Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
INTRODUÇÃO
1
Trabalho orientado pela Prof.ª Dr.ª Valéria Cristina Pereira, no curso de Geografia do Instituto de
Estudos Sócioambientais, na Universidade Federal de Goiás (IESA/UFG), resultado de uma pesquisa
fruto de um projeto de PIBIC.
partir do espaço urbano que os habitantes consolidam o seu cotidiano e compõem
sentidos sobre os lugares.
Para Bachelard (1997) “[...] A imaginação não é, como sugere a etimologia, a
faculdade de formar imagens da realidade; é a faculdade de formar imagens que
ultrapassam a realidade, que cantam a realidade.” (p.17-18). Ou seja, as imagens
captadas nas obras, viabilizarão o estudo do imaginário e da paisagem em relação ao
espaço urbano da cidade de Goiânia, na medida em que a atividade artística permite a
penetração no que se encontra escondido, pois se “a imagem de uma obra de arte
repercute no sujeito, e essa repercussão nos chama a um aprofundamento de nossa
própria existência” (BARBOSA, 2006, p. 48), então a literatura e as artes plásticas
fornecerão meios para desvendar o que compõe essa paisagem.
Para Bachelard (1993), o estudo da imagem poética só é possível através do
entendimento do fenômeno da imagem, quando esta emerge na consciência como
produto do ser e, assim, só uma “fenomenologia da imaginação” seria capaz de
“reconstituir a subjetividade das imagens e a medir a amplitude, a força, o sentido da
transubjetividade da imagem.” (BACHELARD, 1993, p. 3). Assim, será possível captar
a subjetividade das imagens contidas nas expressões artísticas goianienses que iremos
analisar, sendo elas: as imagens poéticas e os grafittis.
2
A palavra sertão tem o sentido de lugar incerto, longe do litoral etc.
interior, intrínseco ao da natureza. Diferentemente do ritmo que estabelecia-se na nova
capital que “[...] trazia consigo um conteúdo simbólico que apontava para ideais de
novos tempos de desenvolvimento e progresso.” (MELLO, 2006, p. 31). Goiânia
carrega em si muito dessa cidade moderna que busca romper com as tradições, porém é
vivida por uma população que tenta realizar-se em meio às tradições.
Nesse sentido, esse “choque de contrários” fez-se muito presente na época de sua
construção, como percebe-se na Foto 1, em que na frente do prédio que ficaria alocada a
administração da cidade, o Palácio das Esmeraldas, sendo portanto um símbolo de
poder e de modernidade, havia um carro de bois passando simbolizando o arcaico, o
tradicional .
Finalmente, ao dizer que “é preciso pôr logo os pingos nos is/ e arranjar rima/ em –
ória/ em –ésio/ pra acabar com essa triste história/ que ficou do césio.”, o autor faz
referência a um dos maiores acidentes radiológicos do mundo acontecido em Goiânia,
no ano de 19873.
Nesse sentido, o autor coloca o quanto a tragédia configura-se como um trauma na
memória em construção da cidade. Sendo uma “ferida aberta” que marcou a literatura,
gerando o que Oliveira (2005) nomina de “literatura do trauma”, além de ter deixado
marcas na paisagem da cidade, pois a área onde a cápsula do elemento foi aberta ainda é
reservada, impossibilitada de ser habitada por tempo indeterminado. A ferida azul do
césio deixou marcas no imaginário urbano não só pelo isolamento do local em que o
material começou a ser espalhado, mas pelo isolamento que a cidade sofreu na época do
acidente. Para, além disso, a mudança na imagem da cidade que, anteriormente,
externava-se positiva, de progresso e desenvolvimento e que após o episódio passou por
3
Em uma escala de 0 a 7, o acidente teve nível 5 e fica atrás dos acidentes nas cidades de Chernobil, na
Ucrânia em 1986, e em Fukushima, no Japão em 2011. O acidente em Chernobil deixou a cidade
desabitada após a explosão de um dos reatores da usina nuclear que ficava na cidade, pois altos níveis de
radiação foram, e ainda são registrados no local. O acidente em Fukushima levou a contaminação
radioativa do Oceano Pacífico que ainda levará décadas para ser limpo. Tanto o evento na Ucrânia quanto
no Japão tiveram nível 7 de gravidade.
preconceitos de âmbito internacional vivendo um verdadeiro trauma (OLIVEIRA, 2005,
p.186)
Com o exemplo dessa análise, dizemos que a literatura goianiense tem como
lócus de criação Goiás e/ou Goiânia e faz referência à vida do sertanejo: desde o seu
modo de falar, até sua forma de pensar e agir com a natureza, além de abordar a relação
com a cidade e a percepção da realidade ao redor. Essa literatura faz-se demasiadamente
clara, sem nebulosidades, gira em torno dos mesmos temas: a natureza, o acidente do
césio 137, a dualidade entre a modernidade e o sertão e o sertanejo. Nesse sentido,
pode-se dizer que essa literatura tem um caráter geográfico, que abarcam questões
relativas ao espaço da capital planejada e do estado sertanejo.
A PAISAGEM GOIANIENSE
RESULTADOS PRELIMINARES
Essa pesquisa mostrou-nos que a literatura é fonte de embasamento para
perceber o quão profunda é a dualidade modernidade x sertão no imaginário de
Goiânia, caracterizando sua origem, seu cerne de criação.
Porém, a literatura não extrapola o que há de contemporâneo na paisagem da
cidade, permanecendo com a atenção voltada à vida do sertanejo. Apesar de ter sido
pelo viés da literatura que percebeu-se uma certa sofisticação do espaço da cidade
apresentada nos discursos literários. Os elementos de sofisticação acabam
aparecendo na paisagem na forma de novos elementos urbanos que chegam à cidade,
como os grafittis. Apesar disso, a característica sertaneja da literatura dificultou a
percepção no que há de diferente na paisagem da capital, pois, ao embebedar-se por
essa literatura clara e sem nebulosidades, por momentos, pensou-se que Goiânia
fosse como Aglaura (CALVINO, 1997): uma cidade que não diz nada mais do que
os seus próprios habitantes dizem.
Porém, as manifestações dos grafittis na cidade apresentaram traços da
contemporaneidade que não percebeu-se na literatura. Os grafittis foram à porta de
entrada para a percepção de uma nova imagem da capital, a de uma Goiânia
metropolitana e não sertaneja; a de uma cidade que está reelaborando-se, elaborando
novos significados e resignificando os que já existem.
BIBLIOGRAFIA
MELLO, Márcia Metran de. Goiânia: cidade de pedras e de palavras. Goiânia, Editora
da Universidade Federal de Goiás, 2006.
SILVA, Valéria Cristina da. Palmas, a última capital projetada do século XX: uma
cidade em busca do tempo. [online]. São Paulo: Editora UNESP; São Paulo: Cultura
Acadêmica, 2010. 294 p. ISBN 978-85-7983-092-1. Disponível em:
<http://books.scielo.org>. Acesso em: 01/07/2015.