção Batista Brasileira?:
Nós, Batistas Brasileiros, somos uma denominação tradicional, rica e histórica. Temos a nossa própria Declaração Doutrinária, promulgada em 1986, substituindo o antigo documento adotado por nossa denominação, que era a Confissão de Fé de New Hampshire. A Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira, é um documento bastante completo, e que entre outros assuntos, também aborda a questão do Pecado, da responsabilidade humana e da Salvação, ou seja, Soteriologia. Como membros de uma igreja batista, é nosso dever conhecer quais são as posições oficiais da nossa denominação; isso é realmente importante, pois gera uma identidade denominacional. Toda igreja deve ensinar as doutrinas que crê, e nós cremos na nossa Declaração Doutrinária, portanto, surge a necessidade de compreendê-la em todos os seus aspectos e estuda-la para edificação pessoal e também dos irmãos que conosco congregam. Certamente a Soteriologia é uma das mais importantes posições abordadas. Nossa Declaração tem 19 artigos, além de apontar em sua introdução, os 6 princípios fundamentais que regem a Tradição Batista, sendo estes: 1° —Aceitação da Bíblia Sagrada como única regra de fé e conduta; 2°—O conceito de Igreja como sendo uma comunidade local democrática e autônoma; 3°—A separação entre Igreja e Estado; 4°— A absoluta liberdade de consciência; 5°—A responsabilidade individual diante de Deus; 6°—A autenticidade e apostolicidade das igrejas. Logo se percebe que a questão da responsabilidade humana é algo que evidentemente prezamos bastante. Nos artigos IV, V e VI, a Declaração aborda os temas, Pecado, Salvação e Eleição, vamos nos aprofundar nisto: PECADO: Na Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira, está registrada a crença de que todos somos pecadores, inclinados ao mal; que herdamos a natureza corrompida de nossos primeiros pais, Adão e Eva, que foram feitos livres e sem pecados, mas caíram no engodo do Inimigo e pecaram ( Gn 2.15-17; 3.8-10; Ec 7.29/Gn 3; Rm 5.12-19; Ef 2.12; Rm 3.23). Que o pecado é cometido contra Deus mas também prejudica o próximo (Gn 3.12; Rm 5.12; Sl 51.15; Is 53.6; Jr 17.5; Rm 1.18-27; 3.10-19; 7.14-25; Gl 3.22; Ef 2.1-3/ Sl 51.4; Mt 6.14; Rm 8.7-22/ Mt 6.14,15; 18.21-35; 1Co 8.12; Tg 5.16). O homem é inimigo de Deus por transgredir a sua Lei. O maior pecado que o homem comete é rejeitar a Deus, e por causa da desobediência e da incredulidade, todos estamos fadados a morrer (Jo 3.36; 16.9; 1Jo 5.10- 12/Rm 5.12-19; 6.23; Ef 2.5; Gn 3.18; Rm 8.22). Sem Deus não existe Salvação, apenas condenação eterna, e sem a Graça de Deus o homem é completamente incapaz de ser redimido ( Rm 3.20; Gl 3.10,11; Ef 2.8,9). SALVAÇÃO: De acordo com a Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira, Deus É O Único que tem poder para nos Salvar, e que o faz mediante a Fé em Cristo como Único e Suficiente Salvador (Sl 37.39; Is 55.5; Sf 3.17; Tt 2.9-11; Ef 2.8,9; At 15.11; 4.12). Todo o preço do nosso pecado já foi pago na cruz, com o sangue Do Nosso Senhor (Is 53.4-6; 1Pe 1.18-25; 1Co 6.20; Ef 1.7; Ap 5.7-10). A Salvação é individual, redimindo o homem por completo (Mt 116.24; Rm 10.13; 1Ts 5.23,24; Rm 5.10). É um dom gratuitos que Deus oferece a todos os homens, e compreende a regeneração, justificação, santificação e glorificação do ser humano (Rm 6.23; Hb 2.1-4; Jo 3.14; 1Co 1.30; At 11.18). (Vale salientar que a Declaração explica o que compreende ser a regeneração, justificação, santificação e glorificação, porém não é necessariamente o foco deste estudo abarcar estes pontos, o que o tornaria demasiado extenso, por abarcar outros temas como Santidade, Pneumatologia e Escatologia.) ELEIÇÃO: Segundo a Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira, Eleição é a escolha feita por Deus em Cristo, desde a eternidade, das pessoas que serão salvas da condenação eterna, não por mérito humano, mas puramente pela riqueza da Graça (Gn 12.1-3; Ex 19.5,6; Ez 36.22,23,32; 1Pe 1.2; Rm 9.22-24; 1Ts 1.4). Antes mesmo de todas as coisas serem criadas, O Senhor predestinou por sua Soberania, iluminada pela sua onisciente Presciência, aqueles que aceitariam livremente serem lavados e remidos pelo Sangue do Cordeiro (Rm 8.28-30; Ef 1.3- 14; 2Ts 2.13,14). Mesmo Deus exercendo sua Soberana vontade sobre essa eleição, ela