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Vinicius de Moraes
Antologia Poética
Antologia poética foi publicada em 1954 e apresenta a relação completa dos poemas que integram esse conjunto, a fim de dirimir
possíveis dúvidas dos alunos:
- O olhar para trás - Marinha - A manhã do morto
- A uma mulher - Os acrobatas - Mensagem a Rubem Braga
- Ilha do Governador - Paisagem - Balada da moça do Miramar
- Ausência - Balada do cavalão - Balanço do filho morto
- O incriado - Canção - Balada das arquivistas
- A volta da mulher - Quatro sonetos de - A Verlaine
morena meditação: - A bomba atômica
- A mulher na noite I - Aurora, com movimento
- Agonia II (Posto 3)
- A legião dos Urias III - Balada do morto vivo
- Alba IV - Sacrifício da Aurora
- O escravo - O riso - Soneto da mulher inútil
- A música das almas - Pescador - O rio
- Três respostas em - Soneto de despedida - Bilhete a Baudelaire
face de Deus - Sinos de Oxford - A morte de madrugada
- Poema nº três em - Trecho - O assassino
busca da essência - O - Mar - Poema enjoadinho
poeta - Balada da praia do - Soneto do só ou Parábola de
O nascimento do Vidigal Malte Laurids Brigge
homem (**) - Soneto de Londres - A pera
- Viagem à sombra - Cântico - A paixão da carne
- Balada feroz - A um passarinho - A ausente
- Invocação à mulher - A estrela polar - A rosa de Hiroshima
única - Soneto do maior amor - Tríptico na morte de Sergei
- A máscara da noite - Imitação de Rilke Mikhailovitch Eisenstein
- Vida e poesia - Balada do enterrado - Pátria minha
- Sonata do amor vivo - O crocodilo
perdido - Epitáfio - História passional,
- A brusca poesia da - Allegro Hollywood, Califórnia
mulher amada - Soneto de véspera - Epitalâmio
- O cemitério na - Balada do Mangue - Conjugação da ausente
madrugada - Soneto a Otávio de - O filho do homem
- Solilóquio Faria - Soneto de aniversário
- A vida vivida - Rosário - Poética (I)
- Ariana, a mulher - O escândalo da rosa - Elegia na morte de Clodoaldo
- Elegia quase uma - Soneto ao inverno Pereira da Silva Moraes, poeta
ode - Marina e cidadão
- Elegia lírica - Soneto de Quarta- - Desert Hot Springs
- Elegia desesperada feira de Cinzas - Retrato, à sua maneira (João
- Elegia ao primeiro - Sombra e luz Cabral de Melo Neto)
amigo - Saudade de Manuel - A hora íntima
- A última elegia Bandeira - Menino morto pelas ladeiras
- O falso mendigo - Azul e Branco de Ouro Preto
- Soneto de intimidade - Soneto de separação - Poema dos olhos da amada
- Ária para assovio - Balada de Pedro Nava - O poeta Hart Crane suicida-
- Soneto à lua (O anjo e o túmulo) se no mar
- Soneto de agosto - Soneto de carnaval - A brusca poesia da mulher
- A mulher que passa - Balada das meninas amada (II)
- Soneto a Katherine de bicicleta - A que vem de longe
Mansfield - Poema de Natal - Receita de mulher
- Balada para Maria - O dia da Criação - Balada negra
- Soneto de contrição - Balada dos mortos dos - Soneto do amor total
- Ternura campos de - Balada das duas mocinhas de
- Soneto de devoção concentração Botafogo
- Soneto de fidelidade - Repto - Máscara mortuária de
- Poemas para todas - O poeta e a lua Graciliano Ramos
as mulheres - Soneto da rosa - O mergulhador
- A morte - Valsa à mulher do - Poema de Auteil
- A partida povo - O operário em construção
- Cinepoema
- Mensagem à poesia
- O tempo nos parques
Este livro reúne a maior e a melhor parte da obra de um dos grandes poetas do Brasil.
Vinicius de Moraes nasceu no Rio, em 1913, aqui se formou em Direito e entrou, por concurso, para a carreira
diplomática. Serviu durante quatro anos no consulado brasileiro em Los Angeles e está no momento como secretário de
nossa embaixada em Paris. Seu primeiro livro foi O caminho para a distância, do qual pouco aproveitou nesta seleção,
seguindo-se Ariana, a mulher e Forma e exegese, com o qual conquistou o Prêmio Felipe de Oliveira. Publicou a seguir
Novos poemas, Cinco elegias, Poemas, sonetos e baladas e Pátria minha que firmaram seu nome, no consenso da crítica,
como o melhor poeta da turma que hoje entra pela casa dos quarenta. Alguns desses livros foram feitos em edições
limitadas; todos estão há longo tempo esgotados, o que faz com que grandes admiradores de Vinicius de Moraes conheçam
apenas uma pequena parte de sua obra. Esta seleção, feita pelo próprio poeta com a ajuda de amigos – principalmente
Manuel Bandeira – adquire, assim, uma grande importância, pois possibilita um estudo da evolução do poeta e a admiração
do que ele tem feito de mais alto e melhor.
Vindo de um misticismo de fundo religioso para uma poesia nitidamente sensual que depois se muda em versos
marcados por um fundo sentimento social, a obra de Vinicius tem como constante um lirismo de grande força e pureza.
Ainda com o risco de incorrer na censura dos que levam suas preocupações puritanas ao domínio das artes, não quiseram
os amigos do poeta, principalmente o que assina esta nota, e assim se faz responsável por esta resolução, suprimir algumas
palavras ou expressões mais fortes que de raro em raro aparecem em seus versos. Isso fará com que não seja
recomendável a presença deste livro em mãos juvenis – mas resguarda a pureza de sua poesia, que tudo, em poesia,
transfigura. Estamos certos de que, com a edição deste livro, a obra de Vinicius de Moraes ganhará uma popularidade
maior, e passará a ter, entre o público, o lugar de honra que há muito ocupa no espírito e no sentimento dos poetas e dos
críticos.
