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Protocolado: 08012.002474/2008-24
Natureza: Procedimento Administrativo
Representantes: Associação dos Fabricantes de Refrigerantes do Brasil
(AFREBRAS), Cervejaria Imperial, Associação Brasileira
de Bebidas (ABRABE) e Cervejaria Kaiser Brasil S/A.
Representada: Companhia de Bebidas das Américas - AmBev
Senhora Diretora,
I. RELATÓRIO
I. 1 Das Representações
7. Às fls 164/167, são listados os seguintes custos impostos pela Representada aos seus
concorrentes: (i) necessidade de reposição das garrafas drenadas; (ii) custos de separação
dos vasilhames; (iii) custo de devolução dos vasilhames da AmBev eventualmente
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9. Às fls 514, a Kaiser acrescenta que a prática dificulta a expansão das vendas dos
rivais no curto prazo. Na medida em que um varejista não poderá mais intercambiar garrafas
entre diferentes produtores, não será possível atender de imediato eventual aumento da
demanda por uma cerveja em particular, uma vez que para tanto será necessário adquirir
novos vasilhames. As cervejarias rivais deverão manter estoques extras de garrafas para
atender prontamente eventuais aumentos de sua participação de mercado, implicando
aumento de custos. Haveria, assim, um engessamento da participação de mercado da
AmBev, na medida em que (i) o ponto de venda não possuiria vasilhames de uso comum
para imediatamente aumentar suas compras de outras cervejas; e (ii) o consumidor, em
posse da Garrafa AmBev 630, estaria subordinado à aquisição de marcas da AmBev.
10. Segundo a Kaiser, a Representada buscaria com a atual conduta alcançar os mesmos
objetivos intentados com a implantação do Programa de Fidelização de Pontos de Venda
“Tô Contigo”, cujos efeitos anticoncorrenciais foram analisados no Processo Administrativo
nº 08012.003805/2004-10, tendo recebido parecer pela condenação da SDE.
11. Por sua vez, a AFREBRAS e a Cervejaria Imperial observam que, até então, o setor
de refrigerantes regionais utilizava a garrafa âmbar de 600 ml de uso comum como principal
insumo para colocação de seus produtos nos pontos de distribuição a frio, em razão de sua
rentabilidade e grande aceitabilidade no mercado regional. Alegam que sua substituição pela
Garrafa AmBev 630 impactaria negativamente sua posição no mercado, em razão da
dificuldade de acesso a outros tipos de embalagens (lata e pet).
14. Em vista do alegado fumus boni iuris e do periculum in mora, requerem a concessão
de medida preventiva com base no art. 52 da Lei n. 8.884/94 para que:
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ii. A AmBev retire de circulação todas as Garrafas AmBev 630 que já estejam nos
pontos de venda ou em posse dos consumidores, substituindo-as por garrafas
comuns, lisas, passíveis de utilização pelas demais cervejarias”.
I.3 Da Instrução Realizada pela SDE e Demais Informações Constantes dos Autos
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19. Desde o protocolo das Representações até a presente nota técnica, foram realizadas
oito reuniões, que serviram não só para esclarecer fatos apresentados e contraditados, como
motivaram a emissão de outros ofícios para instruir o feito:
25. Nesse mesmo dia, servidores da SDE visitaram 32 pontos de venda de cervejas na
cidade do Rio de Janeiro (entre bares, restaurantes e adega), questionando-os sobre a
mudança na dinâmica de troca de vasilhames e nas suas vendas em decorrência da
introdução da Garrafa AmBev 630 (relatório da diligência às fls. 930/937). Em suma, 78%
dos pontos de venda entrevistados informaram que a operação diária de troca de vasilhames
de cerveja passou a demandar mais tempo e/ou trabalho em função da necessidade de
separação das garrafas. A pesquisa constatou uma alteração significativa na rotina do ponto
de venda, visto que anteriormente os varejistas não precisavam separar a garrafa de uso
comum para realizar suas compras de cerveja. Segundo 97% dos pontos de venda
entrevistados, a Garrafa AmBev 630 deve ser separada da garrafa retornável 600 ml de uso
comum no próprio ponto de venda, sendo que 81% respondeu que eles são os responsáveis
pela separação. Perguntados sobre “O que aconteceria se todas as outras marcas de cerveja
da AmBev passassem a ser vendidas na nova garrafa AmBev 630 ml”, 28,1% respondeu que
teria menos trabalho na separação das garrafas, 9,3% afirmou que o PDV só compraria
AmBev para ter menos trabalho, não precisando separar as garrafas, 22% afirmou que
faltaria vasilhames para os concorrentes da AmBev, 37,5% disse que a situação não mudaria
para o ponto de venda e 3% não soube responder.