ainda assim se encontra em perfeita consonância com o livre-arbítrio do ser humano (Dt 30.15-20; Jo 15.16; Rm 8.35-39; 1Pe 5.10). Diz ainda que a Salvação é eterna, sendo impossível perder a Salvação quem verdadeiramente se converteu, pois o Poder de Deus o preserva, nada na existência pode separar um verdadeiro crente do amor de Deus, que está em Jesus Cristo; o novo nascimento, a Regeneração a Justificação e todos os demais processos salvíficos, a adoção como filhos de Deus, a eleição e o dom do Espírito Santo no qual estamos selados nos garantem a permanência na Graça de Nosso Senhor Jesus Cristo ( Jo 3.16,36; Jo 10.28,29; 1Jo 2.19/ Mt 24.13; Rm 8.35-39/ Jo 10.28; Rm 8.35-39; Jd 24). Conclusão: Tendo em vista tudo o que acima foi proposto, podemos tirar as seguintes conclusões: Que segundo o artigo IV e V da Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira, os Batistas Brasileiros não podem ser considerados Pelagianos. A terrível heresia de Pelágio nega o pecado original e a incapacidade humana, mas as Escrituras são enfáticas neste assunto e Biblicamente estamos convencidos de que o pensamento do monge bretão é completamente herético. Apenas em Cristo temos esperança de Salvação, pois somos completamente incapazes de nos salvarmos pelas nossas próprias forças. Mesmo crendo em livre-arbítrio, isso não faz dos Batistas Brasileiros pelagianos ou semi-pelagianos; acreditamos que não é a nossa liberdade quem nos Salva, pelo contrário, se Cristo não viesse até nós, estaríamos eternamente condenados, pois não temos poder ou liberdade suficiente para irmos até Ele. É Tão somente Ele que nos regenera, justifica, santifica através do seu Santo Espírito Consolador e quem irá nos ressuscitar na glorificação (Efésios 2:5). Podemos ainda concluir que segundo o artigo VI da Declaração Doutrinária, os Batistas Brasileiros podem ser considerados sinergistas, mas não podem ser considerados arminianos clássicos, e oficialmente, não nos designamos diretamente como arminianos, pois não cremos no último dos 5 pontos da Remonstrância. O Homem uma vez salvo, jamais perde a Salvação, aquele que inicia a obra, jamais permitirá que escapemos das suas onipotentes mãos! Os Batistas Brasileiros então em um estado intermediário entre o Calvinismo e o Arminianismo, pendendo mais para o lado arminiano. Somos quase o que poderia ser chamado de arminiano de 4 pontos, e também poderíamos nos identificar um pouco com o Baxterianismo, pensamento do pastor puritano britânico Richard Baxter, cuja teologia não é nada menos que um calvinismo bastante moderado; ele diz que O Senhor realmente tem um número seleto de eleitos, mas que porém, morreu por todos os homens e a todos dá a oportunidade de redenção pelo Sangue de Cristo na cruz do Calvário. Mas com absoluta certeza, não somos calvinistas, apesar de crermos que a soberania de Deus é o fator chave na eleição como eles pregam. Prezamos pela doutrina da liberdade e da responsabilidade humana como algo basilar da nossa denominação, e obviamente, cremos que expiação é ilimitada (Tito 2:11), isso é realmente importante para preservarmos a Justiça de Deus. Uma teologia que apesar de fazer sentido põe em controvérsia o caráter do Senhor, deve ser a princípio evitada, por isso nossa posição atual nega o Calvinismo, apesar de termos muito apreço pelos irmãos reformados e reconhecermos sua enorme contribuição para com o Evangelho, tendo sido muitos batistas ilustres, seguidores desta linha. A Soteriologia da CBB é um sistema particular da nossa denominação. Buscamos a todo custo fazer da Bíblia nossa Única regra de fé e prática, e isso implica aceitar as supostas “contradições” que as Teologias possam vir a encontrar. Uma “teologia manca”, a “teologia do Saci-pererê" como diz o teólogo batista Luís Sayão, pode ser muito perigosa e limitadora. Ora, afinal a Bíblia fala em predestinação (Romanos 8:29), fala em eleição (1 Pedro 2:9), fala em depravação total (Eclesiastes 7:20), fala em liberdade (Romanos 2:8; Romanos 10:9) fala sobre responsabilidade humana (Mateus 12:36; Romanos 14:12; 1Pedro 4:5) e outras coisas que parecem se anular, e por isso os homens projetam diversas interpretações. Mas devemos ter em vista que teologias são feitas por homens, são imperfeitas e é por isso que existem várias, mas A Bíblia