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Jantar no Hotel Central

“ Crítica à sociedade
portuguesa”
O Jantar no Hotel Central – Resumo
O episódio do jantar no Hotel Central integra-se no capítulo VI de Os Maias de Eça de Queirós,
insere-se na acção principal e, como tal, trata-se de um episódio da crónica de costumes.
O Hotel Central é o cenário fulcral para o enredo desta obra da prosa queirosiana. Este local reveste-
se de especial interesse, por ser aí que Carlos da Maia vê, pela primeira vez, Maria Eduarda,
mas também por se realizar um Jantar, preparado por Ega, em honra do banqueiro Jacob
Cohen, marido da amante de Ega. É neste momento que Carlos penetra no meio social lisboeta,
adoptando, contudo, uma atitude distante.
O jantar no Hotel Central permite abordar a crítica literária e a literatura, a situação financeira do País
e a mentalidade limitada e retrógrada. Aí se retrata a polémica que marcou a Questão Coimbrã,
na discussão de Ega e Alencar, defensores do Realismo/Naturalismo e da moral do Ultra-
romantismo, respectivamente.
Com este episódio da crónica de costumes, o autor pretende demonstrar a nítida falta de
personalidade de Ega, Alencar e Dâmaso, a incoerência dos acérrimos defensores de estilos
literários divergentes – Alencar e Ega – que, momentos depois de uma intensa discussão que
chega mesmo a vias de facto, se abraçam como nada tivesse sucedido, mas, acima de tudo,
procura evidenciar a falta de cultura e civismo que domina as classes mais destacadas, salvo
Carlos e Craft.

Nota: A paginação apresentada, nas páginas seguintes, corresponde à edição “Livros do Brasil”
O Jantar no Hotel Central – Objectivos

O episódio do “Jantar no Hotel Central” apresenta como objectivos:

 Homenagear o banqueiro Jacob Cohen, como demonstra o excerto “… o Ega, alargando pouco
a pouco a ideia, convertera-o agora numa festa de cerimónia em honra do Cohen”;
 Proporcionar a Carlos da Maia um primeiro contacto com o meio social lisboeta;
 Apresentar a visão crítica de alguns problemas;
 Proporcionar a Carlos a visão de Maria Eduarda
O Jantar do Hotel Central – Intervenientes
Neste episódio demonstrador da sociedade lisboeta, e por extensão, de Portugal da segunda
metade do século XIX, participam as seguintes personagens:

 João da Ega
Promotor da homenagem ao banqueiro Jacob Cohen, João da Ega é a personagem que mais
participa neste episódio, defendendo convictamente o Realismo/Naturalismo (pág. 164). Ao
assumir esta postura, acaba por provocar o ultra-romântico Tomás de Alencar e criar uma acesa
discussão (páginas 172-174). A sua posição ao longo deste importante episódio assemelha-se
àquela tomada pelos jovens escritores da Geração Coimbrã de 1870, autênticos revolucionários,
o que o conduz, por vezes, a fundamentar as suas opiniões com argumentos exagerados.

 Jacob Cohen
O homenageado e representante das Finanças teve a oportunidade de, neste episódio, de
conhecer Carlos da Maia e salientar a importante posição que assume perante a sociedade. Era
um homem de estatura baixa, “apurado, de olhos bonitos, suíças tão pretas e luzidias (…) com
bonitos dentes” (pág. 161), casado com a “divina Raquel (Cohen)” que merecia respeito,
atendendo ao cargo que ocupava – Director do Banco Nacional (pág. 167).
 Tomás de Alencar
O poeta ultra-romântico Alencar é confrontado, no presente episódio, com os princípios
naturalistas/realistas de João da Ega. Eça de Queirós transmite-nos, no decorrer do enredo,
informações sobre este indivíduo:
Caracterização Física (pág. 159):
• “muito alto, com uma face escaveirada (escanzelada), olhos encovados”;
• nariz curvado, bigodes compridos;
• “calvo na frente”
• “dentes estragados”
• “testa lívida”
• Caracterização Psicológica:
• Aparentava um ar “antiquado”, “artificial” e “lúgubre” (pág. 159);
• “Camarada”, “inseparável” e “íntimo” de Pedro da Maia (pág. 159);
• Considerado um “gentleman” (pág. 176), “ generoso” (pág. 175) e um “patriota à antiga” (pág.
167).
 Dâmaso Salcede
O novo-rico burguês é a súmula dos defeitos da sociedade: provinciano, preocupado com a
vaidade e futilidade, como revela a expressão “chique a valer” diversas vezes proferida (pág.
158 e 171), e oportunista, pois louva Carlos da Maia com o objectivo de assumir uma posição
mais preponderante na sociedade. Também sobre esta personagem é realizado um retrato
físico, por sinal pejorativo: “Um rapaz baixote, gordo, frisado como um noivo da província, de
camélia ao peito e gravata azul-celeste” (pág. 157).

 Carlos da Maia
O médico e observador crítico apresenta-se pela primeira vez à sociedade, tomando uma
posição relativamente discreta. Define-se como defensor do Romantismo, apontando como
maior defeito no Realismo “os seus grandes ares científicos” (pág. 164).