27. Em 20.05.2008, a Kaiser apresentou cópia de decisão judicial que deferiu a tutela
antecipada por ela pleiteada para suspender os efeitos dos registros de desenho industrial
relativos à Garrafa AmBev 630 concedidos à AmBev pelo Instituto Nacional de Propriedade
Industrial (INPI). Em síntese, argumentou que as diferenças entre a nova garrafa da AmBev
e a garrafa padrão são muito sutis e que “... todas as concorrentes da AmBev, em razão da
dificuldade de distinção entre as garrafas nas máquinas inspetoras, estarão reiteradamente
sujeitas à prática de crime de contrafação de desenho industrial...”. De acordo com a
decisão proferida pelo Exmo. Juiz Federal Victorio Giuzio Neto (fls. 875/877):
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Fosse a embalagem original, a permitir ictu oculi a sua diferenciação, ou ainda, que
exibisse dimensões tais que viessem a impedir seu trânsito pelos mecanismos
automáticos das esteiras de abastecimento, não se relutaria em afirmar como
improcedentes as alegações da KAISER (...)
Nas circunstâncias, são as sutilezas da diferenciação da embalagem, combinadas com a
concreta ameaça constante no item 7 da notificação encaminhada pela AmBev à
Cervejaria Kaiser que recomenda a suspensão dos efeitos dos registros dos desenhos
industriais (...)
Fosse, nas circunstâncias, um desenho que se apresentasse com características
inovadoras, como as que se observam em determinados frascos de perfumes (para
permanecermos no campo das embalagens) que graças à forma, cor e dimensões
revelam-se como verdadeiras obras de arte a distinguir-se dos demais, a solução
poderia ser outra.
Da mesma forma se o emprego da embalagem fosse para uso promocional, sem
retorno”. (Processo n. 2008.61.00.010461-9, Justiça Federal, Seção Judiciária do Estado
de São Paulo, decisão de 08.05.2008)
28. Em petição de fls. 890/929, a Kaiser informou que a necessidade dos distribuidores
de conferir se não foi incluída nenhuma Garrafa AmBev 630 em suas garrafeiras aumentou
em 50% o tempo médio da visita dos distribuidores Kaiser, sem impedir de forma total a
chegada das Garrafas AmBev 630 na fábrica da Kaiser. Além disso, em reunião em
20.05.2008, a Kaiser foi questionada acerca do lançamento da garrafa 600 ml retornável da
Heineken (integrante do Grupo Femsa), de cor verde e formato próprio. A pedido da SDE, a
o novo vasilhame da Heineken foi apresentada à SDE em 21.05.2008, acompanhada da
Garrafa AmBev 630, da garrafa comum Sindicerv e da garrafa comum tipo A.
