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Doutrina Política - Social-Democracia - Completo PDF
Doutrina Política - Social-Democracia - Completo PDF
Introdução
Módulo I - Social-Democracia
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A construção da social-democracia
Qual a relevância do fenômeno social-democrata? Em primeiro lugar,
independentemente de suas limitações e falhas, a social-democracia parece
ser a forma predominante de organização política dos trabalhadores em
condições de capitalismo democrático. Se o caminho da insurreição é excluído,
seja por inviável, seja por não conduzir ao socialismo, a via social-democrata
surge como alternativa natural aos que perseguem os objetivos socialistas.
Críticas são necessárias, nessa perspectiva, basicamente como meio de
correção e ajuste de rumos e políticas específicas, dado que o caminho geral,
por exclusão, estaria afirmado. Apenas "corrigindo" a experiência social-
democrata poderíamos chegar ao socialismo.
A própria ideia de analisar erros cometidos para aperfeiçoar as decisões
posteriores implica uma concepção de história e política ausente em outras
manifestações do pensamento socialista. Supõe a existência de condições
objetivas que delimitam uma gama de opções possíveis, assim como a vontade
livre, no interior dessa gama, de um operador político. Aceitar apenas a
objetividade implica recusar a possibilidade de erros: a história leva
necessariamente ao socialismo. Aceitar apenas a vontade, atitude comum nas
diferentes correntes políticas que afirmam o "amadurecimento" completo das
condições objetivas, implica dizer que a mudança não se realiza pela ausência
de intenção de líderes e partidos políticos; não se realiza pela "traição",
portanto. Traição é, segundo o autor, a forma consequente de ver a estratégia
social-democrata em um mundo livre de restrições objetivas.
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Na verdade, a social-democracia consiste num conjunto de escolhas políticas
feitas em momentos cruciais. Outras opções eram possíveis e foram seguidas
pelos "insurrecionalistas" de todos os matizes. Essas escolhas foram:
Primeira – promover o avanço do socialismo no interior do quadro das
instituições políticas e sociais capitalistas;
Segunda – dirigir-se a um conjunto de classes sociais e não só aos operários
como agentes da mudança; e
Terceira – dedicar-se à luta pelas reformas parciais do sistema, de interesse
imediato das classes trabalhadoras.
Esse leque de escolhas exclui, evidentemente, a chamada "ação direta", como
forma única ou preferencial de luta, recusa o monopólio dos operários da
condição de agentes da mudança e nega o caminho que se resume a preparar
um momento singular de ruptura do sistema, como a insurreição ou a "greve
geral revolucionária".
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A decisão mais importante que precede historicamente às demais é a
participação. Não se tratava de uma decisão óbvia, até porque o direito de voto
permaneceu limitado, por muito tempo, segundo critérios de renda e
propriedade. No quadro das democracias liberais de então, os operários não
votavam, e toda sua manifestação política, até aquelas que reivindicavam o
direito de voto, extravasava as instituições estabelecidas e constituía forma de
ação direta.
A questão se põe com ênfase para o movimento no instante em que se
dissipam as ilusões de uma mudança feita por fora da política, à maneira dos
socialistas utópicos, a partir de colônias ou quistos socialistas que por simples
efeito-demonstração se difundiriam, acabando por tomar conta do corpo
capitalista. Desde esse momento, é necessário optar: ou se recusa a
participação e se combatem as instituições, ou o voto é aceito como mais uma
arma do arsenal dos trabalhadores.unid1pag4
A questão subjacente, de forma alguma trivial, é se a burguesia respeitaria o
resultado de um processo democrático que contrariasse seus interesses vitais.
À vitória eleitoral socialista seguir-se-ia o golpe da reação? A dúvida perdurou
por décadas, uma vez que em 1926, após seis décadas de debate, os social-
democratas austríacos ainda se sentiam no dever de alertar que respeitariam a
ordem constitucional, mas que a reação golpista da direita, caso ocorresse,
seria reprimida de forma ditatorial.
Clique aqui, e leia sobre a importância do voto.
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De qualquer maneira, no que respeita a essa questão, os anarquistas
posicionaram-se de imediato contra sua participação. A seu ver, a miragem das
eleições domesticaria o movimento dos trabalhadores, levando-o a abandonar
seu propósito revolucionário.
