História Da Engenharia Clínica

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E N G E N H A R I A C L Í N I C A : PARTE I - O R I G E N S (1942-1996)

ERNESTO F E R N A N D O F E R R E Y R A RAMÍREZ 1
S A I D E J O R G E CALIL 2

R A M I R E Z , E. F. F; C A L I L , S. J. E n g e n h a r i a clinica: Parte I - Origens (1942-1996). Semina: Ci. Exatas/


Tecnol. Londrina, v. 2 1 , n. 4, p. 27-33, d e z . 2000.

RESUMO: Neste trabalho é apresentado um histórico da Engenharia Clínica, desde as suas origens na década
de 40, até o panorama observado em meados da década de 90 no Brasil e nos Estados Unidos. Também é feita
uma comparação das situações encontradas nestes dois países. Em outro artigo, serão abordadas e discutidas
a evolução, a situação atual e as novas perspectivas desta área para este início de milênio.

PALAVRAS-CHAVE: Engenharia Clínica; História; Gerenciamento de equipamentos médicos.

1 INTRODUÇÃO hospitais (criação do ultra-som, analisadores


químicos do sangue e tomografia), c o m e ç a r a m a
Ocrescente aumento do parque de e q u i p a m e n t o s aumentar os custos com saúde. S e g u n d o Jurgen
e l e t r o - e l e t r ô n i c o s e m u m hospital, a l g u n s c o m (1977), estimou-se que 5 0 % do c r e s c i m e n t o dos
princípios de f u n c i o n a m e n t o bastante c o m p l e x o s , custos c o m saúde nos Estados Unidos de 1 965 a
e o aparecimento de novas tecnologias tornaram 1974 e s t a v a direta ou i n d i r e t a m e n t e l i g a d o à
i n d i s p e n s á v e l a p r e s e n ç a de um p r o f i s s i o n a l tecnologia médica. Os engenheiros e as empresas
especializado para assessorar, do ponto de vista de e q u i p a m e n t o s médicos estavam frustrados por
técnico, o corpo clínico no gerenciamento de todas tentar obter progressos em u m a á r e a cheia de
estas novas tecnologias associadas aos serviços de riscos relacionados a mercados incertos, dificuldade
saúde. Este profissional é o Engenheiro Clínico, que de testes, custos altos de venda, e um panorama
aplica tecnologias e m é t o d o s de e n g e n h a r i a para onde a legislação sobre segurança dos equipamentos
tentar solucionar os problemas relacionados c o m não era b e m clara (Christiansen, 1973). Nesse
os serviços oferecidos por uma unidade de saúde período, os equipamentos adquiridos pelos hospitais
(Calil, 1 990). Neste trabalho será a p r e s e n t a d o um não traziam instruções sobre c o m o utilizá-ios ou
histórico da engenharia clínica, desde a s u a origem c o m o consertá-los, ou seja, havia um v a z i o entre
nos E s t a d o s U n i d o s e no Brasil, e a s i t u a ç ã o o c o n h e c i m e n t o tecnológico e a i m p l e m e n t a ç ã o
nestes dois países até meados da d é c a d a de 90. deste. C o m isto, a engenharia de m a n u t e n ç ã o
c o m e ç o u a representar u m a alternativa para fazer
a redução de custos com tecnologia nos hospitais.
2 HISTÓRICO N O S E S T A D O S U N I D O S Os engenheiros não substituiriam os médicos, mas
sim forneceriam a tecnologia, automação,
sistemas de comunicação, para auxiliar o médico
A s e m e n t e que deu início à engenharia clínica
a d e s e m p e n h a r as suas a t i v i d a d e s clínicas
foi plantada em 10 de janeiro de 1942, na cidade
(Jurgen, 1973a; Hershberg, 1972).
de St. L o u i s , c o m a c r i a ç ã o de um c u r s o de
manutenção de equipamentos médicos, com Outro ponto importante a destacar foi que no
duração de 12 s e m a n a s , oferecido pelas forças final da d é c a d a de 60 e começo da d é c a d a de 70,
a r m a d a s d o s E s t a d o s Unidos. Este c u r s o deu houve nos Estados Unidos um alarde c o m a notícia
origem a uma escola de manutenção de equipamentos divulgada pelo cirurgião Cari W. Walter, da Harvard
médicos do exército na cidade de Denver, Colorado Medicai School, de que no país estavam morrendo
e na ala de t r e i n a m e n t o da força a é r e a na base cerca de 3 pessoas por dia, ou 1200 por ano, devido
aérea de S h e p p a r d , Texas (Gordon, 1 9 9 0 ) . a choques elétricos relacionados com
Nas d é c a d a s de 60 e 70, com a e v o l u ç ã o e equipamentos médicos (Friedlander, 1 9 7 1 ; Dalziel,
participação c a d a v e z maior da t e c n o l o g i a nos 1 9 7 2 ) . E s t e s d a d o s não f o r a m d e v i d a m e n t e

