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A
Leia com ateno o poema Sou um evadido, de Fernando Pessoa.
5 Se a gente se cansa
Do mesmo lugar,
Do mesmo ser
Por que no se cansar?
Ser um cadeia,
Ser eu no ser.
15
Viverei fugindo
Mas vivo a valer.
Fernando Pessoa,
Poesias inditas (1930-1935),
Lisboa, tica, 1955.
GRUPO I
A
4. No primeiro verso do poema, existe a metfora Sou um evadido. Com este recurso
expressivo, o sujeito potico faz uma autodescrio em que a sua identidade surge
fragmentada, desligada de um centro agregador. De facto, encontramos, ao longo
do poema, palavras e expresses que remetem para a ideia de fuga (ando a
monte, v. 10; cadeia, v. 13), uma vez que o sujeito se define como algum cuja
identidade ou essncia a procura, a indagao, ou seja, a recusa de uma identidade
fixa e determinada, surgindo a evaso como uma forma de escapar a essa conceo
de identidade.
5. A interrogao retrica presente na segunda estrofe do poema sintetiza um
argumento contra a ideia de uma identidade fixa e determinada. Por outras palavras,
o sujeito potico pretende justificar a sua existncia de evadido, sugerindo que o
cansao tambm se aplica a uma identidade una e inseparvel. Assim, estabelece
uma analogia entre o tdio de estarmos sempre no mesmo stio e o cansao de
sermos sempre o mesmo ser.
6. O eu potico define-se como um evadido, algum que pretende fugir priso que
constitui o seu prprio ser entendido como unidade: Ser um cadeia (v. 13).
Assim, define a sua prpria existncia como uma procura contnua, uma fuga
identidade unitria. A esta luz, o eu o resultado de um processo inacabado, sem
limites definidos, ou seja, aquilo que somos enquanto pessoas deixa de estar
confinado a descries claras e imutveis, e existir viver aquele processo.