A linhagem alternativa, que deu origem a socialistas e comunistas, optou pela
participação. No início, sem muita expectativa: eleições eram vistas como
terreno propício à propaganda e ao recrutamento de novos militantes; ou, no
máximo, como indicador do ânimo dos trabalhadores para encarar a
insurreição.
No entanto, a participação é mecanismo dotado de lógica própria, que não
permite meio termo. No início, os socialistas participavam apenas das eleições;
não faziam acordos relativos ao segundo turno ou à partilha de cargos das
mesas dos parlamentos. Participar em governos de coalizão sequer era
cogitado. Aos poucos, a consciência de que as regras do jogo constitucional
deveriam ser aceitas ou recusadas na íntegra levou-os a fechar acordos,
participar das mesas e, em 1924, a assumir o governo na Grã-Bretanha.
Mesmo então, esse passo foi polêmico e teve que ser justificado com o
argumento da experiência a se ganhar, necessária a um futuro governo
suficientemente majoritário, capaz de implementar o programa de mudanças.
Clique aqui, e saiba mais sobre os anarquistas.
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Na verdade, à medida que a pura abstenção política e a participação restrita se
revelavam inviáveis, os trabalhadores começaram a valer-se da estrutura
partidária social-democrata para atender a seus interesses particulares de
classe. Afinal, no capitalismo, os capitalistas participam diretamente das
decisões relativas à economia, particularmente no que se refere à alocação
produtiva do lucro e à distribuição do excedente entre salários e lucros. Nessas
questões, "votam" todos os dias, produzindo tendências que revelam os efeitos
combinados do conjunto das decisões individuais.
Já os trabalhadores, impossibilitados de atingir seus objetivos de forma direta
no mercado, devem recorrer a instituições como sindicatos e partidos. Sendo
assim, a democracia política e o sufrágio universal passam a ser tratados pelo
movimento operário como corretores das disparidades distributivas que o
mercado propicia.
Durante alguns anos conviveram ambas as táticas, a institucional e a ação
considerada direta. Sem dúvida, contribuiu para a predominância da primeira
opção o fato de as greves gerais deflagradas para a obtenção dos direitos
políticos, o sufrágio universal masculino, haverem sido vitoriosas onde
ocorreram, como na Bélgica e na Suécia. Ao mesmo tempo, todas as greves
gerais desencadeadas com objetivos econômicos, com potencial para evoluir
para uma situação de "greve geral revolucionária", entre o final do século XIX e
as primeiras décadas do século XX, foram derrotadas, com perdas duradouras
para o movimento operário.
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Nas palavras de Kautsky, teórico e dirigente da social-democracia alemã, a
própria luta econômica requer direitos políticos e “estes não caem do céu”. Ou
seja, a participação era necessária. Tornava-se necessário ao partido organizar
os trabalhadores como classe, ou seja, organizá-los para votar como
trabalhadores.
A opção pela participação envolvia riscos. O consentimento dos trabalhadores
às instituições políticas do capitalismo poderia levar a seu fim ou apenas
contribuiria para reforçá-lo? Um claro antagonismo era percebido entre os
objetivos estratégicos e táticos do movimento: a superação do capitalismo
exigia um forte movimento de massas, mas um movimento de massas, por sua
vez, exigia atenção e prioridade para reivindicações menores e mais prosaicas,
ligadas ao cotidiano do trabalhador.
Outros complicadores apresentavam-se ao movimento social-democrata,
segundo o autor. O voto coloca o eleitor na sua condição de indivíduo, sendo
uma prática política que tende, portanto, a obscurecer o caráter de classe da
ação política. O próprio instituto da representação constituía problema na
tradição do movimento, problema que a democracia de conselhos ou comunas
tendia a controlar com a eventual demissão de representantes e com o
mandato imperativo. Mesmo o surgimento espontâneo desse tipo de
democracia nas insurreições operárias conhecidas comprova a relação tensa
entre o movimento e o instituto da representação.
