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Sandra R.H. Mariano


Verônica Feder Mayer
Bloqueios à criatividade
30 :: Criatividade e Atitude Empreendedora :: Sandra R.H. Mariano / Verônica Feder Mayer

Meta Apresentar os principais bloqueios à criatividade.

Objetivos
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

1. Analisar os três grupos de bloqueios à criatividade:


autocensura, limitações da percepção humana, e
bloqueios externos ou ambientais.

2. Identificar estratégias para superar os bloqueios.

Guia da Aula

1. Bloqueios à 3. Limitações da 4. Bloqueios externos


2. Autocensura
criatividade percepção humana ou ambientais
Aula 12 – Bloqueios à criatividade :: 31

Criatividade:
como superar o medo de falhar
JAIRO SIQUEIRA

S empre que você tenta fazer alguma mudança, ou criar algo novo, um dos
ingredientes mais importantes é a convicção de que você pode ter sucesso
no que está tentando realizar. Você pode ter o desejo e os conhecimentos
para realizar o trabalho, mas, se não acreditar que pode, você nem tentará.
O medo de falhar é um dos maiores obstáculos à criatividade e inovação,
tanto no nível individual como no nível organizacional.

No nível individual, o medo de falhar está associado aos temores de


parecermos ridículos, incompetentes ou irresponsáveis; de sermos punidos e
prejudicados na nossa carreira. Decorre também de nossa educação formal,
que nos exige sempre acertar na primeira vez, ignorando o que se passa no
mundo real. No mundo real as coisas são bem diferentes, pois temos de lidar
com incertezas, e o certo e o errado nem sempre são claros. Para crescer,
temos de experimentar, errar às vezes, tentar de novo e aprender com nossos
erros e sucessos. A opção de não arriscar e fazer sempre a mesma coisa é a
opção pela mesmice e mediocridade.

No nível organizacional, há uma batalha permanente entre lucratividade


no curto prazo e crescimento. A lucratividade requer eficiência, processos
estáveis e controlados, padronização e previsibilidade. O crescimento
requer inovação, mudanças nos processos, fuga da rotina e assumir riscos.
A opção pelo crescimento implica certa tolerância a tentativas erradas, pois
a realidade mostra que raramente a inovação nasce de uma única idéia
brilhante. Muitos casos de sucesso são construídos sobre algumas dezenas,
centenas ou mesmo milhares de experimentos fracassados (...) (SIQUEIRA,
2007).
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1. Bloqueios à criatividade
A maioria dos homens de negócio é incapaz de pensar de forma
original. Eles não conseguem escapar da tirania da razão. Sua
imaginação está bloqueada.
DAVID OGILVY

Você viu na Aula 11 que as pesquisas indicam que somos todos criativos.
Então, por que muitas pessoas sentem dificuldades para criar? Para responder
a esta questão, os especialistas têm se dedicado a conhecer e explorar os
bloqueios que nos impedem de criar.

Sem considerar problemas mais profundos de ordem pessoal, todos nós


podemos sofrer três tipos de bloqueio:

1. Autocensura. Nesta categoria, estão as situações vividas ao longo de


nosso processo de educação e socialização, que vão sendo internalizadas
ao longo dos anos. Uma “voz interior” confina nossa criatividade aos limites
que consideramos aceitáveis. Por causa da autocensura, mesmo quando
há um ambiente propício para criar, as pessoas tendem a impedir que sua
imaginação voe livremente.

2. Limitações da percepção humana. Nesta categoria, estão as limitações


próprias do funcionamento do nosso cérebro, que podem nos impedir de
ver o mundo de forma inovadora.

3. Bloqueios externos ou ambientais. Como uma planta, a criatividade


também tem necessidade de um solo fértil para atingir o máximo do seu
potencial. Ambientes muito restritivos podem impedir os indivíduos de
expressar sua criatividade.

2. Autocensura
Veja a Figura 12.1. Nela estão representados alguns dos pensamentos mais
comuns que temos, originados do medo de enfrentarmos novas situações.
Aula 12 – Bloqueios à criatividade :: 33

Ninguém vai ligar


Vão me chamar de
para o que eu digo!
idiota!

Vão pensar que sou


louco! Isso nunca vai
funcionar!

