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O Método do Referencial Móvel

Publicações Matemáticas

O Método do Referencial Móvel

Manfredo do Carmo
IMPA

impa
Copyright  2012 by Manfredo do Carmo
Impresso no Brasil / Printed in Brazil
Capa: Noni Geiger / Sérgio R. Vaz
Publicações Matemáticas
• Introdução à Topologia Diferencial – Elon Lages Lima
• Criptografia, Números Primos e Algoritmos – Manoel Lemos
• Introdução à Economia Dinâmica e Mercados Incompletos – Aloísio Araújo
• Conjuntos de Cantor, Dinâmica e Aritmética – Carlos Gustavo Moreira
• Geometria Hiperbólica – João Lucas Marques Barbosa
• Introdução à Economia Matemática – Aloísio Araújo
• Superfícies Mínimas – Manfredo Perdigão do Carmo
• The Index Formula for Dirac Operators: an Introduction – Levi Lopes de Lima
• Introduction to Symplectic and Hamiltonian Geometry – Ana Cannas da Silva
• Primos de Mersenne (e outros primos muito grandes) – Carlos Gustavo T. A. Moreira e Nicolau
Saldanha
• The Contact Process on Graphs – Márcia Salzano
• Canonical Metrics on Compact almost Complex Manifolds – Santiago R. Simanca
• Introduction to Toric Varieties – Jean-Paul Brasselet
• Birational Geometry of Foliations – Marco Brunella
• Introdução à Teoria das Probabilidades – Pedro J. Fernandez
• Teoria dos Corpos – Otto Endler
• Introdução à Dinâmica de Aplicações do Tipo Twist – Clodoaldo G. Ragazzo, Mário J. Dias
Carneiro e Salvador Addas Zanata
• Elementos de Estatística Computacional usando Plataformas de Software Livre/Gratuito –
Alejandro C. Frery e Francisco Cribari-Neto
• Uma Introdução a Soluções de Viscosidade para Equações de Hamilton-Jacobi – Helena J.
Nussenzveig Lopes, Milton C. Lopes Filho
• Elements of Analytic Hypoellipticity – Nicholas Hanges
• Métodos Clássicos em Teoria do Potencial – Augusto Ponce
• Variedades Diferenciáveis – Elon Lages Lima
• O Método do Referencial Móvel – Manfredo do Carmo
• A Student's Guide to Symplectic Spaces, Grassmannians and Maslov Index – Paolo Piccione e
Daniel Victor Tausk
• Métodos Topológicos en el Análisis no Lineal – Pablo Amster
• Tópicos em Combinatória Contemporânea – Carlos Gustavo Moreira e Yoshiharu Kohayakawa
• Uma Iniciação aos Sistemas Dinâmicos Estocásticos – Paulo Ruffino
• Compressive Sensing – Adriana Schulz, Eduardo A.B.. da Silva e Luiz Velho
• O Teorema de Poncelet – Marcos Sebastiani
• Cálculo Tensorial – Elon Lages Lima
• Aspectos Ergódicos da Teoria dos Números – Alexander Arbieto, Carlos Matheus e C. G.
Moreira
• A Survey on Hiperbolicity of Projective Hypersurfaces – Simone Diverio e Erwan Rousseau
• Algebraic Stacks and Moduli of Vector Bundles – Frank Neumann
• O Teorema de Sard e suas Aplicações – Edson Durão Júdice
• Tópicos de Mecânica Clássica – Artur Lopes

IMPA - ddic@impa.br - http://www.impa.br - ISBN: 978-85-244- 0281-4


Este ainda é para a Claudia
Prefácio da 1¯a edição

Estas notas constituem parte de um curso dado no IMPA no perı́odo


Março-Junho de 1976 e foram preparadas especialmente para a Terceira
Escola Latino-Americana de Matemática.
O objetivo das notas é apresentar o método do referencial móvel em
Geometria Diferencial a partir de um mı́nimo de prerequisitos. A leitura
das notas pressupõe apenas um curso de geometria diferencial de curvas e
superfı́cies, noções de variedades diferenciáveis e uma certa familiaridade
com formas diferenciais em variedades.
A fim de evitar apelos a conhecimentos de Grupos de Lie, restringimo-
nos à estrutura riemaniana, que corresponde ao grupo ortogonal. De resto,
o grupo ortogonal possui aparentemente aquela medida de complexidade
que torna o estudo da sua geometria uma tarefa não trivial porém tratável.
No primeiro capı́tulo estabelecemos os fatos fundamentais do método do
referencial móvel. Adotamos o ponto de vista de partir do R n e ir constru-
indo progressivamente as situações mais gerais. Entre as aplicações feitas
neste capı́tulo, encontram-se um teorema de E. Cartan sobre a determinação
local da métrica pela curvatura, o cálculo da curvatura do fibrado tangente
unitário da esfera S 2 , e um teorema de E. Hopf sobre funções subharmônicas
em variedades riemanianas compactas. O capı́tulo pode ser considerado
como uma breve introdução à Geometria Riemaniana pelo método do refe-
rencial móvel.
No segundo capı́tulo apresentamos algumas aplicações a problemas de
imersões em espaços de curvatura constante. Demonstramos o lema de
Chern e Lashof para espaços de curvatura constante (ao que saibamos, esta
forma do lema não se encontra publicada), o teorema de Sacksteder para
o caso compacto (K ≥ 0), o teorema de unicidade de Cohn-Vossen (K ≥
0), alguns resultados recentes sobre redução de codimensão, o teorema de
unicidade de Allendoerfer e, finalmente, o teorema de Chern e Lashof sobre
a curvatura total.
O leitor (ou leitora) poderá se restringir ao uso particular de imersões
em espaços euclideanos, em cujo caso as Seções 6 e 11 do Capı́tulo I poderão
ser omitidas.
Durante a preparação destas notas utilizamos livremente as fontes exis-
tentes, tanto escritas como orais. É impossı́vel dar crédito a todas mas
gostarı́amos de destacar vários cursos feitos em Berkeley com S.S. Chern,
com quem aprendemos a “ver” o método do referencial móvel.
Desejamos agradecer aos alunos e colegas que participaram das dis-
cussões sobre este curso durante as exposições orais, e a Wilson Góes pela
esmerada digitação. Agradecimentos especiais são devidos a Antonio Car-
los Asperti e Renato Tribuzy que leram criticamente todo o manuscrito,
corrigiram vários erros e apresentaram inúmeras sugestões.

Rio, 27 de Maio de 1976

Manfredo Perdigão do Carmo


Prefácio da 2¯a edição

Para esta edição, corrigı́ alguns erros matemáticos e tipográficos, que


me foram bondosamente apontados por colegas e alunos, aos quais agradeço
penhoradamente. Além disto, atualizei, o tanto quanto me foi possı́vel, a
Bibliografia, e introduzı́ algumas referências adicionais que se reportam a
problemas tratados no texto. No mais, o texto permanece o mesmo.
Desejo agradecer a Wilson Góes, que datilografou a 1a¯ edição e digitou
a atual. Agradecimentos são também devidos a Rogério Dias Trindade pela
editoração desta edição.

Rio, junho de 2008

Manfredo Perdigão do Carmo


Índice

Capı́tulo 1: O Método do Referencial Móvel . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1


1.1 Equações de estrutura do Rn . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
1.2 O lema de Cartan e a unicidade das formas de conexão . . . . . . . . 5
1.3 Aplicações às superfı́cies em R3 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
1.4 O Teorema de Gauss-Bonnet para superfı́cies compactas . . . . . . . 13
1.5 Subvariedades de um espaço euclideano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
1.6 Variedades riemanianas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24
1.7 Tensores em variedades riemanianas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
1.8 Equações de estrutura em referenciais geodésicos;
determinação local da métrica pela curvatura . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46
1.9 Imersões riemanianas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51
1.10 Globalização do método do referencial móvel . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61
1.11 Um modelo para o espaço hiperbólico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69

Capı́tulo 2: Imersões em um espaço de curvatura


constante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76
2.1 Hipersuperfı́cies em um espaço de curvatura constante.
O lema de Chern e Lashof. Convexidade e curvatura . . . . . . . . . . 76
2.2 Unicidade de hipersuperfı́cies. O Teorema de
Cohn-Vossen . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89
2.3 Posto e número tipo de uma imersão. Redução de
codimensão. As formas de ordem superior de
uma imersão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 100
2.4 O Teorema de Allendoerfer. Curvatura total de uma
imersão. O Teorema de Chern e Lashof . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .116

Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 127

Referências adicionais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 130


Capı́tulo 1

O Método do Referencial
Móvel
1.1 Equações de estrutura do Rn
Uma variedade riemaniana é uma variedade diferenciável M e uma escolha,
para cada ponto p ∈ M , de um produto interno positivo definido h , ip no
espaço tangente Tp (M ) de M em p, que varia diferenciavelmente com p no
seguinte sentido: Se X e Y são campos diferenciáveis de vetores em M , então
a função p 7→ hX, Y ip , p ∈ M , é diferenciável em M . Diferenciável sempre
significará de classe C ∞ . O produto interno h , i é usualmente chamado
uma métrica riemaniana em M .
A noção natural de equivalência entre variedades riemanianas é a noção
de isometria. Um difeomorfismo f : M → M 0 entre duas variedades rie-
manianas M de M 0 é uma isometria se para todo p ∈ M e todo par
X, Y ∈ Tp (M ), tem-se

hX, Y ip = hdfp (X), dfp (Y )if (p) .

A importância da noção de variedade riemaniana é que nela podemos


definir as noções métricas usuais (ângulo, comprimentos, áreas, etc.) da
geometria euclideana. Em verdade, a geometria euclideana é o estudo das
noções métricas na mais simples de todas as variedades riemanianas, a saber,
o Rn munido da estrutura diferenciável usual e do seguinte produto interno:
Se u = (u1 , . . . , un ) e v = (v1 , . . . , vn ) são vetores do Rn , define-se

hu, vip = u1 v1 + · · · + un vn , para todo p ∈ Rn .

Observe-se que estamos identificando os espaços tangentes do R n com o


espaço vetorial Rn .

1
2 Equações de estrutura do Rn Seção 1.1

Mesmo sendo a variedade riemaniana mais simples, o R n é, em um certo


sentido, a variedade riemaniana universal. Isto ficará mais claro à medida
que formos desenvolvendo o método do referencial móvel que pretendemos
utilizar nestas notas.
Iniciaremos, portanto, estabelecendo as chamadas equações de estrutura
do Rn .
Seja U ⊂ Rn um aberto do Rn e sejam e1 , . . . , en n campos diferenciáveis
de vetores em U de tal modo que, para todo p ∈ U , se tenha hei , ej ip = δij ,
onde δij = 0 se i 6= j e δij = 1 se i = j, i, j = 1, . . . , n. Um tal conjunto de
campos de vetores é chamado um referencial ortonormal móvel em U . De
agora por diante omitiremos os adjetivos ortonormal e móvel.
A partir do referencial {ei } podemos definir formas diferenciais lineares
pela condição ωi (ej ) = δij ; em outras palavras, em cada ponto p ∈ U , a base
{(ωi )p } é a base dual da base {(ei )p }. O conjunto das formas diferenciais
{ωi } é chamado o coreferencial associado ao referencial {ei }.
Cada campo ei pode ser pensado como uma aplicação diferenciável
ei : U ⊂ Rn → Rn . A diferencial (dei )p : Rn → Rn , em p ∈ U , é uma
aplicação linear. Portanto, para todo v ∈ Rn , podemos escrever
X
(dei )p (v) = (ωij )p (v)ej .
j

É imediato verificar que as expressões (ωij )p (v), acima definidas, dependem


linearmente de v. Portanto (ωij )p é uma forma linear em Rn . Como ei
é um campo diferenciável, ωij é uma forma diferencial linear. Com estes
signficados em mente, escreveremos
X
dei = ωij ej , (1)
j

como definição das formas ωij , que são chamadas formas de conexão do Rn
no referencial {ei }.
Derivando a expressão hei , ej i = δij , obteremos

0 = hdei , ej i + hei , dej i = ωij + ωji ,

isto é, as formas de conexão ωij = −ωji são antisimétricas nos ı́ndices i, j.
O ponto fundamental no método do referencial móvel é que as formas
ωi , ωij satisfazem as chamadas equações de estrutura de Elie Cartan.
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 3

Teorema 1 (equações de estrutura do Rn ). Seja {ei } um referencial


ortonormal móvel em um aberto U ⊂ Rn . Sejam {ωi } o coreferencial asso-
ciado a {ei }, e ωij as formas de conexão de U no referencial {ei }. Então:
X
dωi = ωk ∧ ωki , (2)
k
X
dωij = ωik ∧ ωkj , k = 1, . . . , n. (3)
k

Demonstração: Seja ai = (1, 0, . . . , 0), a2 = (0, 1, 0, . . . , o), . . . ,


an = (0, 0, . . . , 0, 1) a base canônica do Rn e seja xi : U → R a função
que faz corresponder a cada ponto p = (x1 , . . . , xn ) ∈ U e sua i-ésima co-
ordenada. Então dxi é uma forma diferencial em U , e como dxi (aj ) = δij ,
concluı́mos que {dxi } é o coreferencial associado ao referencial {ai }.
O referencial dado se exprime em termos dos ai por
X
ei = βij aj , (4)
j

onde os βij são funções diferenciáveis em U e, para cada p ∈ U , a matriz


(βij (p)) é uma matriz ortogonal. Como ωi (ej ) = δij , temos
X
ωi = βij dxj . (5)
j

Diferenciando (4), obteremos


X X X
dei = dβik ak = dβik βjk ej .
k k j
P
Como dei = ωij ej , concluı́mos que
j
X
ωij = dβik βjk , (6)
k

ou seja X X
ωij βjs = dβik βjk βjs = d βis , s = 1, . . . , n. (7)
j jk

Finalmente, diferenciando exteriormente (5) e usando (7), obteremos


X X X
dωi = dβij ∧ dxj = ωik βkj ∧ dxj = ωk ∧ ωki ,
j jk k

que é a primeira equação de estrutura (2).


4 Equações de estrutura do Rn Seção 1.1

Diferenciando (6) e usando (7), obteremos

X X ½¡ X
n
¢ ¡X ¢
¾
dωij = − dβik ∧ dβjk = − ωi` β`k ∧ ωjs βsk
k k `=1 s
X X
=− ωis ∧ ωjs = ωik ∧ ωkj ,
s k

que é a segunda equação de estrutura (3).

A idéia básica do método do referencial móvel pode ser descrita da


maneira seguinte.
Seja x : M → Rn+q uma imersão de uma variedade diferenciável de
dimensão n em um espaço euclideano Rn+q (dizer que x é uma imersão
é dizer que x é diferenciável e que a diferencial dxp : Tp (M ) → Rn+q é
injetiva para todo ponto p ∈ M ). É uma conseqüência do teorema da
função inversa que, para todo p ∈ M , existe uma vizinhança U ⊂ M de p
tal que a restrição x|U de x a U é injetiva. Seja V ⊂ R n+q uma vizinhança
de x(p) em Rn+q de tal modo que V ⊃ x(U ). Admitamos © V suficientemente
ª
pequeno para que exista um referencial móvel e1 , . . . , en , en+1 , . . . , en+q
em V com a propriedade que, quando restritos a x(U ), os vetores e1 , . . . , en
sejam tangentes a x(U ) e os vetores en+1 , . . . , en+q sejam normais a x(U ).
Um tal referencial é dito um referencial adaptado a x.
A existência de um referencial adaptado pode ser provada da seguinte
maneira. Se V é suficientemente pequeno, existe um difeomorfismo g : V →
V tal que g ◦x(U ) é um aberto de uma subvariedade linear de dimensão n de
Rn+q . A existência de um referencial f1 , . . . , fn , fn+1 , . . . , fn+q adaptado a
g ◦ x(U ) em g(V ) é imediata. A imagem inversa dg −1 (f1 ), . . . , dg −1 (fn+q )
de um tal referencial pode não ser ortonormal. Usaremos então o processo
de ortonormalização de Gram-Schmidt em cada ponto de V . Observando
que os vetores obtidos por um tal processo “variam diferenciavelmente” com
os vetores dados, obteremos em V um referencial ortonormal adaptado a
x(U ).
Em V estão definidas as formas ωi do coreferencial de {ei } e as formas de
conexão ωij que satisfazem as equações de estrutura (2) e (3). A aplicação
x : U ⊂ M → V ⊂ Rn+q induz formas diferenciais x∗ (ωi ), x∗ (ωij ) em U .
Como x∗ comuta com a derivação exterior e com o produto exterior, tais
formas em U satisfazem as equações de estrutura (2) e (3). Acontece que
toda a geometria métrica local da imersão x está contida nestas equações
de estrutura, o que reflete o caráter “universal” do Rn .
A justificativa da afirmação acima não pode ser dada agora mas espera-
mos torná-la clara antes de terminar este capı́tulo.
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 5

1.2 O lema de Cartan e a unicidade das formas de conexão


Antes de darmos aplicações do método do referencial móvel, precisamos de
alguns lemas preliminares.
Inciaremos com um fato puramente algébrico. Recordemos que se ω1 , ω2
são formas lineares em um espaço vetorial V de dimensão n, então o produto
exterior ω1 ∧ω2 de ω1 com ω2 é a forma bilinear alternada ω1 ∧ω2 : V ×V →
R dada por
(ω1 ∧ ω2 )(v1 , v2 ) = ω1 (v1 )ω2 (v2 ) − ω1 (v2 )ω2 (v1 ), v1 , v2 ∈ V.
Além disto, se ω1 , . . . , ωn é uma base para o espaço das formas lineares V ∗ ,
então ωi ∧ ωj , i < j, i, j = 1, . . . , n, formam uma base para o espaço Λ2 V ∗
das formas bilineares alternadas de V × V .
Lema (Cartan). Seja V um espaço vetorial de dimensão n. Sejam
ω1 , . . . , ωr : V → R, r ≤ n, formas lineares de V linearmente independentes.
Suponhamos que existam formas lineares θ1 , . . . , θr : V → R satisfazendo a
Pr
seguinte condição: ωi ∧ θi = 0. Então
i=1
X
θi = aij ωj , i, j = 1, . . . , r, aij = aji .
j

Demonstração: Completemos as formas ω1 , . . . , ωr , em uma base


ω1 , . . . , ωr , ωr+1 , . . . , ωn de V ∗ e escrevamos
X X
θi = aij ωj + bi` ω` , ` = r + 1, . . . , n.
j `
P
Basta agora observar que a condição ωi ∧ θi = 0 implica em que
i
X X X X X
0= ωi ∧ θ i = ωi ∧ aij ωj + ωi ∧ bi` ω`
i i j ` `
X X
= (aij − aji )ωi ∧ ωj + bi` ωi ∧ ω` .
i<j i<`

Como os ωk ∧ ωs , k < s, k, s = 1, . . . , n, são linearmente independentes,


conclui-se que aij = aji e bi` = 0.