Por outro lado, participar regularmente em eleições implicava, como ainda
implica, construir uma máquina partidária eficiente, com uma burocracia forte
que inevitavelmente passa a preponderar nas decisões partidárias, levando o
movimento a uma tendência de aburguesamento. Além disso, a opção eleitoral
tem como consequência lógica o abandono dos instrumentos característicos da
ação direta. A continuidade do seu uso provoca a desconfiança e rejeição do
eleitor, além de fazer pesar a suspeita de oportunismo: “voto quando somos
maioria, insurreição quando somos minoria”.
Finalmente, o recurso continuado aos instrumentos da democracia fortaleceu a
tendência no movimento a considerar o socialismo a sequência lógica da
democracia, sua simples extensão para os planos econômico e social. A
democracia passa então do status de instrumento de luta, de meio, para a
consecução de um determinado fim, o socialismo, para o de um valor a ser
preservado e ampliado na nova sociedade. A revolução operária não eliminaria
a obra da Revolução Francesa, mas a terminaria.
É preciso assinalar a presença de um elemento de cálculo estratégico na
adesão do movimento operário às regras do jogo eleitorais. Conforme a
ortodoxia marxista, os operários viriam a constituir a maioria da população, em
todos os países capitalistas. Afinal, para expandir-se, obedecendo a sua lógica
imanente, o capitalismo precisava de um número crescente de operários. O
sistema criava seus próprios coveiros, na conhecida expressão de Marx.
Assim, cedo ou tarde chegaria o momento em que os partidos operários
representariam a maioria da população e contariam com a grande maioria dos
votos.
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Nessa perspectiva, a questão da insurreição perde sentido, dado que o
movimento encontrava-se fadado a tomar o poder pelo voto, em condições de
sufrágio universal. Essa interpretação encontra fundamento até em algumas
passagens de Engels, que afirmam a república democrática como a forma por
excelência da ditadura do proletariado.
Os dados pareceram indicar durante muito tempo o acerto dessas previsões.
Retirados da ilegalidade e conseguido o sufrágio universal, todos os partidos
socialistas europeus viram sua votação crescer exponencialmente, entre o fim
do século XIX e a segunda década do século XX. Entre 1905 e 1925, uma boa
parte deles alcançou seu auge eleitoral, uma maioria relativa situada em torno
dos 40% dos votos.
Até esse momento, convém lembrar, esses partidos dirigiam-se prioritária ou
mesmo exclusivamente à classe operária. No Partido Trabalhista Britânico, até
mesmo a filiação individual de um membro de outra classe foi vetada pelos
sindicatos até 1918.
Havia razões de ordem teórica para essa opção. Para Marx, a centralidade dos
operários, na condição de atores políticos da mudança, devia-se a duas
razões: sua condição de classe explorada no regime, diretamente interessada
em sua superação; e sua capacidade, única fora da burguesia, de organizar a
produção.
No entanto, havia também razões de ordem prática ao menos tão importantes
quanto as teóricas.
Em primeiro lugar, a competição econômica campeava entre os operários,
assim como entre os capitalistas, e sua superação era condição indispensável
ao aumento da eficiência do conflito contra a classe capitalista. Daí a
necessidade de organizar um partido político identificado com a classe que
demandasse o voto do trabalhador na condição de trabalhador.
Em segundo lugar, a ausência de um partido desse tipo facilitaria, na
sociedade burguesa, a integração dos operários como indivíduos, votando
conforme demandas de outra ordem – regionais, religiosas, ou outra qualquer.
Por isso era importante demarcar a classe operária da “massa reacionária”
constituída pelas demais classes.
Finalmente, o partido voltado para a classe era necessário para superar o viés
imediatista e antipolítico dos trabalhadores, sempre interessados no confronto
direto com o seu empregador, mas desconfiados do mundo da política.
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No entanto, essa concentração classista dos partidos operários teve que ser
alterada por imposição do processo eleitoral. Com efeito, a classe operária,
contrariamente às previsões de Marx, jamais chegou a constituir a maioria
estável da população em qualquer país capitalista. Após seu momento de
auge, quando, como vimos, se aproxima da metade da população total, perto
da passagem do século, a participação dos operários, no sentido clássico do
termo, na população cai constantemente. Em 1968 representavam 25% da
população francesa; em 1971, 20% da população belga, para ficar apenas em
dois exemplos expressivos.