As pessoas vão rir de


mim! É óbvio demais!

Figura 12.1: O medo de enfrentar novas situações nos leva a ter pensamentos que
reprimem as ações.

Um dos livros mais interessantes a respeito do tema foi escrito pelo


americano Roger Von Oech: Um toc na cuca. Von Oech é fundador e presidente
da Creative Think, uma empresa com sede na Califórnia, especializada em
criatividade e inovação. Ele chamou a autocensura de “bloqueios mentais” e
identificou dez deles. Veja a seguir.
Fonte: http://www.sxc.hu/photo/548023
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2.1. A resposta certa

Quando as crianças vão para a escola, são pontos de


interrogação; quando saem, são frases feitas.
NEIL POSTMAN

Segundo Von Oech, quase todo o nosso sistema educacional objetiva


ensinar às pessoas uma única resposta certa. O problema é que a vida geral-
mente não é assim. A vida é ambígua e nela existem muitas respostas para os
problemas que enfrentamos. As respostas que encontramos dependem do
que estamos procurando e de como abordamos o problema.

Geralmente, é da segunda, da terceira ou da décima resposta correta


que precisamos para resolver um problema de maneira inovadora. Uma
maneira de ser mais criativo é procurar outras respostas certas. Existem várias
maneiras de procurar respostas, mas o mais importante é procurar. Em geral,
a idéia criativa está logo adiante.

As respostas que encontramos dependem das perguntas que fazemos.


Brinque com a formulação das perguntas para obter respostas diferentes.

ATIVIDADE

1. Em busca de várias respostas certas


Um cano de metal com uma bola em seu interior está preso no chão de
concreto de um quarto vazio.

15cm
Aula 12 – Bloqueios à criatividade :: 35

O diâmetro do cano é apenas 1,5 cm maior do que o diâmetro da bola de


pingue-pongue que está no fundo.
Você é uma das seis pessoas no quarto, que contém os seguintes objetos:
• 100 metros de linha
• 1 martelo
• 1 serra
• 1 caixa de cereais
• 1 lixa
• 1 varal de arame
• 1 chave inglesa
• 1 lâmpada
Liste as formas que você pode pensar, em 15 minutos, de pegar a bola sem
causar danos ao tubo, ao chão e à bola.

Resposta Comentada
Existem várias soluções para este problema, mas a solução considerada até hoje
mais inovadora é urinar dentro do vaso. Invente a sua e depois debata no fórum.
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Metafórica 2.2. Isso não tem lógica


Relativo a metáfora. A lógica é um importante instrumento de criação. Seu uso é especialmente
Metáfora: transferência adequado na fase do processo criativo, quando uma pessoa está avaliando as
de uma palavra para um idéias e se preparando para colocá-las em prática.
âmbito semântico que
não é o do objeto que ela No entanto, quando se está à procura de idéias, o excesso de raciocínio
designa; sentido figurado; lógico pode atrapalhar o processo de criação. Isso porque o pensamento
translação. criativo é governado por uma lógica de tipo diferente, que pode ser descrita
como metafórica, fantasiosa, difusa, elíptica e ambígua.
Elíptica
A metáfora é um excelente instrumento para ajudar a “pensar em algo
Que tem forma de elipse. diferente”. Saia à caça de metáforas e preste atenção às metáforas que as
Elipse: Lugar geométrico
pessoas usam para descrever o que fazem.
dos pontos de um plano
cujas distâncias a dois
pontos fixos desse plano
têm soma constante;
ATIVIDADE
intersecção de um cone
circular reto com um
2. Em busca de metáforas
plano que faz com o eixo
do cone um ângulo maior a. Pesquise três exemplos de metáforas que falem sobre o sentido da vida
que o do vértice. em formatos diferentes. Exemplos:
• um poema;
• uma música;
• o trecho de um filme;
• uma piada.
Aula 12 – Bloqueios à criatividade :: 37

b. Prepare um texto de até 15 linhas sobre sua vida profissional, usando


apenas metáforas.

2.3. Siga as normas

Todo ato de criação é, antes de tudo, um ato de destruição.


PABLO PICASSO

Estabelecemos normas com base em razões que fazem sentido e seguimos


estas normas. Mas o tempo passa e as coisas mudam. As razões que originalmente
levaram à geração dessas normas podem não existir mais.