O volume abre-se com uma "Advertência" (do autor, sem dúvida, embora sem assinatura, com indicação de local e
data):
Poderia este livro ser dividido em duas partes, correspondentes a dois períodos distintos na poesia .
A primeira, transcendental, freqüentemente mística, resultante de sua fase cristã, termina com o poema "Ariana, a
mulher", editado em 1936. Salvo, aqui e ali, umas pequenas emendas, a única alteração digna de nota nesta parte foi
reduzir-se o poema "O cemitério da madrugada" às quatro estrofes iniciais, no que atendeu o A. a uma velha idéia de seu
amigo Rodrigo M.F. de Andrade.
À segunda parte, que abre com o poema "O falso mendigo", o primeiro, ao que se lembra o A., escrito em oposição
ao transcendentalismo anterior, pertencem algumas poesias do livro Novos poemas, também representado na outra fase, e
os demais versos publicados posteriormente em livros, revistas e jornais. Nela estão nitidamente marcados os movimentos
de aproximação do mundo material, com a difícil mas consistente repulsa ao idealismo dos primeiros anos.
De permeio foram colocadas as Cinco elegias (1943), como representativas do período de transição entre aquelas
duas tendências contraditórias, – livro também onde elas melhor se encontram e fundiram em busca de uma sintaxe
própria.
Não obstante certas disparidades, facilmente verificáveis no índice, impôs-se o critério cronológico para uma
impressão verídica do que foi a luta mantida pelo A.contra si mesmo no sentido de uma libertação, hoje alcançada, dos
preconceitos e enjoamentos de sua classe e do seu meio, os quais tanto, e tão inutilmente, lhe angustiaram a formação.
A importância de se ler uma obra como esta ("Antologia Poética") está no fato de que estamos tendo contato com uma seleção de
poemas feita pelo próprio autor.
A primeira está dividida em 27 poemas, marcada pelo misticismo,pelos altos voos angustiados que lembram o condoreirismo
romântico e o Simbolismo.
A segunda fase com 109 textos, é marcada pela abordagem do cotidiano,pelo tempo presente, pelo voo rasteiro sobre as coisas
simples da vida. Por haver nessa fase uma renúncia à superstição e ao purismo fortemente presentes na primeira, bem como um
direcionamento para uma atitude mais brincalhona e amorosa perante a poesia, essa segunda fase ficou conhecida como "O
encontro do cotidiano pelo poeta". Nessa passagem do metafísico para o físico, do espiritual para o sensual, do sublime para o
cotidiano, o poeta retoma sugestões românticas (como lua, cidade, samba). Refugia-se no erotismo: há contemplação do amor,
poemas "sobre a mulher" e adoração panteística da natureza. Compôs também poemas de indignação social, cujos exemplares são:
"Balada dos mortos dos campos de concentração", "O operário em construção" e "A rosa de Hiroshima".
E entre as duas estão as Cinco Elegias, que, por assumirem uma posição intermediária, possuem uma mistura de abstração com
objetividade.
O terceiro Vinicius é o compositor, letrista e cantor. Autor de mais de trezentas músicas (como atesta seu Livro de letras, lançado
postumamente, em 1991, onde estão mais de 300 letras de músicas de sua autoria), difundidas pelo mundo com o grande
acontecimento cultural e musical que foi a bossa nova. Seus parceiros, como vimos, vão desde Bach a Toquinho.
Embora a crítica fizesse (faça) tal divisão, colocando de um lado o poeta e de outro o showman, Vinicius nunca concordou que
houvesse diferença entre seus sambas e seus poemas escritos, pois para ele tudo era igual.
O incriado
Oh, de que serve ao amante o amor que não germinará na terra infecunda
De que serve ao poeta desabrochar sobre o pântano e cantar prisioneiro?
Nada há a fazer pois que estão brotando crianças trágicas como cactos
Da semente má que a carne enlouquecida deixou nas matas silenciosas.
Nem plácidas visões restam aos olhos – só o passado surge se a dor surge
E o passado é como o último morto que é preciso esquecer para ter vida
Todas as meias-noites soam e o leito está deserto do corpo estendido
Nas ruas noturnas a alma passeia, desolada e só em busca de Deus.
Eu sou como o velho barco que guarda no seu bojo o eterno ruído do mar
(batendo
No entanto como está longe o mar e como é dura a terra sob mim...
Felizes são os pássaros que chegam mais cedo que eu à suprema fraqueza
Ai, muito andei e em vão... rios enganosos conduziram meu corpo a todas
(as idades
Na terra primeira ninguém conhecia o Senhor das bem-aventuranças...
Quando meu corpo precisou repousar eu repousei, quando minha boca
(ficou sedenta eu bebi
Quando meu ser pediu a carne eu dei-lhe a carne mas eu me senti mendigo.
Longe está o espaço onde existem os grandes vôos e onde a música vibra solta
A cidade deserta é o espaço onde o poeta sonha os grandes vôos solitários
Mas quando o desespero vem e o poeta se sente morto para a noite
As entranhas das mulheres afogam o poeta e o entregam dormindo à madrugada.
Se alguém não devia sofrer eu não devia, mas sofro e é tudo o mesmo
Eu tenho o desvelo e a bênção, mas sofro como um desesperado e nada posso
Sofro a pureza impossível, sofro o amor pequenino dos olhos e das mãos
Sofro porque a náusea dos seios gastos está amargurando a minha boca.
Não quero a esposa que eu violaria nem o filho que ergueria a mão sobre
(o meu rosto
Nada quero porque eu deixo traços de lágrimas por onde passo
Quisera apenas que todos me desprezassem pela minha fraqueza
Mas, pelo amor de Deus, não me deixeis nunca sozinho!
