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ANAIS DO I COLÓQUIO
ARTIGOS EIXO I
Outubro de 2013
ANAIS DO I COLÓQUIO
ARTIGOS EIXO II
ISSN 2358-0151
Manuela Barreto
Pró-Reitora de Extensão
Antonio Amorim
Pró-Reitor de Ensino de Graduação
Djalma Fiuza
Pró-Reitoria de Infraestrutura e Inovação – Proinfra
SUMÁRIO
RESUMO: O objetivo desse artigo é refletir sobre o trabalho nas classes multisseriadas, com
foco nos aspectos voltados para a formação profissional dos professores e professoras e sua
prática pedagógica. Para tanto, será levado em consideração a escuta atenta da voz de uma
professora que atua em classes multisseriadas, como veículo de comunicação e
entrelaçamento com as práticas de tantos outros professores e professoras e com
fundamentação teórica que aborda essa questão. A aproximação das histórias de vida de
professores e professoras de classes multisseriadas e, com isso, de suas práticas pedagógicas,
seus saberes e processos de formação profissional possibilita um debruçar sobre uma questão
tão pouco pesquisada e focalizada no cenário nacional, muitas vezes abandonada em se
tratando de escolas rurais e multisseriamento.
Palavras-chave: Classes multisseriadas; história de vida; narrativa oral; formação
profissional; prática pedagógica
Introdução
O presente artigo tem como objetivo discutir sobre a formação profissional e prática
pedagógica nas classes multisseriadas, por meio da história oral de uma professora. Para tanto
alguns questionamentos são importantes: Como os docentes se percebem como profissionais
atuando em classes multisseriadas? Como avaliam as suas próprias práticas? Como se
sentem? Essas têm sido questões abordadas em pesquisas contemporâneas (SANTOS e
MOURA, 2012; SOUZA 2012) que buscam romper com o silenciamento dos educadores das
escolas rurais e com o apagamento das práticas pedagógicas das classes multisseriadas na
história da educação brasileira. Nesse sentido Santos e Moura (2010) afirmam que:
Nesse ínterim este trabalho inscreve-se no âmbito dessas produções por compreender
que visões fabricadas da escola rural e de suas práticas pedagógicas escamoteiam o abandono
desse território pelas políticas públicas e corroboram com os ditames das políticas neoliberais
para a educação sob a lógica das linhas abissais (SANTOS, 2007). A partir delas legitima-se o
uso dos conceitos de centro e de periferia e a distribuição desigual de bens culturais e
econômicos, percebido pelo descaso no tratamento das escolas/classes multisseriadas com
arquitetura inadequada, insuficiência e/ou inadequação de recursos e mobiliário escolar e
precariedade de transporte escolar. É comum ouvirmos dizer que a nomeação do profissional
para trabalhar em classes multisseriadas, rurais, torna-se um castigo, algo temido por muitos,
seja pelas longas distâncias, seja pelas condições de trabalho precárias oferecidas.
Tomo como referência as narrativas da professora Nelma Silva Serafim, que através
da narrativa oral com trechos da sua trajetória de vida nos convida a refletir sobre os sentidos
e significados das escolas rurais tendo como cerne as classes multisseriadas, bem como os
desafios que precisamos enfrentar para a qualificação das práticas pedagógicas nesse âmbito.
A análise dos sentidos produzidos por meio dessa narrativa, como nos traz Rios (2011) “[...]
possibilitou o contato direto com as fontes vivas, repletas de sentidos, silêncios e saberes, uma
1
Atuação como formadora de educadores e coordenadora pedagógica regional no Instituto Chapada de Educação
e Pesquisa, que atua em 20 municípios da Chapada Diamantina, semi-árido baiano e em 3 municípios de
Pernambuco.
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Nelma Silva Serafim é professora de classes multisseriadas há 6 anos, no município de Itaetê-Ba, na Chapada
Diamantina. A entrevista foi realizada no dia 13 de novembro de 2012.
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vez que as histórias de vida são unidades orais de interação social que expressam o nosso
sentido de ser e de pertencimento...”.
Para tanto, a análise aqui realizada, é ancorada nas seguintes categorias: formação
profissional e prática pedagógica na classe multisseriada, já que estas podem contribuir para
uma análise em que se entrelaçam fatores relacionados aos saberes e fazeres em sala de aula,
processos de formação e história de vida, concordando com Souza e Santos quando destacam
que
Para a professora Nelma Serafim o fato de ter nascido na localidade em que atua hoje
e de ter estudado em escola multisseriada os anos iniciais do ensino fundamental, foi
importante; há nela uma concepção e tratamento da multisseriação como uma possibilidade
real e não como uma anomalia, um arremedo como muitos a veem; depois, o fato de ser da
comunidade lhe outorga uma autoridade e respeito diante das famílias e dos próprios alunos.
Um passo importante que precisamos dar, de forma geral, é o que colocam Souza e
Santos quando afirmam que acreditam e apostam na heterogeneidade e singularidade das
classes multisseriadas e que há a necessidade de políticas que, dentre outras coisas, fixem os
sujeitos “nos seus territórios de origem, com dignidade, condições de vida e potencializando-
os para a transformação dos espaços onde habitam, a partir do trabalho das escolas no
contexto rural.”
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Com isso o fato de ter nascido na comunidade rural e lá permanecer até hoje é um
ponto que aparece, com ênfase, na fala da professora: “Comecei com 8 anos, numa classe de
multisseriada, fiz até a 4ª série, passei dos oito aos quatorze anos na classe multisseriada...
Hoje ainda moro na linha Central, a gente ainda não mudou, permaneço no meu lugar de
infância.”
Nesse aspecto aparecem duas questões que eram comuns àqueles que moravam em
localidades rurais afastadas dos povoados e da sede do município – entrada tardia na escola –
aos oito anos de idade, e muitos anos para completar o ensino fundamental - passagem para o
fundamental II com quatorze anos de idade.
[...] aí tinha minha irmã que dava aula na classe multisseriada e sempre
quando tinha alguma coisa assim com ela eu ia sempre substituir ela, dava
aula, dava sempre aula pra ela quando ela tinha algum imprevisto ou quando
ela saía, sempre dava aula pra ela, aí quando chegou o tempo aí ela ficou
noiva, casou e tinha que ir pra São Paulo e aí ela pediu pra mim ficar né no
lugar dela causa das criança que não aceitava outro professor, eu já era
conhecida lá, os pais pediam e também uma opção assim pra ajudar minha
família no orçamento em casa. (NELMA)
[...] as crianças e os pais são muito apegados comigo lá, foi assim uma
experiência boa, até que teve uma fala lá, eu fui pra São Paulo, viajei final de
ano e demorei de voltar e os pais foi lá em casa, bastante pais atrás de mim
porque (pensavam que) eu não ia ensinar mais, e que não queria outro
professor lá, se apegaram muito comigo, foi atrás de Arlete (coordenadora),
de outros lá, aí Arlete falou: “Não, Nelma tá voltando”, aí quando eu voltei
fez aquela festa. Aí esse ano eu tô indo de novo, aí eu falei: “Vou ter que
explicar direitinho pra não fazer confusão na cabeça dos meninos e nem dos
pais, que eu tô indo mas eu volto”.
Com tudo isso, é relevante pontuar sobre as relações que são travadas no contexto
educacional, nesse caso especificamente sobre as escolas multisseriadas rurais, até mesmo
porque
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Elementos que se entrelaçam e são colocados por Nelma quando ela retoma o tempo
de estudante em que vem à tona a descontinuidade das aulas devido às muitas faltas dos
professores, pelos longos deslocamentos e problemas com transporte:
[...] um professor assim que faltava muito porque não tinha transporte, era
longe, ele morava em Colônia (povoado) pra vir pra zona rural, aí às vezes
ele vinha, a bicicleta furava o pneu, aí voltava pra trás. Aí quando foi outra
professora de Itaetê, que começou morar lá próximo do prédio mesmo, na
quarta série, na quarta série que eu fui me desenvolver um pouco.
O fato de estar em contato próximo com a comunidade escolar, interagir com ela,
contribui para que as relações favoreçam um ponto muito discutido atualmente e requisitado
em todas as esferas educacionais – no âmbito rural ou urbano: a presença da família na escola.
No caso específico das escolas rurais em que os professores moram na localidade ou próximo
a ela a possibilidade é de que esse entrosamento traga ganhos para o trabalho e aprendizagem
dos alunos.
Essa relação de pertencimento, por estar tão próximos uns dos outros, morarem na
mesma localidade, a família ter no professor uma autoridade, pode também demarcar uma via
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perigosa, em que, como coloca Rios (2011, p.14) “A política do silêncio lá prevalecia,
silêncio total, marcado pela ideologia do discurso escolar, a qual se baseava em tudo dizer
para nada ouvir...” Isso traz os dois lados da moeda, o fato de o pertencimento ser um fator
que agregue valor à escola, ao estreitamento das relações entre a professora e comunidade
escolar, e ao mesmo tempo gerar situações em que impere a imposição e cobrança.
Porém, quando bem cuidada essa relação de pertencimento pode contribuir muito com
o aprendizado, como podemos ver no trecho da fala da professora Nelma, em que considera a
interação muito importante:
Esse sentido é percebido pela professora Nelma quando ela defende que “As
formações [...] contribuem muito para o crescimento profissional dos professores, que ali é
um momento em que reúne vários professores, é um tirando a dúvida do outro com a
formadora.”
momento pra produzir sequência junto com Arlete, tirar as dúvidas, falar
sobre os avanços dos meninos, pedir ajuda: “Ah, fulano não tá avançando, ô
Arlete o que é que eu tenho que fazer pra ajudar?”, pedir ajuda pra ela
mesmo. Ó, o planejamento é de duas horas, mas a gente chega duas horas da
tarde e quando tem muita coisa pra fazer a gente fica até sete horas da noite.
Em se tratando de formação externa, essa deve ser uma aliada da formação interna,
contribuir para que essa se fortaleça e siga contribuindo para qualificação das práticas
profissionais dos coordenadores pedagógicos e professores. Por isso os programas de
formação continuada não podem se ater apenas aos conteúdos, a uma concepção
essencialmente intelectual, que se preocupa mais com o produto do que com o processo, haja
vista que é no percurso formativo, no caminho trilhado pelos professores que as
aprendizagens vão se configurando. Mas quando isso não é uma premissa do programa d e
formação continuada o que acontece é que até consegue-se avanços no campo conceitual, no
campo de domínio dos conteúdos, mas pouco se muda na prática da sala de aula, haja vista
que as mudanças de concepção são complexas e precisam partir de um panorama que integre
o professor na sua inteireza, na sua “complexidade do ser/existir humano” (SCOZ, 2011,
p.48).
Esse é um desafio que deve ser encarado à medida que o professor reflita sobre suas
ações, tome decisões, e torne a refletir sobre as ações, o que favorece a qualificação da sua
prática. E nesse sentido tem lugar o diálogo e trabalho colaborativo, um lugar de destaque
para os processos de comunicação, sendo que
E essa relação entre identidade e alteridade que é dinâmica, fluida, também é trazida
por Rios (2008, p.54) quando focaliza que nesse caso “o centro não está no ‘eu’, nem no ‘tu’,
mas no espaço discursivo, criado entre ambos. O sujeito-professor só se completará na
interação com o outro”.
Essa percepção de sentido em construção que Rios (2008) dá ênfase contribui para que
olhemos para o estar em formação como processo de estabelecimento de relações contínuas
em que a mobilidade do saber no contato com o outro favorece que se descubra como um ser-
sendo na construção dos processos identitários.
Então, numa formação que teve lá de leitura de capa de livros né, com os
meninos que tão iniciando, que foi muito bom pros meninos do grupo cinco.
A formadora apresentou três livros com figuras quase iguais e que o aluno
tinha que descobrir onde tava escrito o nome Floresta Amazônica, em todas
tinha animais, mas aí pro menino mostrar onde tava escrito Floresta
Amazônica, o nome, aí ele poderia indicar qualquer um, mas aí a professora
ia intervir: “Por que esse?”, aí depois informar “Então, Floresta começa com
F”, “Esse título desse livro começa com F?” Pros meninos que tavam
iniciando, foi marcante assim mesmo que eu gostei e que ajudou muito na
sala de aula, que eu tava com sete meninos de grupo cinco e saíram todos
alfabéticos. Os outros que já lia com fluência, como a gente tava trabalhando
uma sequência de anfíbios, eu dava a consigna pra eles, um texto pra eles
conhecer primeiro o texto, eles tinham dez minutos pra ler o texto aí depois
que lia o texto que era pra localizar informação e também preencher uma
tabela, enquanto eles iam fazer esse trabalho eu ia fazendo com os outros cá.
(NELMA)
Toda essa significação da formação também é defendida por Nóvoa (2009) com a
argumentação de que a formação docente precisa ser construída dentro da profissão, e isso
significa que a prática da sala de aula, da escola precisa ser e ocupar a centralidade da
formação, haja vista que é na discussão sobre os problemas da sala de aula, escola, análise
sobre sua prática compartilhada com o colega, estudo, avaliação e discussão que o professor, a
professora vai se percebendo, aprendendo a profissão, aperfeiçoando e inovando, pois “Só
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Na própria escola mesmo você vai aprendendo cada dia mais, cada dia você
descobre coisas novas, diferentes, você vai ter que lidar com aquilo, vai
procurar em outros meios pra se informar. No caso quando eu entrei eu
aprendi várias coisas com os meninos mesmo, é, negócio de compreensão
leitora que a gente vai ajudando os meninos a gente vai tendo mais
conhecimento, projetos que eu não tinha conhecimentos de projeto,
seminários. Eu aprendi muito na sala de aula e na formação.
Dessa forma, vejo que o processo de formação continuada precisa contribuir, de forma
mais efetiva, para a atuação docente em classes multisseriadas, contribuindo com a premissa
colocada por Nóvoa (2009, p.30) de que “É na escola e no diálogo com os outros professores
que se aprende a profissão. O registro das práticas, a reflexão sobre o trabalho e o exercício da
avaliação são elementos centrais para o aperfeiçoamento e a inovação.” e nesse sentido a
reflexão permanente sobre a prática é um momento fundamental.
Isso sem perder de vista, ainda, que há que se ter aprofundamento teórico-
metodológico, considero que temos dado passos importantes no sentido da tematização da
prática, que como coloca Weisz (2002) significa retirar algo do cotidiano, fazer um recorte da
realidade, para transformá-lo em objeto de reflexão. É teorizar. Esse é um importante
princípio: contribuir para que a prática da sala de aula seja um objeto sobre o qual se discute,
se pensa, reflete.
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Na escola com oito anos não lia nem escrevia não, aprendi meu nome
mesmo em casa com as minhas irmãs, no caso sou a mais nova, as minhas
irmãs são mais velhas, aí me ensinou em casa. Aí eu fui aprender a ler
mesmo na quarta série, a ler mesmo e escrever na quarta série já indo pra
Colônia (povoado próximo). Ele (professor) ensinava mais a quarta série,
então a gente via a quarta série lá lendo, mas lendo, não lia na frente não, lia
na carteira assim aquela lição né, tinha que dar a lição, aí levava pra casa,
sempre na lição. Marcante foi na minha quarta série né quando eu aprendi
com a professora que chegou lá, que eu aprendi a armar a continha e efetuar
que eu não sabia de jeito nenhum.
Essa prática era contraposta com exemplos, relatos que a professora ia trazendo sobre
a sua prática atual, em que coloca em ação o que aprende nas formações – externas e internas,
por meio da articulação com o contexto de trabalho, tendo como eixo principal a sala de aula.
papel de leitores desde cedo. E como fazer para que os mais novos e os mais velhos
aprendam, sem forçar demais para uns ou simplificar demais para outros? Essa é uma questão
presente no dia-a-dia dos professores de classes multisseriadas, e que a professora Nelma vai
procurando respondê-las de forma tão empenhada e preocupada em favorecer com que todos
aprendam, trazendo um ponto bem importante: trabalho com agrupamentos produtivos.
modelo vigente isso ainda impera, seja no momento da avaliação, seja no momento de
emissão de transferência.
Outro fator preponderante colocado pela professora e que precisamos destacar é com
relação ao tempo didático numa classe multisseriada, pois temos claro que
[...] uma classe multisseriada não é uma soma de séries justapostas. Para
entendê-la na sua especificidade, é fundamental assumi-la como uma
totalidade una e diversa ao mesmo tempo, a fim de não dicotomizá-la [...] as
classes multisseriadas, ao mesmo tempo em que podem ser vistas como algo
fragmentado, são também coesas na sua forma particular de existir, pois esta
coesão é uma característica das sociedades contemporâneas. (PINHO e
SOUZA, 2012 p.262)
Considerações Finais
Porém os desafios ainda são muitos a serem enfrentados, destacarei alguns, retirados
do intercâmbio com a história de vida da professora Nelma Serafim, tais como escassez de
recursos pedagógicos, acervo literário, saber sobre como gerir uma classe multisseriada,
organizar o currículo em todas as áreas do conhecimento. Esses são alguns dos desafios que
precisam, cada vez mais, ser encarados pelos governos nas esferas federais, estaduais e
municipais, mas também os programas de formação inicial e continuada no sentido de não
ignorarem o multisseriamento, mas tocarem, efetivamente, nessa temática favorecendo um
olhar para o currículo, para os projetos político-pedagógicos das escolas e possibilitando aos
professores refletirem sobre suas práticas e tomarem decisões sobre elas tendo em vista a
aprendizagem significativa de todos os alunos.
Referências
RESUMO: Este artigo discute sobre as classes multisseriadas em seu contexto histórico,
socioeconômico, cultural e organização pedagógica, retratando o silenciamento, abandono e
preconceito nessas classes. Para tanto, procuramos fundamentar nossas reflexões e discussões
através das experiências relatadas pelos alunos do meio rural em seu contexto específico. O
texto traz discussões sobre os impactos políticos que envolvem essa modalidade de ensino,
considerando que mesmo neste contexto desfavorável onde pesam as políticas
compensatórias, as classes multisseriadas resistem. Tratamos ainda nesta tessitura sobre o
processo de aprendizagem nas classes multisseriadas, provocando reflexões, apresentando
questionamentos a partir da visão de um novo currículo, de uma formação específica para o
professor dessas classes, a adequação de tempos e ritmos de acordo com a especificidade do
meio rural, por meio da criação e reformulação de novas políticas que promovam mudanças
nas escolas em seu contexto social. O estudo foi desenvolvido a partir de uma abordagem
qualitativa optando pela pesquisa de campo.
Introdução
O presente artigo surge a partir das nossas inquietações sobre as dificuldades de
aprendizagem encontradas pelos alunos egressos de classes multisseriadas quando adentram
nos anos finais do ensino fundamental, nas classes seriadas. A partir desta perspectiva este
trabalho tem como objetivo analisar o contexto da classe multisseriada do meio rural a partir
da visão do aluno, refletindo sobre esta organização pedagógica que busca assegurar o direito
de aprender dos educandos.
Destacamos também a falta de interesse do Estado em promover uma política
educacional adequada à população do meio rural. As condições que os sujeitos do meio rural
vivenciam para garantir o acesso e a qualidade da educação nas escolas multisseriadas, em
grande medida, estão diretamente relacionadas à ausência e/ou à ineficiência de políticas
públicas.
A reflexão apresentada acima reafirma a necessidade de aprofundamento dos estudos
das classes multisseriadas no meio rural, visto que essa situação é fruto de um processo
histórico e que permanece até os dias atuais, em uma visão baseada no silenciamento,
abandono e preconceito. Sendo assim, mesmo precarizada, a escola multisseriada vem
persistindo e contribuído com a educação nas comunidades rurais, oportunizando então a
escola para os sujeitos rurais. A partir disto, como encarar a real situação das escolas
multisseriadas assegurando o direito de aprender dos educandos do meio rural?
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Segundo Leite (1999, p. 14), “pensar a escola rural é pensar o homem rural, seu
contexto, sua dimensão como cidadão, sua ligação com o processo produtivo”, sendo assim, é
necessário a adequação de uma pedagogia própria para essa realidade. Uma educação rural
adaptada à cultura e ao "homem do campo". Contudo sabemos que a educação rural não
contempla as necessidades básicas de uma educação de qualidade, pois ela se configura
dentro de uma lógica capitalista e hegemônica, apenas visando o homem do campo para a
produção, como um ser mercadológico, fortalecendo as políticas de controle.
Dentro desse contexto surge o “ruralismo pedagógico” tendo como objetivo a fixação
do homem no campo, através de uma educação restringida e pragmática, que atenda todas as
necessidades do meio rural, qualificando a sua mão de obra, fazendo com que o homem do
campo acredite que não é preciso sair do campo para a cidade para ter condições de
crescimento econômico, mas essa ideia negava-lhe o desenvolvimento intelectual.
Leite (1999, p. 29), em sua obra “Escola Rural: urbanização e política educacionais”,
expõe que o ruralismo no ensino durou até a década de 30, uma vez que a escolaridade estava
ligada à tradição colonial e distante das exigências da época. Discussões acontecidas na
década de 1930 sobre a educação anteciparam as teorias que iniciaram na metade da década
de 40, visto que a partir daí foram realizados conferências, debates e palestras, com intuito de
problematizar as condições básicas de vida das populações do meio rural.
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A educação rural de acordo com Leite (1999, p. 55) enfrentou diversos problemas
dentre os quais podem ser destacados:
Estas problemáticas foram apontadas pelo autor na década de 90, mas, infelizmente,
ainda identificamos atualmente esse quadro de descaso na educação do campo, o abandono, a
falta de investimento em políticas públicas, nega a proposta da educação do campo construída
pelos movimentos sociais, que aponta melhorias na educação.
A legislação educacional vigente atenta para estes aspectos, como a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação (Lei nº 9.394/96) e o Plano Nacional de Educação (Lei nº 10.172/2001),
onde mostra que os diagnósticos da educação do campo têm apontado como principais
questões:
Falar sobre esse modelo de educação nos remete a questionamentos: Até onde a falta
de vontade política do poder público, interfere na qualidade de ensino? Por que não valorizar
a educação rural como a educação urbana? Como as políticas públicas poderão se definir da
mesma forma, na educação do meio rural?
Os questionamentos nos levam a reflexões, acerca de toda essa estrutura política que
tenta silenciar a luta e conquistas que foram instituídas pelos movimentos sociais. Para
garantir um novo modelo educacional, permitindo que o homem do campo, tenha acesso ao
conhecimento e direito à escolarização.
construção desta conferência pelos Movimentos Sociais do Campo, foi inaugurada uma nova
referência para o debate e a mobilização popular: Educação do Campo e não mais educação
rural ou educação para o meio rural.
