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Onde está Deus

no meu sofrimento?

Jaime Kemp
Onde está Deus
no meu sofrimento?
Relatos de experiências pessoais do autor em meio a dor São Paulo, junho de 2009

© 2009 by Jaime Kemp


Editora Fô lego
www.editorafolego.com.br
Editores
Emilio Fernandes Junior
Rosana Espinosa Fernandes
Revisã o
Iara Vasconcelos
Preparaçã o de texto
Sonia Emilia Lopez Andreotti
1a ediçã o brasileira
Julho de 2009
Todos os direitos sã o reservados à Editora Fô lego, nã o podendo a obra em questã o ser
reproduzida ou transmitida por qualquer meio - eletrô nico, mecâ nico, fotocó pia, etc - sem a
devida permissã o dos responsá veis.
Dados de Catalogaçã o na Publicaçã o
Kemp, Jaime
Onde esta Deus no meu sofrimento?
Jaime Kemp, Sã o Paulo: Editora Fô lego, 2009.
ISBN 978-85-98862-36-1
1. Dor - Aspectos religiosos 2. Sofrimento - Aspectos religiosos I. Título
DEDICATÓRIA
Dedico este livro a todos que estã o passando por algum tipo de dor, à queles que, em
silêncio, contemplam a grande pergunta: Por quê?
Em especial, dedico-o à minha grande amiga V irgínia Moreira. Enquanto estas pá ginas
eram escritas, acompanhá vamos o percurso do seu tratamento de quimioterapia. Nossas
oraçõ es também seguiram seus momentos de dor e coragem. Você é muito especial para
nó s!
JaimeKemp

SUMÁRIO
.. -..
Dedicató ria .................................................................................... 5
Introduçã o ......................................................... ., ......................... 9
1 A chegada das lá grimas ..................................................... 13
2 Quando parece que Deus é sá dico! ................................. 23
3 Por que Deus nos faz esperar? ......................................... 33
4 Deus é responsá vel por me fazer feliz? ........................... 43
5 Quando a dor nos alcança ................................................ 49
6 Quando merecemos ser disciplinados ............................. 57
7 Sofrendo por Jesus ............................................................ 65
8 Orgulho e quebrantamento ............................................. 77
9 Injustiça, até quando? ....................................................... 83
10 Transformando o mal em bem ......................................... 87
11 Ajudando o Sofredor ........................................................ 97
Epílogo
Deus é fiel .............................................................. 101
INTRODUÇÃO
---•·+-----·-· --
Neste tempo em que nos encontramos, cabe perguntar: qual a situaçã o do verdadeiro
cristã o? Ele possui: dificuldades sem medida, grande urgência e expectativa confiante.
Podemos esperar que as circunstâ ncias fiquem muito ruins, até mesmo calamitosas, antes
de se tornarem incornparavelmente boas. O tempo está voando! Nã o há como definir datas,
mas nossa velocidade em direçã o ao final dos tempos acelerase a dígitos incalculá veis. O
cá lice da iniquidade humana está quase transbordando. Impiedade e irtjustiça estã o se
tornando normas aceitas no planeta Terra.
É hora de concentrarmos nossa atençã o no que é eterno, nã o no encanto transitó rio dos
bens e prazeres. A igreja verdadeira nã o pode permanecer imparcial e impassível enquanto
nosso mundo se destró i. Este momento da Histó ria requer urgência.
Este livro é resultado da adversidade, sofrimento e dor, pelos quais passamos nos anos de
97 e 98, nos â mbitos familiar e ministerial. Fui levado a pensar e a meditar nos propó sitos
de
x ---------------- INTRODUÇÃ O
Deus no sofrimento de seus filhos. Minha busca resultou neste livro.
No capítulo 11 do livro de Hebreus, encontramos uma lista de sofrimentos e tragédias
ocorridos com nossos irmã os no passado. Alguns foram torturados, presos, açoitados,
apedrejados, serrados ao meio, mortos por espada. Eram peregrinos, afligidos e
maltratados. Vestiam-se com peles de animais e andavam pelos desertos e cavernas.
É importante compreender que esses irmã os conservaram sua fé até a morte, sem receber
e:x.'Plicaçã o pelo que lhes ocorrera. Às vezes pergunto-me o que os pregadores do
evangelho da prosperidade fazem com textos como estes. Acho que os arrancam da Bíblia,
pois a postura que assumem é diametralmente oposta ao que vemos aqui.
Nã o é meu objetivo provocar medo, ansiedade, preocupa
çã o ou tristeza em ninguém. Há , porém, muitas chances de que a dor, a dificuldade, o
sofrimento surpreendam a você, a mim ou a alguém pró ximo a qualquer um de nó s. Nã o se
pode saber quando uma pessoa perderá um ente querido, será afligido por um acidente,
terá problemas de coraçã o; quando pais receberã o a notícia de que sua filha adolescente
está grá vida, quando alguém ouvirá um pedido de divó rcio ou perderá o emprego.
O sofrimento é extremamente doloroso e nenhum de nó s está isento de se deparar com ele.
Se há uma instituiçã o ameaçada hoje em dia é a família.
Uma casa que nã o foi firmada na rocha da Palavra de Deus logo ruirá . Os ventos nã o
pararã o de soprar, as tempestades nã o deixarã o de ameaçar. Somos humanos, frá geis e
temos temores, dú vidas e indagaçõ es.
INTRODUÇÃ O----------------- XI Fiz, a mim mesmo, inú meras vezes, as clá ssicas perguntas!

Por que logo eu tive que passar por isso?

Como identificar quando Deus está dizendo para esperannos?

Quando Ele diz "nã o"?

Por que há horas em que o Senhor insiste em permanecer silencioso?

Até quando terei que assistir e passar por injustiças?
Este livro foi o resultado de horas gastas na presença do Pai, em busca de respostas. Ele nã o
é simples teoria, pois possui uma perspectiva bíblica, prá tica e fundamentada na Palavra.
Fui "cobaia" das palavras aqui transcritas, as quais, antes de serem impressas, me
ofereceram conforto e esperança. Por esse motivo, quero compartilhá -las com você.
JAIMEKEMP
C APÍTUL O
1
ACHEGADA
das
LAGRIMAS
Há mais de 30 anos desfruto da bênçã o de possuir um grande e querido amigo: Dennis
l{izziar, que atualmente é pastor de uma igreja no estado de Oregon, Estados Unidos.
Certa vez, ele me contou uma hilariante histó ria sobre um caná rio amarelo, que tinha um
nome muito esquisito. Ele se chamava
"Por que eu?"
"Por que eu?" morava numa residência muito rica. Um dia, quando a empregada limpava o
fundo de sua gaiola com o aspirador de pó , sem querer sugou o pobrezinho para dentro do
tambor do aparelho.
Imediatamente, prevendo a bronca que levaria se acontecesse alguma coisa a "Por que
eu?", ela desligou o aspirador, abriu a tampa que vedava o tambor e ... lá estava ele,
completamente marrom, recoberto pela poeira, debatendo-se desesperadamente à procura
de ar.
A mulher, apavorada, tirou-o dali sem saber muito bem o que fazer. Entã o veio à sua mente
uma idéia - certamente nã o
14 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
muito apropriada - mas uma tentativa de reparar seu erro. Ela o levou até a torneira mais
pró xima e lhe deu um bom banho de á gua fria para tirar toda a sujeira. Depoi,s, com o
secador da patroa ligado no ar bem quente, secou o aterrorizado caná rio que mal podia
respirar diante da fú ria turbinada daquele vendaval.
Gosto muito dessa histó ria porque ela ilustra, de maneira simpá tica e bem-humorada, as
dores e tristezas a que muitas vezes somos expostos.
Você já perguntou a si mesmo: "Por que eu?". Já se sentiu como o passarinho da narrativa?
Aspirado para o tambor de um aspirador, sem ar e totalmente sujo, recebendo o impacto de
ser colocado inesperadamente embaixo de uma á gua gelada para, em seguida, sofrer o
choque térmico do ar quente de um secador? Se sua resposta for afirmativa, talvez você
seja capaz de confortar aquela pobre criaturinha!
Confesso que nos ú ltimos dois anos (97,98) passei momentos nos quais me senti como esse
caná rio. C. S. Lewis , entre tantas outras declaraçõ es, disse: "Deus sussurra em nossos
prazeres e grita em nossas dores". Parece-me que o Senhor tem falado bem alto comigo e
com minha família nestes ú ltimos tempos.
Durante esse período tenho me apegado ainda mais à Palavra, nã o para saber o PORQUÊ de
tantas dificuldades, mas sim PARA QUÊ Ele as tem permitido.
2 Coríntios 1.3-11 tornou-se uma rocha firme para a segurança do meu coraçã o em meio à
tempestade que se desencadeou em minha vida.
Nessa passagem bíblica tã o significativa, o apó stolo Paulo expõ e sua vida particular e revela
suas pró prias adversidades e
A CHEGADA DAS LÁ GRIMAS
15
fraquezas. Esta carta é a mais pessoal, a mais emocional e autobiográ fica das que ele
escreveu. Realmente, é uma defesa de Paulo diante das acusaçõ es que lhe imputaram, que
foram: 1.
Ter motivos questioná veis;
2.
Ter sido desonesto;
3.
Ter sido covarde;
4.
Ter dito palavras duras, á speras;
5.
Ter sido um falso apó stolo.
O fator principal que o apó stolo aborda nestes versículos de 2 Coríntios 1.3-11 é o porquê
do sofrimento. O Senhor permite nossa dor para desenvolvermos a capacidade de confortar
aqueles que também sofrem.
Toda escola deveria incluir em seu currículo uma matéria sobre como confortar pessoas.
Isto deveria ser inserido em cursos para enfermeiros, médicos, bombeiros, pastores,
professores, policiais, artistas, banqueiros, etc. (a lista é interminá vel...) De fato, é um
elemento a ser ensinado a todo ser humano.
Há momentos quando as pessoas necessitam de conforto e, além disso, ainda precisam
confortar outros. Alguns, provavelmente, nunca foram consolados, porém isso nã o modifica
a verdade de que todos precisam ser encorajados.
Infelizmente, mesmo a conclusã o de um curso sobre tal questã o nã o seria suficiente para
que alguém fosse considerado apto para a tarefa de auxiliar os necessitados. Um dos
motivos é o egoísmo do ser humano, sempre mais preocupado com seu pró prio conforto do
que com a carência do seu semelhante.
A Palavra de Deus declara que a tribulaçã o produz perseveran
ça. Para criar cará ter no coraçã o de seus filhos, o Senhor os faz ex-
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perimentar dificuldades, dores, provaçõ es. Como usufruir do conforto divino para
enfrentar problemas e necessidades? Para receber a ajuda que necessitamos, em primeiro
lug-ar de Deus e depois das outras pessoas, é preciso que sejamos confortados em nossas
pró prias dores.
Certamente, você já presenciou uma criança cair, machucarse e vir correndo com dor, à s
vezes sangrando, em direçã o aos braços protetores e carinhosos dos pais. De repente, algo
a reprime inexplicavelmente e a busca por proteçã o e auxílio transforma-se em rebeliã o.
Entã o ela chuta, bate, grita com os que tentam ajudá -la, confortá -la como se fossem
culpados pelo que aconteceu.
Nã o sabemos como socorrer alguém se, previamente, nã o tivemos tal eÀ rperiência em
nossas vidas.
A mais eficiente escola de "confortadores" é a vida. Ela consiste de altos e baixos, alegrias e
tristezas. Quando aprendemos realmente a correr para os braços do Pai, aconchegando-nos
a Seu peito e deixando-O nos consolar, entã o conseguimos agir da mesma forma com
outros. Davi descreve tal acontecimento no Salmo 34.17,18,19,22.
As afliçõ es do povo de Deus sempre foram inú meras. Jó nã o estava só em seu sofrimento.
Paulo coloca claramente suas dificuldades em 2 Coríntios 11.23-28. Ele descreve situaçõ es
dificílimas de sofrimentos físicos que tiveram conseqü ências profundas em sua. alma e em
seu espírito. Dores que prostrariam em definitivo a qualquer homem ou mulher, mas que
só mostraram ao apó stolo o quanto ele precisava de Deus, porque nele mesmo só era
patente a fraqueza.
É por isso, por ter experim�ntado em sua carne o sofrimento, que ele inicia a carta
exaltando o "Deus de toda consolaçã o".
A CHEGADA DAS LÁ GRIMAS
17
Neste trecho, ele nos lembra que nosso Pai Celestial é o Deus de compaixã o e de todo
consolo. Isto é motivo suficiente para proclamarmos, com um coraçã o grato: Aleluia!
Quando você assiste pela TV as dificuldades pelas quais passam tantas pessoas no mundo e
pensa na distâ ncia que as separam de você, impossibilitando uma ajuda mais concreta,
direta, prá tica, seu íntimo nã o se exaspera por nã o poder consolá -las?
Mas quem sabe seja alguém mais pró ximo, um membro de sua família, um amigo muito
achegado que esteja enfrentando um momento de extrema dor? Seu coraçã o fica tã o
ansioso, preocupado e compadecido, que você acorda durante a noite desejoso de orar por
essas pessoas. Esteja certo que o Senhor é infinitamente mais compassivo que você e sente
profundamente a dor de suas criaturas e de seus filhos. Afinal de contas, fomos criados à
Sua imagem e se uma de Suas características é a compaixã o, ela também é intrínseca a nó s.
Deus, porém nã o é descrito e reconhecido apenas como Deus de compaixã o, mas de todo
conforto, que nos conforta em toda 1Zossa tribulação. Como? Primeiramente, se tivermos
sabedoria de correr para Ele.
À s vezes, um sentimento de abandono invade nosso cora
çã o; temos a impressã o de que tudo e todos nos abandonaram.
Entretanto, certamente e de modo imperceptível, o Senhor está nos carregando em Seus
braços. E quando vivenciamos o conforto do Deus de toda consolaçã o, nos preparamos para
ajudar aos que precisam ter seu â nimo renovado.
O primeiro namorado de minha filha mais nova, Annie, foi um rapaz muito especial, cristã o,
responsá vel e simpá tico. Ele era
18 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
o tipo de genro cobiçado por todas a mã es da igreja que freqü entava.
Certa noite, eu estava em casa aproveitando o convívio de minha família num intervalo de
minhas viagens ministeriais, quando ele chegou para buscá -la. Eles iam sair para jantar e,
talvez, assistir a um filme. Eu confiava plenamente nele e sabia que, entre dez, onze da noite
ela estaria de volta.
Fiquei tranqü ilo quando saíram, apesar de já há algum tempo estar percebendo que algo
nã o ia muito bem entre eles.
Nã o se passaram duas horas quando ouvi a chave ser colocada na fechadura da porta de
entrada. Annie entrou com seus longos cabelos cobrindo seu rosto.
-Oi, Annie!
Nã o obtive nenhuma resposta. Ao invés disso, ela foi rapidamente para seu quarto e fechou
a porta atrá s de si.
Pensei comigo: "Que bom que estou em casa!"
Esperei alguns instantes e fui vê-la. Quando bati à porta, eu a ouvi soluçando. Tentando
disfarçar o choro, ela me deixou entrar.
Ajoelhei-me a seu lado na cama. Notei que o.travesseiro estava bem molhado, revelando
que ela já havia chorado bastante. As lá grimas continuavam a cair.
Quando ela finalmente se acalmou, falei:
- Filha, acho que já sei o que houve, mas você quer falar comigo sobre isso agora?
Muito triste e com a voz embargada, ela respondeu:
-Terminamos, pai!
A CHEGADA DAS LÁ GRIMAS
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Annie estava desapontada por ter perdido seu "príncipe encantado" e eu, que há mais de 35
anos havia passado pela mesma situaçã o ("levei o fora" de uma garota que achava que seria
a minha "princesa"), consolei-a com a experiência de quem conhece aquela dor.
E é exatamente isso que Paulo fala em 2 Coríntios 1.3-7.
Ele utiliza as palavras consolaçã o e conforto nove vezes. Em grego, a palavra "parakletos"
está intimamente relacionada com o ministério do Espírito Santo (Jo 14.16; 15.26 e 16.7).
"Parakleo"
significa alguém que fica ao lado de outra pessoa para sustentá -la, segurá -la, impedindo-a
de cair. O grande "Parakleo" é o Deus de toda consolaçã o. Na sua dor mais lancinante, o
Senhor deseja segurá -lo e Paulo nos revela que o propó sito disso é: para podermos consolar
aos que estiverem com qualquer angústia, com a consolação que nós mesmos somos
contemplados por Deus (2 Co 1.4b).
Ao compreender que um dos motivos do sofrimento é a minha preparaçã o para ser
consolador, sinto-me confortado por ver objetivos para a dor que estou enfrentando. Mas,
como exercer o ministério da consolaçã o? Será que existe um manual de instruçõ es para
nos orientar? Nã o, nã o existe! No entantS), gostaria de, baseado na experiência angariada
através das provaçõ es pelas quais passei, colocar algumas idéias de como ser um
"parakleo":
• Seja autêntico. Ao ver alguém sofrendo, expresse seus sentimentos a essa pessoa de modo
honesto. Se ficou chocado pelo que ocorreu, diga isso a ela. Se, de repente, você sentir
vontade de chorar, chore. Se você ficar muito emocionado, demonstre. Nã o esconda seus
sentimentos!
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• Seja sensível. Sua presença é mais importante que suas palavras. A abundâ ncia de
palavras e a preocupaçã o em explicar o porquê de tudo só denunciam um espírito
insensível e arrogante.
Joe Bagly, no livro "T he View From a Hearse" (A Visã o de um Carro Funerá rio),
compartilha sinceramente seus sentimentos quando da morte de um de seus filhos: "Eu
estava sentado, dilacerado pela dor. Alguém aproximou-se e começou a falar sobre a
maneira como Deus trata conosco, por que meu filho estava morto e da esperança que
há ,além do tú mulo. Ele falou sem parar a respeito de fatos verdadeiros, dos quais eu tinha
completo conhecimento. Tudo o que ele disse nã o me tocou em absoluto. Ao contrá rio,
senti imenso alívio quando, finalmente, ele parou de falar e se foi. Outra pessoa veio e
sentou-se ao meu lado. Nã o perguntou nada, nã o falou sobre a esperança do futuro.
Simplesmente nã o abriu sua boca. Sentou-se ali durante uma hora ou mais, ouviu-me
quando eu quis desabafar; deu respostas rá pidas e diretas. Entã o, fez uma breve oraçã o e
foi embora. Eu, porém, nã o queria que ela se fosse!
• Seja um apoio. Aqueles que exercem o ministério de apoio precisam possuir um coraçã o
carinhoso e compreensivo.
O principal nã o é citar diversos versículos e oferecer uma pilha de literatura. Os que sabem
apoiar simplesmente dizem:
- Eu estou aqui ao seu lado para abraçá -lo e chorar com você!
Uma menininha perdeu seu coleguinha de escola em um acidente de carro. Logo depois, ela
contou à sua família que, voltando da escola, visitara a mã e do menino tentando confortá -la
em seu sofrimento.
A CHEGADA DAS LÁ GRIMAS
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- O que você falou para ela, filha? - perguntou o pai.
- Nada! - respondeu a garotinha. Eu só sentei em seu colo e chorei com ela.
Essa atitude demonstra exatamente o que é apoiar alguém em sua dor.
• Seja solícito. No dia em que uma pessoa falece, no dia seguinte e até uma semana depois,
todos dã o assistência, carinho, conforto aos familiares que ficaram. Mas ... e um mês depois,
quando as flores já murcharam e a grama sobre o tú mulo já começa a crescer? É apó s certo
tempo, que aquele que ficou precisa de um amigo presente que o conforte.
Lembra-se de Jesus no tú mulo de Lá zaro? Ali o Mestre foi
"parakleo" para Maria e Marta, irmã s do morto. Ele chorou, apoiou, comoveu-se e mostrou
sua disponibilidade.
Nã o sei se houve algum outro momento em minha vida em que chorei mais do que nessa
fase turbulenta pela qual passei.
Entretanto, o essencial foi descobrir os muitos "parakleos" que o Senhor providenciou para
mim e para minha esposa.
Sim, agora mais do que nunca, reconheço que um dos propó sitos do sofrimento é
experimentar o conforto de Deus e assim nos tornarmos aptos para ministrar graça aos que
sofrem.

