Você está na página 1de 16

.

-f:
'I)eJ,..i('(v~ ~ d.Q ~
~ U/T Y <Dv 1O'Y( cv::::J..a

~.
i Ir
i
/\Jl~ eLe~,

'·'T-~·sJ,").. c
.~
...
i . ,
}
1\"
CAPÍTULO'1

t"~. . / C) '~ "C) .


O SIGNIFICADO DE REVOLUÇÃO i
. ' ~..:; ;~'.lé . l?)j~ I
~
i
\
I' J
~'I
I •. °
l

J
1

j
I
"I 1 '1

I
~JIjl
r}
fi' l!ól
Não nos ocupamos aqui com a questão da guerra. A metáfora que
mencionei e a teoria de um estado de Natureza que interpretou e desen-
"i

., :.~ I )

~~-I
volveu teoricamente essa metáfora - embora muitas vezes tenham servi-
.~:::~
'l',!?_ I. do para justificar a guerra e sua violência, em função de um mal original
Jfi;~ I
r--.:.-.....
· ~·I;;~~~IJ.T.·.~w:. ;<""""'"õC'-A4 .~.
.L\~ . inerente às coisas humanas e manifesto no início criminoso da História
humana - são ainda mais relevantes para o problema da revolução, pos-
Pasta Cópias :,;~~
..:~, I.
nO~'~N_
'j'~4:~: ~' to~ue.(i" ..._ ~'"_ .. ,~, r;.~~~..i'S~~oo~a~~~n' i
Prot.: -~-~_._~.",,!>2...:.T_· __ ,·~·;r.; . .......
~~~J~E~POlS as revoluçoe.s.; • '1:
1
embora possamos ser tentados a defini-lasj nâo são meras mudanças] A~ -

I
~~~~-'}.