Lema 2. Seja U ⊂ Rn . Sejam ω1 , . . . , ωn formas diferenciais linearmente


independentes em U . Suponha que exista em U um conjunto de 1-formas
diferenciais ωij satisfazendo as condições:
X
ωij = −ωji , dωj = ωk ∧ ωkj .
k
6 Aplicações às superfı́cies em R3 Seção 1.3

Então um tal conjunto é único.


Demonstração: Suponhamos que exista um outro conjunto de formas ω̄ ij
com X
ω̄ij = −ω̄ji , dωj = ωk ∧ ω̄kj .
k
P
Então ωk ∧ (ω̄kj − ωkj ) = 0, e pelo lema de Cartan,
k
X j j j
ω̄kj − ωkj = Bki ωi , Bki = Bik .
i

Observe que
X j
X
k
ω̄kj − ωkj = Bki ωi = −(ω̄jk − ωjk ) = − Bji ωi
i i

j k
e, como os ωi são linearmente independentes, Bki = −Bji . Usando as
simetrias obtidas, concluı́mos que
k j j i i k k
Bji = −Bki = −Bik = Bjk = Bkj = −Bij = −Bji = 0,

ou seja, que ω̄kj = ωkj .

1.3 Aplicações às superfı́cies em R3


Vamos aplicar o método do referencial móvel a um caso particular razoavel-
mente bem conhecido, a saber, a teoria das superfı́cies em R 3 .
Seja S uma variedade diferenciável de dimensão 2 e x : S → R 3 uma
imersão. Para cada ponto p ∈ S fica então definido um produto interno
h , ip em Pp (S) pela regra: se v1 , v2 ∈ Tp (S),

hv1 , v2 ip = hdxp (v1 ), dxp (v2 )i,

onde no segundo membro aparece o produto interno usual do R 3 . É imediato


verificar que h , ip é diferenciável e define, portanto, uma métrica riemaniana
em S, chamada a métrica induzida pela imersão x.
Vamos estudar a geometria local de S em torno de um ponto p ∈ S.
Seja U ⊂ S uma vizinhança de p em S tal que a restrição x|U seja injetiva.
Seja V uma vizinhança de x(p) em R3 tal que V ⊃ x(U ). Tomando V e U
suficientemente pequenos, podemos escolher em V um referencial ortonor-
mal móvel e1 , e2 , e3 , adaptado a x, isto é, de modo que, quando restritos a
x(U ), e1 , e2 sejam tangentes a x(U ) (e3 será então normal a x(U )).
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 7

Em V estão definidas as formas ωi do coreferencial de {ei }, i = 1, 2, 3 e


as formas de conexão ω12 = −ω21 , ω32 = −ω23 , ω13 = −ω31 . Tais formas
satisfazem em V as equações de estrutura:

dω1 = ω2 ∧ ω21 + ω3 ∧ ω31 ,


dω2 = ω1 ∧ ω12 + ω3 ∧ ω32 ,
dω3 = ω1 ∧ ω13 + ω2 ∧ ω23 ,
dω12 = ω13 ∧ ω32 ,
dω13 = ω12 ∧ ω23 ,
dω23 = ω21 ∧ ω13 .

A imersão x : U ⊂ S → V ⊂ R3 induz em U formas x∗ (ωi ), x∗ (ωij ), i, j =


1, 2, 3. Como x∗ comuta com d e ∧, tais formas satisfazem as mesmas
equações acima. Observe-se que x∗ (ω3 ) = 0, pois para todo q ∈ U e todo
v ∈ Tq (S), teremos dx(v) = a1 e1 + a2 e2 , e portanto

(x∗ ω3 )(v) = ω3 (dx(v)) = ω3 (a1 e1 + a2 e2 ) = 0.

Para não sobrecarregar a notação, e como só vamos, em geral, tratar de


formas em U , convencionaremos escrever

x ∗ ωi = ω i , x∗ ωij = ωij .

Esta convenção equivale a pensar em U como um subconjunto de R 3 pela


inclusão x (observe que x|U é injetiva) e pensar nas formas ωi , ωij como
restritas a U ⊂ V ⊂ R3 . Tais formas satisfazem portanto as equações acima,
com a relação adicional ω3 = 0.
Passemos agora ao estudo da geometria local de S. Como ω3 = 0, temos
que
dω3 = ω1 ∧ ω13 + ω2 ∧ ω23 = 0
e, pelo lema de Cartan,

ω13 = h11 ω1 + h12 ω2 ,


ω23 = h21 ω1 + h22 ω2 ,

onde hij = hji , i, j = 1, 2, são funções diferenciáveis em U . Para interpretar


geometricamente estas funções, observemos que, por um lado,

ω13 (e1 ) = h11 ω1 (e1 ) + h12 ω2 (e1 ) = h11 ,


ω13 (e2 ) = h12 ,
ω23 (e1 ) = h21 ,
ω23 (e2 ) = h22 ,
8 Aplicações às superfı́cies em R3 Seção 1.3

P
e, por outro lado, como dei = ωij ej ,
j

de3 (v) = ω31 (v)e1 + ω32 (v)e2 ,


para todo q ∈ U e todo v ∈ Tq (S). Portanto, escrevendo v = a1 e1 + a2 e2 ,
obteremos µ ¶ µ ¶µ ¶
a1 −h11 −h12 a1
de3 = = ,
a2 −h21 −h22 a2
isto é, (−hij ) é a matriz da diferencial da aplicação e3 : U → R3 na base
{e1 , e2 }. Como |e3 | = 1, esta última aplicação toma valores na esfera
unitária S 2 ⊂ R3 . Fixemos orientações em U e R3 e escolhamos o refe-
rencial {e1 , e2 , e3 } de tal modo que, para todo q ∈ U , (e1 )q (e2 )q seja uma
base de Tq (S) na orientação escolhida e (e1 )q , (e2 )q , (e3 )q seja uma base
positiva de R3 ; um tal referencial é dito compatı́vel com as orientações de
U e R3 . Neste caso, a aplicação e3 : U → S 2 ⊂ R3 está completamente
definida e é chamada a aplicação normal de Gauss em U . Portanto (−hij )
é a matriz da diferencial da aplicação normal de Gauss na base {e1 , e2 }.
Observe que quando S é orientada é possı́vel definir a aplicação normal
de Gauss globalmente em S.
Como hij é uma matriz simétrica, concluı́mos imediatamente que a dife-
rencial da aplicação normal de Gauss é uma aplicação linear auto-adjunta.
Por um resultado de Álgebra Linear, uma tal aplicação linear pode ser
diagonalizada, com valores próprios −λ1 , −λ2 reais, e vetores próprios or-
togonais.
É usual definir a curvatura Gaussiana K de S em p por
K = det(de3 )p = λ1 λ2 = h11 h22 − h212 ,
onde as funções envolvidas estão calculadas em p. Decorre da definição de
K que
dω12 = ω13 ∧ ω32 = −(h11 ω1 + h12 ω2 ) ∧ (h21 ω1 + h22 ω2 ) =
= −(h11 h22 − h212 )ω1 ∧ ω2 = −Kω1 ∧ ω2 .
A expressão dω12 = −Kω1 ∧ ω2 permite demonstrar um dos teoremas
mais importantes da teoria das superfı́cies, descoberto por Gauss.
Teorema (Gauss). K depende apenas da métrica induzida de S, isto é, se
x, x0 : S → R3 são duas imersões de S tais que as métricas induzidas em S
por x e x0 coincidem, então K(p) = K 0 (p), p ∈ S, onde K e K 0 indicam as
curvaturas Gaussianas de x e x0 , respectivamente.
Demonstração: Considere um referencial {e1 , e2 } em um aberto U ⊂ M ,
ortonormal na métrica induzida. Então, {dx(e1 ), dx(e2 )} pode ser esten-
dido a um referencial adaptado a V ⊃ x(U ). Analogamente, {dx0 (e1 ),
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 9

dx0 (e2 )} pode ser estendido a um referencial adaptado em V ⊃ x(U ). Indi-


caremos por 0 as entidades referentes à imersão x0 . Como as métricas in-
duzidas por x e x0 coincidem, ω1 = ω10 e ω2 = ω20 . Pelo Lema 2, ω12 = ω12
0
.
Decorre daı́ que
0
dω12 = dω12 = −K ω1 ∧ ω2 = −K 0 ω10 ∧ ω20

donde K = K 0 .
O Teorema de Gauss significa que a curvatura Gaussiana, embora tenha
sido definida usando o espaço “ambiente” R3 , só depende de medidas feitas
sobre a superfı́cie. Isto levou Gauss em 1827 a imaginar a existência de
geometrias independentes do espaço ambiente. Por falta de conceitos ade-
quados (particularmente da noção de variedade diferenciável), ele não de-
senvolveu estas idéias que foram retomadas por Riemann em 1852, dando
inı́cio ao que hoje chamamos de Geometria Riemaniana.
Exemplo 1. Considere a imersão x : U ⊂ R2 → R3 , onde U é dado por

U = {(s, v) ∈ R2 ; −∞ < x < ∞, 0 < v < 2π}

e x é dado por
x(s, v) = (h(s) sen v, h(s) cos v, g(s)).
as funções h(s) e g(s) são funções diferenciáveis em s que satisfazem a
¡ ¢2 ¡ dg ¢2
condição dh
ds + ds = 1. A imagem x(U ) é uma superfı́cie de revolução
do eixo 0z cuja curva geratriz y = h(s), z = g(s) é parametrizada pelo
comprimento de arco de s.
Vamos mostrar que a curvatura desta superfı́cie de revolução é K =
00
− hh , onde linha indica derivada em relação a s.
Observe inicialmente que hv mede o comprimento de arco do cı́rculo
¡∂¢ ¡ ∂¢
paralelo x (const., v). Portanto e1 = dx ∂x , e2 = dx h1 ∂v são vetores
ortonormais e tangentes a x(U ). Completando-os com um vetor e3 unitário
e normal a x(U ), teremos um referencial adaptado e1 , e2 , e3 . Em verdade,
para o cálculo da curvatura, não precisaremos nos preocupar com o e3 , e
basta calcular ω1 , ω2 , ω12 .
É imediato verificar que ω1 = ds, ω2 = hdv. Usando que

0 = dω1 = ω2 ∧ ω21 = hdv ∧ ω21 ,

e que
h0 ds ∧ dv = dh ∧ dv = dω2 = ω1 ∧ ω12 = ds ∧ ω12 ,
concluı́mos que ω12 = h0 dv. Levando estes valores na expressão dω12 =
−K ω1 ∧ ω2 , obteremos finalmente

h00 ds ∧ dv = −K ds ∧ hdv,
10 Aplicações às superfı́cies em R3 Seção 1.3

ou seja,
h00
K=− ,
h
que é a expressão procurada.
Em geral, entidades geométricas em S que podem ser calculadas a partir
de ω1 , ω2 e ω12 dependem apenas da métrica induzida de S no sentido
acima mencionado, e devem poder ser definidas sem fazer menção alguma
à imersão x. Voltaremos a este assunto na Seção 1.9.
Pelo que vimos anteriormente, dada uma imersão x : S → R 3 ficam
definidas duas formas quadráticas em cada Tp (S), p ∈ S, da maneira
seguinte.
A primeira forma quadrática Ip é simplesmente a forma quadrática as-
sociada à forma bilinear h , ip isto é,

Ip (v) = hv, vi, v ∈ Tp (S).

Em um referencial local adaptado e1 , e2 , e3 , a primeira forma quadrática


se escreve
Ip (v) = (ω1 ω1 + ω2 ω2 )(v) = (ω12 + ω22 )(v), (1)
onde ω1 ω1 , por exemplo, é o produto simétrico (e não exterior) de ω1 com
ω1 , isto é, ω1 ω1 (v) = ω1 (v)ω1 (v). Para verificar (1), escrevamos v = v1 e1 +
v2 e2 . Então

Ip (v) = ω1 (v)ω1 (v) + ω2 (v)ω2 (v) = v12 + v22 = hv, vi.

Portanto a primeira forma quadrática, isto é, a métrica induzida de S, se


escreve
I = ω12 + ω22 ,
onde, como usualmente, deixamos cair a indicação do ponto p.
A segunda forma quadrática IIp é definida em um referencial local adap-
tado e1 , e2 , e3 por
X
IIp (v) = (ω13 ω1 + ω23 ω2 )(v) = hij ωi ωj (v), i, j = 1, 2,
ij

onde, de novo, os produtos de formas diferenciais são produtos simétricos.


Para que a definição faça sentido, é necessário que II não dependa do refe-
rencial escolhido. Este é o caso quando S é orientada, pois, conforme vimos,
(−hij ) é então a matriz da diferencial da aplicação normal de Gauss em um
referencial compatı́vel com a orientação. Em verdade,

IIp (v) = −hde3 (v), vip , v ∈ Tp (S).


Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 11

Uma outra interpretação geométrica de II, que será generalizada pos-


teriormente, é a seguinte. Seja U ⊂ S uma vizinhança de p e seja e1 , e2 ,
e3 um referencial em U adaptado a x e compatı́vel com a orientação de S.
Então, para todo q ∈ U e todo v ∈ Tq (S), temos

hdxq (v), (e3 )q i = 0,

ou seja,
hdx, e3 i = 0. (2)
A equação (2) significa que se α : (−ε, ε) → U é uma curva em S
parametrizada digamos, pelo comprimento de arco s, com α(0) = p e
α0 (0) = v, então, escrevendo

x ◦ α(s) = x(s), e3 ◦ α(s) = e3 (s),


¿ À
dx
teremos ds , e3 (s) = 0, donde

¿ À¯ ¿ À¯
d2 x ¯ dx de3 ¯¯
¯
, e3 (s) ¯ =− , = −hdx(v), de3 (v)i
ds2 s=0 ds ds ¯s=0

= −hdx, de3 i(v) = −hω1 e1 + ω2 e2 , ω3 e1 + ω32 e2 i(v)

= hω, ω13 + ω2 ω23 i(v) = IIp (v)

Portanto,
¿ À¯
d2 x ¯
IIp (v) = 2
, e3 (s) ¯¯ = hkn, e3 i = khn, e3 i,
ds s=0

onde k é curvatura de α e n é o seu vetor normal principal em p.


Esta última expressão é chamada a curvatura normal de α em p. Decorre
daı́ que o valor da segunda forma quadrática em um vetor v ∈ Tp (S) é o
valor da curvatura normal de qualquer curva que é tangente a v em p (o
que implica que tais curvas têm todas a mesma curvatura normal).
Um fato interessante é que as formas quadráticas I e II determinam a
imersão x : S → R3 a menos de um movimento rı́gido de R3 . Voltaremos a
este assunto posteriormente, quando demonstraremos este resultado de uma
maneira mais geral. No momento, queremos apenas chamar a atenção para
o fato que isto significa que a geometria local da imersão x está inteiramente
contida nas formas quadráticas I e II e, portanto, nas equações de estrutura
que lhes deram origem.
12 Aplicações às superfı́cies em R3 Seção 1.3

A geometria da primeira forma quadrática, isto é, o estudo das entidades


geométricas que só dependem da métrica induzida de S é chamada a ge-
ometria intrı́nseca de S. Além da curvatura Gaussiana, um outro conceito
que pode ser definido intrinsecamente é o de derivada covariante de campos
de vetores, que passaremos a introduzir.
Seja X um campo diferenciável de vetores tangentes a S e seja v ∈ Tp (S),
p ∈ S. Seja α : (−ε, ε) → S uma curva parametrizada com α(0) = p,
α0 (0) = v. Restrito à curva α, o campo X(α(t)) = X(t) é uma função
vetorial X : (−ε, ε) → R3 . Define-se a derivada covariante ∇v X de X em v
no ponto p por
µ ¶
dX
(∇v X)(p) = projeção ortogonal sobre Tp (S) de .
dt t=0
¡ ¢
Em outras palavras, (∇x X)(p) é a parte da derivada usual dX dt t=0 que é
“vista de Tp (S)”.
Para mostrar que a derivada covariante só depende da métrica induzida
de S, consideremos um referencial local adaptado e1 , e2 , e3 , definido
¡ ¢ em uma
vizinhança de p. Escrevamos X = x1 e1 + x2 e2 e calculemos dX dt t=0 , onde
X = X(t) é a restrição de X a uma curva α : (−ε, ε) → S com α(0) = p
e α0 (0) = v. Por simplicidade, deixaremos cair a indicação de t = 0 nas
expressões abaixo:
µ ¶
dX dx1 dx2 de1 de2
= ei + e2 + x 1 + x2
dt t=0 dt dt dt dt
dx1 dx2
= e1 + e2 + x1 (ω12 (v)e2 + ω13 (v)e3 )
dt dt µ ¶
dx1
+ x2 (ω21 (v)e1 + ω23 (v)e3 ) = + x2 ω21 (v) e1
dt
µ ¶
dx2
+ + x1 ω12 (v) e2 + B e3 ,
dt

onde o termo B não nos interessa. Decorre daı́ que


µ ¶ µ ¶
dx1 dx2
(∇v X)(p) = + x2 ω21 (v) e1 + + x1 ω12 (v) e2 ,
dt dt

o que mostra que ∇v X depende apenas da métrica induzida.