C APÍTUL O
2
QUANDO PARECE
que
DEUS É SÁDICO!
Quando oramos e somos ouvidos por Deus, a resposta pode vir de três formas diferentes:
sim, nã o, ou espere!
Gostamos bastante quando o Senhor, imediatamente, responde sim. Em geral ficamos
muito aborrecidos ao receber um nã o. E durante o tempo que Deus determina que
esperemos, ficamos ansiosos, impacientes e duvidamos da bondade divina.
Neste capítulo, abordarei especificamente o nã o que o Senhor nos responde, especialmente
nas horas de nossas dores e afliçõ es.
Muitas vezes, Deus nã o cura nossa doença, nã o restaura nosso casamento, nã o nos dá o
emprego que precisamos desesperadamente. Quando aguardamos um sim do Senhor,
certos, confiantes que a resposta será positiva, e recebemos um nã o, a desconfiança e a
incredulidade tratam de achar um espaço em nossas mentes e em nossos coraçõ es.
Há ocasiõ es em que desejamos algo ardentemente, mais do que qualquer outra coisa, e é
exatamente isso que nã o recebe-
24 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
mos. Nã o estamos sendo exigentes, arrogantes, mas obedientes a uma ordem expressa do
Senhor: E o meu Deus segundo sua riqueza em glória, há de suprir em Cristo Jesus, cada uma
de vossas necessidades (Fp4.19).
Tudo o que desejamos é uma porta aberta ou um dia a mais, uma resposta de oraçã o pela
qual saberemos ser imensamente gratos. Oramos e esperamos. Nã o recebemos resposta
alguma!
. Gostaria de fazer-lhe uma pergunta. Eu mesmo já me indaguei sobre isto algumas vezes. E
se Deus disser "nã o"? Qual será sua reaçã o? Se o Senhor responder: "Eu tenho lhe dado
minha graça, isso basta!" Esse tipo de afirmaçã o deixaria você feliz, satisfeito? Sob a
perspectiva divina, a graça que Ele lhe oferece é mais que suficiente. Se Deus nã o fizesse
nada além de salvar sua alma do inferno, nã o seria o bastante? Se fosse assim, alguém
poderia reclamar dEle? Ele seria injusto se, apó s resgatar sua alma, o mantivesse num leito,
enfermo, até o final de seus dias?
Você ora incessantemente pelo equilíbrio financeiro de sua organizaçã o evangélica; você
clama pela salvaçã o do espírito e do corpo de seu filho que é refém das drogas; você pede
que o Senhor cure sua esposa querida de um câ ncer. E se a resposta vinda do céu, repito,
fosse: a minha graça te basta, como você se·
sentiria?
Talvez o exemplo mais reconhecido e lembrado desse conc�ito esteja na experiência de
nosso irmã o Jó . Ele era o homem mais rico de sua época; repentinamente viu-se despojado
de seus bens, perdeu seus filhos e sua saú de. Sua pró pria esposa o aconselhou,
desanimada:Ainda conservas tua integridade? Amaldiçoa a Dew e morre Qó 2.9). Mas em
todo relato bíblico, as palavras de Jó
QUANDO PARECE QUE DEUS É SÁ DICO -------
25
refletem sua profunda maturidade espiritual e o conhecimento e intimidade que ele tinha
com Deus, mesmo em meio a tã o terríveis perdas.
Quero lembrar-lhe que o Senhor nã o providenciou apenas nossa salvaçã o. O simples fato de
você estar lendo estas palavras demonstra que Ele lhe deu fô lego para prosseguir sua vida,
um coraçã o que palpita em seu peito e olhos que vêem o mundo ao seu redor. Sendo assim,
concluímos facilmente que Ele nos dá graça sobre graça.
Judith, minha esposa, e eu vivemos momentos dramá ticos ( em 97) quando, por muito
pouco, nã o perdemos nossa filha Má rcia, que adoeceu de repente. Quando descobri que ela
nã o corria mais perigo de vida, louvei ao Senhor verbalizando minha gratidã o pela Sua
misericó rdia, amor, bondade e profundamente agradecido por Ele ter salvo minha filha.
Mas, e se ela tivesse morrido? Será que eu ainda consideraria Deus tã o maravilhoso e alvo
de tanto louvor?
Deus continua sendo bom, mesmo quando diz "nã o". J ó nã o precisou pensar duas vezes
para afirmar isto com muita convicçã o.
Uma de minhas grandes irritaçõ es em meu ministério nestes ú ltimos anos é a constante e
repetitiva mensagem de pregadores adeptos do evangelho da prosperidade. Eles alegam
que o propó sito do Senhor é que sejamos ricos, saudá veis, felizes e que isto nã o é uma
prerrogativa, mas um direito. Ainda espero ouvir dessas pessoas uma mensagem sobre a
experiência do grande apó stolo: E para que não me ensoberbecesse com a grandeza das
revelações, foi-me posto um espinho na carne, mensageiro de Satanás, para me esbefeteai; a
fim de que não me exalte. Por causa disto três vezes pedi ao
26 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
Senhor que o afastasse de mim. Então Ele rne disse: A minha graça te basta, porque o poder
se apeifeiçoa na fraqueza. De boa vontade, pois, niaís nie gloriarei nas fraquezas, para que
sobre mim repouse o poder de Cristo. Pelo que sinto prazer nasfraq11ezas, nas injúrias, nas
necessidades, nas perseguições, nas anglÍstias por amor de Cristo. Porque quando sou fraco,
então é que sou forte (2 Co 12. 7-10).
Paulo sabia muito bem o que era ouvir um "nã o" de Deus.
Em sua lista de oraçã o havia um item prioritá rio, destacado como
"espinho na carne". Ele já pedira ao Senhor que o removesse.
Nã o estamos certos quanto a quê Paulo se referia quando citava um "espinho na carne".
Talvez ele nã o se sentisse à vontade para declarar isto publicamente, para expor sua
dificuldade ou tentaçã o no papel.
Em algum trecho, no caminho da vida, somos feridos por um espinho que pode vir na figura
de alguém que nos trai e machuca ou através de uma doença de difícil cura e muito
dolorosa. Finalmente, exaustos e perdidos, pedimos que Deus venha em nosso socorro e
nos liberte do problema que nos faz sofrer.
Este foi o caso de Paulo. As Escrituras nos contam que por três vezes ele implorou a Deus
que removesse o espinho. Sua reivindicaçã o era muito clara, objetiva, e Deus sempre
respondeu da mesma forma: ''A minha graça te basta."
Eu tenho algumas suposiçõ es a respeito desse "espinho na carne" contra o qual Paulo
lutava. Ninguém sabe ao certo do que se tratava, mas permita-me colocar algumas
possibilidades.
• fraqueza física - Há algumas indicaçõ es de que Paulo sofria de alguma doença em seu
corpo. Talvez sua visã o estivesse
QUANDO PARECE QUE DEUS É SÁ DICO ------ 27
prejudicada, comprometida. Em Gá latas 6.11, temos uma dica: Vede com que letras grandes
vos escrevi de meu próprio punho. É possível que o acontecimento na estrada de Damasco,
de quando ficou temporariamente cego, nunca tenha sido superado. Deus chamou sua
atençã o por meio de uma luz fortíssima, muito brilhante, causando ao entã o Saulo cegueira
durante três dias. Mais uma indicaçã o dessa fraqueza encontra-se em Gá latas 4.15: Que é
feito, pois, da vossa exultação? Pois vos dou testemunho de que, se possível fora, teríeis
arrancado vossos próprios olhos para mos da1: Lembremos que Paulo era um artesã o de
tendas, viajava e escrevia muito. Certa�ente, ele dependia de uma boa visã o para executar
tais atividades. Quem sabe a visã o prejudicada fazia com que ele forçasse sua vista, o que
lhe causava fortes dores de cabeça e longas noites de insô nia, as quais ele passava orando
pedindo alívio.
• tentação sexual-Em Romanos 7. 18,19, lemos: Porque eu sei que em niírn, isto é, na ,ninha
carne, não habita bem nenhum: pois o querer o bem está eni mim; não, porém, o efetuá-lo.
Porque não faço o bem que pref,.ro, mas o mal que não quero, esse faço. Neste trecho
entendemos que Paulo travou uma batalha feroz contra a carne.
Será que poderia ser uma tentaçã o sexual? Paulo era sangue, ossos e carne como qualquer
um de nó s. Era solteiro ou viú vo, e neste relato ele pede a Deus uma libertaçã o definitiva
dessa tendência de navegar em á guas proibidas.
• temperamento - Alguns sugerem que o "espinho na carne", que Paulo menciona, era
exatamente seu temperamento
28 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
agressivo, impulsivo, ríspido, intransigente. Antes de ser transformado pela maravilho_sa
graça divina, ele, literalmente, caçava e matava impiedosamente os cristã os. Depois de
convertido, Paulo ainda teve seus momentos de có lera, de ira. Por exemplo, ele confrontou
asperamente o apó stolo Pedro por conta da hipocrisia que este demonstrava (Gl 2.11).
Segundo seu pensamento, a pessoa está do lado de Deus ou do lado de Sataná s. Nã o há
meio termo. Em sua posiçã o radical, se houvesse um titubeio nesse sentido, ele estava ali
para ser o primeiro a questionar, repreender e exigir um reposicionamento. Em 1 Timó teo
1.20, ele revela ter entregue a Sataná s, para serem castigados, dois homens que
naufragaram na fé.
Já houve quem sugerisse que Paulo nunca se casou por ser
"chato" demais a ponto de nenhuma mulher conseguir viver ao seu lado.
• inabilidade para falar- Geralmente imaginamos Paulo como um comunicador eficiente e
dinâ mico. Existem porém, indícios de que ele tinha problemas ao falar; alguns acham, até,
que ele gagueja�a. Em 2 Coríntios 10.10 tomamos conhecimento de uma acusaçã o que lhe
fizeram: As cartas, com efeito, dizem, são graves e fortes; ,nas a presença pessoal dele é fraca
e a palavra desprezível.
Parece que o próprio Paulo concordou com tal avaliação, pois em 1 Coríntios 2.4 ele afirma: A
minha palavra e a minha pregação não consistiram ern linguagem persuasiva de sabedoria,
mas em demonstração de espírito e poder
Agora pergunto: Paulo teria sido um melhor apó stolo se o seu espinho na carne (fosse qual
fosse) tivesse sido removido?
QUANDO PARECE QUE DEUS É SÁ DICO ------- 29
Sob o ponto de vista humano, a resposta é sim, tanto que ele orou pedindo um fim para o
seu sofrimento. Entretanto, analisemos um pouco mais a situaçã o. Talvez, se Deus tivesse
retirado aquela dificuldade que tanto o atrapalhava, ele nã o_ tivesse a experiência de
conhecer tã o profundamente a graça de Deus e como depender dela.
Dizem que só os que têm fome valorizam um banquete.
Paulo estava faminto! Ele, como principal dos pecadores, soube o que é a graça de Deus e
nã o houve na histó ria humana outro que fosse mais autorizado a ensinar e pregar sobre
ela.
Em 2 Coríntios 11.23-28, ele reivindica para si credenciais que lhe forneciam autoridade
para ser um embaixador de Jesus Cristo. Se Paulo nã o tivesse enfrentado tanta tribulaçã o,
talvez nunca compreendesse claramente o amor de Deus em toda a sua dimensã o. O
apó stolo tinha motivos autênticos, isto porque o que o constrangia a ser servo do Senhor
era o amor de Cristo (2
Co 5.14).
Se Deus fizesse de Paulo um homem passivo, cordato, agradá vel, quem teria confrontado os
legalistas, os hedonistas e os críticos do evangelho? Ele questionou ousadamente os crentes
da Galá cia porque nã o suportava a distorçã o da fé por uma série de leis. Sua honestidade ao
escrever as epístolas talvez nã o lhe tenha garantido novos amigos, mas sem dú vida, muitos
discípulos.
Também, se Deus tivesse removido a tentaçã o de sua vida, ele nã o teria aprendido a
depender do poder dEle. Por isso disse: Porque o poder se apeifeiçoa na fraqueza. De boa
vontade, pois, niais me
,gloriarei nas fraquezas para que sobre mim repouse o poder de Cristo. O
30 ----- ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
apó stolo aprendeu que, quando estava fraco, o poder de Deus sobressaía. Ele estava
disposto a ser fraco em troca de deixar transparecer, e assim enaltecer o poder e a graça do
Senhor.
Quando o espinho rasgou a carne de Paulo penetrando em sua alma, ele nã o se deixou
vencer pela autocomiseraçã o, pela amargura, murmurando pelo restante de seus dias. Ele
aprendeu como viver com a sua fraqueza; descobriu como ter contentamento, até alegria
diante de injú rias, necessidades, perseguiçõ es e angú stias. Foi na fraqueza que ele
descobriu seu poder interior.
Que perspectiva inacreditá vel e correta a respeito da bondade de Deus, mesmo que Sua
resposta tenha sido nã o.
O que acontece conosco quando nos deparamos com uma tragédia? Pedimos alívio, mas a
resposta é A minha graça te basta.
Será que isso nã o provoca em nosso coraçã o amargura contra Deus e uma tendência de
culpar a tudo e a todos pelo nosso sofrimento, causando uma paralisaçã o total em nossa
vida? Quando nossa dor é o foco do nosso dia-a-dia, ficamos paralisados.
Recentemente ouvi a histó ria de um homem que recebeu dos médicos o diagnó stico de
câ ncer de rim, já em seus ú ltimos está gios. Isso aconteceu no mês de setembro e os médicos
foram categó ricos ao prognosticar que ele nã o passaria o pró ximo Natal entre seus entes
queridos. Ao contrá rio de resignar-se, ele procurou aproveitar ao má ximo tudo o que a vida
podia lhe proporcionar no pouco tempo que lhe restava.
Os meses passaram e mostraram que os médicos cometeram um engano. Seu cá lculo estava
totalmente errado e, no Natal, ele, seus familiares e amigos participaram da mais linda e
animada festa que alguém poderia ter. Na Pá scoa a festa foi tã o
QUANDO PARECE QUE DEUS É SÁ DICO ------- 31
esplendorosa quanto a do Natal, dessa vez louvando ao Senhor por Sua ressurreiçã o.
Nos meses seguintes ele passeou, foi a piqueniques, acampou e nadou. Quando ele faleceu,
quase um ano depois, um amigo contou que, dias antes, ele consultara o dentista para
tratar seus dentes.
Este tipo de garra, de espírito determinado, me desafia! Essa atitude traduz as palavras de
Paulo em 2 Coríntios 12.106: Porque quando 5011 fraco, então é que 5011 forte".
Quando você é surpreendido por uma tragédia, doença ou dificuldade nã o busque mais dias
em sua vida, mas mais vida em seus dias!
Vem agora à minha mente uma frase que ouvi (infelizmente nã o sei quem a proferiu):
"Deus é bondoso demais para ter ímpetos de crueldade, sá bio demais para errar e profundo
demais para se explicar".
O soberano Deus tem todo direito de responder "nã o". Nó s só temos que reconhecer isso e
dizer: Obrigado, Senhor!