 Craft
O representante da cultura artística e britânica tem uma participação pouco relevante neste
episódio. Pouco se conhece deste britânico admirado pelo escritor poveiro, apenas se presume
que tenha sido educado segundo os preceitos ingleses.
O Jantar do Hotel Central – Temas
discutidos
1. A literatura e a crítica literária (pág. 162-165)
As duas personagens que mais se destacam no debate sobre literatura são,
indiscutivelmente, Tomás de Alencar (ultra-romântico) e João da Ega (realista/naturalista).
Vejamos a posição assumida por cada um:

• Tomás de Alencar
– Incoerente, pois condena no presente aquilo que cantara no passado: o estudo dos vícios da
sociedade;
– Falso moralista, pois não possui outros argumentos; considera o Realismo/Naturalismo
imoral;
– Desfasado do seu tempo;
– Defende a crítica literária de natureza académica;
• João da Ega
– Defende exageradamente a inserção da ciência na literatura
– Não distingue Ciência de Literatura

Nesta discussão entram, também, Carlos da Maia e Craft que recusam simultaneamente o
Ultra-romantismo de Alencar e o exagero de Ega. Craft defende a arte como idealização do
que de melhor há na natureza, defende a arte pela arte. Estas duas personagens estão
próximas da doutrina de Eça, quando defende para a literatura uma nova forma.

2. As finanças (pág. 165-166)


As finanças são outro tema debatido neste jantar. O país tem necessidade dos empréstimos
ao estrangeiro. Cohen demonstra o seu calculismo cínico quando, ao ter responsabilidades
pelo seu cargo, lava as mãos e aceita que o país vá direitinho para a bancarrota, como diz
Carlos. Já João da Ega profere uma frase digna de registo, que marca a sua posição
relativamente a este tema: “- À bancarrota seguia-se uma revolução, evidentemente. Um país
que vive da inscrição, em não lha pagando, agarra no cacete […] E, passada a crise,
Portugal, livre da velha dívida, da velha gente, dessa colecção grotesca de bestas …” (pág.
166).
3. A história política (pág. 166-170)
Outro tema também focado é a história política, cujos intervenientes são Ega e Alencar. O
primeiro aplaude as afirmações de Cohen, defende uma catástrofe nacional como forma de
acordar o país. Afirma que a raça portuguesa é a mais covarde e miserável da Europa:
«Lisboa é Portugal! Fora de Lisboa não há nada.» (pág. 170). Aplaude a instalação da
República e a invasão espanhola. Alencar, por sua vez, teme a invasão espanhola,
considerando-a um perigo para a independência nacional, e defende o romantismo político,
esquecendo o adormecimento geral do país. Cohen afirma que Ega é um exagerado e que,
nas camadas políticas, ainda há gente séria. Dâmaso, cuja divisa é «Sou forte», diz que, se
acontece-se a invasão espanhola, fugiria para Paris. A posição de Ega é a que mais se
aproxima daquela que o autor da obra defende, pois também advoga uma catástrofe nacional
como forma de acordar o País.
O Jantar no Hotel Central – Marcas da
Prosa Queirosiana
Neste episódio, podemos destacar as seguintes características da prosa queirosiana:

 Hipálage
Exemplo: “Fora um dia de Inverno suave …” (pág. 157);

 Uso expressivo do adjectivo


Exemplo: “Um esplêndido preto (…) uma deliciosa cadelinha escocesa” (página 156);

 Uso expressivo do advérbio de modo


Exemplos: “Carlos, tranquilamente, ofereceu dez tostões” (pág. 155); “… mas horrivelmente suja.”
(pág. 156); “… maravilhosamente bem feita …” (pág. 157);

 Utilização do Gerúndio

Exemplos: “… estava mostrando a Craft …” (pág. 155); “… fora comprando, descobrindo …” (pág.
156); “… conversando com um rapaz baixote …” (pág. 157)
 Uso do diminutivo (com valor pejorativo)
Exemplo: “O judeu, num riso que lhe abria a barba grisalha uma grande boca dum só dente, saboreou
muito a “chalaça dos seus ricos senhores”. Dez tostõezinhos! Se o quadrinho tivesse por baixo o
nomezinho de Fortuny, valia dez continhos de réis. Mas não tinha esse nomezinho bendito…
Ainda assim valia dez notazinhas de vinte mil réis…” (pág. 155);

 Galicismos e Anglicismos
Exemplos de Galicismos (palavra ou expressão de origem francesa): “ – Très chic” (pág. 157); “ –
Petits pois à la Cohen” (pág. 171; “Tinha um bouquet de rosas!” (pág. 172)

Exemplos de Anglicismos (palavra ou expressão de origem inglesa): “Shake-hands” (pág. 175);


“Gentleman” (pág. 176);

 Discurso indirecto livre


Exemplo: “Dez tostõezinhos! Se o quadradinho tivesse por baixo o nomezinho de Fortuny, valia dez
continhos de réis. Mas não tinha esse nomezinho bendito… Ainda assim valia dez notazinhas de
vinte mil réis…”;

 Marcas de oralidade
Exemplo: “Eu a bordo atirei-me. E ela dava cavaco! (…) mas trago-a de olho (…) sentir umas
cócegas... E, se me pilho só com ela, ferro-lhe (…) a minha teoria é esta: atracão! Eu cá, é logo:
atracão!” (pág. 177)
FIM

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