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II. ANÁLISE
30. A conduta em questão refere-se à introdução no mercado da Garrafa AmBev 630. Antes
de analisar a conduta sob a ótica antitruste, será feita breve definição dos mercados afetados pela
conduta da Representada. A prática sob investigação pode ter efeitos horizontais (afetando
diretamente os concorrentes) e verticais (afetando diretamente os pontos de venda e,
indiretamente, os concorrentes). Assim, deverá ser definido o mercado relevante sob a ótica
horizontal e vertical (a jusante) e verificada a existência de poder de mercado. Em seguida, será
feita breve introdução ao sistema de compartilhamento de vasilhames.
ser comercializadas a preços mais elevados. Some-se a isso a necessidade de haver uma
ampla e eficiente rede de distribuição, notadamente nos canais “bar” e “tradicional”, pois de
nada adianta a fixação da marca se o produto não estiver disponível nos canais de consumo.
Há hoje cerca de um milhão de pontos de venda de cerveja no Brasil.3
35. Em geral, as fabricantes de cervejas fazem vendas diretas para o canal auto-serviço e
contratam distribuidores para abastecer os canais “bar” e “tradicional”. Isso ocorre em
função das diferenças de dinâmica desses canais de consumo. Um estabelecimento
comercial do canal auto-serviço adquire, em média, grandes quantidades de cervejas. Por
sua vez, os canais “bar” e “tradicional” são bastante pulverizados com pontos de vendas que
adquirem pequenas quantidades do produto. De fato, esses dois canais apresentam uma série
de características que os fazem depender da presença quase que diária de distribuidores em
seus recintos: baixa capacidade de estoque; reduzido capital de giro; compras periódicas em
pequenos volumes; necessidade de prestação de serviços por parte dos distribuidores
(comodato de “freezers”, mesas, letreiros etc); dominância das embalagens retornáveis, o
que aumenta de sobremaneira a complexidade da distribuição. Em vista da logística e
custos envolvidos, nos canais bar e parte do tradicional há um incentivo à concentração das
compras em um único fornecedor (muitas vezes, esse fornecedor único é a AmBev, por sua
posição de mercado, cf.explicado abaixo).
36. Posição Dominante detida pela AmBev. No mercado relevante de cervejas, a
Representada possui liderança de vendas em volume e receita em todos os mercados
geográficos, conforme concluído no parecer da SDE do PA nº 08012.003805/2004-10. Suas
marcas, entre as quais se destacam Skol, Brahma e Antarctica (além de Bohemia, Original,
Stella Artois), são as marcas de melhor percepção e colocação no mercado, com alta fidelização
pelo consumidor.4 Além disso, as marcas detidas pela AmBev contam com um sofisticado
sistema de distribuição, gozando dos benefícios de distribuição conjunta das marcas5.
37. Essa combinação de fortes marcas e sofisticado sistema de distribuição faz com que
a AmBev responda por 67% do total de volume de vendas de cerveja no país6, com reflexo
dessa posição nos mercados regionais e nos mercados a jusante (canais bar e tradicional,
foco da presente análise). Os gráficos abaixo servem como proxy para indicar a forte
posição detida pela AmBev juntos aos pontos de venda: cerca de 70% das vendas no Brasil,
em volume e em valor, são relativas a marcas da AmBev.7
3
Vide AmBev, Relatório Anual 2007, Form 20-F, disponível em
http://www.mzweb.com.br/ambev/web/arquivos/Ambev_Form20F2007_eng.pdf (acesso em 21.05.2008).
4
Pesquisa do Instituto Datafolha de 2006, intitulada Top of Mind, mostra que a Skol é a marca de cerveja mais
lembrada pelos consumidores entrevistados (39% de recall), seguida pelas marcas Brahma (20%) e Antarctica
(14%), totalizando um recall de 73% para as marcas AmBev. Vide parecer da SDE do PA nº
08012.003805/2004-10.
5
Vide AmBev, Relatório Anual 2007, Form 20-F.
6
Dados da Nielsen referentes a março de 2008 e disponíveis em AmBev, Form 20-F, p. 33.
7
A participação de mercado detida pela AmBev é ainda maior, tendo em vista as outras marcas de cerveja
detidas pela empresa (Bohemia, Original, entre outras).