C APÍTUL O
3
POR QUE DEUS
nos
FAZ ESPERAR?
Esperar, esperar, esperar... Este, talvez, seja o exercício mais difícil da vida cristã , em
especial quando enfrentamos adversidades.
Uma amiga, grá vida de quatro meses, aguardava ansiosa pelo nascimento do bebê. Dois
anos antes, seu filho de apenas seis anos de idade falecera de uma doença intestinal
desconhecida.
Por isso, essa nova gestaçã o era tã o especial. Havia, porém, um temor reprimido pela saú de
da criança.
A espera faz parte da vida. Alguns esperam por um casamento que traga amor e realizaçã o.
Outros esperam que seu futuro financeiro e profissional se resolva através da carreira.
Espera-se pela casa pró pria, pelo ingresso na faculdade, pela mudança de comportamento
de pessoas, pela atuaçã o mais eficaz de governantes, por justiça que resolva mais rá pida e
honestamente as pendências, pela alteraçã o de circunstâ ncias que alterem o rumo de uma
situaçã o desagradá vel, por uma palavra (resposta) de Deus que dê sentido à provaçã o que
se enfrenta, etc.
34 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
No auge da afliçã o, quando nã o recebemos qualquer resposta divina, sentimos como se
tivesse algo errado conosco.
Acabamos pressupondo que, se tudo estivesse certo, os desejos do nosso coraçã o seriam
satisfeitos. Relaciona-se espera com incapacidade, .. de trabalhar os problemas e fraquezas
que, segundo o sentimento humano e equivocado, forçam o Senhor a nos abandonar. No
momento de maior angú stia, quando somos forçados à esperar, precisamos de
perspectivas. Entã o, nosso ú nico recurso é correr à Palavra, pois ela contém a perspectiva
correta. As Escrituras estabelecem relaçã o entre espera, esperança e graça.
Abraã o esperou para ser o Pai das Naçõ es. Noé, primeiramente, esperou cair chuva do céu e
depois esperou que ela cessasse. Moisés esperou 40 anos pà ra deixar de pastorear ovelhas
e assumir a condiçã o de comandante do povo israelita. Jacó trabalhou 14 anos, esperando
durante todo esse tempo para casar com sua amada Raquel.
Um dos melhores exemplos encontrados na Palavra de que devemos ter perspectiva na espera
está no livro de João, capítulo 11: Estava enfermo Lázaro, de Betânia, da aldeia de Maria e
Marta, sua irmã. Esta Maria, wjo irmão Lázaro estava enfermo, era a mesma que ungiu com
bálsam.o o Senhor e lhe enxugou os pés com os seus cabelos.
Mandaram, pois, as irmãs de Lázaro, dizer a jesus: Senhor, está erifermo aquele a quem amas
Go 11.1-3).
O lar de Marta e Maria era muito hospitaleiro. Ali, Jesus sempre se hospedava quando
estava na regiã o. Já foi dito por alguns que Lá zaro era um homem rico e que ajudava no
sustento do ministério de Cristo.
PORQUE DEUS NOS FAZ ESPERAR? --------
35
Marta e Maria tinham muita fé no Mestre e criam em Seu ministério. Isso fica patente
quando elas mandam chamá -Lo para vir em socorro do irmã o.
Lázaro adoecera gravemente. Talvez elas achassem que sendo ele um amigo querido de Jesus,
este viria correndo para curá-lo: Ao receber a notícia, disse Jesus: Esta enfermidade não é
para a morte, e, sim, para a glória de Deus, a fim de que o Filho de Deus seja por ela
glorificado. Ora, amava jesus a Marta, e a sua irmã e a Lázaro. Quando, pois, soube que
Lázaro estava doente, ainda se demorou dois dias no lugar onde estava Go 11.4-6).
A Bíblia, entretanto, como acabamos de ler, conta que mesmo sabendo dos fatos, Jesus
permaneceu ainda dois dias onde estava. Do ponto de vista de qualquer pessoa, isto é um
contra-senso, pois equacionamos nossas afliçõ es do seguinte modo: se estou sofrendo,
Deus precisa correr em meu socorro. Para nó s, a espera nã o traz nenhuma expectativa. E é
aí que nos enganamos.
Por que Jesus nã o tomou uma atitude imediata a favor de Lá zaro, já que amava tanto a
família? É muito complicado para o ser humano entender que, a partir do momento que
pedimos auxílio, Ele já inicia uma obra, que sempre é mais abrangente do que imaginamos
e que, apesar de nos forçar a uma espera, redunda em bem para o nosso espírito,
testemunho, edificaçã o para muitos e gló ria para Deus.
Quando minha filha Má rcia ficou doente nos Estados Unidos e eu recebi um telefonema
aqui no Brasil avisando-me que ela estava entre a vida e a morte, tentei chegar até ela o
mais depressa possível. Nã o aguardei dois dias para tentar viajar, tomei
36 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
providências imediatas, mas só consegui vô o para o dia seguinte à noite. Para mim, a
espera de 24 horas pareceu eterna.
Imagino que Marta e Maria tenham passado momentos de desespero esperando pela
chegada do Mestre. Visualizo uma delas cuidando do irmã o, sofrendo pela sua enfermidade
fatal, enquanto a outra corria até os portõ es de entrada da cidade para ver se Jesus vinha
pelo caminho. Depois, ambas se revezavam. Enquanto isso, Lá zaro piorava mais e mais.
Mas Jesus nã o apareceu! Por quê? Será que a mensagem nã o chegou até Ele? Quantas vezes
Ele se hospedou na casa da família e recebeu carinho, atençã o e cuidado dos três irmã os!?
Por que agora, numa hora tã o crucial, Jesus nã o aparecia, nã o vinha socorrer os amigos que
lhe eram tã o fiéis?
Certamente você já experimentou a frustraçã o de esperar por algo ou alguém. Você já deve
ter perguntado ao Senhor: "Por que, Deus? Por que essa espera? Será que o Senhor me
abandonou? É por causa de algum pecado que cometi ou o Senhor é insensível?"
A dú vida surge em nossa mente e coraçã o. Nesse momento, é importante termos sabedoria
diante da adversidade que se apresenta. Foi exatamente isso que Tiago pretendeu ensinar
quando escreveu sobre as provaçõ es que enfrentaríamos e a sabedoria que precisaríamos
ter para passar por elas com a perspectiva correta (Tg 1.2-5).
Lá zaro morreu. Talvez numa manhã , uma das irmã s ao entrar em seu quarto encontrou-o
morto em sua cama. Sem dú vida, nessa hora, essas mulheres sentiram um vazio de dor,
desapontamento e desilusã o. As esperanças terminavam ali. Tudo es-
PORQUE DEUS NOS FAZ ESPERAR? -------- 37
tava acabado. Ele tinha morrido! Envolvidas num redemoinho de pensamentos tristes,
havia um em particular que a cada instante retornava à s suas mentes: Por que Jesus nã o
veio?
Como um Deus de bondade pode ficar de braços cruzados diante de uma criança estuprada,
de uma mulher espancada, de uma mã e ou pai que teve um de seus filhos assassinados?
Estas perguntas sã o feitas nã o só por cristã os convictos, mas também por incrédulos.
Contudo, no decorrer da narrativa de João capítulo 11, percebemos que Jesus estava
completamente comprometido com o problema de Lázaro e sabia precisamente tudo o que
deveria fazer e o que estava por acontecer: Isto dizia, e depois lhes acrescentou: Nosso amigo
Lázaro adormeceu, mas vou para despertá-lo. Dísseramlhe, pois, os discípulos: Senha,; se
dorme, estará salvo.Jesus, porém,falara com respeito à morte de Lázaro; mas eles supunham
que tivesse falado do repouso do sono Go 11.11-15).
A Bíblia afirma que Jesus alegrou-se com a morte de Lá zaro.
Como um homem pode ficar contente com a morte de um amigo e com a dor que a família
está atravessando? Tal pergunta reflete, novamente, como nã o conseguimos perceber o
objetivo divino de alcançar um alvo mais elevado, mesmo que por um breve tempo, assim
como Maria, Marta e Lá zaro, tenhamos que sofrer e esperar.
Jesus, vendo-a chorai; e bem assim os judeus que a acompanhavam, agitouse no espírito e
comoveu-se. E perguntou: Onde o sepultastes? Eles lhes responderam: Senhor, vem, e vê.Jesus
chorou CToão 11.33-36).
Nã o resta dú vida a respeito do amor que Jesus sentia pela família de Lá zaro, tanto que Ele
chorou diante do tú mulo do amigo mo_rto.
38 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
Querido(a) leitor(a), tenha absoluta certeza do amor de Deus e de Seu interesse e empenho
em ajudá -lo quando você estiver em dificuldades, passando por provaçõ es. Há duas
realidades que nã o podemos esquecer na tribulaçã o: 1. Deus é sensível ao que sentimos.
Porqm não temos sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas, antes
foi Ele tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sern pecado (Hb 4.15).
2. Seja qual for o processo que Deus tenha que executar para alcançar seus alvos mais
profundos e elevados, o resultado também será em nosso benefício.
Mas afinal de contas, quais eram esses alvos tã o elevados que Jesus queria atingir e que
para isso expô s seus amigos a uma dor tã o cruel?
Em Joã o 11.4, encontramos o primeiro: para a glória de Deus.
O segundo em Joã o 11. 41 e 42: para qm creiam que Tit me enviaste.
A oportunidade de glorificar a Deus e comunicar a pessoas incrédulas Sua divindade era o
objetivo de Cristo, estabelecido num plano mais amplo e amoroso, além da compreensã o
dos homens, limitado pela dor e dificuldade.
Karis, uma garota de 15 anos, filha de nossos amigos, David e Débora Kornfield, é portadora
de uma séria enfermidade intestinal, que nã o pô de ser resolvida, mesmo apó s oito
cirurgias. Em sua ú ltima internaçã o hospitalar, ela disse à sua mã e:
-T,lvez eu tenha que ir novamente ao hospital para testemunhar ao médico sobre a graça de
Deus.
Karis possui uma visã o correta de seu problema e demonstra uma maturidade acima de sua
idade ao encarar assim sua dificuldade.
PORQUE DEUS NOS FAZ ESPERAR? --------
39
Lá zaro já morrera e fora sepultado há quatro dias. Isto ocorreu, segundo plano de Deus,
para que toda atençã o ficasse voltada para Ele e Seu Filho, Jesus.
Conforme determinaçã o divina do Pai, Cristo foi crucificado e declarou-Se parte de um
plano que precisava ser cumprido, mesmo que isto exigisse Sua pró pria morte.
Nada recebe mais atençã o de incrédulos do que um verdadeiro cristã o sofrendo, mas tendo
uma atitude equilibrada e correta, ciente de que é parte de um plano perfeito de Deus. É
muito fü cil testemunhar de Cristo numa fase de sucesso e realizaçã o; mas causa bem mais
impacto quando as palavras e açõ es dos filhos de Deus sã o ditas e realizadas durante uma
forte provaçã o.
Caminhando Jes11s, viu urn homem cego de nascença. E os seus discípulos pe1g11ntaram:
Mestre, quem peco11, este 011 seus pais, para que nascesse cego? Respondeu Jes11s: Nem ele
peco11, nem seus pais; mas foi para que se manifestem nele as obras de De11s CT o 9 .1-3).
Aparentemente, é uma crueldade Deus permitir que uma criança nasça cega para que Sua
gló ria seja manifesta. No entanto, nã o esqueçamos que o Senhor permitiu a morte de Seu
ú nico Filho para que recebêssemos a vida eterna, Ainda quero abordar mais um aspecto.
Sofrimento é a maneira pela qual Deus traz honra e gló ria para Seus filhos: Porque a nossa
leve e momentânea tribulação produz para nós eterno peso de glória, acima de toda
comparação, não atentando nós nas coisas que se vêem, mas nas que se não vêem; porque as
que se vêem são temporais, e as que se não vêm são eternas (2 Co 4. 17,18).
Nesta passagem bíblica, ao que parece, cada cristã o tem uma conta eterna, onde "gló ria"
pode ser depositada e aplicada na equi-
40 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
valência de nosso sofrimento terreno. Deus permite que participemos de um sistema no
qual o temporal pode ser transformado em lucro eterno.
Então ordenou jesus: Tirai a pedra. Disse-lhe Marta, irmã do morto: Senhor, já cheira mal,
porque já é de quatro dias. Respondeu-lhe Jesus: Não te disse eu que se creres verás a glória de
Deus?
Se a pedra do tú mulo nã o fosse removida, todo sofrimento daquelas três pessoas seria em
vã o. Eles nã o teriam visto a gló ria de Deus e a multidã o nã o testemunharia o poder de Jesus
através daquele milagre.
Se glorificamos a Deus pela morte injusta de Seu Filho ( que nos trouxe salvaçã o eterna),
será que nã o podemos confiar que Ele fará o mesmo com nossas lutas e provaçõ es diá rias?
Se Deus consegue obter gló ria na morte de um amigo de Seu querido Filho, será que nã o
podemos confiar que Ele fará o mesmo através das pequenas e grandes tragédias de nossas
vidas? O Senhor é especializado em transformar mal em bem. De fato, a tragédia insere o
maior potencial para o triunfo.
Cristo mandou removerem a pedra do tú mulo. Quais sã o as pedras que bloqueiam a
atuaçã o de Deus a fim de que Ele receba gló ria nas afliçõ es, dores e dificuldades de sua
vida? Quando as circunstâ ncias nã o fazem sentido, você já cogitou em abandonar suá fé?
Você se recusa a tentar enxergar além da sua perda? A dor o paralisou de tal modo que
você esqueceu que ela contém uma liçã o preciosa que o Senhor quer lhe ensinar?
Você pode confiar que Deus glorificará a Si mesmo quando, durante uma adversidade,
permitirmos que Ele o faça. Na dificuldade você tem duas opçõ es: confiar que Deus
receberá gló -
PORQUE DEUS NOS FAZ ESPERAR? --------
41
ria, ou fixar sua atençã o e forças na perda tornando-se uma pessoa derrotada e
amargurada. É você quem deve fazer a escolha, mas lembre-se: o Senhor sente
profundamente sua dor e, seja qual for o problema que você enfrentar, Ele sempre estará
ao Seu lado e transformará sua perda em benefício. Confie nEle!