Comentário- Observe como nesse poema, por meio de versos livres e longos dentro do padrão dos famosos versículos bíblicos.
Vinícius se destaca por garantir ritmo,realçado pelas anáforas(repetição de expressões no início do verso). A forma,portanto,
adapta-se perfeitamente à preocupação do poeta de expressar a angústia de saber-se prisioneiro da carne. Condena-a, mas
enxerga nela o alívio de sua angústia. Com o espírito perturbado, entra em processo de satanização, ao se intitular o “Incriado”, ou
seja, a negação da criação de Deus, alguém que não é semelhança e imagem do Divino.O eu-lírico se sente tão maldito que nega
em si o grão divino que, de acordo com o cristianismo, existe dentro de todos os homens. Para se esclarecer o que está expondo, é
importante a leitura de outro poema: O Poeta
O poeta
(...)
Foi muito antes dos pássaros – apenas rolavam na esfera os cantos de Deus
E apenas a sua sombra imensa cruzava o ar como um farol alucinado...
Existíamos já... No caos de Deus girávamos como o pó prisioneiro da vertigem
Mas de onde viéramos nós e por que privilégio recebido?
Endimião e a lua-mitologia grega nos relata que Endimião faz parte das personagens que traduzem a perseguição ao ideal
de beleza.
“Na lenda, Endimião é um pastor portador de juventude e uma beleza perfeita.
E Endimião, quando adulto, pediu a Zeus que não lhe tirasse nunca o que tinha de mais perfeito e valioso, a juventude e a beleza
rara de um simples mortal.
Zeus, então, realiza o pedido do rapaz e, numa tarde de verão, promete a Endimião que, naquele dia, quando adormecesse, jamais
envelheceria e jamais perderia a beleza,pois sabia que tão logo adormecesse seria jovem e belo para todo o sempre, e adormece
feliz.Mas o que ele não sabia é que jamais iria acordar. Zeus o envolvera em um sono eterno, poupando-o assim, do
envelhecimento e da perda da juventude e da beleza que tanto o envaidecia.
Diz a lenda que à noite, Selene, a Lua, sempre percorre o céu em sua carruagem prateada, avista a figura adormecida de Endimião.
Ela nunca vira um homem com tamanha beleza e apaixona-se imediatamente.
A presença da Lua é marcante na Antologia Poética- no começo pode se dizer que ela é testemunha dos anseios do poeta.Pouco
depois ele se torna mais ousado e começa a associá-la aos seus desejos sexuais, como em “Elegia desesperada.”(...) e eu só tive a
lua/Lívida, a lésbica que me poluiu da sua eterna/Insensível polução...
Há de lembrar que o mito de Endimião está ligado ás poluções noturnas (ejaculação involuntária durante o sono), típicas
de adolescentes que ainda não atingiram sua maturidade sexual.Mais para a frente, Vinícius dirige diretamente sua emotividade a
esse astro, como em ”Soneto á lua”
Fugaz, com que direito tens-me presa
A alma que por ti soluça nua
E não és Tatiana e nem Teresa:
Até que em “Soneto de despedida” começa a perder o pudor diante dessa deusa implacável diante da luxúria.
Uma lua no céu apareceu
Cheia e branca; foi quando, emocionada
A mulher a meu lado estremeceu
E se entregou sem que eu dissesse nada.
Ainda assim, como um expediente psicológico imaturo de transferência, o desejo é desviado a uma mulher branca como a
Lua.Sente-se atraído por esse astro, porém , ainda não tem coragem de assumir isso. Mas, amadurecido, escancara um claro ato
sexual em “O poeta e a lua”( ainda que em 1ª pessoa, lírica, se disfarce na 3ª pessoa da palavra poeta)
Orfeu- De acordo com a Mitologia Grega Orfeu era um poeta e um músico, filho da musa Calíope. apaixonou-se por Eurídice e
casou-se com ela. Mas Eurídice era tão bonita que, pouco tempo depois do casamento, atraiu um apicultor chamado Aristeu.
Quando ela recusou suas atenções, ele a perseguiu. Tentando escapar, ela tropeçou em uma serpente que a picou e a matou.
Orfeu ficou transtornado de tristeza. Levando sua lira, foi até o Mundo dos Mortos, para tentar trazê-la de volta. A canção
pungente e emocionada de sua lira convenceu o barqueiro Caronte a levá-lo vivo pelo Rio Estige. Finalmente Orfeu chegou ao
trono de Hades.. Eurídice poderia voltar com Orfeu ao mundo dos vivos. Mas com uma única condição: que ele não olhasse para
ela até que ela, outra vez, estivesse à luz do sol.
Orfeu partiu pela trilha íngreme que levava para fora do escuro reino da morte, tocando músicas de alegria e celebração enquanto
caminhava, para guiar a sombra de Eurídice de volta à vida. Ele não olhou nenhuma vez para trás, até atingir a luz do sol. Mas então
se virou, para se certificar de que Eurídice estava seguindo-o.
Por um momento ele a viu, perto da saída do túnel escuro, perto da vida outra vez. Mas enquanto ele olhava, ela se tornou de novo
um fino fantasma, seu grito final de amor e pena não mais do que um suspiro na brisa que saía do Mundo dos Mortos. Ele a havia
perdido para sempre. Em total desespero, Orfeu se tornou amargo. Recusava-se a olhar para qualquer outra mulher, não querendo
se lembrar da perda de sua amada. Furiosas por terem sido desprezadas, um grupo de mulheres selvagens chamadas Mênades
caíram sobre ele, frenéticas, atirando dardos. Os dardos de nada valiam contra a música do lirista, mas elas, abafando sua música
com gritos, conseguiram atingi-lo e o mataram. Depois, despedaçaram seu corpo e jogaram sua cabeça cortada no Rio Hebrus, e ela
flutuou, ainda cantando, "Eurídice! Eurídice!" Chorando, as nove musas reuniram seus pedaços e os enterraram no Monte Olimpo.