Observe-se que h∇v e1 , e2 i = ω12 (v) e, portanto, a derivada covariante
permite reobter a forma de conexão ω12 . Neste sentido, a noção de derivada
covariante é equivalente à noção de conexão, e a geometria da primeira forma
quadrática deve poder ser desenvolvida a partir de qualquer um destes dois
conceitos.
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 13

1.4 O Teorema de Gauss-Bonnet para superfı́cies compactas


As considerações do parágrafo anterior são estritamente locais. Entretanto,
um dos aspectos mais interessantes do método do referencial móvel é que
ele permite a demonstração de teoremas globais de difı́cil acesso por outros
métodos. Ilustraremos esta situação com a demonstração do teorema de
Gauss-Bonnet para superfı́cies compactas do R3 .
Seja S ⊂ R3 uma superfı́cie compacta e orientada do R3 . Seja p ∈ S e
V ⊂ R3 uma vizinhança de p em R3 tal que em V exista um referencial e1 ,
e2 , e3 adaptado a S e compatı́vel com as orientações de S e R 3 . Sejam ωi ,
ωij as restrições a V ∩ S das formas do coreferencial associado a {ei } e das
formas de conexão, respectivamente.
Primeiro, observamos que a forma ω1 ∧ ω2 não depende do referencial
escolhido (dentro da classe dos referenciais compatı́veis com a orientação de
S), e é, portanto, definida globalmente em S. Com efeito, a forma ω1 ∧ ω2
aplicada a um par de vetores u = u1 e1 + u2 e2 , v = v1 e1 + v2 e2 de Tp (S),
linearmente independentes e na orientação de Tp (S), fornece
ω1 ∧ ω2 (u, v) = ω1 (u)ω2 (v) − ω2 (u)ω1 (v) = u1 v2 − u2 v1 ,
que é a área de paralelogramo formado por u e v. Por esta razão ω1 ∧ω2 = σ
é chamado o elemento de área de S.
Como S é compacta, podemos considerar a integral
Z Z
K ω1 ∧ ω 2 = K σ,
S S

que é chamada a integral de K estendida a S. O teorema de Gauss-Bonnet


afirma que este número depende apenas da topologia de S.
Para mostrar isto, levamos em conta a expressão
dω12 = −K ω1 ∧ ω2
e procuramos integrar dω12 em S. Como ω12 não é globalmnete definida
em S, vamos primeiro estudar como muda esta forma por uma mudança de
referencial.
Sejam então e1 , e2 , e3 e ē1 , ē2 , ē3 = e3 referenciais compatı́veis com a
orientação de S e relacionados por
ē1 = cos θ e1 + sen θ e2 ,
(1)
ē2 = − sen θ e1 + cos θ e2 ,
De (1) decorre que
ω̄1 = cos θ ω1 + sen θ ω2 ,
ω̄2 = − sen θ ω1 + cos θ ω2 ,
14 O Teorema de Gauss-Bonnet para superfı́cies compactas Seção 1.4

donde, usando as equações de estrutura,

dω̄1 = − sen θdθ ∧ ω1 + cos θdθ ∧ ω2 + cos θdω1 + sen θdω2


= dθ ∧ ω̄2 + cos θ(ω2 ∧ ω21 ) + sen θ(ω1 ∧ ω12 )
= dθ ∧ ω̄2 + ω̄2 ∧ ω21 = ω̄2 ∧ (ω21 − dθ). (2)

Analogamente
dω̄2 = ω̄1 ∧ (ω12 + dθ). (3)
Portanto, as formas

ω̄12 = ω12 + dθ, ω̄21 = ω21 − dθ = −ω̄12

são antisimétricas e satisfazem as equações (2) e (3). Pela unicidade do


Lema 2 da Seção 1.2, elas são as formas de conexão de S no referencial ē1 ,
ē2 , ē3 .
Passemos agora à demonstração do Teorema de Gauss-Bonnet. Seja v
um campo diferenciável de vetores tangentes a S com um número finito de
pontos singulares p1 , . . . , pk (isto é, v(pi ) = 0, i = 1, . . . , k). Para cada
pi , seja Bi ⊂ S uma vizinhança de pi de tal modo que Bi não contenha
outro ponto singular além de pi e S que ∂Bi seja uma curva fechada regular
v
orientada positivamente. Em S − {pi } podemos escrever ē1 = |v| · Como
i S
S é orientável, podemos escolher em S − {pi } um referencial adaptado ē1 ,
i
ē2 , ē3 compatı́vel com a orientação de S. Então, pelo teorema de Stokes,
Z Z XZ
S
K ω̄1 ∧ ω̄2 = − S
dω̄12 = ω̄12 . (4)
S− Bi S− Bi i ∂Bi

Quando Bi se aproxima de pi , a integral do primeiro membro tende


para a integral de K estendida a S (observe que ω̄1 ∧ ω̄2 não depende
do referencial). Nas mesmas condições, entretanto, a integral do segundo
membro depende do referencial ē1 , ē2 , ē3 , que não está definido em pi .
Portanto, para calcular este limite, introduziremos, em uma vizinhança U i ⊃
Bi , um referencial adaptado e1 , e2 , ē3 = ē3 , compatı́vel com a orientação de
S e dado por (1). Em Ui − {pi }, ω̄12 = ω12 + dθ e portanto, pelo teorema
de Stokes,
Z Z Z Z Z
ω̄12 = ω12 + dθ = dω12 + dθ
∂Bi ∂Bi ∂Bi ∂Bi ∂Bi
Z Z
=− Kω1 ∧ ω2 + dθ,
∂Bi ∂Bi
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 15

pois e1 , e2 , e3 está definido em Bi . Decorre daı́ que


Z Z
lim ω̄12 = lim dθ. (5)
Bi →pi ∂Bi Bi →pi ∂Bi
R
Observe agora que ∂Bi dθ é a integral em uma curva fechada da variação
do ângulo θ que faz o campo v = |v| ē1 com o vetor e1 . Como ambos, v e
e1 , voltam à sua posição inicial, esta integral é um múltiplo inteiro Ii de
2π, isto é, Z
dθ = 2π Ii .
∂Bi

O número inteiro Ii é chamado o ı́ndice do campo v no ponto singular pi


e mede, intuitivamente o número de “voltas” que o campo v dá ao longo
de ∂Bi . É possı́vel definir o ı́ndice de maneira mais rigorosa e provar, ao
mesmo tempo, que ele não depende da escolha da curva ∂Bi , da escolha do
referencial {ei } e da maneira como S está mergulhada em R3 (para detalhes
v. M. do Carmo [dC1]). Portanto
Z
lim dθ = 2π Ii . (6)
Bi →pi ∂Bi

Juntando (4), (5) e (6), obteremos o seguinte resultado


Teorema. Seja S ⊂ R3 uma superfı́cie compacta em R3 e seja K a sua
curvatura Gaussiana. Seja v um campo diferenciável de vetores tangentes
a S com um número finito de pontos singulares p1 . . . , pk . Então a integral
de K estendida a S é igual a 2π vezes a soma dos ı́ndices de v nos pontos
pi , i = 1, . . . , k, isto é, Z
K σ = 2π Σ Ii . (7)
S

Como o primeiro membro de (7) não depende do campo v e o segundo


membro não depende da métrica induzida, concluı́mos que ambos os mem-
bros dependem apenas da variedade S e permanecerá o mesmo para todas
que lhe sejam difeomorfas.
Observação: Na demonstração do teorema de Gauss-Bonnet utilizamos
o fato que toda superfı́cie compacta e orientada do R3 admite um campo
diferenciável de vetores tangentes com um número finito de pontos singu-
lares. Isto é um fato geral que é válido em qualquer variedade diferenciável
compacta (V. Lima [Li1], pg. 144). Para o caso de S ⊂ R3 , poderı́amos
obter uma demonstração mais direta utilizando, por exemplo o Teorema de
Sard para a aplicação normal de Gauss de S; uma outra demonstração pode
ser encontrada em M. do Carmo [dC4], pg. 174.
16 Subvariedades de um espaço euclideano Seção 1.5

1.5 Subvariedades de um espaço euclideano


Voltemos às nossas considerações do fim da Seção 1.1. Seja x : M n → Rn+q
uma imersão de uma variedade de dimensão n em R n+q . (De agora em
diante, usaremos um ı́ndice superior quando quisermos indicar a dimensão
de uma variedade). Seja p ∈ M e U uma vizinhança de p em M na qual a
restrição x|U seja injetiva. Seja V uma vizinhança de x(p) em R n+q de tal
modo que x(U ) ⊂ V e que em V esteja definido um referencial adaptado
e1 , . . . , en , en+1 , . . . , en+q . Pensaremos em x como uma inclusão de U em
V ⊂ Rn+q e usaremos a mesma notação para uma entidade em V ou a sua
restrição a U . De agora por diante, esta convenção será usada sem maiores
comentários.
Usaremos os seguintes tipos de ı́ndices:

1 ≤ A, B, C, · · · ≤ n + q,
1 ≤ i, j, k, · · · ≤ n,
n + 1 ≤ α, β, γ, · · · ≤ n + q.

Dado o referencial {eA } em V , definimos o coreferencial {ωA } e as formas


de conexão ωAB em V por

dx = Σ ωA eA , (1)
deA = Σ ωAB eB . (2)

As formas ωA e ωAB satisfazem as equações de estrutura

dωA = Σ ωA ∧ ωBA , (3)


dωAB = Σ ωAC ∧ ωCB . (4)

As restrições das formas ωA , ωAB e U ⊂ V satisfazem ainda as equações


(3) e (4), com a relação adicional ωα = 0, para todo α. Esta última relação
provém do fato que os vetores eα são normais a U , e portanto, para todo
q ∈ U e todo v = Σ vi ei ∈ Tq (M ), tem-se

ωα (v) = ωα (Σ vi ei ) = 0.

No que se segue só usaremos formas restritas a U . Como ωα = 0, temos


que

0 = dωα = Σ ωB ∧ ωBα = Σ ωβ ∧ ωβα + Σ ωi ∧ ωiα = Σ ωi ∧ ωiα .

Pelo lema de Cartan,


X
ωiα = hα
ij ωj , hα α
ij = hji .
j
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 17

A forma quadrática
X X
II α = ωi ωiα = hα
ij ωi ωj
i ij

é chamada a segunda forma quadrática de x na direção eα .


Para cada p ∈ M , o espaço gerado pelos vetores de Rn+q que são normais
a dxp (Tp (M )) é chamado o espaço normal da imersão x em p e indicado
por Np (M ). Um campo diferenciável de vetores normais é uma aplicação
diferenciável ν : M → Rn+q com ν(p) ∈ Np (M ), p ∈ M . Dado um campo
diferenciável unitário de vetores normais ν : U ⊂ M → Rn+q , em uma
vizinhança U suficientemente pequena de p, podemos escolher um referen-
cial adaptado {eA } em U de tal modo que en+1 = ν. A segunda forma
quadrática II n+1 é chamada a segunda forma quadrática de x na direção ν
e indicada por II ν .
O significado geométrico de II ν é obtido generalizando uma situação
semelhante que encontramos no caso de superfı́cies em R 3 . Para isto, seja
v ∈ Tp M , |v| = 1, e consideremos uma curva α : (−ε, ε) → U parametrizada
pelo comprimento de arco s, com α(0) = p, α0 (0) = v. Então, como
h dα
ds , νi = 0,
¿ À ¿ À
d2 α dα dν
,ν =− , = −hdx(v), dν(v)i = −hdx, dνi(v)
ds2 ds ds
¿X X X À
=− ω i ei , ωn+1,j ej + ωn+1,β eβ
i j β
X X
=− ωi ωn+1,i = ωi ωi,n+1 = II ν (v). (5)
i

Portanto, II ν (v) é a componente do vetor normal de α segundo o vetor


unitário ν. Decorre daı́ que II ν é independente da escolha do referencial.
Como a toda forma quadrática em um espaço vetorial está associada
uma aplicação linear auto-adjunta, temos que, para todo p ∈ M e todo
vetor unitário normal ν ∈ Np (M ), existe uma transformação linear auto-
adjunta Aν : Tp (M ) → Tp (M ), tal que

II ν (v) = −hAν (v)vi,

para todo v ∈ Tp (M ). Por (5), é claro que

hAν (v), vi = hdν(v), dx(v)i,

¡e quen+1
a matriz
¢ de Aν em um referencial adaptado com en+1 = ν é dada por
− hij .
18 Subvariedades de um espaço euclideano Seção 1.5

Vamos agora escrever as equações de estrutura (3) e (4), tendo o cuidado


de separar as partes tangenciais (ı́ndices i, j, . . . ) das partes normais (ı́ndices
α, β, . . . ). Obteremos as equações:
X
dωi = ωj ∧ ωji , (6)
j
X X
dωij = ωik ∧ ωkj + ωiα ∧ ωαj , (7)
k α
X X
dωiα = ωij ∧ ωjα + ωiβ ∧ ωβα , (8)
j β
X X
dωαβ = ωαj ∧ ωjβ + ωαγ ∧ ωγβ . (9)
j γ

Observe que as equações (7) são semelhantes às equações de estrutura de


um espaço euclideano, com um “termo de correção” dado por
X
ωiα ∧ ωαj = Ωij , Ωij = −Ωji .
α

Para esclarecer o significado das 2-formas Ωij , notemos que a imersão


x : M n → Rn+q determina uma métrica riemaniana h , i em M dada por:

hv1 , v2 ip = hdxp (v1 ), dxp (v2 )i, p ∈ M, v1 , v2 ∈ Tp (M ),

onde o produto interno do segundo membro é o produto interno usual do


Rn+q . A métrica riemaniana h , i em M é chamada a métrica induzida por
x. A métrica induzida e a parte tangente {ei } do referencial determinam as
formas ωi , donde as formas dωi . Pelo Lema 2 da Seção 1.2, as formas ωij
ficam então inteiramente determinadas pela imersão, e o mesmo se verifica
para as formas X
Ωij = dωij − ωik ∧ ωkj .
k

Portanto, a matriz anti-simétrica de 2-formas (Ωij ) depende apenas da


métrica induzida (e da escolha do referencial).
Isto sugere que a matriz (Ωij ) é uma espécie de medida de quanto a
métrica induzida deixa de ser euclidiana. (Ωij ) é chamada a matriz das
formas de curvatura no referencial {ei }.
Observe que se M n = Rn , Ωij = 0. Além disto, se x : M 2 → R3 , temos
que
Ω12 = dω12 − 0 = −K ω1 ∧ ω2 ,
o que mostra que (Ωij ) generaliza a noção de curvatura Gaussiana de uma
superfı́cie.
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 19

Para associar um significado geométrico à matriz das formas de cur-


vatura, precisamos verificar como elas variam com uma mudança da parte
tangente do referencial {ei } (a parte normal {eα } do referencial não afeta as
formas Ωij ). Para isto será conveniente usar a seguinte notação matricial.
As matrizes das formas ωij e Ωij serão indicadas por W e Ω, respecti-
vamente, e o vetor coluna das formas ωi , por ω. As equações de estrutura
(6) e (7) se escrevem então

dω = W ∧ ω,
dW = W ∧ W + Ω.

Uma mudança na parte tangente {ei } do referencial será dada por ei =


Σ uij ēj , onde (uij ) = U é uma matriz de funções diferenciáveis em M ;
além disso, U é ortogonal, isto é, U U ∗ = identidade, onde U ∗ indica a
matriz transposta de U .
Lema 1. Por uma mudança do referencial tangente {ei } dada por ei =
P
uij ēj , a matriz das formas de conexão W muda por
j

W = d U U ∗ + U W U ∗, (10)

e a matriz das formas de curvatura Ω muda por

Ω = U Ω U ∗, (11)

onde uma barra indica a entidade correspondente no referencial {ē i }.


P P
Demonstração: De ei = uij ēj decorre que ωi = uij ω̄j , isto é,
j j
ω = U ω̄, e então ω̄ = U ∗ ω. Portanto,

dω = dU ∧ ω̄ + U dω̄ = dU ∧ (U ∗ ω) + U (W ∧ ω̄) = (dU U ∗ + U W U ∗ ) ∧ ω.

Decorre daı́, pelo lema de unicidade, que

W = d U U ∗ + U W U ∗,

o que demonstra (10). Para demonstrar (11), observemos que d U U ∗ =


−U (dU )∗ e passemos a calcular W ∧ W e dW . Obteremos

W ∧ W = (d U U ∗ + U W U ∗ ) ∧ (d U U ∗ + U W U ∗ )
= −d U U ∗ U ∧ (dU )∗ − U W U ∗ U ∧ (dU )∗
+ d U U ∗U ∧ W U ∗ + U W U ∗ ∧ U W U ∗
= −dU ∧ (dU )∗ + dU ∧ W U ∗ − U W ∧ (dU )∗ + U W ∧ W U ∗ ,
20 Subvariedades de um espaço euclideano Seção 1.5

e

dW = −dU ∧ (dU )∗ + dU ∧ W U ∗ − U W ∧ (dU )∗ + U ∗ dW ∧ U.

Portanto,

Ω = −W ∧ W + dW = −U W ∧ W U ∗ + U d W U ∗
= U (dW − W ∧ W )U ∗ = U Ω U ∗ ,

o que demonstra (11).