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38. Além disso, há que se dizer que, conforme o IBOPE, cerca de 30% dos canais bar e
tradicional comercializam exclusivamente marcas de cerveja AmBev. Conclui-se, portanto,
que a Representada detém poder de mercado nos mercados relevantes afetados pela conduta.
40. Em 1997, foi editada a Portaria n. 01/97, do Ministério Público Federal que tornou
público compromisso firmado entre o Poder Público e fabricantes de vasilhames de vidro e
fabricantes de cerveja, entre outros, denominado “Código de Auto-Regulamentação para a
produção, engarrafamento, circulação, estocagem e comercialização de bebidas
carbonatadas (cervejas e refrigerantes) em vasilhames de vidro.”11
8
Conforme reconhecido pela Representada, “Beer is predominantly sold in bars for on-premise consumption,
in standardized, returnable 600 milliliter glass bottles.” Em tradução livre: “Cerveja é vendida
predominantemente em bares para consumo no local em garrafas padronizadas, retornáveis, de 600 ml. Vide
AmBev, Relatório Anual 2007, Form 20-F, p. 33.
9
NBR 7842: “Garrafas Retornáveis de Uso Comum para Cervejas, Refrigerantes, Aguardentes, Sodas e
Águas Gaseificadas - Formatos, dimensões e cores – Padronização”, em vigor. Referida norma foi aprovada
pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (CONMETRO), por meio da
Resolução n. 02/83, posteriormente revogada pela Resolução CONMETRO n. 01/1997, atualmente em vigor.
10
Ata de Reunião n. 02/97, de 14.05.2007, disponível em http://www.abre.org.br/cb23_atas/vidro.pdf.
11
Diário Oficial da União, 09.10.1997, Seção 1, 22797.
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42. As novas garrafas, que passaram a ser o padrão do mercado de cerveja, são
conhecidas como “Garrafa Sindicerv” ou “Garrafa ‘635’”.12 Não apenas as associadas ao
Sindicerv (AmBev e Kaiser) adquirem das vidrarias apenas a nova garrafa, como as demais
fabricantes de cerveja (como Schincariol e Petrópolis) passaram a fazer o mesmo,
devidamente autorizadas a tanto.13 Estima-se que a Garrafa Sindicerv responda por cerca de
80% do total das garrafas de 600 ml retornáveis comercializadas no mercado de cerveja.
Lisa, “Cerveja”
capacidade em alto-
600 ml relevo,
capacidade
total
635 ml,
capacidade
útil 600 ml
44. Há aproximadamente um milhão de pontos de venda no país e 90% das vendas nos
canal bar e tradicional se dão via garrafas retornáveis, exigindo, portanto, um sistema de
troca ágil e eficiente. Estima-se que os distribuidores ficam em média de 7 a 10 minutos em
cada ponto de venda para fazer a entrega.
12
“635” faz referência à capacidade total da garrafa, que é de 635 ml, sendo que a capacidade útil é de 600 ml.
13
Para garantir o padrão da nova garrafa, o Sindicerv homologa as vidrarias aptas a fabricá-la. Exemplos de
vidrarias homologadas são a Owens Ilinois, Saint Gobain e Vidroporto.
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46. Por todos utilizarem a mesma garrafa, elas são totalmente intercambiáveis e não há
separação das garrafas por marcas feita pelos pontos de venda. Assim, cada ponto de venda
tem o cuidado de devolver para cada distribuidor seu engradado próprio (“garrafeira”
logomarcada), sem, contudo, fazer a separação das garrafas vazias por rótulo (uma vez que
o rótulo será retirado assim que a garrafa chegar à fábrica para reutilização).
47. O fato de as garrafas não serem usualmente separadas nos pontos de venda é
constatado inclusive no próprio vídeo apresentado pela AmBev no bojo desse processo para
explicar a dinâmica de entrega nos pontos de venda, em que se pode facilmente observar
que o distribuidor AmBev entrega garrafas cheias de Skol e, em troca, recolhe garrafas
vazias de diversas marcas, entre as quais é possível ver Brahma, Bohemia, Original e Skol.