1
Prof. M.Sc. do Curso de Engenharia Elétrica / Centro de Tecnologia e Urbanismo / UEL (ernesto@uel.br)
2
Prof. Dr. do Depto. de Engenharia Biomédica / Faculdade de Eng. Elétrica e Computação/ UNICAMP

Semina: Ci. Exatas/Tecnol., Londrina, v. 21, n. 4, p. 27-33, dez. 2000 27


c o m p r o v a d o s , mas desde então c o m e ç o u a se 1977). C o m isto, a o s p o u c o s os engenheiros foram
p r e s t a r m a i s atenção n o fator s e g u r a n ç a d o s ocupando esses e s p a ç o s em hospitais e instituições
e q u i p a m e n t o s médicos, mais e s p e c i f i c a m e n t e a ligadas à saúde o n d e os s e u s conhecimentos de
s e g u r a n ç a elétrica. Na época não h a v i a l e g i s l a ç ã o engenharia p u d e s s e m a s s e g u r a r a implementação
do g o v e r n o dos Estados Unidos para c e r t i f i c a ç ã o efetiva e segura de n o v a s tecnologias na área da
dos e q u i p a m e n t o s médicos a n t e s d e s e r e m saúde.
l a n ç a d o s n o mercado. Segundo J u r g e n ( 1 9 7 3 b ) , Na mesma d é c a d a de 7 0 , Thomas Hargest, o
p o d i a - s e projetar, fabricar e colocar à v e n d a um primeiro engenheiro c l í n i c o certificado da história,
m a r c a - p a s s o sem autorização prévia do g o v e r n o e C é s a r Cáceres c r i a r a m o t e r m o engenheiro
ou q u a l q u e r outra entidade de fiscalização. Criou-se clínico, para d e n o m i n a r o engenheiro responsável
um i m p a s s e : Como resolver este p r o b l e m a ? A pelo gerenciamento de equipamentos de um
normalização, via legislação, diminuía a possibilidade hospital, através de c o n s e r t o s , treinamento de
de p r o d u t o s inseguros e não-efetivos e n t r a r e m no usuários, verificação da s e g u r a n ç a e desempenho,
m e r c a d o , mas ao mesmo t e m p o a d i a v a o e especificações t é c n i c a s para aquisição (Gordon,
l a n ç a m e n t o de produtos que podiam salvar v i d a s . O 1990). Assim, c o m e ç o u a se estabelecera profissão
FDA (Food and Drug Administratiori) foi e n c a r r e g a d o de engenheiro clínico n o s Estados Unidos, que foi
de t r a z e r u m a solução para esta q u e s t ã o , ou seja, o país berço da e n g e n h a r i a clínica mundial.
elaborar n o r m a s , fazer registros, realizar i n s p e ç õ e s , Na década de 8 0 , h a v i a crise de identidade dos
o r i e n t a r r e v i s õ e s cientificas e s u g e r i r m e l h o r e s engenheiros clínicos f r e n t e aos administradores,
práticas de manufatura. m é d i c o s e e n f e r m e i r a s q u e , por não terem
A solução apresentada pelo FDA foi a de classificar conhecimentos t é c n i c o s s o b r e equipamentos, não
o s e q u i p a m e n t o s médicos como m e d i c a m e n t o s . d a v a m o devido r e s p e i t o , cooperação e aceitação
A s s i m , o s e q u i p a m e n t o s receberiam o m e s m o aos engenheiros c l í n i c o s ( G o o d m a n , 1989) Isto
t r a t a m e n t o d a d o aos medicamentos. E s t a m e d i d a se d e v i a ã:
r e v e l o u - s e ineficaz, pois o processo de c e r t i f i c a ç ã o - definição muito a b e r t a de engenharia clínica
e x i g i a m u i t o tempo e dinheiro dos f a b r i c a n t e s , o ( a p l i c a ç ã o d o s p r i n c í p i o s de e n g e n h a r i a e
que i n v i a b i l i z a r i a as pesquisas e c o m e r c i a l i z a ç ã o habilidades g e r e n c i a i s na saúde) que gerava
d o s s e u s p r o d u t o s . C o m isto, o s f a b r i c a n t e s conflito com a d m i n i s t r a d o r e s , médicos e