DiSC.. : ------·-t;:::.""--~ L_

J
Data' '---
Cnr"t:r"""O'("!;j'rF

i--~
,I "~ ~ .• ',1i"'Q"
__ ' ·;1l.•..' __
.
_.c;.'
.•.•

.>o
~~~~~,~
•• ,.
I
',I.:~~.I
•••
revoluções modernas pouco têm em comum com a mutatic rerum da histó-
ria romana; ou com a créou;", a luta civil que perturbava a polis grega
-{ j
"-~--''''''._. ....".._.--.~.~ ' .., ~= ~ "-"-4.. .!

"~t~"
~:
'"
Não podemos equipará-Ias à IlE't'a.jjoÀ.aide Platão, a quase natural trans-
Tradução: formação de uma forma de governo em outra, ou à 7tOÀ.l't'S(Wv'élvuKúKÀ.wmç 1
'!-

Fernando Dfdimo Vieira de Políbio, o denominado ciclo recorrente a que estão ligados os eventos'
. ,,;:~ humanos, em virtude de estarem sempre sendo dirigidos para os extre-
1: .;
Revisão de tradução: ::~>i mos". A Antiguidade estava bem familiarizada com a mudança pOlítiCâ·I\.
,:1 l ,'~,
Caio Navarro de Toledo .. e com a violência que a acompanhava, mas nenhuma delas parecia dar
'Niil origem a algo inteiramente novo. As mudanças não interrompiam o cursp.j
\ ,,".,~

U.F.M.G. - BIBLIOTECA UNIVERSITÁRIA 1.--1 ~ daquilo que a 'Idade Moderna passou a chamar de História, a qual, longe , '1
i'·
~
.'7, de começar com um novo princípio, apenas recaiu num est~gio diferente
...;. '.
.-)
IIIJ/f/IfllUlllflUII
65359009
~
-::-.

I -""1<~j
..,
/-'"
~ ' ••.•
~
->.
do seu ciclo, seguindo .um curso pré-ordenado
acontecimentos
pela própria natureza dos'
humanos, e que era, portanto, imutável em si mesmo.
J~
'J
,I Há, no entanto, um outro aspecto das revoluções modernas que po-
r
de ser mais promissor na identificação de precedentes anteriores à Idade'
~\.':) LLJ .Ór

~
1
f',Ilt,.hJ átirél l),nB· '.'~:. , -.'. /,~, , . 1-") •. .":
-,
·1
------ -; I

• Optamos aqui por manter as expressões gregas no corpo do texto conforme utilizado pela auto-
~!
ra, sem a conseqüente tradução para o português, segundo a edição original em língua inglesa da
.
..J jj
Penguin Books. (N. do Ed.) ~f
Jl.'l
:,

. Ji.l ..
..-s...•....
..·:3A
-- . ".
o SIGNIFICAD@ DE REVOLUÇÃO·'
-' 17 .
.'
. _ ..,/ .:..o:!.
, .~

I que não tinham propriedade, era, com efeito, a fonte de toda a riqueza.
Nessas condições, a rebelião dos pobres, da "parte escravizada da
.' .., Moa~rna.~Quem poderia negar o imenso ~l gue",,"~<:~~.Q..~.QQl!l.yei.9
...
humanidade", poderia, de fato, ter por objetivo mais do que a libertação
Ia dese~~31Lc;;.m todas as .E~V.Ql!K9J~_lL
.._equem poderia deixar de lembrar
deles próprios e a escravização da outra parte da humanidade.
'1 que ÀristóteIêiÇql:úindõ'cô'meç'óu a interpretar e explicar a IlEt"al301.:aí de (A Am~ri.c:at9!1larª:s~ S) sÍIIl1:J()I()~~~.g1<!so<:jedade
sem pobreza, muito
Platão, já havia descoberto a importância daquilo que hoje denominamos
\ motivação econômica - a derrubada do governo pelos ricos e o estabele-
cimento de uma oligarquia, ou a ~glp.ada do governo pelos pobres e o esta-
.beIeci,mento de uma democracia?/Outro fato igualmente bem conhecido:
} ntes dáIdade Moderna, em seu desenvolvimento tecnológico único, ha-
ver efetivamente descoberto os meios de abolir aquela miséria abjeta de
pura indigência, que sempre fora considerada como eterna. E foi somente i

lda Antiguidade era o de que os hr~nos subiram ao poder com o apoio das' após isso ter acontecido e se tornado conhecido do mundo europeu, que
a questão social e a rebelião dospobres puderam desempenhar um papel
~i
I camadas simples ou pobres, e que sua maior probabilidade de se conser- verdadeiramente revolucionário.l O anti~o ciclo de_p_crenes recQrrêp.sias
[varern no poder estava nó desejo do povo de ter igualdade de condiçãciJ
A relação entre riqueza e governo, em qualquer país, e o entendimento
--
se baseava na dilslmçao.,..supest-álnent€--Ilatur"ll-;-eRtr:e..r:lcos-e.p.o
~oncreta
. - -' " .~I" .

existência da sociedade-ªID.l}FiGana,..ant~~n..to~da-l"e'-'.o-
bres..;3
r
de que as formas de governo estão ligadas à distribuição da riqueza, a sus-
~;!S~ haviãJnterromnido esse~ciclQ,de~um~vez-per~teda~ Existe um gran-
~ peita de que o poder político pode simplesmente acompanhar o poder eco-
de número de discussões eruditas a respeito da influência da Revolução
nômico, e, finalmente, a conclusão de que o interesse pode ser a força mo-
.~:~Americana 'sobre a Revolução Francesa (bem como a respeito da influên-
triz de toda luta política - tudo isso não é, naturalmente, invenção de
cia decisiva dos pensadores europeus no curso da própria Revolução Ame-
Marx, nem tampouco de Harrington: "Domínio é propriedade, real ou .
,. ricana). Contudo, por mais esclarecedoras e justas que essas investigações
pessoal"; nem de Rohan: "Os reis comandam o povo, e o interesse co- .. possam efetivamente ser, nenhuma influência demonstrável no decorrer
manda os reis". Se quisermos lançar sobre um único autor toda a culpa
~.', da Revolução Francesa - tal como o fato de que ela teve início com a
da chamada visão materialista da História, devemos recuar até IAristóte-
Assembléia Constituinte, ou de que a Déclaration des Droits de l'Homme foi
les, que foi o primeiro a declarar que o interesse, que ele chamava de
concebida segundo o modelo da lei de direitos de Virgínia - pode se equi-
aUI.uptpov,aquele que é útil a uma pessoa, a um grupo ou a um povo, tem·
parar ao impacto daquilo que Abbé Raynal já havia qualificado de "sur-
e deve ter domínio supremo nas questões políticas.l
preendente prosperidade" das terras que ainda eram colônias inglesas na.
Entretanto, essas derrotas e sublevações instigadas pelo interesse, em-
América do Norté. .
bora não pudessem deixar de ser violentas ou sangrentas, até que uma
~ Ainda teremos ampla oportunidade de discutir a influência, ou an-
nova ordem fosse estabelecida, eram apoiadas numa distinção entre po- ·1.1

~r~s e ricos, que estava, ela própria, fadada a i~r tão natural e inevitável
tes, a não-influência da Revolução Americana sobre o curso das revolu-
ções modernas. É incontestável o fato de que nem o espírito dessa revolu-
no corpo político, como a vida no corpo físico.'-.A questão social só come-
") ção, nem as ponderadas e eruditas teorias políticas dos "~Lt,!pdado-=,
ço~~ de~{::!!!~.h~Iõ.~~_~p~ln;.YJ21l!~ário quãnao. n~~õderría,'
re.s.'..'tiveram grande repercussão no continente europeu. Aquilo que os
rn~~_~~C::§L9.~llg1B~1~?.~~~~ç.§lEam a i~vida! ql~<:'~q9reia fo~e íner~!1- . 'hom~ns da Revolução Americana contavam como sendo as maiores ino-
tCà CO!1.Ç:UÇ~i,ºJl_l!.T!!.ªEa,
a duvidar-qUe a distiq@o entre os poucos que, por'
.: vaçQ.c's_.donovo &üverno republicano, a aplicação e a elaboração da teoria
i 'tlrcüÍÍstâncias, forçà··ou·fraude:ÇcônSeguiram libertar-se dos giiTIí:Oesda
de~Ql~tesquí~)sobre uma divisão de poderes dentro do corpo político,
1·~q1t:~-~lÍ~~~~·:~~~~:~:~?c~~;~~~~~~:~~;i~tit descmp'eííhOUum papel muito diminuto no pensamento dos revolucioná-
rios europeus de todos os tempos; foi rejeitada de pronto por Turgot, mesmo
~oençoada com a abundância, ao invés de amaldiçoada pela penúria foi,
antes da eclosão da Revolução Francesa, por razões de soberania nacio-
na origem, pré-revolucionária e americana; surgiu diretamente da expe-
nal5, cuja "majestade" - e maJestasfoi o termo original de Jean Bodin,
riência colonial americanal Do ponto de vista simbólico, poder-se-ia dizer \wi' por ele depois traduzido como souueraineté - supunha a exigência de um .
que o palco para as revolúções, no sentido moderno de uma transforma-' ',~
poder centralizado indivisíveL A soberania nacional, isto é, a majestade (
ção completa da sociedade, foi armado quando John Adams, mais de uma / ~
r do próprio poder público, como fora entendida nos longos séculos de mo- t.
década antes da irrupção da Revolução Americana, assim declarou: "Sem:/ ~
narquia absoluta, parecia estar em contradição com o estabelecimento de
.,~u
I1
pre considerei a colonização da América como o início de um grandicso
uma república. Em outras palavras, é como se o Estado-nação, bem mais 1
.projeto da Providência para a iluminação dos ignorantes e a emancipação
da parte escravizada da humanidade em toda a terra,,2. Do ponto ..de vista l~
~I
. antigo do que qualquer revolução, tivesse derrotado a revolução na Euro-
.pa, mesmo antes do seu aparecimento, Mas, por outro lado.] aquilo qU~1 ·1
teórico, o palco ficou pronto quando, primeiro Locke - provavelmente I)I
~~. representou para todas as outras revoluções o..prºº!e.ma.Il!~i~~IJ.r:g!"!til~:e .
sob a influência das prósperas condições das colônias dei Novo Mundo -
e, em seguida, Adam Smith, afirmaram que o trabalho árduo, longe de
!.,'

'~~~~~=:~i~cil=ê@~~Se!~fi~ºE;rC!.g-p'olítl~a.lnlõ:!lte,.
a q~~~t}~º.~Qcíal,.na.fm:JIH1_d~~ 1,
.\
.\.,
. ser o apanágio da pobreza, a atividade a que a indigência condenava os
o SIGNIFICADO DE REVOLUÇÃO 19 l

DA REVOLUÇÃO ,0'0;"
).
) 18
"--. :'=:"o7"~- -.-.-. - ..- .. ".~.:;;;-.:;;'.::-.-1(, .:::-.-: ::~•... __ ._ •._ .••_ ... _
-~
.......

"
f el
tJue"
IIld 1I,:uo"nlurman t(~Hd()_:~:~.~s.~ri,a
if\t1tI~I-ú.)ilL nCIM I.'LllUOS da Revolução Americana. Q.gue àlimentou~.-o
I Ç{MI "(lvllltl\.:ion{~rj()Uiil.Ew;op<wla:ifüi-ã-l<:evo!ÚçãoAmericana, mas a e:0s-
Jn'II'lH d'l w\l<.licôl.lllque se tiQham estabelecido na América, e que ~
CH:!.ªL
d~~_ng§sas ,. pr.'atiC.~rnCT1f:f! .T1oão.~){(,!l:'_çeu

.
Algumas palavras ainda precisam ser ditas sobre a freqüente afirrna-
ção de que todas as revoluções modernas são essencialmente, cristãs em
sua origem, mesmo quando sua fé confessa é o ateísmo. O argumento em

h/ll!1 q)!1l\l!cidCl~ naEuropa..,-rnuito antes.aa::Declaração.Ele--IuQependência.._., "..'~1..:if~:\\ apoio a essa concepção geralmente aponta para a natureza nitidamen 1'(:
rebelde da seita cristã primitiva, com sua ênfase na igualdadc das almas
')I)VO continente transformara-se num refúgio, num "asilo" e num . i\i ,;
perante Deus, seu manifesto desprezo por todos os poderes públicos, c sua
, "
1'/lnlO do encontro dos pobres; aí havia surgido uma nova raça de homens, , \
'.,\
''>1
promessa de um Reino dos Céus - noções e esperanças que se supõe te-
., unidos pelos laços ele seda de um governo moderado" , e vivendo em con- 'I nham sido canalizadas para as revoluções modernas, ainda que numa for-
dil:i1cH de "uma agTadável uniformidade", da qual "a pobreza absoluta, ! .}

ma secularizada, através da Reforma. A secularização., a separação da re-


pi"" un que a rnortç:", havia sido banida. Apesar disso, Crêvecoeur, aci- ~I
1111. cit.ulu, era radicalmente

('011'"
contra à Revolução Americana, que ele via
espécie de conspiração de "grandes personagens" contra "as das-
r ligião da política, e o surgimento de uni reino se..cular:,-com sua dignidade
~~ia~tamente-um~fatm::_crllcial..no-fenâmeno~da.J:eyolúção. De fa-
'17('H de homens comuns"~~'Não foi a Revolução Americana e sua preocu';- to, é bem possível que, no final, aconteça que aquilo que chamamos.rexo-
I---r---" ~~ - - lução seja precisamenteaquela fase transitória, que dá origem a u~ ..reino .
l'~íi.O 1;.)11!O eSl:abeleci~nto de um ~vo or..8'an~polítjcQ,.Jk..!!ma no-
' d . A""
vu Ionna C governo, mas SlIJLa menca., o novo contmente .,,- ,.0 am~
rioVQ~-s~~~liJiÚ:-.--Mas, se isso to~verdade, então é a própriaG~culá~Ízaçã~>
.ano. o "oovo homem", "a adorável igualdade", no dizer de-Ieffersen- e 'não o conteúdo dos ensinamentos cristãos, que constitui a õrlgêiil"da--;~e-
......

."que OA pobres usufruem juntamente C;:OITLOS ricosíl, que r_ev-º1JJcioJ:!!ll!..o volução. O primeiro estágio dessa secularização foi o aparecimento do ab-
solutismo, e não a Reforma; pois a "revolução" que, segundo Lutem,
esptrito elos homens, primeiro.na Europa, e, em seguida,~l
do - f; isso em tal-medida-que;-a-f>ar,.ti1'-àas~últimas..lªses
tilll!LQ.muI1:..:
da.Revolução;
,(' abala o mundo, quando a palavra de Deus é libertada da autoridade tra-
"fu,ncesa, até as revoluções de nossa própria ~poca, par.eceu aos revQIll.~'· ;:\ dicional da Igreja, é constante e se aplica a todas as formas de governo
I ,9onário,i,ser mais importante mudar a tessitura da sociedader.tal comg '.\ secular; não estabelece uma nova ordem secular, mas, de forma constante
\ fora.mudado na.América antes de-sua r,evoluGão,--do..que.mudar a:estrutu- I· e permanente, abala os fundamentos das instituições rnundanas+, É ver-
.~a..de-domf~·io-pf:lJ.ftieô:I.•Se fosse verdade que nada mais ~stava em jog,o I dade que Lutero, por ter-se tornado eventualmente o fundador de uma
onas revoluções da Idade Moderna do que a mudança radical das condi-
, ções sociais, poder-se-ia então dizer que a descoberta da América e a colo- 't ","
nova igreja, poderia ser incl~ído entre os grandes fundadores da História,
mas sua instituição não foi, e nunca pretendeu ser, uma nouus ordo saeclo- .
o nização de um novo continente constituíram suas origeris - Como se a rum; ao contrário, o que se visava era libertar mais radicalmente a verda-
"adorável igualdade" que surgira naturalmente, e como que organica- deira vida cristã das considerações e preocupações da ordem secular, quais-
mente, no Novo Mundo, só pudesse ser conseguida, no Velho Mundo, quer que elas viesseni. a ser. Com isso não queremos negar que a dissolu-
através da violência e da sangrenta revolução, quando lá se espalhou a ção do elo entre a autoridade e a tradição, possibilitada por Lutero, sua
notícia de uma nova esperança para a humanidade. Essa concepção, com tentativa de basear a autoridade na própria palavra divina ao invés de apoiá-
muitas e por vezes sofisticadas versões, tornara-se, de fato, bastante co-
Ia na tradição, contribuiu para o enfraquecimento da autoridade na Idade
mum entre os historiadores modernos, que tinham chegado :~.~?~_~~9 Moderna: Mas isso, por si só, sem a fundação de uma nova igreja, teria
IÓ!$~~.9:~i:I~q~~ TlenhulJl~.re~hWª.<?_E-ll..!_lli~oC~;:t:eré!...Q?-_A~irica~E certa {
,~e notável que essa idéia seja, de alguma forma, apoiada por KarlM<n:x'1 ~\
v
continuado tão ineficaz como as expectativas e especulações escatológicas
1· da baixa Idade Média, deJoachim de Fiore ao ReJormatio Sigismundi. Tem
ique parece haver acreditado que suas profecias sobre o futuro do capitar
r ~o e as vi~douras revoluções. proletári~s não se aplic.avam ao ?~senvo~L 'I.' f'
~,
sido sugerido recentemente que esses últimos podem ser considerados pre-
cursores um tanto inocentes de ideologias modernas, embora eu duvide
:'-Vímento social nos Estados Unidos, Quaisquer que sejam os merrtos dar 'ir:', i i\
1 ""
i'· qualificações de Marx -que mostram, certamente, uma compreensão ela \
disso"; da mesma maneira, os movimentos escatológicos da Idade Média
: realidade fatual bem maior do que os seus adeptos jamais foram capazes podem ser vistos como os precursores das modernas histerias de massa.
, de ter -, essas mesmas teorias são refutadas pelo simples fato da Revolu- )
: o

,/
/

Por isso, o espírito rebelde, que....parece-tão-~.y~iàente-eTll-ceTrmnrrovim-en-


; ção Americana. Pois os fatos são renitentes; não desaparecem quando os
\, historiadores ou sociólogos se recusam a tirar algum ensinamento deles,
l
.)
tos estritãiTie'iite religigsos da Idaàe-MoQ€rna;resultou-sem}'}re
mã'eSpécie de' Grande Despertar ou renascimento, os g!:lill.s,_não importa
ern-algu-
t
I

..,embora isso possa ocorrer quando todos os esquecem. Em nosso caso, es- o quanto possam ter "renascido" os seus seg1Jidores,_permaneceram ~i- i,
\se esquecimento não seria acadêmico; significaria, literalmente, o fim da ticamente sem consegüências e historicamente fúteis. Além disso, a teoria
"República americana. ._"I:~Õ-/:..: de que os ensin~tos cristãos são, em si mesmo's, revolucionários, se
.!/ ,
20 DA REVOLUÇÃO

~
.: o SIGNIFICADO DE REVOLUçio' ~I

j
i
I
';,
mostra não menos refutada pelos fatos do que a teoria da não-existência
I11,
11
'l;f<

conso~o; e fo~ essa experiênci~ que ~e.rsuadiu os filósofos gregos de que


"de uma Revolução Americana. Pois o fato é que nenhuma revolução ja- :l', eles nao preCisavam levar muito a seno os assuntos humanos, de que os
;' mais foi feita em nome da cristandade antes da Idade Moderna, de tal sorte i~[ ho.mens deviam deixar de conferir a esse campo uma dignidade totalmen-
que o melhor que se pode dizer em favor dessa teoria é que ela necessitou 'i;ll';'; te imerecida. Os illsuntos humanos II,1~_~<l,~,~,.~~~s!~!~mf;:!l_t~,_l!?:<:l,~
..~:rE:=-
de modernidade para poder liberar os germes revolucionários da fé cristã, r' ca produzia!!!...1!ª-d~_!!lteir.:ªm~Il_t~..!l~5),!
se alguma coisa de novo existia
, o que é, obviamente, dar a questão como provada. fi' 506 o sol, eram os próprios homens que nasciam no mundo. Por mais no-
Há, porém, uma outra alegação que se aproxima mais do âmago 1. vos que os VÉOl pudessem vir a ser, todos estavam predestinados a con-
,/
do problema. Temos enfatizado o elemento de inovação inerente .a to- , templar, através dos séculos, um espetáculo, natural ou histórico, que era
das as revoluções, e tem sido afirmado, com freqüência, que toda nos- essencialmente sempre ~ mesmo.
sa noção de História, pois-que essa segue um desenvolvimento linear, é
\;J/i
cristã em sua origem. É óbvio que somente sob as condições de um con-

a ceito de tempo linear, fenômenos como inovação, sin.gularidade-de..ac-<Ul.;


teClmento.s •...e..Q.U1~PQdt:m.séE..C.oncehiv.ci§.Na verdade ;~afilosofia cristã
,,-rompeu com o conceito de tempo da Antiguidade, porque o nascimento
de Cristo, tendo ocorrido num tempo humano secular, constituiu não só
2
O conceito moderno de revolução, inextricavelmente li ado à:~ri'oão
~~.

de que o curso a lstona come a subitament :um..n.OJW-x;u.mo,!de..qu.e


.um novo princípio como também um acontecimento único e sem 'repeti- I
-tl uma História inteiramente nova, uma História nunca antes conl:i~é:idâo
;ção. O conceito cristão de História, como foi formulado por Agostinho, riãrraaa esta para se esenro ar..J6.--a...! eswn ..€Glâ-e-alTt-es-tta-s-clnas-g:Fan{;le:
só podia conceber um novo princípio em termos de um acontecimento trans- fifi\ r-;'oluções no [mal do século XVIII..: Antes que se engajassem naquilo que
cendente que, incidindo sobre o curso normal da História secular. provo-
, casse a sua interrupção. Esse acontecimento, como salientou Agostinho, {\
'1'\
! li resultou em uma revolução, nenhum dos atores teve, o mais leve pressen- .
timento de qual iria ser o enredo do novo drama. Entretanto, uma vez'
ocorrerauma vez, ..porém jamais ocorreria novamente, até o final dos tem- U
iniciado o curso das revoluções, e muito antes que aqueles que se tinham
p~ A História secular, na concepção cristã, permanecia circunscrita aos
ciclos da Antiguidade - impérios surgiriam e desapareceriam como no 'i'1 ' envolvido nelas' pudessem saber se o seu empreendimento iria resultar em
.] r' vitória ou em derrota, a novidade da História e o significado mais recôn-
passado - com a única exceção de que os cristãos, de posse de uma vida
eterna, podiam romper esse ciclo de perpétua mudança e contemplar, com
~~Ir,:
. 1\ dito do seu enredo tornaram-se evidentes, tanto para os atores, como para
indiferença" o espetáculo que lhes era oferecido. 11;,1 " os espectadores. O enredo era, inegavelmente, ~I2arecimento da lihsr-
Que a mudança preside todas as coisas mortais não era, na realida- .t .illtds.,,Em 1793, quatro anos após a eclosão da Revolução Francesa, numa
de, uma noção especificamente cristã, mas uma idéia prevalecente nos úl-.
timos séculos da Antiguidade. Como tal, teve uma maior afinidade com
'~1;1
~,',;.y: \
" época em que Robespierre definia o seu governo como O "despotismo da
liberdade", sem receio de ser acusado de falar por paradoxos, Condorcet
resumiu o que todos sabiam: "h-, palavra re1!olucionário_sÓ.pode.s~,L~E.li.c!Lda
~~; I

as interpretações clássicas gregas, filosóficas e mesmo pré-filosóficas, do


que com o espírito clássico da res publica romana. Em contraposição aos i!!f ª_revoluções cujo objetivo seja·8. liberdade" 10. Que as revoluções estavam
. romanos, os gregos estavam convencidos de que a mutabilidade, ocorren- . '11'1 nã-ímmêildi'de anunciar uma era inteiramente nova, tinha sido atestado
do no rnundo dos mortais, e na medida em que todos eram mortais, não
podia ser alterada, pois estava baseada.rem última análise, no fato de que
ii1 ! anteriormente, com a criação do calendárioJ:,e..\illW,çionácio.,onde a execu-
ção do rei e a proclamação da república eram contados como o ano um.

"lT.,
. DS VÉOl, os jovens, que eram ao mesmo tempo "os novos", estavam cons- .~ j,
cmdaL Rortanto, para..a.compreensão das..re'lOluç,ÇíeS_da_IdadeM~".
• tantemente invadindo a estabilidade do status quo.[políbio, que foi talvez .c derna, ue a idéia de liberg.a.d~~ a experiência de um nova come o se: .
o primeiro escritor a ter consciência do fator decisivo de gerações que se
J i \:cõinc~d..ent~~:~E·aesde' que a noção corrente ncilnündeflivre-é deqti'~ {i
sucedem umas às outras através da História, enfocou os assuntos rqma- ,)
nos com uma perspectiva grega, ao salientar esse constante e inalterável
ir-e-vir no campo da política, embora soubesse que o objetivo da educa-
t
)~1'II
, liberdade, e não a justiça, nem a grandeza, D critério mais alto pa~a ojul-
gamento de constituições de corpos políticos, não é apenas o noSSOenten-
.dimento de revolução, mas nossa conceR,Çãode liberdade, nitídament~~
~

ção romana, em contraste com a grega, era unir c c os novos' aos velhos, ,'H
volucion' . 'ua ori em ue ode medir até ue Dnto estamos re-
.fazer com que os jovens fossem dignos de seus ancestraiª-~j)(9 sentimento
romano de continuidade era desconhecido na Grécia, onde a mutabilida-
\) parados Rara act:ita~,tW:.ejcitar...essli-cQiBGiQ&n<;:i~.Por conseguinte, mes-
de inerente a todas as coisas mortais era experimentada sem lenitivo ou
'() ;;0
nessa altura em que ainda falamos do ponto de vista histórico, pode
i,( ; 23
:\: . o SIGNIFICADO DE REVOLUÇ1Io
22 DA REVOLUÇÃO .j
,\
", ..;,
.;~
._-_._,_ ..._,~
.~ -.<~ .
I
.1

ser prudente fazerinos uma pausa e refletirmos sobre um dos aspectos sob
o qual a liberdade então aparecia - pelo menos para evitar os mal-
i~.~~i~,uiçª()artificial, a p{)lis" a.quéll~ em ra.zão d
e !!~S_~:~.~.~t,,~Y.<!-.J1:1.,.g~~m.a
entendidos mais comuns e ter um primeiro vislumbre da própria moder-. sua VÓJ.l.Oç,OStornaria iguais, A~igualdade existia apenas nessecá"i:!!.Ro es-\
nidade da revolução como tal.
pecificarnentep ..oEtico; onde g_~h9mens convIviam uns com ps outros co-
J I

~7~~~1'
~
=: Pode ser um truísmo afirmar que libertação e liberdade não são a
mesma coisa; que libertação pode ser a condição de liberdade, mas que
_.~'ao:s. e nãO=c'õffiõ\JêssõãSPrivaaas:R~I?:ç~ eTl~r~_.~.~~e
...a.-l1!lg?, I
não leva automaticamente a ela; que a noção de liberdade implícita na
.. f;:~I;~~j~~!~~i~~~;.i:~~~;'.;=~~Js~~~~~~.·~t~~::?J.~~~~ci~I~~~;;i~. I!
libertação só pode ser negativa, e que, portanto, a intenção ele libertar não Iíticas, feitas pelo" liõrrú!"In, dificilmente poderia s~r(':nt(ltizadaem derria- I
é idêntica ao desejo de liberdade. Nãoob.stante,
qüentemente.esquecidos, é porque a libertação sem~
se esses truísmos são fre-
esentou Com
sia, A igualdade da polis grega,sua isonornia, era um atributo da polis e /" I
não dos homens, os quais eram investidos.nessa.igualdade pela ..~~.~~cJªºiaJ l:/
nitidez, enquanto a liberdade foi sel!!.P.reinçer!'ª,..s.e não totalmente inúti . e não.emvirtudedonascimenr». Nem a igualdaP.e.-Ilen:J.a liberdaGle.el'a-~1 I
lérn disso, a liberdade desempenhou um papel relevante e um tanto con- entendidas como uma qualidadC-inerente à Natw::.eza humana, nenhuma
trovertido na história do pensamento filosofico e religioso, e isso através delas era CPúOl;~,.º9.~c!a~ pela natu,rez::" e..s~desenvolvendo por si mesmas;
dagueles séculos - desde o declínio do mundo antigo ao nascimento do elas"eram-VÓJ.l.úl,-1stQ_.é:_~õiivê.iic~ónaIse,artIhcIalS;-r>roãut(Js'do-esforço ..fiu., " s-
moderno - em que não existia liberdade política, e em que, por razões mano e das_ ualidades...d undo feÜp_p.~lQ§ehomens. . i';
que não nos interessa discutir aqui, os homens não se preocupavam com , Õs gregos afirmavam que~Q_ --ê.c :~-ã9-se-F-t}ntr-ê-Q~§:, /

\)-Ü isso. Portanto, tornou-se


l tender podibe,dade
iJase axiomático mesmo em teoria oIítica en-: .
olft Ú não umf~nômeno_ poli":?, m.. ao con"a- i.! .\
seus pares, e que, portanto, nem o tirano, nem o déspota, nem o senhor ",/ .,i
de. uma família - mesmo que fosse inteiramente liberto e não forçado por' ~I~('
~
.
.
--.no, a gama maiS ou
;'.
menos livre de atlvldades nao-J;l
,
.!:?mado corpo POhtlCQ pelJlUte-e..garante....aqueles-EI.uG-Q_CO.JlStltuem.
. m dete _I; ~
".
\
outros - era livre. O ponto fundamental da equação de Heródoto, de li- "
berdade com ausência de governo, era que o próprio governante não era
~ ~~'" Liberdade, como fenô~eno políti~~, foi con.temporânea das cidades- livre; ao assumir o domínio sobre outros, ele se privava daqueles pares
V .,'- _Estad?s g::egas. pesde .Herodoto~ ela_fOI e?t.endI~a Como uma f~r:na de em cuja companhia poderia ser livre. Em outras palavras, ele havia des:-\
~t'l orgamzaçao polItlca em. que os cldadaos VIVIam Juntos em condlçoes de truído o próprio espaço político, resultando daí que nenhuma liberdade
,&",- não:mandoc .,emurna di"inção entee govern~te, e goveénado,". ~"a pôde sobreviver, nem para si próprio, nem para aqueles sobre quem exer- ..
,,,,, noçao d~ nao- mando era exp""a pela palavra tsonomin; eUJa oaraete"'t~_ ·11!.' . da o seu domínio. A razão para essa insistência na interconexão entre lf~: .\
1/ ··-"·ca mais Importante, entre as formas de governo enumeradas pelos anti-
herdade e igualdade, no pensamento político, era.qlJ..!:_ª.LiQer<;lª.ili:,J:t:a-enJ.':.)'f}
I gos, era a de que a noção de mando (a "arquia", de apXElV, em rnonar-
nãd~.r
I .:__ q~ia e olig"'quia, ou a "ecaem", de xpar,Tv, em de~occaeia) e,~ava in- 'f;;
I:i~
~
ten~!gi:\-.,.Ç,Qill.9,~s.~.e.
~c:l?,.tp.'~ªnitesta.em.,certas.,.a.Jiyjºªq~J.rl.J ..!J:tl.,ª.nas.,,,embOl::a
absolutamente em todas, e.que essa.s.a.ti\'i~a_<ic,::~,.só-PQd~a.II1apareceI'e ser:(,r' .
I '/teIramente ausente dela. A polzs era suposta ser uma IsonomJa, nao Uma i~
r~aG-ci'uandõ'QiifrOs:as.obsel:vavam, as julgavam e-as conservavam na me
I ,'ldemocracia. A Pala~~9-A~.~e-~~~'-CL1.::!~.~ig!.1,Íf!~ayª-então ..o.gQy.em9_qª.maio.::.. U ;~ .:»

'~~
mória. A vida de um homem'l1vre necessitava da presença de outros'. Em
ria, foi cunhããâ- orIginalmente por aqueles que se opunham à isopQmi.i!,. j'IW: conseqüência, a própria liJ2~r.çLadedemandava um lugar onde as pessoas _.'
::-e"qüe-pieténâiãm"dizer:à -qlie'vocês "chamiúii.--aeriao::mãnCiÕ-·é:"~a verda- I '~
'i1
•. I
pudessem se reunir -(á" ágora)o mercado público, .ou a polis, o espaçá .
de,-apena"s'ü-iri'a'ÕütiàésPêCie'depoâér;éàPioi fanUa de governC);·O 'do-
\!Jlfmo"pdb'demos
' . 12
..... '. .. .. ' . . l'~ político propriamente ditõ-;---- . .

;0~'"' ..'Dessaforina, a i~-udade gue ~~sinall1~.r:~~~~.:roc-


11~j
Se pensarmos nessa liberdade ~olítica em termos modernos, tentan-
do entender o que Condorcet e os homens das revoluções tinham em mente
.~---:-rregúenteme~~ ,:omo um .p-mg.Q.~~~i6~rJ1'J.çLç.!. ..,~ra,
':'\l'~~
-, ' ..
ãõ proclamarem que a revolu ão tinluL _or alyoJJ..liº~rdade e gM~.J~.Jl,ªd~&.i.-
... nginalmente,. ~as~

~~"e,
p~ãy!:a ZSOTIO~~ria,
undo
ess.a. Es~. gu~ld~d.~~::~,!.ei,.~.;a
~~~~.~~~::SI~ç0A:l~çg.nd].~~~!_ emborá essa
até certo ponto, a eondição de toda a ativida<je poHt;'a
,(~
'it» ~
i .\
mento da II erdade significava o início de uma História inteiramente
vã; aeveillõs oDservar! :'primeirame·üte,-·ô·-rãtõ b-ãs-tan'téOEylo
pãsSlvelmente não estavam
"de:qL:~le~
ensando apenas naquelas liberdades que ho-
no-