O pensamento criativo não é só construtivo. Pode ser destrutivo também.


Freqüentemente, é preciso quebrar um padrão para descobrir outro. Portanto,
seja receptivo à mudança e flexível diante das normas. Lembre-se: violar as
normas não leva necessariamente a idéias criativas, mas é um caminho.

Evite também apaixonar-se pelas idéias. Existem pessoas que se apaixonam


por uma abordagem ou um sistema e se tornam incapazes de ver vantagens
em outras alternativas. Uma das grandes sensações da vida é perder a paixão
por uma idéia querida. Quando isso acontece, você está livre para procurar
novas idéias.
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2.4. Seja prático


À medida que as pessoas envelhecem, ficam prisioneiras do hábito.
Acham que não têm tempo a perder e se limitam ao que é mais prático. Isso
acontece porque abandonamos os jogos de fantasia infantis quando nos
dizem “você precisa crescer”.

É claro que precisamos ser práticos para quase todas as atividades


cotidianas, mas a lógica, que funciona tão bem para julgar e executar idéias,
pode reprimir o processo criativo. Em todos nós existe um juiz e um artista.
A atitude do artista de mente aberta é característica do modo de pensar
da fase germinativa, ou seja, do período em que estamos gerando idéias.
A perspectiva do juiz, que avalia e julga, representa o tipo de pensamento da
fase prática, quando nos preparamos para executar as idéias. É recomendado
evitar pôr em cena o juiz antes de o artista ter realizado sua tarefa. Avaliar
antes da hora pode impedir a criação.

2.5. Evite ambigüidades


Quando dizemos que uma situação é ambígua significa que ela possui
mais de um sentido, mais de uma interpretação.

Ao longo da vida, todos nós aprendemos a evitar ambigüidades por causa


dos problemas de comunicação que elas podem provocar. Em situações
práticas, quando as conseqüências de um mal-entendido seriam graves, isso
é muito importante.

No entanto, quando estamos explorando um problema e buscando


idéias criativas, existe o perigo de a imaginação ser sufocada pelo excesso
de especificidade. Mas como usar a ambigüidade? Se estiver apresentando
a alguém um problema, procure colocá-lo de maneira ambígua, deixando
espaço para novos sentidos e interpretações. Evite ser muito preciso em suas
definições iniciais. Deixe que sua equipe investigue e encontre novas definições
para a situação em questão. Use humor, imagens e diferentes perspectivas
para colocar a si mesmo ou ao seu grupo em estado de espírito criativo.
Aula 12 – Bloqueios à criatividade :: 39

2.6. É proibido errar

Não existe inovação sem que haja experimentação de coisas


novas, e coisas novas têm uma alta taxa de falhas. O truque é
aprender com os erros inevitáveis.
STANFORD  ROBERT SUTTON & JEFFREY PFEFFER

Há ocasiões em que não se pode errar, mas a fase germinativa do


processo de criação não é uma delas. Os erros são um sinal de que estamos
saindo dos trilhos habituais. Se não erramos de vez em quando, é indício de
que não estamos sendo muito inovadores.

Lembre-se de duas vantagens que decorrem dos erros. A primeira é que,


quando falha, você descobre o que não funciona. A segunda é que o fracasso
lhe dá a oportunidade de tentar uma nova abordagem. Se cometer um erro,
trate de usá-lo como ponto de apoio para uma idéia nova que, sem isso, você
não descobriria.

2.7. Brincar é falta de seriedade


Muitas pessoas vêem o trabalho e o prazer como compartimentos
estanques e mutuamente excludentes; para elas, “brincar é falta de seriedade”.
Mas existem dois lados no processo criativo. O lado divertido, que nos possibilita
experimentar várias abordagens e gerar novas idéias. E o lado do trabalho, que
nos permite avaliar as descobertas e dar a elas uma forma utilizável.

Da próxima vez que tiver um problema, brinque com ele. Se não tiver
nenhum problema para resolver, aproveite o tempo brincando. Faça do seu
local de trabalho um espaço divertido.

2.8. Isso não é da minha área


A especialização é um fato da vida. Para funcionar no mundo, você tem
de restringir o foco e limitar seu campo de visão. Quando está procurando
gerar novas idéias, porém, essa maneira de manipular a informação pode
ser limitativa. Ela não só força você a delimitar o problema de forma estreita
como também impede a busca de idéias em outras áreas.