c o m e ç a r a m a procurar outras certificações m e n o s enfermeiras q u a n t o às demarcações de
r i g o r o s a s , c o m o a da Federal Food and Drug e s p a ç o . Havia f a l t a de entendimento claro no
Cosmetic Act, que verificava se os e q u i p a m e n t o s estabelecimento d a s atribuições;
f u n c i o n a v a m de acordo com o a n u n c i a d o pelos - a profissão não e r a b a s e a d a num bem definido
f a b r i c a n t e s , e proibia a venda de e q u i p a m e n t o s conjunto de c o n h e c i m e n t o s . Segundo Shaffer
a d u l t e r a d o s o u desmembrados, m a s n ã o t e s t a v a & Shaffer (1989), os e n g e n h e i r o s de campo
a s e g u r a n ç a e eficácia do mesmo. Isto m o s t r o u tinham desprezo pelas credenciais acadêmicas.
q u e , a l e g i s l a ç ã o do FDA sobre e q u i p a m e n t o s M a s para criar t r a d i ç ã o cultural e misticismo
m é d i c o s necessitava de mudanças e q u e t a m b é m em torno da p r o f i s s ã o , deveriam existir regras
havia a necessidade de uma legislação g o v e r n a m e n t a l de grupo, as q u a i s f a z e m a união e força de
sobre o c a s o . Então começaram as pressões de v á r i o s u m a profissão. E s t a s r e g r a s de grupo somente
g r u p o s e associações civis n ã o - g o v e r n a m e n t a i s poderiam ser c r i a d a s c o m o estabelecimento
para q u e se estabelecessem p r o t o c o l o s de de escolas de e n g e n h a r i a clínica baseadas em
c e r t i f i c a ç ã o de equipamentos m é d i c o s mais c o n h e c i m e n t o s f o r m a i s e padronizados;
r e a l i s t a s , e que tivessem a autorização legal do - a profissão n ã o t i n h a u m a o r g a n i z a ç ã o de
g o v e r n o . D e p o i s de muitas discussões e d e b a t e s representação forte. Isto decorria do fato de que
n a c i o n a i s , a l é m d e várias t e n t a t i v a s d e q u e o n ã o havia um c o n s e n s o sobre as atribuições
a s s u n t o f o s s e colocado em pauta no s e n a d o e no específicas do e n g e n h e i r o clínico, assim, não
c o n g r e s s o , em 28 de maio de 1976 foi a p r o v a d a s e conseguia f a z e r u m a associação d e classe
pelo P r e s i d e n t e Ford uma legislação ( P L 9 4 - 2 9 5 ) c o m profissionais q u e t i v e s s e m o s mesmos
s o b r e e q u i p a m e n t o s médicos r e q u i s i t a n d o q u e o s objetivos. A l é m d i s s o , o processo de
2 0 0 0 d i f e r e n t e s fabricantes d e e q u i p a m e n t o s certificação, s e g u n d o G o r d o n (1990), feito pela
m é d i c o s n o s Estados Unidos e s t a b e l e c e s s e m a I C C ( I n t e r n a c i o n a l C e r t i f i c a t i o n Comission)
s e g u r a n ç a e eficácia dos s e u s p r o d u t o s e s t a v a fora da r e a l i d a d e das leis de mercado
s u b m e t e n d o - o s ã aprovação da F D A , a n t e s que ( d a v a muita ê n f a s e à parte técnica, deixando
e s t e s f o s s e m postos no mercado. Isto g e r o u a de lado a parte g e r e n c i a l da engenharia clínica).
n e c e s s i d a d e d e contratação imediata d e m a i s d e C o m o se o b s e r v a , a e n g e n h a r i a clínica apesar
3 0 0 e n g e n h e i r o s biomédicos e e l e t r o - e l e t r ô n i c o s
de ter sido e s t a b e l e c i d a há algumas décadas nos
p a r a t r a b a l h a r nos escritórios d a F D A ( J u r g e n ,
Estados Unidos, a i n d a s o f r i a alguns problemas de