Dizem que, desde então, os rouxinóis das proximidades cantaram mais docemente do que os outros. Pois Orfeu, na morte, se uniu
a sua amada Eurídice.
Orfeu é, portanto, o símbolo do artista cuja emotividade é capaz de mudar radicalmente o mundo .- é também o apaixonado sem
limites. Sua história traz em si elementos da condição humana: vida, morte, amor e arte. Diante desse fato, é mais fácil entender a
poesia de Vinícius, a música e a emoção são os ingredientes mais fortes,responsáveis pela qualidade latente da sua imatura 1ª
fase.
O Mar- tem presença marcante na obra de Vinícius, a começar pelo pretenso estilo de vida no R.J. Há nele inúmeras simbologias
que o poeta soube captar.A começar pelo ritmo das ondas, constante e cíclico, faz lembrar a dinâmica existência humana, tendo
facilmente associado aos mistérios da vida e da morte.Seu pulsar é sempre associado ao coração humano e ás suas paixões.Todos
esses são temas recorrentes da Antologia Poética.Observe o poema abaixo :
O Amor- Manuel Bandeira percebeu em Vinícius a “ intoxicação do amor”.A relação sexual é constante em seus textos, mas
percebe-se que o poeta busca algo além do automatismo lascivo, do sexo pelo sexo.Comprova essa ideia o “Soneto da Devoção “
Assim como Castro Alves, Vinicius canta o amor físico, o amor livre.
O termo "cadela", bastante forte, pois normalmente funciona como palavrão, como ofensa, dirigida vulgarmente a mulher que
“não se respeita”, que se entrega a qualquer um, tem aqui uma força e um gosto especial.Observe que aborda a sexualidade de
forma fria, direta como afirma Mario de Andrade.
Ao designar a mulher de cadela, dentro do contexto desses versos e da personalidade de seu criador, veste a palavra com novas
roupas e novas cores.
O que se sente ao ler o poema é que ali esta uma mulher que ama o amor, uma mulher que se entrega a relação sexual com força
animal, sem os recatos afrescalhados de uma formação burguesa, cristã, repressora .
Perante a admiração e devoção do eu lírico, tal condição transforma-se em valor, em qualidade, conferindo a musa uma aura de
beleza.
Reforce-se que o sexo só assume valor quando se mostra como meio, não simplesmente um fim em si. Seu objetivo pode ser a
procriação , canal de toda a magia da paternidade, abordado com humor em “Poema Enjoadinho”
.Filhos... Filhos?
Melhor não tê-los!
Mas se não os temos
Como sabê-lo?
Se não os temos
Que de consulta
Quanto silêncio
Como os queremos!
Banho de mar
Diz que é um porrete...
Cônjuge voa
Transpõe o espaço
Engole água
Fica salgada
Se iodifica
Depois, que boa
Que morenaço
Que a esposa fica!
Resultado: filho.
E então começa
A aporrinhação:
Cocô está branco
Cocô está preto
Bebe amoníaco
Comeu botão.
Filhos? Filhos
Melhor não tê-los
Noites de insônia
Cãs prematuras
Prantos convulsos
Meu Deus, salvai-o!
Filhos são o demo
Melhor não tê-los...
Mas se não os temos
Como sabê-los?
Como saber
Que macieza
Nos seus cabelos
Que cheiro morno
Na sua carne
Que gosto doce
Na sua boca!
Chupam gilete
Bebem shampoo
Ateiam fogo
No quarteirão
Porém, que coisa
Que coisa louca
Que coisa linda
Que os filhos são!
Entretanto, o que fica mais nítido em Vinícius é que o amor é a grande força de elevação. É o que exprime em “Os Acrobatas”
Subamos!
Subamos acima
Subamos além, subamos
Acima do além, subamos!
Com a posse física dos braços
Inelutavelmente galgaremos
O grande mar de estrelas
Através de milênios de luz.
Subamos!
Como dois atletas
O rosto petrificado
No pálido sorriso do esforço
Subamos acima
Com a posse física dos braços
E os músculos desmesurados
Na calma convulsa da ascensão.
Oh, acima
Mais longe que tudo
Além, mais longe que acima do além!
Como dois acrobatas
Subamos, lentíssimos
Lá onde o infinito
De tão infinito
Nem mais nome tem
Subamos!
Tensos
Pela corda luminosa
Que pende invisível
E cujos nós são astros
Queimando nas mãos
Subamos à tona
Do grande mar de estrelas
Onde dorme a noite
Subamos!
Tu e eu, herméticos
As nádegas duras
A carótida nodosa
Na fibra do pescoço
Os pés agudos em ponta.
Como no espasmo.
E quando
Lá, acima
Além, mais longe que acima do além
Adiante do véu de Betelgeuse
Depois do país de Altair
Sobre o cérebro de Deus
E morreremos
Morreremos alto,
imensamente
IMENSAMENTE ALTO.
Em uma interpretação vem a mente o 'super homem' de Nietzche, o homem perfeito, belo, bom, mais rápido, mais forte- o ideal
grego, o semi-deus romano,o atleta.Ele faz alegoria do esforço do atleta para fazer o movimento perfeito, no seu tempo, com a
própria revolução humana.O super homem, a possibilidade de irmos muito além nas nossas capacidade humanas, nos faz sentir
vergonha do que somos hoje. Mas vamos além, vamos em frente, vamos seguir até chegar, passar de deus, ou seja, ser o homem
de verdade o que ele deve ser, o centro do universo, acima dele. Morremos porque não seremos mais reles homens.
