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Corpo Culura e Desporto - Manipulação de Resultados Final
Corpo Culura e Desporto - Manipulação de Resultados Final
De que forma a aplicação dos princípios éticos da deontologia kantiana pode contribuir
para prevenir e combater a manipulação de resultados no contexto desportivo,
promovendo a integridade e preservando os valores fundamentais do desporto em
Portugal?
Discentes:
19 de janeiro, 2024
RESUMO
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CORPO, CULTURA E DESPORTO
1ºANO | MESTRADO EM GESTÃO DO DESPORTO
ÍNDICE
1. Introdução ................................................................................................................. 4
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1. INTRODUÇÃO
Desta forma, este trabalho tem como objetivo investigar as implicações éticas da
manipulação de resultados, com foco na aplicação da deontologia kantiana. Pelo que,
procuraremos compreender como esta teoria ética fundamenta a repulsa à manipulação
desportiva, destacando a importância de restaurar a integridade e promover um ambiente
desportivo que esteja alinhado com deveres morais universais.
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2. INTRODUÇÃO TEÓRICA
De acordo com Costa, Filho, Marchetti & Parry (2019), “com o avanço das tecnologias,
esse fenômeno evoluiu para uma ameaça significativa aos princípios fundamentais que
norteiam o desporto, sendo já identificados casos em badminton, hóquei no gelo,
patinação artística, boxe e vela que evidenciam a diversidade de desportos afetados por
esta prática nefasta. Além disso, modalidades amplamente populares como futebol,
basquetebol e ténis já enfrentaram casos de manipulação, comprometendo a integridade
de competições organizadas pelas suas federações.”
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De acordo com o Institut de Relations Internationales et Stratégiques, em 2012, este
mercado, que movimenta uma quantia considerável anualmente, conta com mais de oito
mil operadoras globalmente, das quais 80% operam ilegalmente, especialmente na Ásia
(ICSS, 2014).
Através do exposto, é possível evidenciar que diversos fatores contribuem para o aumento
de eventos desportivos manipulados, incluindo os ganhos expressivos associados ao jogo
ilegal, a vulnerabilidade dos atletas, as penalizações relativamente brandas para esse tipo
de delito e a complexidade em detetar essas práticas.
Segundo o IPDJ (2021). “Existem diferentes correntes éticas, ou seja, diversas formas de
dar resposta a um problema, questão ou dilema ético”. Exemplo disso é a ética
deontológica na qual é o foco do nosso trabalho, a ética utilitarista e a ética das virtudes.
A ética pode ser definida “como um sistema de valores que se manifesta através do
comportamento humano. Ora, se o desporto é uma área do agir humano, então também aí
a ética se manifesta. Desta forma, quando, através do desporto, se tem a intenção de
educar, ajudar a formar o caracter, entre outros objetivos análogos, então o desporto é um
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meio para a manifestação e o desenvolvimento de um conjunto de valores éticos”.
(IPDJ,2021).
Os valores éticos “são aqueles valores que nos ajudam a agir de forma correta, justa, e a
concretizar o bem, pois a essência do valor ético é a procura do bem. Por isso, valores
como a justiça, a verdade, o respeito e a honestidade são valores fundamentais no meu
agir ético”. (IPDJ,2021). Para além destes valores, existem outros não menos importantes,
como:
Respeito - Ao cumprir as
Amizade - No jogo estabelece- regras do jogo e ao reconhecer
se uma relação, criando e Solidariedade - O atleta torna-
as qualidades do outro, o
fortalecendo laços entre pares. se solidário perante a adver-
atleta aceita as decisões e
sidade, ajudando o outro
respeita o outro tal como ele
é.
A manipulação de resultados (match fixing), pode ser definida por diversas maneiras;
pode ser vista como uma combinação, ou acordo, para organizar o resultado e/ ou
interferir em certos eventos de uma competição desportiva, removendo o grau de
incerteza. (United Nations Office on Drugs and Crime (UNODOC), 2013).
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A definição de manipulação de resultados fornecida pelo (Sport and Recreation Ministers’
Council Communiqué, 2011), citado em European Comission, 2012) é mais completa. De
acordo com o próprio, a manipulação de resultados envolve a manipulação de um
resultado por concorrentes, equipas, agentes desportivos, equipas de apoio, árbitros e
oficiais e funcionários do local. Essa conduta inclui:
A fixação deliberada do
resultado de uma Tanking (consiste no ato de
Uma deliberada performance
competição, ou de uma desistir de um jogo
insuficiente;
ocorrência dentro da propositadamente);
competição;
Abuso de informações
privilegiadas para apoiar uma
A aplicação incorreta ou Interferência no jogo ou aposta feita por qualquer um
deliberada de um funcionário superfícies de jogo pelo staff dos itens acima ou feita por
das regras do concurso; local; um jogador que recrutou
essas pessoas para manipular
um resultado;
Figura 2 - Conceito de manipulação de resultados. Sport and Recreation Ministers’ Council Communiqué de 2011.