C APÍTUL O
4
DEUS É RESPONSÁVEL
por
ME FAZER FELIZ?
Em algumas ocasiõ es, no decorrer de minha vida cristã , consciente ou inconscientemente,
julguei que Deus era o responsá vel em promover minha felicidade. Esperava que meu
relacionamento com Ele assegurasse apenas sentimentos prazerosos.
Ao enfrentar dificuldades e provaçõ es, ficava frustrado ... com Ele.
Parece-me que nó s, cristã os, queremos uma garantia de alegria, satisfaçã o e felicidade
permanentes, sem a menor sombra de problemas ou provaçõ es.
Por exemplo, hoje é terça-feira, preciso preparar este capítulo para meu novo livro,
responder a mais de uma dezena de cartas e montar oito programas de rá dio, os quais devo
gravar na pró xima quinta-feira. Além disso, ministrarei cinco palestras num congresso em
Portugal, que ainda preciso preparar. Se o dia terminar e eu nã o conseguir cumprir essas
tarefas, ficarei um tanto frustrado. Devo admitir que gosto de dias bem organizados,
previsíveis, sem alteraçõ es ou interrupçõ es que atrapalhem meu planejamento. Na
verdade, o que eu gostaria é de
44 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
uma vida livre de stress, com os alvos de realizaçõ es alcançados e poucos problemas. Mas
também sei que, infelizmente, isso nã o é possível.
No mundo evangélico atual muitos pregam que Jesus é a ú nica resposta para nossa
felicidade. Ouvimos que Deus suprirá todas nossas necessidades, curará todas nossas
enfermidades e nos dará riqueza e realizaçã o total em todas as á reas. Você "ingere uma
aspirina divina" e anestesia os mal-entendidos e impossibilidades do dia-a-dia. É claro que
esta pregaçã o é mentirosa!
Durante o período de grande provaçã o que minha esposa e eu atravessamos há pouco
tempo, muitas pessoas se aproximavam de nó s e perguntavam como está vamos. Se eu
respondesse que estava tudo bem, estaria mentindo. Se dissesse: "Mais ou menos" - elas
fariam vá rias indagaçõ es, insistindo em saber mais detalhes, com a intençã o de tentar nos
ajudar. Se, ainda, eu resolvesse dizer: "Estou mal!" -num misto de surpresa e
desapontamento, elas retrucariam: "Mas pastor, o senhor, um homem de Deus, diretor do
Ministério Lar Cristã o, está mal?" Entã o, sempre que alguém perguntava como está vamos,
eu tentava ser honesto sobre a situaçã o difícil, mas sempre enfatizando que Deus estava
trabalhando a nosso favor.
Parte da razã o do triunfalismo apregoado hoje em dia, dessa visã o irreal de vida cristã , é
porque tudo é encarado como sendo um mar de rosas. Interpretamos versículos bíblicos -
como o de Mateus 6.33: "Buscai, pois, eni primeiro lugar, o seu reino e a s11a
, justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas" - como um cheque em branco - tudo
será acrescentado, o que quisermos, o que desejarmos.
DEUS É RESPONSÁ VEL POR ME FAZER FELIZ? ----- 45
Outra "garantia" de felicidade é "sugerida" em Joã o 10.10: O ladrão vem somente para
roubar, matar, e destruir; eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância. Vida
abundante, conforme a Palavra de Deus ensina, nã o é um mar de rosas. Muitas vezes
buscamos pela bênçã o divina e nã o pelo doador da bênçã o.
Quando meu amigo Ary Velloso sofreu seu primeiro ataque cardíaco, em 1977, muitos
ficaram chocados questionando como um servo de Deus era sujeito a passar por aquele ou
por qualquer outro problema. Agora, passados 21 anos, ele está em Miami, Fló rida, recém-
operado, tentando recuperar-se de um transplante de coraçã o.
Como minha querida amiga de longos anos, Virgínia Moreira, esposa do pastor Paulo
Moreira, missioná rios na Á ustria, enfrenta o choque de ser submetida a uma seriíssima
cirurgia onde foi descoberto um câ ncer?
Confesso que nos duros momentos de crise pelos quais passamos, também perguntei a
Deus:
- Senhor, eu que estou dando minha vida para cuidar das famílias brasileiras, nã o posso ter
a segurança de que o Senhor cuidará da minha? De onde nó s, cristã os, tiramos essa idéia de
que os servos de Deus têm uma proteçã o especial, estã o livres ,das complicaçõ es do
cotidiano, têm um passe de imunidade cristã divino que impede a mais remota
aproximaçã o de dificuldades? Se cremos nessa isençã o, como interpretamos 1 Pedro 4.12,
13: Amados, não estranheis o fogo ardente q11e surge no meio de vós, destinado a provar-vos,
como se alguma coisa extraordinária vos estivesse acontecendo; pelo contrário, alegraivos na
medida em que sois co-participantes dos sefrimentos de Cristo, para que também na
revelação de Sua glória vos alegreis exultando.
46 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
Quem ensina, atualmente, que devemos ser co-participantes dos sofrimentos de Cristo?
Leia Filipenses 3.10 e Hebreus 12.1 O para confirmar o fato de que somos destacados por
Deus para sofrer.
Até quando, Senha,; clamarei e11, e tu não me escutarás? Gritar-te-ei: Violência! e não
salvarás? Por que me mostras a íniqiiídade, e me fazes ver a opressão? Pois a destruição e a
violência estão diante de mim: há contendas e o litígio se suscita. Por esta causa a lei se
efro11xa, e a jHStiça nunca se manifesta; porque o perverso cerca o j11sto, a justiça é torcida
( Hc 1.2-4).
Imagino-me, também, em pé num parlamento ou mesmo num pú lpito, ou como Habacuque,
em cima de um muro gritando: - "Por que, Senhor?" ou - ''Até quando?" Mas quando me
detenho para pensar um pouco mais sobre este trecho, noto que a indignaçã o do profeta
nã o era causada pelo seu sofrimento pessoal, mas sua angú stia se exacerbava porque a
reputaçã o de Deus era posta à prova, e isso prejudicava as causas do Reino. As suas
pró prias causas nã o eram tã o significativas diante disso.
Devemos promover um sério auto-exame e descobrir quantas vezes nossa verdadeira
motivaçã o é a preocupaçã o com a causa de Deus; se nossa tristeza provém, genuinamente,
da injustiça que consome a terra, se nosso interesse é proteger a reputa
çã o do Senhor.
Nossas oraçõ es sã o imaturas e egoístas. Quando devemos orar e chorar para que Deus
trabalhe através dos sofrimentos de nossa vida e os utilize para Sua gló ria, oramos e
choramos para que Ele os afaste de nó s e nos livre de todos eles.
Pouco a pouco aprendemos que o alvo de Deus para nó s nã o é a ausência de tribulaçõ es no
nosso cotidiano, mas a presen-
DEUS É RESPONSÁ VEL POR ME FAZER FELIZ?----- 47
ça e o poder dEle trabalhando dentro e através delas para Sua gló ria e nosso benefício.
Uma vez que reconhecemos a necessidade de pararmos de procurar felicidade em coisas e
fatos e começarmos a buscar o Deus que oferece bênçã os, compreenderemos que a
adversidade e o sofrimento que surgem em nossas vidas nã o acontecem para nos destruir,
mas para nos ajudar a entender os valores eternos e purificar-nos do desgaste da luta pelas
coisas temporais e passageiras.
O Senhor, segundo nossa necessidade e Seu grande amor, acrescentará as bênçã os que
julgar valiosas e benéficas para nosso crescimento como Seus filhos.
Há três perguntas que auxiliam a focalizarmos nossa aten
çã o no que é eterno:
1. Será que estou louvando a Deus pelo Seu poder, majestade e beleza? (Sl 104).
2. Será que convido o Senhor para ser meu guia em cada evento e circunstâ ncia do meu dia-
a-dia? (Sl 145.18).
3. Será que estou cumprindo um dos propó sitos de Deus para minha vida, que é ajudar a
apresentar todo homem perfeito diante dEle? ( Cl 1.28).
Quando o foco de nossa preocupaçã o deixar de ser a busca de uma felicidade imediata e
localizar-se no empenho em conhecer a Deus profundamente, a louvá -Lo, e a nos
tornarmos participantes comprometidos com Seu projeto de transformar pessoas em
filhos, entã o experimentaremos uma verdadeira realizaçã o e conheceremos o que é
usufruir de uma alegria completa.

C APÍTUL O
5
.. ,. ..
QUANDO A DOR
nos
ALCANÇA
J\ dor faz parte da vida. Ela pode manifestar-se através de um
..f1corpo doente ou de um coraçã o despedaçado. De qualquer maneira, cedo ou tarde, ela
surge e invade nosso cotidiano.
Quando a dor irrompe com toda sua força, temos duas escolhas a fazer: 1. Culpar e rejeitar
o Deus que poderia ter evitado o sofrimento.
2. Confiar que aquele ocorrido integra o plano perfeito do Soberano Senhor de nossas
vidas.
Em toda histó ria da humanidade,Jó foi a figura que melhor personificou a escolha da
segunda opçã o, mesmo apó s receber a notícia de quatro tragédias repentinas incluindo a
morte de seus dez filhos. A Bíblia relata: Então,Jó se levantou, e rasgou o seu manto, e rapou
a sua cabeça, e se lançou em terra, e adorou, e disse: Nu sai do ventre de ,ninha mãe e nu
tornarei para lá; o Senhor o deu e o Senhor o tomou; bendito s(ja o nome do Senhor Gó
1.20,21).
50 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
Finalmente, quando Deus permitiu que Sataná s tocasse a saú de de Jó , sua esposa esmerou-
se ao desencorajá -lo, como que dando um empurrã ozinho para que ele se entregasse mais
rapidamente ao desâ nimo, à autopiedade e à amargura contra Deus.
Ainda conservas tua integridade? Anialdiçoa a Deus e morre. Re�pondeulhe ele: Como fala
qualquer doida, assim falas tu. Receberemos o bem de Deus e não receberemos o mal? 0 ó 2. 9,
1 O). Haverá alguém com uma visão mais correta e consistente de Deus do que seu servo Jó?
No Salmo 77, Asafe mostra como a angú stia pode causar efeito negativo no crescimento
pessoal. Através de quatro está gios, ele demonstra como fazer a transiçã o da dor à alegria.
1. SENDO HONESTO COM DEUS
Elevo a Deus a minha voz, e clamo, elevo a Deus a minha voz, para que me atenda. No dia da
minha angústia procuro o Senhor; erguern-se as minhas mãos durante a noite, e não se
cansarn; a minha alma rewsa-se consolar-se. Lembro-me de Deus e passo a gemer; medito, e
me desfalece o espírito. Não me deixas pregar os olhos; tão perturbado estou, que nem posso
falar (Sl 77.1-4).
A ênfase de Asafe nestes primeiros quatro versículos é o desabafo perante o Senhor diante
da situaçã o dolorosa e angustiante que enfrentava. A princípio, esta atitude pode parecer
egoísta. Sendo ou nã o, considero que este é o primeiro passo para a cura. Penso assim pois
a confissã o sincera do que nos perturba e faz sofrer, leva-nos a buscar auxílio além de nó s
mesmos.
Ao preocupar-se com nosso sofrimento, o principal interesse de Deus é moldar-nos para
glorificá -Lo, honrá -Lo e louvá -
QUANDO A DOR NOS ALCANÇA ---------
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Lo. À s vezes, nossa dor escondida é tã o grande e dilacerante que impede a compreensã o de
que o Senhor está atuando em nossas vidas. Nunca é fá cil procurar a Deus no momento da
angú stia.
Nossa natureza, orgulhosa em sua essência, tenta manter sua independência e resiste em
procurar ajuda até, e principalmente, do Senhor Deus que nos criou.
Em 1 Pedro 5.7, o apó stolo encoraja-nos a lançar sobre Deus toda nossa ansiedade, porque
Ele tem cuidado de vós. Apenas quando exaurimos nossas possibilidades de vencer o
sofrimento sozinhos é que aceitamos a sugestã o de Pedro. Por exemplo, tentamos camuflar
nossa dor e "fazemos de conta" que ela nã o existe.
No decorrer de 97 e 98 derramei minha afliçã o, confusã o e medo no altar do Pai Celestial,
dia apó s dia. Aos poucos, pela dura experiência, tenho aprendido de modo muito prá tico
que o Senhor é o nosso refú gio, socorro bem presente nas horas da mais profunda dú vida,
receio e sofrimento. Se procurarmos ignorar ou negar esse período de dificuldade,
posteriormente essa dor contida explodirá de dentro de nó s tal qual uma barragem que, ao
se romper, libera toneladas de á gua, arruinando e devastando tudo e todos que encontra
pela frente.
2. FORMULANDO PERGUNTAS HONESTAS
Rejeita o Senhor para sempre? Acaso não torna a ser propício? Cessou perpetuamente a Sua
graça? Caducou a Sua promessa para todas as gera
ções? Esqueceu-se Deus de ser benigno? Ou, na Sua ira, terá Ele reprimido as Suas
misericórdias? (SI 77.7-9).
52 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
Asafe modifica o enfoque de seu desabafo. Ele já nã o expressa o que vai dentro de sua alma,
mas questiona o Senhor sobre a autenticidade de Suas virtudes. Abalado pelo que, segundo
seu entender, representava uma falha no amor, bondade, interesse e misericó rdia de Deus,
ele argumenta a respeito do pró prio cará ter do Criador.
É importante observar a reaçã o divina. Resta-nos louvar novamente ao Senhor, pois Seu
infinito amor tornou-se patente ao compadecer-se de Asafe. Ele nã o o destruiu ao ouvir
suas dú vidas, mas reconheceu a sinceridade de um coraçã o ferido e necessitado.
Deus nunca fica enraivecido ou impaciente com as perguntas de Suas criaturas (um
costume nosso, de humanos, pecadores e mortais). O Seu pró prio Filho, Jesus Cristo,
morrendo na cruz do Calvá rio, clamou em desespero: Deus meu, Deus meu, por que me
desamparaste? Por que se acham lon�i:çe de meu salvamento as palavras de meu bramido?
(Sl 22.1). A gloriosa ressurreiçã o de Cristo foi a resposta do Pai para toda a angú stia e
sofrimento da cruz.
Também a nó s ocorrem momentos de tremenda escuridã o, quando imploramos ao Senhor
que nos dê uma explicaçã o sobre Seu procedimento. À s vezes, Ele insiste em permanecer
quieto.
Temos que esperar por Sua resposta e isso pode transtornar-nos ainda mais.
O profeta Isaías fala sobre essas horas de escuridã o com muita perfeiçã o: Quem há entre vós
que tema ao Senha,; e ouça a voz do Seu Servo que andou em trevas sem nenhuma luz, e assim
confiou em o nome do Senhor e se firmou sobre o Seu Deus? (Is 50.10). Ele ensina que, depois
de esperar na dificuldade, aprendemos a confiar no nosso Deus, mesmo sem obter
respostas.
QUANDO A DOR NOS ALCANÇA ---------
53
3. REFLETINDO SOBRE O PASSADO
Então disse eu: Isto é a minha aflição: mudou-se a destra do Altíssimo.
Recordo os feitos do Senha,; pois me lembro das tuas maravilhas da antigüidade. Considero
também nas tuas obras todas, e cogito dos teus prodígios (Sl 77.10-12).
Asafe travava uma forte luta interior. Depois de desabafar com Deus sobre a confusã o que
perturbava e causava muito sofrimento ao seu íntimo; depois de praticamente brigar com o
Senhor colocando honestamente suas dú vidas quanto à veracidade do cará ter divino, ele
ficou perplexo com o silêncio que obteve como resposta.
No entanto, de repente, Asafe recuperou-se emocional e racionalmente e começou a
enxergar luz em meio à escuridã o que o atormentava. Estes verbos demonstram que Asafe
conseguiu recobrar-se: recordo, considero, cogito. Racionalmente ele decidiu refletir sobre
a fidelidade, misericó rdia e amor de Deus que já experimentara no passado, mas que eram
distantes e irreais em sua atual provaçã o, ainda mais depois do total silêncio do Senhor.
Asafe revela um espírito de mansidã o e humildade perante um Deus Soberano. Deus honra
uma reaçã o como essa. Isto é confirmado pelas palavras do profeta em Isaías 66.2, quando
o Senhor diz: mas o homem para quem olharei é este: o a.flito e abatido de espírito e que
treme da minha palavra.
À medida que Asafe concentra sua atençã o no poder e fidelidade de Deus através da
Histó ria, ele ganha a perspectiva que necessita na afliçã o.
54 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
Assim também, quando angustiados, a reflexã o na bondade e fidelidade de Deus no passado
representa uma â ncora de fé para enfrentarmos os dias de afliçã o.
4. LOUVANDO A DEUS
O Teu caminho, ó Deus, é de santidade. Que Deus é tão grande como o nosso Deus? Ti, és o
Deus que operas maravilhas, e, entre os povos, tens feito notório o Tett poder. Com o Teu
braço remiste o Teu povo, os filhos de
]acó e de josé. Viram-Te as águas, ó Deus; as águas Te viram e temeram, até os abismos se
abalaram. Grossas nuvens se deiftzeram em, água; houve trovões nos espaços; tanibém as
suas setas cruzaram de uma parte para outra. O ribombar do Teu trovão ecoou na
redondeza; os relâmpagos alumiaram o mundo; a terra se abalou e tremeu. Pelo mar foi o Teu
caminho, as 1itas veredas pelas grandes águas, e não se descobrem os Teus vestígios.
O Teu povo, Ti, o conduziste, como rebanho, pelas mãos de Moisés e de Arão ( Sl 77.13-20).
Depois de ter derramado suas dú vidas e reclamaçõ es diante do Senhor e de ter
compreendido que, mesmo quieto, Deus continuava sendo o mesmo, isto é, bondoso e
operante, fiel e amoroso, Asafe louvou seu Pai amado, pelo que sempre foi, pelo que
continuava sendo; pelo que fizera no passado e pelo que realizava no presente.
Uma das histó rias mais dramá ticas e surpreendentes do poder do louvor é encontrada em
2 Crô nicas 20. O rei Josafá recebeu a terrível notícia que dois exércitos estavam se unindo
para atacar Israel. Ele chamou o povo e, frente à multidã o, reconheceu sua incapacidade de
vencer tal força. Ele confessou: Não
QUANDOADORNOSALCANÇA --------- 55
sabemos nós o que fazer; porém os nossos olhos estão postos em Ti (2 Cr 20.12).
Josafá estava tã o seguro quanto à fidelidade de Deus que designou um grupo de cantores
para marcharem à frente do exército israelita cantando mú sicas de louvor ao Senhor. Sabe
o que eles cantavam? Rendei graças ao Senho1; porque a Sua misericórdia dura para sempre
(2 Cr 20.21). Quando eles começaram a cantar e louvar, Deus colocou emboscadas e os
soldados inimigos voltaramse uns contra os outros e mataram-se mutuamente.
Israel nã o necessitou levantar uma ú nica espada para lutar!
Quando o povo chegou no alto da colina e olhou para o deserto no vale, nã o viu os exércitos
inimigos esperando-os para a batalha. Surpreso, Israel teve, isso sim, uma visã o insó lita.
Nã o havia sequer um sobrevivente em nenhum dos dois exércitos. Todos jaziam mortos
depois de se atacarem numa guerra confusa e fatal.
O louvor é a arma mais poderosa contra forças e inimigos dispostos a nos derrotar. Se, pela
fé, aprendêssemos a louvar a Deus, mesmo sem resposta im�diata, obteríamos muitas
vitó rias em nossa vida pessoal e ministerial.
Desviando nosso olhar do egocentrismo e tomando a decisã o racional de louvar ao Senhor,
Ele nos dará a vitó ria no final e nó s poderemos crescer através do sofrimento. É
exatamente isso que o autor de Hebreus declarou em seu livro, capítulo 11, versículo 1:
Ora, a fé é a certeza de coisas que se esperam, a convicção de fatos que se não vêem.
O que produziu efeito paraAsafe também pode ser proveitoso para nó s. Em meio à nossa
maior dificuldade podemos ser transportados do desespero à adoraçã o, se ...
56 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO;,
• formos honestos a respeito do que sentimos;
• questionarmos o Senhor sobre o que nos perturba interiormente;
• lembrarmos da Sua atuaçã o poderosa e misericordiosa no passado;
• louvarmos ao nosso Deus, mesmo antes de receber qualquer resposta.
Nã o posso afirmar o motivo dos acontecimentos que atingiram minha família. No entanto,
sei que meu Deus, sendo Ele meu Bom Pastor, vai adiante de mim. Confio nisso! E, pelo que
Ele já me concedeu no passado, sei que o futuro trará novas e grandes bênçã os.