Um dos pontos essenciais que enfatiza a identidade do movimento Por Uma Educação
do Campo é a luta da população do campo por políticas públicas que garantam o direito à
educação e a uma educação que seja no e do campo. Neste debate, Caldart (2002) diz, “No: o
povo tem direito a ser educado no lugar onde vive; Do: o povo tem direito a uma educação
pensada desde o seu lugar e com a sua participação, vinculada à sua cultura e às suas
necessidades humanas e sociais”.
Deste modo, é indispensável construir uma educação para o campo numa dimensão
que trabalhe a diversidade cultural do cidadão rural, que discuta propostas de educação para o
cidadão do campo que envolva suas especificidades culturais, sociais e econômicas.
Ao analisar a Lei no 5.692/1971, Leite (1999) afirma que a educação rural não foi
focalizada ou enfatizada e, sim, destituída de sua identidade. Segundo o autor, desde 1960, a
educação rural vem seguindo programas educacionais determinados pelo Ministério e
Conselhos de Educação, sem, contudo, estabelecer uma filosofia e/ou uma política específica
para a escolaridade nas regiões rurais.
Por isso, a Educação do Campo, uma conquista que surge a partir da luta dos
movimentos sociais, que teve como protagonistas desta emancipação política os trabalhadores
rurais, uma luta que se revela pela superação do sistema capitalista, ao contrário da Educação
rural que atrelada ao poder hegemônico, reforça o silenciamento, abandono e preconceito,
limitado muito no interesse da proposta capitalista, que privilegiou os grandes latifundiários,
sem garantir a formação para o homem do campo. Contradizendo esses fatores, a Educação
do Campo vem legitimar o saber do homem do campo, configurando os sujeitos rurais como
produtores de direitos, entendendo que os professores têm seus saberes construídos, busca
oportunizar a ligação da formação escolar à formação para uma postura na vida, na
comunidade, compreendido este como espaço de vida dos sujeitos do campo, sendo
importante lembrar que a partir da Educação do campo se produziu muitas conquistas como a
abertura para Universidades, as Diretrizes Operacionais, a garantia em espaços que se
discutam os direitos para a melhoria na condição de vida do homem do campo, entre outros.
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Saviani (1980, p. 197), nos indica que as escolas rurais não foram criadas para atender
aos interesses do homem do campo, mas “a escolarização do campo se revela um fenômeno
decorrente da expansão das relações capitalistas no campo”. Desta forma, a educação é um
direito do coletivo, ou seja, social, por isso, partimos da compreensão de que a educação
urbana não é superior à rural, onde se faz necessário à distinção entre essas duas realidades,
respeitando a diversidade de cada espaço. No que trata o quesito diversidade no contexto da
educação no meio rural é necessário colocar em relevo a existência da classe multisseriada.
As classes multisseriadas são um tipo específico de educação.
Sendo assim, para manter as classes multisseriadas é necessário dar condições, por
meio de políticas educacionais específicas que garantam a efetividade do processo de ensino
aprendizagem, atendendo os educandos do meio rural, no intuito de oferecer uma educação de
qualidade em diferentes contextos sociais e culturais.
Sabemos que a história da classe Multisseriada das escolas do campo sempre foi
negligenciada por políticas públicas e atendida apenas por políticas compensatórias. As
escolas multisseriadas consideradas como fragmento de um período em extinção decorrente
do processo acelerado de urbanização, sendo necessário unir em uma única sala alunos com
distintos níveis de aprendizagens, seriação e faixa etárias diferentes, pois a baixa densidade
populacional nesses espaços e com número mínimo de alunos impossibilita a forma ção de
turmas voltadas ao atendimento de classes seriadas.
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Para Hage (2006), as escolas multisseriadas possuem uma identidade diferenciada pela
“precarização do modelo urbano seriado de ensino”. Por isso, torna-se necessária uma
educação que contemple a diversidade e heterogeneidade de sujeitos, ou seja, uma educação
escolar multicultural e inclusiva. Educação que oportunize o diálogo e a convivência entre os
diferentes sujeitos e culturas, visando superar a realidade de exclusão social e educacional que
grupos sociais sofrem por fatores de etnia, gênero, classe, idade, entre outras.
O espaço da escola era pequeno, não tinha lugar para brincar, a sala era
cheia, fazia muito barulho, não aprendia quase nada. As cadeiras também
eram quebradas. Gostava mais ou menos de estudar lá. (Aluno D).
Era muito (sic) bagunça, a gente conversava muito, fazia muito barulho. Ela
(professora) passava o mesmo dever que passava pra uma série passava pra
outra. A mesma atividade que passava para 3ª passava pra 4ª. (Aluno A).
Cada um dia era uma matéria, para todas as séries, e era um professor só, era
melhor. Tinha mais tempo pra entender. (Aluno C).
Minha escola era muito boa para mim, cabia todos os alunos da 1ª, 2ª, 3ª e 4ª
série, era essas turmas todas que um professor só ensinava, ele primeiro
explicava a uma série para depois ele ensinar a outras séries (Aluno X).
Nas classes multisseriadas todas as turmas são colocados em uma mesma sala e o
professor precisa dividir o tempo escolar com todos os educandos. Assim, a “diversidade” é a
principal realidade das classes multisseriadas, seja a partir da seriação ou faixa etária, e os
professores também encontram barreiras para praticar o processo de ensino e aprendizagem,
pois suas formações não os permitem avançar no sentido multiculturalista, desta maneira,
acabam utilizando sua prática etnocêntrica, deixando de trabalhar as diferenças dos aspectos
de cada grupo.
Seguindo esse pensamento, educandos da escola Municipal JAS relataram sobre suas
vivências nas classes multisseriadas em que estudaram.
Era uma professora pra todo mundo de várias séries, tinha uma sala só para
todas as séries, na sala que eu estudava tinha 30 alunos, e ela (professora)
passava de cadeira em cadeira e ensinava. Mesmo indo de cadeira em
cadeira dava pra aprender às vezes. (Aluno C).
Soma-se a esse fato também, a falta de formação docente para os professores lidar
com esse universo e as estratégias didático-pedagógicas que não atendem e não respeitam a
realidade da formação multisseriada no meio rural. Além disso, a alta rotatividade dos
professores e os contratos temporários por meio de perseguição política faz com que o
professor não se identifique com a realidade ali encontrada, causando uma resistência para
atuar nessa modalidade de ensino pedindo transferência para outro campo de atuação,
resistência essa que faz com que o professor crie no aluno um bloqueio na sua capacidade de
aprendizagem. Geralmente são destinados para lecionar nessas turmas professores que são
considerados “inaptos” para atuar nas turmas das escolas da zona urbana ou muitas vezes por
“vingança” e/ou perseguição “política”. (SANTOS & MOURA, 2012, p. 268). Neste sentido,
o aluno explicitou essa realidade que é vivenciada no âmbito das escolas rurais.
Antes quando a gente estudava na classe multisseriada todo dia trocava de
professor, quando a gente tava se acostumando com um, de uma hora pra
outra entrava outro, aí mudava tudo de novo, ai confundia tudo na mente da
gente. (Aluno F).
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A professora avisou pra gente que quando passasse para 5ª série ia ser mais
difícil. (Aluno G).
Entretanto, Hage (2010, p.01) aponta algumas observações sobre o Programa Escola
Ativa - PEA, pois enquanto o Escola Ativa recomenda propostas pedagógicas e princípios
políticos pedagógicos diretamente aplicados às especificidades do campo, o material didático
pedagógico que o MEC desenvolve induz a ampliação de uma só proposta pedagógica,
curricular e metodológica para todo o país, visto que todas as escolas que assentirem ao
programa adquire o mesmo apoio pedagógico, não considerando assim a heterogeneidade e o
aspecto multicultural, características estas especificas da população do meio rural. Isso,
quando essa inserção no programa acontece da maneira correta, pois como expressou uma
professora de classe multisseriada,
De um dia pra noite a escola já estava no Programa Escola Ativa. Não tive
nenhuma preparação, nenhuma formação. A direção chegou lá com os livros
e um manual e disse que tinha que aderir ao programa. Porém, não chegou
nenhum material, só uns livros que nem deram pra todos os alunos. Não
posso esquecer também dos cantinhos que obrigaram a gente a fazer. Na
escola que eu lecionava não tinha nem parede direito, como eu ia fazer
cantinho? (Professora A).
No documento Projeto Base – Escola Ativa (2010) o Programa Escola Ativa tem como
objetivo melhorar a qualidade do desempenho escolar em classes multisseriadas do campo.
Mas esse objetivo não foi obtido nas escolas rurais da cidade de Valença, pois esse programa
foi jogado como um pacote pronto na mão do professor, que teve que aderi-lo do dia para
noite, sem que ele tivesse nenhuma formação voltada para o PEA. “Por um lado, o professor
não é convidado a sistematizar o conhecimento que produz [...] e passa a desenvolver uma
relação de maior alheamento com ele; por outro, corre o risco de que o Programa não receba
contribuições que o atualizem.” (GONÇALVES, 2009, p.146). O professor dessa modalidade
necessita de uma formação específica, pois não encontra apoio e ainda se sente obrigado a
fazer o que não está preparado para desenvolver, como relata uma professora,
Graças a Deus que acabou. Eles jogam as coisas de qualquer jeito e nós
temos que nos virar em material, em estratégias que não nos foram passadas.
E nada que fazemos sem ter um preparo vai acontecer da maneira que tem
que ser. (Professor B).
34
Fica visível que é necessário repensar questões sobre a formação docente para
professores de escolas multisseriadas. É imprescindível valorizar os conhecimentos
adquiridos na própria atuação do professor e motivar discussões que gerem a troca de
experiências conjuntas, como Nóvoa (2009) mostra sobre a questão da formação docente em
um contexto específico.
É preocupante quando ouvimos de alunos e professores que as escolas rurais
multisseriadas são uma barreira para o aprendizado, um problema que deve ser excluído da
educação, pois nos remete ao pensamento de (SANTOS & MOURA, 2012, p. 35) quando
expõe que “tratada nas últimas décadas como uma “anomalia” do sistema, “uma praga que
deveria ser exterminada” para dar lugar às classes seriadas tal qual o modelo urbano, este
modelo de organização escolar/curricular tem resistido”.
Partindo dessa visão, Santos (2011), entende que o abandono do Estado e seu
silenciamento são fatores que estão ligados à forma preconceituosa presente atualmente em
torno da multissérie e educação do campo. De acordo com o autor, o silenciamento se
apresenta pela resistência do estado em reconhecer a realidade específica da educação do
campo e classes multisseriadas, não investindo na mesma, evidenciando o abandono.
É preciso ter outra visão sobre a realidade que se tem do campo, para que assim se
mude a visão sobre a educação e as escolas existentes nesse espaço. Sendo uma delas, a visão
de compreender as concepções de tempos e ritmos das classes multisseriadas do meio rural,
analisando desta forma que o tempo dos alunos e professores dessas classes está inserido num
contexto escolar com diversas particularidades. Dialogando com essa visão, Pinho & Souza
(2012, p. 251):
Se considerarmos que os acontecimentos humanos ocorrem no tempo em
que as formas manifestadas em torno desse conceito variam de pessoa para
pessoa e de cultura para cultura, podemos dizer que a noção de tempo, além
de estar relacionada e ser uma característica da cultura, é a própria cultura.
Assim, compreender as diferenças concepções de tempos e ritmos nas
classes multisseriadas do meio rural pressupõe considerar as diferenças
culturais e individuais que dão vida a esses espaços educativos.
36
Partindo desse pressuposto, porque não pensar em um currículo voltado para as classes
multisseriadas do meio rural?
É importante construir um currículo baseado nas falas e experiências da população do
meio rural, pois os conhecimentos vivenciados por eles é que vão revelar a necessidade de
valorização de seu contexto sócio cultural, onde esta construção deve surgir de “dentro pra
fora” e não utilizar saberes distantes de sua realidade.
De acordo com os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira (2007) a respeito da realidade das escolas multisseriadas no Brasil, um dos fatores
que podem estar ligados à baixa qualidade educacional das classes multisseriadas seria a
ausência de uma capacitação específica dos professores que atuam nestas condições. Com
37
isso, são necessárias políticas públicas de formação docente que permita um diálogo e uma
prática dentro das particularidades nas classes multisseriadas.
Desde o ruralismo se pensava em uma formação especifica para os professores do
meio rural. Arroyo (2005, p. 361) debate sobre essa situação:
Considerações finais
39
Apesar das classes multisseriadas serem uma realidade nas escolas do meio rural, e
que não podem ser eliminadas por conta da baixa densidade demográfica, visto que a
distância e a localização da população das áreas rurais, não favorecem a formação de turmas
seriadas, ainda existem poucos estudos desenvolvidos sobre essa modalidade de ensino. Essas
classes favorecem os sujeitos ao acesso à escolarização em sua própria localidade, o que
colaboraria de maneira significativa para continuação dos sujeitos no meio rural, e a
afirmação de suas identidades socioculturais, porém existem as problemáticas que interferem
em seu processo educativo.
Assim, a inserção de políticas públicas que promovam melhorias nas escolas e práticas
pedagógicas dos professores, e também uma preocupação com o currículo aproximado da
realidade local, para que os conhecimentos adquiridos na escola tenham relação com os
processos sociais que o meio rural carrega, são fatores que devem ser pensados pelo poder
público como forma inicial de avanços para as classes multisseriadas.
Cabe destacar que não somos de acordo com os métodos, visões e políticas que
reforçam a realidade das escolas rurais multisseriadas composta por condições precárias de
infraestrutura, distorção idade-série, fracasso escolar, currículos não adequados à realidade do
campo, sobrecarga de trabalho dos professores, também a falta de apoio das secretarias
estaduais e municipais de educação. Não somos a favor dessa falta de respeito, desse ataque à
dignidade dos sujeitos do campo. Não somos a favor da inserção do “modelo seriado urbano”
nas escolas do meio rural. O ato de anunciar, ao passo que denunciamos, esta realidade está
ancorado na convicção de que é possível mudar o que está imposto historicamente.
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43
RESUMO: O presente trabalho discute as práticas pedagógicas narradas por três professoras
aposentadas da comunidade rural de Quizambu no município de Alagoinhas BA. A proposta da
elaboração do trabalho surgiu a partir da pesquisa de Iniciação Cientifica (PICIN –UNEB) intitulada
“Narrativas de professores rurais: modos de leitura e suas implicações no fazer pedagógico”. A
pesquisa utilizou-se da abordagem autobiográfica para análise do corpus e usou como instrumento
para coleta de dados, a entrevista narrativa. O presente ensaio discute a importância da pesquisa
autobiográfica no tocante à investigação sobre formação e profissão docente, pois a autobiografia
permite o sujeito professor a pensar em si revisando o que compreende sobre seus saberes e sua prática
pedagógica. As histórias de vida narradas pelas professoras oportuniza ao conhecimento de si sobre as
práticas pedagógicas realizadas nas escolas rurais na referida comunidade nas décadas de 70 a 90. Ao
estudar processos educativos através de memórias de professoras aposentadas é possível encontrar
questões pertinentes para se entender os modos rural de educação atual com base nos modos de
educação de décadas passadas.
Palavras Chave: Pesquisa autobiográfica. Professoras aposentadas. Trabalho docente.
3
Gradulada em Letras com habilitação em Língua Portuguesa e Literaturas. Licenciada em Pedagogia pela
Faculdade Santíssimo Sacramento. E-mail: langeborgess@hotmail.com
4
Prof. Assistente do Departamento de Educação- Campus II-UNEB. Doutoranda em educação pelo programa de
Pós-Graduação em Educação e Contemporaneidade- PPGEDUC-UNEB. E-mail: aureauneb@gmail.com
44
conhecimento acontece porque falar sobre si e sua história estabelece sentido ao que foi e é
vivido através dos significados particulares e coletivos.
No que tange as pesquisas com histórias de vida, é válido considerar que estas se
configuram como um campo sensível, subjetivo e que por assim ser causa medo e cuidado,
pois estamos adentrando e compartilhando do eu do outro. Nesta perspectiva vale salientar
que o campo educacional é por natureza um campo de formação de identidades, da
aprendizagem, da troca de experiência, é um rico espaço de memórias. Assim, é possível
considerar que as narrativas transmitem conhecimentos através de experiências vivenciadas,
por isso se pensa na abordagem autobiográfica como meio de observar os processos de
formação e as aprendizagens que as representam como ressalta Josso (2004):
visão reflexiva em busca de compreender a trajetória de si e dos outros, não perdendo de vista
o próprio processo de formação.
Paralelo a concepção apresentada, salientamos que esse fato que ora citamos poderá
ser observado com as narrativas autobiográficas das colaboradoras aposentadas, pois colocar
as narrativas das colaboradoras em evidência se faz necessário para assim entendermos que
cada uma delas possui a sua história, única e singular, mas ao mesmo poderemos visualizar
pontos fortes, comungados, sobretudo, quando estas histórias se entrecruzam umas com as
outras. Pereira, (2008, p.39) afirma que: “As histórias de vida textualizadas constituem-se em
47
5
Para as professoras foram atribuídos nomes fictícios, vale salientar que Menta é o nome de uma flor qlue
significa memória em homenagem a pesquisa.
48
assim, em 1965, Menta estava empregada como professora e começou a exercer a docência
nomeando a escola. A colaboradora relata que o nome escolhido dentre muitos que ela
sugeriu foi o nome de uma escola que ela havia estudado em Ilhéus: General Osório. Menta
afirma que esse emprego foi lhe concedido por questões políticas, pois seu sogro tinha muita
influencia com os chefes políticos da época.
A colaboradora enfatiza que depois de oito anos começaram a surgir problemas no
trabalho por conta de novas amizades que Menta fez com outros políticos daí aqueles que
antes a tinham nomeado começaram a exigir sua formação e ela só tinha o Terceiro Ano do
atual Ensino Fundamental I. Foi preciso estudar, fazer concurso, daí se matriculou em um
curso à distância. Era um curso por correspondência, a professora estudava em casa e fazia as
atividades avaliativas numa escola em Alagoinhas, essas atividades correspondiam a testes
para avaliar as competências de ingresso ao Ensino Médio. Assim, Menta foi cursar o Ensino
Médio em catorze meses independente do desejo do seu marido/esposo (companheiro). A
professora relata que sofreu bastante, pois no decorrer do curso ficou doente tratando-se de
reumatismo. As lideranças do governo na época, como por exemplo, a Secretaria de Educação
informou que era preciso desistir, recebeu a proposta de se encostar, mas tinha um propósito:
pegar seu diploma. Menta conseguiu concluir seu curso com sacrifício e força de vontade.
A colaboradora Zuzu com 96 anos traz em suas narrativas suas experiências. Ela
nasceu e se criou em Inhambupe e foi uma das primeiras moradoras do Quizambu, ela afirma
que ajudou no desenvolvimento da comunidade. Diz também que as pessoas da comunidade
de Quizambu sempre desejaram que ela casasse com alguém de Quizambu para ser
professora. E assim foi a colaboradora casou-se e foi morar no Quizambu ela conta que
ficava procurando meninos para ensinar e uma certa vez apareceram uns políticos e a
nomearam professora ela destaca que hoje é contrato e antes era nomeação. A aposentada
resgata nas suas memórias dados muito importantes para as futuras discussões que não foram
possíveis ser tratadas nesse trabalho, como exemplo velhice algo que a colaboradora
enfatizava ao narrar sua história de vida. Vale ressaltar que as memórias da colaboradora
deixa algumas lacunas, pois a memória é seletiva e lacunar e é no exercício da rememoração
que essas lacunas são preenchidas. Talvez pela idade ou pela falta do exercício de rememorar
aconteça esse processo de seleção e “lacunagem” na memória da colaboradora Zuzu.
50
Zuzu evidencia que além de ser professora foi parteira. E destaca por várias vezes que
gostava mais da sua profissão de parteira. Ela destaca que ajudou muita criança a vir ao
mundo e que por conta disso quase todos no Quizambu são seus afilhados e afilhadas. A
colaboradora traz criticas, ao governo ao sistema educacional e o modos de educar da
sociedade moderna e assim tece comparações a educação do seu tempo de professora com a
educação atual.
A colaboradora Lili tem 68 anos. Começou a estudar com sete anos, afirma que nessa idade
já ajudava seus pais na roça. Ela diz que sua carreira de professora começou aos dezessete
anos e que trabalhava um turno na roça e outro na sala de aula.
Lili enfatiza por várias vezes a importância da família e de uma boa educação. Ela
afirma que com educação adiquerri-se a moral que está esquecida na sociedade.
Como Zuzu ela também compra e faz criticas a educação atual. Lili casou teve oito
filhos e ela ressalta que todos fizeram as primeiras séries iniciais com ela. A colaboradora
afirma que tudo que teve vontade de fazer como professora fez e que não se arrepende de
nada. Lili enfatiza em muitos momentos que o reconhecimento
ao profissional da educação é insuficiente ao papel que ele desenvolve, e que hoje qualquer
um pode ser profissional da educação , fato este que a deixa intrigada, pois a educação é o
meio de se buscar valores e para isso precisa de profissionais competentes e compromissados.
Assim, a partir das biografias apresentadas das colaboradoras, vai ser possível
adentrarmos no campo de discussão que se constitui no foco do trabalho: a trajetória de
formação e as práticas docentes de três professoras aposentadas da comunidade rural de
Quizambú.
Vamos perceber como essas professoras desenvolviam o papel docente na
comunidade, como contribuíram com a formação de inúmeros sujeitos, vamos poder ver nas
suas falas, denúncias, críticas, reflexões e sobretudo suas imagens, a partir das suas
experiências na sala de aula.
Neste trabalho de pesquisa, apresento três professoras aposentadas Menta, Zuzu, e Lili
três histórias de vida com algumas semelhanças e muitas singularidades. Conceituo essas
colaboradoras metaforicamente como bibliotecas humanas. Muito saber, muita experiência
que muitas vezes caem no esquecimento e são deixados de lado sem serem expostos.
Portanto, é importante destacar:
[...] eu morava em Ilhéus trabalhava por lá, quando tava lá recebi uma carta
do meu sogro me pedindo para voltar para trabalhar como professora,
precisava de uma professora aqui [...] ai eu disse : como posso ser professora
Eu não estudei pra ser professora, ai meu sogro disse que podia que pra ser
professora não precisava de estudo que quem sabia ler podia ser professora
[...]
52
A partir das narrativas das professoras foi possível perceber nos seus processos
formativos que elas não tinham a formação do magistério e como podemos observar não só na
fala de Menta, mas também nos excertos textuais a seguir de Zuzu e Lili
[...] me casei e vir embora pra cá [...] As pessoas daqui sempre desejaram
que eu casasse com alguém daqui para que eu fosse professora aqui. Fui uma
das primeiras moradoras daqui. [...].Eu procurava menino aqui acolá para
ensinar... Depois apareceram uns homens, uns políticos no Riacho e me
nomearam hoje é contrato, mas eu fui nomeação[...]Comecei a ensinar aqui
numa casa que era de religião [...] eu aqui e outra professora com mais
estudo no Riacho [...](Zuzu).