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identidade c o m u n s a q u a l q u e r nova profissão. Esta p u b l i c a ç õ e s , a p r e s e n t a ç õ e s e p a r t i c i p a ç ã o na
situação s o m e n t e p o d e r i a ser melhorada através s o c i e d a d e profissional. O objetivo é n ã o d e i x a r o
do estabelecimento de u m a sociedade profissional e n g e n h e i r o clínico se isolar, pois a e x p e r i ê n c i a de
de engenharia c l í n i c a (Arthur & Boxerman, 1981) t r a b a l h o só c o n t a 1 ponto por a n o , i n d u z i n d o - o a
para: e s t a r s e m p r e reciclando seus c o n h e c i m e n t o s .
- e d u c a r os c o n s u m i d o r e s ( a d m i n i s t r a d o r e s , No início da d é c a d a de 90, o g o v e r n o federal
médicos e e n f e r m e i r a s do hospital) sobre as n o r t e - a m e r i c a n o c o m e ç o u a reduzir os c u s t o s c o m
atribuições d o s e n g e n h e i r o s clínicos; s a ú d e a t r a v é s d o c o n t r o l e e f i s c a l i z a ç ã o dos
- orientar os f o r m a d o r e s de engenheiros clínicos s e r v i ç o s m é d i c o s para assegurar q u e o s m é t o d o s
na elaboração d o s currículos básicos de d e t r a t a m e n t o utilizados f o s s e m m a i s e f i c i e n t e s ,
engenharia c l í n i c a ; s e g u r o s e baratos. O pagamento por c o n s u l t a para
- promover o e n v o l v i m e n t o crescente dos o s m é d i c o s , e s p e c i a l m e n t e o s c i r u r g i õ e s , sofreu
engenheiros c l í n i c o s em todas as áreas u m a redução. C o m isto, os médicos foram i n c e n t i v a d o s
e n v o l v i d a s c o m a l t a t e c n o l o g i a , bem c o m o a utilizar tecnologias que r e d u z i s s e m o t e m p o de
participar dos p r o c e s s o s de tomada de decisão tratamento dos pacientes a fim de que m a i s p e s s o a s
nas instituições d e s a ú d e . f o s s e m a t e n d i d a s (Federal... 1 9 9 0 a ; 1 9 9 0 b ) . É
n e s t e ponto q u e e n t r a m os e n g e n h e i r o s clínicos,
A partir da d é c a d a de 80 começou a se pensar
pois eles têm, através da avaliação e gerenciamento
no engenheiro c l í n i c o não apenas c o m o o
tecnológicos, a habilidade e competência necessárias
responsável p e l o s e q u i p a m e n t o s dos hospitais,
para ajudar o corpo médico dos h o s p i t a i s a e s c o l h e r
m a s sim c o m o u m e l e m e n t o que p o d e r i a t e r
a m e l h o r t e c n o l o g i a e a ajudar a i m p l e m e n t á - l a e
participação ativa n a s á r e a s de transferência de
utilizá-la de m a n e i r a segura e p r o d u t i v a .
tecnologia, a v a l i a ç ã o tecnológica e gerenciamento
tecnológico. A p e s a r d e t e r relação c o m c a d a u m a Atualmente, os engenheiros clínicos a i n d a b u s c a m
destas a t i v i d a d e s , a engenharia clínica se c o n q u i s t a r o s e u e s p a ç o nos h o s p i t a i s . A ê n f a s e
aproximou delas d e m a n e i r a não-sistemática. Isto d a d a à s e g u r a n ç a nas décadas de 60 e 7 0 , passou
limitou o impacto e o p a p e l do engenheiro clínico a s e r d a d a para o custo e eficácia n a s d é c a d a s de