C APÍTUL O
6
QUANDO MERECEMOS
ser
DISCIPLINADOS
Você já foi pego por um temporal? Daqueles que, mesmo que a gente esteja com guarda-
chuva, acaba ficando encharcado?
É claro que isso também já aconteceu comigo! Neste momento, porém, estou seco e
observando pela janela do meu apartamento a tempestade que desaba lá fora. Os raios,
como rá pidos chicotes de néon rasgam os céus deixando um rastro de luz extremamente
claro, seguido de trovõ es que ecoam como assustadoras bombas.
Surge em minha mente, de forma inevitá vel, aquela passagem do livro do profeta Naum: O
Senhor tem o seu caminho na tormenta e na tempestade (Na 1.3).
Sabemos que, além do fenô meno físico propriamente dito, Deus também caminha através
das tempestades de nossas vidas.
E, como isso funciona quando se iniciam os redemoinhos compostos por enfermidades,
acidentes, morte? O que acontece em meio à s tempestades das irritaçõ es e frustraçõ es?
Como ficam os temporais que nos sobrevêm decorrentes de nossa pró pria desobediência e
pecado?
58 ----- ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
Davi também tem uma resposta para essas perguntas: O
salmo 115.3 nos diz: No céu está o nosso Deus e tudo faz como lhe agrada.
Ele muitas vezes nos faz atravessar tempestades de disciplina porque nos ama. A vida está
intercalada com essas tempestades. E mesmo quando estamos em meio aos "trovõ es",
devemos nos consolar com o fato de que Deus se utiliza desse método para, de forma mais
eficaz, desenvolver em nó s um cará ter mais digno e firme. As "pesadas gotas" nos
conduzem ao caminho da humildade e nos levam a aceitar o caminho e o papel que Ele
separou para nó s. O objetivo delas é atingir nossos coraçõ es, como podemos ver em
Hebreus 12.5-6: e estais esquecidos da exortação que, como a filhos, discorre convosco: Filho
meu, não menosprezes a correção que vem do Senhor, nem desmaies quando por Ele és
reprovado; porque o Senhor corrige a quem ama, e açoita a todo filho a quem recebe.
Uma das razõ es por que Deus permite adversidade em nossas vidas é que Ele utiliza o
sofrimento para expressar Seu grande amor. Parece incoerente e é realmente difícil o ser
humano entender que um Pai amoroso concorde e até promova a dor na vida daqueles que
ama. Em nossas mentes os conceitos de amor e dor sã o diametralmente opostos. Talvez
essa seja uma das razõ es de muitos pais serem contra a utilizaçã o da vara, visto a
possibilidade de causarem dor em seus filhos. É aparentemente iló gico pais amorosos
baterem em seus filhos queridos.
Entretanto, o pensamento de Deus coloca disciplina e amor caminhando juntos. O amor
necessita prever a possibilidade e probabilidade de vir a sentir dor. Note o que o autor de
Hebreus diz: açoita a todo filho a quem recebe. Para o crente do primeiro sécu-
QUANDO MERECEMOS SER DISCIPLINADOS -----
59
lo, ouvir essa afirmaçã o deve ter sido um choque. O açoite era um instrumento
aterrorizante. Tratava-se de um chicote de couro amarrado a uma madeira, com pedaços de
ferro ou ossos pontiagudos em sua extremidade, que tinham a finalidade de cortar as
costas, o corpo da pessoa açoitada. Esta forma de puniçã o era tã o severa e cruel, que as leis
de Roma a proibiam entre os romanos. Nã o era comum uma pessoa morrer dessa maneira.
O escritor de Hebreus conhecia a tendência humana de nã o encarar Deus com seriedade.
Sendo assim, era preciso alertarnos sobre a necessidade da disciplina. A firmeza da
severidade de Deus deve ser suficiente para nã o tentarmos desobedecê-Lo.
Um dos motivos de cairmos em pecado tã o facilmente é esquecermos do fato de que o
Senhor nos disciplinará por isso.
O total conhecimento de Deus sobre o pecado e suas conseqü ências destrutivas impele-o a
utilizar tais medidas drá sticas.
Até que ponto o Senhor permite que a dor nos acometa?
Há um limite imposto por Ele à adversidade que nos atinge?
Para que Paulo lhe prestasse atençã o, Deus o cegou temporariamente; quase matou Jonas,
que foi engolido por um grande peixe. Acho que até podemos afirmar que Deus fará
qualquer coisa para motivar-nos a obedecê-Lo. Certamente Ele nã o sente satisfaçã o em
submeter-nos ao sofrimento, mas Deus odeia o pecado e está disposto a aplicar-nos a
provaçã o visando livrar-nos do mal, do pecado.
A Palavra de Deus revela em Hebreus 5.8: embora sendo Filho, aprendeu a obediência pelas
coisas que sofreu. Se o Pai nã o poupou Seu pró prio Filho de sofrer, visando Seu
aprendizado, quanto mais nã o o permitirá a nó s, pecadores?
60 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
Ainda em Hebreus, encontramos uma palavra de encorajamento: nem desmaies quando por
Ele és reprovado (Hb 12.Sb).
Quando nos deparamos com a disciplina divina, nossa tendência é desanimarmos e sermos
dominados pela autopiedade e desconfian
ça, ficando até amargurados com o Senhor. Consideramos que Ele é severo demais e
questionamos Sua justiça e bondade.
Constantemente esquecemos que nosso Pai eterno nos trata como filhos e filhas. Ao invés
de esperarmos pela disciplina sempre que cometemos deslizes, ficamos assustados com
ela. Na verdade, tal atitude de Deus nã o passa de uma evidência de que somos seus filhos. É
a garantia de um relacionamento entre pai e filho. É para disciplina que perseverais (Deus
vos trata como a filhos); pois, que filho há a quem o pai não corrige? Mas se estais sem
correção, de que todos se têm tornado participantes, logo sois bastardos, e não filhos (Hb
12.7,8).
Quando olho para trá s, para quando minhas filhas ainda eram pequenas, confesso que
receava que a disciplina com a vara surtisse efeitos negativos em suas personalidades.
Entretanto, nã o houve nenhum trauma ou rejeiçã o para comigo; pelo contrá rio,
aprofundamos muito nossos laços de pai e filhas por causa dessa disciplina exercida com
amor. Além disso, tínhamos os nossos país segundo a carne, que nos corr(e,ia,n, e os
respeitávamos; não havemos de estar em muito maior submissão ao Pai dos espíritos, e então
viveremos?
Pois eles nos corrigiam por pouco tempo, segundo melhor lhes parecia; Dew, porém,, nos
disciplina para aproveitamento, a fim de sermos participantes da Sua santidade (Hb 12.9,10).
Todos nó s já nos deparamos com crianças que nunca foram disciplinadas pelos pais. A
Bíblia as define como entregues a si mes-
QUANDO MERECEMOS SER DISCIPLINADOS -----
61
mas (Pv 29 .15). Além de ser uma vergonha para seus pais, tornam-se indesejá veis e
intratá veis para o convívio. Também é verdade que quando a disciplina é falha, há uma
inclinaçã o mais substancial para o comportamento autodestrutivo. Deus sabe que se nã o
formos disciplinados, o pecado terá acesso liberado à s nossas vidas e nos precipitará num
caminho de ruína. Ele nos ama tanto que nã o ficará de braços cruzados, assistindo nosso
fim, mas interferirá através da disciplina.
Quando eu corrigia minhas filhas, tinha dú vidas se nã o estava sendo severo demais ou até
mesmo injusto. Mesmo assim, diante da possibilidade de um eventual engano, um pai
consciente, responsá vel e amoroso precisa disciplinar seus filhos. O argumento do
versículo 10 do livro de Hebreus é praticamente esse: se nó s, que somos imperfeitos, que
até cometemos erros na tarefa de disciplinar, mesmo assim a aplicamos para o bem de
nossos filhos, quanto mais Deus, que é perfeito, que nã o se engana na correçã o a que nos
sujeita, por que Ele nã o nos disciplinará para evitar pecados futuros?
Tenho certeza de que algumas vezes disciplinei as meninas injustamente. Em algumas
ocasiõ es eu estava com raiva, em outras o fiz com um certo espírito de vingança. Ainda
aconteceu de eu estar irritado, entã o, disciplinei-as para que se comportassem bem em
determinada situaçã o, preocupado com meu sossego e minha imagem diante das pessoas
ao redor. Contudo, nosso Pai Celestial nunca disciplina com alvos errados, mas para criar
um cará ter firme e equilibrado em cada um de nó s.
Toda disciplina, com efeito, no momento não parece ser motivo de alegria, mas de tristeza; ao
depois, entretanto, produz fruto pacifico aos que
62 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
têm sido por ela exercitadosfruto de justiça (Hb 12.11). O propó sito divino nã o é nosso bom
comportamento imediato. O alvo é para longo prazo. É criar um cará ter semelhante à
imagem de Jesus Cristo em nossas atitudes, personalidades e almas.
Antes de disciplinar minhas filhas, sempre procurei fazê-las entender a razã o pela qual elas
deveriam passar por aquilo. Entretanto, no que se refere ao Senhor, nem sempre Ele
explica o como, onde e porquê. À s vezes temos a impressã o que nosso pecado passou
despercebido. Nada acontece. Há muitos cristã os que, ao pecar, já se perguntam qual será a
forma que Deus os disciplinará .
Podemos ter certeza de que a disciplina nã o é motivo de alegria, mas de tristeza. Tristeza
para o pai, para a mã e que a administram e p<:ra os filhos que a recebem. Mas, como a
Bíblia afirma: ao depois, entretanto, produz fruto de justiça.
Gostaria de fazer agora algumas observaçõ es que podem nos·
ajudar a entender o sofrimento como um dos métodos de disciplina de Deus.
• A disciplina está interligada, de alguma maneira, ao pecado cometido. Este ponto
relaciona-se ao princípio de semear e colher (Gl 6.7): Não vos enganeis: de Deus não se
zomba; pois aquilo que o homem semeai; isso também ceifará. Paulo declara que,
aparentemente, existe uma relaçã o entre a atitude da pessoa e a conseqü ência de seu ato.
Quando o rei Davi pecou, Deus poupou sua vida, mas sua família e a naçã o sofreram
duramente como conseqü ência de seus atos.Jonas tentou fugir de Deus, mas terminou sua
fuga no ventre de um peixe enorme. Os israelitas foram infiéis ao Senhor na Terra
Prometida; por isso, foram disciplinados e perderam suas terras para os babilô nios.
QUANDO MERECEMOS SER DISCIPLINADOS -----
63
• A insensibilidade espiritual pode prejudicar a habilidade do cristã o enxergar o Senhor
administrando disciplina à sua vida.
Tenho conversado com pessoas amarguradas com Deus por causa do sofrimento a que
estã o, ou foram, expostas. Logo descubro que essas pessoas nã o têm andado em comunhã o
com o Senhor, têm pecado freqü entemente e isso as torna insensíveis à atuaçã o divina. Elas
desejam o alívio para sua dor, mas nã o estã o dispostas a abandonar seu pecado.
Quando alguém nã o quer deixar seu pecado, Deus eleva a temperatura da adversidade. Ele
nã o tem interesse em que tenhamos uma vida de regalias, prazeres e satisfaçã o que só
contribuem para um cará ter frá gil, dado ao egoísmo e ao pecado.
Ele nos quer com personalidade e espírito firmes, determinados e equilibrados. Seu
objetivo é de longo prazo. Para nosso cará ter ser firme e profundo, nada melhor que
sermos depurados na fornalha.
A disciplina nã o surge somente em razã o do pecado pessoal. À s vezes, sofremos pelos
pecados alheios, pelas decisõ es egoístas dos que vivem ao nosso lado.
A provaçã o pessoal e familiar a que fomos submetidos nos anos de 97 e 98 - eu, Judith,
minhas filhas e genro - nã o foi fá cil de suportar. Mas, eu estou convicto disso, o Senhor deu
a partida num processo de preparaçã o para o desenvolvimento mais amplo e marcante do
nosso ministério.
- Você está passando pela disciplina de Deus em sua vida agora?
- Você está sofrendo em conseqü ência de algum pecado ou desobediência?
64 ------ ONDEESTÁ DEUSNOMEU SOFRIMENTO?
- Você consegue entender que o Senhor o ama tanto que fará tudo para endireitar seus
passos, conduzindo-o em Sua dire
çã o?
A disciplina resulta em fruto pacífico, fruto de justiça. É
uma promessa de Deus para aqueles que O amam.