A economia havia mudado. O crescimento, não antecipado pela teoria, do setor
de serviços demandava cada vez mais trabalhadores. A nova legislação,
resultado do empenho dos socialistas, fazia aumentar também a importância
de estudantes e aposentados na população total. Em suma, a previsão de Marx
de uma sociedade no rumo da simplificação da estrutura de classes, com uma
burguesia cada vez menor e mais rica, confrontada com uma massa operária
majoritária e empobrecida, não se verificara.
A nova situação deixou aos partidos social-democratas uma alternativa difícil.
De um lado, era possível preservar a homogeneidade social, a pureza de
classe, o que implicava resignar-se à condição de minoria eleitoral. De outro
lado, também era possível ultrapassar os limites da classe operária e dirigir o
apelo político e eleitoral do partido a outras classes e camadas da população,
percebidas como aliadas conjunturais dos operários. A soma dos votos
tradicionais dos socialistas com os dos aliados de classe permitia pensar na
maioria nas eleições.
É preciso assinalar que esta última alternativa não implica necessariamente, ao
menos na percepção de dirigentes e militantes da época, o abandono dos
objetivos finais do movimento. Significava apenas reconhecer que, ao contrário
da assertiva de Marx, a emancipação dos trabalhadores não seria obra
exclusiva dos próprios trabalhadores.
De fato, à medida que a progressão eleitoral dos partidos social-democratas
estagnava, a opção pelo pluriclassismo se impôs. Os partidos passaram a
dirigir-se ao povo, às classes populares, focalizando sua crítica num pequeno
número de grandes capitalistas e especuladores. Os limites da categoria povo
eram amplos o suficiente para abarcar perto de 90% da população desses
países.
A social-democracia nunca chegou a percentuais similares de votos. Sua
estratégia atraiu parte dos membros das classes populares, mas não todos.
Paralelamente, parece haver-se estabelecido um círculo vicioso entre o apelo à
classe e o apelo ao povo. Quanto mais os partidos modificavam seus discursos
para atrair o voto de camponeses, trabalhadores de colarinho branco,
funcionários públicos, intelectuais, maior a perda de seus votos operários
tradicionais. No que parece ter sido um dos pontos culminantes do processo, a
eleição britânica de 1979, 50% dos operários votaram nos conservadores.
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A busca da maioria encontrava-se, aparentemente, bloqueada nas duas
alternativas eleitorais. A opção classista estava condenada à maioria, dado que
a classe operária tendia a perder participação na população total. A opção
popular, por sua vez, produzia uma perda de votos antigos que
contrabalançava a conquista dos novos.
Mas quais as razões desse fenômeno?
A primeira e mais evidente razão é a concentração em objetivos comuns aos
operários e outros integrantes da coalizão. A política popular dirige-se aos
interesses da maioria do povo: operários são contemplados, não na sua
especificidade de classe, mas como cidadãos de baixa renda, usuários dos
serviços públicos, consumidores e contribuintes, por exemplo. Os interesses
próprios dos trabalhadores passam a um segundo plano.
Há uma segunda razão, de caráter menos imediato. O discurso da opção
popular interpela os eleitores como indivíduos, solicita sua escolha numa arena
política neutra, voltada para o bem comum. Esse tipo de apelo enfraquece a
identidade de classe e libera os operários a votar conforme as exigências de
outros princípios, como região, religião e outros.
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Essas questões, no entanto, não foram antecipadas pelas lideranças que
encaminharam os partidos social-democratas ao rumo do bloco de classes.
Para eles, permanecia a validade do objetivo final do movimento: a abolição da
propriedade privada, fonte da irracionalidade e da injustiça presentes na
sociedade capitalista. Para eles, a luta por objetivos específicos, de interesse
das classes populares, não constituía desvio em relação a essa meta, mas a
construção do caminho que levaria a ela. O socialismo como etapa seguinte ao
capitalismo era visto como inevitável, e os ganhos do movimento, de fundo
popular ou operário, eram irreversíveis e acumulativos. Na expressão de
Jaurès, líder do socialismo francês, a transição para a nova sociedade poderia
ser comparada à passagem de um navio pela linha do Equador: lenta,
inexorável e imperceptível.
