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Entre hóstias e células eleitorais: a atuação

político-ideológica da Igreja Católica no Brasil


(1929 – 1937)
 
Léia Patek de Souza (PIBIC-AF/Unioeste)
Gilberto Grassi Calil (Orientador)

Centro de Ciências Humanas, Educação e Letras – CCHEL


Campus de Marechal Cândido Rondon
Introdução
A pesquisa buscou investigar a inserção da Igreja Católica na política brasileira entre os
anos 1929 e 1937, em especial sua relação e posicionamento frente os movimentos de teor
fascista no país como a Ação Integralista Brasileira (AIB) e o processo de consolidação do regime
fascista liderado por Mussolini na Itália.

Para cumprir os objetivos da pesquisa, estudamos o objeto através de uma análise


contextual da fonte, apoiados na bibliografia escolhida sobre o tema. O principal referencial para
a análise foi a produção de Antonio Gramsci sobre a Igreja Católica e a Ação Católica, sendo
utilizado tanto como aporte teórico quanto como bibliografia contextual. A partir da leitura do
Cadernos do Cárcere – vol. 4 compreendemos a Igreja enquanto uma instituição que se
constituirá em partido político, organizando a Ação Católica como modo de inserir-se nas disputas
políticas e sociais. Além disso, sua obra contribui para compreensão das alterações que sofre a
Igreja Católica ao longo da história, internamente e externamente, teorizando sobre como tem
sido entregue à Igreja o papel de organizadora da cultura.
Objetivos
Objetivo Geral:

Analisar a inserção da Igreja Católica na política brasileira de 1920 a 1937, frente as


representações do fascismo no país, a partir de organizações sociais como o Centro Dom Vital e
a Liga Eleitoral Católica.

Objetivos Específicos:

Contextualizar as relações entre Vaticano e fascismo, pré e pós ascensão de Mussolini,


evidenciando as alterações nos diferentes cenários.
Compreender a atuação da Igreja Católica brasileira enquanto extensão do contexto vivido pela
Santa Sé na Itália.
Problematizar os objetivos da Igreja na criação de organizações sociais e políticas, atentando
para com quais classes sociais dialogavam.
Investigar a construção de vínculos do clero nacional com o integralismo e com regime de
Vargas pós-golpe de 1930, evidenciando as especificidades de cada caso.
Material e Métodos
Em setembro de 2020, iniciamos as atividades da pesquisa com a procura das fontes nos
acervos digitais disponibilizados por universidades e centros de documentação. Com as
possibilidades de acesso a documentos ainda não digitalizados limitadas, devido a pandemia do
novo coronavírus, redirecionamos nossa busca para a revista A Ordem. Com a disponibilidade da
revista na Biblioteca Nacional Digital, conseguimos realizar a busca inicial do tema em suas
páginas. Antes de trabalharmos propriamente com a fonte, realizamos uma instrução teórica, a
partir da leitura e síntese da bibliografia contextual e teórica utilizada na pesquisa.

Considerando os prazos de uma pesquisa de iniciação científica, delimitamos quais textos


da revista iríamos analisar, dentro do recorte temporal indicado. Realizamos a busca do termo
“fascismo” dentre o conteúdo da revista, nas edições disponíveis na Biblioteca Nacional Digital.
Encontramos 53 ocorrências do termo, presentes em 34 das 73 edições publicadas entre 1930 e
1937, com exceção do ano 1934 que não se encontra disponível. Catalogamos as edições em
que havia ocorrência do termo, fichando-as e analisando seu conteúdo.
Resultados e Discussão
 Igreja Católica no Brasil e processo de romanização: hierarquização das relações e
tentativa de homogeneização do catolicismo nacional (Rosa, 2011; Gramsci 2007).

 Instituição de grupos de católicos leigos militantes e a Ação Católica: incentivo à


participação na vida social e política do país a fim de disseminar e defender os preceitos
católicos (Parga, 2012).

 Criação da revista A Ordem e Centro Dom Vital no intuito de “encontrar soluções para o
problema que consideravam o mais grave do país: a ausência do catolicismo da vida pública.”
(Arduini, 2014).

 Frentes de atuação múltiplas como o meio intelectual a partir d’A Ordem, e publico geral a
partir da imprensa católica (Parga, 2012; Arduini, 2014).