1
no, m.
m . a.~tig.o,
ad ond.e o campo político. eS!~Xf.!....a._~~:tQ..apenas
,suza .PfQPl'le9 e ~ eS_~~ilV:?S,-mas a Igualdade dos que fazem parte do
..a.os.que.pos-.
:i~:~
.'
';1·11i.:~
.~.I,'i'
I~J'.rSV. .,

fi \,li
je associamos ao governo consíituç~ , e Qllc sao ap,ropnaãamente
nominados direitos civis. Pois nenhum desses direitos, nem mesmo o di-
de-

. Corpo de pares, A isonomia assegurava íaó'rllC;, a igualdade, não porque


( todo, o,. ho",eo, J"'''''_ilii~âiõido;-oUtivé;,,;;;-
O
;idó ·cr;.dó;-iguai" !"a;, (: ;\.,~"

'::'/:'
reito de participar do governo, já que a taxação demanda representação,
foi, na teoria ou na prática, o resultado da revolução 13. Eles foram o pro-
i . ao éOllt!,~rio, p fqlle. os_homenseriüri'~.:pºY~b-'attireza ((PÓeml), desiguais,. duto dos" três grandes direitos primordiais": vida,liberdade, proprieda-
~\ DA REVOLUÇÃO --- - .. .
Ir
i" .. de, em relação aos quais todos os outros direitos eram "direitos subordi-
.•li!\
~.
'·o! .•..•.:::•.. ··f
.• 1','"
:f PROJETO lnnT ("\Q o SIGNIFICADO DE REVOLuÇriO 2:i
~I\
~t'l...'
'- PNBUJSESU/MEC,,~
';J,

I
I,)'
ri Mas essa dificuldade em se traçan.uma fronteira entre libertação e
..m' liberdade, num determinado qyadLO_de..circunstâncias históricas, não síg-
"i I:; nifica que libertaçao e liberdade se'am a mesma coisa, ou que aquelas li- ,
" ..u, f?eWa es que' oram conquistadas em conseqüê.n.cia-daJibertação nos contem
.1,\ ~ toda a lustóna aa-llõeroãêIe, mesmo q.ll..e-a.qJlelesq:ue tentaram conguWr
a.ambas freqüentemente não distinguissem,,-C.QnLmui~a.dareza, essas q~-
~ Os homens das revoluções do século XVIII tinham o perfeito direito
a essa falta de discernirnento; era ela própria natureza de seu empreendi-
mento que eles descobrissem sua própria capacidade e desejo pelos "en-
cantos da liberdade", como JohnJ ay certa vez assim qualificou, no próprio
~~' 1

• .r~------ ------t:)-, ---------.---- ~ ------ ----r~------- -- -~-~-- -- -..------- -_.--~. li' ato da libertação. Pois os atos e feitos que a libertação deles exigia, lançaram-
~ . ,,' I
nos na atividade pública, onde, iÍitencionalmente ou muitas vezes inespe-
radamente, começaram a construir aquele espaço onde a liberdade pode
revelar os seus encantos e tornar-se. uma realidade visível e tangível. Da-
~
governo a reparaçao de injusnças: lt'nmClra rsmenoa uonStltuclOnal), pero do que eles não estavam, de forma alguma, preparados para esses encan-
~ que~ "~is;t~rica~ente, o direito d~ petição é o ,~ir~ito ?rimár~~", e a inte~- tos, dificilmente poder-se-ia esperar que tivessem plena consciência do novo
{}:'
fenômeno. Não era outra coisa senão o peso de toda a tradição cristã que
os impedia de admitir o fato evidente de que gostavam daquilo que fa-
ziam, para além das imposições do dever. ..
Quaisquer que fossem os méritos das exigências expressas da Revo:-'\
,I

:
lução ÃmerlCanã-:=--nenh'üma I
TãXãção-';~~---l:ep-;~~~-~ta-ção'-=~--eIa"cerfa-':
6 ~ rrlenteiiãÕ"ati;ãí~Cêm"flmçãõ·de-seÜs--ericãi1-fàs. Erã-'iirgõ-completamênte 1

4J ~üferen~~-~c.~~~E~~~~~a?ão~~_~~~~~,~S?~_~!~_~~9~,-ª~_~~~~_~~_~~ ,',~_-~_r.~t~~r \ ': .


. I . r,:.~_~_~_~ª_~!~Q.erª-ç-º!,!_s"_.~T.dle}Çao,e,,.a,per:suasao,_e._tudo_o
mals,qll~_s~}azta \2J~
~ ! à sua conclusão lógica; governOj
•.. necessário para levar essa reivindicação
independenteea criação de. uIT.l.!?()Y9corpo ,pol(tico, Fcii-~'ti~vesde'ssas
experiências que aqueles que, .naspalavraªde J ohn Adarns, tinham sido

··~~1::~:~~~;,~e~:::f~~c~~~i~ :
f
ô li
.. !
ã
~~:~~~~çl~~:e:;~~ft:t~D~~~~Ç~~:'~~~s,~~'~
'-'--"CY'qu-ea'-revoll:i'çaõ'tr'Oux'e luz p
-füressa'ex érlêllêia'dê-ser-lívre,
essa foi uma experiência nova, embora não na História do mundo ociden-
tal - foi bastante comum na Antiguidade greco-romana -, mas em rela-
e

t '-
.-",
.:

I1
!
t
ção aos séculos que separam a queda do Império Romano do advento da
Idade Moderna, E essa experiência relativamente nova, pelo menos para
aqueles que a viveram, foi, ao mesmo tempo, a experiência da capacidade
do homem para iniciar alguma coisa nova. Essas duas coisas juntas - uma
nova experiência que revelava ~apacjdade do homem para a n_?vi.da~e.
~ I
_ estão na base do enorme~~):jue encontramos tanto na Revoluçâo
i Americana como na France~s'a sempre reiterada insistência d~ que
" ! , nada comparável em grandeza e relevância jamais acontecera antes em
toda a História documentada da humanidade, e que, se tivéssemos de avaliá-
)
~
~
ct:
~J). !
Ia em termos de reivindicação
inteiramente descabido.
bem-sucedida de direitos civis, pareceria

J'
\ -
o SIGNIFICADO DE REVOLUÇAO 27
26 ,DA REVOLUÇÃO
l
.'"
'~
\,
\\;~~
-( ~~~~r::~_~?~.:,_:ss~.e~!h~~ do para cobrir a nova experiência, seja o uso de uma antiga palavra, à