A seguir, examinaremos a feição que a social democracia adotou a partir da
década de 1930.
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Duas razões estariam na origem dessa omissão.
A primeira razão, uma ambiguidade conceitual quanto ao que fazer.
Nacionalizar, ou seja, passar o controle para o Estado, ou socializar,
entregando a empresa à gestão dos trabalhadores que operam aquela unidade
particular de produção? Os partidos dividiram-se nessa questão, alguns
enfatizando mais o aspecto planificador da propriedade estatal e outros o
componente autogestionário. Aos olhos dos socialistas, contudo, essa última
alternativa não poderia ser vista como definitiva, pois solucionava apenas a
contradição interna à empresa, entre capitalistas e operários, mas não o
conflito entre aquela unidade e o conjunto dos consumidores.
A segunda razão encontra-se no fato de os socialistas haverem assumido o
governo na condição de minoria ou na liderança de uma coalizão com outros
partidos, contrários à política de nacionalização. Nessa situação, impõe-se a
escolha entre dois caminhos. O primeiro é perseguir a nacionalização, o
objetivo final, apesar da condição de minoria. A derrota subsequente teria
utilidade pedagógica, ensinando às massas a identidade de seus aliados e de
seus inimigos, preparando o advento de um governo socialista majoritário.
Essa posição foi implementada apenas uma vez, em 1928, na Noruega, por um
governo socialista que durou três dias. O segundo caminho é o das reformas, o
da mudança do capitalismo a prestações, até o dia em que a maioria se volte
para os partidos socialistas e as nacionalizações possam ser efetuadas.
Essa situação de carência de uma teoria econômica específica perdura até a
década de 1930. Após a crise de 1929, uma série de políticas anticíclicas é
implementada em diversos países. Seu fundamento teórico foi formulado por
Keynes, e o caso mais conhecido é o New Deal americano. No entanto, na
mesma época, os governos socialistas da Noruega, Suécia e França iniciavam
políticas de estímulo a demandas similares.
Clique aqui, e saiba mais sobre o New Deal Americano.
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Criou-se um novo paradigma, no qual cabia ao Estado gerenciar o nível de
demanda, seja mediante uma política de pleno emprego, seja pelo gasto
público direto em obras de qualquer espécie. Aceitava-se um certo montante
de déficit público, a economia assim aquecida saía da crise e iniciava-se um
novo ciclo expansionista. No momento posterior, de prosperidade, procurava-
se o equilíbrio das contas públicas.
A afinidade entre keynesianismo e social-democracia foi imediata e duradoura.
Essa perspectiva permitia pensar a congruência entre os interesses
particulares dos trabalhadores e os interesses gerais da sociedade. Aumentar a
renda dos trabalhadores era a receita para fazer a economia crescer e
beneficiar a todos. Os interesses populares, de todas as classes e grupos
aliados, aparentavam uma afinidade, até então oculta, com os interesses da
classe operária.
Clique aqui e saiba mais sobre o mundo pós-primeira guerra
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Para aperfeiçoar ainda mais os seus conhecimentos sobre a Primeira Guerra
Mundial, assista ao vídeo abaixo.
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KeynesA assimilação do enfoque keynesiano à política econômica dos
socialistas no poder marca o início do que se convencionou chamar Estado do
bem-estar social. Não se trata mais de implementar reformas pontuais
enquanto se aguarda o momento propício à nacionalização massiva. Criou-se,
na verdade, um novo modelo, com a ambição de domesticar o capitalismo, em
benefício de trabalhadores e consumidores. O papel ativo que o Estado passou
a ter permitiria evitar a crise econômica e compensar os danos sociais do
sistema, sem necessidade da nacionalização completa da atividade
econômica.
O modelo, de grande aplicação na Europa, após a segunda guerra, apoiava-se
em três pilares.Até esse momento, convém lembrar, esses partidos dirigiam-se
prioritária ou mesmo exclusivamente à classe operária. No Partido Trabalhista
Britânico, até mesmo a filiação individual de um membro de outra classe foi
vetada pelos sindicatos até 1918.