Decorre do lema que, fixado p ¡∈ M , ¢quando mudamos o referencial
tangente {ei }, a matriz de formas (Ωij )p muda como a matriz de uma
transformação linear em Tp©(M ). Portanto,
ª fixados dois vetores X, Y ∈
Tp (M ), a matriz numérica (Ωij )p (X, Y ) representa uma transformação
linear em Tp (M ), que indicaremos por
¡ ¢
RXY p : Tp (M ) → Tp (M ),

e que não depende do referencial tangente. RXY é chamado o operador de


curvatura da métrica induzida.
Passemos agora a analisar as equações (9). Escrevevendo (9) na forma
X
dωαβ = ωαγ ∧ ωγβ + Ωαβ ,
γ

onde X
Ωαβ = ωαi ∧ ωiβ = −Ωβα ,
i

vemos que elas possuem uma certa analogia formal com as equações de
estrutura de um espaço euclideano com um “termo de correção” Ωαβ . Por
um raciocı́nio inteiramente análogo ao do Lema 1, verificaremos que a matriz
de formas (ωαβ ) = W ⊥ e a matriz de formas (Ωαβ ) = Ω⊥ se transformam,
por uma mudança da parte normal {eα } do referencial, de modo semelhante
às formas W e Ω, respectivamente. Por esta razão, chamaremos ωαβ as
formas da conexão normal e Ωαβ as formas da curvatura normal.
© É claro que, ª fixados p ∈ M e dois vetores X, Y ¡∈ ⊥Tp (M ¢ ), a matriz
(Ωαβ )p (X, Y ) determina uma transformação linear RXY p
: (Np (M ) →

Np (M ). RXY é chamado o operador de curvatura normal da imersão x.
Para o caso x : M 2 → R4 , podemos definir, por analogia com a curvatura
Gaussiana, uma função KN chamada curvatura normal da imersão x por

dω34 = −KN ω1 ∧ ω2 .
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 21

Como no caso de superfı́cies, as formas ωij possuem a seguinte inter-


pretação geométrica. Seja X um campo diferenciável de vetores tangentes
em M , seja Y ∈ Tp (M ), e seja α : (−ε, ε) → M uma curva diferenciável com
α(0) = p e α0 (0) = Y . Definamos
µ ¶
¡ ¢ dX
∇Y X p = proj. sobre Tp (M ) de ,
dt t=0
onde t é o parâmetro da curva α. Em outras palavras, (∇Y X)p é a parte da
¡ ¢
derivada usual dX dt t=0 que é “vista de Tp (M )”. Vamos mostrar que ∇Y X
só depende da métrica induzida em M por X.
Para isto, escolhamos um referencial adaptado {eA } em uma vizinhança
U ⊂ M e escrevamos X = Σ xi ei , onde xi são funções diferenciáveis em U .
Como
dX X dxi X dei
= ei + xi
dt i
dt i
dt
X dxj X X µ∂¶ X X µ ¶

= ej + xi ωij ej + xi ωiα eα ,
j
dt i j
∂t i α
∂t

temos que
X ½ dxj X ∂
¶ ¾ µ
(∇Y X)P = + ωij x i ej
j
dt i
∂t
X© X ª
= dxj (Y ) + ωij (Y )xi ej
j i

o que
¡ mostra
¢ que ∇Y X só depende dos ωij e portanto da métrica induzida.
∇Y X p é chamada a derivada covariante do campo X segundo o vetor
Y no ponto p. Se X = ei , obteremos
h∇Y ei , ej i = ωij (Y ),
o que fornece uma interpretação geométrica das formas de conexão ωij em
termos da derivação covariante.
Uma interpretação análoga pode ser dada às formas de conexão normal
ωαβ : Seja η um campo diferenciável de vetores normais em M e y ∈ Tp (M ).
A derivada covariante normal (∇⊥ y η)p de η em relação a y no ponto p é a
projeção sobre o complemento ortogonal Np (M ) de Tp (M ) da derivada usual
¡ dη ¢
dt t=0 . Como anteriormente, t é o parâmetro de uma curva diferenciável
α : (−ε, ε) → M , com α(0) = p, α0 (0) = y.
De uma maneira inteiramente análoga à anterior, verifica-se que
¡ ⊥ ¢ X© X ª X
∇y η p = dηα (y) + ωαβ (y)ηα eβ , η = η α eα ,
β α α
22 Subvariedades de um espaço euclideano Seção 1.5

isto é, ∇⊥
y η depende apenas das formas ωαβ . A interpretação geométrica
das formas ωαβ é obtida observando que, se η = eα , temos
h∇⊥
y eα , eβ i = ωαβ (y).

Finalmente, deve ser observado que as equações de definição


X X
Ωij = ωiα ∧ ωαj , Ωαβ = ωαi ∧ ωiβ ,
α i

relacionam as formas de curvatura da métrica induzida e as formas da cur-


vatura normal com as segundas formas quadráticas de imersão da seguinte
maneira:
X©X X ª
Ωij = − hα
i` ω` ∧ hαjk ωk
α ` k
X©X ª
= (hα
i` hα
jk − hα
ik hα
j` ) ωk ∧ ω` (12)
k<` α
e
X©X X ª
Ωαβ = − hα
ik ωk ∧ hβi` ω`
i k `
X©X ª
= (hα
ki hβi` − hβki hα
i` ) ωk ∧ ω` (13)
k<` i

As equações (12) e (13) são chamadas as equações de Gauss e as equações


de Ricci, respectivamente.
Tudo se passa como se a geometria da imersão x se decompusesse em
duas, uma geometria tangente e uma geometria normal, ligadas pelas segun-
das formas quadráticas, isto é, as formas ωiα . Neste contexto, as equações
(8) (Equações de Codazzi) exprimem as diferenciais das formas ωiα (isto
é, as segundas formas quadráticas) em termos das formas ωiα , da conexão
tangente e da conexão normal.
Exemplo 1 (O toro de Clifford). Seja x : R2 → R4 uma aplicação diferen-
ciável dada por
x(u, v) = (cos u, sen u, cos v, sen v), (u, v) ∈ R2 .
Como
dx = (− sen u du, cos u du, − sen v dv, cos v dv),
teremos

µ

dx = (− sen u, cos u, 0, 0),
∂u
µ ¶

dx = (0, 0, − sen v, cos v),
∂v
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 23

e portanto x é uma imersão. Como x(u + 2nπ, v + 2mπ) = x(u, v), para n,
m inteiros, a imagem x(R2 ) é um toro S 1 × S 1 ⊂ R4 .
Para estudar a geometria deste toro, escolhamos um referencial ortonor-
mal e adaptado:
e1 = (− sen u, cos u, 0, 0),
e2 = (0, 0, − sen v, cos v),
1
e3 = √ (cos u, sen u, cos v, sen v),
2
1
e4 = √ (− cos u, − sen u, cos v, sen v).
2
Como dx = Σ ωi ei , concluı́mos que
ω1 = hdx, e1 i = du, ω2 = dv, ω3 = 0, ω4 = 0.
Para o cálculo das ωij , calcularemos primeiro
de1 = (− cos u du, − sen u du, 0, 0),
de2 = (0, 0, − cos v dv, − sen v dv),
1
de3 = √ (− sen u du, cos u du, − sen v dv, cos v dv),
2
donde

ω12 = hde1 , e2 i = 0,
−du
ω13 = hde1 , e3 i = √ ,
2
du
ω14 = hde1 , e4 i = √ ,
2
−dv
ω23 = hde2 , e3 i = √ ,
2
−dv
ω24 = hde2 , e4 i = √ ,
2
ω34 = hde3 , e4 i = 0.
De ω12 = 0, concluı́mos que a curvatura Gaussiana da métrica induzida
é zero. De ω34 = 0, concluı́mos que a curvatura normal KN da imersão
também é zero.
Para o cálculo das segundas formas quadráticas nas direções e3 e e4 ,
faremos
ω13 = h211 ω1 + h312 ω2 ,
ω23 = h321 ω1 + h322 ω2 ,
24 Variedades riemanianas Seção 1.6

−1 −1
donde h311 = √
2
, h312 = h321 = 0, h322 = √ 2
, isto é,
 ±√ 
−1 2 0
A2 =  ±√
.
0 −1 2
Analogamente,  ±√ 
1 2 0
A4 =  ±√
.
0 −1 2

Observe que e3 = √1 x descreve uma esfera unitária, pois |x| = 2.
2 √
Portanto x(S 1 × S 1 ) está contida na esfera S√ 3
2
de raio 2 de R4 e o
referencial e1 , e2 , e4 é tangente a esta esfera, com e3 normal a x(S 1 × S 1 ).
Como imersão, x : S 1 × S 1 → S√ 3
2
em S√3
2
, x descreve o chamado toro
de Clifford. Observe que é natural considerar A4 como a segunda forma
quadrática desta imersão (uma definição rigorosa será dada na Seção 1.9) e
que o traço de A4 é zero. Como veremos na Seção 1.9, isto significa que o
toro de Clifford é uma superfı́cie mı́nima da esfera S 3 .

1.6 Variedades riemanianas


As equações de estrutura relativas a uma métrica induzida por uma imersão,
a saber, X
dωi = ωj ∧ ωji , (1)
j
nos sugerem a possibilidade de desenvoler o método do referencial móvel
para uma variedade riemaniana M n . Seja p ∈ M um ponto de M e seja
U ⊂ M uma vizinhança de p em M , onde seja possı́vel definir campos
diferenciáveis de vetores e1 , . . . , en tais que hei , ej i = δij . O conjunto {ei },
i = 1, . . . , n, será chamado um referencial (ortonormal, móvel) em U . Se-
jam ωi formas diferenciais em U definidas por ωi (ek ) = δij (o coreferencial
associado a {ei }). Já vimos no Lema 2 da Seção 1.2 que se existirem formas
diferenciais ωij = −ωji satisfazendo (1), elas estarão inteiramente determi-
nadas. Que tais formas existem a partir da métrica riemaniana de M é o
conteúdo do lema seguinte.
Lema 1 (Levi-Civitta). Escolhido um referencial {ei } em um aberto U ⊂ M
de uma variedade riemaniana M existe em U um (único) conjunto de formas
diferenciais ωij que são anti-simétricas, ωij = −ωji , e satisfazem (1).
Demonstração: Façamos dωj (ek , ei ) = Ajki , isto é,
X j
dωj = Aki ωk ∧ ωi , Ajki = −Ajik .
k<i
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 25

i i
Queremos determinar funções Ckj = −Cjk tais que as formas diferenciais
X
i
ωkj = Ckj ωi (2)
i

satisfaçam (1). Se tais funções existirem, teremos


X j X
dωj = Aki ωk ∧ ωi = ωk ∧ ωkj =
k<i k
X ¡X ¢ X
i i k
= ωk ∧ Ckj ωi = (Ckj − Cij ) ωk ∧ ωi .
k i k<1

Igualando os coeficientes de termos correspondentes nas equações acima,


temos

Ajki = Ckj
i k
− Cij ,
j
Akij = Cik i
− Cjk ,
j
Aiij = Cki k
− Cji .

Adicionando membro a membro as igualdades acima, obteremos a seguinte


i
condição necessária para a existência dos Ckj :

i 1 j
Ckj = (A + Akij + Aikj ).
2 ki
i
Definindo Ckj pela equação acima e as formas ωij por (2), verificamos facil-
mente que elas satisfazem as condições pedidas.
As formas ωij são chamadas as formas de conexão de M no referencial
{ei }. O interesse geométrico das formas de conexão é que elas permitem
definir uma noção de derivação para campos de vetores em M . Observe-se
que em uma variedade diferenciável, podemos derivar funções, porém não
campos de vetores. O conteúdo do Lema 1 e da proposição seguinte é que
em uma variedade riemaniana uma tal derivação é bem definida.
Proposição 1. Sejam X e Y campos diferenciáveis de vetores em M
P e seja
{ei } um referencial em um aberto U ⊂ M . Suponhamos que Y = y i ei e
i
façamos X© X ª
∇X Y = dyj (X) + ωij (X)yi ej . (3)
j i

Então ∇X Y é independente do referencial {ei } e, portanto, globalmente


definido em M .
Demonstração: Será conveniente usar a notação matricial estabelecida no
parágrafo anterior, com as adições seguintes. e = (e1 , . . . , en ) será uma
26 Variedades riemanianas Seção 1.6

matriz linha e y = (y1 , . . . , yn ) será uma matriz coluna; assim Y = ey. Se


ē é um outro referencial, façamos e = ēU ∗ ; assim y = U ȳ. Com uma tal
notação, a equação (3) se escreve

∇X Y = e(dy(X) + W ∗ (X)y).

Como X não irá interferir nos cálculos, vamos abandoná-lo nas expressões
abaixo. Inicialmente, observemos que

dy = dU ȳ + U dȳ,

e que, da equação (10) do parágrafo anterior, vem


∗ ∗ ∗
W ∗ y = U (dU )∗ y + U W U ∗ y = −dU U ∗ y + U W U ∗ y = −dU ȳ + U W ȳ.

Portanto

e(dy + W ∗ y) = e(dU ȳ + U dȳ − dU ȳ + U W ȳ)
∗ ∗
= eU dȳ + eU W ȳ = ē(dȳ + E ȳ),

o que mostra que (3) não depende da escolha do referencial {ei }.


∇X Y é chamada a derivada covariante de Y em relação a X. Que ela é
uma derivação “de boa qualidade” é garantido pelos quatro primeiros itens
da seguinte proposição.
Proposição 2. Sejam X, Y , Z campos diferenciáveis de vetores em M , f ,
g funções diferenciáveis em M e a, b números reais. Então:
1) ∇f X+gZ Y = f ∇X Y + g ∇Z Y ,
2) ∇X (aY + bZ) = a ∇X Y + b ∇X Z,
3) ∇X (f Y ) = f ∇X Y + X(f )Y ,
4) h∇X Y, Zi + hY, ∇X Zi = X(hY, Zi),
5) Se p ∈ M , (∇X Y )(p) só depende do valor de X no ponto p e dos
valores de Y ao longo de uma curva parametrizada α :(−ε,ε)→M , com
α(0) = p, α0 (0) = X(p).

Demonstração: Verificação direta a partir da definição (3). Os detalhes


podem ser deixados como exercı́cios.
Uma observação importante é que a derivação covariante permite inter-
pretar geometricamente as formas de conexão. Com efeito, de (3) decorre
que, para todo campo X,

h∇X ei , ej i = ωij (X).


Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 27

Portanto ωij (ek ) = h∇ek ei , ej i.


Convém estender a noção de derivada covariante para campos de vetores
definidos ao longo de uma curva parametrizada α : (a, b) → M da maneira
seguinte. Um campo diferenciável de vetores ao longo de α é uma corre-
spondência que a cada t ∈ (a, b) associa um vetor Y (t) ∈ Tα(t) (M ) de tal
modo que escolhendo um referencial {ei } em torno de α(t), as funções yi (t)
dadas por Y (t) = Σ yi (t)ei sejam diferenciáveis; é claro que esta condição
não depende do referencial escolhido. Pelo item (5) da Proposição 2, a
expressão
( µ ¶ )
DY X dyj X ∂
= + α∗ ωij yi ej = ∇ ¡ ∂ ¢ Y (t)
dt j
dt i
∂t dα ∂t

está bem definida, e é chamada a derivada covariante de Y ao longo de α.


Um campo Y ao longo de α é paralelo se DY dt ≡ 0. Uma curva α é uma
geodésica se o seu campo de vetores tangentes (que é um campo ao longo
D dα
de α) é paralelo, isto é, se dt dt ≡ 0.
A condição para que o campo Y (t) = Σ yi (t)ei seja paralelo, isto é,
µ ¶
dyi X ∗ ∂
+ α ωji yj = 0, i = 1, . . . , n,
dt j
∂t

é evidentemente um sistema de equações diferenciais lineares em yi (t). De-


corre daı́ que dado Y0 ∈ Tα(t0 ) (M ) existe um e um único campo paralelo
Y (t) ao longo de α com Y (t0 ) = Y0 . O campo Y (t) assim obtido é chamado
o transporte paralelo de Y0 em α.
Se uma curva parametrizada γ : (a, b) → M é uma geodésica, então, pelo
item (4) da Proposição 1,

d 0 Dγ 0 (t) 0
hγ (t), γ 0 (t)i = 2 h , γ (t)i = 0
dt dt
isto é, o vetor tangente γ 0 (t) tem comprimento constante. Observe, entre-
tanto, que γ pode ter auto-intersecções.
Os seguintes fatos sobre geodésicas serão apresentados sem demons-
trações. As demonstrações dependem dos teoremas de existência, unicidade
e dependência das condições iniciais das equações diferenciais ordinárias e
podem ser encontradas em M. do Carmo [dC ].
Para todo ponto p ∈ M e todo vetor v ∈ Tp (M ) existe uma única
geodésica γ(t; p, v) definida em um intervalo (−ε, ε) e satisfazendo às con-
dições: γ(0; p, v) = p, γ 0 (0; p, v) = v; uma tal geodésica é homogênea no
sentido seguinte: se γ(t; p, λv) está definida em t ∈ (−ε, ε), a geodésica
28 Variedades riemanianas Seção 1.6

¡t ¢ ¡ ¢
γ λ ; p, v está definida em t ∈ − λε , λε e
µ ¶
t
λ ; p, v = γ(t; p, λv), λ ∈ R.
λ

Além disso, fixado p ∈ M , o ponto γ(1; p, v) está definido para todo v


pertencente a uma bola aberta Bη (0) ⊂ Tp (M ), centrada na origem de
Tp (M ), e varia diferenciavelmente com v.
Os fatos acima permitem definir uma aplicação diferenciável

expp : Bη (0) ⊂ Tp (M ) → M

chamada a aplicação exponencial em p, dada por

expp (v) = γ(1; p, v).

Observe que expp (0) = p e que a diferencial de expp na origem é dada por
¯ ¯
d ¯ d ¯
(d expp )0 (v) = ¯
γ(1; p, tv)¯ = γ(t; p, v)¯¯ = γ 0 (0, p, v) = v.
dt t=0 dt t=0

Pelo teorema da função inversa, expp é um difeomorfismo em uma vizi-


nhança V da origem de Tp (M ). A imagem expp (V ) = U é chamada uma
vizinhança normal de p ∈ M . As geodésicas de U que passam por p são
chamadas geodésicas radiais da vizinhança normal U . Note que todo q ∈ U
é ligado a p em U por uma única geodésica radial.
Dada uma curva α : (a, b) → M parametrizada pelo comprimento de
D dα
arco, o campo ds ds ao longo de α mede o quanto α deixa de ser geodésica.
D dα
O valor de ds ds é chamado o vetor curvatura geodésica de α em M .
Passemos agora à introdução da curvatura em uma variedade riemani-
ana. Motivados pela Seção anterior, definiremos
X
Ωij = dωij − ωik ∧ ωkj . (5)
k

As formas Ωij são chamadas as formas de curvatura de M no referencial


{ei }. O significado geométrico de tais formas é inteiramente análogo ao das
formas Ωij da Seção anterior,
© isto é, para
ª cada p ∈ M e cada par de vetores
X, Y ∈ Tp (M ), a matriz (Ωij )p (X, Y ) é a matriz de uma aplicação linear
¡ ¢
RXY p
: Tp (M ) → Tp (M ).