Quanto mais amplo e diversificado for seu conhecimento, mais áreas terá
onde caçar idéias. Procure analogias nas situações. Geralmente, problemas
semelhantes aos seus já foram resolvidos em outras áreas.
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Prestem atenção às idéias novas e interessantes que os outros


usaram com sucesso, e façam disso um hábito. A sua idéia
precisa ser original só na adaptação ao problema que estiver
enfrentando.
THOMAS EDISON

2.9. Não seja bobo


Novas idéias não nascem em ambiente conformista. Sempre que há
reunião de pessoas existe o perigo do “pensamento grupal”. Esse fenômeno
consiste em que os membros do grupo se interessam mais em manter a
aprovação dos outros do que em tentar propor soluções criativas para os
problemas em pauta. A pressão do grupo pode inibir a originalidade e,
conseqüentemente, idéias novas. Quando todo mundo pensa de forma
semelhante, ninguém está se dando o trabalho de pensar muito.

Qualquer pessoa que decida e pense criativamente tem que enfrentar


os problemas do conformismo e do pensamento grupal. Mas como? Uma
idéia é lançar mão da estratégia que os reis da Idade Média utilizavam para
se proteger de conselheiros bajuladores: o bobo da corte. Sua função era
parodiar as propostas em discussão, protegendo o rei do pensamento grupal
e gerando novas idéias.

Niels Bohr, físico dinamarquês, ganhador do prêmio Nobel, disse certa


vez: “Existem coisas tão sérias que você é obrigado a rir delas”. A observação
é pertinente. Tem gente que se liga de tal maneira às suas idéias que chega
a colocá-las num pedestal. É difícil ser objetivo quando se investiu o próprio
ego em uma idéia.

Observe para ver se você ou os outros estão sendo conformistas ou se


estão reprimindo o “bobo”. Pode ser que estejam armando uma situação de
“pensamento grupal”.
Aula 12 – Bloqueios à criatividade :: 41

Curiosidade

Humor como forma de evitar o conformismo no ambiente de


trabalho.

SIM A coisa NÃO


funciona?

Não mexa
SIM
Você mexeu
nela?
Seu idiota NÃO

Alguém SIM SIM Vai estourar


Então você é um
sabe? pobre infeliz na sua
mão?
NÃO NÃO
NÃO
Você pode
Esconda culpar outra Finja que não viu
pessoa?

SIM
Então, não há problema

(autor desconhecido)

2.10. Eu não sou criativo

A maioria das pessoas desiste mais do que fracassa.


HENRY FORD

Um fenômeno que acontece em todos os setores da vida é o da “profecia


que se auto-realiza”. Trata-se de um fenômeno pelo qual a pessoa acredita
ser algo que não é e age com base nessa crença. Em conseqüência da ação, a
previsão se torna realidade. A profecia auto-realizada é uma situação em que
o mundo do pensamento e o mundo da ação se interpenetram.

Multimídia

P ara compreender melhor sobre este tema da “profecia que se auto-realiza”, veja o
filme The secret – O segredo, que conta histórias de pessoas que utilizaram a Lei de
atração” (fenômeno semelhante a profecia que se auto-realiza) e tornaram-se pessoas
bem-sucedidas na vida.
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Os educadores têm prática em profecias auto-realizadas. Há anos, uma


professora de Nova York foi informada de que estava recebendo uma turma
de superdotados, quando, na verdade, a turma era de crianças normais.
O resultado foi que ela se esforçou ao máximo para desenvolver os alunos.
Gastou mais tempo preparando aulas e ficava na classe, depois da aula, para
dar orientações. A turma, por sua vez, correspondeu de forma positiva e
obteve pontos acima da média nos mesmos testes feitos anteriormente e
nos quais havia sido classificada dentro da média. Ao receber tratamento de
superdotados, os alunos se comportaram como tais.

Esse exemplo nos permite reafirmar a idéia de que não existem pessoas
sem criatividade. O que acontece é que as pessoas criativas se acham criativas,
enquanto as menos criativas acham que não são criativas.