·l-í~~~
...~~.~. ;.~.~;~~~f~~~~~i.
~~.I1~::i?a.~~.~~f}zer.p:esenre, e Dnde~~D-
qual é atribuído um significado inteiramente novo. Isso é duplamente ver-
~.;;:-s.}i~ffi.il!,l.~:~.~l~I:~~~::~U~U:S
algo mais que insurreições bem-sucedidas, e que não temos justificativa
..g.·..:. .;~i~
t;:~~ u~.. dadeiro na esfera política da vida, onde o discurso tem o domínio supremo,
Não é, portanto, um .interesse meramente acadêmico observar que
J:i'ãJ:a:apdidai~ qualquer cou{J d'étaJde revolução, ou para enxergá-laemqual- a palavra revolução ainda está ausente onde nos mostramos bastante incli-
'",qlle!,.@e.rrª.çiYiJ..,J;>opulações oprimidas freqüentemente se levantaram em nados a julgar que poderíamos encontrá-Ia, isto é, na historiografia e na
rebelião, e uma grande parte da antiga legislação pode ser entendida co- teoria política do início da Renascença, na Itália. É particularmente sur-
mo salvaguarda contra a sempre temida, embora rara, sublevação da po- preendente que Maquiavel ainda empregue a mutatio rerum de Cícero, sua
pulação escrava. Além do mais, guerra civil e lutas de facções representavam I; mutazioni del stato, em suas descrições sobre a derrubada violenta dos go-
'I
para os antigos as maiores ameaças para todo corpo político, e a qllÂ.ía de vernantes e substituição de uma forma de governo por outra, na qual se
l-,
Aristóteles, essa curiosa amizade que ele exigia na relação entre os cida- ,
j; mostra tão apaixonadamente e, por assim dizer, prematuramente interes-
dãos, foi concebida como a mais confiável defesa contra elas. Coups d'état sado. Pois o seu pensamento sobre esse problema dos mais antigos da teo-
e revoluções palacianas, em que o poder se alterna de um homem para ria política não estava mais ligado à tradicional resposta, segundo a qual
outro, ou de um grupo para outro, dependendo da forma de governo em o. g~~ de _l;lE!._~ºJ].g~t;.va..à.demrt~ci.'l, <!-~~:w-..Q.ÇI.ªçiaJey..a"à.o.li-
que ocorre o coup d'état, têm sido menos temidas, porque a mudança que ~gy"ia, ~.,9lÜ~m;fLl,Ú~.)ev.<1,;~;W{m,~çj}.üa, e .}j~~~X~E~a - ,~.S.X~9~.~,s,...s~~~,
elas acarretam é circunscrita à esfera do governo e provoca um mínimo" pos~i!?~i.qt!:ç!~§,.g.l:;lip_~~Et~Aini<:.~~~!!º..t.~.E!2LR1~..tfu;I.,
sistematizadas depois por
de inquietação no povo em geral, mas são igualmente bem-conhecidas e i., Ar1stóteles, e ainda descritas por Bodin' quas!:;~em nenhuma mudança fun-
~.J,
., damental. O principal interesse de Mãqulâvei:'com suas inúmeras mut;
descritas,
zioni, uanaeioni e alterazioni que abundam' tanto em sua obra ao ponto que
Todos esses fenômenos têm em comum com a revolução o fato de
seus intérpretes poderiam qualificar equivocadamente os seus ensinamen-
~ que foram concretizadosatravés da violência, e essa é a razão pela qual
tos de "uma teoria da mudança política", foi precisamente o imutável, 1"
.···(-'élessão, com tanta freqüência, confundidos com ela, Mas a violência não
é mais adequada para de~~rever o fenômeno das revoluçõesdôqüêãmu=
-·i!
r ,"
2j~.v~.i~~~~_~ ...i~~.!i~~ªy.~!;._~r.:r!-!e.§~!!!.()~_~..E.~<0~!ee-:2._~st<fv'e:.L
qJQ91a tão importante para <I, história das re,:.0uç§es, .~~ qual foi um pre- .
..º_q~e rW'"
aança;sornente-OndeO~r~~n~-sen'tídode umnovo prJneí15'fO, ,.
i

3?nd.f'a viOl~Ii~J.~-=-f()f.~!m~_~.~Pél.E~~tuirumªJor.ma.de~gõveinQ-com·-
plGJamente_difer~ntf!,pal'a dar origem à formação d.~...lI}JLQºy'º,Ç.9!:P.<? polí-
r ~~~1~~p~~~0~~~~f:x:~:~!~~'~~
i
.~\
aqui não é nem mesmoqueele já se mostre tão familiarizado com os ele- \,
ti~9.L()I1.9~..a Iibertação ·dã·~pressãõã1meje~···pClõ·~~nº.s,. a çonstituiçã~~a
lili_~sdade,._é..q\.!.e.·li()ªemõs'Tarar·aê"·revorução. E o fato é que, embora a ;.
mentos mais marcantes elas revoluções modernas - com a conspiração I
e a luta de facções, com o incitamento do povo à violência, com os distúr- :
História tenha semprec'Õllfiêddõ-'aqüéles 'que, como AIcebíades, deseja-
vam o poder para si próprios, ou aqueles que, como Catilina, eram rerum
bios e a derrocada das leis que acabarão por lançar num torvelinho todo !
o corpo político, e, finalmente, com as oportunidades que as revoluções I
nouarum cupidi, ávidos de coisas novas, oéspírito revolucionário dos últi-
oferecem aos adventícios, aos homines nooi de Cícero, aos condottieri de Ma- /
mos séculos, ou seja,. a ânsiadelibertare d.~o}~§~lJ1ir.Y:rP.ca.no.y~~[).orada
onde a liberdade possa liãbitar, é algo sem precedentes e sem paraleiõ errl' qui::el, que :m~rg~m"da~ camadas inferiores para o ~~pl~ndor do ~undo
político, e da insignificância para urn poder ao qual primeiramente tinhamjj;
l
toda a História anterí'or.-'----------- .....-..· --_ ...._..- ..--- .....-.---. --'" --.--...---~...
~-----------_._- 7 1,
. ;~~aDdo r~~~~~~s~~s~~~:~~-~~~~~~~~~J;~~~~to u~~~n~~~~rr~1t·
i """." .p.'" "". . -, "'" '" .. , - - p -.. '." . '.. . "I /j
" !
~ c~j~~Jeise.p_q§,t?la.gos. .de ação eram. indep~,nd{!!lte~,.?~.s.ensinarnentos d~
!
I{ Igr.~Ja, .ern particular, e,em geral, dos padrões morais, transcendendo a
3 . )
, li e~~~~_?C?~_.a.s~~p~~?s.hu~~g.o.,~.Foip·or essa razão que de irisistia ci'ile"as
J
-:-----_ _--_histó-.
Uma maneira de datar o nascimento de fato de tais fenômenos
I
pessoas que ingressavam na política deviam, em primeiro lugar, aprender \
ricos gerais como as revoluções - ou de Estados-nações, de imperialismo "a não serem boas", isto é, a não agirem segundo os preceitos cristãos18 .
. ou regime totalitário, e outros semelhantes -=- é, certamente, descobrir quan- 't' O que principalmente o distinguiu dos revolucionários foi que ele via sua
do a palavra que, a partir de então, permanece ligada ao fenômeno, ara- instituição - a criação de uma nova Itália, de um Estado-nação, italiano,
. rece pela primeira vez. Obviamente, cada nova manifestação entre os organizado segundo os modelos francês e espanhol - como uma rinooazio-
t
homens necessita de uma nova expressão, seja um novo vocábulo cria- :j ne, e renovação era, para ele, a única alierazione a salute, a única alteração
I~
i"
20 DA REVOLUÇÃO
l
o I L~

,
o SIGNIFICADO DE REVOLUÇÃO 29
'ij
F mento que e, so, meu, e para o qu al nasci nasci ,,21 . Sal'
e guem Ier. essas e outras
benéfica que era capaz de conceber. Em outras palavras, o pathos especifi-
camente revolucionário do absolutamentenovo, de ummíçio"qüe,3u~tjfi- frases semelhantes, concordará de boa vontade com as revelações de estu-
cassê~coiiÜ~çarã:córitár'o-tempo a pârtíraOeverit~ revolucionário, era-lhe
j'
!
dos recentes que vêem, na Renascença, apenas a culminância de uma su-
cessão de reflorescimentos da Antiguidade, que começou logo após as épocas
<tofàlmenfé 'estranho. Noentanto, mesmo a esse respeito, elenão 'estava ~,
tão distanciado dos seus sucessores do século XVIII como pode parecer. realmente obscuras, com a Renascença carolíngia, e terminou no século
XVI. Pela mesma razão, .constatar-se-á que, politicamente, os incríveis T
Veremos mais adiante que as revoluções começararn como restaurações !
ou renovações , e que o pathos reVoíuClonáriode~~i~íci6 inteiramenten~vo distúrbios nas cidades-Estados, nos séculos XV e XVI, foram um fim, e !!
nasceu somenteno C:,u!"so~opróprio evento. R'õbespierre teve mais de um não um início: o fim das cidades-municípios medievais, com seu autogo-
motivoparaasseverar, com razão, que "6 plano da Revolução Francesa vemo e sua liberdade de vida política22. .-
foi esboçado amplamente nos livros [... ] de Maquiave1,,19; poisele pode- E-Q(2~t!'9.J<;,?~,::,:i~s~s~,~p~i-ª:~de 11a~qlJi,ªx~L§.~l?!.~.~_yi?l~nci<t é méli~
ria facilmente ter acrescentado: Nós também "amamos nosso país mais t' sugestiva. Foi a conseqüência direta da dupla perplexidade em que teori-
do que a salvação da nossa alma,,2o. ' camente se encontrava, e que, mais tarde, tornou-se a perplexidade bas-·
Na verdade, a maior tentação de ignorar a história da palavra e da- tante prática com que se defrontaram os revolucionários. A perplexidade
j:ar o fenômeno da revolução a partir da desordem das cidades-Estados ita- consistia na tarefa da fundação, 'no estabelecimento de um novo começo
lianas, durante a Renascença, está nos escritos de Ma~~L Ele certa- que, como tal, parecia exigir violência e violação, como se fosse uma re-
mente não foi o pai da ciência política, ou da teoria política, mas é difícil petição do antigo crime lendário (Rôrnulo matou Remo, Caim_m;~to.pAbel) ,
negar que se pode muito bem ver nele o Rai espiritucl."gª-EY9Iuç~0. Não dos prim6rdios da História. Além disso, essa tarefa de<tiÚJ,,ºªçãó estava; j,/
() ligada à tarefa de fazer as leis, de dar vida a uma nova autoridade e impô-
apenas já podemos encontrar nele esse esforço consciente e apaixonado,
no sentido de reavivar o espírito e as instituições da Antiguidade romana" Ia aos homens; autoridade essa, entretanto, que tinha de ser concebida
'que se tornou, a partir de então, tão característico do pensamento político de tal maneira que viesse a substituir adequadamente a antiga autoridade
do século XVIII;' ainda mais importante nesse contexto é sua notória in- absoluta, porque outorgada por Deus, extinguindo, por conseguinte, uma
sistência no papel da violência no campo da política, que nunca deixou ordem terrena cuja confirmação mais alta foram os mandamentos de um
de 'chocar os seus leitores, mas que também encontramos nas palavras e Deus onipotente, e cuja fonteúltima de legitimidade fora a crença de uma
ações dos homens da Revolução Francesa. Em ambos os casos, o elogio
,da violência se apresenta estranham ente em conflito com a professada ad- r encarnação de Deus sobre a terra. Por essa razão, Maquiavel, inimigo exa-
cerbado de considerações religiosas em assuntos políticos, foi levado a pe-
miração por tudo quanto era romano, dado que na República 'romana era dir auxílio divino, e mesmo inspiração, para os legisladores - exatamente
a autoridade, e não a violência, que regulava a conduta dos cidadãos. En- como os "iluminados" do século XVIII, John Adams e Robespierre, por
tretanto, embora essas semelhanças possam explicar a elevada considera- exemplo. Esse "recurso a Deus", é claro, só se fazia necessário no caso
ção por Maquiaveí, nos séculos XVIII e XIX, elas não são suficientes pa- de "leis extraordinárias", ou seja, leis que dessem origem à fundação de
ra equilibrar as diferenças mais notáveis. O retorno revolucionário ao an-'
tigo pensamento, político não objetivava, nem conseguiu fazer reviver a
Antiguidade como tal; o que', no caso de Maquiavel, era apenas o aspecto
1\
I
!
j
uma nova comunidade. Veremos, mais tarde, que essa ~!~~!lla~E~~~i
j:arefa d~!<::~<:>1.~s.~~_=_,<::~,on~!:ªL!Jm.nOy,o,,ªb,s_ºt~to
!-':l,~~1!?J).9,!:l<::J:giyi.11º = .:Rara&.ubstltJÜLQ...abso-
__ é~-ºs.9~!!.yel,.p.ois.o po der, ~'?!?_.s:.Q...~gk~.9,-ª-ª-,pll!r1!!i-
"político da cultura do Renascimento corno um' todo, cujas'ar- I!. (J~~<:: humana, nunca pode atingir a onipotência, e leis que se baseiam no
poder humàiiO'nunca podem r serabsolutas, Porúúitü;o"c'ãpelõ' aos-altos
tes e letras suplantaram de longe todos' os avanços políticos das cidades- , ~.: · _..• · ·.'·,,·.'v. . . .. .. .