Todas essas diferentes marcas são levadas misturadas pelo distribuidor na garrafeira Skol.
Além disso, em visita à fábrica da Cervejaria Petrópolis foi constatado que em todos os
engradados Petrópolis vistos havia cervejas de outras marcas (Antártica, Skol, Bohemia,
Crystal e inclusive marcas de refrigerantes). No mesmo sentido, na linha de produção foi
possível constatar a atual falta de atual separação das garrafas. Por fim, diligência em campo
junto a pontos de venda trouxe elementos no mesmo sentido.
Exemplo de Garrafeiras / Engradados usados no Imagem do Vídeo AmBev em que é possível constatar
sistema de distribuição de retornáveis que não há separação por marcas nas garrafeiras
(Brahma e Bohemia são colocadas em garrafeiras
Skol recolhidas pelo distribuidor AmBev)
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Padrão ornamental e
inscrição “AmBev” em
alto-relevo
Inscrição “Qualidade
AmBev” em alto-
relevo
49. Por suas características, a introdução da Garrafa AmBev 630 poderá prejudicar a
concorrência14 ao aumentar o custo dos rivais em função da dificuldade de diferenciação e
separação das garrafas nos pontos de vendas, distribuidores e linha de produção, gerando
perda da eficiência do sistema de distribuição. Outro possível efeito é o fechamento de
mercado junto aos pontos de venda decorrente dos custos impostos aos pontos de venda na
separação. Passa-se a analisar cada um desses possíveis efeitos resultantes da conduta da
Representada, com vistas a verificar se existem indícios suficientes de infração à ordem
econômica a autorizar a abertura de processo administrativo.
14
Note-se aqui que a ótica de análise será em relação ao impacto da Garrafa AmBev 630 com relação às
cervejarias concorrentes e não com relação aos fabricantes de refrigerantes regionais. Isso porque,
independentemente do lançamento da Garrafa AmBev 630, fabricantes de refrigerantes regionais já não podem
utilizar as garrafas de uso comum Sindicerv, padrão no mercado e de uso exclusivo por cervejarias. Assim, o
fato de serem introduzidas Garrafas AmBev 630 no mercado não deveria afetar a situação dos fabricantes de
refrigerantes regionais.
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50. Há fortes indícios no sentido de que a Garrafa AmBev 630 aumenta os custos dos
concorrentes em vista da dificuldade de se separar a Garrafa AmBev 630 da garrafa de uso
comum Sindicerv nos pontos de venda, distribuidores e linhas de produção.
52. A separação das garrafas nos pontos de venda se tornou necessária justamente pela
introdução da Garrafa AmBev 630, sendo um ônus do ponto de venda conforme o próprio
encarte da AmBev. Essa regra é confirmada pela pesquisa de campo realizada pela SDE
junto a pontos de venda de cerveja na cidade do Rio de Janeiro. Dos entrevistados, 78%
afirmaram que a introdução da Garrafa AmBev 630 alterou a rotina do seu estabelecimento,
na forma de aumento do tempo e/ou de trabalho para realizar a separação das garrafas.
53. A necessidade de separação das garrafas aumenta também o tempo gasto pelo
distribuidor na visita em cada ponto de venda conforme reconhecido pela própria
Representada. Considerando a semelhança das garrafas e o grande número de pontos de
venda de cerveja que precisam ser abastecidos semanalmente pelos distribuidores15, tem-se
que um aumento no tempo de permanência do distribuidor no ponto de venda gera perda da
eficiência de todo o sistema de distribuição. Nesse sentido, a Cervejaria Petrópolis informou
que o tempo médio gasto com cada visita ao ponto de venda aumentou em cerca de 50%
devido à dificuldade de separar as garrafas e, por esse motivo, para manter o mesmo número
de entregas por dia, os seus distribuidores estão retornando à empresa com duas horas de
atraso (fls. 851/859). A Kaiser também reportou aumento do tempo da visita dos
distribuidores aos pontos de venda em 50% (fls. 890/929).