Curiosidade

Dicas de Gestão
Você deseja desenvolver seu potencial criativo? Veja as recomendações de empreen-
dedores de sucesso.
• Sair da zona de conforto
• Trabalhar com o que se tem
• Ter atenção aos detalhes
• Cultivar a flexibilidade
• Aprender a confiar
• Aprender com os erros cometidos
• Reinventar-se continuamente
• Despertar os sentidos
• Criar uma comunidade
• Manter a fé no potencial criativo
Aula 12 – Bloqueios à criatividade :: 43

3. Limitações da percepção humana


Shultz (1993) explica o processamento de informações em nosso cérebro
da seguinte forma:

Tendo em vista que o número de sensações em nosso ambiente


é tão maior do que nossa capacidade de processá-las,
selecionamos somente aquelas coisas que percebemos como
sendo importantes e ignoramos aquelas que não o são. Assim,
limitamos nossa faixa de percepção. Para nos ajudar a lidar
com todos os fragmentos de dados, valemo-nos de um sistema
denominado transformação e categorização. Em outras
palavras, transformamos visões, sons e sensações percebidos
em conceitos que são armazenados em nossa memória.(...)
As categorias nos permitem prosseguir na classificação e
armazenamento da informação. (...) Através do processo de
transformação e categorização, somos capazes de armazenar
quantidades relativamente grandes de dados e informações
em nossas mentes, em apenas alguns conceitos e categorias.
O esquema de categorização nos permite operar em nosso
ambiente, com toda sua complexidade.

Fazemos suposições e inferências, avaliamos e tomamos nossas decisões,


considerando os conceitos e categorias descritos por Shultz. Ele descreve
nosso cérebro como uma máquina de fazer relações. Relações que se estabe-
lecem através de uma trama de conceitos e categorias interligados, que se
parece com uma rede.

Novas informações são testadas em relação às categorias estabelecidas,


com o objetivo de que sejam encaixadas nas associações já existentes. Se
não houver conexões anteriores ou categorias formadas, a mente tende a
rejeitar um novo conceito apresentado. A busca pela similaridade com algo
conhecido faz parte do nosso processo de julgamento cognitivo.

Edward de Bono é uma das maiores autoridades mundiais do campo da


criatividade, com mais de 25 anos de trabalho em grandes corporações e
muitos livros escritos sobre o tema. Ele é o criador de algumas das técnicas
mais famosas e usadas, (que veremos detalhadamente nas aulas seguintes),
para estimular o pensamento criativo ou “pensamento lateral”. Para ele, o uso
de exercícios mentais estruturados é necessário porque nosso cérebro está
preso a padrões que nos impedem de inovar.
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3.1. Os padrões do cérebro humano


O cérebro humano possui um sistema no qual as informações que
chegam estabelecem uma seqüência de atividades mentais. Desde a mais
tenra idade, uma pessoa recebe informações. Estas informações chegam
por meio dos cinco sentidos (visão, olfato, tato, paladar e audição) e vão
compondo sua percepção do mundo.

Com o tempo, essa seqüência de atividades mentais passa a ser uma


espécie de “caminho mental” ou “padrão preferido” para o julgamento das
diferentes situações da vida. Os padrões, uma vez estabelecidos no cérebro,
são de grande utilidade, porque permitem o rápido reconhecimento
das coisas. Não precisamos gastar energia analisando cada informação
novamente. Uma vez acionado o padrão, nós o seguimos e vemos as coisas
em termos de nossas experiências anteriores. A percepção é o processo de
estabelecimento e uso desses padrões.