Estados italianas, estava inversamente, no caso dos revolucionários, bas- Céus", como diria Locke, não foi inspirado por nenhum sentimento de-;
tante em desacordo com o espírito de sua época, que se afirmava, desde i religiosidade, mas sim ditado exclusivamente pelo seu desejo de "fugir a
o início da Idade Moderna e do aparecimento da ciência moderna, haver essa dificuldade,,23; da mesma forma, sua insistência sobre o papel da vio-
se distanciado de todas as realizações do passado, E não importa quanto lência na política era motivada nãotanto por sua assim denominada visão

I
os revolucionários possam admirar o esplendor de Roma, nenhurri deles realística da natureza humana, mas pela vã esperança de que pudesse en-
teria se sentido tão à ';ontade na Antiguidade como Maquiavel; não te- contrar alguma qualidade em certos homens que pudesse se igualar às qua-
riam podido escrever: "Ao cair da tarde, volto a casa e 'entro em meti ga-
binete; à porta, dispo o vestuário do dia, coberto de lama e pó, e envergo
~;
li
lidades que associamos ao divino.
' Contudo, ,tudo isso foram apenas premonições, pois as idéias de Ma-
trajes suntuosos e elegantes; e vestido com apuro, ingresso nas antigas cortes quiavel ultrapassaram de longe toda a efetiva experiência de sua época.
~ O fato é que, não importa o quanto possamos estar inclinados a interpre- I
dos' homens antigos, onde, acolhido por eles com afeto, me nutro do ali- li
:1 / (
30 DA :REVOLUÇÃO
'I I O SIGNIFICADO DE REVOLUÇÃO 31/
J (

~.
tar nossas próprias experiências à luz dos acontecimentos deflagrados pe- devido a qualidades pelas quais se distinguiam do povo, por uma virlu que
las lutas civis que assolaram as cidades-Estados italianas, não foram essas era tanto mais louvada e admirada por não ser reconhecida por origem
tão radicais que viessem a sugerir, aos que delas participaram ou foram social e nascimento. Entre os direitos, os antigos privilégios e liberdades
testemunhas, a necessidade de uma nova palavra, ou a reinterpretação de i do povo, manifestamente não se encontrava o direito de participar dogo-
ft.··
uma mais antiga. (A nova palavra que Maquiavel introduziu na teoria vemo. E esse direito de autogoverno não está ainda claramente definido
'I no famoso direito de representação, decorrente da taxação. Para poder go-
política e que tinha sido usada mesmo antes dele, foi a palavra Estado,
/0 stati4. A despeito de seus constantes apelos à glória de Roma e reitera-
'I'. vernar, era preciso que alguém tivesse nascido com esse direito, um ho-
das referências à história romana, sentiu claramente que uma Itália unifi- .\ mem livre, na Antiguidade, e, na Europa feudal, um membro da nobreza;
'i e não obstante houvesse bastantes palavras na linguagem política pré-
cada deveria constituir um corpo político tão diferente das cidades-Estados li
antigas ou quinhentistas que impunha fosse-lhe atribuído um novo nome.) 11 moderna para descrever a rebelião de súditos contra um governante, não
I[
As palavras que naturalmente sempre ocorrem são rebelião e revolta, \' havia nenhuma que descrevesse uma mudança tão radical que os próprios
! súditos se tornassem governantes.
I cujos significados foram determinados e mesmo definidos desde o final da
Idade Média. Essas palavras, porém, nunca indicaram libertação, como
( a entendem as revoluções, e muito menos traduziram o estabelecimento
de uma nova liberdade. Pois libertação, no sentido revolucionário, veio 4' \~\M) vo.cPP
i qiie-~~y~~~
a ~~@iflç?:I_gl.l~~º_<:l<?"s_~gueles sempre vivido ~~~_bscu.!J.9~ª~,
'sujeitos a qualquer que foss-eo-poaer, não apenas no presente, m~~._;:tt~a- Que o fenômeno da revolução sejaum fato ímpa; na História pré-
1\
v"éi de toda Hístônã;-nãéisiffiplesmêntecomõmalv{dlios:-l1iai:=~~~~~!!1_~
ã .. v~ . moderna não é, de forma alguma, Uma coisa natural. E certo que muitas
pessoas concordariam que a.avidezpor coisas novas, juntllm~g~ç:_cO.lJLi_·
bras davastã màiória -dahumanld~ª~:;:9.iF.>Qg!~i~---º~]!.~ml[de~ dey.~riam 1\
) .\ COJl-v...icçã<kde...qJJ.e .•'l-JI2Q.y,ação.,.comotal, é algo desejável, são característi- ..
Se, à guisa de
t"~cf~~~er-~~t=s~_~~féi~~a~~~~~~~:~iªi!'Qs~$.lJEr.:':.l.!!.qUj-ª:_!.~~:.. 1I
comparação, quiséssemos unaginár um evento dessa natureza em termos cas rnarcantesdomundoem qu~yiveIIlI:J~L.e_equiparar essa concepção da
f\ de condições antigas, seria como se não o povo de Roma ou Atenas, o
i populus ou o demos, as classes mais baixas da cidadania, mas os escravos \! 11
sociedade moderna com um espírito revolucionário é, de fatoç rnuito C():.
mum.i.Entretanto, se entendermos por espírito revolucionário o espírito
-que realmente brotou da- revolução, então esse anseio moderno por inova-
. e os estrangeiros residentes, que compunham a maioria da população sem
\ jamais fazer parte do povo, tivessem se sublevado e exigido igualdade dt
\ ção a qualquer preço deve ser cuidadosamente diferenciado daquele. Psi-
i,;.F-.direitos. Isso, como_sabe!!l0sLjamais aco~u. A própria idéia de igual-l cologicamente falando, a experiência de fundação, combinada com a
.;:' dade, como nós a entendemos, isto é, que todas as pessoa~ nascem iguais, 1\ convicção de que um novo drama está na iminência de se desenrolar na
! pelo simples fato de haverem nascido, e que a igualdade é um direito ina-II História, tornará os homens "conservadores" e não "revolucionários",
\ to, era totalmente desconhecida antes da Idade Moderna. ~ ávidos em preservar o que foi realizado e assegurar sua estabilidade, ao
- É verdade que a teoria medieval e pós-medieval já conhecia a rebe- invés de se mostrarem receptivos às coisas novas, aosnovos avanços e no-
lião legítima, a sublevação contra a autoridade constituída, o franco desa- vas idéias. Ademais, do ponto de vista histórico, os h0l'!lerl.~m:i.I.!!.l?iras
fio e a desobediência. No entanto, o alvo dessas rebeliões não era uma revol1,lçpes -::-jsto _~rii§uel~_gg~ nã_~apenãSTizera:m:umã revolução, mas
contestação da autoridade e da ordem estabelecida das coisas, como tais; introduziram as rev~h!çº~ª_I!º_ç~náriO-da-polítiea--n-ãG--estav.arn.ahsolu:
era sempre uma questão de mudar a pessoa que acontecia estar investida -tamente=-anslõsos=p:-6-r~~~ª_s .nºy'ª~,-p.()~.ll~~_~-º_~~_p',--ti.f!._saeclo~!!!..,~é_essa
de autoridade, fosse a troca de um usurpador por um monarca legítimo, "~, -áyersão-ã'inovaç6es-que ainda ecoa na própria palavrarevo[üção, um ter-
fosse a substituição de um tirano que tivesse abusado do poder por um li mú-rerãtivilnienteaiú:igõ-que·só ientàmen~(!ªºg~iiig~~~y.=!iQ~§slgllifka~
governante legal. Por conseguinte, ~]Je às_p_~~ío.s.s.e re~oJ1h_eçid"o í d-õ-:--Bã-vádãa-e:--o·p"rópnõ-üsodessã-páIávra indica muito clarnmentea
o direitQ. dedecidir qllem não deveria governá-Ias, certamente não o ti- I, iâliãde expectativa e propensão por parte dos protagonistas, que não es- -
'nF~J~ai:.~~~s_ço.lher q~.~~~ti.~~~ii:'·~·-;-uit~menõsJãIDillsnàuve"r-egistro li tavarn mais preparados para alguma coisa sem precedentes do que os.seus
as
[de--que pessoas tivessem o direito de se governar a si próprias; ou de
'j
,, espectadores contemporâneos. O ponto a destacar é que ~orr:.A~athos_
indicar aquelas de suas próprias fileiras para os negócios do governo. On- ( de uIll";:t_.I!º.Y~..(!;:'~I_"q:I1.!<~.nçQn.!r-'~I.:mQÜ1ªJ~qI~id~:t=énLcondlçõ.e.s __
quase.idên-
de realmente aconteceu que homens das camadas sociais inferiores se ele- -ficas: e com infindáveis variações, pelos agentes principais da~.R~volu-
vassem para o esplendor do poder público, como no caso dos condottieri das çoes-Alli~ilçãna_e:Fra-íiçe~~;·_sÓ__ ~elO.ª_i9n_ª~.d~põis·qü-;;:dieiàrãm,-mmtõ
cidades-Estados italianas, seu ingresso na esfera pública e no poder foi co-rlg.:a.:~suavontad(!,
....---~_.-
' '
a umponto
- ..
semretorno.

32 DA REVOLUÇÃO o SIGNIFICADO DE RfjVOLUÇÁO 33

.~
~
A palavra reuoluçdo foi originalmente um termo astronômico, que cres-
I XVIII que, para nós, parecem mostrar todos os indícios de um novo espí-
ceu em importâncià nas ciências naturais com o De reooluuonibus orbium coe- r,it9' ó~_e~pírito'éhiIÇlide 1vf0de~n.a,. pretendera!n ser apenªs~~:~,~~ª-»HǪ~S.
, lestium de Copêrnicoé". Nesse emprego científico, o vocábulo reteve seu J E verdade que as guerras civis da Inglaterra prenunciaram um grande nú-
preciso significado latino, designando .1?}:n-º'lÜJ,:tl:;n.!()_regl:l.la..r:,..sistemático
ecíc;!i~Q diiê.~~trelf:l:s.,o qual, visto que todos sabiam que-não depéildia da
influência do homem e que era, portanto, irresistivel, não era certamente
t
'I'
mero de tendências que viemos a associar ao que foi essencialmente novo
nas revoluções do século XVIII: o aparecimento dos Igualitários e a for-
mação de um partido composto exclusivamente por pessoas das camadas
l,' caracterizado nem pela novidade, nem pela violência. Ao contrário, a pa-
, lavra indica claramente uma recorrência, UIn..ITtQYÍJ:nep~JLc(clico;é a per-
I, inferiores, cujo radicalismo entrou em conflito com os líderes da revolu-
ção, indicam claramente o curso da Revolução Francesa; ao passo que a
feita tradução latina do õ.uaKúKÀ.fficnç de Políbio, um termo que também ! exigência de uma constituição escrita como "fundamento de um governo
teve origem na astronomia e foi usado metaforicamente no campo da po- ( justo", reivindicada pelos Igualitários e, de certa forma, atendida quando
lítica. Se era usado nos assuntos humanos sobre a terra, só poderia signifi- '1 Cromwell introduziu um "Instrumento de Governo" para úlstitu ir o Pro-
I
car que as poucas formas conhecidas de governo giram entre os mortais I
tetorado, antecipa uma das mais importantes realizações, se não a maior,
em eterna recorrência, e com a mesma força irresistivel que faz com que da Revolução Americana, Contudo, o fato é que aquela efêmera vitória
',as estrelas sigam suas trajetórias preestabelecidas no espaço. Nada pode- da primeira revolução moderna foi oficialmente interpretada como uma
i ria estar mais distanciado do significado original da palavra revolução do 'restauração, ou,' mais precisamente, corno' a liberdade restaurada pelas
I