nestas áreas ( G o o d m a n , 1991). 80 e 90. Pode-se dizer que se p a s s o u da " e r a do
micro-choque" para a "era da contabilidade" ( P a c e l a ,
Em 1991, o C o l é g i o A m e r i c a n o de Engenheiros
1 9 8 8 a ; 1988b).
Clínicos (American College of Clinical Engineers -
ACCE) criou o u t r a d e f i n i ç ã o para servir de o p ç ã o
mais realista p a r a os e n g e n h e i r o s clínicos. Esta 3 H I S T Ó R I C O NO B R A S I L
definição dava ê n f a s e à parte administrativa e de
gerenciamento e a v a l i a ç ã o de tecnologias (Bauld, No Brasil, em 1989 o Ministério do B e m - e s t a r
1991). e d a Previdência Social estimou q u e d e 2 0 a 4 0 %
A partir de j a n e i r o de 1994, o ICC renovou o d o s equipamentos médicos no Brasil estavam
seu método de c e r t i f i c a ç ã o . Para manter válida a d e s a t i v a d o s por falta de c o n s e r t o , p e ç a s de
sua certificação, os e n g e n h e i r o s clínicos e os r e p o s i ç ã o , s u p r i m e n t o s ou até i n s t a l a ç ã o ( W a n g
técnicos biomédicos a g o r a são obrigados a manter & C a l i l , 1991). C o m o o parque de e q u i p a m e n t o s
níveis de c o n h e c i m e n t o s profissionais e tarefas e s t a v a estimado em U$5 bilhões, isto r e p r e s e n t a v a
consistentes c o m as normas nas quais a u m d e s p e r d í c i o d e mais d e U $ 1 b i l h ã o . A l é m
certificação inicial f o i o b t i d a (Farmer, 1996). Este d i s s o , a m a n u t e n ç ã o dos m e s m o s , q u a n d o era
processo é c h a m a d o de re-certíficação, e consiste f e i t a , ficava a cargo de fabricantes ou seus
na c o m p r o v a ç ã o , p o r p a r t e dos candidatos, de representantes que nem sempre e r a m bem-
atividades d e s e n v o l v i d a s na área. Para isto, o intencionados. Muitos hospitais ao tentar estabelecer
candidato deve a l c a n ç a r no mínimo 15 pontos em s e u s grupos internos de m a n u t e n ç ã o de
um período de t r ê s a n o s , nas cinco categorias equipamentos deparavam-se com p r o b l e m a s c o m o :
abaixo relacionadas: — falta de recursos humanos e s p e c i a l m e n t e
- cursos (10 p o n t o s ) ; t r e i n a d o s para a função;
- publicações e a p r e s e n t a ç õ e s (10 pontos); — f a l t a de d o c u m e n t a ç ã o s o b r e s e g u r a n ç a de
- participação n a s o c i e d a d e profissional ( 1 0 e q u i p a m e n t o s , o u até m e s m o i g n o r â n c i a d a
pontos); existência d a m e s m a ;
- outras atividades profissionais (10 pontos); — f a l t a de c o o p e r a ç ã o dos f a b r i c a n t e s ou
- experiência de t r a b a l h o (1 ponto a cada ano r e p r e s e n t a n t e s dos e q u i p a m e n t o s , que
de trabalho). dificultavam a aquisição de p e ç a s de r e p o s i ç ã o
A re-certificação dá ê n f a s e à formação contínua e de d o c u m e n t a ç ã o técnica;
do engenheiro c l í n i c o ( c u r s o s ) e à sua interação — burocracia do governo para p o d e r importar
c o m outros e n g e n h e i r o s c l í n i c o s , a t r a v é s d e p e ç a s ou e q u i p a m e n t o s de t e s t e s .

