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Metais pesados poluem rios em Patamares.

Caco Caetano

As obras que o Governo do Estado e a Prefeitura de Salvador realizam nos rios


do complexo Jaguaribe e Passa Vaca, visando suas canalizações e
concretagem dos leitos, na Orla Atlântica de Salvador, não informam que as
águas do rio Passa Vaca, onde sobrevive o último remanescente de manguezal
no perímetro urbano de Salvador, estão contaminadas por metais pesados,
registrando a presença de Ferro, Zinco e Cobre, entre outras substâncias
nocivas à saúde da população. Não há qualquer sinalização no acesso ao
manguezal informando sobre o assunto e os catadores de crustáceos
continuam retirando do local exemplares do Guaiamum para alimentação e
comercialização para a população.

Tratam-se de pessoas de classe social mais baixa, residentes em bairros


populares, que buscam na lama do manguezal de Patamares e nas suas
árvores características, o mangue vermelho (Rhizophora Mangle L.) e o
mangue branco (Lagunculária Racemosa L. Gaertn), exemplares desses
crustáceos como fonte de alimento, sem ter noção de que os metais pesados
presentes no manguezal podem causar danos à saúde. Esses catadores
recorrem a armadilhas rusticas, improvisadas em madeira, que prendem os
crustáceos, no mesmo estilo das ratoeiras.

Um dos casos recentes de catador de Guaiamum atuando no local foi


registrado pelo jornal A Tarde, em sua edição de 2 de maio passado, com a
reportagem “Crustáceo com risco de extinção, Guaiamum ainda resiste em
Patamares”, do jornalista Franco Adailton, com fotos de Raul Spinassé, da
Agência A Tarde, quando Florisvaldo Pereira, de 34 anos, afirmou que armava
essas “ratoeiras” para caçar o crustáceo e retirar do manguezal o sustento de
sua família. Pai de 4 filhos ele afirmou que vende a dúzia dos crustáceos por
40 reais. Florisvaldo não evidenciou ter a menor noção de que o manguezal
está contaminado com metais pesados e que essa contaminação pode chegar
ao alimento que consome e comercializa.

Nunca houve, por parte das chamadas autoridades, qualquer alerta em


relação à presença desses metais pesados nas águas de Patamares, por parte
tanto do poder público municipal como estadual, em especial por parte do
INEMA, Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos, responsável por
coordenar, executar, acompanhar, monitorar e avaliar a qualidade ambiental e
de recursos hídricos, conforme a Lei n° 12.212/2011. Na maioria das vezes são
divulgados dados relativos à presença de coliformes fecais nas águas das
praias, indicando se elas estão próprias ou impróprias para banho. No caso da
praia de Patamares, no trecho onde desaguam os rios Passa Vaca e
Jaguaribe, são sempre consideradas impróprias para banho, segundo esse
critério da presença de coliformes fecais.

Mas, e a presença dos metais pesados como Ferro, Zinco e Cobre, entre
outros? O INEMA não fala sobre isso. Esses metais foram identificados no rio
Passa Vaca e no manguezal pela pesquisadora da UFBA, Universidade
Federal da Bahia, Consuelo Lima Navarro de Andrade, em sua pesquisa
apresentada ao mestrado do Programa de Pós-Graduação em Geoquímica, do
Instituto de Geociências, em 2011, mesmo ano em que entrou em vigor a Lei
12.212, que encarregou o INEMA de monitorar os recursos hídricos.

A impressão que fica é que as pesquisas científicas desenvolvidas pela


academia são ignoradas pelo poder público ao planejar as intervenções
urbanas que faz. Nesse caso, a extinção do manguezal do rio Passa Vaca com
a canalização do rio, bem como com a obra de macrodrenagem e canalização
do rio Jaguaribe, irão aumentar o fluxo de poluentes para as praias de
Jaguaribe e Patamares, tornando-as similares ao trecho da Pituba/Jardim de
Alah, onde desagua o rio Camurugipe. E os metais pesados serão levados
pelas águas para as praias, que já estão contaminadas com coliformes fecais.

Consuelo Andrade fala claramente em sua pesquisa que as concentrações de


Cobre nas análises feitas foram consideradas altas e “próximas da linha de
risco para os seres vivos”. A pesquisadora destaca os efeitos nocivos da
poluição do rio e, consequentemente do manguezal, salientando que “o
lançamento de esgotos domésticos, com ou sem tratamento prévio, em
ambientes aquáticos afeta a qualidade da água do sistema receptor,
provocando redução do oxigênio dissolvido, aumento da turbidez, mudanças do
pH, entre outros efeitos, e tem reflexos sobre a manutenção das condições
ideais para a sobrevivência dos organismos e sobre a saúde humana”.

“De um modo geral, elementos metálicos avaliados apresentam significativa


correlação entre si”, citando como exemplo as “concentrações dos elementos
metálicos, Fe, Zn, Cu e Mn nos sedimentos do manguezal de Passa Vaca”,
destacando que há um aumento das concentrações desses elementos nos
trechos próximos à desembocadura de tubulações de esgotos domésticos,
além de pontos que também apresentaram picos de poluição, “localizados na
parte superior do estuário onde se encontram tubulações metálicas de água
com vazamento constante”.

Consuelo explica em sua pesquisa que as concentrações de Cobre, no caso do


Passa Vaca, são mais altas que todas as encontradas em ocorrências nos
manguezais da Baía de Santos, Estuário de São Vicente e Estuário de Santos,
em São Paulo. E que as ocorrências de Ferro, na área do manguezal de
Patamares, foram mais altas do que as encontradas em Cananéia, também
em São Paulo. Ela salienta que a concentração média de Cobre no Passa Vaca
“está próxima da linha de risco para os seres vivos”, segundo a literatura
especializada.

Os dados da pesquisa de Consuelo são de 2011, seis anos atrás. De lá para cá


a situação só se agravou pela falta de qualquer iniciativa de saneamento na
área. Consuelo explica que as plantas de manguezal absorvem parte desses
metais pesados como nutrientes, que podem ser encontrados em suas folhas,
o que indica que a vegetação de manguezal, no caso o mangue vermelho e o
mangue branco, funcionam como uma barreira eficiente para impedir que
esses metais sejam levados para a zona costeira. A extinção do manguezal do
Passa Vaca, portanto, pode facilitar a chegada de metais pesados nas praias
daquela região.

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