Nesse soneto a seguir: “Soneto de quarta-feira de cinzas” encontra-se principalmente a busca da mulher amada, das
infinitas mulheres que se concentram e se desprendem de uma mulher, a afirmação do motivo principal: "mudança",
"evolução", "transição". Poeta viril e terno, transcendental e carnal, caudaloso e contido, ele fez de sua obra o lugar do
encontro e da despedida. Enfim, não importa que Vinícius parta do etéreo para chegar ao real, o que mais vale em sua
obra é a busca da fusão com a vida.
Essa “eternidade” do amor pode durar uma vida toda, ou não mais do que algumas meras horas de encantamento e de
prazer. O que conta, no caso, não é a duração, mas a intensidade do sentimento. É a sua autenticidade. São as marcas
deixadas na memória por esse acontecimento de tanta relevância e até transcendência, que nos acompanham enquanto
vivermos.
Qualquer que seja a análise feita da obra de Vinícius de Moraes, não se pode escapar das palavras "mudança",
"evolução", "transição". Sua poesia, além de ser a encarnação do movimento e do transitório, elege a busca como motor
primordial: do divino, da coisa ordinária, do homem concreto, do homem social, do homem banal, do amante e,
sobretudo, da mulher
O que o poeta apresenta em sua poesia, não é novidade em sua cultura, pois remonta ao neoplatonismo , nascido na Idade
Média.Em outras palavras, um culto ao amor em sua inúmeras facetas.Essa não realização plena do amor é que nascerá acesa sua
chama, mas também provocará sofrimento, melancolia, que lhe parece essencialmente constitutiva. É o que se vê em “ Ausência”
Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz
a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne como uma nódoa do passado.
Eu deixarei... tu irás e encostarás a tua face em outra face
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos
Mas eu te possuirei mais que ninguém porque poderei partir
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.
Comentário:
Diz o crítico Carlos Felipe Moisés que este é um dos primeiros poemas em que aparece a tentativa de representar a mulher amada
e a experiência amorosa como ponto de encontro entre a transcendência e os apelos terrenos, entre espírito e matéria. Para o
ideal do amor sobreviver em toda a sua força ,as partidas, as separações são necessárias.A melancolia é essencial,mas Ausência
também mostra a simbiose, ou seja a fusão do eu-lírico com a amada.
A mulher amada é enaltecida com fervor romântico- ela é rainha, pois carrega o cetro, ela faz parte da criação do universo, é o
poder absoluto Emblemático o seguinte trecho: “A mulher amada é a mulher amada é a mulher amada”.Nele a coincidência entre
sujeito e predicativo, permite inferir que o simples fato de a mulher se amada a torna um ente completo, sem necessidade de
nenhum atributo , de mais nenhum adjetivo. .
Observe o tema moderno da mulher que passa, inspirados em “ A uma passante”, do francês Baudelaire.
Tal idealização feminina culminará na canção “Garota de Ipanema”- canção mais popular do mundo.
GAROTA DE IPANEMA
Pátria Minha Pátria minha... A minha pátria não é florão, nem ostenta
Lábaro não; a minha pátria é desolação
A minha pátria é como se não fosse, é íntima De caminhos, a minha pátria é terra sedenta
Doçura e vontade de chorar; uma criança dormindo E praia branca; a minha pátria é o grande rio secular
É minha pátria. Por isso, no exílio Que bebe nuvem, come terra
Assistindo dormir meu filho E urina mar.
Choro de saudades de minha pátria. (...)
Ponho no vento o ouvido e escuto a brisa
Se me perguntarem o que é a minha pátria direi: Que brinca em teus cabelos e te alisa
Não sei. De fato, não sei Pátria minha, e perfuma o teu chão...
Como, por que e quando a minha pátria Que vontade de adormecer-me
Mas sei que a minha pátria é a luz, o sal e a água Entre teus doces montes, pátria minha
Que elaboram e liquefazem a minha mágoa Atento à fome em tuas entranhas
Em longas lágrimas amargas. E ao batuque em teu coração.
(...)
Vontade de beijar os olhos de minha pátria Agora chamarei a amiga cotovia
De niná-la, de passar-lhe a mão pelos cabelos... E pedirei que peça ao rouxinol do dia
Vontade de mudar as cores do vestido (auriverde!) tão feias Que peça ao sabiá
De minha pátria, de minha pátria sem sapatos Para levar-te presto este avigrama:
E sem meias pátria minha "Pátria minha, saudades de quem te ama...
Tão pobrinha! Vinicius de Moraes."
(...)
Comentário-
Este poema vincula-se á tradição literária de cantar as belezas da pátria, firmada no Romantismo por Gonçalves Dias – Canção do
Exílio.Entretanto,como sempre fez no decorrer de sua obra poética, Vinícius retoma a herança estética para imprimir nela uma
marca própria.A estranha frase inicial-“A minha pátria é como se não fosse”- em que falta o predicativo do sujeito, significa a
recusa dos adjetivos altissonantes que cristalizaram ao substantivo pátria. É como se ele defendesse a tese de que a pátria não
tem os predicados que costumam atribuir a ela, por isso a recusa das palavras e expressões, como “florão”,”ostenta” e “lábaro”.,
presentes no Hino Nacional.Em vez disso, ele assume um tom de afetividade, com abundantes diminutivos, tratando sua terra
como uma criança, em um processo conhecido como “prosopopéia”, personificação ou antropomorfização.Entretanto ,essa visão
edulcorada não impede o poeta de enxergar os problemas sociais.Confirma esse aspecto a referência á pátria “tão pobrinha”.Por
isso, deve ser ressaltado, que, apesar de pertencente á segunda fase poética de Vinícius, em “Pátria Minha” ele trouxe de volta o
hábito de sua fase inicial; A utilização de versos livres extensos.