, "que a idéia que se apoderou obsessivamente de todos os revolucionários, bênçãos de Deus", como está gravado no grande brasão de 1651.
J isto é, que eles são agentes num processo que resulta no fim definitivo de Em nosso contexto, é ainda mais importante observar o que aconte-
I uma velha ordem,' e provoca o nascimento de um novo mundo. ceu mais de um século depois.' Pois não nos ocupamos aqui com a história
, Se o caso das revoluções modernas fosse tão nítido como uma defini- 'dasrevoiuções como tal, com seu passado, suas origens, ou com a trajetó-
ção didática, a escolha da palavra revolução seria ainda mais intrigante do i, ria do seu desenvolvimento. Se quisermos saber o que é a revolução -
que realmente é. Quando, de início, a palavra desceu dos céus e foi intro- ! suas implicações gerais para o homem como um ser político, sua significa-
duzida para descrever o que acontecia na terra entre os mortais, apareceu ção política para o inundo em que vivemos, seu papel na história moder-
claramente corno uma metáfora, transportando a noção de um movimen-
to eterno, irresistivel e sempre recorrente às oscilações aleatórias, aos al-
,I' na - devemos nos voltar para aqueles momentos históricos em que a re-
voluçãoapan:ceu em sua,pl~ituQ.e, assumiu uma espécie de papel defini-
;;'
tos e baixos do destino humano, que haviam sido comparados ao nascer tivo, e começou a lançar oS"!ieus encantos na mente dos homens, indepen-
e ao pôr do sol, da lua e das estrelas, desde tempos imemoriais~NQ..Aé,culo dentemente dos abusos, crueldades e privações de liberdade que possam
_', XVII;, onde pela primei ra vez encontramosapalavraccmo te:r:!l1_q,_p-QlJ!j- tê-los levado à rebelião.
:~~cQ~:o conteúdo metafórico estava aindãmaÍs próximo do significado origi- Em outras palavras, devemos nos voltar para as Revoluções France-
nal da palavra, pois era usada em relação a um movimento de circulação sa' eJ\meÚçGlg.a"J':_deYemo;;le~ar em-conta qué.àinbas foi.arii-,prõfagõiiíiª~
e de retorno a algum ponto preestabelecido, e, conseqüentemente, de re- , d'~~,em seus estágios ini~~a.:is,>,porhomens.qll('!.estav<l_f!1!iEmemente con-
torno a urna ordem predeterminada. J~QJ:.tantn,_a..palavra.foijnjcialmente '-venéiClosdé-que naofari~ml outra coisa senão restaurar uma à,'üií"gaorClem
usada.não quando aquilo que denominamos revolução rebentou na Ingla- .de:coisa~~q~~}~f.:aj?çrtÜrl:íacra- e' v~õh~da pelo 4t:~p~ti~~~.4;;:~S;iiªrçis:ª~~ _
terra, e Cromwell assumiu a primeira 'ditadura revolucionária, mas, ao i
sülutÓs'ou por al:>l!sosdo gove~~o colonial. .Eles alegavam, com toda sin-
contráriovem 1660, ~p.ó.s..iJ.,Qçr!::l!:~acladoParlª,mento,
restauração da-mon·ã~quia.)~Ieç;isarriente_com
e por ocasjão da
o mesmo sentido,·~~paJ.avra
.•)~.,
I
I ceridade, que desejavam o retomo dos velhos tempos em qUe-as-êOisaserain
-como»ae-Vlam---se'r~--'--"-' -,--,------ .. ,'- -. ,- 00 __ "_' ------·----i-
.~Loi usada ~IJl1688, quando osStuarts foram expulsos e o-poder real foi . --. Isso-d~~~rigem a muita confusão, especialmente no que diz respeito'
_trânSferido para.Guilherme e Maria26. A Revolução Gloriosa, o aconteci- p.r:ºPú.Qll..fgh.o_~,-~_~I!!~~,
ª_.!3:.::Y2hiç.ão-Airiericana, que nª()_.':!~_~~!,<?-u-êe]J~ \.:>
, ffirntü-em que, muito paradoxalmente, o termo encontrou guarida defini- ,p~rta.~!g,.:..9'§homem_que.~niciar:a!I.lª_~):!,!_s_t!;!_l!F"!,Ç,.ªQ'_'loraín
os mesmos qU~
tiva nalinguagem histórica e política, não foi entendida, de forma alguma, ..c._º@.~Çaraw,~!;;-.ter:minar:.Çlm-Cl. ~~§,!,~,o ~-~ublr' ãQ..Q?-
x,e'{9LlI,ç-ªPL~_!=h~g~ª,_f!.1
como uma revolução, mas como uma reintegração do poder monárquico .: cte.ce_ao.gQY\::WQ.Jlanova-ordem_de ..coisaaO que julgavam que fosse um
à SUa antiga glória e honradez. . "restáuração", o restabelecimento de suas antigas prerrogativas, trans-
O fato de que a palavra revolução significou originalmente restaura- formou-se numa revolução, e suas idéias e teorias sobre a Constituição
! ção , algo, portanto, que para nós representa exatamente o oposto, não é britânica, os' direitos dos cidadãos ingleses e as formas de governo colo-
uma mera excentricidade semântica. ~§'Le.':.o)yç§.e:,~~!~?_~~ÇllJºS.XVII e nial, desembocaram numa declaração. de independência. Mas o movi-
Ii
34 DA REVOLUÇÃO li! o SIGNIFICADO DE REVOLUÇÃO 35
j'J.. I
Â
}11_e.!1:to
..'l~.é!_1.C:,!:()U.ª-I~.Y91yçª-º-!>ó.J()L!:.<:yg)!tçiQU_ário
..por. inadY_exJ~n_c::iél,.
e Ben- I os escravos romanos podiam ser membros perfeitamente integrados às cor-
jaminFranklin, que tinha mais informações precisas sobre as colônias do
que qualquer outro homem, pôde escrever mais tarde, com toda franque-
za: "Nunca ouvi, em qualquer conversa com qualquer pessoa, ébria ou
w
I porações religiosas, e, dentro dos limites da lei sagrada, seu status legal era
o mesmo dos homens livres3o, Mas direitos políticos inalienáveis, comuns
a todos os homens em virtude do nascimento, teriam parecido, a todas
sóbria, a menorexpressão de um desejo de separação, ou qualquer alusão li as épocas anteriores à nossa; o mesmo que pareceu a Burke .::-.uma con-
d e que ta 1·coisa pu d esse ser vantajosa . para a Améerica ,,27 . S e esses h omens
foram, de fato, "conservadores" ou "revolucionários", é, na verdade, im-
I tradição em termos. E é interessante observar que a palavra latina homo,
possível de decidir, se se empregarem essas palavras fora do seu contexto
i equivalente a "homem", significava originalmente alguém que não era
histórico, como termos genéricos, esquecendo que conservadorismo, co-
I nada além de um homem, uma pessoa sem direitos e, por conseguinte,
um escravo.
mo credo político e como uma ideologia, deve sua existência a uma reação I Para o nosso presente propósito, e especialmente em função do nos-
à Revolução Francesa, e é significativo apenas no que diz respeito à His-
tória dos séculos XIX e XX. E a mesma observação, ainda que provavel-
f so esforço maior para compreendermos a mais fugidia e, contudo, a mais
: impressionante faceta das revoluções modernas, ou seja, o espírito revolu-
mente menos inequívoca, pode ser feita em relação à Revolução France-
:1 cionário, é relevante lembrar que a idéia geral de inovação e novidade,
sa; aqui, também, nas palavras de Tocqueville, "poder-se-iaacreditar que
como tal" existia an.tes dás revoluções, e, não obstante, estava basicamen-
a meta da futura revolução não era a derrubada do antigo regime, mas
te ausente de seus primórdios. Em relação a esse e a outros aspectos seria
sua restauração,,28. Mesmo quando, no transcurso de ambas as revolu-
\ tentador argumentar que os revolucionários eram antiquados em termos
ções, os seus agentes tomaram consciência da impossibilidade de restau-
de sua própria época, antiquados certamente quando comparados aos ho-
ração e da necessidade de se aventurarem numa empresa inteiramente nova,
mens de ciência e aos filósofos do século XVII, os quais, como Galileu,
e quando, portanto, a própria palavra revolução já havia adquirido seu no- !
enfatizavam a "absoluta novidade" de suas descobertas, ou, como Hob-
vo significado, Thomas Paine ainda pôde, em consonância com o espírito
bes, afirmavam que a filosofia política não era mais antiga do que sua obra
de uma época pretérita, propor, c~m toda seriedade, chamar as Revolu-
- A'mencana e Francesa de " contra-revo Iuçoes - ,,19 .' Essa propoSlçao,. - De Ciue, ou, como Descartes) insistiam em que nenhum filósofo tivera su-
çoes
cesso antes com a filosofia. E claro que reflexões sobre o "novo continen-
na verdade estranha por provir da boca de um dos homens mais "revolu- ,
I te", que dera origem a um "novo homem", tais comoas que citei, de
<' cionários" de sua época, mostra, laconicamente, como a idéia de retorno, ,! ,rf.' Crêvecoeur e John Adams, e que podiam ser encontradas em inúmeros
de restauração, era preciosa para as mentes e os corações dos revolucioná-.
outros e menos destacados escritores, eram bastante comuns. Mas, em con-
,; rios. Paine não queria mais do que recuperar o antigo significado da pala- li
traposição aos anúncios de cientistas e filósofos, o homem novo, da mes-
vra revolução, e expressou sua firme convicção de que os acontecimentos·
da época haviam feito com que os homens voltassem a "um período ini-
a
ma forma que terra nova, era tido como sendo uma dádiva da Providên-
cia,:e não um produto dos homens. Em outras palavras, o estranho palhas
cial" em que estiveram de posse de direitos e prerrogativas de que foram
de riovidade.itão característico da Idade Moderna, necessitou de quase du-
despojados pela tirania e pela conquista. E esse "período inicial" não é,.
zentos anos para abandonar a relativa reclusão do pensamento filosófico
absolutamente, o hipotético estado pré-histórico de Natureza, como o sé-
e científico, e ingressar no mundo da política. (Nas palavras de Robes-
culo XVII o entendia, porém um período preciso da Hist6ria, ainda que
pierre: "Tout a changé dans I'ordre physique; et tout doit changer dans l 'ordre mo-
não-definido. -
ral et politique.") Mas ao atingir essa esfera, na qual os acontecimentos di-
Paine, devemos lembrar, usou o termo contra-revolução em resposta
zem respeito a muitos, e não a poucos, adquiriu ele uma expressão não
à enérgica defesa de Burke em favor dos direitos dos ingleses, garantidos
apenas mais radical, corno também tornou-se dotado de uma realidade pe-
por antiqüíssimos costumes e pela História, contra a idéia mais moderna
culiar apenas ao mundo político. ~gi apena~.P-2-ª_~Ç.C>Er.~~ª<l:~_r.~~~~ç_§~s

:,
_dos direitos do homem. Mas o ponto é que Paine, não menos do que Bur-
ke, sentia que a inovação absoluta seria um argume!lto contra e não a fa-
do século XVI~t9~_~_oshomenscomeçaram e
__~_~?El1_a.r:_<:<?E~r:;i~~::i_<l.E~-.9~
umnovo prinCípio podia ser um fenômenopolítico, podia ser a conseqüência
vor da autenticidade e legitimidade de tais direitos. E desnecessário acres-

JI
daqúilo·c[u-e·oshõmens-tí~h~;;;-féÍto-e"qu~:-~~~~~i~~-t~~~nte,se -dlsptise-:
centar que, falando historicamente, Burke estava correto e Paine, errado.
Nãb há nenhum período na História em que a Declaração dos Direitos
rafifa-fazer .-Aparfircreerlfãõ-,--um-·' 'ilõvô -conúnente-j-;-e ,-rilô:V-o}iomem-"
.11 queCleIe surgisse não mais seriam necessários para instilar a esperança de
do Homem pudesse haver retroagido. Os séculos precedentes podiam ter
uma nova ordem de coisas. A nouus ordo saeclorum não era mais uma bên-
reconhecido que os homens fossem iguais no que tange a Deus ou aos deu-
ção advinda do "grande plano e desígnio da Providência", e a novidade
ses, já que esse reconhecimento não é cristão, mas romano na origem;
não era mais a vaidosa e simultaneamente assustadora, posse de alguns.
36 DA REVOLUÇÃO
o SIGNIFICADO DE REVOLUçAo 37
"i'
Quando a inovação alcançou o mercado público, tornou-se o início de uma dor pelas ruas de Paris, que ainda era, nessa época, não apenas a capital.
, nova História, desencadeada - ainda que involuntariamente - por ho- ! da França, mas de todo o mundo civilizado - a sublevação da populaça
mens de ação, a ser encenada posteriormente e ampliada e difundida pela das grandes cidades, inextricavelmente mesclada ao levante do povo pela
sua posteridade. ~ liberdade, ambos irresistíveis pela pura força do seunúmero. E essa mul-
.• l,j tidão, aparecendopelaprimeira vez emplena 11lZ do dia, era na verdade
. UJ a multidão dos pobres e dos oprimidos, que em todos os séculos passados

\ 5 lNtJJ;ÍJlI\ bJ-,J ( O ) tinham estado ocultos na obscuridade e na degradação. O que a partir de-l"
então tornou-se irrevogável, e que os protagonistas e espectadores da re-
volução imediatamente reconheceram como tal, foi que o domínio públi-!
~'Enquanto os elementos de novidade, começo e violência, todos inti-.

f
co - reservado, até onde a memória podia alcançar, àqueles que eram li-
mamente associados ao nosso conceito derevolução, estão claramente au- vres, ou seja, livres de todas as preocupações relacionadas com as necessi-
sentes do significado original da palavra, bem como do seu primeiro em- dades da "ida, com as necessidades físicas - fora forçado a abrir seu es-
prego metafórico na linguagem política, existe uma outra conotação do paço e ~ua luz a :ssa imensa ~aior~a dos que não eram livres, por estarem j
termo astronômico que já mencionei brevemente, e que ainda permanece I presos as necessidades do dia-a-dia. J
muito forte em nosso próprio uso da palavra. Refiro-me à noção de irre-
sistibilidade, o fato ele que o movimento giratório das estrelas segue uma
trajetória predeterminada, e é independente de qualquer influência do poder
.l ~ A noção de um movimento irresistível, que o século XIX logo deve- ,
ria conceituar na idéia de necessidade histórica, ecoa, do princípio ao fim, '
nas páginas da Revolução Francesa. De repente, um conjunto de imagens_"
~li.umano. Sabemos, ou acreditamos saber, a data exata em que a palavra inteiramente novas começa a se agrupar em torno da antiga metáfora, e

I
revolução foi usada pela primeira vez com uma ênfase exclusiva na irresisti-
bilidade, e sem qualquer conotação de um movimento giratório recorren-
te; e tão importante se apresenta essa ênfase ao nosso entendimento de
revolução, que se tornou uma prática comum datar o novo significado po-
lítico do antigo termo astronômico a partir do momento desse novo uso.
A data foi a noite do 14 de julho de 1789, em Paris, quando Luís
um vocabulário totalmente novo é introduzido na linguagem política. Quan-
do pensamos em revolução, ainda pensamos quase automaticamente
termos dessas imagens, nascidas naqueles' anos - em termos da torrent ré-
volutionnaire, de Desmoulin, em cujas ondas impetuosas' 'os participantes
da revolução foram impelidos e arrebatados, até que o redemoinho os su-
gasse da superfície, e todos pereceram, juntamente com seus inimigos, os
em

XVI recebeu do duque de La Rochefoucauld-Liancourt a notícia da que- agentes da contra-revolução. Pois a poderosa corrente da revolução, nas
da da Bastilha, da libertação de uns poucos prisioneiros e da defecção das palavras de Robespierre, foi constantemente impulsionada pelos" crimes
tropas reais frente a um ataque popular. O famoso diálogo que se travou da tirania", de um lado, e, de outro, pelo "progresso da liberdade", os
entre o rei e seu mensageiro é muito lacônico e revelador. O rei, segundo quaisinevitavelmente se defrontavam, de tal forma que movimento e con- .'
consta, exclamou: "C'est une réoolte'"; e Liancourt corrigiu-o: "Non, 'Sire, tramovimento nem se equilibravam nem se restringiam ou prendiam um
W'est une révolution". Aqui ouvimos ainda a palavra - e politicamente pela ao outro, mas, de uma forma misteriosa, pareciam confluir numa torren-
tóltima vez - no sentido da antiga metáfora que transfere, do céu para_ te ,de' 'violência progressiva", ~recipitando-se na mesma' direção com uma
a terra; o seu significado; mas aqui, talvez pela primeira vez, a ênfas~ impetuosidade cada vez maior 2. Esta é a majestosa" torrente de lava da
deslocou-se inteiramente do deterrninismo de um movimento giratório cí- renovação, que nada poupa e que ninguém pode conter", como Georg
clico para a sua irresistibilidade31. O movimento ainda é visto através da -. ...;,.-, Forster testemunhou em 179333; e o espetáculo submetido ao signo de Sa-
imagem dos movimentos das estrelas, mas o que é enfatizado agora é que turno: "A revolução devorando os seus próprios f.tlhos", como se expres-
~stá além do poder humano detê-lo, e, como tal, é uma lei em si mesma. \ sou Vergniaud, o grande orador da Gironda. É a "tempestade revolucio-
O rei, ao declarar que a investida contra a Bastilha era uma revolta, rea- nária" que colocou em marcha a revolução, a tempête réoolutumnaire de Ro-
firmou o seu poder e os vários meios à sua disposição para fazer face à bespierre e sua marche de Ia Révolution, aquele poderoso turbilhão que .var- .
conspiração e ao desafio à autoridade; Liancourt replicou que o que tinha ,reu ou fez submergir o inesquecível e nunca inteiramente esquecido co-
acontecido era irrevogável e além do poder de um rei. O que Liancourt meço, a afirmação da "grandeza do homem contra a pequenez dos gran-
viu - e o que devemos ver e entender, ouvindo esse estranho diálogo -
que julgou ser, e sabemos que com razão, .irresistível e irrevogável? J
JI
des", como salientou Robespierre'l", ou "a defesa da honra da raça hu-
mana " ,nas p al avras d e H am il ton 35 . P'arecia que uma. L'torça maior

que
A resposta, para começar, parece simples. Por trás dessas palavras, o homem interferira quando os homens começaram a afirmar sua grande-
podemos ainda ver e ouvir a multidão em marcha, o seu avanço avassala- za e defender a sua honra.' '