Com 17 anos comecei a ensinar, ainda assim ensinava um turno e o outro
continuava trabalhando na roça. Montaram uma escola aqui em casa pra
mim aqui tinha de tudo de uma escola mesa carteira, quadro... Eu fui a
segunda professora daqui [...]Ensinei 30 anos e três dias me aposentei com
47 anos. Hoje tenho 68 anos. (Lili).
Vale salientar que não basta apenas saber ler, pois o professor é o trabalhador do
conhecimento, cuja dinâmica faz, com que a educação assuma caráter de permanente
recomeço e renovação. (MARQUES, 2000 apud RIBEIRO, 2004).
Na época de atuação das colaboradoras elas tinham a penas que sem muita formação
alfabetizar “mecanicamente” os alunos para assim atingir os interesses políticos da época,
como afirma Zuzu: “Naquele tempo ensinou os meninos a assinar já era, o governo só queria
isso para o sujeito acertar votar a maioria dos meninos só tinham o primeiro ano e ali mesmo
ficavam.”
No tocante da formação continuada as colaboradoras destacam como se davam os
processos de formação e como este contribuía tanto para a vida pessoal quanto profissional:
Seguindo a mesma concepção de Lili, a Colaboradora Zuzu destaca como era a sua
formação:
53
Eu ia para Alagoinhas eu tinha esse tempo não era trabalhando era tomando
uma experiência de educação graças a Deus eu me dei bem[...]essas
experiências era para passar instruções de como ensinar os meninos, como
ensinar a resolver as palavras, como ensinar a soletrar como exemplo tinha
casa era c-acá-z- a-zá- casa!Outra coisa tornava a dizer e assim aprendiam...
todos aprendiam. Fui tomar experiência para fazer as coisas direitinhas [...]
(Zuzu)
Podemos perceber que Zuzu e Lili nas suas narrativas apresentam semelhanças na sua
formação, enquanto Menta apresenta uma diferença entre elas, pois a formação continuada
para o aperfeiçoamento profissional obedecia a uma seleção pública e muitas não tinham as
competências de aprendizagem exigida para conquistar a vaga e, posteriormente, realizar o
curso de magistério, o qual Menta realizou.
Considerações finais
A partir do exposto vale considerar que a profissão docente é impregnada de valores e
de ideais muito exigentes do ponto de vista do empenhamento e da relação humana, é nesta
perspectiva que se vem acreditando na importância que as histórias de vida vem adquirindo
nos estudos sobre a profissão docente por intermédio dos professores e das suas práticas de
ensino. Nesse tocante, Nóvoa (1995) aborda que a vida dos professores constituiu -se por um
longo tempo em um paradigma “perdido” da pesquisa em educação. Todavia Fávero e
Tonieto (2010) vêm salientar que as histórias de vida possuem um grande
potencial para que se construam propostas significativas e de entendimento para a formação e
profissão docente.
A partir da história de vida das professoras que atuaram em escolas da zona rural de
classes multisseriadas, pode-se compreender como é importante discutir sobre a formação de
professores e como esta discussão é antiga e que ainda persiste na historiografia brasileira,
pois as condições das escolas e, muitas vezes, a formação docente mostra-se “frágil”,
dificultando a situação educacional na nossa sociedade.
Realizando a pesquisa com as professoras aposentadas da comunidade rural de
Quizambu, município de Alagoinhas, BA, consideramos que esta nos conduziu a pensar a
formação docente como algo imprescindível, levando-nos a perceber que o falar de si permite
refletir sobre o papel exercido na sociedade. Também é importante destacar a contribuição
destas mulheres/professoras/cidadãs para o desenvolvimento de Quizambu que com seus
sabres elas se tornaram professoras, além de já exercerem outros papéis na comunidade, como
lavradora, mãe, esposas, domésticas, parteira, numa época em que a acessibilidade para o bom
desempenho destes papéis era muito difícil.
Assim sendo, consideramos que as experiências/aprendizagens formadoras em uma
abordagem autobiográfica geram possibilidades aos sujeitos de adquirirem novas
aprendizagens ao passo que refletem o processo de construção e desenvolvimento destas. Por
isso, é que a docência reside no trabalho dos professores que não se resume unicamente a
55
tarefa de ministrar aulas. A prática docente exige constantemente uma efetiva e segura
formação e reflexão além de está diretamente ligada ao papel de formadora de sujeitos
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.
Resumo: As ações humanas, direta ou indiretamente, afetam a natureza. Paradoxalmente,
nenhum outro animal tem tamanha capacidade de destruição e conhecimento sobre a vida. Os
efeitos globais do modelo de desenvolvimento econômico praticado no mundo estão,
comprovadamente, desencadeando profundas transformações na atmosfera e na superfície
terrestre. Portanto, se faz cada vez mais necessário e urgente, uma educação ambiental crítica,
contextualizada com a realidade social, cultural e econômica. Objetivou-se então a construção
do conhecimento sobre o ecossistema escolar, tomando a escola como centro referencial dos
processos ecológicos, para dar base à aprendizagem das questões ambientais, sociais e
culturais. A partir de uma metodologia participativa e interdisciplinar, que transite por várias
outras linguagens como a agroecologia, permacultura, arte, música, brincadeiras, entre outras.
Buscou-se entender melhor as relações interpessoais, homem-natureza, universidade-
sociedade, visando à cooperação com os processos de transformação da sociedade.
Introdução
O surgimento de novas necessidades no contexto da evolução das sociedades humanas
conduziu ao desenvolvimento de novas tecnologias, culminando também em um modelo de
produção baseado na industrialização que, por um lado, proporcionou a disponibilização de
novos itens de conforto e serviços e por outro gerou situações e condições de degradação das
formas de vida do planeta Terra. O panorama global contemporâneo, marcado por graves
problemas socioambientais e também pelo desenvolvimento científico e tecnológico, exerce
sobre as sociedades humanas uma grande pressão de demanda de conhecimento, capacidade
de planejamento e postura crítica para tomada de decisões.
De acordo com Capra (1996) os principais problemas de nossa época não podem ser
entendidos isoladamente. São problemas sistêmicos, o que significa que estão interligados e
são interdependentes, remetendo assim a uma série de reflexões sobre qual deve ser a
contribuição das instituições sociais e de cada cidadão na prevenção, minimização e resolução
dos problemas ambientais6 que nos afligem.
6
O termo decorre do conceito de ambiente definido como o conjunto de elementos naturais, sociais,
econômicos, políticos, culturais e suas interações.
58
Essa ideia é reforçada, no parágrafo 1º, inciso VI, onde afirma-se que cabe ao Poder Público
a incumbência de efetividade desse direito, promovendo a educação ambiental em todos os
níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente.
Nesse contexto, situa-se a eco-alfabetização ou alfabetização ecológica vista aqui
como uma possibilidade epistemológica e metodológica mediadora de ações pedagógicas
escolares que concorram para a construção de uma forma mais harmoniosa de relação do
homem com a natureza. De acordo com Legan (2004), a eco-alfabetização é a compreensão
dos princípios básicos da sustentabilidade sendo capaz de refleti-los na vida diária das
comunidades humanas. Os seis pontos principais relevantes para uma educação de uma
cultura sustentável são: segurança e soberania alimentar, economia local, espécies e
ecossistemas, interação humana, energia, tecnologia e água. Portanto, é importante trabalhar
educação ambiental na prática, dentro das escolas, a partir da contextualização e relação entre
os múltiplos conhecimentos envolvidos no processo de ensino-aprendizagem.
A mesma autora (LEGAN, 2004) diz ainda que a área da escola oferece um recurso
educativo perfeito. E que o desenvolvimento do terreno da escola como uma sala de aula ao ar
livre permite a experiência em primeira mão com a natureza, trabalhando para um futuro
sustentável. A realização de tal trabalho exige uma atitude de investigação atenta, curiosa,
aberta às observações das múltiplas inter-relações e dimensões da realidade, muita
disponibilidade e capacidade para o trabalho em equipe, características necessárias ao
educador ambiental, como nos lembra Carvalho (2008).
A partir destes contextos, e do conceito básico de ecossistema, como um conjunto de
organismos, seus ambientes físico-químicos, o fluxo de energia e o ciclo dos elementos
químicos que caracterizam um sistema ecológico complexo de interligações, como nos traz
Ricklefs (1996), percebe-se que o ambiente escolar também apresenta um conjunto de
elementos interconectados e interdependentes, tendo um enorme potencial para o
desenvolvimento de atividades teórico-práticas e interdisciplinares. Sendo assim, define-se o
ecossistema escolar como o conjunto de elementos que compõem o ambiente escolar como
um todo, considerando suas interações e relações de interdependência, tendo, dessa forma, a
contextualização dos conceitos básicos da ecologia como base norteadora.
59
Com este trabalho, objetiva-se contribuir para a formação de sujeitos sociais críticos,
através de ações educacionais fundamentadas em uma concepção sistêmica da relação
homem-ambiente e nos princípios da alfabetização ecológica e da sustentabilidade ambiental,
utilizando o ecossistema escolar como referencial. Buscando entender melhor as relações
interpessoais, homem-natureza, universidade-sociedade, visando à cooperação com os
processos de transformação da sociedade.
Desenvolvimento
Campos de Atuação
As etapas deste trabalho foram realizadas no município de Cruz das Almas - BA,
distante 150 km da capital Salvador, no território do Recôncavo Baiano. Utilizaram -se
quatro campos de trabalho:
A escola tem que ser uma escola de cidadania crítica, que deve ensinar e
instruir coletivamente para a rebeldia, quando ela se justifique, obviamente, e
para o conformismo, quando o conformismo for a concordância com ideias
que nós criticamente consideramos como progressistas e nossas, e não porque
o são oficialmente ou porque somos objeto de doutrinação. O que é preciso é
retirar da escola todo princípio de doutrinação, e ele existe não só na maneira
como nós ensinamos, mas, na forma como nós avaliamos.
Em Lipiansky (2007) e Pey (2000) são encontrados alguns princípios básicos sobre a
Pedagogia Libertária que orientam este trabalho, tais como as ideias contrárias ao
autoritarismo e a hierarquização presentes nas escolas convencionais, além da noção de um
sistema educativo a partir da autogestão.
2.4 Agroecologia
receber o título de maior incentivador intelectual, por outro, os movimentos sociais populares
que lutam por reforma agrária e soberania alimentar, tais como o Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e a Via Campesina, constroem a agroecologia na
prática, através de suas lutas cotidianas e do diálogo com as comunidades tradicionais.
De maneira geral, pode-se dizer que a Permacultura é uma corrente de ação e reflexão
ambiental que parte de uma filosofia de cooperação com a natureza, de cuidado com a terra e
com as pessoas, onde os indivíduos sentem-se encorajados a tornarem-se partes conscientes e
atuantes da solução para diversos problemas com que deparamos local e globalmente
(EVANGELISTA, 2010).
Resultados
Dentre as especificidades que ocorreram para cada escola, destaca-se uma maior
facilidade em realizar o trabalho fora da sala de aula, com os estudantes mais novos,
principalmente os do 5° ano do Ensino Fundamental, que demonstraram mais interesse e
espontaneidade para a prática ao ar livre, além de apresentarem maior empenho na
participação de dinâmicas e outras atividades em grupo. Análogo a essa reflexão, em Arruda
(2007. In: Corrêa e Preve, 2007, p. 223) encontra-se a ideia em que:
A autora ressalta ainda a importância das brincadeiras, que além de serem uma
linguagem da criança e uma forma de conhecimento do mundo físico e social, permitem a ela
interagir com outros, viver emoções e aprender a lidar melhor com seus sentimentos.
Conclusões
67
Referências
ABREU, L. S. et al. Desenvolvimento e Situação Atual da Agricultura de Base Ecológica no
Brasil e no Estado de São Paulo, 2008. Disponível em: <
http://www.sbsociologia.com.br/portal/index.php?option=com> Acessado em: 08 de abril de
2013.
68
Introdução
Justificativa
os diversos espaços e seguimentos da sociedade, uma vez que é evidente e lógico que o
direito a vida está intrinsecamente ligada às condições ambientais, não basta um discurso
naturais renováveis e não renováveis. Com o surgimento e o crescimento dos centros urbanos
74
preocupantes (SENAR, 2009). Neste sentido a luta pela manutenção da biodiversidade deve
ser compreendida como uma luta de dimensão social, política, econômica e cultural.
vivo, nada mais é que uma cadeia de vidas interdependentes. A realização dos diversos
processos ecológicos que ocorrem na natureza depende, direta ou indiretamente, dos seres
vivos e de sua relação de interdependência, a interação entre os seres é que vai possibilitar a
adaptação das variadas formas de vida as mais diversas condições ambientais (SENAR, 2006,
p. 39).
destaque na sociedade por ser importante fonte renda e sustento. Na Amazônia e no Nordeste,
2006, p. 43).
sua efetividade é a resposta para tal problemática. Trata-se de mais falácias ou discursos, mas,
distribuição de renda. A Educação Ambiental emerge neste contexto como uma ferramenta
Ambiental fomentada pelo Programa Despertar, com a temática Biodiversidade e com base no
diagnóstico inicial sobre a comunidade rural do Jabute, que permitiu avaliar as demandas da
escola e da comunidade, principalmente por tratar-se de uma região da caatinga onde escassez
Com apenas uma breve observação na região do Jabute já foi possível perceber as
uma das propriedades fundamentais da natureza, além de ser grande manancial em potencial
implica em dizer que a mudança não ocorre da noite para o dia, mas isso requer continuidade
sujeitos sociais para uma prática social transformadora. Nesta perspectiva, o ensino e as
CONTEUDOS TRABALHADOS
Resultados alcançados
Considerações finais
Os desafios e vontades com certeza não se encerram, este projeto foi pensado com
base no diagnóstico sobre os desafios e limites locais na promoção do desenvolvimento local
sustentável, logo não se pretende apontar um caminho de conclusão ou finalização, pois se
espera que este trabalho resulte sempre num recomeço, na redescoberta.
Transformar culturas é o objetivo maior que se assume como educador ambiental e
isso ultrapassam os limites conteudista e as grades curriculares rígidas e fechadas. Perceber a
sustentabilidade como grande tarefa necessária e urgente para a sociedade é o primeiro passo
para assumir o legado de enfrentamento de apresentar ao mundo outras respostas e
77
possibilidades de uso dos recursos naturais e da produção, consumo e distribuição dos bens,
materiais e imateriais.
O importante é advertir que as respostas que o homem dá a um desafio não
muda só a realidade com o qual se confronta: a resposta muda o próprio
homem, cada vez um pouco mais, de uma forma diferente. Pelo jogo
constante destas respostas o homem se transforma no ato mesmo de
responder (FREIRE, 1980, p. 37).
REFERÊNCIAS
RELATO DE EXPERIÊNCIAS
RESUMO: O presente artigo nasceu das observações e das atividades realizadas na Escola
Municipal Dr. Abílio Farias, localizado no povoado do Mucambo em uma comunidade negra
rural. As atividades iniciaram-se no período de Julho do ano de 2012, e ainda se encontra em
andamento. A metodologia utilizada foi à abordagem qualitativa do tipo pesquisa de campo.
As observações e atividades, e a coleta de dados na escola, tiveram suas origens, no
Programa Institucional de Iniciação à Docência, o (PIBID). O programa (PIBID) tem como
objetivo, nortear a importância da relação entre Universidade - Comunidade, como espaços de
construção da identidade do pedagogo. Através da temática central, que é as questões étnicas-
raciais, podemos salientar as dificuldades e aflições que circulam as mentes das crianças, e
dos adultos ali inseridos. Podemos também observar as dificuldades de se trabalhar a historia
do povo negro, uma vez que a comunidade em questão é uma comunidade que possui quase
em sua totalidade pessoas negra, porem não se vê como tal. Com cautela, o referente artigo
veem infelizmente fragilizado, por falta de mais fontes, e da colaboração tímida de
professores e alunos no ambiente escolar, em desdobrar a dificuldade de se trabalhar a
identidade racial, e o papel dos discentes nesse processo, que vai além dos anseios atuais, são
acima de tudo aspirações antigos, porem, com sede de estabelecer uma discussão e uma
reflexão sobre a temática, dentro da sala de aula, traremos relatos do que foi constatado,
através de observações e questionários. Os autores ajudarão a salientar e aprofundar está
discussão, são eles: O’DWYER, (2002), RIBEIRO (2006), MOREIRA (2008), FREIRE,
2010, SANTANA, (2011).
Introdução
negação aos estudos, sofrer castigos diários, como, chicotadas ou ainda, um dos piores males,
serem marcado com ferro em brasa, em decorrência, nas inúmeras tentativas de fugas, já que a
morte, já era realidade, em decorrência do desgaste físico, das condições subumanas há que
estavam submetidos. E ainda por saber que suas crenças e tradições estavam sendo destruída,
para eles a morte pareciam um dos menores males, pois sabiam que ‘ nenhum povo que
passasse por isso como sua rotina de vida, através de séculos, sairia dela sem ficar marcado
indelevelmente’ (RIBEIRO, 2006, p.108).
7
SANTANA, ( Apud, Munaga ,2009,p.92-93) “ De origem da língua umbundu de Angola, “ quilombo” é uma
aportuguesamento da palavra Kilombo, cujo conteúdo remete a uma instituição sociopolítica e militar que
resulta de longa historia [...]”
82
Infelizmente, apesar das inúmeras mazelas que o povo negro foram submetidos
antigamente, ainda sofrem cruelmente as conseqüências nos dias de hoje. Falta de
oportunidade, preconceito, racismo. Resultado invariavelmente de uma disseminação de uma
“democracia racial”, que tornar alguns negros, passíveis, e acomodados diante das injustiças,
e principalmente das lutas enfrentados por alguns civis, e consolidada por alguns movimentos
sociais, como o próprio movimento negro. Prova disso, foi a vitoria, diante das cotas, que
ainda hoje é motivo de muitas discussões. Principalmente diante as incertezas que assolam as
mentes de alguns indivíduos, que infelizmente, não os fazem olhar além. Além do sistema, e
muito menos das dificuldades encontradas pelo o povo negro, devido às injustiças históricas a
que esse grupo estava submetido, e especialmente da discrepância entre as oportunidades
entre os brancos e os negros. Como por exemplo, se as cotas, são apenas mais uma forma de
racismo, um apartheid escolar, ou um direito, diante de um povo, que ajudou a construir com
suor e sangue a sociedade brasileira, e que outrora, só recebiam em troca, humilhação,
chibatadas, dor.
Entrando nas questões cruciais que compõe este artigo, desdobraremos através de
observações, atividades e questionários, realizadas pela equipe do PIBID, a relação entre
escolas- comunidade, papel docente, e experiência de uma bolsista ID, em relação às questões
étnicos- raciais que circulam entre as crianças e adultos da Escola Municipal Dr. Abílio
Farias.
Por outro lado, nos, as bolsistas ID, estávamos timidamente, em meio a discussões
existente na comunidade, se ela é ou não é uma comunidade quilombola. Percebemos que as
pessoas em que estávamos em contato, não concordavam com o termo, e ainda, comentavam
que ali, não existiam nenhum descendente de escravos. Medo este, aflorado pelo temor de
perder suas terras, de serem jogadas em terras longínquas de suas casas já construídas, e
principalmente por acreditarem que uma vez, reconhecida como comunidade quilombola, as
pessoas ali inseridas, serão afetadas pelo preconceito, piadas, falta de oportunidade, que os
livros didáticos e a mídia exploram. Assim, nasce a reflexão:
(...) quem é que se julga autorizado a dizer o que o “outro” é? Quem é que
define a identidade do outro e, ao fazê-lo, chama a si o poder de permitir ou
de vetar? É nesse quadro da ampliação que sobressai como “legítimo” o
dispositivo autoritário que traça os novos limites das identidades e dos
territórios tidos agora como “étnicos”. (O’DWYER, 2002, p. 76).
Assim, analisou-se que infelizmente, as crianças da Escola Dr. Abílio Farias, já estão
infectados pelos os termos preconceituosos, ao se referirem a seus colegas de turma, por
macacos, marrons, neguinho, urubu, o que me deixou, em alguns casos com aparência e
sentimentos perplexos.
Constatamos também entre as crianças que o “racismo brasileiro é que ele não incide
sobre a origem racial das pessoas, mas sobre a cor de sua pele”. (RIBEIRO, 2006, p.206).
Quanto mais escura for à cor da pele do individuo, mais apelidos pejorativos ele recebi. Mas,
também percebemos que durante as atividades, despertamos atos consciente em alguns
alunos, que salientaram que, o preconceito é algo errado, e “ machuca e traz sofrimento”. Fala
de uma criança y, da II serie, da Escola Municipal Abílio Farias.
Assim, o Mucambo, segue construindo sua historia, e que hoje, conscientemente, nós,
do PIBID, fazemos parte. Relatar os problemas de um grupo não é fácil, e muito menos se
colocar como um dos agentes de transformação, mas espero que os resultados satisfatórios
cheguem visivelmente, mesmo que em longo prazo. Trabalho árduo, mais interessante, que
espero que todos os granduandas (os) em licenciatura tenham a oportunidade de ter.
REFERENCIAS
Introdução
Outro princípio importante presente na LDB em seu artigo 35º, inciso II, é oferecer
aos jovens, ao final de sua educação básica, uma bagagem cultural e de compreensão das
ciências, capaz de permitir a sua adaptação às mudanças e exigências do mercado de trabalho,
bem como lhes garantir a opção de um posterior aperfeiçoamento. Por isso, tona-se
importante à compreensão dos conteúdos de Biologia e Química, bem como a articulação
desses saberes com as experiências cotidianas.
Como afirma Bazzo [iii], não há o método ideal para ensinar nossos alunos a
enfrentar a complexidade dos assuntos trabalhados, mas que haverá alguns métodos
potencialmente mais favoráveis do que outros. Adequar o material didático às especificações
e às necessidades do aluno é uma forma de valorizar as experiências que ele trás de sua vida
extraescolar, viabilizando uma metodologia que estimule sua criatividade. Contudo, as
Orientações Curriculares para o Ensino Médio [iv] afirmam que é importante que o professor
perceba que a contextualização não deve servir somente para tornar o assunto mais atraente
ou mais fácil de ser assimilado. Mais do que isso, deve permitir que o aluno possa
compreender a importância daquele conhecimento para a sua vida, e seja capaz de analisar sua
realidade, imediata ou mais distante, o que pode tornar-se uma fonte inesgotável de
aprendizado.