C APÍTUL O
7
SOFRENDO
por
JESUS
Nã o posso prosseguir este livro sobre sofrimento, dor e adversidade e seu significado na
vida do cristã o, sem abordar a perseguiçã o que a igreja tem enfrentado nestes quase dois
séculos.
Jesus e os apóstolos previram que ela aconteceria. Eis seus alertas: Bem-aventurados os
perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus. Bem-aventurados sois
quando, por minha causa, vos injuriarem e vos perseguirem e, mentindo, disserem todo mal
contra vós (Mt 5.10,11).
Ora, todos quantos querem viver piedosamente em Cristo Jesus serão perseguidos (2 Tm 3.12).
Mas, se sefrer como cristão, não se envergonhe disso, antes glorifique a Deus com esse nome (1
Pe 4.16).
Os cristã os foram advertidos sobre a futura perseguiçã o, mas eles nã o compreenderam a
seriedade dessa situaçã o, principalmente o que ocorreria nos primeiros três séculos de
existência da 1greJa.
66 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
John Fox, no seu clá ssico "Livro dos Má rtires", descreve detalhada e realisticamente os
horrores da arena, onde homens e mulheres se depararam com a crueldade das bestas
selvagens, com o terror das fogueiras, que fizeram parte da histó ria das atrocidades que
flagelaram e mataram os cristã os nas perseguiçõ es contra a Igreja Primitiva.
O livro de Atos fornece as informaçõ es mais antigas de como as pessoas que seguiam a
Cristo naquela época lutaram contra a oposiçã o e vingança dos líderes judaicos.
Atos, do capítulo três ao cinco, registra tais conflitos entre os apó stolos e os principais de
Jerusalém. No capítulo sete lemos o apedrejamento de Estevã o; no capítulo oito tomamos
conhecimento da perseguiçã o que Saulo submetia à igreja, capturando seus adeptos e
enviando-os a julgamento. No capítulo nove há a linda narrativa da conversã o deste inimigo
dos cristã os, que mais tarde tornou-se um dos mais dedicados apó stolos de Jesus Cristo.
O livro de Atos finaliza com a experiência do entã o Paulo sendo resgatado da fú ria da turba
descontrolada, preso pelos soldados de Ro�a e levado cativo à Cesaréia, onde foi acusado
pelos líderes religiosos de Jerusalém (Atos 21 a 25).
Posteriormente Paulo foi levado à Roma. Ali permaneceu encarcerado e a tradiçã o afirma
que aproximadamente em 66 d.C.
ele foi decapitado. O apó stolo Pedro também teve uma morte cruel. A mesma tradiçã o
conta que ele foi decapitado de cabeça para baixo. Ambos foram sacrificados por
permanecerem firmes em sua crença e fé.
Historiadores romanos registram que o luná tico imperador Nero culpou os cristã os pelo
fogo que ele mesmo ateou à
SOFRENDO POR JESUS
67
Roma. Devido à sua insanidade, muitos foram usados como tochas de fogo para iluminar
seus jardins. A perseguiçã o que o louco imperador impingiu aos fiéis cessou apenas quando
de sua morte, em 68 d.C.
O segundo século testemunhou o crescimento da perseguiçã o romana. Alguns eventos
heró icos permaneceram através da Histó ria. Um deles, um dos mais conhecidos, foi a morte
de Policarpo, bispo de Esmirna, no oeste da Á sia Menor. Preste aten
çã o à leitura de suas palavras na hora de sua morte. O Pró -Consul aproximou-se e
perguntou:
- Você é mesmo Policarpo?
-Sim, sou!
O Pró -Consul tentou persuadi-lo a negar sua fé, dizendo:
- Tenha respeito pela sua velhice! Arrependa-se e jure em nome de César morte aos ateus!
(Para os romanos da época, os seguidores de Jesus eram considerados ateus).
Sendo observado por milhares de pessoas, amarrado a uma estaca com a fogueira prestes a
ser acesa a seus pés, Policarpo fixou seus olhos na multidã o e, levantando suas mã os,
acenou-lhes.
E depois, voltou seu olhar para o céu e disse:
- Há 86 anos tenho servido ao meu Senhor. Ele tem sido fiel comigo todo esse tempo. Como
eu blasfemaria nesta hora contra meu Rei e Salvador?
Em seguida Policarpo orou para que a tortura a qual seria submetido servisse como oferta
sacrificial ao Senhor e um testemunho de sua fé.
Ele foi queimado impiedosamente!
Por que os oficiais romanos perseguiram os cristã os? Justino
68 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
Má rtir, em seus escritos que datam por volta do ano 50, antes de ele pró prio ser
martirizado, apontou quatro motivos. As acusa
çõ es eram as seguintes:
• os cristã os eram ateus - significava que nã o acreditavam nos deuses visíveis, físicos das
religiõ es pagã s das primeiras civilizaçõ es. Os cristã os adoravam um Deus invisível, algo que
os pagã os nã o conseguiam entender.
• os cristã os eram imorais - surgiu uma má -interpretaçã o das "festas de amor cristã o"
(á gape) em que todos chamavam-se mutuamente de "irmã o" e "irmã ". Os romanos
imaginavam que nessas comemoraçõ es aconteciam incestos, adultérios, etc.
• os cristã os eram traidores - nã o queimavam incenso em adoraçã o ao imperador.
• os cristã os isolavam-se - nã o participavam dos rituais romanos, nem de seus
divertimentos, nem ao menos concordavam com seu estilo de vida. Sendo assim, Roma os
rotulava como seita rebelde.
Todas essas acusações condenaram à morte e à tortura milhares de cristãos. O autor de
Hebreus se refere a isso em Hebreus 11.33 a 38: os quais por meio da fé, subjugaram reinos,
praticaram a justiça, obtiverarn promessas, fecharam bocas de leões, extinguiram a violência
do fogo, escaparam ao fio de espada, da fraqueza tiraram força,fizeram-se poderosos em
guena, puseram em júga exércitos de estrangeiros.
Mulheres receberam, pela ressurreição, os seus mortos. Alguns foram torturados, não
aceitando seu resgate, para obterem superior ressurreição; outros, por sua vez, passaram
pela prova de escárnios e açoites, sim, até de algemas e prisões. Foram apedrejados, provados,
serrados pelo meio, nwrtos ao fio de espada; andaram peregrinos, vestidos de peles de ovelhas
e de cabras,
SOFRENDO POR JESUS
69
necessitados, afligidos, maltratados (homens dos quais o mundo não era digno), errantes
pelos desertos, pelos montes, pelas covas, pelos antros da terra.
Escondidos nas profundezas de nossas memó rias estã o os registros bíblicos sobre o
heroísmo daqueles que foram martirizados por causa de sua fé em Cristo.
A maioria da populaçã o brasileira, criada sob a influência do consumismo moderno, nunca
enfrentou as barbaridades de uma guerra mundial, desconhece o que é perseguiçã o, como
aconteceu e ainda acontece com russos, alemã es, poloneses, judeus, etc. Nã o tem a menor
idéia do preço que alguns tiveram que pagar para hoje favorecer a muitos com a liberdade
religiosa. Assistimos a filmes e documentá rios que mostram o sofrimento atroz que essas
pessoas tiveram que enfrentar por sua fé em Jesus.
Enquanto fatos histó ricos, tais acontecimentos sã o melhor aceitos do que como realidade
atual.
No verã o de 1900 os chineses pagã os, denominados
"boxers", chamavam os cristã os de "demô nios da religiã o estrangeira". Eles deflagraram
uma onda de violência que culminou com o assassinato de 188 missioná rios estrangeiros e
seus filhos, bem como de um nú mero inestimá vel de cristã os chineses.
Em Tsum-Hu, 163 chineses metodistas sofreram suplícios indescritíveis. Um pastor chinês
foi forçado a entrar em um templo pagã o onde, amarrado a um pilar, foi estimulado por
conhecidos a renegar sua fé. Perseverante, ele pregou para eles durante toda a noite. Pela
manhã , mais de mil pessoas enfurecidas arrombaram as portas do lugar e, literalmente,
arrancaram o coraçã o daquele homem.
70 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
Duas mulheres chinesas, cristã s, professoras, recusaram-se a renunciar a Cristo. Uma delas
teve seus pés cortados e foi morta a fio de espada; a outra foi embrulhada em algodã o, o
qual foi ensopado em querosene. Por fim, atearam fogo em seu corpo.
Ela morreu gritando aos seus alunos: "Guardem a sua fé!".
Outro pastor, natural da Manchú ria, também permaneceu firme em sua crença no Senhor;
por isso, seus algozes cortaram de seu rosto as sobrancelhas, lá bios e ainda orelhas.
Stewart McKee, missioná rio da "Missã o do Interior da China", tentou dialogar com 300
simpatizantes "boxers" sobre o que representava crer em Jesus. Irracionalmente, cortaram-
no em pedaços a machadadas, puseram fogo em sua casa, onde estavam sua esposa e cinco
filhos. A filha menor, Alice, conseguiu escapar, mas a criança foi encontrada pela manhã e
recebeu o mesmo tipo de morte sofrida pelo pai.
Em Shouyang, aproximadamente cem jovens chineses cristã os foram colocados dentro de
um enorme círculo no qual desenharam uma cruz bem no centro. Em seguida convidaram
os que quisessem negar a Jesus a saírem do círculo, pois os que permanecessem seriam
mortos. Muitos morreram naquele dia, apenas alguns sobreviveram.
Em 1937, na Alemanha nazista, centenas e centenas de pessoas morreram nas mã os do
alucinado Hitler. Presente nessa época estava o brilhante Dietrich Bonhoeffer, um teó logo
luterano de uma das mais tradicionais famílias alemã s. Bonhoeffer levantou sua voz contra
o nazismo, chamando a Hitler de anticristo e auxiliando judeus a fugirem para a Suíça.
Finalmente, foi preso em 1945. No domingo, dia 8 de abril de 1945, ele pregou aos compa-
SOFRENDO POR JESUS
71
nheiros de prisã o usando o texto de Isaías 53.5: (e pelas suas pisaduras fomos sarados) e 1
Pedro 1.3 a respeito de nossa esperança mediante a ressurreiçã o de Jesus Cristo. À s cinco
horas da manhã do dia seguinte ele foi morto. Antes da execuçã o, ajoelhou-se para orar e,
ao levantar-se, o pelotã o crivou seu corpo de balas.
O governo comunista também nã o teve nenhuma tolerâ ncia com o cristianismo e planejou
uma infinidade de "criativos"
modos de tortura, tã o ou mais cruéis aos da época de Nero. Somente a eternidade poderá
revelar a dimensã o do sofrimento dos cristã os prisioneiros durante o regime stalinista.
Peter Yakovleich Vins, ministro do evangelho nos anos 30, foi o primeiro de sua família a
ser encarcerado. Duas geraçõ es depois, homens de Deus de sua família tiveram a mesma
senten
ça. Seu filho Jorge, de apenas dois anos de idade, presenciou diversas vezes sua mã e
recortar trechos da Palavra, costurá -los em peças de roupa de seu pai e enviar para ele no
cá rcere, onde alguns anos depois faleceu.
Em 1966, Jorge seguiu os passos do pai e foi levado para um campo de concentraçã o, de
regime muito severo. Em 1970, sua mã e, Lídia, foi presa durante três anos. Em 1977, o filho
de Jorge, Pedro, também foi preso e açoitado porque cria em Jesus Cristo e lhe era fiel.
Durante sua tortura, Pedro afirmou a seus algozes: "Este caminho é especial, maravilhoso",
referindo-se à perseguiçã o e açoites. "É o mesmo que meu avô , minha avó , meu pai e minha
mã e percorreram".
Em 1970, o caixã o de Ivan Vasilevich chegou à casa de seus pais lacrado. A informaçã o que
as autoridades deram sobre a cau-
72 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
sa da morte era que Ivan morrera afogado. Inconformados, eles resolveram forçar o lacre
do caixã o e ficaram atô nitos ao ver o corpo de seu filho coberto de hematomas, da cabeça
aos pés. Ivan fora esfaqueado, queimado, espancado e torturado até a morte porque,
mesmo diante da bestialidade de seus opressores, continuou fiel ao Senhor, declarando sua
fé.
Mais tarde, seus pais tomaram conhecimento, oficialmente, que o obrigaram a ficar durante
cinco dias exposto ao rigoroso inverno russo, vestido inadequadamente e sem comer. Em
seguida, por continuar firme no propó sito de ser fiel ao Senhor Jesus, colocaram-no por 12
horas em pé sob uma temperatura de muitos graus abaixo de zero. Como Ivan ainda
sobreviveu, açoitaram-no, incitando-o para que traísse Aquele que já enfrentara sofrimento
semelhante. Esta foi a resposta de Ivan:
- Eu nã o tenho um compromisso mais importante do que o que fiz com Jesus Cristo. Ele me
deu ordens e eu vou obedecêlas.
Diante de tal resistência, seus carrascos o entregaram à KGB, que, por sua vez, dispensou-
lhe um tratamento que resultou em sua morte.
Os armênios também têm sido alvo de torturas inimaginá veis nas mã os dos turcos
muçulmanos. Em 1915 o governo muçulmano decidiu matar todos os armênios em seu
territó rio. A maneira escolhida para executá -los foi terrível. Suas cabeças eram colocadas
em tornos e apertadas até que morressem. O dia 24 de abril de 1915 foi tragicamente
inesquecível. Os muçulmanos o escolheram para exterminar 600 mil armênios, inclusive
evangélicos. Milhares de crianças foram jogadas em enor-
SOFRENDO POR JESUS ------------ 73
mes valas e sepultadas vivas. Muitas mulheres e moças foram estupradas antes de serem
assassinadas. Algumas foram marcadas no peito com uma cruz em brasa.
Uma jovem de 18 anos de idade conseguiu escapar desse terror e fugiu para o lado russo,
onde foi socorrida pela Cruz Vermelha americana. Muito abalada, ela contou sua histó ria:
- Os turcos me perguntavam:
-Maomé ou Cristo?
- Cristo! Eu respondia sempre! E durante sete dias eles me fizeram a mesma pergunta. A
cada resposta que eu dava, marcavam-me com uma cruz. (Seu corpo estava coberto delas!)
Finalmente, eles lhe disseram:
-Se amanhã você responder Maomé, viverá ; caso contrá rio, será seu fim!
- E aí eu consegui fugir. Agora, literalmente sei o que é carregar no corpo as marcas de
Cristo!
Escrevo este livro no início de 1999. O mundo tornou-se menor. Temos recebido, por e-
mail, comunicados de irmã os que ainda hoje passam por atrocidades. Gostaria de citar
alguns casos recentes: um deles foi a notícia de que um missioná rio australiano, Grahan
Staine, que trabalhava há 30 anos com grupos étnicos e leprosos na Índia, na cidade de
Orissa, dormia dentro do carro com seus dois filhos, um de oito e outro de dez anos, a 200
km da capital, quando foram atacados. Os três foram queimados vivos. Os cristã os estã o
sendo perseguidos na Índia. Notícias gerais sobre esse assunto estã o registradas na Folha
de Sã o Paulo do dia 25/12/98, pá gina 10. Há fotos de cristã os sendo arrastados e
ameaçados com facas "sagradas" para extermínio dos que pregam o evangelho ali.
74 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
Tc1mbém na China, no dia 1/12/98 as autoridades chinesas prenderam o evangelista Li De
Xian enquanto ele pregava, em pleno culto. ''A Voz dos Má rtires" reportou também que,
enquanto ele estava sendo retirado da igreja, pediu à congregaçã o que orasse por ele.
Imediatamente 600 pessoas se ajoelharam e começaram a clamar a Deus. No dia 15 de
dezembro de 1998 ele foi solto com a cabeça raspada apó s permanecer numa cela com
outros 12 presos.
Continuamos a receber notícias de. cristã os sendo vitimados e mortos no Nepal, na China,
Rú ssia, etc.
Para os que entendem o evangelho, a cruz representa a maior demonstraçã o de amor de
todos os tempos. Cristo, o Deus encarnado, morreu para libertar milhõ es e milhõ es de
pessoas da escravidã o do pecado. Milhares já morreram porque nã o renunciaram sua
crença nesse amor. Eles sã o homens e mulheres dos quais o mundo nã o é digno.
É necessá rio nos prepararmos e pensarmos muito sobre as atrocidades que poderã o vir
com o século 21, que está diante de nó s. Embora muitas vezes nos esqueçamos disso, elas
sã o reais, continuam acontecendo no mundo atual. O que o dia de amanhã trará só Deus
sabe; de qualquer forma estou certo que, como cristã os, precisamos estar bem atentos e
sensíveis para orarmos e socorrermos nossos irmã os que sofrem.
Lembre-se, nã o é porque moramos no Brasil que estamos isentos das perseguiçõ es, das
dores. Nunca se sabe o que poderá ocorrer. Acima de tudo, nã o podemos esquecer que um
dia estaremos perante o Senhor prestando contas da nossa fidelidade ao servi-Lo e,
também, aos nossos irmã os, principalmente aos que estã o sofrendo.
SOFRENDO POR JESUS
75
Se enfrentarmos sofrimento, adversidade, dor nos dias que estã o por vir, seja como igreja
ou como indivíduos, que tenhamos a mesma coragem, confiança e fé de nossos irmã os que
dedicaram sua vida em favor do evangelho.
C APÍTUL O
8
ÜRGULHO
e
QUEBRANTAMENTO
Durante meus 34 anos de ministério, sendo a maior parte no Brasil, Judith e eu tivemos o
privilégio de conhecer vá rias pessoas muito talentosas, excelentes pregadores e líderes.
Eles surgem em cena rapidamente, prenunciando um futuro brilhante, disponíveis para
serem usados por Deus grandiosamente.
Porém, apó s alguns anos sob a luz dos refletores, eles desaparecem sem deixar o menor
vestígio.
Lembro-me de um jovem seminarista que foi meu aluno, muito inteligente, comunicativo,
capaz de pregaçõ es profundas e impactantes, de boa aparência, enfim um rapaz que se
destacava do grupo.
Ele se formou no seminá rio, casou-se com uma Jovem maravilhosa, muito bonita e mudou-
se para outro estado, onde iniciou seu ministério como pastor.
Depois de alguns anos, ele envolveu-se com uma outra mulher, traiu sua esposa, adulterou,
abandonou-a e a seus filhos e, em seguida, divorciou-se. Nessa derrocada moral e espiritual,
78 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
ele conheceu muitas outras mulheres, até chegar ao fim do tú nel e desaparecer de cena.
Há pouco tempo encontrei sua ex-esposa, que também foi minha aluna. Ela trouxe seus
filhos para que eu os conhecesse.
Hoje estã o crescidos, adultos, educados no caminho do Senhor graças ao empenho,
dedicaçã o e fé de sua mã e.
Sobre seu ex-marido, segundo as ú ltimas notícias ( que sã o muito raras), ele está vivendo
em outro país, inteiramente só e distanciado de Deus. Infelizmente, desperdiçou sua vida,
pois optou por seguir uma estrada que o marcou negativamente para sempre.
Ele padeceu da mesma "doença" que afeta muitos homens e mulheres que gastam tempo
demais esforçando-se para estar em evidência, sob as luzes. Começam a imaginar-se
invencíveis, esquecem de onde foram tirados e de que Deus é a voz e eles os instrumentos
que Ele utiliza para falar. Perdem de vista a realidade, esquecem que o Senhor pode tirar-
lhes tudo o que lhes proporciona popularidade e satisfaz seus egos, deixando-os à mercê de
sua pró pria incapacidade de tomar decisõ es corretas.
Eles confundem quem é o verdadeiro merecedor de aplausos, tentam roubar a gló ria que
pertence ao Senhor, facilitam o crescimento do orgulho em seu interior e viciam-se no
deslumbramento de ser alvo de ovaçõ es e adulaçõ es.
Deus odeia o orgulho. Foi o orgulho que precipitou Lúcifer, um anjo de luz, ao inferno. Era
esse o seu pensamento: Eu subirei ao céu, e, acima das estrelas de Deus, exaltarei o meu trono,
e, no rnonte da congregação, me assentarei, da banda dos lados do norte. Subirei acirna das
mais altas nuvens e serei semelhante ao Altíssimo (Is 14 .13, 14).
ORGULHO E QUEBRANTAMENTO --------
79
Foi o orgulho que transformou o pecado em realidade na criação de Deus. Porque Deus sabe
que, no dia em que dele comerdes, se abrirão os vossos olhos, e sereis como Deus (Gn 3.5).
O mesmo orgulho que causou a queda do anjo de luz nas regiõ es celestiais provocou a
derrocada do homem no Jardim do É den. Sã o essas as palavras do sá bio rei Salomã o: O
temor do Senhor é aborrecer o mal; a soberba e a arrogância, e o mau caminho, e a boca
perversa aborreço (Pv 8.13).
Deus odeia tanto o orgulho que está disposto a permitir que passemos por adversidades a
fim de nos tornar humildes.
Em outro capítulo já me referi a Paulo e a seu "espinho na carne". Essa passagem oferece
muitas liçõ es. O "espinho", na vida de Paulo, veio em forma de tribulaçã o, provavelmente
uma doença física que resultou em desconforto e ansiedade. Tal circunstâ ncia levou-o a
ajoelhar-se diante de Deus, depender inteiramente dEle, de Sua graça, misericó rdia e poder,
e obrigou-o a uma auto-aná lise sobre seu procedimento pessoal, caracterizado pelo
orgulho de ser quem era.
O Senhor, prevendo a possibilidade de Paulo tornar-se arrogante, pretensioso, orgulhoso e
vaidoso, permitiu que o "mensageiro de Sataná s" o esbofeteasse, fustigando-o para que ele
nã o tivesse chance de exaltar-se. Deus conhece o potencial que cada um de nó s tem para
ser usado em prol do Seu reino. Por isso Ele nã o nos poupará do sofrimento, da dor, da
tristeza, do pranto, se for exatamente isso o que nos fará mais preciosos para Sua gló ria.
Mas nã o é somente Deus que reconhece nosso potencial.
Sataná s também está atento. Ele deseja que uma pessoa seja bemsucedida e até a ajuda na
escalada para o sucesso; e entã o, posterior-
80 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
mente usa isto contra ela. Ele tem imensa alegria em convencer um pregador, pastor ou
cantor evangélico de que sã o pessoas realmente maravilhosas. Ele sabe perfeitamente que
o grande vilã o da destruiçã o do homem é seu orgulho.
N abucodonosor é um exemplo de como o orgulho devasta um homem. Num dia ele era o
rei da Babilô nia, no outro, ele estava "de quatro", comendo ervas, pastando ao lado de
animais: Falou o rei e disse: Não é esta a grande Babilônia que eu edifiquei para a casa real,
com a força do meu poder e para a glória da minha magnificência?
Ainda estava a palavra na boca do rei, quando caiu uma voz do céu: A ti se diz, ó rei
Nabucodonosor: Passou de ti o reino. E serás tirado dentre os homens, e a tua morada será
com os animais do campo; far-te-ão conier erva como os bois, e passar-se-ão sete tempos
sobre ti, até que conheças que o Altíssimo tem domínio sobre os reinos dos homens e os dá a
quem quer (Dn 4.30-33).
Quando o orgulho se infiltra na vida de alguém, aos poucos ele desgasta o senso de
dependência do Senhor, e essa pessoa passa a julgar-se auto-suficiente. Tal atitude é
frontalmente contrá ria ao que o Senhor propõ e. Deus nã o ajuda, apó ia ou encoraja o
soberbo, antes resiste a ele: "Deus resiste aos soberbos, dá porém, graça aos humildes" (T g
4.6).
Se você notar que o orgulho está tentando penetrar em seu coraçã o, desviando-o de ser
tudo o que Deus quer que você seja, submeta-se humildemente à soberania do Pai Celestial.
Mesmo sentindo receio daquilo que Deus terá que fazer para afastá -lo do orgulho, para
colocá -lo a salvo de ver sua vida destruída, permaneça firme na sua resoluçã o e permita
que o Senhor cure esse mal de seu coraçã o.
ORGULHO E QUEBRANTAMENTO -------- 81
Deus tem grandes planos para sua vida. Há muitas pessoas desorientadas, perdidas em
pecado, que Ele deseja e sabe que você pode alcançar. Há muitos irmã os feridos e Ele o
destacou para confortá -los. Deus nã o quer que o orgulho interfira no ministério que você
pode desenvolver na vida dessas pessoas.
Se você está lutando com a provaçã o em sua vida, louve ao Senhor por isso. Se você
conseguir agradecer a Deus com um coraçã o sincero, já terá dado um enorme passo em
direçã o ao amadurecimento e crescimento espiritual.