Balada do Mangue
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Balada do Mangue
Comentário
Mangues lembram Recife. O eu poético faz uma referência metafórica da vida das prostitutas que se embelezam inclusive mulatas
pintam os cabelos de loiros para atrair rapazes. Há uma nítida comparação das prostitutas com as flores venenosas chamadas no
primeiro verso de "flores gonocócitas" uma alusão à gonorréia. Isto pq, segundo o eu poético, tais mulheres eram transmissoras de
doenças venéreas. Na última linha de verso há uma crítica tb aos homens que as usam tb.
(PUC-RS 2009) Para responder à questão 1, leia o trecho de “Operário em construção”, de Vinicius de Moraes, e as afirmativas,
preenchendo os parênteses com V para verdadeiro e F para falso.
a) V – F – F – V
b) V – F – V – V
c) F – V – F – V
d) V – V – F – F
e) F – F – V – F
a) ele pertence à 1ª fase do poeta, com a presença de linguagem simples e forte erotismo.
b) ele pertence à 1ª fase do poeta, em que a mulher representa o pecado por provocar o desejo no eu lírico.
c) ele pertence à 2ª fase do poeta, em que a mulher é vista de forma mais material e há a consciência do pecado.
d) ele pertence à 1ª fase do poeta, em que os temas transcendentais predominam e a mulher é vista como uma espécie de anjo.
e) ele pertence à 2ª fase do poeta, com a presença do soneto e da indagação sobre as contradições do amor.
A mulher na noite
a) Comente a que fase da obra de Vinicius de Moraes pertence esse poema e destaque duas características dessa fase, uma quanto
à forma e outra quanto ao conteúdo do poema.
O poema pertence à 1ª fase da obra do poeta. Quanto à forma, pode-se destacar os versos longos e a linguagem abstrata e
alegórica, sobretudo com vocabulário pertencente à natureza. Quanto ao conteúdo, encontra-se nesse poema a angústia do eu
lírico, dividido entre o amor carnal e a sensação do pecado.
b) Neste poema, há uma metáfora do desejo amoroso. Explique essa metáfora e comente os sentimentos do eu lírico que ela
revela.
A metáfora do desejo amoroso está nos elementos da natureza, principalmente na descrição do ato sexual, que é sentido como
atividade dos animais, como em “os insetos se ocultavam no meu ouvido” e “grandes reses lambiam-me o rosto”. O eu lírico
revela sentimentos de angústia a partir dessas metáforas e, por fim, associa o gozo sexual à morte, “E não havia mais vida na
minha frente”.
Soneto de véspera
Oxford, 1939
a) Comente o poema acima quanto à forma e ao conteúdo tendo em vista a obra poética de Vinicius de Moraes.
O poema em questão é um soneto, forma que Vinicius de Moraes cultivou em muitos momentos, a partir dos modelos de
Camões e Shakespeare. Quanto ao conteúdo, pode-se destacar o questionamento acerca do relacionamento amoroso, também
muito comum nos sonetos do poeta.
O título do poema “Soneto de véspera”, relaciona-se à angústia sentida pelo eu lírico ao antecipar a volta da mulher amada que
estivera longe. Dessa maneira, ele mostra-se aflito por perceber que se acostumara à ausência e por não saber o que sentir na
presença da mulher amada. O soneto demonstra uma característica marcante da obra de Vinicius, sobretudo do soneto, em que
a relação amorosa é analisada em suas contradições.
A rosa de Hiroxima
Os sonetos
Ao escrever sonetos, Vinicius de Moraes soma-se à distinta lista de poetas que versejaram em língua portuguesa, tais como
Camões, Gregório de Matos, Bocage, Antero de Quental, Olavo Bilac, entre outros, e que escolheram como forma de expressão
esta composição poética clássica.
Mas não é só; o motivo de tal escolha diz muito, também, sobre a atitude do poeta diante do fazer poético. O soneto, forma
literária clássica fechada, é uma composição de quatorze versos, dispostos em dois quartetos e dois tercetos, seguindo
variavelmente os seguintes esquemas de rima: abab / abab / ccd / ccd; abba / abba / cde / cde ou abba / abba / cdc / dcd., sendo
que o metro mais utilizado tem sido o decassílabo (com acento na 4ª, 7ª e 10ª). Por encerrar o conceito fundamental do poema, o
último verso constitui o que chamamos de "fecho de ouro" ou a "chave de ouro".
Tudo isso faz do soneto uma escolha formal lúcida para o poeta. Porque aí se observa a clareza e a concisão de linguagem, de
características clássicas. Com ela, o poeta mantém a expressão de um lirismo controlado, ou seja, o sentimento e a emoção líricos
contêm-se nos limites do equilíbrio e da harmonia. O poeta procura atenuar os impulsos do "eu", isto é, de sua subjetividade
particular, em favor de uma visão impessoal ou objetiva. Daí dizer que nos sonetos existe a luta de um "eu" que ama e um "eu" que
raciocina.
Soneto de separação
Comentário:
Este soneto, um dos mais populares de Vinícius, é quase todo composto num jogo antitético, tais como: riso X pranto; calma X
vento; triste X contente e próximo X distante. O emprego dessa figura de linguagem, ao longo do poema, revela as mudanças na
relação amorosa que se processam de uma forma abrupta e inesperada. O poeta utiliza um outro recurso, num belíssimo arranjo
de antíteses, para acentuar o dinamismo que caracteriza o poema: o emprego da forma verbal "Fez-se" e de sua forma contrária
"desfez". Esse dinamismo expresso no soneto revela, sob certo aspecto, a própria inconstância na vida amorosa de Vinicius.
SONETO DA SEPARAÇÃO
De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
Este soneto, de um poeta e compositor contemporâneo, foi inserido em uma canção, e pode ser explorado para mostrar que a
Literatura não é estanque; pelo contrário, seus usos atravessam épocas e movimentos históricos. Das características de
movimentos literários citadas abaixo, indique a única que não está presente no poema.