Neste trabalho buscamos relatar uma experiência pedagógica nas disciplinas de
Biologia e Química atreladas à uma aprendizagem pautada na experimentação e ludicidade,
em apoio às Tecnologias de Informação e Comunicação aplicadas à Educação a Distância, por
Intermédio das aulas contextualizadas.
bem como lista de exercícios, atividades, avaliações e outros suportes pedagógicos. Nele
também é feito o contato dos mediadores com toda a equipe pedagógica e docente do
programa.
O ambiente é dividido em espaços pedagógicos por áreas de concentração relacionada
ao Ensino Médio, dentre elas, na qual se objetiva este trabalho está relacionado ao ensino de
Ciências da Natureza e suas tecnologias. Em 2013, o EMITEC inovou, já em conformidade
com as novas diretrizes, tratando a disciplina Matemática, como uma área de conhecimento a
parte, mas sempre que possível fazendo associações com as outras áreas de concentração, e
não somente com as Ciências Naturais como é comumente realizado.
As aulas, em cada disciplina, são geralmente geminadas e divididas em tempos
pedagógicos que consiste em: exposição, produção e interação. No espaço de exposição é
onde é transmitido o conteúdo propriamente dito [100’]; a produção é onde os alunos
desenvolvem a atividade, constroem, e aplicam aquele conhecimento trabalhado na aula [25’]
e por último, a interação é onde os alunos podem divulgar o que produziram, mostrando em
tempo real, o produto oriundo da atividade realizada em sal [15’]. Perfazendo um total de 140
minutos de aula por disciplina; sobre o que é trabalhado nestes últimos tempos, é que esse
trabalho pretende focar.
um recurso lúdico e de boa aceitação pelos estudantes, podendo ser trabalhados de forma
dinâmica e bem contextualizada, relacionando princípios de autonomia, participação, bem
como de autoria para a realização da mesma. O lúdico é uma importante ferramenta didática
como força motivadora para que o aluno construa um conhecimento. Vale ressaltar que foi
preciso desenvolver um intenso trabalho de pesquisa, para culminar em atividades que
relacione a sua localidade com os avanços na pesquisa, meio ambiente, alimentação saudável,
medicina e saúde.
Outra estratégia muito comum utilizada é a Construção de Bingo intercalando
diferentes saberes, voltados aos conhecimentos de Ciências, Método Científico, conceitos
básicos de química e biologia. Utilizamos neste ano de 2013, como revisão dos conteúdos,
retomando os principais conceitos trabalhados no ensino fundamental II, para iniciarmos o
estudo das disciplinas de Química e Biologia. Esta estratégia é bem fácil, requer poucos
recursos e é excelente de trabalhar de forma interdisciplinar os conteúdos que envolvem a
temática em questão. Esse procedimento pode despertar maior interesse por parte dos alunos
no estudo da química e da biologia que muitas vezes é trabalhado, pelos professores de forma
memorística. Portanto, essa forma de ensinar poderá proporcionar uma real aprendizagem
levando a modificação de condutas importantes.
A elaboração e confecção de vídeos educativos mostrando a realidade local, dentro da
temática “Tecnologia em Minha Vida”, buscou proporcionar um espaço em que o aluno pode
refletir e inovar, integrando as mídias no seu cotidiano. Além deste trabalho, a Construção e
Alimentação do BLOG Comunitário, é um trabalho que ocorre sempre, onde os alunos
expõem as atividades desenvolvidas durante as aulas, não somente da área de naturezas, mas
das outras áreas de conhecimento.
Vale ressaltar que toda a atividade parte de um pressuposto teórico, baseada na
construção coletiva e a Ambiente Virtual estão todas as orientações destinadas a realização
deste trabalho, sempre orientado de forma contínua pela equipe técnica, gestora e pedagógica.
Os resultados das atividades apresentadas, bem como de outras atividades, podem ser
acessadas e comentadas através do site: http://bit.ly/13rrJvn. No site é possível interagir com
as comunidades e visualizar todas as estratégias aqui apresentadas.
Considerações finais
Diante dos resultados apresentados, em turmas do ensino médio com intermediação
tecnológica, demonstra-se que uma solução possível para despertar o interesse dos alunos,
94
está na inovação e diversificação das práticas escolares. Estas deixariam de ser centradas em
ações rotineiras e conteudistas, e utilizariam estratégias motivadoras e lúdicas que valorizem o
saber científico, convidando o estudante a buscar mais informações além daquelas
apresentadas em sala de aula.
Sendo assim, os relatos aqui apresentados são relevantes como mecanismo de
promoção do conhecimento, como também de desenvolver práticas para educação na área de
Ciências Naturais e suas Tecnologias. Sabendo-se da importância da aprendizagem
significativa para a educação básica, percebe-se a relevância do trabalho descrito, não apenas
como estratégia de diversificação das aulas, mas como uma ferramenta de educação para,
atingindo os alunos, levando-o a atuar como agente multiplicador dessa ação dentro da sua
comunidade, propiciando um aprendizado significativo, revelando mais uma ação eficaz para
a garantia do exercício pleno para a efetiva cidadania.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro
de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Brasília:MEC, 1996.
KRASILCHIK, M. Prática de Ensino de Biologia 4. ed. São Paulo: Editora Universidade de
São Paulo, 2005.
BAZZO, V. L. Para onde vão as licenciaturas?: a formação de professores e as políticas
públicas. Educação. Santa Maria, RS, v. 25, n. 1, p. 53-65, 2000.
BRASIL. Orientações curriculares para o ensino médio: Secretaria de Educação Básica.
Brasília: MEC. v. 2. , 2006.
BRASIL, Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: MEC/SEF,
1998.
SANTOS, Letícia Machado dos (Org.) Educação Básica com Intermediação Tecnológica:
tendências e práticas. Volume 01. Prefácio. 2012.
PRODEB. Companhia de Desenvolvimento de Dados do Estado da Bahia. Reportagem:
Estudantes da zona rural da Bahia concluem ensino médio com Emitec. Disponível em:<
http://www.prodeb.ba.gov.br/modules/news/article.php?storyid=1860>. Acesso em:
10/06/2013.
FREIRE, PAULO. Pedagogia da Liberdade. São Paulo: paz e Terra. 1985.
BRASIL, Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. PCN+
Ensino Médio: orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares
Nacionais: Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. Brasilía, DF: MEC, 2002.
CABRERA, W.B. A Ludicidade para o Ensino Médio na disciplina de Biologia: Contribuição
ao processo de aprendizagem em conformidade com os pressupostos teóricos da
95
RESUMO: Este artigo tem como objetivo compartilhar nossa experiência docente dentro do
subprojeto “Histórias de leitura no Ensino Médio: espaços e tempos da/na formação do(a) leitor(a)”,
do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência -PIBID, desenvolvido pelo Departamento
de Ciências Humanas – Campus IV, Jacobina-BA. As vivências fez-nos entender as histórias de
leitura dos alunos que vivem no territorial rural. Este texto buscou aportes teóricos em Demo (2006),
Morin (2005), Rios (2012), entres outros. Ao encontro dos objetivos propostos, relataremos nossas
experiências docentes em contextuais rurais, refletindo sobre as práticas leitoras e estratégias
vivenciadas pelas histórias de leitura dos nossos alunos. Este trabalho foi inicialmente desenvolvido na
Escola Família Agrícola de Jaboticaba, situada no município de Quixabeira – BA e hoje está sendo
realizado no Colégio Normal Arnaldo de Oliveira (Extensão), localizada no povoado de Caém, interior
da Bahia. A nossa prática dentro do subprojeto do PIBID assumiu um papel fundamental para a
formação do leitor, formação esta que não se limita apenas ao contexto escolar, mas que se constroem
para além dos muros da escola, entrelaçados nas diversidades culturais e sociais, construindo leitores
capazes de resignificar sua leitura a partir da realidade, de sua atuação social.
Palavras - chave: Experiências; Formação do Leitor; Prática docente no campo; PIBID.
Introdução
Acreditando na importância da troca de experiências entre docentes e discentes do
território rural, percebemos a necessidade de tecer uma prática que contemple os alunos em
atividades que envolvem a cultura da roça, e que na medida do possível busca reforçá-las,
qualificá-las a partir dos conhecimentos que estão a construir dentro da escola. Neste sentido,
o objetivo deste trabalho foi elaborado a partir das nossas experiências docentes na zona rural,
através do subprojeto “Histórias de Leitura no Ensino Médio: Espaços e Tempos da/na
Formação do(a) Leitor(a)” do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência,
coordenado pela Prof.ª Dr.ª Jane Adriana Vasconcelos Pacheco Rios.
O PIBID é criado pelo MEC no propósito de inserir os alunos de licenciatura junto à
docência, fazendo uma relação de aprendizagem e troca de conhecimentos adquiridos no
curso. O subprojeto é desenvolvido por bolsistas, alunas do curso de Licenciatura Plena em
Letras Vernáculas do Departamento de Ciências Humanas, da Universidade do Estado da
Bahia - UNEB, com campus localizado em Jacobina-Ba. Este visa inserir estudantes de
universidades, futuros professores, no ambiente da educação básica, criando um vínculo entre
o ensino básico e o ensino superior.
97
Dessa forma, faz com que nós, graduandos, tenhamos noções de como se dá a
docência, aprendendo a relacionar prática e teoria na busca da formação leitores proficientes,
reflexivos e capazes de tomarem suas próprias decisões. É válido mencionar que, este
subprojeto busca também, através das histórias de leitura, ressignificar os valores da cultura
do campo com foco nas práticas culturais dos jovens do Ensino Médio. Para isto, são
desenvolvidas oficinas e atividades que visam mediar à aprendizagem e a construção do
conhecimento.
No intuito de vivenciarmos essas experiências docentes no território rural, o
subprojeto foi realizado em dois momentos: De início, as atividades foram desenvolvidas na
Escola família Agrícola de jaboticaba. Vivemos uma experiência da Pedagogia da
Alternância, uma educação voltada para a valorização da vida e trabalho do/no campo. Um
processo educativo que parte, segundo Calvó (2002, p. 22) da “formação escolar, formação
profissional, formação social, educação, cidadania, projeto de vida, economia, família,
meio...todos os meios que se referem ou que interferem de uma maneira ou de outra na
formação das pessoas”. Em um período de dois anos, tivemos que conclui as atividades na
escola por sua organização que estava programa só para esse período. Em agosto de 2012
começamos uma nova etapa no Colégio Estadual Normal de Arnaldo de Oliveira (Extensão),
localizada no município de Caém – BA, onde estamos atualmente.
Assim, são diferentes experiências vivenciadas no subprojeto para
formação/experiência docente na Educação do Campo. São vivências construídas ao longo do
processo de vida. Nas atividades realizadas nas oficinas, procuramos relacionar as práticas
educativas com a realidade os alunos, buscando aproximar seus saberes sociais da
comunidade escola, para assim, proporcionar a participação daqueles alunos que demonstram
muitas vezes aversão às leituras tanto daqueles que gostam de ler, buscando que eles retornem
às lembranças analisando as relações vivenciadas com a leitura no período escolar para que ao
final cada um construa o seu Memorial de Leitura.
Ao entendermos sobre a Educação do Campo, devemos refletir sobre sua função
social, contextos e dinâmicas realizadas entre os educandos, trata-se de um trabalho realizado
com jovens do campo que trazem consigo práticas que envolvem a cultura da roça,
relacionando ao conhecimento construído dentro da escola.
O subprojeto histórias de leitura no ensino médio: espaços e tempos da/na formação do (a)
leitor (a): Pibid e o reflexo dessa prática de ensino
98
que cada vez mais vem se tornando um elemento indispensável para inserção social do sujeito
e, consequentemente, proporciona o acesso à informação e novos conhecimentos que são
indispensáveis para interação do indivíduo na sociedade. Segundo Silva (1948), a leitura é um
ato de conhecimento, pois ler significa perceber e compreender as relações existentes no
mundo.
Por isso, acreditamos que a leitura é um caminho necessário para formação do
cidadão, propiciando entendimento para relação sujeito-sociedade. Morin (2005) traz
discussões que levam a sociedade a refletir sobre os novos modos de articular os saberes em
favor de uma sociedade mais humana. Assim,
[...] ler pode ser um ato banal, sobretudo hoje ao tornar-se mero pressuposto
para viver de maneira minimamente adequada nesta sociedade, mas pode
abrigar intensa potencialidade política, se abarcar a habilidade de confrontar-
se com a realidade, desconstruindo-a e reconstruindo-a, sob o signo do saber
pensar [...].O sentido maior da leitura é fazer-se autor (DEMO, 2006, p. 46,
49).
102
Para tanto, a escola atual impõe limites ao ensino com restrições de habilidades básica
de leitura e escrita em regras estruturais de português, mantendo sempre um diálogo com
alunos com o saber decorrente da cultura corporificada em obras escritas – o livro sendo o
principal veículo neste processo de formação. Assim, na sociedade brasileira, o ambiente
“escola” não estimula a leitura na formação dos sujeitos, não cria leitores críticos de cultura.
Desta forma, os alunos não veem a necessidade de ler um livro, pois, grande parte dos
professores se enquadra nesta classe de não leitores, como nos assegura Demo (2006, p.51),
O diálogo entre textos em sala de aula, sem dúvida contribui para que o conhecimento
se construa com maior facilidade e sentido. E se tratando de um trabalho que envolve tanto a
leitura como a produção de textos, procuramos levar para os nossos alunos que vivem na zona
rural textos que se aproximem realidade deles, pois acreditamos que as práticas educativas
103
ocorrem também da relação que o sujeito estabelece com sua realidade, “não apenas por estar
no mundo, mas com o mundo” (FREIRE, 1987, p. 97).
A educação no campo é o resultado de um complicado método de construção realizado
através das atividades práticas que os alunos desenvolvem na realidade concreta, numa
interação permanente e intensa com a natureza material, com os outros sujeitos e consigo
mesmos. Quando tratamos sobre a “Educação do Campo”, Brasil (2001), afirma que,
Neste propósito, são evidentes que a educação do campo e urbana deve ser tratada
uniformemente. Trabalhar com base na realidade dos alunos, no contexto a qual estão
inseridos.
Em linhas gerais, dentro as experiências vivenciadas no subprojeto voltadas para as
práticas nas escolas da Educação do Campo, podemos mencionar os círculos de leitura,
momentos que trazemos textos para discussões voltadas para a cultural local dos alunos,
resgatando suas vivências e contextos em que vivem.
Assim, nas escolas muitos trabalhos foram desenvolvidos pela necessidade de resgatar
as histórias de leitura de nossos alunos. Partindo das leituras para as escritas e sendo mais
específicas ao memorial de leitura, pudemos lidar com essa intertextualidade dentro das
produções, pois, ao fazerem referências às leituras realizadas na infância, pela família,
comunidade, trabalhos e outros espaços formativos interagiram nesse processo de formação
leitora como nos afirma Moraes (2001):
Quando conta a sua história, o sujeito narra o seu percurso de vida e passa a
retomar alguns sentidos dados ao longo dessa trajetória, mas não só isso,
passa também a redefini-los, reorienta-los e, principalmente, a construir
novos sentidos para essa história. A narrativa não é um simples narrar de
acontecimentos; ela permite uma tomada reflexiva, identificando fatos que
foram, realmente, constitutivos da própria formação (MORAES, 2001,
p.183):
Percebemos que lidar com o processo de reescrita sem dúvida também foi essencial,
uma vez que dentro das atividades de produção há sempre algo para construir, refletir, dizer
104
de forma mais clara, complementar e é justamente nessas “idas e vindas” que o sujeito pode
ressignificar seus conhecimentos, reorganizar o seu discurso e percorrer pelas diferentes
estratégias dentro do campo das linguagens, não se auxiliando simplesmente em algo técnico,
mais sim aproveitando cada oportunidade para o aluno expor o que sabe.
Para além do processo de intertextualidade e reescrita em sala de aula, chegamos a um
ponto culminante que foi a confecção dos memoriais de leitura dos alunos de todas as séries
do ensino médio. Após um longo processo de revisão, podendo assim juntar os alunos e
professores da escola no intuito de mostrar os resultados das oficinas e proporcionar um
contato com as histórias de leitura que sem dúvida também serão úteis em nosso itinerário de
leitura, principalmente quando a ideia é refletir e perceber-nos outros um pouco da nossa
história e através dessas narrativas também ressignificar o que chamamos de nossas memórias
de leitura.
Considerações finais
Referências
RESUMO: Este trabalho discute o tratamento dado pela instituição educativa urbana de
séries finais de ensino fundamental aos estudantes oriundos de comunidades quilombolas
rurais e como o currículo de língua portuguesa atende às demandas de tais sujeitos, em
conformidade com o que está proposto na Lei 10639/03 e nas Diretrizes Curriculares para a
Educação das Relações Étnicorraciais. Pretende-se, assim, contribuir para a reflexão acerca da
prática pedagógica em realidades similares, bem como fornecer instrumentos para aproximar
escola e comunidade. Para tanto, utiliza-se como método o estudo de caso, e como campo,
uma escola que oferta as séries finais do ensino fundamental na zona urbana do município de
Tanque Novo, Bahia. Os sujeitos desta investigação foram os discentes oriundos das
comunidades quilombolas desse município. Como pressupostos teóricos, além da teoria que
trata da educação quilombola e da educação étnicorracial, aparecem os estudos de Paulo
Freire, que falam do papel da leitura de mundo para a formação do sujeito. Do mesmo modo,
estudos de teóricos do currículo são fundamentais na discussão acerca da implementação de
políticas afirmativas educacionais direcionadas a quilombolas.
INTRODUÇÃO
[...]antes de me tornar cidadão do mundo, fui e sou um cidadão do Recife, a que
cheguei a partir de meu quintal, no bairro de Casa Amarela. Quanto mais enraizado
na minha localidade, tanto mais possibilidades tenho de espraiar, me mundializar.
Ninguém se torna local a partir do universal. O caminho existencial é o inverso. Eu
não sou antes brasileiro para depois ser recifense. Sou primeiro recifense,
pernambucano, nordestino. Depois, brasileiro, latino-americano, gente do mundo.
(FREIRE, 1995, p.25).
____________
1
Pedagoga, Especialista em Gestão Governamental e Mestre em Administração Estratégica. Docente auxiliar na
Universidade do Estado da Bahia (Uneb) e convidada na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB).
E-mail: jaquelinechrystal@yahoo.com.br.
1
Licenciado em Letras Vernáculas. Professor e coordenador pedagógico das séries finais do ensino
fundamental de Tanque Novo, Bahia. E-mail: jhoucardoso@hotmail.com.
107
Dessa forma, todo cidadão e toda cidadã, seja ele ou ela criança, jovem, adulto ou idoso,
tem direito a esse serviço, sendo, de preferência, uma educação pública e de qualidade. No
entanto, em se tratando da educação oferecida aos alunos das zonas rurais, essa realidade está
muito distante de ser alcançada, uma vez que essa modalidade, no Brasil, sempre foi relegada,
por motivos ideológicos fundamentados no ideário da elite oligárquica e latifundiária, que
sempre cultivou e difundiu a ideia que o estudo não é necessário à gente do campo (LEITE,
2002).
A escola, seu currículo e o material didático disponível acabam por excluir os alunos
oriundos das comunidades tradicionais do campo, pois não valorizam nem aceitam sua cultura
e seus saberes. Do mesmo modo, a discriminação e o racismo acabam por serem germinados,
por meio da inclusão de mensagens subliminares, veiculadas em termos e imagens pejorativos
e depreciativos.
Tendo como campo uma escola localizada na zona urbana cidade de Tanque Novo,
Alto Sertão da Bahia, foi realizado um Estudo de Caso, cujos sujeitos foram dez estudantes
matriculados nas séries da segunda etapa do ensino fundamental, todos oriundos de
comunidades tradicionais. Como técnica, foi aplicado um questionário junto aos sujeitos.
109
Nesse sentido, percebe-se que ler é uma atividade essencial para qualquer área do
conhecimento, pois pode possibilitar maior ao sucesso do ser humano que dela se utiliza, pela
ampliação de seu universo cultural e intelectual. Do mesmo modo, permite ao homem situar-
se consigo e com o outro, possibilitando a aquisição de diferentes pontos de vista e o
alargamento de sua experiência. Assim, a leitura torna-se um possível meio de transmissão e
transformação da cultura, sobretudo quando tratada de forma consciente no âmbito do
currículo escolar, pois é o patrimônio cultural de um povo que “talha a vida e a mente
humana, dá significado à ação, situando seus estados intencionais subjacentes em um sistema
interpretativo de aprendizagem (MACEDO, 2007, p.142).
Para alcançar tais finalidades socioculturais, sua conexão com as demandas da
sociedade é fundamental, seja tanto pela possibilidade de transformação da realidade, quanto
pela necessidade de promoção da aprendizagem significativa. De acordo com Ausubel (et. al.,
1978, p. 159), esse tipo de aprendizagem ocorre “quando uma informação nova é adquirida
mediante um esforço deliberado por parte do aprendiz em ligar a informação nova com
conceitos ou proposições relevantes preexistentes em sua estrutura cognitiva”.
Assim, a escola, sendo uma instituição formadora, para cumprir seu papel, precisa
assumir o compromisso de formar leitores. Do mesmo modo, nessa ação, deve buscar
contemplar os interesses e necessidades dos educandos, independente da sua origem étnica,
geográfica ou econômica, utilizando diversas modalidades textuais e diversificando seus
procedimentos, de forma a tornar a ação leitora significativa e que instrumentalize os
beneficiados com novas perspectivas de mundo.
110
É importante salientar que no Brasil, país formado por culturas distintas, o educador
deve estar atento para os sujeitos que integram a população atendida, para que possa
contemplar, nas suas abordagens, a história de seus antepassados. O que se indica, nesse caso,
Para tanto, para alcançar com êxito suas finalidades, o professor deve cuidar,
atenciosamente, do planejamento de suas atividades. Nessa perspectiva, deverá considerar o
contexto sócio-histórico em que o aluno está inserido, associado ao domínio dos
conhecimentos clássicos, para a ampliação dos seus horizontes, a partir das discussões
realizadas no âmbito escolar (SAVIANI, 2003).