Citado por European Comission, 2012.
Dado o exposto, é possível evidenciar que a manipulação de resultados vai além da mera
influência nos resultados finais de uma competição e engloba diversas condutas que
comprometem a integridade do evento esportivo. Assim, na base desta ideia, Souza
(2014) afirma que “(…) a manipulação de resultados se traduz numa atividade ilegal, em
que, deliberadamente, se vicia o resultado de uma competição desportiva, para a
concretização de um benefício material de uma pessoa ou várias.”
Com a evolução tecnológica e a expansão das apostas desportivas online, que permitem
a participação global em tempo real em diversas competições, testemunhamos um
aumento exponencial na manipulação de resultados. De acordo com Oxford (2010) a
manipulação de resultados tem sido considerada uma das principais ameaças à
integridade do desporto, juntamente com o doping, lavagem de dinheiro e desvios de
dinheiro em federações desportivas.
Deste modo, este fenómeno vai além da mera influência no resultado, abrangendo aspetos
específicos do desempenho desportivo, como resultados parciais, número de golos, entre
outros, com o intuito de obter ganhos financeiros indevidos. Ainda assim, importa
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destacar que a manipulação de resultados não se restringe apenas às apostas, podendo
também envolver vantagens desportivas (Council of Europe, 2014).
4. DEONTOLOGIA KANTIANA
A Deontologia Kantiana, formulada por Immanuel Kant no século XVIII, é uma teoria
ética que se destaca por priorizar que a moralidade é determinada pelo dever e pela razão,
com ênfase na autonomia da vontade humana (Herrero 2001). Desta forma, esta
abordagem ética está intrinsecamente ligada à filosofia moral kantiana, que se distingue
na ideia de que o Homem age como legislador das suas próprias leis morais.
Por outro lado, do ponto de vista de Kant, este rejeita o “consequencialismo”, termo
criado por Anscombe (1958), esta teoria defende que o valor ético de uma ação é
determinado pelos resultados da própria ação, intencional ou não. Por outro lado, Kant
fundamenta a Deontologia Kantiana na conceção da moralidade como uma questão de
dever. Assim, a ação ética, segundo Kant, decorre de um sentido de dever desligado das
consequências. Dessa forma, a vontade autónoma é central na teoria, representando a
capacidade de agir de acordo com a razão prática pura e sem influências externas.
Por outro lado, outro ponto distintivo é a ideia de imperativos categóricos, ações éticas
universais e incondicionais. Deste modo, o princípio da universalização da ação destaca
que uma ação é ética se poder ser universalizada sem contradição, promovendo a
consistência lógica e a igualdade na aplicação dos princípios (Kranak 2019).
Apesar da base sólida, a Deontologia Kantiana não escapa de críticas. Assim, na opinião
de Kranak (2019), o problema da relação entre a vontade e a razão é central na filosofia
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ética de Kant, conduzindo à formulação do imperativo categórico como o princípio
supremo da moralidade. Por outro lado, na visão de Herrero (2001), a rigidez dos
imperativos categóricos e a falta de consideração pelas consequências específicas das
ações. Em suma, a aplicação prática dos princípios kantianos em situações complexas
pode gerar dilemas éticos, suscitando dúvidas sobre a adequação da abordagem em
contextos onde o cálculo utilitário pode parecer mais pragmático.
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compatibilidade entre a manipulação de resultados e os princípios morais universais
propugnados por Kant.
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de confiança reduz a atratividade do desporto enquanto plataforma publicitária,
prejudicando os investimentos e a sustentabilidade financeira (Lisboa 2023).
Desta forma, uma medida preventiva eficaz é promover a transparência nas finanças
desportivas e divulgar informações sobre contratos e patrocínios. Assim como, a medida
da “tolerância zero” Cima e Moriconi (2022), avaliações regulares das políticas éticas,
adaptações contínuas e recompensas para integridade contribuem para um ambiente
desportivo ético; Sanções severas e universais, como suspensões e multas substanciais,
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são cruciais para dissuadir práticas manipulativas. Dado o exposto, estas medidas
combinadas fortalecem a integridade do desporto, preservando a justiça e equidade nas
competições (Moriconi, 2014).