RXY é chamado o operador de curvatura de M . Como Ωij = −Ωji , e


Ωij é uma forma bilinear alternada, temos as seguintes identidades para o
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 29

operador de curvatura: Se X, Y , Z e T são campos diferenciáveis de vetores


em M , então

hRXY Z, T i = −hRY X Z, T i, (6)


hRXY Z, T i = −hRXY T, Zi. (7)

Derivando exteriormente as equações (1), obteremos


X X
0= dωk ∧ ωkj − ωk ∧ dωkj
k k
X X
= ωi ∧ ωik ∧ ωkj − ωi ∧ dωij
ki i
X ¡X ¢ X
= ωi ∧ ωik ∧ ωkj − dωij = − ωi ∧ Ωij
i k i

ou seja X
ωi ∧ Ωij = 0. (8)
i

A equação (8) é chamada a primeira identidade de Bianchi. Em termos


do operador curvatura, ela se traduz da maneira seguinte. Se X, Y e Z são
campos diferenciáveis de vetores em M , então, para todo j = 1, . . . , n,

X
0= ωi ∧ Ωij (X, Y, Z)
i
X© ª
= ωi (X)Ωij (Y, Z) − ωi (Y )Ωij (X, Z) + ωi (Z)Ωij (X, Y )
i
= hRY Z X − RXZ Y + RXY Z.ej i,

donde
RXY Z + RY Z X + RZX Y = 0. (8’)
De (8’) e (7) decorre a seguinte identidade

hRXY Z, T i = hRZT X, Y i (9)

que pode ser demonstrada da maneira seguinte: a partir de (8), obtemos

hRXY Z, T i + hRY Z X, T i + hRZX Y, T i = 0,


hRY Z T, Xi + hRZT Y, Xi + hRT Y Z, Xi = 0,
hRZT X, Y i + hRT X Z, Y i + hRXZ T, Y i = 0,
hRT X Y, Zi + hRXY T, Zi + hRY T X, Zi = 0.
30 Variedades riemanianas Seção 1.6

Somando as equações acima, concluı́mos que

2hRZX Y, T i + 2hRT Y Z, Xi = 0,

donde, usando (7),


hRZX T, Y i = hRT Y Z, Xi,
que é equivalente à expressão (9).
Derivando exteriormene a equação (5), obteremos
X X
0= dωik ∧ ωkj − ωik ∧ dωkj + dΩij
k k
X¡X ¢
= ωis ∧ ωsk + Ωik ∧ ωkj
k s
X ¡X ¢
− ωik ∧ ωkm ∧ ωmj + Ωkj + dΩij
k m
X X
= dΩij + Ωik ∧ ωkj − ωik ∧ Ωkj , (10)
k k

que é chamada a segunda identidade de Bianchi.


Como as formas Ωij são formas de grau dois, elas podem ser escritas
1X X
Ωij = − Rijk` ωk ∧ ω` = − Rijk` ωk ∧ ω` .
2
k` k<`

As funções Rijk` são chamadas as componentes do tensor curvatura de M .


Veremos na próxima seção o significado desta expressão. É claro que
1X
hRek ,e` (ei ), ej i = Ωji (ek , e` ) = − Rjist ωs ∧ ωt (ek , e` ) = Rijk`
2 s,t
= hRei ej (ek ), e` i.

As formas de curvatura permitem definir vários tipos de curvatura em


M , o mais importante sendo a curvatura seccional que passaremos a intro-
duzir. Seja P ⊂ Tp (M ) um subespaço de dimensão dois do espaço tangente
Tp (M ) de M em p ∈ M . Escolhamos um referencial ortonormal e1 , . . . , en
em uma vizinhança
¡ ¢ de p de tal modo que e1 , e2 geram P . Vamos mostrar
que o número Ω12 p (e1 , e2 ) depende apenas do subespaço P .
Para isto, seja ē1 , . . . , ēn um outro referencial em torno de p de modo
ē1 , ē2 ainda geram P . Então ei = Σ uij ēj , onde a matriz U = (uij ) é da
forma  
A 0
U = 
0 B
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 31
   
cos θ sen θ − sen θ cos θ
e A=  ou A= 
− sen θ cos θ cos θ sen θ
dependendo da orientação de ē1 , ē2 relativamente a e1 , e2 . Pelo Lema 1 da
Seção 1.5, X
Ωij = uik Ωk` uj` ,
k`

donde
X ¡ ¢
Ω12 = u1k u2` Ωk` = ± cos2 θ Ω12 − sen2 θ Ω21 = ± Ω12
k`

onde o sinal depende da orientação. Portanto

Ω12 (e1 , e2 ) = ± Ω12 (e1 , e2 ) = Ω12 (ē1 , ē2 ),

qualquer que seja a orientação adotada, o que prova o afirmado. O número

Kp (P ) = −(Ω12 )p (e1 , e2 ) = h(Re1 e2 )p (e1 ), e2 i

é chamado a curvatura seccional de M em p segundo P .


Para obter a expressão da curvatura seccional em termos do operador
de curvatura, tomemos dois vetores linearmente independentes X, Y ∈ P ⊂
Tp (M ), e um referencial ortonormal {ei } tal que e1 , e2 gerem P . Então
X = x1 e1 + x2 e2 , Y = y1 e1 + y2 e2 , e, por linearidade e pelas relações
de simetria (6) e (7),

hRXY X, Y i = hRx1 e1 +x2 e2 ,y1 e1 +y2 e2 x1 e1 + x2 e2 , y1 e1 + y2 e2 i


= (x1 y2 − x2 y1 )hRe1 e2 x1 e1 + x2 e2 , y1 e1 + y2 e2 i
= (x1 y2 − x2 y1 )2 hRe1 e2 e1 , e2 i = (A(X, Y ))2 K(P ),

onde A(X, Y ) é a área do paralelogramo formado por X e Y . Portanto

hRXY X, Y i
K(P ) = · (11)
(A(X, Y ))2

Diz-se que uma variedade riemaniana M é isotrópica em p ∈ M se


todas as curvaturas seccionais em p têm o mesmo valor, isto é, se Kp (P )
não depende de P ⊂ Tp (M ).
Proposição 3. Seja M uma variedade riemaniana, p um ponto de M e
{ei } um referencial em uma vizinhança de p. Então M é isotrópica em p
se e só se
Ωij = −Kp ωi ∧ ωj . (12)
32 Variedades riemanianas Seção 1.6

Demonstração: Sejam X = Σ xi ei e Y = Σ yi ei dois vetores linearmente


independentes de Tp (M ). Por linearidade,
X
h(RXY )X, Y i = Rijk` xi yj xk y` .
i,j,k,`

Por outro lado,


2
(A(X, Y ))2 = |X|2 |Y |2 − hX, Y i
à !   à !
X X X X
= δik xi xk  δj` yj y`  −  δij xi yj  δk` xk y`
ik j` ij k`
X
= (δik δj` − δij δk` )xi xk yj y` .
i,j,k,`

Suponhamos agora que M seja isotrópica em p, isto é, para todo X, Y ∈


Tp (M ),
hRXY X, Y i = Kp (A(X, Y ))2 ,
ou seja,
 
X X 
x i yj x k y` = K p (δik δj` − δij δk` )xi yj xk y` ,
 
i,j,k,` i,j,k,`

para todo X, Y .
Afirmamos que isto implica que (note a mudança de ı́ndices no lado
direito da igualdade)

Rijk` = Kp (δik δj` − δkj δi` ).

Para provar nossa afirmação, escolha:


i k
X = (0, . . . , 0, 1, 0, . . . , 1, 0, 0, . . . ),
j `
Y = (0, . . . , 0, 1, 0, . . . , 1, 0, 0, . . . ).

Então,
1 = x i x k yj y` = x k x i yj y` = x i x k y` yj = x k x i y` yj ,
e todos outros produtos são nulos. Segue-se que

Rijk` = Kp (δik δj` − δij δk` ).


Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 33

Da expressão acima, obtém-se


2(Rijk` + Rkji` ) = Kp [δik δj` − δij δk` ] + [δki δej − δk` δij ]
+ [δki δj` − δi` δkj ] + [δki δj` − δkj δi` ],
donde
Rijk` + Rkji` = Kp [2δik δj` − δij δk` − δkj δi` ] (i)
De (i), concluı́mos
Rkij` + Rjik` = Kp [2δkj δi` − δki δj` − δji δk` ]. (ii)
Finalmente, escrevemos a igualdade de Bianchi,
Rijk` + Rkij` Rkji` = 0. (iii)
Se agora tomarmos a soma (i) + (iii) − (ii), obteremos
Rijk` = Kp (δik δj` − δkj δi` ),
como havı́amos afirmado.
Portanto,
1 X
Ωij = − Rijk` ωk ∧ ω`
2
k`
X
=− Kp (δik δj` − δij δk` ) ωk ∧ ω` = −Kp ωi ∧ ωj .
k`

Revertendo os passos do argumento, provaremos a recı́proca.


Diz-se que uma variedade riemaniana M tem curvatura constante se
Kp (P ) não depende de p e de P . O resultado seguinte é surpreendente e
mostra que se dim M ≥ 3, a isotropia de M em todos os seus pontos implica
na constância da curvatura de M .
Teorema (Schur). Seja M n uma variedade riemaniana conexa, n ≥ 3.
Suponha que M é isotrópica para todo p ∈ M . Então M tem curvatura
constante.
Demonstração: Diferenciando a relação (12), obteremos
dΩij = −dKp ∧ ωi ∧ ωj − Kp dωi ∧ ωj + Kp ωi ∧ dωj .
Por outro lado, a segunda identidade de Bianchi (10) e as equações de
estrutura fornecem
X X
dΩij = − Ωik ∧ ωkj + ωik ∧ Ωkj
k k
X X
= Kp ωi ∧ ωk ∧ ωkj − Kp ωik ∧ ωk ∧ ωj
k k
= Kp ωi ∧ dωj − Kp dωi ∧ ωj .
34 Variedades riemanianas Seção 1.6

Segue-se daı́ que, para todo i, j,

dKp ∧ ωi ∧ ωj = 0,

e, portanto, dKp = 0 em M . Como M é conexa, Kp não depende de p.


Voltaremos às variedades de curvatura constante na Seção 1.8. No mo-
mento queremos apenas apresentar dois exemplos de variedades riemanianas
de curvatura constante que junto com o Rn desempenham um papel funda-
mental na Geometria Diferencial.
Exemplo 1. A esfera unitária S n ⊂ Rn+1 centrada na origem. Escolhendo
um referencial adaptado e1 , . . . , en , en+1 em Rn+1 − {0}, teremos
X
dωij = ωik ∧ ωkj + ωi,n+1 ∧ ωn+1,j , i, j, k = 1, . . . , n,
k

donde
Ωij = ωi,n+1 ∧ ωn+1,j .
Como podemos pensar em x = en+1 como o vetor posição da esfera S n em
Rn+1 , teremos
dx = Σ ωi ei = den+1 = Σ ωn+1,i ei ,
donde ωi = ωn+1,i . Decorre daı́ que Ωij = −ωi ∧ ωj , isto é, S n tem
curvatura constante 1.
Exemplo 2 (O espaço hiperbólico). Seja H n = {x ∈ Rn ; |x|2 < 4} a bola
aberta em Rn de raio 2. Vamos definir em H n uma métrica riemaniana
dada por
¿ À
∂ ∂ δij n
, =µ ¶2 , x = (x1 , . . . , xn ) ∈ H .
∂xi ∂xj x 2
1 − |x|4

Munido desta métrica riemaniana, H n é chamado o espaço hiperbólico de


dimensão n. Vamos mostrar que H n tem curvatura constante igual a −1.
2
Façamos u = 1 − |x|4 e escolhamos o referencial ei = u ∂x ∂
i
· É ime-
diato verificar que hei , ej i = δij . O coreferencial associado é dado por
ωi = u1 dxi . Portanto,

1 1 X ∂u
dωi = − 2
du ∧ dxi = − 2 dxj ∧ dxi
u u j ∂xj
X X µ ¶
∂u ∂u ∂u
=− ωj ∧ ωi = − ωj ∧ ωi − ωj .
j
∂xj j
∂xj ∂xi
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 35

Façamos
∂u ∂u
ωij = ωi − ωj = −ωji .
∂xj ∂xi
Pelo Lema 2 da Seção 1.2, ωij são as formas de conexão de H n no refe-
rencial {ei }. Resta-nos mostrar que Ωij = ωi ∧ ωj para concluir que H n
tem curvatura constante −1.
Σ x2i
Como u = 1 − 4 , temos que ∂u
∂xj = − 21 xj . Então
1
ωij = − (xj ωi − xi ωj ).
2
Portanto,
X X 1© ª © ª
ωik ∧ ωkj = x k ωi − x i ωk ∧ x j ωk − x k ωj
4
k k
1 X© ª
= x k x j ωi ∧ ω k − x k x k ωi ∧ ω j + x i x k ωk ∧ ω j
4
k
e
u
dωij = (ωi ∧ ωj − ωj ∧ ωi )
2
1© ª
− xj ωk ∧ (xk ωi − xi ωk ) + xi ωk ∧ (xj ωk − xk ωj ) .
4
Decorre daı́ que
|x|2
Ωij = dωij − Σ ωik ∧ ωkj = u ωi ∧ ωj + ωi ∧ ω j = ω i ∧ ω j ,
4
conforme querı́amos.
Daremos mais um exemplo que, embora não tão fundamental como os
exemplos anteriores, apresenta aspectos instrutivos. Os cálculos abaixo
foram feitos por Antonio Carlos Asperti e Renato Tribuzy.
Exemplo 3 (A métrica do fibrado tangente). Seja M n ⊂ Rn+k=N uma
variedade riemaniana com a métrica induzida. Seja T M ⊂ R N × RN o
fibrado tangente de M , isto é,
T M = {(p, v) ∈ RN × RN ; p ∈ M, v ∈ Tp (M )}.
T M possui uma métrica riemaniana natural que passaremos a definir.
Seja (p, v) ∈ T M e sejam V , W dois vetores tangentes a T M no ponto
(p, v). Sejam α(t) = (x(t), v(t)) e β(t) = (y(t), ω(t)) duas curvas em T M
com
α(0) = (x(0), v(0)) = (p, v), β(0) = (y(0), ω(0)) = (p, v)
α0 (0) = (x0 (0), v 0 (0)) = V, β 0 (0) = (y 0 (0), ω 0 (0)) = W.
36 Variedades riemanianas Seção 1.6

Definiremos

hV, W i(p,v) = hx0 (0), y 0 (0)i + h(v 0 (0)T , (ω 0 (0))T i,

onde h , i no segundo membro indica a métrica de M e ( )T indica ¡ a compo-


¢
nente tangente a M do vetor ( ) ∈ RN . Observe que (v 0 (0))T = ∇ ∂ v t=0
∂t
e que, portanto, a métrica de T M pode ser definida de uma maneira intrı́n-
seca.
É conveniente, às vezes, considerar o fibrado tangente unitário T1 M que
é definido por
T1 M = {(p, v) ∈ T M ; |v| = 1} ⊂ T M.
É claro que a métrica acima definida de T M induz em T1 M uma métrica
riemaniana que chamaremos a métrica natural de T1 M . O interesse na
introdução de T1 M provém do fato de que, quando M é compacto, T1 M
também o é.
A métrica natural do fibrado tangente unitário possui várias propriedades
interessantes. Aqui nos contentaremos em provar que se M = S 2 com a
métrica de curvatura constante igual a 1, então a métrica natural de T1 S 2
tem métrica de curvatura constante igual a 1/4.
No que se segue, indicaremos por π : T1 M → M a aplicação π(p, v) = p.
Seja p ∈ S 2 e sejam (r, θ) , −∞ < r < +∞, 0 < θ < 2π, coordenadas
polares em Tp (S 2 ) − L, onde L é a semi-reta de origem 0 que corresponde a
θ = 0. Como expp : Tp (S 2 ) → S 2 é um difeomorfismo em uma vizinhança V
da origem de Tp (S 2 ), podemos introduzir as coordenadas (r, θ) em expp (V −
¡∂¢
V ∩ L) = U ⊂ S 2 . É fácil verificar que os campos vetoriais e1 = d expp ∂r ,
1
¡∂¢
e2 = sen r d expp ∂θ , definidos em U , são ortonormais. Portanto, uma
parametrização de π −1 (U ) ⊂ T1 (M ) é dada por

(r, θ, ω) → (expp (r, θ), cos ω e1 + sen ω e2 ), 0 < ω < 2π.

Vamos indicar por ∂r, ∂θ, ∂ω os campos coordenados de T1 S 2 na para-


metrização acima. Se mostrarmos que
(a) h∂r, ∂ri = 1,
(b) h∂θ, ∂θi = 1,
(c) h∂ω, ∂ωi = 1,
(d) h∂r, ∂θi = 0,
(e) h∂r, ∂ωi = 0,
(f) h∂θ, ∂ωi = cos r,
poderemos tomar

1 cos r
ε1 = ∂r, ε2 = ∂θ, ε3 = ∂ω − ∂θ, (*)
sen r sen r
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 37

como um referencial ortonormal em U . Para provar as relações (a)-(f),


procederemos ¡da ¢maneira seguinte.
¡ ∂ ¢Será∂ conveniente simplificar a notação
∂ ∂
e fazer d expp ∂r = ∂r , d expp ∂θ = ∂θ ·
(a) Por definição de métrica natural,
¿ À
∂ ∂
h∂r, ∂ri = ,
∂r ∂r
¿ À
D D
+ (cos ω e1 + sen ω e2 ), (cos ω e1 + sen ω e2 ) .
∂r ∂r
D D ∂
Como r → expp (r, θ) é uma geodésica radial em S 2 , ∂r e1 = ∂r ∂r = 0.
D
Além disto, e2 é paralelo ao longo das geodésicas radiais, donde ∂r e2 = 0.
Decorre daı́ que
h∂r, ∂ri = 1 + 0 = 1.
(b) Por definição,
¿ À
∂ ∂
h∂θ, ∂θi = ,
∂θ ∂θ
¿ À
D D
+ (cos ω e1 + sen ω e2 ), (cos ω e1 + sen ω e2 ) .
∂θ ∂θ
∂ ∂
Mas h ∂θ , ∂θ i = sen2 r, donde,
¿ À ¿ À
∂ ∂ ∂ 1 d ∂ ∂
, = , = sen r cos r.
∂r ∂θ ∂θ 2 dr ∂θ ∂θ
Portanto,
¿ À ¿ À ¿ À
D D ∂ 1 ∂ D ∂ 1 ∂
e1 , e 2 = , = , = cos r
∂θ ∂θ ∂r sen r ∂θ ∂r ∂θ sen r ∂θ
e ¿ À
D 1 d
e1 , e 1 = (e1 , e1 ) = 0,
∂θ 2 dθ
isto é,
D
e1 = cos r e2 .
∂θ
Além disto,
¿ À ¿ À ¿ À
d D ∂ 1 ∂ D ∂
e2 , e 1 = − e2 , =− , = − cos r
∂θ ∂θ ∂r sen r ∂θ ∂r ∂θ
e ¿ À
D 1 d
e2 , e 2 = he2 , e2 i = 0,
∂θ 2 dθ
38 Variedades riemanianas Seção 1.6

isto é,
D
e2 = − cos r e1 .