CAPÍTUL O
9
INJUSTIÇA,
/
ate
QUANDO?
Se Deus é Todo-Poderoso, entã o, certamente, Ele pode colocar um ponto final nas
injustiças. Mas o fato é que vivemos num mundo injusto. Por quê?
O que está por trá s das lá grimas de uma esposa abandonada? Qual a razã o do olhar
assustado e desconfiado de uma criança molestada? Qual a causa da incerteza de um
homem que foi demitido por um motivo fú til, meses antes de sua aposentadoria?
Se Deus é justo, por que permite que injustiças escureçam nossas vidas?
No primeiro século, a naçã o israelita padecera toda sorte de iniqü idades. Dominada pelo
Império Romano, estava à mercê da intolerâ ncia do poder estrangeiro. Os romanos
taxaram os judeus pesadamente para financiar suas campanhas militares de conquista em
vá rias partes do mundo conhecido. Confiscaram as melhores terras e seus produtos mais
selecionados; estabeleceram seus pró prios governadores impondo leis e costumes
desconhecidos ao povo de Israel.
84 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
A naçã o precisava de um líder forte que se impusesse contra o jugo romano, mas nem um
homem sequer foi encontrado.
Nessa atmosfera opressora e injusta criada pelo poderio estranho, nasceu Jesus Cristo. As
notícias de Sua vida e ministério espalharam-se rapidamente, como fogo em palha seca.
Muitos O
viam como o Messias prometido no Antigo Testamento, imaginando que promoveria uma
reforma social, política e religiosa.
As expectativas e desejos do povo nos dias de Jesus sã o muito semelhantes à s das pessoas
hoje. Eles queriam justiça, assim como nó s. Estavam cansados de sofrer tantas puniçõ es
injustas e prontos para assistir o Senhor interferir nos acontecimentos.
Em resposta à frustração e ao sentimento de incapacidade que Jesus percebeu nos israelitas,
Ele os ensinou por meio da seguinte história: Havia em certa cidade umjuiz, que não temia a
Deus nem respeitava homem algum. Havia também naquela mesma cidade uma viúva, que
vinha ter com ele, dizendo: Julga a minha causa contra o meu adversário. Ele por algum
tempo não a quis atender; mas depois disse consigo: Bem que eu não temo a Deus, nem
respeito a homem algum, todavia, como esta viúva me importuna, julgarei a sua causa, para
não suceder que, por fim, venha a molestar-me. Então disse o Senhor: Considerai no que diz
este juiz iníquo. Não fará Deus justiça aos seus escolhidos, que a ele clamam dia e noite,
embora pareça demorado em defendê-los? Digo-vos que depressa lhes fará justiça. Contudo,
quando vier o Filho do homem, achará porventura fé na terra? (Lc 18.2-8).
Nesta pará bola, Jesus usa a figura de um juiz cuja postura era desrespeitosa e arrogante,
contrastando-se à de uma viú va pobre, sem nada e sem direito algum. Ela precisava de
justiça e, aparentemente, aquele jurista iníquo era sua ú nica esperança.
INJUSTIÇA, ATÉ QUANDO? ---------- 85
Cotidianamente ela o importunava pedindo que legislasse sua causa, mas nã o obtinha
ajuda. Por fim, o juiz resolveu atendê-la; nã o por dever, mas para ver-se livre dela.
Jesus contou esta pará bola para comparar um juiz injusto com um Deus justo. Se um juiz
com tais características foi convencido a ajudar uma mulher miserá vel, a quem nã o
conhecia e por quem nã o se interessava, quanto mais o Senhor nã o se disporá a fazer
justiça à queles a quem ama?
Quando os que ouviam a Cristo escutaram estas palavras, questionaram se Deus demoraria
a fazer justiça a seu favor. Jesus sabia que essa questã o surgiria, entã o ele respondeu com
outra pergunta: Quando vier o Filho do homem, achará porventura fé na terra? (Lc 18.8).
A resposta mais só lida para a problemá tica do sofrimento é a volta do Senhor Jesus à terra
porque na Sua segunda vinda todos os homens e mulheres prestarã o contas de seus atos.
Os injustos passarã o pelo julgamento do Grande Trono Branco (Ap 20.11-13). Para os
salvos pela graça de Deus o julgamento será perante o Tribunal de Cristo (2 Co 5.10).
Nessas duas ocasiõ es a justiça será feita aos justos e aos injustos. O justo também receberá
galardã o (Mt 5.10; 1 Pd 2.19-21).
O apó stolo Pedro diz que, quando somos maltratados ou tratados com injustiça, Deus olha
do céu e sorri. Deus se agrada do sofrimento de Seus amados. Será que o Senhor é sá dico?
Por que Ele se agrada com a afliçã o injusta? Porque fomos chamados a sofrer. Nã o devemos
nos surpreender com o tratamento injusto, pois o pró prio Jesus trilhou tal caminho e,
quando sofremos, somos coparticipantes de Seu sofrimento: Porque os olhos do Senhor
repousam sobre os justos e os seus ouvidos estão abertos às suas súplicas, mas o rosto do
86 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
Senhor está contra aqueles que praticam males. Ora, quem é que vos há de maltratar; se
fordes zelosos do que é bom? (1 Pd 3.12,13).
Os que sofrem injustamente serã o vindicados pelo Senhor e receberã o a coroa da vida,
como Ele mesmo prometeu em Tiago 1.12.
Nó s, seres humanos, queremos justiça imediata e nã o estamos dispostos a aguardar a volta
de Cristo. Você já parou para pensar que o assassinato de Jesus nã o foi vingado e já se
passaram quase dois mil anos? O pior crime da histó ria da humanidade ainda nã o foi
julgado.
Deus sabe quando sofremos. Nada passa despercebido a Seus olhos. O Senhor nunca nos
abandona aos caprichos e desejos dos poderosos perversos. Ele "anota", com cuidado e
detalhes, tudo que observa e já instituiu um promotor, um jú ri e um juiz. Todos estã o na
mesma pessoa: Jesus Cristo! E naquele dia Ele fará justiça a quem ama.
Quando Jesus perguntou: quando vier o Filho do homem, achará porventura fé na terra?, Ele
desejava saber se haveria um homem, um que fosse, que continuaria fiel quando a justiça
nã o fosse aplicada.
Quais sã o as nossas ordens? Permanecer fiel, orar pela justiça e aguardar ansiosamente
pela vinda do Juiz.
Para alguns, ser fiel significa liberar anos de amargura e desconfiança guardados no íntimo.
Amargura, ó dio e animosidade contra os que nos feriram é como veneno que contamina e
se espalha tal qual uma epidemia.
Converse com Deus neste momento. Diga-lhe que reconhece que Ele é o Juiz e o Vingador.
Peça que Ele lhe mostre como deve juntar as peças para montar o quebra-cabeças de sua
vida. Tudo o que Ele pede é sua fidelidade. Ele fará justiça a Seu tempo.
C APÍTUL O
10
TRANSFORMANDO
o
MAL EM BEM
Quantas vezes observamos pessoas sofrendo injustamente!
Elas sofrem pelas decisõ es, escolhas e pecados dos outros.
Nossosjornais estã o repletos dessas histó rias.
Uma pessoa é detida, perde preciosos anos na prisã o antes da verdade de sua inocência vir
à tona. Investidores inocentes tornam-se presas fá ceis de empresá rios inescrupulosos. Um
homem serve a uma companhia durante anos a fio e perde seu emprego devido à fusã o de
duas empresas.
Contudo, poucos sofreram tanta injustiça, por um tempo tã o longo, como José do Egito.
Vendido como escravo por seus irmã os com apenas 17 anos, amargou os 13 anos seguintes
como escravo e prisioneiro. Nove anos mais tarde, aos 39 anos, reencontrou seu pai e
reconciliou-se com seus ciumentos irmã os.
A histó ria de sua vida é contada em Gênesis, do capítulo 37
ao 50 e proporciona um estudo fascinante da maneira de agir do Senhor. Ele sempre
planeja os fatos da vida para o nosso bem e benefício, apesar da oposiçã o das forças
malignas.
88 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
José foi o primeiro filho nascido da esposa predileta de Jacó , Raquel. Ele recebeu
tratamento preferencial desde o início, atitude demonstrada por seu pai ao presenteá -lo
com uma tú nica talar de mangas compridas, em detrimento aos seus outros dez irmã os (Gn
37.3). Esses dez irmã os mais velhos o odiavam, apelidando-o desdenhosamente de
"sonhador" (Gn 37.19).
Na verdade,José era mesmo um sonhador. Seus dois sonhos, os quais relatou aos irmã os,
representavam-nos prostrando-se a seus pés. Talvez, a repetiçã o do sonho tenha dado a
José uma firme convicçã o dos planos divinos sobre sua vida futura. Tomemos como
referência Génesis 41.32 e observemos como José tinha certeza de que a repetiçã o de seus
sonhos demonstrava a vontade de Deus.
Para mim, a atitude do jovem adolescente, contando seus sonhos precipitadamente aos
irmã os, foi muito imatura, pouco sensata. É possível que os 13 anos seguintes tenham sido
necessá rios para o Senhor trabalhar no coraçã o de José a fim de transformá -lo no homem
que Ele precisava vir a ser. Quando, enfim, José deixou a prisã o, sua sabedoria era
incontestá vel e evidente. O pró prio faraó declarou: Acharíamos, porventura, homem como
este, em quem há o Espírito de Deus? (Gn 41.38).
A resposta dos irmãos de José a seus sonhos foi de ciúme e ódio: Reinarás, com efeito, sobre
nós? E sobre nós dominarás realmente?
(Gn 37.8). Muitas vezes o ó dio mais persistente dos quais somos alvos, vem das pessoas
mais pró ximas. A aversã o que aqueles rapazes sentiam por seu irmã o menor era tã o forte
que resolveram matá -lo (Gn 37.20). No desenrolar da narrativa sobre a vida de José, muitos
anos depois, constatamos que os sonhos se tornaram realidade. Perdidos em suas
manobras e manipulaçõ es, eles
TRANSFORMANDO O MAL EM BEM --------
89
(os dez irmã os) tiveram que curvar-se diante da soberana e imutá vel vontade de Deus.
Como lemos no Salmo 75.7: Deus é o juiz: a um abate, a outro exalta.
Retomando a histó ria, de repente, devido à s ponderaçõ es de Judá , os outros resolveram
vendê-lo como escravo (Gn 37.25-28). Eles engendraram uma mentira e contaram aJacó
como um animal devorara seu filho tã o querido. J acó , "o enganador", foi enganado por seus
filhos. Ainda mais irô nico foi o fato de terem utilizado um bode para dar mais realidade à
sua mentira. Muitos anos antes,Jacó usara a pele do mesmo animal para enganar !saque (Gn
27.9-16).
Será que, por causa da manipulaçã o humana, o plano de Deus pode ser frustrado? Será que
Deus modifica o rumo planejado por causa do pecado do homem? Nã o! O Senhor pode levar
seus amados filhos pelo vale da sombra da morte, mas Ele nã o muda aquilo que já
arquitetou.
Como José explicou posteriormente a seus irmãos: Vós, na verdade, intentaste o mal contra
mim, porém Deus o tornou em bem, para fazer como vedes agora, que se conserve muita gente
em vida (Gn 50.20).
Deus tinha um plano traçado para a vida de José e este pô de sentir Sua presença muito
pró xima desde o dia em que foi vendido como escravo, até o dia em que recebeu o cargo de
Ministro do Egito.
Gênesis 39 explica como José foi vendido como escravo à casa de Potifar e, mais tarde,
lançado à prisã o injustamente, sob falsas acusaçõ es.
Neste capítulo, lemos pelo menos três vezes a afirmaçã o de que Deus estava com ele.
Afliçã o e sofrimento nã o sã o indicaçõ es
90 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
de que o Senhor nos odeia, rejeita e depois nos abandona. O Senhor estava com José na casa
de Potifar e na prisã o. Em ambos os lugares Ele favoreceu aos superiores do rapaz, isto é,
por causa de José eles foram abençoados (Gn 39.4,21). José foi designado para posiçõ es
especiais, tanto na casa de Potifar como na prisã o (Gn 39.5, 21- 23).
O fato de o jovem José sentir e reconhecer a proximidade do Senhor, mesmo numa situaçã o
desconfortá vel, servindo como escravo, com certeza protegeu-o de vá rios e sérios perigos
ao redor. Por exemplo, ele, fortalecido por Deus, resistiu e rejeitou os insistentes apelos e
tentaçõ es da sensual esposa de seu senhor, Potifar. Muito antes dos dez mandamentos
serem entregues a Moisés, José já sabia que adultério era ( e é) um ato pecaminoso contra
outro ser humano e, principalmente, reprovado por Deus (Gn 39.8,9).
José nem ao menos cogitou em considerar os valores morais muito subjetivos ou moldá veis
à s diferentes situaçõ es. Ele compreendia que há um absolutismo no que se refere ao certo/
errado porque ele vivia diante dos olhos do Deus Onisciente.
Dia apó s dia, a mulher de Potifar tentava-o, persistentemente. Surgiu, entã o, uma situaçã o
em que ela e José ficaram sozinhos em casa. Ela agarrou-se à tú nica do rapaz e exigiu que
ele a possuísse. De imediato José tratou de fugir do pecado que ela insistia que ele
cometesse. Logo em seguida, porém, foi preso em conseqü ência das injú rias daquela
mulher rejeitada.
Por que era necessá ria essa provaçã o adicional à vida de José?
Ele já nã o enfrentara afliçõ es demais? Ainda tinha que suportar mais aquela? Resistir à
tentaçã o e nã o ser recompensado é com-
TRANSFORMANDO O MAL EM BEM --------
91
preensível; mas resistir à tentaçã o e, aparentemente, ser punido, é mais difícil de se aceitar.
No padrã o humano de justiça, José pagou um preço alto demais por sua fidelidade. Tanto
Potifar, quanto Deus, foram duros demais com ele.
Mas, como o Senhor tinha um plano muito superior a tudo o que José, ou qualquer outra
pessoa pudesse imaginar, a longo prazo notamos que o preço pago por ele para assumir a
posiçã o de Ministro do Egito, foi o que ele precisava para desincumbir-se do cargo e suas
implicaçõ es.
Se nos aprofundarmos um pouco na reflexã o sobre a prisã o de José, concluiremos que ela
foi mais um sinal da providência do Pai Celestial para endireitar os caminhos do jovem e
protegê-
lo de maiores perigos.
Ele foi levado a uma prisã o especial, onde só ficavam detidos os prisioneiros do rei. Potifar,
comandante da guarda oficial de Faraó , poderia tê-lo executado imediatamente; porém,
talvez por gostar do jovem e por desconfiar da honestidade das acusa
çõ es de sua esposa, nã o o fez.
O tempo que José passou administrando a casa de Potifar e sendo sá bio conselheiro na
prisã o, preparou-o para a grandiosa tarefa de governar o Egito ao lado do Faraó ,
coordenando o estoque e distribuiçã o dos alimentos durante os sete anos de fartura e os
sete anos de escassez, respectivamente.
O pró ximo segmento da vida de José demonstra o imenso poder que Deus tem para dirigir a
vida de Seu povo. O que Ele planeja, Ele cumpre (Gn 41.32).
Fico muito intrigado por que os acontecimentos que sã o narrados nos capítulos 40 e 41 de
Génesis enfatizam o padrã o da
92 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
repetiçã o dos sonhos sempre duas vezes. Eram dois oficiais: o copeiro-chefe e o padeiro-
chefe (Gn 40.2). Cada um deles teve um sonho (portanto foram dois sonhos). Os sonhos e a
interpretaçã o foram repetidos duas vezes. Uma vez a José, outra ao Faraó (Gn 40.5-19 e Gn
41. 9-13). Depois de dois anos (Gn 41.1), o pró prio Faraó teve dois sonhos, cada um com
duas partes: sete anos de fartura e sete anos de fome. Estes sonhos foram repetidos duas
vezes (Gn 41.1-7; Gn 41.17-24). Assim como José sonhara duas vezes no passado, Faraó
também sonhou duas vezes.
Talvez você julgue insignificante esta minha fixaçã o sobre a repetiçã o dos fatos sempre
duas vezes. No entanto, o versículo 32 do capítulo 41 de Gênesis diz: O sonho de Faraó foi
dúplice, porque a coisa é estabelecida por Deus, e Dew se apressa em fazê-la.
Esta seqü ência dú plice, como diz a Palavra, corrobora a confirmaçã o daquilo que o Senhor
revelou a José quando ele tinha 17 anos. Também ilustra o envolvimento integral de Deus
nos eventos humanos. Estudando até aqui tudo o que ocorreu a José, deveríamos estar
totalmente convencidos da intervençã o sá bia e amorosa do nosso Pai nos fatos de nossa
vida.
O poder de Deus também é evidenciado nas falhas dos homens. Quando José interpretou os
sonhos dos dois oficiais na prisã o e o copeiro-chefe foi reintegrado à sua funçã o na corte do
Faraó ,José pediu que ele nã o o esquecesse e que intercedesse por ele. Mas o copeiro, assim
que se viu livre, nã o teve sequer lembrança daquele que o ajudara e encorajara no cá rcere.
Realmente, nã o era o momento de Deus para a libertaçã o de seu servo. Somente quando o
Faraó também teve os seus sonhos é que o empregado lembrou-se que,jogado na prisã o
real, havia ai-
TRANSFORMANDO O MAL EM BEM -------- 93
guém que poderia ajudar seu senhor (pode ser que a motivaçã o do copeiro tenha sido a de
simplesmente "ganhar pontos" com o rei; seja como for, Deus estava no controle). E entã o,
chegou a ocasiã o escolhida por Deus para erguer José do escuro cá rcere para a gló ria de ser
Ministro da naçã o mais poderosa da terra, daquela época.
Perante Faraó , José inicia ressaltando o poder de Deus na interpretaçã o dos sonhos: Não
está isso em mim; mas Deus dará resposta favorável a Faraó ( Gn 41.16). Os sonhos, explicou,
eram a revelaçã o de Deus sobre o que Ele pretendia fazer: Deus manifestou a Faraó o que há
de fazer (Gn 41.25).
A resposta do rei foi nomeá -lo Primeiro-Ministro, o homem mais poderoso da naçã o depois
dele, designado para coordenar e supervisionar todo planejamento da preparaçã o para os
anos de fome.
O poder de Deus revelou-se ainda mais grandioso para José no segundo ano de fome.
Depois de 22 anos separado de sua família, ele reencontrou seus irmã os mais velhos. J acó
enviara seus filhos ao Egito porque sabia que ali havia abundâ ncia de cereais, e que o
alimento estava sendo vendido. Os irmã os, porém, nã o reconheceram no Ministro seu
irmã o.
José estava, entã o, totalmente consciente do plano de Deus desde sua venda como escravo
até aquele dia, quando viu seus familiares depois de tanto tempo. Ele declarou isso em sua
conversa com seus irmã os em Gn 45.7: Deus me enviou adiante de vós, para conservar a
vossa sucessão na terra, e para vos preservar a vida por 11111. grande livramento.
Quando José viu seus meio-irmã os, concebeu um complexo plano para testá -los.
Primeiramente acusou-os de espiõ es e
94 ------ ONDEESTÁ DEUSNOMEUSOFRIMENTO?
deteve Simeã o como refém, até que os outros regressassem com seu irmã o mais novo (seu
irmã o legítimo), Benjamim.
Na primeira viagem, José recolocou secretamente no saco de cereais, o dinheiro que eles
haviam levado para a compra do alimento. Na segunda vez, quando regressaram trazendo
Benjamim, José colocou um cá lice de prata no saco de cereal do rapaz e, entã o, acusou-os de
roubo.
À primeira vista, o plano de José aparentava ser uma vingança mesquinha. Contudo, numa
aná lise mais cuidadosa, percebemos que ele desejava que seus irmã os se arrependessem
do que haviam feito.
Através de todos esses acontecimentos, aqueles homens foram capazes de reconhecer sua
culpa. Até aquele instante eles nã o estavam ansiosos ou preocupados com seu
procedimento de 22 anos antes, quando sentenciaram José a uma vida de escravidã o, mas
sim, com a acusaçã o de ro_ubo que lhes fora imputada.
Mas, pouco a pouco, notamos que eles ainda sentiam arrependimento, tristeza e culpa pelo
que haviam feito: Então disseram uns aos outros: Na verdade, somos wlpados, no tocante a
nosso irmão, pois lhe vimos a angústia da alma, quando nos rogava, e não lhe awdimos; por
isso nos vem essa ansiedade (Gn 42.21).
Quando estava diante de José pela segunda vez, seus irmã os foram mais honestos.Judá
suplicou por Benjamim e citou o pró prio José, que todos julgavam estar morto (Gn 44.20).
José nã o pô de mais conter sua grande emoçã o. Mandou que todos saíssem e, ao que parece,
falando pela primeira vez em hebraico (língua de seus irmã os), revelou-se, chorando
copiosamente: Eu sou]osé; vive ainda meu pai? (Gn 45.3).
TRANSFORMANDO O MAL EM BEM -------- 95
No capítulo 45 de Génesis, nos versículos 4 a 8, José nã o os libertou da culpa pelo que lhe
fizeram, mas tranqü ilizou sua ansiedade, temor, pedindo que nã o se preocupassem, pois
Deus transformara o mal em bem.
Mesmo muito antes de saber que reveria sua família na situaçã o privilegiada em que se
encontrava,José expressou sua gratidã o a Deus pelo Seu cuidado e bondade, quando do
nascimento de seu primeiro filho:José ao primogênito chamou Manassés, pois disse: Deus me
fez esquecer de todos os meus trabalhos, e de toda casa de meu pai (Gn 41.51).
José nã o deixou nascer amargura ou ressentimento contra os instrumentos utilizados pelo
Senhor para desencadear sua afli
çã o. Ele reconheceu que, desde o início, Deus alinhavava todos os acontecimentos de sua
vida: Deus me pôs por senhor em toda terra do Egito; desce a mim, não te demores (Gn 45.9).
A vida deste homem exemplifica e fornece a resposta correta ao sofrimento. A mesma resposta
do salmista: "Por que estás abatida, ó minh' alma? Por q11e te perturbas dentro em mim?
Espera em Deus, pois ainda O louvarei, ele meu auxílio e Deus meu" (Sl 42.5).
Permita-me concluir este capítulo com algumas observa
çõ es sobre o nosso sofrimento.
1. Deus tem um plano cujo desenrolar atravessa nossas adversidades. Mesmo quando
sofremos por ter pecado, o Senhor nos favorece com bênçã os e benefícios através do nosso
arrependimento.
2. Deus permanecerá ao nosso lado, passo a passo, em todas as dificuldades, problemas,
afliçõ es e angú stias que tenhamos que enfrentar. Ele estará conosco na fornalha da
provaçã o.