é A Palavra de Deus, ela é perfeita e por isso só há uma. Portanto devemos buscar o equilíbrio sempre! E é esse equilíbrio bíblico que a CBB buscou preservar na sua Declaração. Cremos que o homem é completamente depravado (Efésios 2:1), mas essa depravação total não anula o livre-arbítrio se assim O Senhor conceder que o homem o tenha (Josué 24:22; João 1:12). Cremos que Deus não É um gigantesco telespectador cósmico que fica de braços cruzados a nos observar sem interferir, pelo contrário, sem a interferência divina, jamais poderíamos sequer escolher aceitar a obra redentora, então temos que crer no princípio da Graça Preveniente, que é Deus atuando para que o homem tenha a possibilidade de escolher (Isaías 1: 18-20; Romanos 5:8-9; João 3:16; 1João 2:2). O Senhor Deus não quer marionetes, ele quer servos que o adorem livremente; desta forma, a eleição claramente é feita pela soberana vontade do Senhor, porém baseada em sua presciência, que desde a eternidade pregressa previu quais homens usariam sua liberdade para se renderem como servos de Cristo (João 3:17-18; Romanos 8:29; 1Pedro 1:2); somos escravos do pecado, porém, Deus por sua Graça que nos alcançou de modo preventivo, faz de nós homens detentores de liberdade, que por livre vontade escolheram ser escravos de um bom Senhor (João 1:12; Atos 16:31; Êxodo 21: 5-6). Cremos na doutrina da perseverança dos santos, se qualquer outro nos tivesse Salvo, poderia nos deixar escapar de suas mãos, mas o Todo Poderoso Senhor, que deseja amorosamente que todos se salvem, não permite que nossa liberdade contaminada pelo pecado nos faça cair de sua Graça, não se a obra redentora realmente estiver operando em nós, sem falsidade mas com conversão sincera (Romanos 8: 35-39; Filipenses 1:6; Judas 24). A verdade é que nós Batistas somos uma tradição cristã cheia de divergências entre nossas denominações, porém acreditamos que o correto é ser sempre o mais Bíblico possível, por mais que às vezes possa parecer confuso. Sempre houveram grandes Batistas Calvinistas, como o inglês Charles Spurgeon, e grandes Batistas Arminianos, como o norte-americano Billy Graham, e eles foram servos do Senhor que impactaram o mundo e fizeram a obra de Deus. Porém no Brasil, decidimos não ser de Armínio nem de Calvino. Sabemos que não foi a vertente teológica que fez esses homens serem as figuras icônicas e inspiradoras que foram, foi O Nosso Senhor Jesus Cristo, a quem eles livremente decidiram seguir e fielmente servir. Os Batistas Brasileiros, estão dispostos a defender as verdades escriturísticas da Soberania de Deus, da sua Justiça e da responsabilidade humana. Apesar de presarmos muito pela teologia, nós reconhecemos suas limitações e por via das dúvidas, decidimos ser de Cristo, e apenas d'Ele. Louvado seja o nome do Senhor Todo Poderoso, agora e para sempre, Amém. Do seu irmão em Cristo, João Vitor de Lima Ferreira. A.M.D.G. Soli Deo Gloria! BIBLIOGRAFIA: LOTT, Henrique Marques. A Soteriologia e os diferentes critérios de Salvação de Salvação em Luc Ferry. Rio de Janeiro-RJ: Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). CONEGERO, Daniel. O que é Pelagianismo? Quem foi Pelágio? Disponível em: https://estiloadoracao.com/o-que-e-pelagianismo/ COSTA, Marques Roberto Nunes. 10 Lições sobre Santo Agostinho. 4.ed. Editora Vozes. Petrópolis-RJ: 2014. SPROUL, R.C. Eleitos de Deus. 2.ed. Editora Cultura Cristã. Trad. Gilberto Carvalho Cury. Cambuci-SP. 2002. OLSON. Roger E. Teologia Arminiana: Mitos e Realidades. 1.ed. Editora Reflexão. Vila Prudente-SP.2013. LEITE, Jônatas Câmara. A Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira, sua história e intertextos. Vitória-ES: Faculdade Unida. 2014. Pacto e Comunhão. 2.ed. Convicção Editora. Org. Sócrates Oliveira. Rio de Janeiro-RJ. 2010. SAYÃO, Luiz. A Teologia do Saci Pererê. Disponível em: http://www.prazerdapalavra.com.br/colunistas/luiz-sayao/2630-a-teologia-do-saci- perere-luiz-sayao CUNHA. Bispo Renato. BAXTERIANISMO. Disponível em: https://www.facebook.com/apostolopauloinconformado/photos/a.1128124850547109/1 380976721928586/?type=3 https://www.bibliaon.com/
Pecado, Expiação e Salvação como Processo: três doutrinas bíblicas, três temas bíblicos que, postos e estudados em sequência, formatam um Processo muito frequente ao longo da Bíblia - Volume 2