No âmbito regulamentar, a análise das medidas existentes revela uma interseção entre
ética desportiva e princípios kantianos. Deste modo, a proibição de apostas para
determinados intervenientes, aliada à cooperação entre entidades desportivas e
autoridades reguladoras, representa uma resposta ética à manipulação de resultados.
Contudo, a eficácia dessas regulamentações deve ser avaliada continuamente. Desta
maneira, a consistência com os princípios éticos propostos por Kant e a sua capacidade
de preservar a integridade das competições são fatores cruciais ao serem aplicadas
sanções robustas em caso de violações éticas são essenciais para garantir o respeito pelos
deveres morais universais, conforme preconizado pela deontologia kantiana.
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De acordo com Moreira & Pestana (2008), as sugestões para melhorias éticas incluem o
reforço da educação sobre ética desportiva, envolvendo atletas, treinadores e agentes
desportivos.
Neste contexto, as organizações desportivas devem priorizar a divulgação aberta das suas
práticas e decisões, contribuindo assim para a construção de uma relação de confiança
com os participantes e fãs. Além disso, a prestação de contas desempenha um papel vital,
exigindo que essas entidades assumam a responsabilidade por manter a integridade dos
eventos desportivos (Marques & Costa, 2019).
Além disso, as organizações desportivas devem assegurar que suas práticas de gestão
promovam a integridade em todos os níveis. Isso inclui a seleção de líderes éticos, a
criação de uma cultura organizacional que valoriza a honestidade e a implementação de
medidas que desencorajem práticas antiéticas (Ferkins & Shildbury, 2015).
O projeto Sport Against Match Fixing (SAMF)1, surge como uma iniciativa vital na luta
contra a corrupção no desporto, abordando especificamente a preocupante problemática
da manipulação de jogos e resultados. Desta forma, sob a coordenação da Federação
Portuguesa de Futebol (FPF) e em colaboração com organizações de renome de Portugal,
Alemanha, Itália, Lituânia, Malta e Holanda, mais especificamente a Federação de
Futebol de Malta, FIBA-Europa (Federação Internacional de Basquetebol), Federação de
Futebol da Lituânia, Sport Evolution Alliance, Stichting European Network for
Innovation and Knowledge (EUNIK) e Panathlon Internacional.
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Disponível em: https://www.fpf.pt/pt/Institucional/PROJETOS-FINANCIADOS/SAMF e
sportagainstmatchfixing.com.
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Este projeto tem uma duração de 24 meses, assim o primeiro objetivo do projeto é realizar
uma análise aprofundada do estado atual do Match-Fixing e entender o impacto direto na
carreira dos atletas. Esta avaliação crítica servirá como base para as fases subsequentes
do projeto.
A segunda etapa envolve uma campanha de sensibilização, tanto online como offline,
visando informar e alertar atletas de base sobre a natureza prejudicial da manipulação de
jogos. Por isso, a conscientização é uma ferramenta poderosa na prevenção, e o SAMF
procura capacitar os atletas com o conhecimento necessário para reconhecer e resistir a
tentativas de corrupção.
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O principal objetivo da Convenção de Macolin é prevenir e combater a manipulação de
competições desportivas, incluindo práticas como a manipulação de resultados, suborno
de atletas e outros comportamentos fraudulentos que possam minar a confiança do
público no desporto, enfatizando também a importância da cooperação internacional e
reconhecendo a necessidade de medidas consistentes e eficazes em nível nacional.
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Disponível em: https://golazzo.com.br/calciopoli/
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A manipulação de resultados, como alegada no "Calciopoli," não poderia ser
universalizada sem gerar contradições. Como tal, se todos os clubes adotassem tal prática,
a confiança no desporto seria minada, tornando a competição justa impossível. Desta
forma, a deontologia kantiana destaca a importância de tratar jogadores, treinadores e
árbitros como fins em si mesmos, respeitando a sua autonomia e dignidade.
Dado o exposto, este escândalo desportivo serve como um exemplo marcante para debater
a responsabilidade dos clubes perante ações que comprometem a integridade e a ética no
desporto.
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10. CONCLUSÃO
Respondendo à questão de investigação, “de que forma a aplicação dos princípios éticos
da deontologia kantiana pode contribuir para prevenir e combater a manipulação de
resultados no contexto desportivo, promovendo a integridade e preservando os valores
fundamentais do desporto em Portugal?”
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