Em se pensando numa educação de qualidade voltada para os alunos oriundos da zona
rural quilombola, é imprescindível compreender esses sujeitos e seu espaço de vida, do
mesmo modo que libertar o currículo da escola da concepção urbanocêntrica e exclusora, na
qual o homem do campo não é visto como produtor de conhecimento, tampouco apto a
receber uma educação básica, consequência da ideologia e da prática elitista do Estado
Brasileiro, em relação a esses povos. Nesse sentido, a política educacional instaurada no país
acaba por corroborar com o cenário de descaso em relação a essas populações, pois, as
Nesse sentido, percebe-se que o currículo construído para tais escolas, normalmente,
não atendeàs demandas atuais dos povos do campo, uma vez que estão sobrecarregadas de
111
Desse modo, torna-se extremamente pertinente, como passo principal para a efetivação
dessa política, uma total reformulação de conhecimentos, ideias e posturas de docentes e
demais atores da educação, por meio da adoção da estratégia interdisciplinar no currículo das
escolas que atendem a estudantes oriundos de comunidades tradicionais negras, discutindo os
problemas sociais contemporâneos e mediando a aquisição de conhecimentos clássicos
universais das diversas áreas do conhecimento pela via da resistência e da ampliação das
possibilidades de ação política.
No entanto, três deles, talvez por medo de alguma represália, ou por terem somente
conhecimento da forma tradicional e disciplinar de abordagem do conhecimento, responderam
que estavam satisfeitos com as aulas.
Assim, percebe-se claramente, que as escolas urbanas que recebem estudantes
oriundos de quilombos apresentam grande necessidade de adequação curricular para atender
às determinações contidas nos dispositivos legais que regulamentam a educação das relações
étnicorraciais e da educação do campo.
Do mesmo modo, o descaso dos governantes e agentes públicos em relação às
politicas que determinam o tratamento educativo diferenciado a essas comunidades e seus
habitantes demanda uma urgência de mobilizações por parte desses grupos e de seus pares,
em busca de novas conquistas, pela via da participação na gestão pedagógica da escola.
Considerações finais
centro urbano faz com que a invisibilidade cresça e o racismo apareça de forma tênue e
violenta.
Assim, por meio dos dados obtidos nesse estudo, pode-se perceber claramente que o
tipo deensino oferecido a estes estudantes está totalmente desvinculado da sua realidade rural
e quilombola, do mesmo modo que está longe de promover qualquer condição de
instrumentalização para conquista de seu protagonismo e o exercício da cidadania.
Referências
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Petrópolis: Vozes, 2004.
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_____. _____. PARECER 003. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das
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1993.
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São Paulo: Selo Negro Editora, 2001.
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2002.
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professores. In: NÓVOA, A. Profissão professor. Portugal: Porto, 1995.
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MUNANGA, Kabengele (Org.). Superando o Racismo na Escola. Brasília: Ministério da
Educação, Secretaria de Educação Continuada, 2008.
117
RESUMO: Este artigo é fruto de minha experiência como professor da disciplina Educação do
Campo, no município de Baixa Grande, estado da Bahia, pelo Curso de Formação de Professores,
PARFOR, UNEB, Campus IV. Descreve e analisa a experiência docente que nasce a partir da
participação das professoras-alunas e professores-alunos na arena discursiva aberta para partilhar seus
sabores e experiências em sala de aula. Analisa a experiência exitosa do professor de Educação do
Campo, Genival Rios da Silva, preocupado com o comportamento taciturno de um dos seus educandos
em sala de aula, sendo surpreendido pela participação ativa desse educando a partir de uma aula de
campo em que o mesmo foi colocado em contato direto com a plantação de mamona, cultura com a
qual tinha experiência suficiente para ocupar, naquele momento, o lugar de educador, transitado do
silêncio para a palavra. Esta experiência é analisada, neste artigo, utilizando os conceitos de
conhecimento-regulação e conhecimento-emancipação, oferecidos por Boaventura de Sousa Santos,
aliando aos mesmos as contribuições de Paulo Freire sobre a relação entre saberes na escola e a
metodologia que privilegia uma transição da curiosidade ingênua, espontânea, para a curiosidade
epistemológica do educando, sem causar uma ruptura entre tais curiosidades. Conclui com algumas
considerações sobre as implicações o conhecimento-emancipação do conhecimento-regulação para
atender o educando respeitando os seus saberes e a consequente construção de sua subjetividade nesse
processo.
Palavras-chave: Silêncio; Conhecimento; Emancipação
Percebi que estava muito no palco da sala de aula, o que, para um leonino, não é algo
desagradável. Contudo, ao aparecer demais no brilho ofuscante da palavra docente que não
cala, porque, mesmo negando, ainda acha que a verdade está em si, obstruindo o diálogo e
produzindo silenciamento, os educandos desapareciam enquanto sujeitos que desejam e
necessitam partilhar também a sua palavra e tecer sentidos outros para o discurso,
redirecionando, assim, seu traçado político e ideológico para o caminho da dialogicidade que
conduz à construção solidária do saber partilhado na humildade, na curiosidade, no desejo e
na necessidade de transformação da realidade rebelde que nos desafia à pronúncia e à
plenitude concreta do fazer cotidiano. Foi isso que aconteceu em uma das aulas de Educação
no Campo e que passo a relatar abaixo.
Ao fazer atividades empíricas que levavam a investigar plantações nas roças, Genival
Rios da Silva foi a um roça de mamona, onde o educando silencioso demonstrou
conhecimento prático bastante relevante sobre a planta, ensinando, por exemplo que, ao cortar
o “olho da mamona”, o “pé” carrega muito mais os cachos, entre outros exemplos e
informações acerca daquele plantio. Conhecimento que fora ensinado pelo seu pai e que, por
sua vez, tornava o educador educando e, por isso mesmo, ainda mais educador.
Esse educador-educando aproveitou a revelação surpreendente da subjetividade
encarnada no fruto do contexto local e continuou o processo na sala de aula, onde, segundo o
seu relato, o educando foi redescobrindo suas potencialidades intelectuais e transformando a
si mesmo nesse processo, transitando do lugar do educando mudo para o educando que educa
quando o mundo faz sentido para si na escola. Do mesmo modo, o educador revelou-se, nesse
momento, educador em sua inteireza, tanto no aspecto afetivo, do mais experiente que acolhe
e preocupa-se com a situação de negação de seu educando, quanto no aspecto técnico e
político, na medida em que não causou uma ruptura entre a curiosidade espontânea e a
curiosidade que vai se fazendo epistemológica num processo de transição entre os saberes da
experiência e os saberes sistematizados no currículo escolar.
Esse relato da experiência de “Val”, como é conhecido entre os colegas de profissão, o
professor Genival Rios da Silva, permitiu-me perceber importantes nuances de
desdobramentos epistemológicos, políticos e culturais, de extrema relevância para o processo
de ensino e de aprendizagem, na metodologia implementada por este educador, que, se
refletidos, sistematizados e bem aproveitados, podem desencadear importantes
desdobramentos para a prática educativa na escola. Portanto, essa experiência docente
compartilhada em sala de aula, reveste-se de importante momento de reflexão sobre a vontade
do educador da escola do campo em ensinar numa perspectiva que o educando seja o autor de
sua palavra num processo de construção de conhecimento contextualizado, o que exige um
posicionamento teórico claro, que sustente a reflexão e a direcione às ações rumo aos
objetivos emancipatórios na escola e fora dela.
CONHECIMENTO EMANCIPAÇÃO
COLONIALISMO SOLIDARIEDADE
CONHECIMENTO REGULAÇÃO
A (CAOS) B (ORDEM)
De outro modo, o educador Genival Rios da Silva não percebia o ponto de ignorância
como caos, mas como colonialismo. Ele não queria seu educando como objeto, emudecido
por forças que se opunham à sua assunção humana, por isso sua preocupação e seu desejo de
conduzi-lo à condição de sujeito, construindo o saber na comunhão discursiva dos seres
humanos. Quando a oportunidade apareceu, ele, movido pela sua vontade docente, exerceu
sua docência no sentido de florescer “o broto que saia da terra em busca de luz”. Do
colonialismo para a solidariedade ele exerceu a escuta sensível e acolheu os sentidos que
emanavam daquele homem novo que pronunciava o seu saber, a sua herança que seu pai
havia lhe deixado como preciosidade cultural que a escola não deve negar, porque, ao fazer
isso, destrói a subjetividade na marginalização de um conhecimento legítimo que brota do seu
contexto familiar e social, conhecimento tecido no afeto, na esperança, naquilo que tornam os
pais senhores de saberes que devem ser valorizados como ponto de partida e de chegada, não
num ciclo vicioso, que roda, roda e chega no mesmo lugar da partida, num não lugar, lugar do
outro e, por isso mesmo, lugar nenhum, mas numa espiral que tem suas raízes no lugar em
que florescem como cultura, como semente de conhecimento entrelaçado na história pessoal
de cada um e de todos.
A forma de conceber o trajeto até o conhecimento e do próprio conhecimento, é
crucial, seja para processos emancipatórios, seja para processos regulatórios da formação
humana na escola. Sendo dado, como algo pronto a ser apreendido passivamente pelos
educandos, o conhecimento distancia-se da emancipação dos mesmos, porque não faz sentido
para a racionalidade encarnada numa dada cultura local. A centralidade do livro didático,
tanto no ensino, quanto na aprendizagem, vem como um sintoma claro desse movimento
regulatório e coibidor do exercício da criticidade no processo educativo, que torna-se contra
educativo. Na educação do campo, segundo relatos dos próprios professores da mesma, o
livro didático é relativizado no processo. Tal recurso didático é mais um apoio ao esforço
cognitivo empreendido pela inteligência criativa do educando. O traçado epistemológico do
educando inclui o livro, mas este recurso só adquire sentido enquanto mais um elemento, e
não o principal, que subsidia as duas passagens – uma política e uma epistemológica –
propostas por Freire (2002), como resultado de uma intervenção educativa emancipatória: A
passagem da curiosidade ingênua para a curiosidade epistemológica e a passagem da
heteronomia dependente para a autonomia responsável.
123
Queremos saber,
o que vão fazer
com as novas invenções.
Queremos notícia mais séria
sobre a descoberta da antimatéria
e suas implicações
na emancipação do homem,
das grandes populações,
homens pobres das cidades
das estepes dos sertões
Pois é: “todos queremos saber.” E do que sabemos, não queremos deixar de saber para
saber um saber que nada sabe sobre o nosso viver. Portanto, conhecimento pode ser
desconhecimento na alienação que produz em seu processo de conhecer. Esse saber eu não
quero. Porque eu sou e porque penso. Mas não como Descartes brilhantemente e genialmente
pensou. Nós pensamos porque vivemos a nossa existência encarnada num local específico do
mundo. Pensamos porque sem o outro não somos nada. Sem o outro eu não consigo ser eu.
Sem nossa terra, sem nosso sofrimento e sem nossa esperança nós não seguimos o nosso
destino, e não conseguimos escrever um palmo do nosso caminho comum. E, assim como
nós, nossos educandos também pensam. E querem pensar seus pensamentos, sem serem
negados por uma ordem regulatória escolar ou universitária que lhe nega seu direito mais
legítimo de pensar, porque o concebe apenas como objeto, em seu ponto de ignorância e em
seu ponto de saber.
Queremos saber não somente o saber sem sabor, que é o saber em sua dimensão
puramente técnica, insossa. Por isso queremos saber das implicações de todo conhecimento
para “a emancipação do homem, das grandes populações, homens pobres das cidades, das
estepes dos sertões”. Queremos aprender a dimensão política do conhecimento e participar
ativamente e criativamente de sua construção, a fim de exercer um controle democrático sobre
suas implicações para nossas existências.
Para que tanto saber? Para que essa vontade avassaladora de saber tudo e a tudo
controlar? Perguntava Nietzsche e, depois, Foucault (1999). Esse saber que me nega, que me
cega, que relega o meu jeito, o meu leito, o meu peito, o meu sabor e a minha ira? Prefiro,
pode pensar certamente assim o educando, a minha sina que não me recrimina. E esse jeito
regulatório da escola prepotente esvazia, porque sua função enfastia o educando curioso,
125
reduzindo-o a objeto, retirando do saber seu sabor. Essa escola que quer regular, transformar
em objeto o sujeito curioso, desejoso de conhecer o conhecimento de sua gente, que lhe traga
emancipação, júbilo, felicidade. É da mamona que o educando de Genival Rios da Silva
aciona o seu saber e é daí que elege o seu conhecer. E assim, como da mamona, vem saber do
abacaxi, vem saber da Feira dos Caxixis e saber da Feira de São Joaquim, vem saber da maré
e da maresia, vem saber em forma de medo, de desejo, de segredo e de poesia. E esse saber,
não controla, ele apenas desenrola e sistematiza a vida que segue sua lida na alegria e na
tristeza, na feiura e na beleza que a existência no mundo proporciona a todos e a todas.
Quais as “implicações na emancipação do homem” desse saber que a escola sanciona?
Pela via do conhecimento-emancipação as implicações atingem, entre outros aspectos, o
fortalecimento de sua identidade sócio cultural. Quando um educando se apropria do
conhecimento tendo como instância desencadeadora o local, com seus objetos manifestando
significados históricos que compartilham memórias de eventos que marcaram a sua
existência, esse conhecimento potencializa todo o caminho, o método, em seu processo de
construção porque ele envolve o educando na aventura do conhecimento como
autoconhecimento, como nos canta Ivan Lins:
Creio que, em primeiro lugar, o educando não pode ser visto como um objeto
esquecido num canto da sala de aula. Emudecido, deslocado, escondendo-se dos processos
didáticos que desejam regular a sua existência pautados em princípios de negação de sua
subjetividade. É preciso vê-lo com os olhos do educador Genival Rios da Silva. Seu relato
revelava o educando como um sujeito aprisionado, obrigado a encarcerar-se por uma
concepção regulatória de educação, perseguido pela ameaça das avaliações classificatórias e
excludentes, limitado por objetos de conhecimentos mediados por metodologias que criam
distâncias cognitivas cansativas, irracionais, além de rupturas e brechas epistemológicas com
a sua realidade que não se constituem como desafios, mas como trama perversa da dimensão
política que a escola, dirigida por concepções pedagógicas regulatória de conhecimento,
aciona, legitima e sanciona, naturalizando a exclusão em forma de repetência, evasão,
fracasso escolar.
De outro modo, numa concepção emancipatória de conhecimento, o educando é
seduzido por uma didática encarnada em sua existência histórica, recolhendo seus saberes por
uma epistemologia ouvinte, atenta à trama dos sentidos que a cultura local vai gestando e
parindo incessantemente. Num processo assim a avaliação é vista cuidadosamente, como
momento sistemático de desafio para a aprendizagem, que também deve ser engendrada de
maneira engenhosa, paciente e criativa pelo educador preocupado, não em classificar seu
127
educando com uma nota fria, como uma tatuagem que o marcará permanentemente por todo o
ano escolar ou, em casos mais graves de aguda sensibilidade, pelo resto dos seus dias, mas em
identificar as potencialidades e os limites sobre determinado assunto, tema, objeto de estudo.
A implicação mais imediata de uma avaliação assim concebida é que a ela tem dois sentidos:
identifica os limites e potencialidades não apenas de quem aprende, mas também de quem
ensina. O educador também vai identificar, reconhecer e decidir sobre seus limites, o que
errou em sua intervenção, nos instrumentos, métodos, recursos e atividades em relação à
turma e àquele (a) educando (a) que não conseguiu aprender satisfatoriamente.
Na perspectiva do conhecimento-regulação O educador não é o senhor soberano do
conhecimento, o dono do saber, mas um mediador que não deixa a sua curiosidade fenecer,
porque não transforma em rotina o seu fazer pedagógico. A rotina não acontece, se torna
muito difícil, pois sua preocupação com seus educandos, sua engenhosidade em pensar
desafios cognitivos que atuem na zona de desenvolvimento proximal, passando, como diria a
professora Socorro da Universidade Católica do Salvador, uma “rasteira pedagógica” no
educando, a fim de provocar-lhe o desequilíbrio cognitivo necessário para que ele avance de
um patamar a outro de conhecimento, numa passagem permanente da curiosidade que,
“criticizando-se, aproximando-se de forma cada vez mais metodicamente rigorosa do objeto
cognoscível, se torna curiosidade epistemológica.” (FREIRE, 2002, p. 35).
O conhecimento-emancipação é este convite permanente a aprender ensinando, a
educar sendo educando, a perceber o (a) educando (a) como subjetividade possível de
plenitude humana. É convite ativo para criar possibilidades a fim de que ele (a) manifeste suas
potencialidades e usufrua da escola, da educação, do conhecimento e da tecnologia todo o
saber e todo o sabor que emana da aventura em aprender de forma contextualizada, encarnada
na história, a partir do lugar que significa o mundo e, desse processo, retira,
permanentemente, os sentidos para sua existência que adentram a escola, o currículo, a
avaliação e todos os processos pedagógicos que se destinam ao outro na solidariedade de
seres humanos que desejam realizar-se plenamente em comunhão com a natureza, o outro, o
mundo e, nele, também com a mamona.
REFERÊNCIAS
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FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 24. ed.
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128
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SANTOS, Boaventura de S. A crítica da razão indolente: Contra o desperdício da
experiência. Para um novo senso comum. A ciência, o direito e a política na transição
paradigmática. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2001.
8
Aluna especial de Mestrado da UFRB, Licenciada em Pedagogia, Coordenadora da Educação do Campo no
município de Feira de Santana
9
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia
129
Resumo: Este texto tem por intenção relatar o processo de elaboração da proposta curricular da
Educação do Campo, para o Ensino Fundamental, da Rede Pública Municipal de Ensino de Feira de
Santana/Bahia. A Educação do Campo enquanto política de educação, diz respeito à luta popular pela
ampliação, acesso, permanência e direito à escola pública de qualidade. Nesta proposta, elaborada de
forma coletiva, busca-se assegurar que a escola do campo pensada como parte de um projeto maior
de educação da classe trabalhadora, oportunize a construção a partir da organização do trabalho
pedagógico de uma prática educativa que assegure aos sujeitos do campo uma educação que
possibilite o reconhecimento e autorreconhecimento desses sujeitos.
Introdução
Portanto, uma Proposta Curricular com a intenção de atender a esses sujeitos de direitos e
suas especificidades requer reflexões críticas sobre: como se formam os sujeitos do campo
considerando o grau de desenvolvimento histórico da sociedade? como se forma a juventude,
a infância, os adultos do campo? Quais seus valores? Memórias? identidades, cultura? O que
130
estão privilegiando nos diferentes espaços formativos? o que é indispensável para que os
sujeitos do campo não apenas conheçam a sua comunidade e o mundo, mas, sobretudo,
saibam nele atuar e transformá-lo?. Diante de tais considerações, que teoria ou teorias
pedagógicas e do conhecimento deve fundamentar esta elaboração? quais os elementos que
devem compor essa Proposta no sentido de garantir a qualidade das escolas do campo diante
da sua diversidade de sujeitos e complexidade de contextos? quais os conteúdos construídos
historicamente pela humanidade e socialmente necessários são relevantes de serem
apropriados pelos sujeitos do campo? Como assegurar a compreensão da proposta e sua
efetivação no “chão da sala de aula” de uma escola do campo?. É importante reconhecer que
não são questões simples de serem respondidas, principalmente se a intenção é construir um
currículo voltado para as escolas do campo que apresentam uma diversidade de sujeitos com
especificidades culturais, sociais, políticas entre outras de produzir/reproduzir a vida no
campo.
Na tentativa de responder a essas questões e tantas outras que foram tomando forma
durante o percurso de elaboração da proposta e aos anseios dos professores e professoras que
durante anos apontaram a necessidade de um documento de referência curricular para as
escolas do campo, do Ensino Fundamental (seriadas e multisseriadas), a Secretaria
Municipal de Educação de Feira de Santana, propõe a formação de um grupo para a
elaboração do Currículo do Ensino Fundamental para a Rede Municipal de Educação
(GCEF). O referido grupo foi composto por professores da rede, das diferentes modalidades
e áreas do conhecimento. A partir do GCEF foram formados subgrupos referentes as
modalidades de ensino, entre eles o Grupo de Educação do Campo.
O município de Feira de Santana conforme IBGE (2012) é uma unidade territorial de
1.362,88 km² com 556.756 habitantes. Destes, 510.736 estão na zona urbana e 46.020 na
zona rural. O município é representado por nove distritos, sendo um distrito sede localizado
na zona urbana e oito distritos localizados no espaço rural, entre eles estão: Mª Quitéria,
Matinha, Governador João Durval Carneiro, Jaíba, Bomfim de Feira, Tiquaruçu, Humildes e
Jaguara. Cada distrito possui inúmeros povoados que o constituem. Nestes distritos, a Rede
Pública Municipal de Feira de Santana conta hoje com 96 escolas do campo (seriadas e
multisseriadas) e atende a 15.266 alunos nas diferentes modalidades de ensino (Educação
Infantil; Ensino Fundamental I e II; e Educação de Jovens e Adultos).
Para melhor evidenciar os processos de construção da elaboração da Proposta
Curricular ainda em curso, este relato será apresentado em três momentos: I – Os primeiros
131
10
Representantes de associações, cooperativas, representantes da comunidade local.
132
Escola do Campo
Compreender o lugar da escola na educação do campo é ter claro que ser humano ela
precisa formar, e como pode contribuir com a formação dos novos sujeitos que se constituem
no campo, na atualidade. A escola precisa assumir a sua vocação universal de ajudar no
processo de humanização, com as tarefas especificas que pode assumir nesta perspectiva. Ao
mesmo tempo é chamada a estar atenta à particularidade dos processos sociais do seu tempo
histórico e ajudar na formação das novas gerações de trabalhadores e militantes sociais
(CALDART, 2005, p.30). Nesse sentido considera-se Escola do Campo:
A escola do campo é então uma escola vinculada à luta dos movimentos sociais do
campo, e que nessa luta tem papéis a desempenhar: manter viva sua memória e origem,
vivenciar a organicidade e a formação humana, garantir a apropriação dos conhecimentos
mais avançados e comprometidos com a transformação social, trabalhar a mística da vida e a
pertença classe trabalhadora.
A concepção de escola do campo exige muito mais de nós educadores do campo e
das políticas públicas para conduzir o fazê-la por dentro, o que implica perceber e
compreender, o que significa fazer a formação humana nessa complexidade em que se dá a
educação do campo, levando em consideração todas as contradições existentes no campo, é
preciso considerar que a escola do campo pode estar na escola infantil, fundamental e média.
Ela pode estar nas escolas isoladas, nas escolas nucleadas. Entretanto, mais do que estar no
campo a escola do campo precisa ser intencionada para estar e ser do campo, por quem a faz.