 Com recorrência debates e publicações sobre o fascismo. Na revista, o tema surgia de


diferentes perspectivas e com diferentes posicionamentos à seu respeito, já na imprensa
católica era comum um abordagem positiva em relação ao fascismo italiano.
Resultados e Discussão
Os textos presentes da revista não apresentavam homogeneidade de posições. É
possível encontrar em suas páginas desde elogios e defesa direta do regime fascista, ao desdém.
É comum nas análises católicas uma aproximação do fascismo ao comunismo, geralmente
com uma defesa de que nenhum dos dois seria adequado para a sociedade, segundo os moldes
católicos.

O fundamento philosophico do bolchevismo é o monismo materialista. Ao passo que o


fundamento philosophico do fascismo é o monismo idealista, derivado tambem de Hegel, como foi
a principio o pensamento philosophico de Marx, mas alterado e convertido em néo-hegelianismo,
pelos dois grandes philosophos da Italia moderna Croce e Gentile. (Editorial, 1931)

Mas o fascismo restaura no seu primeiro termo a formula christã, e encaminha o segundo, o que
permitte dizer delle, que é o mais christão dos systemas politicos modernos. Para a sociologia
catholica todo o trabalho será de exceder o finalismo fascista incorporando-lhe os demais
elementos da sua propria formula. (Dantas, 1931, grifos do autor)
Resultados e Discussão
Podemos observar como um discurso que se pretende a um afastamento de tomada de
posição, uma neutralidade, (Rosa,2011) tratam do fascismo italiano e alemão, como exemplos de
“contenção de danos”, e até solução, para uma sociedade em processo de destruição pelos
males do liberalismo, materialismo e laicidade.

Nossa pregação anti-liberal não significa uma adesão ás doutrinas que o liberalismo se antepõem
como o “Fascismo” e, agora, o “Rascismo”. Sem duvida, praticamente tanto o regimen em
vigor na Italia quanto o que domina a Allemanha dos nossos dias, representam para as
perspectivas nacionalidades uma solução imediata para os mais graves problemas ali
surgidos depois da guerra. Tambem significam uma reação oportuna contra os elementos de
dissolução da sociedade. (A Ordem, 1933)
Resultados e Discussão
A partir das considerações de Rosa (2011), e teorizações de Gramsci (2007)
compreendemos que o contexto de atuação e organização política leiga e clerical no Brasil,
a partir do anos 1920, tem vinculações com todo o processo de reorganização política da
Santa Sé, imposta pelas forças históricas em voga no período, que se tratando das elites,
pressionavam no sentido de uma política liberal e laica, e se tratando dos trabalhadores, no
sentido da contestação das estruturas sociais e econômicas que os oprimiam. Nesse
cenário, a Igreja assume uma postura defensiva, mas não inerte, uma vez que irá se
rearticular internamente, alterando as formas de contato com as dioceses brasileiras a fim
de reordenar a postura dos bispos e padres de acordo com os interesses de Roma, e se
colocará, em constante diálogo com o Estado, seja por vias clericais e estatais após o
Tratado de Latrão, ou leigas e militantes, com a organização política de movimentos sociais,
ou a inserção nos já existentes.

A Ordem nos permite acessar os debates e posicionamentos adotados pelos


intelectuais católicos leigos, comprometidos em disseminar ideias para que os fiéis se
guiassem politicamente de acordo com os preceitos e indicações católicas.
Conclusão
Compreendemos a atuação política da Igreja Católica brasileira como auxiliar no
processo de disseminação e consolidação dos ideais fascistas no Brasil. A luta
comum, entre o pensamento social cristão e o fascismo, que travava contra o
comunismo se constitui como uma das principais pontes entre a atuação política dos
dois movimentos, juntamente com o desprezo pelo liberalismo. Partindo da concepção
gramsciana sobre a realidade clerical do período como um partido, a revista A Ordem
servia como instrumento de disseminação da cultura política católica e, portanto,
intervia na disputa ideológica em voga em seu meio, podendo conter posições
contraditórias, mas poucas vezes excludentes, que auxiliavam a formar o pensamento
político-ideológico brasileiro.

A luta comum entre o pensamento social cristão e o fascismo contra o


comunismo se constitui como uma das principais pontes entre a atuação política dos
dois movimentos, juntamente com o desprezo pelo liberalismo.

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