'k
,.
. . .,J'
,',

I
38 DA REVOLUÇÃO ",
o SIGNlFICADO DE REVOLUçio 39 I
. '.1
Nas décadas seguintes à Revolução Francesa, essa associação de uma
poderosa corrente subterrânea, que arrastava os homens inicialmente pa-
')
I:].i.!
.1.1.
'mente verdade que todas as revoluções seguintes até, e iD:<;:IY.siY{!,-'lJ~,evo-
luçaoª-é-b~.l~§!~~Iq-i~;m-õD.~it.tª.dªs~§~ggq,dº,_Ê-_!3_,~~gr.-ª~_f! ~~~Igº~
__ g!:l~_~si~
ra a superfície de feitos gloriosos, para em seguida subrnergi-Ios no perigo
;I
;-'1 eles-enrolaram do 14 de julho ao 9 de Terrnidor e ao 18 de ):~,Egmªriº.:-
j
e na infâmia, havia de se tornar predominante. As diferentes metáforas datas·queficar-ãm-gr-ãV:ii:"ª~~]J(ºjliiido~Jiã.~m~m6iíi~çtº-R9Y..c:>_Jr~~_ê.s._q~c::, ..
através das quais a revolução era vista, não como obra do homem, mas airiaaIioje~-toac;s-imediatamente as identificam com a queda da Bastilha,
como um processo irresistível, as metáforas da caudal, torrente ou corren- á-mõrte-dc--Robesplerre -e-~Cãscensaõd~_ ~~p<>1~~913_~~~~~~!~:N~o .foi na
teza, ainda foram forjadas pelos próprios participantes, os quais, 'ÍJOrmais .,
embriagados que estivessem com O vinho da liberdade, no abstrato, posi-
111 nossá epõcã;'"""riúfiriios-meãaos"'d.üséculo XIX que a expressão "revolução
permanente", ou, ainda mais sugestivamente, révolution en. permanence, foi
tivamente não mais acreditavam que estivessem agindo livremente. E - criada (por Proudhon), e, com ela, a idéia de que "não houve nunca vá-
se, por um instante, refletirmos desapaixonadamente - como poderiam nas uçoes, mas qu~ a apenas uma revo Iuçao,
. revo l-h' - unica
,. e perpetua ",36
.
eles ter acreditado que fossem, ou jamais tivessem sido" os autores de seus '1, Se o novq conteúdo metafórico da palavra revolução derivou-se dire-
pr6prios atos? Que outra coisa, que não a tormenta enfurecida dos acon- f tamente das experiências daqueles que primeiro fizeram e, em seguida,
,\
impuseram a revolução na França, é óbvio que o seu sentido pareceu ain-
tecimentos revolucionários, poderia tê-Ios transformado e a suas convic-
ções mais profundas no espaço de poucos anos? Não tinham sido todos .. ~
I.. da mais plausível aos que, de fora, observavam o seu transcurso, como
eles, os monarquistas de 1789; que, em 1793, foram levados, não apenas se fosse um espetáculo. O que apareceu com mais nitidez nesse espetáculo
'W foi que nenhum dos participantes podia controlar o curso dos aconteci-
a executar um determinado rei (que podia ou não ter sido um traidor),
mas a denunciar a própria realeza como "um crime eterno" (Saint-]ust)? mentos, e que esse curso tomou uma direção que pouco ou nada tinha
!!R.
,,~.,
Não tinham sido, todos eles, os ardentes defensores dos direitos da pro- a ver com os objetivos e metas intencionais dos homens que, pelo contrá-
priedade privada, que, nas leis de Ventôse, em 1794, proclamaram o con- rio, se viam obrigados a submeter sua vontade e objetivos à força anôni-
-'I
fisco não apenas das propriedades da Igreja e dos émigrés, mas de todos ma da revolução, se é que queriam realmente sobreviver. Isso pode nos
os "suspeitos", para que fossem entregues aos "desafortunados"? Não parecer bastante trivial hoje, e provavelmente achamos difícil cornpreen-"
tinham sido eles os instrumentos da formulação de uma constituição, cujo der que nada, senão banalidades, possa ter-se originado daí. Contudo, pre-
fundamento básico era a descentralização radical, apenas para descartá-Ia cisamos apenas nos lembrar dos rumos da Revolução Americana, onde :
como algo absolutamente sem valor, e instalar, em seu lugar, um governo aconteceu exatamente o oposto, e recordar o quanto era forte o sentimen-
revolucionário através de comitês que eram mais centralizados do que qual- to de que o homem é senhor do seu destino, que impregnava todos os seus
quer coisa que o Ancien Régime jamais conhecera ou ousara pôr em práti- atores, pelo menos no que diz respeito ao governo político, para entender
ca? Não estavam travando e mesmo ganhando uma guerra que jamais ha- o impacto que o espetáculo da impotência do homem em face do curso
viam desejado, e que jamais haviam acreditado que pudessem ganhar? O de sua própria ação deve ter tido. O conhecido choque de desilusão, sofri-
que poderia restar no final, além do conhecimento de que, de alguma for- do pela geração que viveu na Europa durante o transcurso dos eventos
ma, eram possuidores mesmo no início, ou seja (nas palavras de Robes- fatais que vão de 1789 _até a restauração dos Bourbons, transformou-se
pierre, escrevendo ao seu irmão, 1789), que "a atual Revolução havia sus- quase imediatamente num sentimento de terror reverente e de admiração
citado, em poucos dias, acontecimentos mais grandiosos do que toda a his- pelo poder da pr6pria História. Onde antes, isto é, nos dias felizes do Ilu-
tória anterior da humanidade"? E, no fim, somos tentados a pensar que minismo, apenas o poder despótico do monarca parecia se interpor entre
isso deveria ter bastado. o homem e sua liberdade de agir, surgiu de repente uma força muito mais
I' Desde a Revolução Francesa, tem sido comum interpretar qualquer poderosa que compelia os homens à sua vontade, e da qual não havia li-
(
levante violento, seja ele revolucionário ou contra-revolucionário, em ter- 'il:i' bertação possível, revolta ou fuga, a força da História e da necessidade
mos ele uma continuação do movimento iniciado originalmente em 1789, ~I; histórica.
J\ como se os tempos de calma e restauração fossem somente as pausas em
n ;
Teoricamente, a conseqüência de maior alcance da Revolução Franj
v que a corrente imergiu no subsolo para acumular forças e irromper nova- cesa foi o nascimento do moderno conceito de História, na filosofia de Hegel.
mente na superfície - em 1830-,_~m 183~,eml11.±fL.Jilll-~..lJ.! __ ~871,
para mencionar apenas as cf~tas mais importantes do século XIX. De""Ca':"'"
II'! A idéia verdadeiramente revolucionária
ÃOsoTutõ'dos fllósofôsrevéfãià-se
~~ Hegel_[Qi_-ª de_9...~_~E._~:r:!!igº
no domínio dos assuntos humanos, isto
da vez, os adeptos e opositores dessas revoluções entenderam os eventos '~
c,-pre-cisamente náqú-êfeclõ·míllio dã"sexperíências-humãllãs-qü-e-;:;~ tt!9~,º::
como conseqüências imediatas de 1789 ..E se for verd~ como disse ~!.EX, '~
fosliavíamunanimemente"exclufdõ" cõmo ·fõnte-ouodg:émd~Rª,dii5_(!~_ªº7.
que a Revolução Francesa foi encenada com roupagens romanas, é igual-
.--- ----~- ••._--_ ••• _-- -. --- _ .• - ••. ---"'~ _•• __ ~ •• -._•.__ ••. '-0 •• ' ••••• _.~"",._._._ •••• __ ._._~ __ .•__ .•• t s'olutôs:"OmoaaodêSsa~ova"revel~ção~~a fo;mad;;~ p~~~esso históri-.
r
10 DA REVOLUÇ}\O ~ o SIGNIFICADO DE REVOLUÇÃO 'H
Il,
co , foi indubitavelmente a Revolução Francesa, e a razão pela qual a filo-
de ser válida para todos os homens, independentemente do lugar em que
sofia alemã pós-kantiana veio a exercer uma enorme influência no pensa-
.mento europeu do século XX, especialmente em países sujeitos a agita-
ções revolucionárias - Rússia, Alemanha, França -, não foi o seu assim
I' possam morar e do país em que porventura tenham nascido. Em outras
palavras, a verdade não devia referir-se ou dizer respeito aos cidadãos,
em cujo meio apenas podia existir urna grande diversidade de opiniões,
chamado idealismo, mas ao contrário, o fato de que havia abandonado
a esfera da mera especulação e buscado formular uma filosofia que corres- r nem aos nacionais, cujo senso de verdade estaria limitado por sua própria
história e experiência nacional. A verdade tinha de referir-se ao homem
pondesse e compreendesse conceitualmente as mais novas. e reais experiên- qua homem, o qual, como uma realidade terreria, tangível, não existia em
cias da época. Contudo, essa própria compreensão era teórica, no antigo lugar algum. Por conseguinte, se a História estava destinada a tornar-se
sentido original da palavra teoria; a filosofia de Hegel, embora tratasse da um meio de revelação da verdade, devia ela ser história mundial, e a ver-
ação e do domínio dos assuntos humanos, consistia na contemplação. An- dade que se revelava a si mesma tinha de ser um 'I espírito mundial". Não
te a visão retrospectiva do pensamento, tudo o que tinha sido político - ~.; obstante, embora, a noção de História só pudesse atingir dignidade filosó-
atos, palavras e acontecimentos - tornava-se histórico, resultando daí que fica sob a condição de abranger o mundo inteiro e os destinos de todos
o mundo novo, que fora anunciado pela revolução do século XVIII, não os homens, o conceito da própria história mundial é nitidamente político
recebeu, como Tocquevilleainda reivindicava, uma" nova ciência da po- em sua origem; foi precedido pela Revolução Francesa e pela Americana,
lítica,,]7, mas uma filosofia da História - completamente à parte da trans- ambas se orgulhando de haver ensejado uma nova era para a humanida-
formação talvez ainda mais significativa da filosofia em filosofia da Histó- de, por se tratar de eventos que diriam respeito a todos os homens qua ho-
ria, de que não nos ocupamos aqui. :1 mens, sem levar em conta o lugar em que vivessem, as suas circunstân-
~
Politicamente, a falácia dessa nova e tipicamente moderna filosofia )Jú' cias, ou quaisquer que fossem as.suas nacionalidades. A própria noção de
. é relativamente simples. Consiste ela em descrever e compreender todo história mundial surgiu da primeira experiência de política mundial, e em-
o domínio da ação humana não em termos do ator e do agente, mas do bora o entusiasmo tanto dos americanos como dos franceses pelos "direi-
ponto de vista do espectador que assiste a um espetáculo. No entanto, es- tos do homem." tenha arrefecido rapidamente com o nascimento da nação-
sa falácia é relativamente difícil de identificar, em razão da verdade a ela Estado - que, por mais efêmera que possa ter sido essa forma de gover-
.;
:"':, inerente, que consiste em que todos os dramas encetados e representados no, foi a única conseqüência relativamente duradoura da revolução na Eu-
':'- pelos homens só desvendam seu verdadeiro significado ao atingirem o seu ropa -, o fato é que, de uma forma ou de outra, a política mundial tem
' . .1
final, de tal forma que pode parecer, de fato, que apenas o espectador, 7
!. sido,' desde então, um coadjuvante da política. .
~..• e não o agente, pode aspirar a compreender o que realmente aconteceu,
'
Um outro aspecto dos ensinamentos de Begel que, não menos ob-
~••• 1

.\::: em qualquer determinada sucessão de fatos e acontecimentos. Foi para


viamente, deriva das experiências da Revolução Francesa, é ainda mais
r- o espectador, com muito mais ênfase do que para o ator, que a lição da importante em nosso contexto, pois exerceu uma influência imediata ain-
J Revolução Francesa pareceu demonstrar a necessidade histórica, ou o fa- da maior nos revolucionários dos séculos XIX e XX - os quais, mesmo ~.~
to de Napoleão ter-se tornado um "destino,,]8. Contudo, o ponto em ques- que não tenham aprendido as lições de Marx (ainda o mais ilustre discí- ~c?
cr:
tão é que todos aqueles que, por todo o século XIX e na maior parte do pulo~ue.H~.liamaistevel;.e nunca tenham se pre~ç,1lpado:m ler He- 7;;;
século XX, seguiram as pegadas da Revolução Francesa, se viram não I~ .
gel, consideravam a revoluçao em termos das categorias hegehanas Esse ;~')'
,I
simplesmente como sucessores dos homens da Revolução Francesa, mas aspecto' diz respeIto ao caráter do movimento histó'ncO~@!!.... o _.~:~
também como agentes da História e da necessidade histórica, com a con-
,J,'
Hegeretodos os seus adeptos, é, ao mesmo tempo, a-i'aJ.éticoe movido-E,e-
--.---.-----.~f::----.- ---.------.- ...
,---,,---
_:~L.
-, .,
seqüência óbvia, ainda que paradoxal, de que, em lugar da liberdade, foi Ii:_~~ssida~ ..con_t.r.:~:Ievol'!:0?1do 14 de julho ao 18
reyg!!!.Ç~Q_~-da
i de Brumário e à restauração da monarquia, nasceu o movimento e o con-
a necessidade que se tornou a principal categoria do pensamento político
e revolucionário. . I. tramovimento dialético da História, que arrãSIà-õ-s"nõliH!,f[s-ení-iiíâcor-
I'r
Ainda assim, sem a Revolução Francesa, pode-se duvidar que a filo-

r"ente irresistivel, como um põCIerllM caudal subterrâneo, ao qual devem
fi
sofia jamais tivesse tentado se ocupar com o domínio dos assuntos huma- submeter-se no próprio instante em que tentam estabelecer a liberdade sobre
nos, ou seja, descobrir a verdade absoluta em um domínio que é regulado 1iL a terra. E~~@ii!~a famosa.dialética da liberdade e da neE~si':; _
pelas relações dos homens e seu relacionamento uns com os outros, e que
Mi, dade, em que ambas finalmente coincidem - talvez o mais terrível, e,
:.',{ llUmãnamente falando, o mais intolerável paradoxo de todo o pensamen-
. é, portanto, relativo por definição. A verdade, não obstante fosse concebi-
to moderno. E Hegel, entretanto, que chegara a ver no ano de 1789 omo-
da "historicamente", isto é, entendida como revelando-se no tempo, não
mento em que a terra e o céu se reconciliavam, pode ainda ter pensado.
precisava necessariamente ser válida em todas as épocas, embora tivesse
em termos do conteúdo metafórico original da palavra revolução, como se
\;
42 DA REVOLUÇÃO
o SIGNIFlCIWO DE REVOLUçiO 43