Decorre daı́ que

h∂θ, ∂θi = sen2 r + sen2 ω cos2 r + cos2 ω cos2 r = 1.

(c) Por definição,


¿ À
D D
(∂ω, ∂ω) = (cos ω e1 + sen ω e2 ), (cos ω e1 + sen ω e2 )
∂ω ∂ω
= h− sen ω e1 + cos ω e2 , − sen ω e1 + cos ω e2 i
= sen2 ω + cos2 ω = 1.

(d)
¿ À
∂ ∂
h∂r, ∂θi = ,
∂r ∂θ
¿ À
D D
+ (cos ω e1 + sen ω e2 ), (cos ω e1 + sen ω e2 )
∂r ∂θ
¿ À
D D D D
= 0 + cos ω e1 + sen ω e2 , cos ω e1 + sen ω e2 = 0
∂r ∂r ∂θ ∂θ

(e)

¿ À
D D
(∂θ, ∂ω) = cos ω e1 + sen ω e2 , − sen ω e1 + cos ω e2 = 0.
∂r ∂r

(f)
¿ À
D D
(∂θ, ∂ω) = cos ω e1 + sen ω e2 , − sen ω e1 + cos ω e2
∂θ ∂θ
= h cos ω cos r e2 − sen ω cos r e1 , − sen ω e1 + cos ω e2 i
= cos2 ω cos r + sen2 ω cos r = cos r,

o que conclue a demonstração das afirmações (a)-(f).

Consideremos em U o referencial dado por (*). O coreferencial associado


é dado por

ω1 = dr, ω2 = dθ + cos r dω, ω3 = sen r dω,


Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 39

onde, por exemplo, dr é a diferencial da função coordenada:

(expp (f, θ), cos ω e1 + sen ω e2 ) → r.

Utilizando as equações de estrutura, obteremos

0 = dω1 = ω2 ∧ ω21 + ω3 ∧ ω31 ,

− ω1 ∧ ω3 = dω2 = ω1 ∧ ω12 + ω3 ∧ ω32 ,

cos r
ω1 ∧ ω3 = dω3 = ω1 ∧ ω13 + ω2 ∧ ω23 .
sen r
Para calcular as formas de conexão ω12 , ω13 , ω23 , procederemos da
maneira seguinte. Da primeira equação acima e do lema de Cartan, temos
que

ω21 = A11 ω2 + A12 ω3 ,


ω31 = A12 ω2 + A22 ω3 .

Fazendo ω32 = B1 ω1 + B2 ω2 + B3 ω3 e introduzindo estas expressões nas


duas últimas equações, concluı́mos que
1 cos r
A11 = B2 = B3 = 0, A12 = , A22 = − ,
2 sen r
donde
1 1 cos r 1
ω21 = ω3 , ω31 = ω2 − ω3 , ω32 = ω2 .
2 2 sen r 2
Finalmente, usando as expressões das formas de curvatura, obteremos
1
Ω12 = dω12 − ω13 ∧ ω32 = cos r dr ∧ dω + ω2 ∧ ω 1
4
cos r 1
− ω3 ∧ ω 1 = − ω1 ∧ ω 2 ,
sen r 4
1
Ω13 = dω13 − ω12 ∧ ω23 = − ω1 ∧ ω3 ,
4
1
Ω23 = dω23 − ω21 ∧ ω13 = − ω2 ∧ ω3 .
4
Pela Proposição 3 da Seção 1.6, concluı́mos que T1 S 2 tem curvatura cons-
tante igual a 14 , como havı́amos afirmado.

Para concluir esta seção, mencionaremos que, se M é orientada, a n-


forma diferencial ω1 ∧ · · · ∧ ωn = ν não depende da escolha do referencial
40 Tensores em variedades riemanianas Seção 1.7

{ei }, contanto que tomemos sempre referenciais na orientação de M . Com


efeito, o valor de ν nos vetores vi = Σ aij ej , i, j = 1, . . . , n é dado por
¡X X ¢
(ω1 ∧ ω2 ∧ · · · ∧ ω2 ) a1j ej , . . . , anj ej
j j

= det(aij )ω1 ∧ · · · ∧ ωn (e1 , . . . , en ) = det(aij )

que é igual ao volume orientado do paralelepı́pedo formado pelos vetores vi .


A forma ν é portanto globalmente definida e é chamada a forma volume de
M . Por exemplo, a forma volume da esfera S n no referencial do Exemplo 1
é dada por

ν = ω1 ∧ ω2 ∧ · · · ∧ ωn = ωn+1,1 ∧ · · · ∧ ωn+1,n .

1.7 Tensores em variedades riemanianas


Seja M n uma variedade riemaniana. Um tensor de ordem r em M é uma
correspondência F que a cada ponto p ∈ M associa uma forma r-linear

Fp : Tp (M ) × · · · × Tp (M ) → R.
| {z }
r fatores

Um tensor F é diferenciável em p ∈ M se escolhido um referencial {ei },


i = 1, . . . , n, em uma vizinhança U de p, as funções Fi1 i2 ,...,ir dadas por

Fq (ei1 , ei2 , . . . , eir ) = Fi1 i2 ,...,ir (q),


i1 , i2 , . . . , ir = 1, . . . , n, q ∈ U

são diferenciáveis em p. É claro que esta condição não depende da escolha


do referencial {ei }. F é diferenciável em M se é diferenciável para todo
p ∈ M . De agora por diante, só consideraremos tensores diferenciáveis e
omitiremos o adjetivo diferenciável por conveniência. As funções fi1 ,i2 ,...,ir
são chamadas as componentes do tensor F no referencial {ei }.
Exemplo 1. O tensor curvatura R em M que faz corresponder a cada
p ∈ M e a cada conjunto de quatro vetores X, Y , Z, T de Tp (M ) e valor

Rp (X, Y, Z, T ) = hRZT X, Y i.

R é um tensor de ordem quatro e suas componentes em um referencial {ei }


são dadas por
Rp (ei , ej , ek , e` ) = Rijk` .
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 41

Exemplo 2. O tensor métrico G que faz corresponder a cada ponto p ∈ M


e a cada par de vetores X, Y ∈ Tp (M ), o produto interno de X e Y na
métrica riemaniana de M , isto é,

Gp (X, Y ) = hX, Y ip .

Exemplo 3. Toda k-forma diferencial ω em M é automaticamente um


tensor de ordem k em M .
Observação 1: Para os que são familiares com a noção de tensor, deve
ser mencionado que a definição acima é conveniente para os propósitos da
Geometria Riemaniana. É possı́vel definir a noção de tensor em uma va-
riedade diferenciável sem estrutura riemaniana mas, então, é necessário dis-
tinguir os tensores covariantes (que definimos acima) dos contravariantes
(que poderı́amos definir utilizando o dual de Tp (M )). No nosso caso, isto
é desnecessário, pois a métrica riemaniana faz corresponder a cada campo
diferenciável de vetores X uma forma diferencial ω dada por

ωp (Y ) = hX, Y ip , para todo p ∈ M e todo Y ∈ Tp (M ).

Observação 2: Segundo a definição adotada, um campo diferenciável de


vetores X é um tensor de ordem 1 que faz corresponder a todo p ∈ M e
todo Y ∈ Tp (M ) o valor hX, Y ip .
Freqüentemente será conveniente deixar de indicar o ponto p nos cálculos
abaixo. Por exemplo, se X1 , . . . , Xr são campos diferenciáveis de vetores
em M , F (X1 , . . . , Xr ) indica a função diferenciável que a cada p ∈ M faz
corresponder o valor Fp ((X1 )p , . . . , (Xr )p ). Assim, tem sentido falar na
diferencial d(F (X1 , . . . , Xp )), etc.
Em uma variedade riemaniana, é possı́vel estender a noção de diferencial
covariante a tensores de ordem r. Seja F um tensor de ordem r em uma
variedade riemaniana M n . Seja p ∈ M e {ei } um referencial ortonormal em
uma vizinhança U de p. A diferencial covariante ∇F é um tensor de ordem
r + 1 definido da seguinte maneira. As componentes

Fi1 i2 ,...,ir ;j = ∇F (ei1 , ei2 , . . . , eir , ej ),


i1 , i2 , . . . , ir , j = 1, . . . , n,

de ∇F no referencial {ei } são dadas por


X X
Fi1 i2 ,...,ir ;j ωj = dFi1 ,...,ir + Fji1 ,i3 ,...,ir ωji1
j j
X X
+ Fi1 ji3···r ωji2 + · · · + Fi1 i2 ...ir−1 j ωjir , (1)
j j
42 Tensores em variedades riemanianas Seção 1.7

onde Fi1 i2 ...ir indica as componentes de F no referencial {ei }.


Para mostrar que a definição faz sentido é necessário verificar que ela não
depende da escolha do referencial {ei }. Isto pode ser feito ou por um cálculo
direto ou por meio de uma interpretação geométrica de ∇F . Usaremos a
segunda alternativa.
Observe inicialmente que, por exemplo,
X X
Fi1 i2 ji4 ...ir ωji3 (ei ) = F (ei1 , ei2 , ej , . . . , eir )h∇ei ej , ei3 i.
j j

Como F é linear e h∇ei ej , ei3 i = −hej , ∇ei ei3 i, teremos


X X X
Fi1 i2 ji4 ,...,ir ωji3 (ei ) = −F (ei1 , ei2 , h ∇ei ei3 , ej iej , . . . , eir )
j j j

= −F (ei1 , ei2 , ∇ei ei3 , ei4 , . . . , eir ).

Portanto
X
Fi1 i2 ,...,ir ;i = Fi1 i2 ,...,ir ;j ωj (ei )
j

= (dF (ei1 , ei2 , . . . , eir ))(ei ) − F (∇ei ei1 , ei2 , . . . , eir )

− · · · − F (ei1 , ei2 , . . . , ∇ei eir )


= ∇F (ei1 , ei2 , . . . , eir , ei ).

Sejam agora
X X X X
X1 = x1i1 ei1 , X2 = x2i2 ei2 , . . . , Xr = xrir eir , Y = y i ei
i1 i2 ir i

r+1 campos diferenciáveis em U . Usando a linearidade, a regra de derivação


do produto e a expressão anterior, obteremos

∇F (X1 , . . . , Xr , Y ) = d(F (X1 , . . . , Xr ))(Y )−


− F (∇Y X1 , X2 , . . . , Xr ) − · · · − F (X1 , X2 , . . . , ∇Y Xr )

o que mostra que a definição de ∇F não depende do referencial.


A noção de derivada covariante se obtém a partir da noção de diferen-
cial covariante da maneira usual. Mais explicitamente, define-se a derivada
covariante de um tensor F em relação a um campo diferenciável de vetores
X como sendo o tensor ∇X F de mesma ordem que F dado por

∇X F (X1 , . . . , Xr ) = ∇F (X1 , X2 , . . . , Xr , X).


Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 43

Exemplo 1. Vamos mostrar que ∇G = 0, onde G é o tensor métrico de


M . Com efeito, dados campos diferenciáveis de vetores X1 , X2 , Y , teremos
∇G(X1 , X2 , Y ) = (dG(X1 , X2 ))(Y ) − G(∇Y X1 , X2 ) − G(X1 , ∇Y X2 )
= dhX1 , X2 i(Y ) − {h∇Y X1 , X2 i + hX1 , ∇Y X2 i} = 0,
o que exprime simplesmente que a derivada covariante satisfaz a regra do
produto (V. (4) da Prop. 2 da Seção 1.6).
No caso de uma imersão x : M n → Rn+q de uma variedade riemaniana,
é conveniente estender a noção de tensor da maneira seguinte. Um tensor
de ordem (r, `), ` 6= 0, de uma imersão x é uma correspondência F que a
cada ponto p ∈ M associa uma forma (r + `)-linear
Fp : Tp (M ) × · · · × Tp (M ) × Np (M ) × · · · × Np (M ) → R.
| {z } | {z }
r fatores ` fatores

A definição de diferenciabilidade de um tal tensor é feita da maneira usual.


A diferencial covariante ∇F de F (X, Y, . . . , Z, ξ, η, . . . , ζ) é o (r + ` + 1)-
tensor dado por
∇F (X, Y, . . . , Z, ξ, . . . , ζ; T )
= dF (X, Y, . . . , Z, . . . , ξ, η, . . . , ζ)(T ) − F (∇T X, Y, . . . , Z, ξ, η, ζ)
− F (X, ∇T Y, . . . , Z, ξ, η, ζ) − · · · − F (X, Y, . . . , Z, ∇T ξ, η, ζ)
− F (X, Y, . . . , Z, ξ, η, ∇T ζ).
Naturalmente, a derivada em T de F é dada por
∇T F (X, Y, . . . , Z, ξ, η, . . . , ζ) = ∇F (X, Y, . . . , Z, ξ, η, . . . , ζ; T ).
A derivação covariante de tensores permite estender às variedades rie-
manianas certos operadores diferenciais (laplaciano, divergência, etc) de uso
freqüente no Rn . Passaremos a uma exposição de alguns destes operadores.
Seja f : M → R uma função diferenciável em uma variedade riemaniana
M . O gradiente de f é o campo vetorial grad f em M definido por
h grad f, Xip = dfp (X),
para todo p ∈ M e todo X ∈ Tp (M ). Em outras palavras, grad f é o dual
na métrica riemaniana da forma df .
Considerando umP referencial {ei } em um aberto U ⊂ M , podemos es-
crever, em U , df = fi ωi . A função fi é chamada a derivada de f na
i
direção ei . É imediato que, em U ,
X
grad f = f i ei .
i
44 Tensores em variedades riemanianas Seção 1.7

A diferencial covariante de df é dada por


X
∇(df ) = fi;j ωi ωj ,
i,j

onde, por (1), X X


fi;j ωj = dfi + fj ωji .
j j

A forma bilinear ∇(df ) é chamada o hessiano de f na métrica de M . O


traço desta forma bilinear, isto é, a função em M dada por
X
fi;i = ∆f
i

é chamada o laplaciano de f . Note que no caso M = Rn (ωij = 0), hessiano


e laplaciano concidem com os conceitos conhecidos do R n . As funções em
M para as quais ∆f = 0 são chamadas harmônicas.
Dado um campo diferenciável de vetores X em M , a métrica riemaniana
faz corresponder a X uma 1-forma diferencial ω X dada por
ω X (Y ) = hX, Y ip ,
para todo p ∈ M e todo Y ∈ Tp (M ). Dado um referencial local {ei }, é
imediato verificar que se X = Σ xi ei então
X
ωX = x i ωi .

A diferencial covariante ∇ω X de ω X é uma forma bilinear


X
∇ω X = xi;j ωi ωj ,

onde, por (1), X X


xi;j ωj = dxi + xj ωji . (2)
j j

O traço de ∇ω X , isto é, a função em M dada por


X
xi;i = div X
i

é chamada a divergência de X. Observe que


∆f = div grad f.
As expressões seguintes são obtidas sem dificuldade a partir das definições,
e serão deixadas como exercı́cios.
div(f X) = f div X + X(f ), (3)
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 45

∆(f g) = f ∆g + g∆f + 2h grad f, grad gi. (4)


A importância destes operadores reside no fato que eles permitem de-
monstrar teoremas globais em variedades riemanianas. Dentro em pouco
mostraremos que se ν é a forma volume de uma variedade riemaniana ori-
entável, então
div X ν = dθ, (5)
onde θ é uma (n − 1)-forma definida em M . Admitindo provisoriamente
este fato, podemos demonstrar o seguinte teorema de uso freqüente.
Teorema (E. Hopf). Seja M uma variedade riemaniana orientável, com-
pacta e conexa. Seja f uma função diferenciável em M com ∆f ≥ 0. Então
f = const.
Demonstração: Seja X = grad f . Usando (5) e o teorema de Stokes,
obteremos
Z Z Z Z
∆f ν = div X ν = dθ = θ = 0.
M M M ∂M

Como ∆f ≥ 0, teremos que ∆f = 0. Utilizando de novo o teorema de


Stokes para f 2 /2, teremos, por um lado,
Z Z Z Z
∆(f 2 /2)ν = div Y ν = dθ0 = θ0 = 0,
M M M ∂M

2
onde Y = grad(f /2). Por outro lado, usando (4),
Z Z Z
∆(f 2 /2)ν = f ∆f ν + | grad f |2 ν.
M M M

Como ∆f ≡ 0, concluı́mos que grad f ≡ 0, o que implica que df ≡ 0. Como


M é conexa, f é constante em M .
Resta-nos provar (5). Para isto, convém introduzir a noção de produto
interior iX ω de um campo diferenciável de vetores X com uma k-forma
diferencial ω. Esta noção não necessita da presença de uma métrica riema-
niana. Por definição, iX ω é uma forma de grau k − 1 tal que
¡ ¢
iX ω p (v1 , . . . , vk−1 ) = (ω)p (v1 , . . . , vk−1 , Xp ),

para todo p ∈ M e todo v1 , . . . , vk−1 ∈ Tp (M ).


Afirmamos que dθ na igualdade (5) é dada por (−1)n d(iX ν), isto é, que

(−1)n div Xν = d(iX ν), (6)

onde n é a dimensão da variedade M .


46 Equações de estrutura em referenciais geodésicos... Seção 1.8

Para provar (6), basta verificá-la em um referencial particular. Escolha-


mos um referencial local {ei } tal que X = xn en . Então

iX ν(e1 , . . . , en−1 ) = ν(e1 , . . . , en−1 , xn en ) = xn ,

e iX ν(ei1 , . . . , ein−1 ) = 0 se i1 , . . . , in−1 é qualquer combinação de n − 1


elementos de 1, 2, . . . , n, distinta de 1, . . . , n − 1. Portanto, neste referencial,

iX ν = ω1 ∧ · · · ∧ ωn−1 xn .