Em primeiro lugar, a presença do Estado como agente econômico, como
provedor dos insumos fundamentais à economia, a preços módicos. Tornou-se
comum o monopólio público em setores como crédito, aço, carvão, energia,
transportes e comunicações. Todos eles estratégicos e de baixa rentabilidade
para o capital privado. Entre os poucos casos de presença estatal em
indústrias de bens de consumo, cabe citar, por sua relevância, a produção de
automóveis.
Em segundo lugar, a promoção de políticas anticíclicas de prevenção e
regulação de crises econômicas. Aqui o Estado age como controlador da
demanda, normalmente suprindo-a, mediante geração direta ou indireta de
postos de trabalho.
Clique aqui, e saiba mais sobre Keynes.
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O terceiro pilar é a construção de uma rede de proteção que pretendia nada
menos que a segurança absoluta para todo cidadão, “do berço ao túmulo”.
Integram essa rede as políticas de saúde, previdência, assistência social,
habitação, transporte, educação, assim como todas as demais que o Estado
utilize para o incremento da segurança e do bem-estar de sua população.
A rede de segurança tem o objetivo de sanar as sequelas sociais do
capitalismo. A presença do Estado na produção e na regulação do mercado
imprimiria racionalidade a esse espaço, evitando a crise, ao menos a crise
prolongada. Os capitalistas seriam induzidos a investir os seus lucros nos
setores considerados pelo Estado como importantes para a eficiência do
sistema. No limite, operariam como funcionários da coletividade.
O modelo supõe a possibilidade de os trabalhadores fazerem uso do Estado,
em que cada pessoa representa um voto, para corrigir as distorções do
mercado, esfera na qual o peso nas decisões é proporcional ao montante de
recursos que cada um possui. A política prevaleceria, garantindo a justiça e a
eficiência que o mercado seria incapaz de prover por períodos continuados.
A experiência da social-democracia na aplicação desse modelo trouxe à tona
suas limitações estruturais. Na verdade, equidade e eficiência não são
objetivos sempre compatíveis, mas muitas vezes até antagônicos. Em casos de
tensões e conflitos aparece a principal barreira limitadora: a dependência da
disposição do capitalista para o investimento.
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O modelo depende do crescimento econômico, este do investimento e este
último, por sua vez, do lucro e da expectativa de sua continuidade. Na hipótese
de resistência ou desconfiança dos capitalistas, estes, a rigor, não precisariam
sequer conspirar contra o governo: bastar-lhes-ia deixar de investir, para
provocar em pouco tempo uma crise desestabilizadora, de consequências
fatais para o governo.
Esse o dilema que atormenta os governos socialistas empenhados numa
transição sistêmica, na superação do capitalismo por uma nova ordem
econômica e social. Qualquer passo no sentido da nacionalização, da restrição
dos mercados, retira os capitalistas da base de apoio ao governo e gera um
momento de desorganização da produção. Essa crise tem seu ônus, em
empregos e salários, e a classe trabalhadora não se mostrou historicamente
disposta a suportá-los, mesmo com o aceno de benefícios futuros até mais
substanciais.
A crise é inevitável nessa situação. Um governo eleito com promessas de
mudanças deve satisfazer as demandas dos diversos grupos de apoio a que
deve a vitória. Esse leque de demandas pode ser atendido por um número
limitado de meios: distribuição direta de renda, uso da capacidade produtiva
ociosa, gasto das reservas internacionais e redução da taxa de lucros.
Segundo Przeworski, os três primeiros sempre se mostrarão insuficientes, de
maneira que a pressão no sentido da redução da taxa de lucros é inevitável.
Nesse momento ocorre a reação empresarial. Obrigados pela instância política
a manter salários e empregos em montante maior que o necessário, aumentam
seus preços, gerando inflação. Caso se imponham controles diretos sobre os
preços, cessa a produção e surge uma situação de escassez. Processos com
esse roteiro aproximado observaram-se na França, em 1936; em Portugal, na
Revolução dos Cravos; e no Chile de Allende.