CAPÍTUL O
11
AJUDANDO
o
SOFREDOR
Seja o que for -alguém que tenha recebido uma notícia trá gica do médico, um acidente
sofrido por um ente querido, pessoas necessitando de conforto e compaixã o, etc - como
podemos ajudar alguém, quando nã o nos sentimos capazes de fazê-lo?
Quando as pessoas estã o sofrendo, nã o precisam ouvir que a tragédia de alguma forma as
ajudará ; que aquela é a vontade de Deus; ou ainda, que tudo dará certo no final. Na verdade,
elas precisam ser ouvidas e cuidadas, mas com palavras e motivaçõ es adequadas.
Gostaria de compartilhar algumas sugestõ es daquilo que eu mesmo tenho procurado
aplicar nestes meus 34 anos de ministério, quando estou diante de uma pessoa em crise.
• Ouça o que a pessoa diz, mas também as palavras que não são ditas.
Ser ouvido corretamente é um presente especial para quem que sofre. Isto envolve uma
concentraçã o total à verbalizaçã o de sua dor. Enquanto você escuta, poderá notar
sentimentos
98 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
indisfarçá veis de confusã o, raiva e tristeza. Cuidado, nã o responda com uma longa
conversa. O apó stolo Tiago aconselhou: S(ja pronto para ouvi,; tardio para falar (T g 1.19).
• Deixe a pessoa extravasar sua dor e desespero.
Nossa tendência é tentar libertar o outro de seu sofrimento e tristeza. O sofrimento faz
parte de nossa vida. Em um mundo violento e cruel, as lá grimas sã o elementos de cura. Até
mesmo Jesus angustiou-se e chorou declaradamente enquanto aqui na terra (Lc 19.41; Jo
11.35).
Às vezes, quando confortamos alguém que está arrasado pelo peso de uma tragédia,
sentimo-nos desconfortá veis diante de tamanho sofrimento e nos precipitamos procurando
anular tal dor.
Devemos encorajar a pessoa a liberar suas emoçõ es e sentimentos, mesmo que sejam
hostis, confusos ou inadequados.
• Tenha disponibilidade para auxiliar a pessoa que sofre.
Geralmente, a pessoa que está sofrendo nã o tem nenhuma vontade, energia ou motivaçã o
para cumprir seus afazeres normais.
Ligue para ela e pergunte se pode ajudá -la, como por exemplo, levando-lhe uma refeiçã o,
dividindo suas tarefas. Se você nã o puder estar fisicamente, telefone periodicamente para
lembrá -la que você está predisposto a auxiliá -la e preocupa-se com ela. 11-ansmita sua
disposiçã o para ouvi-la no instante em que ela desejar falar.
• Ore por e com a pessoa.
Os cristã os sã o chamados a perseverar na tribulaçã o, devotar-se a orar e contribuir para a
necessidade dos santos (Rm
AJUDANDO O SOFREDOR ----------- 99
12.12,13). Comprometa-se a orar com a pessoa que está com problemas e, se for
apropriado, convide outros a fazerem o mesmo.
Se você quiser orar com alguém que está passando por uma fase de grande provaçã o, seja
sensível. Pergunte: "Você gostaria que eu orasse por você agora?"
• Aprenda a permanecer em silêncio ao lado da pessoa.
A Bíblia nos relata que os amigos de Jó sentaram com ele sete dias sem falar uma só palavra
CT ó 2.11-13).
Freqü entemente a agonia vai além das palavras. Nã o tente saber o que a pessoa sente, ou
explicar os fatos que sucederam, apenas fique quieto ao seu lado, sentindo empatia por seu
sofrimento.
• Nã o tente explicar ou interpretar a tragédia.
Infelizmente, muitas pessoas procuram confortar o sofredor arriscando um propó sito
conclusivo para o que ocorreu. Evite tais frases:
- Deus quer lhe ensinar algo através disso.
- Há alguma bênçã o escondida nessa provaçã o.
- Você já analisou se há algum pecado escondido em seu coraçã o?
Estas frases podem sugerir que você está minimizando a dor da pessoa e despertar nela um
sentimento de culpa em decorrência do que aconteceu.
Nã o é nossa responsabilidade explicar a tragédia!
• Utilize as Escrituras com cautela.
A Palavra de Deus, especialmente os Salmos, oferecem for-
100 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
ça e confiança genuínas a quem tenta se restaurar de uma tragédia. Por outro lado,
devemos ter cuidado para nã o citar versículos conhecidos apenas por citar, como há bito, e
sem aplicaçã o ao momento que a pessoa está enfrentando.
Se ela tiver uma passagem predileta, ofereça-se para lê-la.
Peça ao Espírito Santo para orientá -lo como deve encorajar seu (sua) amigo (a)
adequadamente.
Lembre-se: a pessoa pode estar se sentindo distante, ou até mesmo magoada e
decepcionada com Deus pelo ocorrido em sua vida.
• Evite os clichês e as frases feitas.
''Anime-se, pense que ele está com Deus."
"O tempo cura todas as feridas."
''Agora só resta confiar no Senhor."
A maioria destes chavõ es leva a pessoa a imaginar que sua dor nã o é profunda e nem
saudá vel.
Cada experiência que alguém enfrenta é ú nica, particular e exclusiva.
Ao invés de dizer:
- Sei exatamente o que você está sentindo!", procure dizer:
- Dá pra imaginar que está muito difícil o que você está passando!
Nã o se esqueça: você é um "parakleo" (como definido no capítulo 1). Você mesmo, em
alguma ocasiã o de sua pró pria vida, foi confortado pelo Deus de todo conforto e, agora, Ele
o chama para confortar outros. Seja sensível aos que estã o ao seu redor. Há muitas pessoas
sofrendo e você pode tomar-se um presente especial para elas.

EPÍLOGO
DEUS É FIEL
Confesso que é um mistério, mas infelizmente nunca conheceremos a Deus intimamente se
nã o nos defrontarmos com provaçõ es. A nossa fé crescerá na dor. As circunstâ ncias difíceis
de nossas vidas tornam-se meios de Ele manifestar-Se a nó s. E, sendo a dor inevitá vel, o
mais sá bio é procurarmos aprender o mais que pudermos para sairmos melhor do que
entramos, de forma a nosso sofrimento nã o ser em vã o.
Se dependesse de nó s colocaríamos todo nosso empenho em fugir das adversidades ... mas
nem sempre dá ! Por outro lado há situaçõ es de dor que podem ser evitadas, prevenidas.
Lemos em Provérbios que o tolo sofre mais que o sá bio, por expor-se mais. Nã o sou
defensor do masoquismo; isso é outra coisa. Falo daquele sofrimento que pode
simplesmente surgir em nossa vida sem convite, como temos visto nos outros capítulos
deste livro.
102 ------ ONDE ESTÁ DEUS NO MEU SOFRIMENTO?
E, em meio ao sofrimento, a primeira coisa que precisamos aprender é: Deus é fiel. O
salmista testemunhou dessa fidelidade: Bmq11ei o Senhor e Ele 1ne acolheu; livrou-me de
todos os meus temores. Clamou este aflito, e o Senhor o ouviu e o livrou de todas as suas
trib11lações. Muitas são as aflições do justo mas o Senhor de todas o livra (Sl 34.4,6,7,19).
Estas sã o palavras de alguém que está com problemas, passando por horas muito duras,
mas que experimentou a fidelidade de Deus.
Na realidade, no dia-a-dia, nem sempre as situaçõ es têm um desfecho feliz. Maridos
abandonam suas esposas, filhos de pais cristã os se drogam, prejudicando seu futuro;
empresá rios perdem suas firmas, ministérios autênticos e vá lidos naufragam, cristã os
perdem seus empregos; milhares de mulheres abortam.
Será que Deus é menos fiel nesses casos? À s vezes, a fidelidade do Senhor nã o é
reconhecida por nã o recebermos a resposta que julgá vamos ter que receber. Tendemos a
duvidar dEle, a nos amargurarmos achando que Ele nos deu as costas.
Não raramente, Deus mostra Sua fidelidade não ao nos libertar do problema, mas ao
fortalecer-nos para enfrentá-lo. Em Hebreus 4.16, Ele promete: Acheguemo-nos, portanto,
confiadamente, junto ao trono da graça, a fi.m de recebermos misericórdia e acharmos graça
para socorro em ocasião oport11na.
O autor afirma que quando estivermos enfrentando problemas, Ele providenciará
misericó rdia e graça. Ele nã o promete mudar as circunstâ ncias, libertar-nos da dor ou
livrar-nos do inimigo.
Nã o sou diferente de qualquer pessoa. Eu preferiria que o Senhor me livrasse da
adversidade do que me sustentasse nela.
DEUS É FIEL ----------------- 103
Preciso admitir porém, que recebi magníficas liçõ es através das prolongadas horas de
provaçõ es.
Há momentos em que eu ajo confiando em minha pró pria força. Quando isso acontece,
desmorono diante das inú meras pressõ es. Finalmente, quando compreendo que preciso
depender de Deus e permito que Ele me dê graça e força para superar as dificuldades de
minha vida e ministério, entã o consigo sentir paz.
Meu (Minha) amado (a) amigo (a), nã o sei a natureza da provaçã o que você está passando
agora, mas estou certo que, se você deixar que o Senhor use essa tribulaçã o, sua crença na
fidelidade do Pai será aprofundada. Ele se revelará de maneiras como você nunca viu até
aqui. Espere nEle. Ele é fiel!
Editora Fô lego
Caixa Postal 16.610
CEP 03149-970 - Sã o Paulo - SP
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