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4ª AULA EM EAD

Ricardo Luis Chaves Feijó


riccfeij@usp.br

HISTÓRIA DO PENSAMENTO
ECONÔMICO II

Alfred Marshall – parte II


Princípios de Economia

 Obra máxima de Marshall. Publicado em


1890 ela ganhou oito edições
completamente revisadas pelo autor.
 A oitava edição de 1920 é considerada a
edição definitiva com as mais importantes
alterações. Da quinta à oitava edição não se
fez alterações estruturais.
 Há também uma nona edição póstuma.
 Trata-se da obra mais influente de sua era e que foi,
por muitos anos, a bíblia dos economistas britânicos,
introduzindo muitos conceitos hoje familiar a
estudantes de graduação.
 Para gerações de estudantes, professores e economistas
profissionais, os Princípios foram a suma econômica e o
compêndio básico no ensino da matéria.
 O livro teve sucesso imediato e ajudou a restabelecer
na opinião pública o prestígio e a credibilidade da
economia política.
 Voltado principalmente aos homens de negócio,
políticos e profissionais liberais, ele não se descuidava
da preocupação didática de servir de livro-texto a
estudantes especializados.
 É uma tentativa de síntese dos postulados da
economia clássica e da doutrina marginalista num todo
coerente.
 Os Princípios tornaram-se livro de consulta obrigatória
para profissionais e compêndio básico no ensino de
economia.
 A obra foi escrita em 9 anos com base nas aulas, e
reescrita ao longo de 30 anos.
Méritos dos Princípios

 Na forma: destacam-se elegância estilística, metáforas


literárias bem empregadas e emprego de magnífico
aparato matemático e de diagramas com prudência e
destreza, expressando conceitos complexos de modo
inovador e enxuto.
 Há claramente uma preocupação didática com
introduções, remissões e notas explicativas. A leitura
do livro não é árida, ele não tem a aparência dos
modernos manuais introdutórios de economia.
No conteúdo:

 Análise microeconômica de uma economia de


mercado. Articula em novas bases conceituais o
antigo paradigma clássico de uma economia com
crescimento gradual e tendência natural ao
equilíbrio.
 Marshall busca complementar e generalizar pelo uso
da matemática as teorias de D. Ricardo e J. S. Mill.
 O problema geral da distribuição econômica dos
recursos é resolvido pela ideia de que a renda dos
fatores produtivos é a contrapartida de suas
contribuições marginais.
 A teoria do valor-trabalho é complementada pela
introdução da análise de curto prazo, na qual os
determinantes do lado da demanda prevalecem sobre
os custos de produção.
 Outra peculiaridade da contribuição de Marshall é a
introdução do método de análise parcial onde ele
assume a famosa condição “tudo o mais constante”
(ceteris paribus).
Sob a roupagem da literatura a armadura
da matemática (Edgeworth)

 A análise do valor, da distribuição e dos


mercados é feita de modo essencialmente
verbal. Marshall remete todos os gráficos e
demonstrações matemáticas a notas de rodapé.
 Mesmo os raciocínios verbais têm subjacente a
eles uma sólida estrutura matemática.
 Muito do sucesso dos ensinamentos e
princípios de Marshall derivou de seu uso
eficiente de diagramas, que logo foram
imitados por outros professores em todo o
mundo.
Principais contribuições à
teoria econômica
 Metodologia: análise do equilíbrio parcial estático.
 A ideia é começar analisando um mercado em
particular sob o suposto de que variáveis afetadas pela
ação de outros mercados não se alteram.
 Depois, pelo método de composição, vai-se
acrescentando mais elementos à análise com o fito de
elucidar problemas maiores.
“A função da análise e da dedução em economia
não é forjar longas cadeias de raciocínio, mas
forjar seguramente muitas pequenas cadeias e
simples elos de ligação”.
Método ceteris paribus

 Não faz mais do que empregar o procedimento


rotineiro de análise dos homens práticos.
“As forças a serem encaradas [na análise econômica]
são tão numerosas que o melhor é tomar poucas de
cada vez e elaborar um certo número de soluções
parciais como auxiliares de nosso estudo principal.
Começamos assim por isolar as relações primárias de
oferta, procura e preço em relação a uma mercadoria
particular. Reduzimos as outras forças à inércia com a
frase ‘todos os outros fatores sendo iguais’: não
supomos que sejam inertes, mas por enquanto
ignoramos sua atividade. Esse expediente científico é
bem mais velho do que a ciência: é o método pelo qual,
conscientemente ou não, homens sensatos trataram
desde tempos imemoriais cada problema difícil da vida
ordinária.”
 Reformulação da teoria clássica do valor com o uso
do marginalismo e das noções de curto e longo
prazo.
 Uso do fator tempo: reconcilia a teoria do valor
trabalho com a ideia de utilidade marginal como
determinante do valor pela mediação do fator
tempo.
 No curto prazo, a oferta é inelástica e a demanda
determina os preços; no longo prazo a oferta é
horizontal e é ela que determina os preços.
Os Princípios representam uma contribuição
importante também pela articulação de
conceitos já propostos por outros autores agora
dentro de uma roupagem analítica mais
completa
 Elasticidade da procura.
 Noção de margem e substituição que explica como o
equilíbrio é estabelecido na teoria do consumidor e da
produção.
 Excedente do consumidor: nos Princípios, o conceito é
ostensivamente usado para mostrar que por meio de
técnica de discriminação de mercados pode-se alcançar
uma vantagem maior que a concorrência irrestrita.
 Análise da economia do estado estacionário.
Há outras inovações conceituais
absolutamente originais:

 Firma representativa.
 Quase-renda.
 Doutrina do lucro normal.
 Análise do monopólio.
 Rendimento crescente e economias externas.
Quase renda
P Quase-renda

Custo marginal

p
c
Custo variável médio

a b

Custo variável total

Q
O q
Noção de valor normal versus
valor corrente

“Estes últimos são aqueles em que os acidentes do momento


exercem uma influência preponderante, ao passo que valores
normais são os que seriam afinal atingidos se as condições
econômicas que se têm em vista tivessem tempo de produzir, sem
perturbações, os seus efeitos completos. Mas não há nenhum
abismo intransponível entre uns e outros: eles projetam as suas
sombras uns nos outros, por gradações contínuas.”
Considerações éticas
 As considerações éticas condicionam o raciocínio
econômico e as propostas de implementação prática
de reformas sociais.
 Preocupação social básica: há necessidade de
existirem pobres para que haja ricos?
 A economia é importante não apenas porque tal
ciência oferece caminho racional para otimizar o
sustento da humanidade, mas também porque ao
combater a pobreza ela elimina as fontes de
degeneração do caráter individual associadas ao
estado de privação.
Natura Non Facit Saltum

“Alguns dos melhores trabalhos da presente geração


têm, de fato, parecido, à primeira vista, antagônicos aos
de passados autores; no entanto, à medida que, com o
tempo, vão se colocando em suas devidas proporções e
suas arestas mais ásperas vão sendo desbastadas, pode
se ver que não envolvem nenhuma solução de
continuidade no desenvolvimento da ciência. As novas
doutrinas têm completado as antigas, as têm estendido,
desenvolvido e, algumas vezes mesmo, corrigido, e
frequentemente lhes têm dado outro aspecto, insistindo
de modo diferente sobre os diversos pontos; porém
muito raramente as têm subvertido.”
Crítica à ideia de Homo economicus

 É insuficiente por não levar em conta o papel da


ética na análise econômica.
Estrutura dos Princípios
 1o livro: exame preliminar com definições do objeto da
economia científica e discussão de pontos conceituais como
o significado de lei econômica.
 2o livro: exposição das noções fundamentais neste campo,
tais como riqueza, produção, consumo, trabalho, bens de
primeira necessidade, renda e capital.
 3o livro: tema das necessidades e satisfações individuais no
consumo. Aparece aí o cerne da teoria do consumidor onde
se discute utilidade, elasticidade da demanda, alocação dos
bens no consumo e intertemporalmente, e ainda:
excedente do consumidor e preço de demanda.
 4o livro: aspectos da teoria da produção e temas sobre
trabalho e organização industrial.
 5o livro: apresenta a teoria do valor de Marshall.
Livro primeiro, capítulo 1
 Definição da economia científica: estuda a humanidade
nas atividades correntes da vida. Examina a ação no que
diz respeito à obtenção de bens materiais.
 Por que combater a pobreza? Estudar as causas da
pobreza é estudar as causas da degradação de uma parte
da humanidade. A pobreza, além de afetar diretamente a
possibilidade de continuar existindo, exerce impacto
também nas condições mentais e morais dos homens.
É necessário existirem pobres?

“Nos dispomos seriamente a investigar se é


necessário haver as ditas ‘classes baixas’,
isto é, se é preciso haver um grande número
de pessoas condenadas desde o berço ao
rude trabalho a fim de prover os requisitos
de uma vida refinada e culta para os outros,
enquanto elas próprias são impedidas por
sua pobreza e labuta de ter qualquer quota
ou participação nessa vida.”
A resposta não depende só da economia, mas também da
filosofia moral e da política...

“A solução depende em grande parte de fatos e inferências que


estão na província da economia, e isto é o que dá aos estudos
econômicos seu principal e mais alto interesse.”

 Na compreensão deste problema, embora se tenha


verificado algum progresso no século XIX, assevera
Marshall que a economia está quase na infância.
Características fundamentais
da moderna vida industrial
 Independência, deliberação, projeção do futuro,
concorrência, cooperação e ética.

 A existência de concorrência é vital para o bom


funcionamento da economia, mas a cooperação é ainda
mais importante.

 Mesmo a concorrência pura envolve uma postura ética,


embora não se possa negar a existência de fraudes e abusos
nos negócios do dia a dia. Embora um ideal superior, a
cooperação entre os homens nunca seria plena, dadas as
imperfeições da natureza humana.
“Se a concorrência é posta em contraste com a enérgica
cooperação de trabalho não egoísta para o bem público, então as
melhores formas de concorrência são relativamente perniciosas, e
suas formas mais grosseiras e baixas são abomináveis. Em um
mundo no qual todos os homens fossem perfeitamente virtuosos, a
competição não teria lugar, mas o mesmo aconteceria com a
propriedade particular e qualquer forma de direito privado. Os
homens pensariam só nos seus deveres, e nenhum desejaria ter
uma quota maior de conforto e luxo do que os seus vizinhos. Os
produtores mais fortes facilmente suportariam o fardo mais pesado
e admitiriam que os seus vizinhos mais fracos, embora produzindo
menos, elevassem o seu consumo. Felizes nesta maneira de pensar,
eles trabalhariam para o bem geral com toda a energia e espírito
inventivo, e a iniciativa arrebatada que tivessem, e o gênero
humano seria vitorioso na luta contra a natureza em todas as
ocasiões. Tal a Idade de Ouro que poetas e sonhadores podem
visionar. Mas, numa conduta responsável da vida, é pior do que a
loucura ignorar as imperfeições ainda imanentes da natureza
humana.”

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