A conclusão do autor é da impossibilidade da mudança de sistema por meios
democráticos. A perda inicial que os trabalhadores experimentam determina a
retirada de seu apoio ao governo partidário da mudança, deixando-o debilitado
para enfrentar com sucesso a reação conservadora. A melhor solução para os
trabalhadores seria persistir no compromisso social-democrata, assegurar os
ganhos possíveis em troca da renúncia à revolução social. Afinal, somente
esse modelo assegurou, historicamente, a convivência entre capitalismo e
democracia.
Ao estudar o histórico e as características principais da social-democracia,
detivemo-nos nas opções fundamentais que levaram, com o tempo, a sua
distinção em relação à corrente socialista tradicional. Em seguida, discutimos
as características principais do produto de engenharia política que se associou
à social-democracia a partir da década de 1930 e, principalmente, no pós-
guerra: o conjunto de políticas econômicas e sociais que veio a ser conhecido
como Estado do bem-estar social.
No próximo módulo vamos abordar as bases que tornaram possível o
compromisso que é esse tipo de estado: o Estado do bem-estar social.
Doutrina Política: Social-Democracia
Como vimos, uma das idéias correntes nos primórdios do movimento socialista
era a crença na incompatibilidade, no médio e longo prazo, entre capitalismo e
democracia. A existência simultânea desses dois elementos era considerada
intrinsecamente instável. Numa situação como essa, a classe dominada
procuraria de imediato estender sua emancipação política para o campo social,
o que implicaria a eliminação do capitalismo. A burguesia, por sua vez, trataria
de restabelecer a congruência ampliando a sujeição social dos operários para a
esfera da política, limitando, sempre que possível, o sufrágio aos ricos e
proprietários, e eliminando, assim, a democracia.
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crise da social-democracia;
características da social-democracia clássica e do neoliberalismo e sua
confrontação;
razões do sucesso social-democrata até os anos 70;
mudanças necessárias ao modelo.
c) Coletivismo
e) Mercado restrito
f) Pleno emprego
Para saber mais sobre Thomas Humphrey Marshall, leia o artigo de Paula
Julieta Jorge de Oliveira, publicado pela OAB. Clique aqui
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2. Características do neoliberalismo
a) Governo mínimo
c) Fundamentalismo de mercado
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f) O elogio da desigualdade
g) Nacionalismo tradicional
j) Realismo internacional
k) Mundo bipolar
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Em resumo, temos:
Social-Democracia Clássica
Neoliberalismo
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No plano social, dá-se como certo que o indivíduo não é capaz de defesa
própria em um leque importante de situações, nas quais é legítima e
necessária a intervenção reparadora do Estado. O envolvimento da burocracia
na vida das famílias assistidas é percebido como ônus inevitável do modelo.
O neoliberalismo, por sua vez, postula o menor Estado possível, sob controle
do mercado e da sociedade civil. Esta disporia da energia suficiente para gerar
a solidariedade de que a sociedade precisa.
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O recuo eleitoral dos partidos socialistas, a onda liberal que invadiu a Europa a
partir de fins dos anos 1970, obedece, conforme esta perspectiva, a causas
mais profundas que a simples volubilidade dos cidadãos ou a alternância entre
oposição e situação. A erosão progressiva de cada uma dessas premissas teria
posto, aos governos de esquerda, problemas cada vez mais difíceis de serem
resolvidos nos seus parâmetros clássicos. O Estado do bem-estar social
tornava-se, ao mesmo tempo, mais caro e mais ineficiente. A acumulação de
insucessos parciais teria conferido credibilidade à alternativa neoliberal,
provocando a sucessão de vitórias eleitorais.
As mudanças necessárias
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Esse fato não implica o abandono dos trabalhadores como grupo interlocutor
importante dos partidos socialistas, mas impõe a consideração de outros
grupos, como mulheres, jovens e aqueles organizados em torno de questões
que cortam o eixo direita-esquerda, como os verdes.
Atentos à necessidade de mudança, de interlocutores e de propostas, os
diversos partidos socialistas europeus iniciaram um processo de transição. A
partir da década de 1980 passaram a incluir em sua agenda temas como a
produtividade econômica, a participação dos cidadãos, o desenvolvimento de
estruturas comunitárias, a ecologia e a pluralidade de estilos de vida, todos
antes subestimados.