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Com isto, ficou evidente a necessidade da criação Sanitária. Até então, apesar do Ministério da Saúde
de grupos de engenharia clínica por todo o país. ter a o b r i g a ç ã o , estabelecida por lei desde 1973
No estado de São Paulo, com a unificação de todos (ver Apêndice), de avaliar a qualidade dos produtos
os serviços públicos em 1987, houve a possibilidade para d i a g n ó s t i c o antes de a u t o r i z a r a sua
de estabelecer u m a política de e q u i p a m e n t o s que comercialização, não se fazia qualquer controle
integrava pesquisa, desenvolvimento, e regulamentação dos e q u i p a m e n t o s e seus s u p r i m e n t o s (Costa et
em todas as fases do ciclo-de-vida dos m e s m o s . ai., 1 995). Isto mostra que, no Brasil já c o m e ç o u a
A implantação foi feita por um grupo multidisciplinar haver u m a maior preocupação c o m a segurança
que criou uma rede de manutenção e gerenciamento dos e q u i p a m e n t o s m é d i c o s . A p e s a r d i s s o , a
tecnológico (Wang, 1990). Posteriormente, o governo engenharia clínica no Brasil ainda sofria de alguns
federal estimulou a criação de escolas de treinamento males, entre os quais pode-se citar (Wang & Calil,
em engenharia clínica. 1991):
Entre 1 9 9 3 e 1995, foram instituídos cursos - falta de Informações confiáveis. Ao contrário
anuais de especialização em e n g e n h a r i a clínica, dos E s t a d o s Unidos, no Brasil muitos hospitais
financiados pelo Ministério da S a ú d e , c o m carga não tinham registros do histórico dos equipamentos
horária de 1935 horas, sendo 620 de teoria e 1.315 n e m de desempenho dos p r o g r a m a s . Assim,
de prática. E s s e s cursos foram implantados nas não se conseguia fazer a análise de custos
universidades U N I C A M P (Campinas-SP), USP e n v o l v i d o s c o m a engenharia clínica, nem a
(São Paulo-SP), U F P a (João Pessoa-PB) e U F R S implementação de programas efetivos de
(Porto A l e g r e - R S ) destinados a e n g e n h e i r o s m a n u t e n ç ã o preventiva. Isto restringiu a
elétricos que q u i s e s s e m trabalhar em hospitais. e v o l u ç ã o da engenharia clínica para o estágio
Junto com isso foi estabelecida u m a central de de g e r e n c i a m e n t o tecnológico.
referência técnica no Centro de Engenharia Biomédica - f a l t a de c o o p e r a ç ã o d o s m é d i c o s e
(CEB) d a U n i v e r s i d a d e Estadual d e C a m p i n a s administradores do hospital, que ainda
(UNICAMP). Esta central, que já existe desde 1 983, e n x e r g a v a m o engenheiro clínico apenas como
tem como objetivo adquirir d o c u m e n t a ç ã o técnica a l g u é m que somente faz a m a n u t e n ç ã o dos
e l e g i s l a ç õ e s , n o r m a s e r e g u l a m e n t a ç õ e s dos e q u i p a m e n t o s . C o m isto, o h o s p i t a l não se
fabricantes de equipamentos médicos, nacionais utilizava de todo o potencial de trabalho de um