Significa pensar e fazer a escola desde o projeto educativo dos sujeitos do campo,
tendo o cuidado de não projetar para ela o que sua materialidade própria não permite. Trazer
para dentro da escola as matrizes pedagógicas ligadas às práticas sociais, combinar estudo
com trabalho, com cultura, com organização coletiva, com postura de transformar o mundo
prestando atenção nas tarefas de formação específicas do tempo e do espaço escolar e pensar
a escola desde o seu lugar e os seus sujeitos, dialogando sempre com a realidade mais ampla
e com as grandes questões da educação e da humanidade, é uma tarefa que a educação do
campo se propõe a realizar (KOLLING; CERIOL; CALDART, 2002).
135
Fomos aos poucos descobrindo que não existe um modelo ou um tipo de escola que
seja próprio para um grupo ou outro, ou que seja revolucionário em si mesmo. Trata -se de
alterar a postura dos educadores e o jeito de ser da escola como um todo; trata-se de cultivar
uma disposição e uma sensibilidade pedagógica de entrar em movimento da história, porque
é isto que permite a escola acolher sujeitos como os Sem terra, as crianças, sem-terrinha. E
ao acolhê-los. Eles aos poucos a vão transformando, e ela a eles. Um mexe com o outro, num
movimento pedagógico que mistura identidade, sonhos, pedagogias (CALDART, 2005,
p.94).
A escola do campo, na organização do trabalho pedagógico, precisa construir ações
intencionais que considerem a temporalidade humana, o contexto, as vivências
socioculturais dos sujeitos. Isso implica no acompanhamento político, organizativo e
pedagógico das escolas do campo; na construção de relações sociais formadoras dos sujeitos;
na superação de uma escola seriada; no planejamento de vivências geradoras, emergidas do
contexto e promotoras de formação humana do campesinato. A participação da comunidade
é elemento central de sua constituição, não envolve apenas os educadores, ela é
coletivamente dirigida.
Nesse sentido, cabe à escola do campo o enfrentamento da hegemonia
epistemológica do conhecimento inoculado pela ciência capitalista. Partindo do pressuposto
de que,
O conhecimento acumulado pela humanidade não pode ser usado com
neutralidade; ele deve dialogar com as contradições vividas na realidade
destes sujeitos, o que envolve a busca de alternativas para as condições
materiais e ideológicas do trabalho alienado e para as dificuldades de
reprodução social da classe trabalhadora do campo, todas elas condições
inerentes ao antagonismo intrínseco à lógica do capital. (MOLINA, 2012,
P.327).
O trabalho pedagógico em sala de aula pode ser pensado a partir de algumas categorias
consideradas contraditórias: os objetivos gerais/avaliação da escola; e o conteúdo/forma geral
do trabalho pedagógico da escola. A sala de aula é aqui compreendida enquanto,
Considerações Finais
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
ARROYO, Miguel González; CALDART, Roseli Salete; MOLINA, Mônica Castagna
(org.). Por uma educação do campo. 4 ed. Petropólis (RJ): Vozes, 2009.
ARROYO, Miguel G., MOREIRA, A. FLÁVIO. Indagações sobre Currículo
(coordenadores). Brasília: MEC/Secretaria de Educação Básica, nov. de 2008.
BRASIL. Conselho Nacional de Educação (CNE). Câmara de Educação Básica (CEB).
Resolução CNE/CEB nº 1, de 3 de abril de 2002.
BRASIL. Conselho Nacional de Educação (CNE). Câmara de Educação Básica (CEB).
Resolução CNE/CEB nº 2, de 28 de abril de 2008.
BRASIL. Decreto nº 7.352, de 4 de novembro de 2010. Dispõe sobre a política de
educação do campo e o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária –
PRONERA. Diário Oficial da União, Brasília, Sessão1, 5 nov. 2010.
141
SANTOS, Claudio Eduardo Félix dos; PALUDO, Conceição; OLIVEIRA, Rafael Bastos
Costa de. Concepção de educação do campo. In: UFBA. Universidade Federal da Bahia.
Cadernos didáticos sobre educação no campo/Universidade Federal da Bahia. Salvador:
EDITORA, 2010.
142
RESUMO: Os resíduos sólidos urbanos têm se tornado um dos maiores desafios da atualidade, entre
os diversos problemas ambientais, e é apontado como o segundo maior problema das cidades urbanas.
O aumento da quantidade de lixo por habitante produzido na cidade é fruto do modelo de alto
consumo da sociedade capitalista. Caém é uma cidade do interior da Bahia, que não possui nenhum
programa efetivo de gerenciamento dos resíduos sólidos, como na maioria das cidades brasileiras. O
lixo ao coletado através de caçamba é despejado em um lixão a céu aberto nas proximidades da
cidade. O lixo além de comprometer a preservação do meio ambiente pela poluição do solo, do ar e da
água, representa também sérios problemas para a saúde humana. Faz-se necessário realizar um
diagnóstico da consciência ambiental dos estudantes, quanto aos impactos ambientais negativos
causados a cidade, devido à disposição inadequada dos resíduos sólidos, investigando também o
interesse e motivação em ser implantado um programa de coleta seletiva para reciclagem, estruturado
pelos próprios estudantes através de orientação, para minimização destes impactos negativos. Visto
que o sucesso da implantação do projeto da coleta seletiva está na adesão dos estudantes e população
local, tornando-se necessário um trabalho de Educação Ambiental, que além de informar, deva formar
novos hábitos e condutas no cotidiano dos estudantes e familiares.
Introdução
Metodologia
Resultados
Ciências/Biologia
80
% Geografia
60
Educação Física
40 Matemática
História
20
Educação Artística
0 Educação Religiosa
Ensino Fundamental Ensino Médio
Esses resultados, tanto do Ensino Fundamental como no médio, pode ser explicado
pela afinidade do tema com essas disciplinas. Viana e Oliveira (2006) falam que a “atuação
do docente no processo educacional é fundamental para o rompimento de práticas defasadas
que ainda se encontram no contexto escolar”, diz ainda que “cada professor pode contribuir
para que haja a interação da sua disciplina com as questões ambientais, levando-se em
consideração a realidade atual e a urgência de formação de uma consciência sensível à
garantia da sobrevivência da humanidade”. Nesse sentido reforça Guimarães (1995) citado
por Lorenzi (2003) que a educação ambiental deve ser eminentemente interdisciplinar
orientada para a resolução de problemas locais, participativa, comunitária, criativa, crítica,
transformadora de valores e atitudes, criadora de nova ética e que valorize a ação, buscando a
melhoria da qualidade de todos os níveis de vida.
A formação de professores é importante para que se consiga uma aprendizagem
escolar de melhor qualidade. A lei 9.975 dispõe no seu artigo 11 e parágrafo único que “a
dimensão ambiental deve constar dos currículos de formação de professores, em todos os
níveis e em todas as disciplinas”. E que “os professores em atividade devem receber formação
complementar em suas áreas de atuação, com o propósito de atender adequadamente ao
cumprimento dos princípios e objetivos da Política Nacional de Educação Ambiental”. Dispõe
também que a educação ambiental será desenvolvida como uma prática educativa integrada,
contínua e permanente em todos os níveis e modalidades do ensino formal.
GRÁFICO 2 - Atividades utilizadas pelo professor para tratar do assunto Meio Ambiente
34% . A principal função do trabalho com o tema meio ambiente de acordo com a proposta
dos PCNs, é contribuir para a formação de cidadãos conscientes, aptos para decidirem e
atuarem na realidade socioambiental de um modo comprometido com a vida, com o bem-estar
de cada um e da sociedade, local e global. Para isso é necessário que, mais do que
informações e conceitos, a escola se proponha a trabalhar com atitudes, com formação de
valores, com o ensino e a aprendizagem de habilidades e procedimentos (PCN,1998).
Quanto ao questionamento se a escola promove algum tipo de evento ecológico além das
atividades em sala de aula, 70,42% do Ensino Fundamental responderam positivamente. Já no
Ensino Médio 61,7% dos alunos afirmaram que a escola não promove eventos desse tipo
(Gráfico 3).
Dentre os eventos citados destacam-se, para todos os ciclos do ensino fundamental, o
plantio de árvores, com 50% e mutirão de limpeza das ruas com (16%). Essas atividades
foram mais evidenciadas pelos alunos do 2° e 3° ciclos (Apêndice B). Também forma citados
a realização de jogos e caminhada ecológica, porém com uma representatividade menor.
No ensino médio, o evento mais apontado foi a caminhada ecológica com 27,78%, o
que não foi um resultado tão expressivo. Nesta análise, apesar de os resultados terem sido
superiores ao da caminhada, não foram consideradas as respostas palestra e dramatização porque foi
abordada na questão anterior, mas os dados estão expressos na tabela 3.1 do apêndice B.
147
40 Caminhada ecológica
35
Feira
30
25 Jogos
20 Festa
%
15
Mutirão de limpeza das ruas
10
Desfile da primavera
5
0 Palestra
Ensino Fundamental Ensino Médio
Dramatização
S em resposta
A educação ambiental como assinala Guimarães (2000) não deve ficar limitada ao
ensino de biologia/ciências ou descrevendo problemas, ou realizando campanhas para
recolher latas, vidros e garrafas de plástico. O importante é que também seja feita uma
reflexão sobre o porquê de tais atitudes. As atividades de educação ambiental, conforme a Lei
9.795/99 devem ser orientadas para que os alunos adquiram uma compreensão integrada do
meio ambiente em suas múltiplas e complexas relações, estimulando e fortalecendo uma
consciência critica sobre a problemática ambiental e social (BRASIL, 1999).
Complementando com Tristão (2005, pg. 256) “em vez da conscientização dentro de uma
abordagem comportamentalista da educação, a Educação Ambiental precisa pensar em
promover a autoconsciência para uma reflexão-ação de um saber solidário”.
60 Desmatamento
50 Lixo
% Poluição do rio
40
30 Poluição do ar
20 Queimadas
10 Outros
0 Sem resposta
Ensino Fundamental Ensino Médio
O maior problema ambiental na cidade de Caém, segundo 78,9% dos alunos do Ensino
Fundamental e 59,6% do Ensino Médio foi especificamente a poluição do rio Caém. Em
seguida destaca-se com 29,6% e 25,53%, respectivamente, a falta de saneamento básico que é
compreendido na visão de Neves e Azevedo (1997) como os serviços de abastecimento de
água, esgotamento sanitário, limpeza pública e coleta de lixo. O lixo foi citado
especificamente por 26,76 % dos alunos do ensino fundamental e 40,42% dos alunos do
Ensino Médio (Gráfico 4). Os problemas ambientais apontados pelos alunos realmente
refletem a realidade do município. Caém, até os dias atuais, não é servida por um sistema de
saneamento básico. A empresa do Estado responsável (EMBASA) não atende a cidade
deixando-a carente desse serviço. Em conseqüência, os efluentes domiciliares, comerciais e
também hospitalar, como citado por um aluno, são despejados diretamente no rio, sem
nenhum tipo de tratamento. O principal desafio do município de Caém, de acordo com as
respostas obtidas, consiste em viabilizar recursos para a implantação de sistemas de
tratamento de esgotos, coleta e disposição do lixo, assegurar o pleno abastecimento de água
potável à sua população, para a melhoria da qualidade de vida e do meio ambiente.
Os restos das atividades humanas, considerados pelos geradores como inúteis, indesejáveis ou
descartáveis.
É qualquer material considerado inútil, supérfluo, repugnante ou sem valor, gerado pela atividade
humana, e a qual precisa ser eliminada.
Sem resposta
Para Oliveira e Carvalho (2004, p.89), “o lixo pode ser definido como todos os tipos de
resíduos sólidos resultantes das diversas atividades humanas ou de material considerado
imprestável ou irrecuperável pelo usuário”.
149
qualquer material considerado inútil, supérfluo, repugnante ou sem valor, gerado pela
atividade humana, e a qual precisa ser eliminada, com 33,8% e 36,17%;
todo e qualquer resíduo proveniente das atividades humanas ou gerado pela natureza
em aglomerações urbanas com 29,6% e 36,17%;
restos das atividades humanas, considerados pelos geradores como inúteis,
indesejáveis ou descartáveis com 16,9% e 8,51%;
comumente, é definido como aquilo que ninguém quer com 2,81% e 23,4%.
Na tabela encontram-se os resultados distribuídos por séries.
90
80 Sim
70
60 Não
% 50 As vezes
40
30 Sem
20 resposta
10
0
Ensino Fundamental Ensino Médio
Ao serem questionados se sempre joga os resíduos que gera em lixeiras, 84,5% dos
alunos do Ensino Fundamental responderam que sim. Os percentuais por ciclo estão
distribuídos na tabela 6 do apêndice B. No Ensino Médio esse percentual foi menor, 48,94%
alunos fizeram essa afirmação (Gráfico 6). Aqui se questiona quanto a diferença nesses
percentuais, pois se o tema em questão fosse trabalhado desde as séries iniciais, como
preconiza os PCNs, o alunos do ensino médio, deveriam, nesse nível de ensino, ter uma maior
compreensão dos impactos negativos causados pelo lixo mal acondicionado e
consequentemente comportar-se de forma mais adequada frente ao meio ambiente.
ainda insuficiente para propiciar uma discussão mais aprofundada da Educação Ambiental,
como seria necessário”.
Sem resposta
GRÁFICO 6.1 - Quando o aluno não encontra lixeira próxima o que faz?
Em relação a atitude tomada por eles quando não há uma lixeira próxima para
descartar o lixo, 59,2% dos alunos do Ensino Fundamental e 48,94% do Ensino Médio
afirmaram que guardam o lixo consigo até achar uma lixeira. Nesta mesma ordem, 14,1% e
27,66% declaram que descarta na rua (Gráfico 6.1).
Vale ressaltar que alguns alunos não interpretaram a pergunta, em análise, da maneira
esperada pelas pesquisadoras. Estes relataram o que fazem com o lixo dentro de suas
residências, como: jogam no quintal, queimam e colocam numa sacola ou bacia até “o carro
do lixo pegar”.
GRÁFICO 7 - O aluno se preocupa com os resíduos deixados fora das lixeiras por outras pessoas?
Sobre a preocupação deles com os resíduos deixados fora da lixeira por outras pessoas,
a maioria disseram se preocupar (Gráfico 7). O Ensino Fundamental representando 94,36%
151
100
80
Sim
% 60
Não
40
Sem resposta
20
0
Ensino Fundamental Ensino Médio
Podemos perceber através dos dados coletados, que 70,4% dos alunos do Ensino
Fundamental e 53,19% do Ensino Médio demontraram estar conscientes do problema que
estão gerando ao se descartar os resíduos sólidos inadequadamente, quando poderiam ser
reaproveitados (Gráfico 11). No entanto 26,8% e 36,17 % nesta mesma ordem responderam
não estarem conscientes do problema que estão gerando.
80
60 Sim
% Não
40
20 Sem resposta
0
Ensino Fundamental Ensino Médio
Conforme Berna (2001) citado por Perin (2003) desde que os seres humanos passaram
a se organizar em tribos, vilas e comunidades, problemas com o manejo dos resíduos
passaram a existir e tornou-se uma conseqüência da vida. O lixo é considerado por muitas
pessoas, como uma coisa suja e que deve ser colocada no lugar mais longe possível, num
canto qualquer, distante de tudo. Por outro lado, a população não colabora com a limpeza da
cidade, pois costuma achar que as ruas e praças são terras de ninguém, e portanto pode-se
jogar papel de bala, de sorvete, no chão sem nenhum problema. Jogar o lixo na rua, ou em
qualquer lugar que não seja a lixeira, são gestos que mostra o quanto se precisa caminhar
quando se fala em educação ambiental. A maioria das pessoas que agem dessa forma, o faz
por não ter consciência dos males que isso poderá causar.
Outro
20
10 Sem resposta
0
Ensino Fundamental Ensino Médio
GRÁFICO 12 - Quem o aluno acha que é responsável pelos resíduos que gera em casa?
Em relação à questão: quem o aluno acha que é responsável pelos resíduos gerados em
casa?, pode-se observar no gráfico 12 que para 50,7% dos alunos do Ensino Fundamental
todos são responsáveis pelos resíduos gerados em casa. Já no Ensino Médio 65,96%
afirmaram serem eles próprios os responsáveis.
Sabe-se segundo a Constituição Brasileira que é de competência do poder público, a
coleta de lixo nos centros urbanos, mas a geração e o acondicionamento é responsabilidade
individual. Segundo Monteiro et al (2001, p. 45) “acondicionar os resíduos sólidos
domiciliares significa prepará-los para a coleta de forma sanitariamente adequada, como ainda
compatível com o tipo e a quantidade de resíduos”. Para eles a qualidade da operação de
coleta e transporte de lixo depende da forma adequada do seu acondicionamento,
154
básica entre um aterro sanitário e um aterro controlado é que este último prescinde da coleta e
tratamento do chorume, assim como da drenagem e queima do biogás. Sendo portanto o
aterro sanitário a solução tecnicamente mais indicada para a disposição final dos resíduos
sólidos (MONTEIRO et al, 2001).
Conclusão
O estudo sobre a inclusão dos temas meio ambiente e resíduos sólidos nas escolas e o
conhecimento e percepções dos alunos acerca destes é de fundamental importância para que
se possa avaliar o processo ensino-aprendizagem e contribuir para que seja abordada práticas
pedagógicas mais adequadas. Faz-se necessário relembrar que as atividades de educação
ambiental devem ser consideradas como um processo contínuo e contextualizado, permitindo
desta maneira a relação entre o conhecimento sistematizado e a realidade cotidiana dos
indivíduos envolvidos, levando os indivíduos a se posicionarem como cidadãos críticos e
reflexivos diante das questões ambientais. Segundo os PCNs (1998, p.187) “cabe à escola
também garantir situações em que os alunos possam por em prática sua capacidade de
atuação”. Foi demonstrado que a maioria dos alunos, tanto do Ensino fundamental quanto do
Ensino médio, possuem uma percepção dos principais problemas ambientais da cidade de
Caém e as causas desses problemas. O lixo que corresponde o alvo desta pesquisa, foi citado
como um dos problema. Reconhecem, junto com a família, a responsabilidade pelos resíduos
que gera e sabem a forma de disposição final do lixo em sua cidade.
Em relação aos resíduos gerados por eles, constatou-se que os alunos do Ensino
Fundamental adotam uma postura mais adequada frente ao meio ambiente do que os alunos
do Ensino Médio. Esse fato leva a refletir sobre as práticas pedagógicas utilizadas e o
currículo do curso deste nível de ensino. Observa-se que a cada ano que passa, os exames
vestibulares cobram uma quantidade maior de conteúdos específicos de cada disciplina,
deixando o professor com pouca possibilidade de criar espaço para trabalhar a educação
ambiental no dia-a-dia do ensino médio (FONSECA; COSTA, M. F.; COSTA, M. A., 2005).
Verificou-se que a maioria dos alunos pesquisados conhece como funciona a coleta
seletiva e reciclagem, e demonstraram interesse em participar de um programa de coleta
seletiva para minimização dos impactos negativos causados pelo lixo à cidade. Muitos se
apresentaram como voluntários na divulgação do mesmo. Sendo este um ponto positivo para
alcançar um dos objetivos específicos desta pesquisa que é justamente a implementação da
156
Referências
Resumo: O texto apresenta narrativas de professoras de Geografia que moram na cidade e exercem a
docência na roça, buscando através de suas narrativas, compreender os modos e as maneiras de fazer
docência nesse contexto específico. A intenção foi mapear práticas, estratégias e táticas materializadas
na operacionalização do trabalho docente em contextos rurais. Metodologicamente o trabalho ancora-
se em princípios epistemológicos da abordagem qualitativa de pesquisa, na perspectiva da pesquisa
(auto)biográfica, com ênfase nas histórias de vida e na vertente da entrevista narrativa. Foram
utilizados como instrumentos de recolha de dados: as entrevistas narrativas e as observações,
analisados a partir de princípios da hermenêutica (RICOUER, 1976), na perspectiva interpretativa-
compreensiva, além das contribuições de Schütze (1987), sobre a análise das narrativas. As narrativas
docentes, recolhidas mediante a realização de entrevistas narrativas, ao destacar a complexidade das
experiências vivencias em escolas rurais, sinalizam representações, sentidos e significados sobre a
docência, apontando questões importantes para problematizar o ensino de Geografia em contextos
rurais. Ao propor essa discussão, intentamos deslocar olhares para este tipo de escola/educação,
buscando com esse movimento de rotatividade dar atenção para questões em torno da problemática da
escola rural, dos processos de aprendizagem de seus sujeitos-alunos e das singularidades encontradas
pelas professoras no processo de ensinar Geografia em espaços rurais. Desse modo, ao revelar modos
de aproximar os conteúdos escolares dos contextos vivenciados pelos seus sujeitos-alunos, essas
professoras anunciam maneiras particulares de exercer a docência em escolas rurais.
Introdução
12
O título é inspirado nos escritos de Guimarães Rosa (1986), com adaptações para esse texto.
13
O texto é parte integrante da dissertação de Mestrado: Macabéas às avessas: trajetórias de professoras de
Geografia da cidade na roça – narrativas sobre docência e escolas rurais, defendida em abril de 2013, na
Universidade do Estado da Bahia, no programa de Educação e Contemporaneidade – PPGEDUC-UNEB.
159
14
Compreendida como manifestação de identidades sociais associadas ao mundo rural. Refere-se à natureza e
aos processos de produção e reprodução da vida (MOREIRA, 2005).
161
Tomando o emblemático contexto, situado no inicio dessa escrita, esta seção do texto
tenciona compreender o ensino de Geografia ministrado em escolas rurais, ao desvelar modos
e maneiras de ensinar nesse contexto específico. As professoras dessa investigação revelam,
em suas narrativas e nas práticas pedagógicas cotidianas desenvolvidas em escolas rurais, que
há uma necessidade de considerar em suas aulas a realidade dos sujeitos desse espaço,
fomentando o ensino de uma Geografia viva, vivida, que parte da nascença da terra, dos
alpendres das casas e ganha o mundo. Esta nova concepção possibilita o enfrentamento de
imposições de um ensino e de uma Geografia urbana, evidenciando as questões do lugar e as
especificidades do rural em seus processos de ensinar e aprender em escolas rurais.
15
Os nomes das professoras colaboradoras foram mantidos, conforme autorização e carta de cessão das mesmas.
162
[...] Ao ensinar Geografia em escolas rurais, a gente tem que pensar a nossa
realidade, aquilo ali que a gente vive, a gente tem que cuidar de onde a gente
vive para depois sair, a gente tem que conhecer o lugar que a gente vive para a
partir daí conhecer os outros lugares, [...] O local, eu acho que é essencial que
a gente conheça, porque se a gente não conhecer o local como é que a gente
vai conhecer os outros, então primeiro o nosso lugar, a nossa realidade,
nosso dia-a-dia, para depois as outras (professora Maria de Lourdes,
Entrevista Narrativa, 2012, grifos meus).
dos conteúdos geográficos, incitando, assim, protagonismo dos sujeitos-alunos rurais, no que
concerne às suas escolhas pessoais e no desenvolvimento de suas comunidades locais.