A) O poema apresenta antíteses e outras figuras de estilo, típicas da poesia barroca.
B) O soneto tem em comum com a poesia simbolista a expressão da realidade de maneira vaga e imprecisa, e a musicalidade, com
aliterações e assonâncias.
C) A vertente lírica do Romantismo, com idealização e exacerbação dos sentimentos, está presente no tratamento temático da dor
da separação.
D) O poema é um exemplo da perfeição formal, de rima e métrica, muito valorizadas no Parnasianismo.
E) Do Modernismo, corrente a que pertence o poeta, o poema apresenta, além da linguagem coloquial, expressões de humor.
Resposta
Vinícius de Moraes, poeta modernista da Geração de 30, assinalava que sua obra consistia em duas fases: a primeira,
transcendental, freqüentemente mística, é resultante de sua fase cristã; a segunda fase assinala a explosão de uma poesia mais
próxima do mundo material, com a difícil, mas consistente repulsa ao idealismo dos primeiros anos. O tema principal desse
momento foi o amor em suas múltiplas manifestações: saudade, carência, desejo, paixão, espanto, separação.
Diferentemente da primeira fase, em que o escritor utilizava poemas longos, com versos extensos, em linguagem abstrata e
declamatória, nesta segunda fase, Vinícius, embora aprecie o soneto e seu teor clássico, adere às idéias dos modernistas de 22,
sendo aberto a novas propostas e incorporando características de diversos estilos de época ao seu texto, o que verificamos em
“Soneto de separação” nas seguintes alternativas:
a) ao longo do poema, está presente a oposição entre o passado e presente (antíteses): “branco como a bruma” – (comparação) –
(Barroco);
b) presença de aliterações: “branco”, “bruma” e de assonâncias: /e/ ; /o/, linguagem vaga: “da calma fez-se o vento” (Simbolismo);
c) verifica-se a vertente romântica a partir do próprio título: “Soneto da separação” – no texto, há descrições desse momento de
intensa dor;
d) o poema está ligado à tradição clássica (Parnasianismo), uma vez que faz uso do soneto, do verso decassílabo e apresenta
sintaxe e vocabulário apurados;
e) são improcedentes no textos as características modernistas: a utilização de uma linguagem coloquial, como foi dito acima,
também não se verifica o humor na mensagem, o eu-lírico demonstra dor em função da separação.
Resposta E
Soneto de fidelidade
Poética
De manhã escureço
De dia tardo
De tarde anoiteço
Nasço amanhã
Ando onde há espaço:
- Meu tempo é quando.
Na segunda estrofe, numa atitude de liberdade, de anticonvencionalismo, o eu lírico diz-se guiar pelo "este" e não pelo "norte"
como todos fazem. O último verso da última estrofe privilegia o circunstancial (não é "aquilo que" acontece, mas o "momento
quando" acontece que realmente importa), valorizando a disponibilidade do instante presente, para que seja intensamente vivido.
Observando o aspecto formal do poema, parece haver ali um soneto renovado. Isso confirma a valorização da liberdade e do
individualismo, da insubordinação e da disponibilidade, também para o ato de criação poética.
Curiosidade
Na saída de um show em Portugal, diante de estudantes salazaristas que protestavam contra ele na porta do teatro,
Vinicius declama os versos de "Poética" (De manhã escureço / De dia tardo / De tarde anoiteço / De noite ardo). Um dos jovens
tirou a capa do seu traje acadêmico e a colocou no chão para que Vinicius pudesse passar sobre ela - ato imitado pelos outros
estudantes e que, em Portugal, é uma forma tradicional de homenagem acadêmica.
Elegia desesperada
(O DESESPERO DA PIEDADE)
no anticlímax da aurora!
murmura adormecida
É meu nome!...
sou eu, sou eu, Nabucodonosor!
Motionless I climb
the wa
t
e
r
Am I p a Spider?
i
Am I p a Mirror?
e
Am I s an X Ray?
A mulher do poeta dá-lhe a dolorosa nova às oito da Me acordam numa carícia... O que foi que aconteceu?
manhã, depois de uma telefonada de Rodrigo M. F. de Rodrigo telefonou: MÁRIO DE ANDRADE MORREU.
Andrade.
Vivo na imortalidade.
Operário em construção
Epígrafe
E o Diabo, levando-o a um alto monte, mostrou-lhe num momento de tempo todos os reinos do mundo. E disse-lhe o Diabo:
- Dar-te-ei todo este poder e a sua glória, porque a mim me foi entregue e dou-o a quem quero; portanto, se tu me adorares, tudo
será teu.
E Jesus, respondendo, disse-lhe:
- Vai-te, Satanás; porque está escrito: adorarás o Senhor teu Deus e só a Ele servirás.
Lucas, cap. V, vs. 5-8.
Era ele que erguia casas E assim o operário ia
Onde antes só havia chão. Com suor e com cimento
Como um pássaro sem asas Erguendo uma casa aqui
Ele subia com as casas Adiante um apartamento
Que lhe brotavam da mão. Além uma igreja, à frente
Mas tudo desconhecia Um quartel e uma prisão:
De sua grande missão: Prisão de que sofreria
Não sabia, por exemplo Não fosse, eventualmente
Que a casa de um homem é um templo Um operário em construção.
Um templo sem religião Mas ele desconhecia
Como tampouco sabia Esse fato extraordinário:
Que a casa que ele fazia Que o operário faz a coisa
Sendo a sua liberdade E a coisa faz o operário.