ou e s t r a n g e i r o s , e das a s s o c i a ç õ e s civis e n g e n h e i r o clínico.
governamentais e não-governamentais dos Estados e s c a s s e z de metodologias de a ç ã o adaptadas
Unidos e outros países da Europa, para depois à realidade nacional, pois havia pouca
fornecer este material para as instituições de saúde d o c u m e n t a ç ã o técnica a respeito do assunto.
nacionais que precisarem dessas informações. No
Brasil não h a v i a ainda n e n h u m a legislação
específica a respeito de segurança ou desempenho 4 C O N S I D E R A Ç Õ E S FINAIS ( A T É 1996)
dos e q u i p a m e n t o s médicos.
Desde 1 9 9 4 , a A C C E , um dos ó r g ã o s norte- No Brasil, a falta de verbas no sistema de saúde
americanos de certificação, p a s s o u a permitir a pode permitir que os administradores hospitalares
certificação de engenheiros clínicos brasileiros. Isto vejam os engenheiros clínicos c o m outros olhos.
cria u m a indicação de qualidade para ser s e g u i d a Pois, c a b e a eles procurar novas alternativas de
pelos e n g e n h e i r o s clínicos no B r a s i l . A i n d a no g e r e n c i a m e n t o de e q u i p a m e n t o s . A engenharia
mesmo ano, depois de muitas d i s c u s s õ e s e clínica c o m c e r t e z a c o n t r i b u i r á p a r a a s novas
v o t a ç õ e s d e s d e 1 9 8 0 , foi a p r o v a d a a n o r m a p e r s p e c t i v a s na área da e n g e n h a r i a biomédica
nacional NBR IEC 601-1 (ABNT, 1994), q u e se (Calil, 1994).
baseia n a n o r m a internacional IEC 6 0 1 . 1 , que Nos Estados Unidos, tendo em vista que, desde
dispõe sobre a segurança dos e q u i p a m e n t o s a d é c a d a de 70 os problemas c o m segurança e
eletro-médicos. g e r e n c i a m e n t o de riscos para o paciente vinham
Entre 1 9 9 3 e 1996, o governo f e d e r a l publicou sendo s e d i m e n t a d o s , a p r e o c u p a ç ã o seguinte foi
u m a série de portarias (Brasil, 1993; 1 9 9 4 ; 1995; com a d i m i n u i ç ã o dos custos do ciclo-de-vida dos
1996), e s t a b e l e c e n d o prazos de até 36 m e s e s , e q u i p a m e n t o s m é d i c o s ( a q u i s i ç ã o , instalação,
para que os f a b r i c a n t e s e r e v e n d e d o r e s de m a n u t e n ç ã o , operação e desativação) e com o
equipamentos eletro-médicos f a ç a m a certificação g e r e n c i a m e n t o d e i n f o r m a ç õ e s (Technology...
dos s e u s p r o d u t o s u t i l i z a n d o o s c r i t é r i o s d e 1990a; 1 990b). Isto se explica devido às exigências
segurança dos m e s m o s , de acordo c o m a n o r m a do mercado em todas as áreas de produção e prestação
nacional NBR IEC 601.1 e c o m p l e m e n t a r e s , em de serviços por causa das filosofias de administração
laboratórios c r e d e n c i a d o s pelo I N M E T R O , para vigentes (qualidade total e reengenharia).
fins de o b t e n ç ã o de registro j u n t o à V i g i l â n c i a Q u a n t o à parte de normalização, nos Estados