Assim sendo, Marta ver “na geografia a possibilidade dos alunos refletirem sobre seus
mundos sem desconsiderar outros”. Tal perspectiva sugere que as fronteiras se misturem,
atingindo, também, os processos pedagógicos, rompendo com a aparente homogeneização
que historicamente tem marcado o ensino de Geografia. Esse entendimento perpassa pela
escuta e pela compreensão da experiência dos alunos, sujeitos rurais que, em sua relação com
o lugar, podem apreender importantes elementos de entendimento da realidade, reunindo,
nesse movimento de aprendizagem, subsídios para melhor lidar com o mundo que
cotidianamente se apresenta.
Desse modo, o lugar é compreendido como “o habitual da vida cotidiana, mas, por
outro lado, também é por onde se concretizam relações globais” (CALLAI, 2010, p. 36).
Aqui, o local e global, o rural e o urbano, o sujeito e o lugar possuem uma ação implicada, de
unidade e complementariedade e não simplesmente de dependência, como comumente tem se
perpetuado. Nesse sentido, portanto, o ensino de Geografia pode fazer a diferença em escolas
rurais. Entendendo que as práticas cotidianas são espaciais, o conhecimento geográfico torna -
se importante para a vida cotidiana, de modo que, compreender o mundo e ser sujeito de sua
vida são condições que possibilitarão aos sujeitos, rurais ou urbanos, viverem com dignidade,
como protagonistas do mundo.
O ensino de Geografia, portanto, deve situar o sujeito nesse mundo, mediante a
compreensão da espacialidade dos fenômenos, possibilitando-o apreender o porquê isso
acontece aqui e não ali. E nesse mesmo sentido, deve possibilitar que os sujeitos entendam
que os espaços são resultados da história dos homens, os quais vivem nos lugares e que por
isso são construídos a partir dos interesses dos que ali vivem e produzem suas vidas. Isso
porque “o sujeito pertence ao lugar como este a ele, pois a produção do lugar liga -se
indissociavelmente à produção da vida” (CARLOS, 1996, p. 29).
É no lugar que aflora a vida, os sentimentos, as tensões, as alegrais, as saudades, os
pertencimentos. É no lugar que se fala do mundo, que se escondem os segredos, é nele que a
vida acontece no ápice de sua autenticidade. É! “Pobre dos que não tem esse sentimento de
pertencimento, que não tem lugares seus” (KAERCHER, 2004 p. 317). Tomando o espaço
rural como esse lugar, marcado pelo plano do vivido, o qual dá sentido e significado às
histórias dos sujeitos rurais, ao ponto de produzir uma identidade que lhes é peculiar e uma
Geografia que lhe é particular, estes sujeitos se reconhecem nesse espaço porque é este o seu
167
lugar de vida. É considerando esse lugar rural, espaço geográfico de vida onde se concretizam
todas as dimensões da existência humana, que se aposta no desenvolvimento de um ensino de
Geografia que contemple por um lado, a diversidade do mundo e, por outro, a singularidade
do lugar.
Nesse sentido, escutar os sujeitos-alunos rurais tem sido uma possibilidade de
aproximar os conteúdos da Geografia e de suas vidas-mundos. Assim, ouvir os alunos tem se
configurando como uma ação pedagógica importante no trabalho da professora Marta, como
se pode ver na narrativa a seguir:
Então acredito muito numa prática onde a gente possa abrir espaço
para que o aluno diga de si, diga o que pensa. Eu digo que a escola hoje ela
não seja tão boa porque a gente pára muito pouco para escutar o aluno como
deveria, eu acho que é o aluno que nos dar pistas de como melhorar
nossa prática e assim fazer dessa escola um espaço de conhecimento
mas, também de vida. [...] Então eu fui um pouco nessa perspectiva de
perceber a realidade e dar vida a essa Geografia, deixando que a vida deles
aflorasse. A intenção é propor uma Geografia que os envolvesse, que tivesse
sentido para eles, porque acho difícil você não querer se envolver em algo
que você se sente parte. Mas é sempre um desafio, na verdade eu aprendi a
ser professora de Geografia da roça com os meus próprios alunos, muito
mais do que as teorias [...] Tudo eu busquei para subsidiar a minha prática,
mas muito mais eu aprendi a ser professora de Geografia com meus próprios
alunos, eles foram sempre o ponto chave para pensar, para refletir de que
forma eu poderia ser melhor. [...] A cada aula que eu vejo que eu consegui
realmente mexer com a vida deles, isso me faz cada vez mais sentir o desejo
de continuar sendo professora de Geografia, porque na verdade eu aprendi
por meio da Geografia, essa possibilidade de mexer com o aluno, com a vida
dele implicada com o seu lugar, sua escola, sua comunidade (professora
marta, Entrevista Narrativa 2012, grifos meus).
Ao tecer “posições avaliativas” (SCHÜTZE 1987) sobre sua trajetória e sobre sua
constituição docente, esta professora evidencia, em diversos momentos da narrativa, por meio
de “teorias explicativas”, reflexões pertinentes sobre suas concepções e práticas docentes.
Desse modo, mediante um “sistema de orientação atual”16, apresenta resultados positivos no
processo de ensinar Geografia, conseguidos ao longo de sua experiência docente em contexto
rural. “[...] Claro, que durante a trajetória não foi sempre assim, mas hoje eu já posso dizer
que é dessa forma, e isso me deixa muito feliz, porque eu fui aos poucos me constituindo mais
e mais professora da roça”.
O ato de escutar os sujeitos-alunos rurais e valorizar suas falas no processo de ensinar
Geografia nos faz reconhecer que o aluno do espaço rural, quando chega à escola, já traz uma
bagagem de conhecimento valorativo, criado a partir das relações anteriormente estabelecidas.
Entretanto, a escola, muitas vezes, ao desconsiderar a voz desses sujeitos rurais em suas
práticas docentes, reforça a negação do meio rural, realçando as diferenças culturais e
propondo um ensino distante de seus contextos e perspectivas, deixando o aluno à margem,
entediado, uma vez que não se reconhece enquanto sujeito no contexto da aprendizagem
geográfica. Trata-se, portanto, da necessidade de escutar esses sujeitos e, de maneira crítica,
valorizar os saberes espaciais, políticos, culturais e experienciais.
Diante de tal realidade, é importante romper, independentemente do contexto sócio-
histórico-geográfico onde estejamos inseridos, com um ensino de Geografia distante da
realidade dos alunos, sobretudo para alunos-sujeitos rurais, que convivem diretamente com
uma lógica urbana. Essa idealização do urbano, que também inspira, em sua maioria, os textos
e documentos legais sobre a educação em espaços rurais, tem encontrado na palavra
“adaptação”, empregada repetidas vezes, a indicação de tornar acessível ou de ajustar a
educação escolar às condições de vida rural. Os dispositivos legais, dentre eles o currículo, as
propostas pedagógicas e o livro didático, encontram-se amparados, de algum modo, no
paradigma moderno, que supervalorizou o modo de vida urbano, influenciando, também, um
ensino de Geografia urbanocêntrico, fomentando um currículo e uma prática docente urbana,
neutralizadora e silenciadora do outro, do subordinado, neste caso, o rural e o modo de vida
dos seus sujeitos.
Outras questões são narradas pelas professoras, no que se referem aos dilemas e às
tensões da profissão:
16
Nesse caso, a avaliação do percurso nasce de sua posição atual, que é a referência temporal norteadora da
analise da trajetória/experiência (SCHÜTZE 1987, trd. DW, 2003).
169
Ademais, as narrativas das professoras validam, nesse sentido, que a profissão docente
é uma profissão marcada por interações humanas (TARDIF; LESSARD, 2012), fonte de
prazer e valorização, cujos resultados estão sempre voltados, por um lado, pela individulidade
de quem pleita o trabalho, nesse caso o professor, e, por outro, pela coletividade onde se
inserem suas práticas materializadas sempre no encontro com outro, neste caso, os alunos-
sujeitos rurais.
(In)conclusões
Através das narrativas das professoras, muitas questões emergiram no campo da vida e
da profissão, todas elas atravessadas por constantes subjetividades. Por isso, nesse texto,
nossas análises buscaram apreender, a partir de uma perspectiva “hemenêutica compreensiva”
RICOUER (1976), modos e maneiras de exercer a docência em contextos rurais. Assim, em
um movimento de ida e vinda, foi possível evidenciar/publicizar práticas de professoras de
Geofragia em contextos rurais, que através de “gestos cotidianos” (CERTEAU, 2001, p. 47)
reiventam a vida e a profissão docente.
Desse modo, ao tomar suas vivências e relatar experiências inseridas nesses
atravessamentos diários, as professoras falaram de modo simples, deixando escapar a
complexidade e as dinâmicas implícitas no trabalho docente, onde o elemento humano (a
pessoa do professor) transita nas interações personalizadas pelos sujeitos-alunos rurais,
interações imersas em subjetividades. Foi possivel perceber, ainda, que tais interações
acontecem dentro de um espaço-tempo/mundo de vivências, onde as professoras e os alunos
partilham suas certezas e incertezas nos processos de ensinar e aprender em contextos rurais.
O trabalho envidenciou ainda, que tem sido por meio da compreensão e do
conhecimento do lugar que as professoras das escolas rurais buscam compor suas práticas
educativas, de forma a respeitar os saberes socioculturais dos alunos, os quais são construídos
mediante suas interações com o lugar. O lugar é então um espaço vivido, concebido e
percebido, local onde as relações do cotidiano acontecem constantemente, sofrendo suas
mudanças. Ele é, pois, um produto da experiência humana. Nesse sentido, a referida categoria
significa mais que o sentido geográfico de localização, o “lugar é o centro de significados
construídos pelas experiências” (TUAN, 1983, p. 43) de quem vive o lugar, de quem
compreende sua dinâmica e respeita suas singularidades.
171
Nesse sentido, o trabalho das professoras, encontra-se ancorado nesse mundo vivencial
donde extraem seus sentidos e significados, seus modos e maneiras de ensinar Geografia em
escolas rurais. Contudo, nessse movimento de olhar atentamente as práticas das professoras,
muitas coisas, sobretudo no que concerne às bases de uma Geografia crítica precisariam ser
consideradas e problematizadas nesse trabalho. No entanto, a intenção não foi tecer críticas e
pôr em cheque as fragilidades e as inconformidades expressas nos discursos e práticas
cotidianas das professoras. Desse modo, entender as limitações das professoras não significa
justificar as fragilidades e incorências de suas práticas, mas pecerber que cada uma das
professoras materiliza suas práticas nessa humana docência.
Assim sendo, parafraseando Guimarães Rosa (2001), posso afirmar: “docenciar é um
negócio muito perigoso”, isso porque nem sempre operacionalizamos o que acreditamos e
nem sempre acreditamos no que operacionalizamos. Nessa corda de equilibrista, ainda que
reconheçamos outros modos significativos de “docenciar” em escolas rurais, não há, portanto,
como negar que existe uma linha tênue entre desejo e prática, realidade e ficção, conteúdo e
realidade, Geografia e vida que atravessa os cotidianos das professoras colaboradoras dessa
investigação, mas isso não pode nos imbolizar. Por ora, é tempo de validar elementos
positivos operacionalizados pelas professoras, que em suas práticas docentes, com modos e
maneiras singulares, buscam anunciar aos sujeitos-alunos rurais que o mundo não é longe
daqui!
Referências
Introdução
Vale ressaltar que todas as imagens que serão utilizadas nessa oficina aqui proposta são
constituintes do universo de comunicação não verbal da língua e que esse “leitor” para o qual
se designa essa atividade pode ou não ter domínio completo da habilidade de leitura. Portanto,
ao final dessa oficina de leitura objetivamos responder positivamente a problemática que
norteia toda essa atividade: “É possível ler, sem saber ler?”, ou em outras palavras, “Qual
seria a capacidade de interpretação e significação para alguém que não sabe ler?”.
Para aplicação dessa oficina foram escolhidas como participantes, algumas crianças das
mais variadas faixas etárias, nos mais variados níveis de escolaridade (incluindo também as
que não são alfabetizadas). Essas crianças compõem uma instituição rural de ensino – Escola
Estadual Rural Taylor-Egídio (ERTE) na cidade de Jaguaquara. Lá elas recebem educação
básica, além de auxílio na alimentação, saúde, entre outras necessidades básicas de toda
criança. Esta escola foi escolhida para a aplicação da oficina por apresentar uma realidade
diferenciada de contato com a língua, devido à origem rural.
Por meio das interpretações que as crianças fizeram das imagens observadas tornou -se
evidente a demonstração de que é possível ler sem saber ler. Neste contexto, o universo de
significação e a habilidade cognitiva de percepção propiciaram uma capacidade de leitura
diferenciada que certamente contribui com a constituição do ser de cada criança, assim como,
com o seu desenvolvimento da leitura de mundo.
Objetivos
Objetivo Geral
Objetivos específicos
Aplicar oficina de leitura utilizando imagens para demonstrar que mesmo sem o
domínio da escrita existe a possibilidade de ler.
Estimular o processo de leitura despertando na criança a perspectiva futura de sua
formação como sujeito e cidadão.
175
Justificativa
Referencial
Portanto, o conceito de leitura é muito mais vasto do que o usualmente empregado no senso
comum. Essa afirmação está refletida também na seguinte citação: “As imagens, assim como
as palavras, são a matéria de que somos feitos” (Manguel, 2001).
A par dessa perspectiva, observa-se quanto a noção de leitura é restringida a textos
escritos na esfera escolar. As imagens são concebidas como instrumentos ilustradores do texto
verbal, mero ornamento para quebrar o ritmo cansativo da leitura. Porém, não é dessa maneira
que a leitura visual deve ser tratada e é isso que os estudiosos como Manguel e Freire
defendem em seus discursos.
O interesse por essa temática, só tem aumentado e isso faz com que vários
pesquisadores, de diferentes áreas, discutam cada vez mais a necessidade de uma
alfabetização visual.
Com a ampliação da noção de leitura para uma perspectiva que transforma o conceito
da mesma, outrora ligado apenas à interpretação de textos e trabalhos letrados, “(...) aprender
a ler significa também aprender a ler o mundo, dar sentido a ele e a nós próprios, o que, mal
ou bem, fazemos mesmo sem ser ensinados” (MARTINS, 1984).
Fica implícito aqui nesta declaração de Martins que ao contrário da leitura
convencional, a leitura de mundo é anterior ao ensino, ou seja, é subjetiva, é perceptiva,
podendo até ser num simbolismo mais exagerado, concebida inata.
A postura diferenciada do professor que oferece ao aluno uma "alfabetização visual"
dará a esse, condições de conhecer melhor a sociedade em que vive e interpretar a cultura de
sua época. E mais, ele vai descobrir as próprias concepções e emoções ao apreciar uma
imagem. "O professor tem de despertar o olhar curioso, para o aluno desvendar, interrogar e
produzir alternativas frente às representações do universo visual", afirma Fernando Hernández
(2000).
Por fim, utilizando as palavras de Charlot (2000), a leitura de imagens é composta por
um dos movimentos de ir e vir, presentes nas relações que o sujeito estabelece com ele
mesmo, com os outros e com o mundo. É, portanto, um movimento de leitura positiva do
universo realístico que possui um caráter epistemológico e metodológico. Em síntese, no
contexto deste projeto, a leitura é uma das ações humanas mais significativas na mediação das
relações entre os sujeitos e tudo aquilo que os circundam no seu mundo.
177
Metodologia
1. Leitura Coletiva
1.1 Temática: Leitura de imagens diversas
1.2 Objetivos: Incentivar a integração, e desenvolver a leitura de forma coletiva.
1.3 Material: Revistas, livros, pinturas, fotografias, desenhos, charges, etc.
1.4 Passo a passo:
Foram oferecidas as crianças várias imagens, desde fotografias, pinturas, charges,
imagens ambíguas, entre outras. Esse primeiro momento de visualização e
interpretação aconteceu de maneira coletiva. Sendo que, a interpretação de uma
criança, consequentemente, influenciou a de outra, como também a de todo o grupo.
Por isso, a priori, a subjetividade de cada uma não foi totalmente considerada. Nessa
etapa o relato do visual ocorreu oralmente. As crianças observaram e descreveram o
que estavam visualizando.
AVALIAÇÃO
Após as duas etapas foi suscitado um momento dialogado entre aplicador e crianças.
Nesse, elas descreveram o que acharam da atividade e o que pensam sobre leitura.
RELATO DE EXPERIÊNCIA
“Leitura de Imagens – É possível ler, sem saber ler?”. Para a realização dessa prática foram
selecionadas de forma aleatória 26 crianças, sendo essas alfabetizadas e não alfabetizadas, e
também solicitada à direção da escola a disponibilidade dessas para a atividade que teve
duração de aproximadamente 4 horas. A oficina iniciou-se às 14:00 h em uma das salas da
própria instituição. Logo de início foi falado ás crianças sobre a importância da leitura e
apresentada a abordagem “Leitura de imagens”. Houve total integração com as crianças na
etapa da leitura coletiva, na qual cada criança pode socializar sua percepção das imagens
observadas. Toda essa etapa ocorreu de forma bastante descontraída e agradável, pois houve
verdadeira interação com as crianças: maior parte das leituras foi feita em uma grande roda
formada por aplicador e crianças sentados no chão. Nessa etapa de leitura coletiva, foram
observadas e interpretadas algumas placas contendo imagens diversas; a partir delas as
crianças conheceram um pouco da tipologia textual, e elas mesmas, construíram textos
narrativos e descritivos. Também foram lidos ainda nessa etapa três livros: “Na roça!” e
“Pinote o fracote e Janjão o fortão!” – livros de predominância não verbal; e “Verde Vivo” –
livro totalmente composto de imagens (não verbal). As participações foram espetaculares, as
crianças desenvolveram muito bem cada leitura, mostrando serem possuidores de uma enorme
capacidade perceptiva. Na segunda fase da oficina, a da leitura individual direcionada, cada
criança recebeu uma folha de papel contendo uma imagem da qual deveriam desenvolver uma
história, ou seja, uma leitura. O resultado foi bastante significativo; mesmo não sendo tão
habilidosos com a escrita, cada criança, com a ajuda do aplicador, escreveu seu próprio texto
interpretativo. Eles se mostraram encantados por conseguirem ler as imagens e escrever sobre
elas. Após esse momento, foi feito o encerramento da oficina com um diálogo com as
crianças e alguns questionamentos sobre quão qualitativa havia sido a atividade. As crianças
afirmaram que a leitura de imagens é muito fácil e divertida, que gostaram de praticá -la, e
gostariam de realizá-la mais vezes. Mais uma vez, eles foram conscientizados sobre a
importância da leitura, seja verbal ou não, e como incentivo desta, cada criança recebeu um
livro de atividades com imagens, para marcar a significação daquela oficina em suas vidas. A
atividade foi muito benéfica não só para os alunos da ERTE, mas também para o aplicador
envolvido no projeto. Em fim, é muito gratificante saber que é possível realizar leituras de
mundo, sem possuir completa dominação das habilidades linguísticas.
180
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei de diretrizes e bases da educação nacional. Minas Gerais: Delegacia do MEC,
1997.
CHARLOT, Bernard. Da relação com o saber: elementos para uma teoria. Porto Alegre:
Artmed, 2000.
FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler. In: A importância do ato de ler em três artigos
que se completam. 45ªed. São Paulo: Cortez, 2003.
HERNÁNDEZ, Fernando. Cultura Visual, Mudança Educativa e Projeto de Trabalho. Porto
Alegre: Artmed, 2000.
KLEIMAN, Ângela. Leitura: ensino e pesquisa. 2ª ed. Campinas: Pontes, 1996.
MANGUEL, Alberto. In. MADALENA, Antônio. Se deixarmos de ler, iremos morrer.
Entrevista para o jornal O Globo, 2001.
MARTINS, Maria Helena. O que é Leitura. São Paulo: Brasiliense, 1984.
MOITA LOPES, L.P. Um modelo interacional de leitura. In: Oficina de linguística aplicada –
a natureza social e educacional dos processos de ensino-aprendizagem. Campinas: Mercado
das Letras, 1996.
ANEXO I
Introdução
passa a conhecer melhor seu processo de formação. Refletir pode ajudar o docente a entender
sua formação e um pouco sobre suas experiências, suas aprendizagens para melhor rever a sua
prática na sala de aula. Souza (2006) destaca bem a importância dessa reflexão quando afirma
que:
Profissão docente
A profissão docente no bojo de alguns problemas atuais deve ser discutida, para tentar
entender o trabalho que os professores rurais vêm desenvolvendo no seu dia-a-dia. Segundo
Nóvoa (1999, p, 15) “a função docente desenvolveu-se de forma subsidiária não
especializada, constituindo uma ocupação secundária de religiosos ou leigos das mais diversas
origens”. Ainda, segundo o autor durante anos imputou-se a profissão docente a ação dos
sistemas estatais do ensino.
Ser professor é uma tarefa que requer, em geral, dedicação, gostar do que faz, conhecer
a si mesmo e o lugar que atua. Na sala de aula, o docente vai articulando sua vida pessoal e
profissional, as quais vão se transformando e originando subsídios importantes para a reflexão
de como ser professor. Cada docente tem sua história de vida e uma trajetória. Assim, é
importante conhecer como os docentes percebem suas vivências e como elaboram os
acontecimentos, fatos, experiências que se entrelaçam e lhes permitem iterpretar o mundo.
Tratando-se de professoras rurais, vê-se de maneira clara uma atuação profissional que
brota de uma educação vagarosa, e que surge e continua até hoje a partir de um modelo de
educação do meio urbano. O docente formado na área urbana, e que vai atuar no meio rural,
necessita ter uma formação adequada e continuada para trabalhar com o meio. Neste sentido,
Caldart (2005), tem mostrado a importância destacada do professor no processo de progressão
e aprendizado dos alunos. Apesar dessa constatação, a condição de trabalho desses
profissionais tem se deteriorado cada vez mais. No caso específico de territórios rurais, os
docentes têm-se a baixa qualificação e salários inferiores ao meio urbano, enfrenta entre
outras coisas, a sobrecarga de trabalho, dificuldades de acesso à escola, em função das
condições das estradas entre outros. Ser professora rural implica em refletir uma identidade
em construção, refletir sua prática e compreender as demandas da sala de aula.