Decorre daı́, usando as equações de estrutura e (2), que

d(iX ν) = dω1 ∧ ω2 ∧ · · · ∧ ωn−1 xn


+ (−1)ω1 ∧ dω2 ∧ · · · ∧ ωn−1 xn
+ · · · + (−1)n ω1 ∧ · · · ∧ ωn−1 ∧ dxn
¡X ¢
= ωj ∧ ωj1 ∧ ω2 ∧ · · · ∧ ωn−1 xn
j
¡X ¢
+ (−1)ω1 ∧ ωj ∧ ωj2 ∧ · · · ∧ ωn−1 xn
j
n
¡X ¢
+ · · · + (−1) ω1 ∧ · · · ∧ ωn−1 ∧ xn;j ωj − xn ωnn
j

= (−1)n (xn ωn1 ) ∧ ω2 ∧ · · · ∧ ωn


+ (−1)n (xn ωn2 ) ∧ ω1 ∧ ω3 ∧ · · · ∧ ωn
+ · · · + (−1)n xn;n ω1 ∧ · · · ∧ ωn
= (−1)n {x1;1 ν + x2;2 ν + · · · + xn;n ν} = (−1)n div Xν,

pois, de (2), X
xn ωni = xi;k ωk .
k

Portanto (6) está demonstrado.

1.8 Equações de estrutura em referenciais geodésicos;


determinação local da métrica pela curvatura
Uma pergunta natural é se o conhecimento do tensor curvatura deter-
mina localmente a métrica riemaniana de uma variedade. Em um certo
sentido, que pretendemos explicitar neste parágrafo, a resposta é afirma-
tiva. Uma afirmação equivalente foi feita pela primeira vez por Riemann
em sua famosa dissertação de 1850, ([Ri], pg. 289). Ao que saibamos, a
primeira demonstração do resultado local foi dada por Elie Cartan ([Ca 1],
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 47

pg. 238) e é essencialmente a demonstração que apresentamos aqui. A


versão global do teorema, que não apresentaremos, foi feita por Ambrose
em 1956 ([Amb]). Uma apresentação do resultado de Ambrose pode ser
encontrada em Cheeger, Ebin [ChEb].
Precisamos de um lema preliminar, útil em muitas outras situações, que
é uma forma particular das equações de estrutura.
Seja M n uma variedade riemaniana e p um ponto de M . Seja U uma
vizinhança normal de p, isto é, U = expp (V ), onde V é uma vizinhança da
origem em Tp (M ) na qual expp é um difeomorfismo. Considere o referencial
{ei }, i = 1, . . . , n, em U obtido transportando paralelamente uma base
ortonormal (e1 )p , . . . , (en )p de Tp (M ) ao longo das geodésicas em U que
saem de p. Um tal referencial é chamado um referencial geodésico em p em
uma vizinhança normal U de p.
Sejam ωi , ωij as formas do coreferencial e as formas de conexão de M
em {ei }, respectivamente. Considere o espaço R × Rn e seja W ⊂ R × Rn
o aberto dado por
( )
X
n
W = (t, a1 , . . . , an ) ∈ R × R ; t ai {ei }p ∈ V .
i

Seja F : W → U dada por


¡ X ¢
F (t, a1 , . . . , an ) = expp t a i ei .
i
∗ ∗ n
Então F ωi , F ωij são formas em R × R e podemos escrever

F ∗ ωi = fi dt + θi , F ∗ ωij = θij ,

onde θi não contém dt.


Lema (equações de estrutura em um referencial geodésico). Com a notação
acima, θij não contém dt e

fi (t, a1 , . . . , an ) = ai .

Além disso, as seguintes equações são verificadas:


∂θi X ¯
= dai + aj θji , θi (t, ak , da` )¯t=0 = 0, (1)
∂t j
∂θij X ¯
=− Rijk` ak θ` , θij (t, ak , da` )¯t=0 = 0, (2)
∂t
k`

∂θi ∂θi
onde a forma ∂t , por exemplo, é definida por dθi = dt ∧ ∂t + termos sem
dt.
48 Equações de estrutura em referenciais geodésicos... Seção 1.8

Demonstração: Façamos
θij = F ∗ ωij = βij dt + αij ,
onde αij não contém dt. Fixado a = (a1 , . . . , an ) ∈ Rn , a curva γ(t) =
F (t, a) é uma geodésica partindo de p com vetor tangente γ 0 (t) = Σ ai ei . É
claro que γ ∗ ωi = fi dt e γ ∗ ωij = βij dt. Portanto,
µ ¶ µ µ ¶¶
∂ ∂
f i = γ ∗ ωi = ωi dγ = ωi (γ 0 (t)) = ai ,
∂t ∂t
µ ¶ µ µ ¶¶
∗ ∂ ∂
βij = γ ωij = ωij dγ = ωij (γ 0 (t)) = h∇γ 0 (t) ei , ej i = 0,
∂t ∂t
pois o referencial {ei } é paralelo ao longo de γ. A primeira afirmação do
lema está portanto provada.
Para provar a validade das equações indicadas, apliquemos as equações
de estrutura às formas F ∗ ωi , F ∗ ωij . Por um lado,
X
dF ∗ ωi = F ∗ dωi = F ∗ (Σ ωj ∧ ωji ) = (fj dt + βj ) ∧ θji
j
X X
=− aj θji ∧ dt + θj ∧ θji
j j

e por outro,
∂θi
dF ∗ ωi = d(ai dt + θi ) = dai ∧ dt + dt ∧ + termos sem dt.
∂t
Portanto,
∂θi ¡ X ¢
∧ dt = dai + aj θji ∧ dt + termos sem dt,
∂t j

o que fornece a equação em (1) (a condição inicial (1) será verificada dentro
em pouco).
Analogamente,
¡X 1X ¢
d(F ∗ ωij ) = F ∗ dωij = F ∗ ωis ∧ ωsj − Rijk` ωk ∧ ω`
s
2
k`
X 1 X
+ θis ∧ θsj − Rijk` (fk dt + θk ) ∧ (f` dt + θ` )
s
2
k`
¡1 X 1X
= Rijk` ak θ` + Rij`k a` θk ) ∧ dt = termos sem dt
2 2
k` k`
X
= Rijk` ak θ` ∧ dt + termos sem dt,
k`
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 49

e
∂θij
dF ∗ ωij = dθij = dt ∧ + termos sem dt.
∂t
Portanto,
∂θij X
=− Rijk` ak θ` ,
∂t
k`

o que prova a equação em (2).


Para verificar as condições iniciais, observe que se g é uma função dife-
renciável arbitrária em uma vizinhança de p, então, em (0, a1 , . . . , an ) ∈ W ,
µ ¶ µ µ ¶¶
∂(g ◦ F ) ∂ ∂
0= = dg ◦ dF = dF g,
∂ai ∂ai ∂ai

onde a primeira igualdade vem do fato que F (0, a1 , . . . , an ) = p. Portanto,


em t = 0,
µ ¶ µ µ ¶¶
∂ ∂
θj = ωj dF = 0,
∂ai ∂ai
µ ¶ µ µ ¶¶
∂ ∂
θij = ωij dF = 0,
∂ai ∂ai

o que prova as condições iniciais em (1) e em (2).


Para enunciar o teorema de Cartan, precisamos de alguma notação. Se-
jam M e M 0 duas variedades riemanianas e sejam p ∈ M e p0 ∈ M 0 . No que
se segue, indicaremos por uma linha as entidades correspondentes em M 0 .
Seja V uma vizinhança da origem de Tp (M ) onde expp é um difeomorfismo,
fixemos uma isometria linear i : Tp (M ) → Tp0 (M 0 ), e seja

f : expp V = U → expp0 V 0 = U 0

a aplicação dada por

f (q) = expp0 ◦ i ◦ exp−1


p (q), q ∈ U.

Para todo q ∈ U , seja Ppq = Tp (M ) → Tq (M ) o transporte paralelo de p a


q ao longo da geodésica radial dada por expp tv, v = exp−1
p (q), 0 ≤ t ≤ 1.
Seja φq : Tq (M ) → Tf (q) (M 0 ) a aplicação

φq (X) = Pp0 0 f (q) ◦ i ◦ Ppq


−1
(X), X ∈ Tq (M ).

Diremos que φ preserva curvatura se, para todo q ∈ U e todo X, Y, Z, T ∈


Tq (M ), tivermos

hRXY Z, T iq = hRφ0 q (X)φq (Y ) φq (Z), φq (T )if (q) .


50 Equações de estrutura em referenciais geodésicos... Seção 1.8

Teorema (Cartan). Com a notação acima, se φ preserva curvatura, então


f : U → U 0 é uma isometria.
Demonstração: Escolha uma base ortonormal {(ei )p } em Tp (M ) e faça
i(ei )p = (e0i )p0 . Construa um referencial geodésico {ei } em U transportando
paralelamente {(ei )p } ao longo das geodésicas radiais de U e efetue uma
construção semelhante em U 0 a partir de (e0i )p0 . Pela construção dos refe-
renciais, dizer que φ preserva curvatura e equivalente a que
(Rijk` )q = (Rijk` )0 f (q) , q ∈ U.

Pelo lema, as formas {θi , θij } e {θi0 , θij


0
} são soluções de um mesmo sistema
((1)+(2)), com as mesmas condições iniciais. Portanto θi = θi0 , θij = θij 0
.
0 0 n
Observe que θi , θij , θi , θij são formas induzidas em R × R pelas aplicações
F e F 0 definidas como no lema. Como F 0 = f ◦ F , teremos que
ωij = f ∗ ωij
0
, ωi = f ∗ ωi0 ,
P P
donde ωi2 = f ∗ ωi02 , isto é, f é uma isometria.
i i

Corolário 1. Duas variedades riemanianas M e M 0 de mesma curvatura


constante K são localmente isométricas.
Corolário 2. Seja M n uma variedade riemaniana de curvatura constante.
Sejam p e q dois pontos de M , a1 , . . . , an uma base ortonormal de Tp (M )
e b1 , . . . , bn uma base ortonormal de Tq (M ). Então existe uma isometria f
de uma vizinhança normal Up de p em uma vizinhança normal Uq de q tal
que f (p) = q e dfp (ai ) = bi , i = 1, . . . , n.
Observação 1: Uma variedade riemaniana M é completa se para todo
p ∈ M , a aplicação expp é definida em todo o Tp (M ). Uma variedade
diferenciável M é simplesmente conexa se toda curva fechada em M pode
ser continuamente deformada em um ponto. É possı́vel provar que se as
variedades M e M 0 do Corolário 1 são completas, simplesmente conexas e
têm a mesma curvatura constante K, então elas são globalmente isométricas.
(V. M. do Carmo [dC 2] pg. 177).
Relacionado com o problema que acabamos de tratar existe o problema
de saber se um difeomorfismo f : M → M 0 que preserva curvaturas no
sentido que
0
hRX,Y Z, T ip = hRdf p (X),dfp (Y )
dfp (Z), dfp (T )if (p) ,

para todo p ∈ M e todo X, Y, Z, T ∈ Tp (M ), é uma isometria. Em dimensão


dois, isto seria uma espécie de recı́proca do teorema de Gauss e é falso,
mesmo no caso compacto, como mostra o exemplo da figura a seguir:
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 51

isométricas isométricas

dilatação = f

f é um difeomorfismo que preserva curvatura mas não é uma isometria.


Para n ≥ 4 (n = dim M = dim M 0 ), o problema admite, com algumas
hipóteses adicionais, uma solução afirmativa. Por exemplo, se M é C ∞
e o conjunto dos pontos não-isotrópicos de M é denso em M , então um
difeomorfismo de M em M 0 que preserva curvaturas no sentido acima é
uma isometria (V. Kulkarni, [Ku 1], [Ku 2]). Para n = 3, o problema foi
tratado por Yau [Ya].

1.9 Imersões riemanianas


n+q
Seja M n uma variedade riemaniana e seja x : M n → M uma imersão
de M em uma variedade riemaniana M . Diremos que x é uma imersão
isométrica (ou riemaniana) se

hv1 , v2 ip = hdx(v1 ), dx(v2 )ix(p) ,

para todo ponto p ∈ M e todo par v1 , v2 ∈ Tp (M ). Em outras palavras, f


é isométrica se a métrica induzida coincide com a métrica original.
Dado um ponto p ∈ M , escolheremos uma vizinhança U ⊂ M de p de
tal modo que x restrita a U seja injetiva. Seja V ⊂ M uma vizinhança de
p em M tal que V ⊃ x(U ) e que em V seja possı́vel definir um referencial
ortonormal {eA }, A = 1, . . . , n + q, adaptado a x, isto é, restritos a x(U )
os vetores e1 , . . . , en são tangentes a x(U ). Faremos a convenção usual de
identificar U ⊂ M com x(U ) ⊂ M , e utilizaremos os seguintes domı́nios
para os ı́ndices:

1 ≤ A, B, C, · · · ≤ n + q, 1 ≤ i, j, k, · · · ≤ n, n + 1 ≤ α, β, γ, · · · ≤ n + q.

O espaço tangente Tp (M ) de M em p se decompõe em uma soma direta


Tp (M ) = Tp (M ) ⊕ Np (M ), onde identificamos dxp (M )) ≈ Tp (M ) e deno-
tamos por Np (M ) o complemento ortogonal de Tp (M ) em Tp (M ). Np (M )
será chamado o espaço normal da imersão x em p. Um campo normal ν é
uma correspondência que a cada p ∈ M associa um vetor ν(p) ∈ Np (M ) de
tal modo que para todo referencial adaptado em uma vizinhança V ⊂ M
52 Imersões riemanianas Seção 1.9

de p em V , as funções να dadas por ν = Σ να eα sejam diferenciáveis em p.


É claro que uma tal condição não depende da escolha do referencial.
Em V temos as formas ωA , ωAB que satisfazem as equações de estrutura:
X
dωA = ωB ∧ ωBA ,
B

X 1 X
dωAB = ωAC ∧ ωCB + ΩAB , ΩAB = − RABCD ωC ∧ ωD .
2
C

As restrições destas formas em U ⊂ V satisfazem as mesmas equações de


estrutura e, como o referencial é adaptado, ωα = 0. Decorre daı́ que

0 = dωα = Σ ωi ∧ ωiα ,

e pelo lema de Cartan,


X
ωiα = hα
ij ωj , hα α
ij = hji .
j
P
A forma quadrática II α = hα
ij ωi ωj é a segunda forma quadrática de x
ij
na direção eα .
Seja ν um campo unitário normal em M . É possı́vel escolher a parte
normal do referencial {eα } em U de modo que en+1 = ν em U . II ν =
II n+1 é então chamada a segunda forma quadrática de x na direção ν.
Para mostrar que a definição não depende da escolha do referencial, seja
α : (−ε, ε) → U uma curva parametrizada pelo comprimento de arco com
α(0) = p. Fazendo α0 (0) = v, e escolhendo a parte tangente do referencial
de modo que α0 (s) = e1 , teremos
¡X ¢ X
IIpν (v) = IIpn+1 (e1 ) = ωi,n+1 ωi (e1 ) = ¯ e ei , en+1 iωi (e1 )
h∇ 1
i i
= h∇ ¯ α0 (0) α0 (s), νi,
¯ e e1 , νi = h∇ (1)
1

isto é, IIpν (v) é a componente segundo ν do vetor curvatura geodésica em


M de uma curva passando por p com vetor tangente v. Portanto, II ν não
depende da escolha do referencial e está globalmente definida.
A transformação linear auto-adjunta em Tp (M ) associada à forma qua-
drátia IIpν em Tp (M ) será indicada por

−Aνp : Tp (M ) → Tp (M ).

Como hv, νi = 0, se v ∈ Tp (M ), teremos, usando (1),


¯ v ν, vi.
hAνp (v), vi = −IIpν (v) = h∇
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 53

Às vezes é conveniente usar a aplicação bilinear Bp : Tp (M ) × Tp (M ) →


Np (M ) dada por

hBp (X, Y ), νip = −hAνp (X), Y ip , X, Y ∈ Tp (M ), ν ∈ Np (M ).

Em termos de um referencial local adaptado, B é dada por


X¡X ¢
B(X, Y ) = hα
ij ωi (X)ωj (Y ) eα ,
α ij

o que mostra que B é uma aplicação bilinear simétrica. O traço de B em


p, isto é, X¡X ¢
hαii eα = n Hp
α i

dá origem a um vetor normal Hp chamado o vetor curvatura média em p.


Uma imersão x : M → M é mı́nima se H ≡ 0. A teoria das imersões
mı́nimas é um ramo altamente desenvolvido da Geometria. Para maiores
detalhes, veja-se Chern [Ch], Lawson [La], Osserman [Os].
Separando as equações de estrutura nas partes tangenciais e normais,
obteremos
X
dωi = ωj ∧ ωji (2)
j
X X
dωij = ωik ∧ ωkj + ωiα ∧ ωαj + Ωij (3)
k α
X X
dωiα = ωik ∧ ωkα + ωiβ ∧ ωβα + Ωiα (4)
k β
X X
dωαβ = ωαi ∧ ωiβ + ωαγ ∧ ωγβ + Ωαβ (5)
i γ

As formas ωij só dependem da métrica riemaniana de M e da parte tan-


gente do referencial {ei }. Por outro lado, as formas ωαβ determinam uma
derivação covariante para campos de vetores normais, definida da maneira
usual (Cf. Seção 1.5): Se {eA } é um referencial local adaptado, X é um
campo de vetores tangentes a M e ξ = Σ ξα eα é um campo de vetores
normais a M , então o campo normal
X© X ª
∇⊥
Xξ = dξα (X) + ωβα (X)ξβ eα ,
α β

não depende do referencial escolhido. As formas ωαβ são as formas da


conexão normal e ∇⊥
X é chamada a derivada covariante normal em relação
ao campo tangente X.
54 Imersões riemanianas Seção 1.9

¯ X ξ,
Estendendo X e ξ a campos vetoriais de M , podemos calcular ∇
¯
onde ∇X é a derivada covariante em M , da seguinte maneira:
X© X ª
¯ Xξ =
∇ dξA (X) + ωBA (X) ξA eA
A B
X© X ª X
= dξα (X) + ωβα (X) ξβ eα + ωβi (X) ξβ ei
α β iβ
X¡X ¢
= ∇⊥
Xξ + ωβi (X) ξβ ei .
i β

Portanto ∇⊥ ¯
X ξ é a componente normal de ∇X ξ. Observe (Cf. item 5 da
¯
Prop. 2 da Seção 1.6) que ∇X ξ não depende realmente das extensões con-
sideradas mas só dos valores de X e ξ em M .
Analogamente se verifica que ∇X Y é a componente tangente de ∇ ¯ XY ,
onde X e Y são campos
P de vetores tangentes em M .
As formas dωij − ωik ∧ωkj = Ωij são as formas de curvatura da métrica
k P
riemaniana de M . As formas dωαβ − ωαγ ∧ ωγβ = Ωαβ são chamadas
γ
formas da curvatura normal da imersão. Elas determinam, da maneira

usual, um operador de curvatura normal (RXY )p : Np (M ) → Np (M ), para
todo par de vetores X, Y ∈ Tp (M ).
Da equação (3) decorre que o tensor curvatura Rijk` de M está rela-
cionado com as componentes tangentes Rijk` do tensor curvatura de M
por
1 X X X
− Rijk` ωk ∧ ω` = Ωij = dωij − ωik ∧ ωkj = ωiα ∧ ωαj + Ωij
2 α
k` k
1 X¡X α α ¢ 1 X
= (hi` hjk − hα α
ik hj` ) ωk ∧ ω` − Rijk` ωk ∧ ω` ,
2 α
2
k` k`

ou seja, X
Rijk` = Rijk` − (hα α α α
i` hjk − hik hj` ), (6)
α

que é chamada a equação de Gauss e generaliza a equação (12) da Seção 1.5.