Segundo Edward De Bono, como os rios, os padrões têm grandes áreas de


drenagem. Isso significa que qualquer atividade dentro de uma determinada
Áreas de área de drenagem irá levar ao padrão estabelecido. O resultado é que o
drenagem
cérebro reconhece padrões instantânea e automaticamente.
A área de drenagem
natural de um rio é
composta por seus Curiosidade
afluentes ou córregos: as O cérebro reconhece padrões
chuvas que caem na área
de drenagem sempre
correm na direção do rio
N osso cérebro é capaz de reconhecer padrões e estabelecer relações em apenas
alguns segundos. Faça um teste, tentando ler o texto a seguir.
principal. 3M UM D14 D3 V3R40, 3574V4 N4 PR414, 0853RV4ND0 DU45 CR14NC45 8R1NC4ND0
N4 4R314. 3L45 7R484LH4V4M MU170 C0N57RU1ND0 UM C4573L0 D3 4R314,
C0M 70RR35, P4554R3L45 3 P4554G3NS 1N73RN45. QU4ND0 3575V4M QU453
4C484ND0, V310 UM4 0ND4 3 D357RU1U 7UD0, R3DU21ND0 0 C4573L0 4 UM M0N73
D3 4R314 3 35PUM4.
4CH31 QU3, D3P015 D3 74N70 35F0RC0 3 CU1D4D0, 45 CR14NC45 C41R14M N0 CH0R0,
C0RR3R4M P3L4 PR414, FUG1ND0 D4 4GU4, R1ND0 D3 M405 D4D45 3 C0M3C4R4M 4
C0N57RU1R 0U7R0 C4573L0. C0MPR33ND1 QU3 H4V14 4PR3ND1D0 UM4 GR4ND3
L1C40; G4574M05 MU170 73MP0 D4 N0554 V1D4 C0N57RU1ND0 4LGUM4 C0154
3 M415 C3D0 0U M415 74RD3, UM4 0ND4 P0D3R4 V1R 3 D357RU1R 7UD0 0 QU3
L3V4M05 74N70 73MP0 P4R4 C0N57RU1R. M45 QU4ND0 1550 4C0N73C3R 50M3N73
4QU3L3 QU3 73M 45 M405 D3 4LGU3M P4R4 53GUR4R, 53R4 C4P42 D3 50RR1R!! S0
0 QU3 P3RM4N3C3 3 4 4M124D3, 0 4M0R 3 C4R1NH0. 0 R3570 3 F3170 4R314.
AUTOR DESCONHECIDO
Aula 12 – Bloqueios à criatividade :: 45

Portanto, para qualquer lado que olhemos vemos o mundo a partir dos
nossos padrões preexistentes. É isso que torna a percepção tão poderosa e
útil. Raramente estamos perdidos. Podemos reconhecer e solucionar a maior
parte das situações cotidianas.

Mas é por isso que a simples análise de informações dificilmente produz


novas idéias. O cérebro somente pode ver aquilo que está preparado para
ver. Há um caminho dominante do pensamento que se, por um lado, nos
ajuda a transitar em um mundo repleto de estímulos e informações, por
outro, torna difícil a tarefa de estabelecer novas conexões mentais e de ver
situações antigas de forma inovadora.

Para estimular nosso potencial criativo, precisamos fugir, mesmo que


momentaneamente, destes padrões estabelecidos em nossa mente, estimu-
lando novas conexões mentais – ou caminhos laterais de pensamento, como
definiu De Bono. Este é o principal objetivo das técnicas de estímulo do
pensamento criativo.

É preciso investir tempo, esforço e foco para encontrar uma nova idéia.
Uma pessoa motivada para criar deve fazer uma pausa, focalizar um deter-
minado objetivo e praticar o pensamento criativo.

Somos o que fazemos repetidamente. Excelência, então, não é


um ato, é um hábito.
ARISTÓTELES
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Curiosidade

A percepção pode ser enganada

S e você confia cegamente em seus sentidos, cuidado! Nossa percepção pode ser
iludida e manipulada. Veja, a seguir, alguns exemplos de ilusões óticas.

Autor: Akiyoshi Kitaoka (2003) –


Fonte: http://www.psy.ritsumei.ac.jp/~akitaoka/

Os círculos parecem mover-se.

Autor: Elke Lingelbach, do Instituto Augenoptik Aalen, da


Alemanha. Fez uma modificação na ilusão chamada Hermann
Grid, de data de 1870.

Fonte: http://www.grand-illusions.com/opticalillusions

Quantos pontos pretos há na figura acima?


Aula 12 – Bloqueios à criatividade :: 47

Autor desconhecido.
Por causa de um efeito de contexto, os círculos centrais parecem ter diferentes
tamanhos, mas são exatamente iguais!

Autor desconhecido.

Apesar de serem paralelas, as linhas da figura parecem estar completamente


tortas!
Autor: Octavio Ocampo.