É preciso que o educador entenda que o ser humano é produto da sua história e que
estes diferentes grupos humanos que vivem nos espaços rurais têm história, cultura,
identidade, lutas comuns e específicas. Conforme Caldart (2005) a finalidade de uma ação
educativa é ajudar o indivíduo no desenvolvimento como ser humano. Sendo assim, a história
do sujeito e sua constituição mantêm-se, mas pode passar por mudanças, e é por conta destas
questões que o professor deve estar atento a demanda dos sujeitos rurais. Ao falar sobre a
profissão docente, é preciso pensar no lugar que se trabalha, ter um olhar voltado para o povo
185
rural com o intuito de direcionar sua prática, perceber que os alunos de espaços rurais são
pessoas que têm uma história de vida e estão em momentos diferentes de seu
desenvolvimento humano.
O docente pode pensar em não só atuar na educação, mas lutar pelas transformações
do meio rural e na sociedade inteira. O professor tem um papel importante no que diz respeito
a guiar o educando no processo de aprendizagem e mudanças. Para Zabala o docente
potencializa as capacidades que propiciem ao discente compreender o sistema social e
cultural. “É preciso insistir que tudo quando fazemos em aula, por menos que seja, incide em
maior ou menor grau na formação de nossos alunos” (1998, p.28). Ou seja, a formação não é
só vista como do professor, mas do aluno, pois o trabalho realizado pelo docente é válido para
estes sujeitos.
O professor rural lida com muitas questões na sua profissão, pois, “A profissão é uma
palavra de construção social. É uma realidade dinâmica e contingente calcada em ações
coletivas” (VEIGA, 2008, p.14). A docência envolve uma construção do lugar, das pessoas e
das ações. Assim, realização desse trabalho pode ser individual ou coletiva. As professoras
que estão no meio rural durante a sua profissão modificam a sua prática no seu exercício em
sala de aula, visto que estão sempre encontrando questões diversas para resolver. A prática no
contexto rural é determinada pela formação que este docente possui e que se configura na
realização de sua profissão. É possível entrever certo desconforto, certa dificuldade que
atrapalham muitos docentes que vão ensinar nas escolas rurais, que é a falta de um projeto
político pedagógico adequado à vivência do sujeito rural.
Caldart (2005) afirma que particularmente sobre os profissionais em educação das
escolas rurais, em comparação aos profissionais urbanos, que estes recebem menos formação
acadêmica e informação cotidiana, recebem menor remuneração e materiais didáticos e,
consequentemente, concentram maiores índices de doenças de trabalho. São muitas as
questões a serem resolvidas e que interferem diretamente na profissão docente, é preciso,
então, que o professor busque subsídios. Além disso, novamente nos deparamos com a ideia
de que o professor rural precisa saber manusear as questões do meio em que faz sua prática
acontecer, é muito mais do que apenas conteúdos, é uma realidade totalmente heterogênea.
Por isso o professor necessita estar em constante processo de formação, para atuar com
qualidade no ensino dos sujeitos que moram em espaços rurais.
18
Fiz a opção pelo feminino por se tratar de professoras que atuam em povoados diferentes
187
Apesar da identificação com o meio rural, mesmo que esta seja parcial, a professora
N1 mostra na sua narrativa o esforço para lecionar no espaço rural. Aponta a dificuldade esta
relacionada com a precariedade de material algo dificultor durante a prática pedagógica em
sala de aula. Compreender dilemas dentro da sala de aula é perceber os ritmos e tempos que
as situções vão conduzindo o fazer docente. A narrativa da professora N2 que diz se
identificar com o contexto rural, tem um itinerário de idas e vindas da cidade e da roça, onde
19
Os trechos aqui apresentados foram extraídos das narrativas, conforme pelos professores, mantendo-se a
fidelidade à escrita original.
188
leciona e diz que sente dificuldade na prática pedagógica durante os conteúdos expostos a
alunos do meio rural.
A professora N2 marca muito fortemente durante a sua narrativa a necessidade de uma
formação continuada para dá conta dos conteúdos e que seria necessário uma formação
voltada a educação do campo. A formação continuada é necessária a muitos professores que
tem o seu fazer docente constante.
Partindo do pressuposto sobre o trabalho docente em escolas rurais foram colhidas
as narrativas das quatro professoras. Estes puderam fazer uma reflexão sobre o seu processo
na vida e na profissão, expressando assim suas dificuldades e subjetividades e formação.
Além disso, foi possível perceber nas falas das professoras N3 e N4:
Percebe-se conceitos formados com relação a educação rural, um lugar atrasado, com
dificuldades e de poucas condições de trabalho. Em algumas narrativas percebe-se a passagem
da categoria “roça”. Segundo Rios (2011), as discussões feitas sobre as novas ruralidades e as
possibilidades de ressignificação do rural e dos discursos que o constituem como um espaço
de sentidos e significados, a roça poderá surgir pelo fato de carregar uma construção
histórico-epistemológica que marca os espaços e tempos no cotidiano de alunos e alunas. A
roça, que é um rural específico, um rural das pequenas e mesmo minúsculas propriedades; da
agricultura de subsistência; de homens e mulheres, trabalhadores e trabalhadoras que lavram a
terra para dela tirar seu “pão”, que não lhes rende riqueza, mas, quando muito, apenas o
sustento necessário à sobrevivência (SANTOS, 2006, p 43).
189
O professor em sua formação está sempre buscando mais aprendizados seja na vida
pessoal ou profissional. Na sua profissão o docente passa por um processo contínuo de
descobertas e/ou redescobertas. Muitas mudanças acontecem no decorrer dos processos
vividos, assim, há uma incompletude, o docente encontra-se em um processo de permanente
busca.
Para entender a formação de professoras Veiga (2008) diz que a formação docente é o
ato de formar, educar o profissional. Esta vem ao longo do tempo, se desenvolve em
momentos individuais ou coletivos, no sentido de construir saberes adquiridos pela
experiência ou pelas aprendizagens acontece de forma gradativa, na qual muitos elementos
podem estar envolvidos. Pensar em uma escola de qualidade para os sujeitos de espaços
rurais é repensar a formação inicial e continuada de professoras.
Essa formação ajuda transformar muitos aspectos dentro da sala de aula, como a
melhoria da prática, a busca de elementos novos para serem aplicadas na escola, e a
190
competência para resolver demandas que poderão sempre surgir. A prática diária é um
elemento de formação, não apenas as teorias e a experiência adquirida. A formação pode
ajudar o docente a encontrar respostas às dificuldades encontradas do dia-a-dia e é um
processo inicial e contínuo. Para Mizukami (2002), a formação inicial sozinha não dá conta de
toda a tarefa de formar professores, como querem os adeptos da racionalidade técnica,
também é verdade que ocupa um lugar muito importante no conjunto do processo total dessa
formação, se encarada na direção da racionalidade prática. Nota-se assim que a formação
inicial é um ponto de partida para o professor e esta não será suficiente para resolver todos os
assuntos que enfrentará no decorrer de sua atuação, por isso, a formação continuada é o que
dará suporte ao professor.
Ao longo dos anos, vem se questionando os cursos de formação continuada
fragmentados e de pouca duração, como um meio efetivo para alteração da prática
pedagógica. Mizukami (2002, p.71) diz a esse respeito: “Esses cursos, quando muito,
fornecem informações que, algumas vezes, alteram apenas o discurso dos professores e pouco
contribuem para uma mudança efetiva”. Essa é uma perspectiva clássica da formação
continuada de professores, que é vista como um processo de reciclagem, uma atualização.
Contrária a essa visão clássica, pesquisas sobre uma nova concepção de formação continuada
foram desenvolvidas. Para Candau (1996) todo processo de formação continuada deve ter
como fundamental a valorização do saber docente e a experiência que este possui na escola.
Sendo assim, o professor deve apropriar-se de seu processo de formação e fazer um processo
de reflexão sobre a sua história de vida seja numa dimensão pessoal ou profissional.
A reflexão sobre saberes que estão se configurando na docência é importante para uma
construção da identidade profissional do professor. Segundo Mizukami (2002) com o novo
perfil do professor, o conceito de formação docente é relacionado ao de aprendizagem
permanente, onde se consideram os saberes, as competências docentes, como decorrência da
formação profissional, das aprendizagens ao longo da vida. O processo de construção do
professor se desenvolve a partir da prática pedagógica, pelo compromisso com o seu trabalho,
através de uma formação contínua e mediadora de conhecimentos. O que acrescenta, também,
nesse processo de construção de identidade são as experiências vividas, as relações dos
professores entre si e com outras pessoas.
A formação do professor rural deve ser pensada de forma mais atenciosa, pois estes
lidam com muitas dificuldades no campo e sua grande maioria tem formação inicial, mas não
pensam em dar continuidade. Consta nas Diretrizes Operacionais para a Educação Básica das
191
Escolas do Campo (2002) que é dever do sistema de ensino municipal ou estadual assegurar a
formação do professor, seja ela no magistério ou em nível superior. As Diretrizes dizem
também que os cursos oferecidos aos professores deverão ter conteúdos da zona rural, os
conhecimentos devem ser voltados ao campo, às questões enfrentadas pelo educador rural.
Formar docentes para a atuação na educação rural é um desafio para as universidades e
são poucas as instituições de ensino superior que estão tomando a iniciativa de incluir no seu
currículo disciplinas para o professor rural ou até mesmo oferecer cursos. No entanto, já
existem programas de apoio à formação superior em curso de licenciatura em educação do
campo em algumas universidades federais, tais como a Universidade Federal da Bahia, a
Universidade Federal de Minas Gerais e a Universidade de Brasília. A oferta das licenciaturas
em educação do campo é oferecida a professoras que não têm formação superior e que atuam
no meio rural. Essas licenciaturas oferecem formação inicial específica, sendo esta uma
iniciativa viável aos educadores rurais. Para Rocha e Martins (2009) a experiência da
licenciatura em educação do campo está sendo construída, mas sucedem muitos desafios e
possibilidades.
Cita-se ainda o Programa de Apoio à Formação Superior em Licenciatura em
Educação do Campo (PROCAMPO) que é uma iniciativa do Ministério da Educação, por
intermédio da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD), em
cumprimento às suas atribuições de responder pela formulação de políticas públicas para
combater os problemas educacionais sofridos pelas populações rurais e a valorização da
diversidade nas políticas educacionais. O objetivo do Programa é apoiar a implementação de
cursos regulares de Licenciatura em Educação do Campo nas Instituições Públicas de Ensino
Superior de todo o país, voltados especificamente para formar educadores que lecionarão nos
anos finais do ensino fundamental e no ensino médio nas escolas rurais. A falta de interesse
das políticas públicas ainda interfere fortemente quando se trata de trabalhar a educação rural
e essas propostas ainda precisam se expandir a ponto de chegar a todos os professores rurais.
Considerações finais
O estudo realizado, a partir das narrativas autobiográficas de professoras de espaço
rural evidenciou, dentre outras coisas, que antes de se estudar o trabalho docente e a formação
de professores rurais, faz-se necessário entender as relações existentes no espaço rural, assim
192
REFERÊNCIAS
BRASIL. Resolução 01/2002 do CNE/CEB, que Institui as Diretrizes Operacionais para a
Educação Básica do Campo. Brasília: CNE/CEB, 2002.
193
RESUMO: O presente artigo procura analisar os problemas que contribuem para o fracasso escolar
nas classes multisseriadas enfocando o processo de ensino e aprendizagem da leitura e escrita nos anos
iniciais do Ensino Fundamental. Dessa forma, buscou-se refletir acerca do fracasso escolar em classes
multisseriadas, dos problemas que interferem na qualidade do ensino e as dificuldades apresentadas
pelos professores no processo de alfabetização no contexto múltisserie. Para tanto, a pesquisa foi feita
através de uma metodologia de base empírica em que foram utilizados como instrumentos de coleta de
dados entrevistas semi-estruturadas e observação da prática pedagógica dos educadores, bem como do
cotidiano dos alunos das escolas pesquisadas. Para esse estudo, realizamos uma pesquisa bibliográfica
com base em autores que discutem educação do campo e o processo de alfabetização. Assim sendo,
constatou-se a ausência de políticas públicas que garantam o acesso e permanência do corpo docente
das escolas, bem como as dificuldades dos educadores no processo de alfabetização que está
relacionado a falta de experiência em classes multisseriadas e uma formação específica que lhes
possibilite elementos teóricos e práticos que possam ser confrontados com sua prática pedagógica.
Introdução
Historicamente, percebe-se que o fracasso escolar em grande parte das escolas do
campo tem sido decorrentes aos problemas de acesso e permanência na escola que é composta
de classes multisseriadas, fato esse que, de certa forma, está relacionado ao processo de
ensino e aprendizagem da leitura e escrita nos primeiros anos do ensino Fundamental. Diante
disso, foi realizada uma pesquisa de base empírica em 03 (três) escolas multisseriadas que
atendem da Educação Infantil ao 5º do Ensino Fundamental de nove anos, que compõem um
núcleo denominado Subsistema Educacional, todas localizadas em comunidades agrícolas de
um Município do Baixo Sul da Bahia.
Nesse sentido, o estudo analisa os problemas que interferem no fracasso escolar nas
classes multisseriadas, especificamente no que tange as dificuldades apresentadas pelos
professores no processo de ensino e aprendizagem da leitura e escrita. Dessa forma, o
presente artigo traz reflexões acerca do fracasso escolar em classes multisseriadas, dos
problemas que intervêm na qualidade do ensino, bem como as dificuldades dos professores no
processo de alfabetização no contexto multissérie.
Considerando tais questões, foram utilizados na pesquisa os referenciais teóricos que
discutem sobre Educação do Campo, como Arroyo, Caldart, Molina (2009), Arroyo (2011),
Caldart, Pereira, Alentejano e Frigotto (2012), acerca de Classes multisseriadas, fundadas nas
195
ideias de Antunes-Rocha e Hage (2010), além de um texto que trata de fracasso escolar,
baseado em Patto (1999), e outros que se referem ao processo de alfabetização,
fundamentando-se em Ferreiro (2011), Moll (2009), Soares (1998).
Assim sendo, busca-se através da referida pesquisa interferir de forma cientifica no
contexto escolar, tendo em vista estabelecer um movimento dialógico que pode fomentar um
processo reflexivo sobre as questões inerentes ao processo de ensino e aprendizagem nas
classes multisseriadas do campo.
Dessa forma se faz necessário, que as práticas de leitura e escrita trabalhadas nas
escolas do campo, valorizem os conhecimentos presentes nas vivências dos campesinos,
através da exploração de textos que estejam dentro da realidade dos alunos. Sem a interação
entre texto e leitor, a leitura perde o significado e os alunos acabam perdendo o interesse em
praticar a leitura e escrita, pois conforme Freire se expõe na citação seguinte:
Por isso pensar certo coloca ao professor ou, mais amplamente, a escola, o
dever de não só respeitar os saberes com que os educandos, sobretudo os das
classes populares, chegam a ela saberes socialmente construídos na prática
comunitária- mas também como há mais de trinta anos venho sugerindo,
discutir com os alunos a razão de ser de alguns desses saberes em relação
com o ensino dos conteúdos. (FREIRE, 1996, p. 30).
No que diz respeito às políticas educacionais voltadas para alfabetização das crianças
do Ensino Fundamental, estamos imersos aos princípios de avaliações externas, que tem
introduzido no trabalho dos professores, práticas pedagógicas que atendam aos modelos
gerencialistas de avaliação, no intuito de tornar submisso o sistema educativo ao mercado.
198
Nesse sentido, são aplicadas a Provinha Brasil para o 2º ano e a Prova Brasil para o 5º
ano do Ensino Fundamental de 09 anos, com o objetivo de medir o desempenho dos
educandos nas diferentes modalidades de ensino com relação à prática da leitura, escrita e
conhecimentos matemáticos. Além disso, a propagação dos resultados dessas avaliações pela
mídia, tem reforçado a triste situação de exclusão já vivenciada pelos educandos da classe
popular, como define Arroyo (2011, p. 175),
Diante disso, fica explicito que o baixo desempenho dos alunos está fortemente
relacionado às características do seu grupo social, como se os fatores econômicos estivessem
relacionados à capacidade cognitiva. No entanto, fica camuflado a distribuição desigual de
oportunidades educacionais, “acostumando-nos à existência de um contingente crônico de
repetentes e excluídos na rede pública de ensino fundamental”. (PATTO, 1999, p. 22).
Assim sendo, a escola do campo, precisa se ocupar em criar possibilidades ao
educando, para o desenvolvimento de suas potencialidades, o domínio da leitura e escrita de
forma efetiva, permitindo o acesso às informações necessárias para sua formação omnilateral.
críticas e resistências de muitos educadores que defendem a política de nucleação, e por conta
de existir poucas pesquisas que tratem desta realidade.
Neste sentido observou-se que nestas escolas pequena parte dos professores, são
concursados, aceitam trabalhar no campo, por questões referentes aos concursos públicos que
oferecem maior número de vagas na área rural e para garantir sua estabilidade como
funcionária do município. Geralmente, depois de 02 anos, passagem do estágio probatório,
200
pedem transferência para cidade, por conta das más condições de trabalho existentes no
campo. Esses educadores enfrentam em média de 12 horas diárias, devido à distância do
trabalho até a sua residência, e as precárias condições do transporte e das estradas.
Em consequência dessa situação, o início do ano letivo e cumprimento dos 200 dias
letivos, ficaram comprometidos devido ao processo de contratação de professores para suprir
as vagas dos transferidos. Além disso, o salário dos professores que são contratados é inferior
aos professores efetivos, e estes também sofrem com os fatores relacionados também a falta
de pagamento, em razão destes contratos, serem realizados sem seguir os requisitos
necessários. Por conta, desse problema, no ano de 2012, nas escolas, 1 e 2, as aulas iniciaram
no mês de abril, e pela falta de pagamento dos professores contratados, o ano letivo foi
interrompido no mês de junho. Os educadores que iniciaram as aulas nesta unidade foram
substituídos em meados de julho, por outros professores que passaram pela seleção do REDA
– modalidade de triagem que contrata pessoas para prestar serviço por um determinado
tempo. Sabemos que estas questões podem interferir diretamente na qualidade do trabalho
destes profissionais.
Isso implica dizer que, quando se objetiva oferecer uma escola de qualidade no e do
campo, é preciso possibilitar a atuação de profissionais, principalmente de professores que
tenham relação constante com a escola, com a comunidade e com os alunos. Nesse sentido, a
estabilidade torna-se necessária, pois permite conhecer as vivências do aluno, a comunidade
onde a escola se localiza, suas culturas e tradições e assim desenvolver um currículo que
promova a aprendizagem significativa.
Além dos motivos já citados, os problemas com o transporte escolar e precariedade
das estradas, também influenciou muito o andamento das aulas nestas escolas. Neste mesmo
ano, houve problemas com o pagamento dos proprietários do transporte dos professores e
alunos que prestam serviço nestas unidades. As aulas foram interrompidas nos meses de
agosto e outubro, sem contar com os dias sem aula nos outros meses, por conta do
201
impedimento das estradas. A equipe gestora junto com a equipe de professores encerrou o ano
letivo, sem cumprir de fato os 200 dias.
Vale salientar também, que a formação dos professores tem forte influência na
qualidade da escola oferecida no Campo. As professoras que atuam na escola 1, tem apenas o
curso de magistério, as das outras escolas já concluíram o curso de Pedagogia.
Sabemos que os cursos de Pedagogia pouco têm preparado educadores para trabalhar
nas escolas do campo, incluíram em sua grade a disciplina Educação do Campo, mas falta
profissional especializado na área para assumir esta disciplina, geralmente disponibilizam
um professor, que pouco conhece a realidade da Educação do Campo. Tais problemas
refletem nas dificuldades dos professores ao atuar nas escolas do campo.
que é insuficiente, as condições oferecidas a esses alunos, quanto ao deslocamento por conta
do difícil acesso, condições insuficientes das estradas, e o precário atendimento do transporte
escolar como já foi comentado.
Em 2002, são instituídas as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica do Campo
e em, 2008 as Diretrizes Complementares, Normas e princípios para o desenvolvimento de
Políticas Públicas de atendimento a Educação Básica do campo, que foram elaboradas através
de seminários e conferências no intuito de garantir os direitos dos sujeitos do campo.
Uma das tensões que hoje vivemos na defesa dos direitos é serem defendidos
apenas como direitos abstratos e serem negados como direitos concretos,
direitos tão universais que não vemos gente, não vemos seres humanos neles.
Temos que defender o direito à educação como direito universal, mas como
direito concreto, histórico, datado, situado num lugar, numa forma de
produção, neste caso da produção familiar do campo. (ARROYO, 2006, p.
128).
Fico confusa! Quando estou com os alunos do 2º ano que ainda não sabem
ler e escrever e vejo que outros grupos de alunos, já terminaram a atividade e
estão parados. Sinto falta da Pedagogia ao me deparar com esses conflitos,
vejo que o curso de letras não dá subsídio para realização do meu trabalho.
(Professora da escola 1, turno vespertino)
Preciso conciliar o ensino para as diferentes séries, e dar atenção especial aos
alunos que ainda não conseguem ler e escrever. Nem sempre o que planejo
para atender as dificuldades dos alunos surte efeito. (Professora da escola 2)
A organização do tempo e do espaço tem sido um dos problemas que mais tem
dificultado o trabalho dos professores em classes multisseriadas, por conta da
sobrevalorização do modelo de escola urbanocêntrica, os alunos são organizados em grupos
por série e nível de desempenho na prática da leitura e escrita. “Na verdade, sabemos que esta
divisão dos alunos em busca da homogeneidade é ilusória e perigosa, pois é estigmatizante e
mais impeditiva do que benéfica à progressão escolar.” (PATTO, 1999, p. 258). Dessa forma,
a utilização do padrão de escola seriada tem desconsiderado a importância de se trabalhar com
a pedagogia da diferença, que muito tem contribuído na aprendizagem significativa em
classes multisseriadas.
204
Neste sentido, a linguagem oral e escrita é trabalhada nestas escolas, sem nenhuma
relação com o contexto vivenciado pelo aluno, ocasionando muitas vezes a chegada destes
educandos no 5º ano / 4ª série com poucas habilidades de produção e interpretação de textos.
Em consequência dessa situação, muitos professores centram sua atenção nestes educandos,
devido às inúmeras criticas constrangedoras dos professores da escola nucleada de 6º ao 9º
ano que recebem estes alunos.
Os professores participam do curso do PACTO, projeto que deu certo no estado do
Ceará, implantado pelo Governo do Estado da Bahia no município desde o ano de 2012. Foi
relatado que o curso não atende a realidade das classes multisseriadas, uma vez que enfoca
apenas os alunos do 1º ano e o material não discute o contexto do campo.
Considerações finais
do educador, com intuito de fomentar esse movimento criativo e inovador nas salas de aula
das comunidades do campo.
Referências:
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reinventando a escola multisseriada. Belo Horizonte, Autêntica, 2010.
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