54. Contudo, por maior que seja o esforço dos pontos de venda e dos distribuidores para
separar a Garrafa AmBev 630 da garrafa de uso comum Sindicerv, Garrafas AmBev 630
têm chegado às fábricas de cervejarias concorrentes devido à sua grande semelhança física,
especialmente se colocadas no contexto do giro diário de milhares de garrafas. A Garrafa
AmBev 630 e a garrafa de uso comum Sindicerv têm a mesma cor (cor âmbar), formato
parecido, base de diâmetro que permite a colocação da garrafa nas garrafeiras dos
concorrentes e diferença de altura de apenas 0,8 cm, o que não impede seu trânsito nas
linhas de produção das concorrentes.
15
A AmBev informou que visita seus pontos de venda de uma a três vezes por semana. A Cervejaria
Petrópolis informou que visita os pontos de venda duas vezes por semana.
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Engradados contendo duas Garrafas AmBev 630 em meio a garrafas de uso comum Sindicerv
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58. Segundo a Representada, a separação dos vasilhames da fábrica pode ser feita
manualmente ou pela introdução de um inspetor eletrônico na linha de produção. A
separação manual das garrafas não é uma solução eficiente em razão do enorme volume de
vasilhames transportados na fábrica diariamente (as linhas fabris de cerveja são de 40 a 62
mil garrafas / hora, com produção que supera as 20 mil caixas de cerveja por dia). Ademais,
como visto, a Garrafa AmBev 630, quando misturada às garrafas de uso comum, é pouco
diferenciada, o que torna a tarefa de separação manual penosa e sujeita a erros.
61. Mesmo com todos os esforços, ainda há o risco de que a cerveja dos concorrentes
seja engarrafada na Garrafa AmBev 630, como aliás já ocorreu. Por exemplo, a AmBev
chegou a notificar a Kaiser por ter encontrado no mercado a cerveja da Kaiser envasada na
Garrafa AmBev 630 (fls. 429). Nesse ponto, há que se dizer que foram trazidas aos autos
fotos de cervejas Brahma e Antarctica engarrafadas na Garrafa AmBev 630 (fls. 413/414), o
que evidencia que a separação das garrafas não é tarefa fácil nem mesmo para a
Representada. Contudo, se para a AmBev não há ônus em se engarrafar qualquer de suas
marcas no vasilhame Garrafa AmBev 630 (uma vez que ele é identificado com a marca
“AmBev” e não “Skol”), se o concorrente fizer isso ele poderá estar sujeito aos seguintes
ônus:
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63. Isso porque em vista da semelhança da Garrafa AmBev 630 com a garrafa de uso
comum Sindicerv, há custos significativos na separação das garrafas. Esses custos, de acordo
com as próprias instruções da AmBev aos pontos de venda, recaem sobre os pontos de venda,
resultando em um desestímulo para que este comercialize as marcas de cervejas concorrentes.
65. Nesse sentido, alguns pontos de venda visitados pela equipe da SDE manifestaram
que deixariam de adquirir cervejas de outras marcas se a AmBev estendesse o uso da
Garrafa AmBev 630 para todas as suas marcas (fls. 935). Transcrevem-se abaixo alguns dos
comentários feitos pelos pontos de venda:
“Se todas fossem iguais seria melhor, como não são, por enquanto venderia Itaipava, mas
essa deve sair do mercado porque dá muito trabalho ficar separando garrafas.”
“pra quem trabalha com outras marcas pioraria a situação, pois aumentaria o trabalho de
troca de garrafas”
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66. Em vista do exposto acima, há fortes indícios de que a conduta em análise pode se
configurar um abuso de poder econômico, apto a ser punido nos termos da Lei n. 8.884/94,
em vista do aumento não razoável dos custos dos rivais e do potencial fechamento de
mercado junto aos pontos de venda, sugerindo-se a instauração de processo administrativo
para investigar a prática.