L .>.0;

..
no curso da Revolução Francesa o irresistível movimento cíclico dos cor- É estranho, na verdade, verificar que a opinião iluminada americana do
pos celestiais tivesse descido sobre a terra e as coisas humanas, conferindo- s'~ Xx, ainda mais que a européLa, esteja freqüentemente in:~ii~-ada
lhes uma "necessidade" e regularidade que pareciam situar-se além da a interpretar a Revolução Americana à luz da Revolução Francesa, ou a
"melancólica casualidade" (Kant), da triste "mistura da violência e falta i~
críticar aquela por não ter tão obviamente se ajustado às lições of~s
de sentido" (Goethe), que até então dera a impressão de ser a qualidade por essa última. A triste verdade da questão é que a Revolução Francesa, --:::

predominante da História ic' da trajetória do mundo. Portanto, o parado- que redundou em aesastre, tenha.1eito..história-no..mundo ~assõ--que
xo de que a liberdade é fruto da necessidade, no próprio entendimento ªlS,gõfuçao Americana, tão triunfantemente vitoriosa, tenh~~~rl'!l?~E:~::
de Hegel, dificilmente seria mais paradoxal do que a reconciliação do céu. doum acontecimento clê.:'J.mpÓit-anclã·guasc"gueapenas local... .
.---- -, 'OlS sempre que, em nosso próprio século, as revoluçÕ~s-aparêceram
e da terra. Ademais, nada havia de jocoso na teoria de Hegel, nem qual-
quer graça vã na sua dialética da liberdade e da necessidade. Ao contrá- na cena política, elas foram interpretadas segundo imagens evocadas no
rio, elas devem ter exercido, mesmo nessa época, um forte atrativo sobre curso da Revolução Francesa, compreendidas em conceitos elaborados pelos
aqueles que ainda estavam sob o impacto da realidade política; a inabalá- espectadores, e entendidas em termos de necessidade histórica. Notável
vel força de sua plausibilidade fundamentou-se, a partir daí, muito menos por sua ausência no espírito dos que fizeram as revoluções, bem como no
na evidência teórica, do que numa experiência repetida com freqüência daqueles que as observaram e tentaram a elas ajustar-se, estava a profun-
nos séculos de guerras e revoluções. O conceito moderno de História, com da preocupação com as formas de governo tão característica da Revolu-
sua ênfase sem precedentes na História como um processo, tem muitas ção Americana, mas também muito importante nas fases iniciais da Re-
origens e, entre elas, especialmente, o inicial conceito moderno de nature- volução Francesa. Foram os homens da Revolução Francesa que, intimi-
za comoum processo. Enquanto os homens tomaram como modelo as ciên- ~\ dados com o espetáculo da multidão, exclamaram com Robespierre: "La
. das naturais, e consideraram esse processo como um movimento cíclico, République? La Monarchie? Je ne connais que la question sociale"; e eles perde-
rotativo e sempre recorrente - e mesmo Vico ainda entendia o movimento ram, juntamente com as instituições e constituições, que são "a, alma da
.histórico nesses termos - era inevitável que a necessidade fosse inerente' República" (Saint-Just),a própria revolução 39, A partir daí, os homens,
tanto ao movimento histórico quanto ao astronômico. Todo movimento arrebatados à sua revelia nos vendavais revolucionários, para um futuro
cíclico é um movimento necessário por definição. Mas o fato de que a ne- incerto, assumiram o lugar dos orgulhosos idealizadores que intentaram
cessidade, como uma característica inerente à História, sobrevivesse à mo- construir seus novos lares com base no saber acumulado de todas as épo-
derna ruptura do ciclo dos eternos retornos, e fizesse seu reaparecimento cas pretéritas, na forma como o entendiam; e, com esses iniciadores, de-
'num movimento que era essencialmente retilíneo - e que, portanto, não sapareceu a confortadora confiança de que uma novltS ordo saeclorum podia
.retornava ao que já era conhecido anteriormente, mas se alongava rumo- ser erigida com idéias, segundo um modelo conceitual, cuja verdade era
. a um futuro desconhecido -, esse fato deve sua existência não à especula- assegurada por sua própria antiguidade. Não o pensamento, apenas a prá-
",ção teórica, mas à experiência política e ao curso dos acontecimentos reais. tica, apenas a aplicação poderia ser nova. O tempo, nas palavras de Wash-
Foi a Revolução Francesa, e não a Americana, que ateou fogo ao ington, era "auspicioso", pois havia "desvendado para nós [... ] os tesou-
mundo, e foi, conseqüentemente, do curso da Revolução Francesa, e não ros do conhecimento adquirido pelo esforço de filósofos, sábios e legisla-
do desenrolar dos acontecimentos na América, ou dos atos dos' 'Pais Fun- , dores, durante uma longa sucessão de anos"; com a ajuda deles, os ho-
dadores" que o atual uso da palavra revolução recebeu suas conotações e , mens da Revolução Americana julgaram que podiam começar a agir se-
matizes em todos os lugares, inclusive nos Estados Unidos.jA colonizaçãoÇ" i' gundo as circunstâncias, e a política inglesa não lhes deixou outra alterna-
i
__ ---<taAmérica do Norte e o gove~~~:p~!.!~~~?._~_~~ ..~~~ados Unidos consti- ( tiva senão a fundação de um corpo político inteiramente novo. E já que
r tuem talvez o maior, e certamenteo-InaIS audacioso empreendimento do \ lhes fora oferecida a oportunidade de agir, a História e as circunstâncias
I pOvo europeu; contUCIo, õsEStadõSUiiicros1lveiãm-efefiVâmeiífe~amícía- I não mais podiam ser consideradas culpadas: se os cidadãos dos Estados
Unidos "não conseguissem ser completamente livres e felizes, a culpa se:
tiva de su~<2P..~i~~!.~!9.JjJq29LPº!:!.c:.~mais de"cêiü-àllàs, em esplênâido,(
õUIíão tão esplêndido isolamento do cõntineffte-~mãe.Uescre:-ofiiiãlâosé- ria inteiramente deles" 40 . Jamais lhes teria ocorrido que, apenas algumas
culo passado, estiveram sujeitos à tríplice investida da urbanização, in- décadas mais tarde, o mais arguto e penetrante observador do que haviam
I
-...- dustrializaçâo, e, acima de tudo, da imigração em massa. Desde então, [\1 feito assim concluiria: "Retorno ao passado, através das eras, até a mais
-as teorias e os conceitos, embora, infelizmente, nem sempre suas expe- remota Antiguidade, mas não encontro nada que se compare ao que está
~ -riências subjacentes, migraram, uma vez mais, do velho para o novo rnun- -ocorrendo diante dos meus olhos; já que o passado deixou de lançar sua
do, e a palavra revolução, com suas conotações, não é exceção a essa regra. luz sobre o futuro, o espírito do homem vagueia na escuridão,,41 . v
:<

•••
44 DA REVOLUÇÃO

1
1
l
'I
I:
o SIGNIFICADO DE REVOLUÇÃO 45
· o mágico fascínio que a necessidade histórica lançou sobre as men-
tes dos homens, desde o início do século XIX, aumentou de intensidade
com a Revolução de Outubro, que, para o nosso século, teve o mesmo
'profundo significado da primeira cristalização das melhores esperanças dos
homens e da posterior constatação da inteira dimensão do seu desespero, ,t..:
CAPÍTULO 2,
que a Revolução Francesa representou para seus contemporâneos. Ape-
nas que, dessa vez, não foram experiências inesperadas que transmitiram A QUESTÃO SOCIAL
a .lição, mas a modelagem consciente de um curso de, ação sobre as expe-
riências de uma época e acontecimentos passados. E certo que somente
a dupla compulsão da ideologia e do terror, uma compelindo os homens Les malheureux stmt Ia puissance de Ia terre
de dentro para fora, e a outra, de fora para dentro, pode explicar plena- (Saint-Just)
.~
mente a candura com que os revolucionários de todos os países que caí-
ram sob a influência da Revolução Bolchevista caminharam para sua ruí-
na; mas aí a lição presumivelmente assimilada da Revolução Francesa
tornou-se parte integrante da compulsão a que se impôs o pensamento ideo-
lógico de hoje. O problema foi sempre o mesmo: os que freqüentaram a l'
escola da revolução aprenderam e souberam antecipadamente o rumo que Os revolucionários profissionais do início do século XX podem ter
deve tomar uma revolução. Foi o curso dos acontecimentos, e não os ho- I•. sido os tolos da História, mas certamente eles próprios não eram loucos.
:..
mens da revolução, que eles imitaram. Se tivessem tomado como modelo Como uma categoria de pensamento revolucionário, a noção de necessi-
os revolucionários, teriam protestado sua inocência até o último suspiro 42. dade histórica tinha algo mais a recomendá-Io do que o mero espetáculo
Mas não podiam fazer isso, pois sabiam que uma revolução deve devorar
da Revolução Francesa, mais ainda do que a atenta recapitulação do cur-
seus próprios filhos, assim como sabiam que uma revolução daria origem
so dos seus eventos, e da subseqüente condensação dos acontecimentos em
a uma seqüência de revoluções, ou que, ao inimigo declarado, seguir-se-
conceitos. Por trás das aparências, havia uma realidade, embora talvez
ia o inimigo oculto sob a máscara dos "suspeitos", ou que uma revolução
se dividiria em duas facções extremas - os indlllgents e os enragés - que
verdadeiramente ou "objetivamente" trabalhavam juntas para solapar o
I' fosse a primeira vez que ela aparecesse em plena luz da História. Numa
visão introspectiva, a necessidade mais poderosa de que temos conheci-
governo revolucionário, e que a revolução era "resgatada" pelo homem mento é o processo vital, que impregna os nossos corpos e os mantém num
do centro, o qual, longe de ser mais moderado, aniquilava a direita e a estado de constante mudança, cujos movimentos são automáticos, inde-
'. esquerda, como Robespierre liquidou Danton e Hébert. s.sue os qome~,s pendentes de nossa vontade e irresisríveis - isto é, de uma avassaladora
I da RevoluC;:ª,-l?R~~,'!:.,~Rre~d~E.~!r.l_.C::C!I~.~._~~~(J.~~l~~º]f..a.l1cesa.
- e esse urgência. Quanto menos agimos, quanto menos ativos nos mostramos,
1 ap~ado constituiu quase que toda a sua preparação - !~~IE~tória1 tanto mais intensamente esse processo biológico se afirma, impõe sobre
<:_@? aç8 Eles adquiriram a habilidade de reP!5!se..!!.té!r. ..q1,!';11q~r.Jlap'c:1 nós sua intrínseca necessidade, e nos intimida com o seu fatídico automa-
tismo de pura transcorrência, subjacente em toda a; história humana. A
\ I~i~ef1s~~c!fs:d~:6~~J!~~~s2~~-.~~~~te~.~~r.~~e~i~sfa~~.~~~1~~:~~~··· necessidade dos processos históricos, assimilada originalmente à imagem
\dispo'stos a-ãceifá=lo;'ôe preferência a ter de ficar de fora da peça. do movimento cíclico, regular e necessário dos corpos celestes, encontrou
\ , . ..
li\.

i
"'-Háumã-certa-comicidade 'grandiosa no espetáculo desses homens _ sua poderosa contrapartida na necessidade recorrente a'que toda a vida'
que ousaram afrontar todos os poderes vigentes, e desafiar todas as auto- humana está sujeita. Quando isso aconteceu, e aconteceu quando os po-
ridades da terra, e cuja coragem estava além ele qualquer dúvida _ bres, movidos por suas neêessidade's físicas,lrtº.!D...p~Eam no palco da Re-
submetendo-se, muitas vezes de um dia para outro, com humildade, e sem volução F'rmcesa, a metáfora astronôniI~~tão piausivel~en~ adequida
qualquer expressão de revolta, ao apelo da necessidade histórica, não lhes à perpétua mudança, aos altos e baixos do destino humano, perdeu suas'

=:.
importando quão louca e incongruente possa ter-lhes parecido a aparên- antigas co~otaçõ~s: e adq,:ir~u a acepç~o ,b~ológica q~e ~icerça e irnpreg- .
cia exterior dessa necessidade. Foram ludibriados, não em razão das pala-
!! na as teorias SOCIaISe orgamcas da História, as quats tem em comum o 1
vras de Danton e Vergniaud, de Robe'Spierre e Saint-Just, e de todos os
fato de compararem uma multidão - a pluralidade fatual de uma
outros, que ainda 'soavam em seus ouvidos; foram ludibriados pela Histó-.
ria, e se ~m os tolos.da História. ':~.~r-:-=~.;'--~'=õ'"-,=,.,..".~. r: ou um povo, ou a sociedade - a um corpo sobrenatural, movido por uma
---'._--~------'--.-. i:i sobre-humana, irresistivel "vontade geral". .
46 DA REVOLUÇÃO

i
n
.;' \.
ti QUESTÃO SOCIAL 47

Você também pode gostar