Fonte: http://www.grand-illusions.com/opticalillusions

Quantas figuras vivas você consegue encontrar na figura acima?


48 :: Criatividade e Atitude Empreendedora :: Sandra R.H. Mariano / Verônica Feder Mayer

Fonte: http://www.grand-illusions.com/opticalillusions/woman/

Você vê a velha ou a jovem?

Esta imagem, intitulada “Minha mulher e minha sogra”, foi publicada em 1915 pelo
cartunista W.E. Hill. Even

Fonte: http://www.grand-illusions.com/opticalillusions/queens_speech/

Um cálice? Ou duas pessoas se olhando?

Esta famosa ilustração foi criada pelo psicólogo Edgar Rubin


Aula 12 – Bloqueios à criatividade :: 49

4. Bloqueios externos ou ambientais


Os autores do livro Criatividade e Marketing, Roberto Duailibi e Harry
Simonsen Jr., também sugeriram uma série de bloqueios que estão presentes
no ambiente empresarial. Veja a seguir:

1. A pressão para conformar-se. Quando novas idéias são sempre recebidas


com temor e desconfiança; é o status quo auto-indulgente.

2. Atitudes e meio excessivamente autoritários. Identificável principal-


mente na frase atribuída a Ruben Berta, ex-presidente da Varig: “Nesta
companhia há sempre três opiniões: a errada, a certa e a minha”.

3. Medo do ridículo. Quando o executivo se recusa a correr riscos por temer


à opinião de seus colegas, concorrentes ou de seus subordinados.

4. Intolerância para com as atitudes mais joviais. Empresas que exigem


uma atitude séria e compenetrada de seu pessoal, mesmo quando
há razões para alegria. Um famoso banqueiro brasileiro, por exemplo,
chegou a proibir a entrada de gente com barba ou cabelos compridos
nas dependências de seu banco.

5. Excesso de ênfase nas recompensas e no sucesso imediatos.

6. A busca excessiva de certeza.

7. Hostilidade para com a personalidade divergente.

8. Falta de tempo para pensar. Há empresas que sobrecarregam seus


executivos de tal forma e por tão longos períodos, que não lhes sobra
tempo para dedicar-se a soluções novas ou mesmo para enunciar novos
problemas.
50 :: Criatividade e Atitude Empreendedora :: Sandra R.H. Mariano / Verônica Feder Mayer

9. Rigidez da organização. É chamada “prisão do organograma”: em geral,


é o caso de empresas superestruturadas, cheias de manuais de procedi-
mento, que carecem do ambiente estimulante para a criatividade.

Curiosidade

Resistência à inovação

U m importante obstáculo que muitos empreendedores enfrentam é a resistência ao


que é novo e diferente.
Antes de abrir a Amazon.com, Jeff Bezos passou um mês pesquisando novos produtos
e mercados para uma importante empresa do mercado financeiro em Nova York. Após
intensa pesquisa, propôs que deveriam abrir, em Seatle, uma livraria virtual para vender
livros via internet. Como seu chefe não achou um bom negócio, Bezos pediu demissão
e abriu a Amazon.com utilizando suas economias e as de alguns familiares. A Amazon
é hoje o maior caso de sucesso de comércio eletrônico e, Bezos, um dos homens mais
ricos dos Estados Unidos.
Na década de 1990, uma escritora do Reino Unido, com sérios problemas financeiros,
criou um mundo imaginário e sem o “cor de rosa” dos contos de fadas tradicionais.
A história de um menino órfão que vivia num lugar sombrio, onde crianças e jovens
não eram poupados da crueldade e do sofrimento, era longa e sem final feliz. A autora
escolheu um caminho difícil, considerando-se que o livro era voltado para o público
infanto-juvenil.
Mesmo contendo ingredientes como magia, ação e esportes radicais, o livro foi mal
recebido pelos executivos das grandes editoras britânicas. Depois de muitas recusas
(algumas fontes dizem que oito editoras recusaram o livro, outras falam em doze
editoras), os originais chegaram à Editora Bloomsbury, e Barry Cunningham decidiu
publicar o livro, que foi finalmente lançado em 1997.
Estamos falando de Joanne Kathleen Rowling, a autora da série de livros mais vendida
do mundo: Harry Potter. Hoje, J. K. Rowling é a mulher mais rica e poderosa da
Inglaterra, segundo a revista Forbes. Sua fortuna pessoal é estimada em mais de 1
bilhão de dólares.
A idéia de Harry Potter surgiu inesperadamente na mente de J.K. Rowling durante uma
viagem de trem. Os primeiros manuscritos foram rabiscados em papel barato, e escrever
o livro ajudava Joanne a passar o tempo, numa época em que sofria de depressão. Ela
diz que nunca esperou sustentar-se escrevendo livros, mas só o fato de ter seu livro
publicado de verdade já seria um sonho de infância realizado.
Aula 12 – Bloqueios à criatividade :: 51