68. Como o próprio nome do instituto indica, a medida preventiva destina-se a prevenir
danos ao mercado causados por práticas que ferem a concorrência e que, por sua natureza e
gravidade, não podem esperar a demora natural do processo para serem cessadas. Cada caso
específico demandará intervenção diferente. A intervenção precisa ser incisiva o suficiente
para fazer cessar os efeitos da prática, sem, obviamente, impor aos representados do
processo gravames desnecessários. Além disso, a concessão da medida preventiva não visa
a proteger diretamente um concorrente e sim o bem-estar coletivo, ou seja, o interesse
público. Dois são os requisitos autorizadores da medida preventiva em sede antitruste:
16
Segundo HUMBERTO THEODORO JR., o fumus boni iuris trata de uma constatação perfunctória da
plausibilidade do direito material em risco, dispensando-se, em um momento inicial, prova cabal de sua
existência. Basta, portanto, para a concessão da medida, a presença de indícios suficientes de que a conduta
deflagrada esteja causando ou possa vir a causar efeitos prejudiciais à livre concorrência e à livre iniciativa, de
forma a demandar uma imediata intervenção das autoridades antitruste. Vide THEODORO Jr., Humberto,
“Curso de Direito Processual Civil”, 26ª edição, Rio de Janeiro: Editora Forense, 1999, p. 371.
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69. Como visto no item II.3 acima, há fortes indícios de que a conduta em análise pode
configurar abuso de poder econômico, apto a ser punido nos termos da Lei n. 8.884/94, em vista
do aumento não razoável dos custos dos rivais e do potencial fechamento de mercado junto aos
pontos de venda decorrente da introdução da Garrafa AmBev 630, que pouco se diferencia da
garrafa de uso comum Sindicerv, ficando caracterizada a presença do fumus boni iuris.
70. Igualmente, o periculum in mora está bastante claro, uma vez que os concorrentes já
arcam com os custos das dificuldades na separação dos vasilhames AmBev 630 ml em sua
linha de produção, nos distribuidores e nos pontos de vendas, sendo que a cada dia que
passa mais Garrafas AmBev 630 vão parar nas fábricas de concorrentes, impondo os
seguintes custos: (i) custos de separação das garrafas na fábrica; (ii) perda de
produtividade; (iii) custos de armazenagem e devolução das Garrafas AmBev 630; (iv)
exposição jurídica por potencial configuração de crime contra o consumo, crime de
contrafação de desenho industrial e crime contra a marca; e (v) prejuízos à imagem e à
competitividade.
ii) Recolha as “Garrafas AmBev 630 ml” introduzidas no mercado no prazo de três
meses contados da notificação desta decisão. O prazo de 3 (três) meses para a
retirada das Garrafas AmBev 630 ml do mercado mostra-se razoável uma vez que a
AmBev logrou completar a troca das garrafas de 600 ml para a nova garrafa nos
mercados afetados em cerca de um mês;
iii) Até que todas as “Garrafas AmBev 630 ml” sejam recolhidas do mercado,
disponibilize um número de fax para que todas as vezes que os concorrentes
acumularem, individualmente, 6 (seis) pallets de “Garrafas AmBev 630 ml” em sua
fábrica, possam solicitar a troca dessas garrafas por garrafas de vidro retornável de
uso comum Sindicerv, o que deverá ser atendido pela Representada em um prazo
máximo de 48 (quarenta e oito) horas do recebimento do fax pela Representada, a
não ser que acertado de outra forma pelo concorrente interessado na troca. O
número de fax para esse objetivo deverá ser informado à Secretaria de Direito
Econômico e às cervejarias concorrentes em até 5 (cinco) dias da notificação desta
decisão.