Era a sua escravidão. De forma que, certo dia
De fato, como podia À mesa, ao cortar o pão
Um operário em construção O operário foi tomado
Compreender por que um tijolo De uma súbita emoção
Valia mais do que um pão? Ao constatar assombrado
Tijolos ele empilhava Que tudo naquela mesa
Com pá, cimento e esquadria - Garrafa, prato, facão -
Quanto ao pão, ele o comia... Era ele quem os fazia
Mas fosse comer tijolo! Ele, um humilde operário,
Um operário em construção. Como era de se esperar
Olhou em torno: gamela As bocas da delação
Banco, enxerga, caldeirão Começaram a dizer coisas
Vidro, parede, janela Aos ouvidos do patrão.
Casa, cidade, nação! Mas o patrão não queria
Tudo, tudo o que existia Nenhuma preocupação
Era ele quem o fazia - "Convençam-no" do contrário -
Ele, um humilde operário Disse ele sobre o operário
Um operário que sabia E ao dizer isso sorria.
Exercer a profissão. Dia seguinte, o operário
Ah, homens de pensamento Ao sair da construção
Não sabereis nunca o quanto Viu-se súbito cercado
Aquele humilde operário Dos homens da delação
Soube naquele momento! E sofreu, por destinado
Naquela casa vazia Sua primeira agressão.
Que ele mesmo levantara Teve seu rosto cuspido
Um mundo novo nascia Teve seu braço quebrado
De que sequer suspeitava. Mas quando foi perguntado
O operário emocionado O operário disse: Não!
Olhou sua própria mão Em vão sofrera o operário
Sua rude mão de operário Sua primeira agressão
De operário em construção Muitas outras se seguiram
E olhando bem para ela Muitas outras seguirão.
Teve um segundo a impressão Porém, por imprescindível
De que não havia no mundo Ao edifício em construção
Coisa que fosse mais bela. Seu trabalho prosseguia
Foi dentro da compreensão E todo o seu sofrimento
Desse instante solitário Misturava-se ao cimento
Que, tal sua construção Da construção que crescia.
Cresceu também o operário. Sentindo que a violência
Cresceu em alto e profundo Não dobraria o operário
Em largo e no coração Um dia tentou o patrão
E como tudo que cresce Dobrá-lo de modo vário.
Ele não cresceu em vão De sorte que o foi levando
Pois além do que sabia Ao alto da construção
- Exercer a profissão - E num momento de tempo
O operário adquiriu Mostrou-lhe toda a região
Uma nova dimensão: E apontando-a ao operário
A dimensão da poesia. Fez-lhe esta declaração:
E um fato novo se viu - Dar-te-ei todo esse poder
Que a todos admirava: E a sua satisfação
O que o operário dizia Porque a mim me foi entregue
Outro operário escutava. E dou-o a quem bem quiser.
E foi assim que o operário Dou-te tempo de lazer
Do edifício em construção Dou-te tempo de mulher.
Que sempre dizia sim Portanto, tudo o que vês
Começou a dizer não. Será teu se me adorares
E aprendeu a notar coisas E, ainda mais, se abandonares
A que não dava atenção: O que te faz dizer não.
Notou que sua marmita Disse, e fitou o operário
Era o prato do patrão Que olhava e que refletia
Que sua cerveja preta Mas o que via o operário
Era o uísque do patrão O patrão nunca veria.
Que seu macacão de zuarte O operário via as casas
Era o terno do patrão E dentro das estruturas
Que o casebre onde morava Via coisas, objetos
Era a mansão do patrão Produtos, manufaturas.
Que seus dois pés andarilhos Via tudo o que fazia
Eram as rodas do patrão O lucro do seu patrão
Que a dureza do seu dia E em cada coisa que via
Era a noite do patrão Misteriosamente havia
Que sua imensa fadiga A marca de sua mão.
Era amiga do patrão. E o operário disse: Não!
E o operário disse: Não! - Loucura! - gritou o patrão
E o operário fez-se forte Não vês o que te dou eu?
Na sua resolução.
- Mentira! - disse o operário E o operário ouviu a voz
Não podes dar-me o que é meu. De todos os seus irmãos
E um grande silêncio fez-se Os seus irmãos que morreram
Dentro do seu coração Por outros que viverão.
Um silêncio de martírios Uma esperança sincera
Um silêncio de prisão. Cresceu no seu coração
Um silêncio povoado E dentro da tarde mansa
De pedidos de perdão Agigantou-se a razão
Um silêncio apavorado De um homem pobre e esquecido
Com o medo em solidão. Razão porém que fizera
Um silêncio de torturas Em operário construído
E gritos de maldição O operário em construção.
Um silêncio de fraturas
A se arrastarem no chão.
Comentário- Este poema, produzido no final da carreira de Vinícius, mostra que a abertura para a solidariedade provocou no poeta
a simpatia pelos ideais socialistas, o que se percebe na representação da luta de classes a partir da 5ª estrofe do trecho acima
apresentado e principalmente na valorização da consciência de classe, caminho essencial para a revolução libertadora do
proletariado. Vale a pena lembrar que a forma da redondilha e o aspecto dramático-narrativo do texto autorizando a considerá-lo
uma balada.É interessante ressaltar, ainda, que a herança católica do poeta, anunciada na epígrafe bíblica no texto, estabelece um
diálogo entre cristianismo e marxismo, igualando o martírio engrandecedor de Jesus ao martírio do trabalhador.Assim,Vinícius,
sempre antenado no mundo presente, assume os ideais do setor progressista da Igreja Católica que tanta atenção chamou nos idos
dos anos 60 e70 do século XX.
Leia o trecho de “Operário em construção”, de Vinicius de Moraes, e as afirmativas, preenchendo os parênteses com V para
verdadeiro e F para falso.
Era ele quem os fazia
Ele, um humilde operário,
Um operário em construção.
Olhou em torno: gamela
Banco, enxerga, caldeirão
Vidro, parede, janela
Casa, cidade, nação!
Tudo, tudo o que existia
Era ele quem o fazia
Ele, um humilde operário
Um operário que sabia
Exercer a profissão.