Frases famosas sobre a resistência à inovação 2


“A teoria dos germes de Louis Pasteur é uma ridícula ficção.” (Pierre Pochet, professor de
Fisiologia em Toulouse, 1872)
“Quando a exposição de Paris se encerrar, ninguém mais ouvirá falar de luz elétrica.”
(Erasmos Wilson, Universidade de Oxford, 1879)
“O cinema será encarado por algum tempo como uma curiosidade científica, mas não
tem futuro comercial.” (Auguste Lumiére,1895, a respeito do próprio invento)
“A televisão não dará certo. As pessoas terão que ficar olhando sua tela, e a família
americana não tem tempo para isso.” (The New York Times, 1939, na apresentação do
protótipo de um aparelho de TV)
“Recuso-me a acreditar que um submarino faça outra coisa além de afundar no mar e
asfixiar sua tripulação.” (H.G. Wells, escritor inglês, 1902)
“O avião é um invento interessante, mas não vejo nele qualquer utilidade militar.”
(Marechal Ferdinand Foch, titular de estratégia na Escola Superior de Guerra da França,
1911)
“Até julho, sai de moda.” (Revista Variety, a propósito do rock’n’roll, março de 1956)
“O Raio-X é uma mistificação.” (Lord Kelvin, físico presidente da British Royal Society of
Science, 1900) (
Fonte: DUAILIBI, 1990.

ATIVIDADE

3. Fórum na web
Discuta com seus colegas no fórum, depois de conhecer os 3 tipos
de bloqueio à criatividade, quais são os bloqueios que limitam a sua
criatividade?
52 :: Criatividade e Atitude Empreendedora :: Sandra R.H. Mariano / Verônica Feder Mayer

Retomando...

C omo vimos, somos todos criativos, mas há muitos bloqueios que


nos impedem de criar. Resgatar uma visão inocente e mudar alguns
hábitos pode ser de grande ajuda para resgatarmos nosso potencial criativo. Mas o
primeiro passo é acreditar que a criatividade está em você.

Referências Bibliográficas
CAMERON, Julia. Criatividade: a mina de ouro. Rio de Janeiro: Ediouro, 1998.

COLEMAN, Daniel.; KAUFMAN, P.; RAY, M. O espírito criativo. São Paulo: Cultrix – Amana
Key, 2001.

DE BONO, Edward. Criatividade levada a sério. São Paulo: Pioneira, 1994.

______. Novas estratégias de pensamento. São Paulo: Nobel, 2000.

DE MASI, Domenico. Criatividade e grupos criativos. Rio de Janeiro: Sextante, 2003.

DUAILIBI, Roberto; SIMONSEN JR, Harry. Criatividade & marketing. São Paulo: McGraw-
Hill, 1990.

EXLEY, Helen. Negócios: as melhores reflexões. Rio de Janeiro: Ediouro, 1996.

GOLDMAN, Robert; KLATZ, Ronald; BERGER, Lisa. A saúde do cérebro. 2.ed. Rio de
Janeiro: Campus, 1999.

OECH, Roger Von. Um toc na cuca: técnicas para quem quer ter mais criatividade na
vida. São Paulo: Livraria Cultura Editora, 1988.

SCHULTZ, D.E.; Tannenbaum, S.I.; Lauterborn, R. Integrated Marketing Communications:


Pulling It Together & Making It Work, Lincolnwood (Chicago), IL: NTC Business Books,
1993. Chapter: 2., p.17-40.

SIQUEIRA, Jairo. Criatividade e Inovação. Disponível em: <http://criatividadeapli-


cada.com/>. Acesso em: 15 dez. 2007.

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