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73. Note-se que este momento mostra-se especialmente adequado para a adoção da
medida, tendo em vista que a prática da Representada iniciou-se há poucos meses e está
restrita a dois Estados do país e a certas marcas (Skol no Rio de Janeiro e Bohemia no Rio
Grande do Sul), o que implica menores custos associados à retirada da Garrafa AmBev 630
do mercado.
74. Com relação ao pedido das Representantes no sentido de que “A AmBev abstenha-se
imediatamente de produzir, por si ou por terceiros, colocar no mercado ou se valer de
garrafas que não sejam passíveis de utilização pelas demais cervejarias”, entende-se que a
princípio é uma prerrogativa de cada agente econômico decidir se vai participar de um
sistema compartilhado de vasilhames ou não. Não há dúvidas de que o fato de o agente com
maior participação de mercado integrar um sistema compartilhado beneficia os seus
concorrentes, uma vez que diminui custos e possibilita a existência de um grande número de
garrafas de uso comum. Porém, pode bem ser que um agente decida deixar de comercializar
seus produtos em embalagens retornáveis, o que geraria sua saída do sistema compartilhado
e a conseqüente redução do número de garrafas de uso comum disponíveis e nem por isso
haveria, por si só, indícios de prática anticompetitiva. Além disso, pode ser que o agente
queira continuar fazendo uso de garrafas retornáveis, mas queira diferenciar seu produto.
Aliás, essa foi a estratégia adotada recentemente pela Heineken (Grupo Femsa), que lançou
uma garrafa retornável de cor verde, capacidade de 600 ml, formato diferenciado, com o
rótulo impresso no próprio vidro. Assim, apesar da garrafa ser retornável, ela não integra o
sistema compartilhado e nem por isso há indícios de prática anticompetitiva.
IV. CONCLUSÃO
76. Portanto, diante dos fortes indícios de infração à ordem econômica decorrentes da
introdução da Garrafa AmBev 630, recomenda-se a abertura de Processo Administrativo em
desfavor da Representada, nos termos do art. 20, incisos I, II e IV, c/c o art. 21, incisos IV,
V e VI, ambos da Lei nº 8.884/94.
77. Por fim, nos termos do art. 52 da Lei 8.884/94, diante da presença dos requisitos
legais do fumus boni iuris e do periculum in mora, recomenda-se a imediata adoção de
Medida Preventiva, com o objetivo de restabelecer as condições de concorrência no
mercado de cerveja, determinando à Representada que (i) Abstenha-se de envasar cerveja na
“Garrafa AmBev 630 ml” em um prazo de 10 (dez) dias a partir da notificação desta
decisão; (ii) Recolha as “Garrafas AmBev 630 ml” introduzidas no mercado no prazo de 3
(três) meses contados da notificação desta decisão; (iii) Até que todas as “Garrafas AmBev
630 ml” sejam recolhidas do mercado, disponibilize um número de fax para que todas as
vezes que os concorrentes acumularem, individualmente, 6 (seis) pallets de “Garrafas
AmBev 630 ml” em sua fábrica, possam solicitar a troca dessas garrafas por garrafas de
vidro retornável de uso comum Sindicerv, o que deverá ser atendido pela Representada em
um prazo máximo de 48 (quarenta e oito) horas do recebimento do fax pela Representada, a
não ser que acertado de outra forma pelo concorrente interessado na troca. O número de fax
para esse objetivo deverá ser informado à Secretaria de Direito Econômico e às cervejarias
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Procedimento Administrativo nº 08012.002474/2008-24
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA
SECRETARIA DE DIREITO ECONÔMICO
concorrentes em até 5 (cinco) dias da notificação desta decisão. Tendo em vista a gravidade
dos fatos verificados e a capacidade econômica da Representada, recomenda-se, ainda, a fixação
de multa diária, em caso de descumprimento da medida preventiva, no valor de R$ 100.000,00
(cem mil reais), até a decisão final do presente processo administrativo.
À consideração superior.
Brasília, de maio de 2008.
De acordo.
À consideração da Sra. Secretária de Direito Econômico.
Brasília, de maio de 2008.
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