30 Semina: Ci. Exatas/Tecnol., Londrina, v. 2 1 , n. 4, p. 27-33, dez. 2000


Unidos, a tendência e s t a v a s e n d o a flexibilização Resumindo, p o d e - s e relatar as mudanças no
das normas de fiscalização dos serviços de saúde. mercado n o r t e - a m e r i c a n o da seguinte m a n e i r a
N ã o se dizia mais c o m o fazer, m a s sim o q u e (Shaffer & Shaffer, 1992):
deveria ser feito. As d e c i s õ e s sobre a permissão Anos 60: s e g u r a n ç a .
de funcionamento dos hospitais seriam baseadas Anos 70: g e r e n c i a m e n t o de riscos.
mais no d e s e m p e n h o o b s e r v a d o , demonstrado, e Anos 80: custo X efetividade,
m e d i d o do que em r e c o m e n d a ç õ e s de práticas de Anos 90: balanceamento de orçamentos.
ação. O ponto chave das novas normas da J C A H O Enquanto que nos Estados Unidos a
(Joint Commission on Accreditation of Healthcare engenharia clínica foi estimulada pela necessidade
Organizations) e do p r o c e s s o de fiscalização do de aumentar a segurança elétrica dos equipamentos,
hospital é a aquisição e gerenciamento de informações no Brasil a e n g e n h a r i a clínica foi motivada p e l o
(Keil, 1994). No c a s o dos grupos de engenharia a l t o índice d e e q u i p a m e n t o s d e s a t i v a d o s o u
clínica se exige a d o c u m e n t a ç ã o detalhada de parados por falta de manutenção e treinamento
todas as metodologias utilizadas, dos resultados adequados (Wang & Calií, 1991).
destas, e o estabelecimento de registros de históricos Nos E s t a d o s U n i d o s a e n g e n h a r i a c l í n i c a
dos e q u i p a m e n t o s que p e r m i t a m u m a eventual seguiu seu c u r s o natural, ou seja, primeiro foi
f i s c a l i z a ç ã o dos ó r g ã o s g o v e r n a m e n t a i s . Por garantida a s e g u r a n ç a dos e q u i p a m e n t o s n a s
exemplo: o J C A H O , órgão governamental que décadas de 60 e 7 0 , depois tentou-se melhorar o
fornece o alvará de f u n c i o n a m e n t o dos hospitais desempenho e diminuir os custos nas décadas de
nos Estados Unidos, exigia dos engenheiros clínicos: 80 e 90. Já no Brasil, devido ao atraso na
liderança, administração de recursos humanos, implementação da profissão, pois a e n g e n h a r i a
g e r e n c i a m e n t o de i n f o r m a ç õ e s e melhoria d o s clínica só c o m e ç o u a ganhar corpo no c o m e ç o da
procedimentos para avaliar o seu d e s e m p e n h o década de 90, e s t á havendo uma aglutinação e
(Keil, 1995). C o m isto, e l e s p o d e r i a m ter u m a aceleração das t e n d ê n c i a s da engenharia clínica
perspectiva a m p l a do s e u papel em assegurar a para tentar a c o m p a n h a r a evolução e s t á v e l e
qualidade dos tratamentos médicos aos pacientes. gradativa que v e m ocorrendo nos Estados U n i d o s .

R A M I R E Z , E. F. E; C A L I L , S. J. Clinical Engineering: Part I - Origins (1942 - 1996). Semina: Ci. E x a t a s /


Tecnol. Londrina, v. 2 1 , n. 4, p. 27-33, dez. 2 0 0 0 .

ABSTRACT: In this paper, a brief description of the Clinical Engineering is presented, since its origins in
the early forties until the mid nineties in Brazil and in the United States of America. A comparison of the
situation of the Clinical Engineering in these countries is also carried out. The evolution, the current situation
and the new perspectives of the Clinical Engineering for this millennium will be discussed in another paper.

KEYWORDS: Clinical Engineering; History; Medical equipment management.


f— •

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APÊNDICE

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