Usando a linearidade, é fácil verificar que a equação de Gauss se escreve

hRXY (Z), T i = hRXY (Z), T i − {hB(X, T ), B(Y, Z)i − hB(X, Z), B(Y, T )i}

para todo X, Y, Z, T ∈ Tp (M ), ou seja, em termos de curvaturas seccionais,

K(X, Y ) = K(X, Y ) + {hB(X, X), B(Y, Y )i − (B(X, Y ))2 }, (6’)

onde K(X, Y ) indica a curvatura seccional do plano gerado por X e Y .


Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 55

Da equação (5) decorre, analogamente, que

1X X
− Rαβij ωi ∧ ωj = Ωαβ = dωαβ − ωαγ ∧ ωγβ
2 ij γ
X
= ωαk ∧ ωkβ + Ωαβ
k

1 X¡X α α X α β ¢ 1
− hkj hki − hki hkj ωi ∧ ωj − Rαβij ωi ∧ ωj
2 ij 2
k k

ou seja, X β α
Rαβij = (hα α
ik hkj − hik hkj ) + Rαβij (7)
k

que é chamada a equação de Ricci e generaliza a equação (13) da Seção 1.5.


Usando a linearidade, podemos escrever a equação de Ricci na forma

hRXY ξ, ηi = −h(Aξ Aη − Aη Aξ )(X), Y i + hRXY ξ, ηi
= −h[Aξ , Aη ]X, Y i + hRXY ξ, ηi, (7’)

para todo X, Y ∈ Tp (M ) e todo ξ, η ∈ Np (M ), e onde indicamos Aξ Aη −


Aη Aξ = [Aξ , Aη ].
Observe que se M tem curvatura constante, Rαβij = 0 para todo
α, β, i, j (Cf. Prop. 3 da Seção 1.6), donde hRXY ξ, ηi = 0. Portanto,

hRXY ξ, ηi = −h[Aξ , Aη ]X, Y i.

Por um teorema de Álgebra Linear, [Aξp , Aηp ] = 0, isto é, Aξp e Aηp comutam
se e só se existe uma base em Tp (M ) que diagonaliza simultaneamente Aξp
e Aηp . Decorre daı́ a seguinte proposição.

Proposição 1. Seja x : M → M uma imersão isométrica em uma varie-


dade riemaniana M de curvatura constante. Então é possı́vel diagonalizar
simultaneamente todas as segundas formas quadráticas da imersão x em
cada ponto de p ∈ M se e somente se a curvatura normal da imersão é
identicamente zero.
Exemplo 1. Seja x1 : Srm1 → Rm+1 a esfera de raio r1 centrada na origem
de Rm+1 . Seja
x : Srm1 × Srq2 → S1m+q+1 ⊂ Rm+q+2 ,
+x2
p
a imersão dada por x = x1D , D = r12 + r22 . x é uma imersão de um
produto de esferas de dimensão m + q em uma esfera unitária de dimensão
m + q + 1. Vamos calcular a primeira e a segunda formas quadráticas de x.
56 Imersões riemanianas Seção 1.9

Para isto, escolha um referencial e0 , e1 , . . . , em , f0 , f1 , . . . , fq em um


aberto de Rm+q+2 de tal modo que r1 e0 = x1 , r2 f0 = x2 , e1 , . . . , em sejam
tangentes a Srm1 e f1 , . . . , fq sejam tangentes a Srq2 . Observe que

r 2 e0 − r 1 f 0
ν=
D
é um vetor unitário normal de x. Defina formas ϕi e ϕ̃j , i = 1, . . . , m,
j = 1, . . . , q, por X X
de0 = ϕi ei , df0 = ϕ̃j fj .
i j

Então, a segunda forma quadrática II de x na direção ν é dada por


¿ À
r1 de0 + r2 df0 r2 de0 − r1 df0
−II = hdx, dνi = ,
D D
r1 r2
= {hde0 , de0 i − hdf0 , df0 i}
D2

r1 r2 ¡ X 2 X 2 ¢
= ϕi − ϕ̃j .
D2 i j

Definindo
r1 r2
ωi = ϕi , ω̃j = ϕ̃j ,
D D
teremos finalmente
r12 X 2 r2 X 2 X 2 X 2
I = hdx, dxi = 2
ϕi + 22 ϕ̃j = ωi + ω̃j ,
D D i j
r2 X 2 r1 X 2
−II = hdx, dvi = ω − ω̃ .
r1 i i r2 j j

¡ ¢2
Observe que se rr21 = m q , então o traço de II é zero, isto é, x é uma
imersão mı́nima de um produto de esferas em uma esfera unitária. Este
x1
exemplo inclue o caso do toro de Clifford para m = q = 1, r1 = r2 e x = √ 2
(Cf. Exemplo 1 da Seção 1.5). Observe ainda que, pela fórmula de Gauss,
as curvaturas seccionais dos planos gerados por vetores ei , fj são nulos.
Por outro lado, os planos gerados por ei , ek , i, k = 1, . . . , m têm curvaturas
positivas.

Uma imersão x : M → M é geodésica em p ∈ M se IIpν = 0 para todo


ν ∈ Np (M ). A imersão é totalmente geodésica se ela é geodésica em todo
ponto p ∈ M . A razão desta terminologia é dada na proposição seguinte.
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 57

Proposição 2. Uma imersão x : M → M é geodésica em p ∈ M se e só se


toda geodésica γ de M partindo de p é geodésica de M em p.
Demonstração: Suponhamos que x é geodésica em p e parametrizemos
γ pelo comprimento de arco s, com γ(0) = p. Seja {eA } um referencial
adaptado em uma vizinhança de p de modo que e1 = γ 0 (s). Então, para
todo ν ∈ Np (M ),
¯ γ 0 (0) γ 0 (s), νi = 0.
IIpν (γ 0 (0)) = h∇ (8)
Como γ é geodésica em M ,
¯ γ 0 (0) γ 0 (s), ei i = ω1i (γ 0 (0)) = h∇γ 0 (0) γ 0 (s), ei i = 0,
h∇ (9)
para todo ei ∈ Tp (M ). Decorre de (8) e (9) que ∇¯ γ 0 (0) γ 0 (s) = 0 em p, isto
é, γ é geodésica de M em p.
Reciprocamente, suponhamos que toda geodésica γ de M partindo de p
é geodésica de M em p. Seja v ∈ Tp (M ) um vetor unitário e seja γ uma
geodésica de M parametrizada pelo comprimento de arco, de modo que
γ(0) = p, γ 0 (0) = v.
Como γ é geodésica de M em p, tem-se, por (8)
IIpν (v) = 0,
para todo ν ∈ Np (M ). Como isto se verifica para todo v ∈ Tp (M ), IIpν = 0,
isto é, x é geodésica em p.
A condição de ser totalmente geodésica é muito forte. Se, por exem-
plo, M = Rn+q , a Proposição 2 mostra que as imagens das imersões to-
talmente geodésicas em Rn+q são as subvariedades lineares de Rn+q . Se
M = S n+q ⊂ Rn+q+1 é uma esfera centrada na origem de Rn+q+1 , as ima-
gens das imersões totalmente geodésicas em S n+q são as intersecções com
S n+q de subvariedades lineares de Rn+q+1 passando pela origem.

A Proposição 2 permite também obter uma interpretação geométrica


interessante da curvatura seccional. Seja M uma variedade riemaniana,
p ∈ M e P ⊂ Tp (M ) um subespaço de dimensão dois de Tp (M ). Seja
B ⊂ Tp (M ) uma bola aberta de Tp (M ), centrada na origem e onde expp é
um difeomorfismo. Então, expp (B ∩ P ) = S ⊂ M é uma subvariedade de
dimensão dois em M passando por p. Intuitivamente, S é uma superfı́cie
formada por “pequenas” geodésicas de M que saem de p e são tangentes a
P em p. Pela Proposição 2, S é geodésica em p, donde as segundas formas
quadráticas da inclusão i : S ⊂ M são nulas em p. Como subvariedade de
M , S possui uma métrica riemaniana induzida, cuja curvatura gaussiana
em p indicaremos por KS . Decorre da equação de Gauss (6’) que
KS = Kp (P ).
58 Imersões riemanianas Seção 1.9

Em outras palavras, a curvatura seccional Kp (P ) é a curvatura gaussiana


em p de uma “pequena” superfı́cie formada por geodésicas de M que saem
de p e são tangentes a P em p. Esta foi exatamente a maneira pela qual
Riemann definiu a curvatura seccional em [40].

Uma outra relação interessante entre a curvatura gaussiana de uma su-


perfı́cie S ⊂ M e a curvatura seccional de M segundo Tp (S) ⊂ Tp (M ) é
dado pelo seguinte resultado, devido a Synge.
Proposição 3 (Synge). Seja M uma variedade riemaniana. Seja γ uma
geodésica de M e seja S uma subvariedade de dimensão dois em M (su-
perfı́cie de M ) que contém γ. Seja KS (p) a curvatura gaussiana de S em
p ∈ S e K(Tp (S)) a curvatura seccional de M em p segundo o plano tan-
gente a S. Então para todo p ∈ γ, KS (p) ≤ K(Tp (S)) e a igualdade ocorre
para todo p ∈ γ se e só se Tp (S) é paralelo ao longo de γ.
Demonstração: Escolha um referencial e1 , . . . , en em uma vizinhança de
p ∈ γ de tal modo que e1 = γ 0 (s) e e2 é tangente a S. Vamos considerar
S como uma subvariedade de M e indicar por α um ı́ndice que varia em
3, . . . , n. Da equação de Gauss (6’) decorre que
X¡ ¢
α 2
KS (p) = K(Tp (S)) + hα α
11 h22 − (h12 ) .
α

Como γ é uma geodésica, tem-se, para todo α,


11 = ω1α (e1 ) = h∇e1 e1 , eα i = 0,

donde a desigualdade afirmada. A igualdade ocorre para todo p ∈ γ se e só


se hα
12 (p) = 0, para todo α e todo p ∈ γ. Isto é equivalente a

0 = hα
12 = ω2α (e1 ) = h∇e1 e2 , eα i. (10)

Além disso, como γ é geodésica,

h∇e1 e2 , e1 i = −he2 , ∇e1 e1 i = 0. (11)

Juntando (10) e (11) concluı́mos que a igualdade ocorre se e só se e2 é


paralelo ao longo de γ, isto é, se o plano gerado por e1 e e2 é paralelo ao
longo de γ.

As variedades totalmente geodésicas são bastante raras. Não se sabe se-


quer se toda variedade riemaniana possui uma variedade totalmente geodé-
sica. Um resultado de E. Cartan afirma que se para todo p ∈ M n , n ≥ 3,
e todo subespaço de dimensão dois P ⊂ Tp (M ) existe uma superfı́cie de M
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 59

tangente a P em p e totalmente geodésica, então M tem curvatura constante


(para uma demonstração V. L. Rodrı́guez [Ro2].
As variedades totalmente geodésicas generalizam as subvariedades li-
neares do Rn . Uma generalização da noção de esfera em Rn é dada na
seguinte definição. Seja M n uma variedade riemaniana. Uma subvariedade
S q ⊂ M n , q < n, é chamada uma q-esfera riemaniana se:

a) S é totalmente umbı́lica, isto é, para qualquer ponto p ∈ S e qualquer


direção normal ν em p a segunda forma quadrática IIpν tem valores
próprios iguais: λ1 = λ2 = · · · = λp 6= 0.

b) O vetor curvatura média H de S em M é paralelo na conexão normal,


isto é, para todo p ∈ S e todo X ∈ Tp (S), ∇⊥
X H = 0.

Leung e Nomizu demonstraram o seguinte resultado ([LeNo]). Se


para todo p ∈ M n , n ≥ 3, e todo subespaço de dimensão dois P ⊂ Tp (M )
existe uma 2-esfera riemaniana de M tangente a P em p, então M tem cur-
vatura constante. (Uma demonstração pode ser encontrada em L. Rodrı́guez
[Ro 2].)

Uma outra caracterização dos espaços de curvatura constante foi obtida


em 1975 por Kulkarni [Ku 3] e pode ser enunciada da maneira seguinte: Seja
M n , n ≥ 3, uma variedade riemaniana conexa. Então M tem curvatura
constante se toda esfera métrica suficientemente pequena de M é totalmente
umbı́lica. Aqui uma esfera métrica é o subconjunto de M constituı́do de
pontos que estão a uma distância fixa de um ponto dado; se a distância fixa
é suficientemente pequena um tal subconjunto é uma subvariedade de M .
n+q
De uma maneira geral, uma imersão x : M n → M é umbı́lica relati-
vamente a um campo ν de vetores normais se, para cada p ∈ M , os valores
n+q
próprios de Aνp são todos iguais. O lema seguinte mostra que se M é um
espaço de curvatura constante e o campo ν é paralelo na conexão normal,
então tais valores próprios não dependem de p.
n+q
Lema 1. Seja M n conexa e seja x : M n → M uma imersão de M n em
n+q
um espaço de curvatura constante M . Suponhamos que x seja umbı́lica
relativamente a um campo normal paralelo ν. Então os valores próprios de
Aν são constantes.
Demonstração: Seja p ∈ M e escolha um referencial móvel {eA } adaptado
a x, em uma vizinhança U de p, de modo que en+1 = ν. Como x é umbı́lica
relativamente a en+1 , a parte tangente {ei } do referencial diagonaliza An+1
em U . Então
ωi,n+1 = λωi ,
60 Imersões riemanianas Seção 1.9

onde λ é o valor próprio de An+1 em qualquer direção. Diferenciando exte-


riormente a equação anterior, obtemos

dωi,n+1 = dλ ∧ ωi + λdωi .

Por outro lado, utilizando a equação de estrutura (4),


X X
dωi,n+1 = ωij ∧ ωj,n+1 + ωiβ ∧ ωβ,n+1 + Ωi,n+1 .
j β

n+q
Como M tem curvatura constante, Ωi,n+1 = 0. Além disto, en+1 é
paralelo na conexão normal, isto é, ωα,n+1 = 0, para todo α. Portanto,
X
dωi,n+1 = ωij ∧ ωj,n+1 = λωj ωij ∧ ωj = λdωi .
j

Decorre daı́ que, para todo i,

dλ ∧ ωi = 0,

donde dλ = 0. Como M é conexa, λ = const., como querı́amos.


O Lema 1 tem várias conseqüências geométricas. Trataremos apenas do
n+q
caso em que M = Rn+q .
Proposição 4. Seja M n conexa e x : M n → Rn+q uma imersão. Supo-
nhamos que x é umbı́lica relativamente a um campo normal paralelo ν.
Então, ou x(M ) está contida em uma (n + q − 1)-subvariedade linear de
Rn+q ou x(M ) está contida em uma (n + q − 1)-esfera de Rn+q .
Demonstração: Escolha um referencial {eA } em uma vizinhança U de
p ∈ M , como no Lema 1. Então ωi,n+1 = λωi , com λ = const., em U . Como
a função λ tem um significado geométrico, ela está definida globalmente em
M . Como M é conexo, λ = const. em M .
Suponhamos λ = 0. Então o vetor normal ν é constante em M , pois,
em uma vizinhança de um ponto arbitrário,
X X
dν = den+1 = ωn+1,i ei + ωn+1,α eα = 0.
i α

Por outro lado, seja f : M → R, dada por f (p) = hx(p), νi, p ∈ M . f é


constante em M , pois

df = hdx, νi + hx, dνi = 0,

e M é conexa. Decorre daı́ que, se λ = 0, x(M ) está contida em uma


(n + q − 1)-subvariedade linear de Rn+q perpendicular a ν.
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 61

Suponhamos λ 6= 0, e seja y : M n → Rn+q dada por

ν(p)
y(p) = x(p) − , p ∈ M.
λ
Se mostrarmos que y é constante, teremos que x(M ) está contida na (n +
q − 1)-esfera de Rn+q de centro y e raio 1/λ. Mas, em uma vizinhança de
um ponto arbitrário de M ,
1 X 1X
dy = dx − den+1 = ω i ei − ωn+1,i ei = 0.
λ i
λ i

Como M é conexa, y = const. como querı́amos.


Como corolário da Proposição 4, obtemos um resultado clássico de su-
perfı́cies.
Corolário. Se uma superfı́cie conexa S ⊂ R3 é inteiramente constituı́da de
pontos umbı́licos, entãoo ou S está contida em um plano ou S está contida
em uma esfera.

1.10 Globalização do método do referencial móvel


Uma das caracterı́sitcas mais importantes do método do referencial móvel é
que as formas ωi e ωij , que são definidas em um aberto U de uma variedade
riemaniana e dependem da escolha de um referencial em U , podem ser
globalizadas em uma certa variedade construı́da a partir de M . Os detalhes
desta construção e a explicação do que se entende por esta “globalização”
é o objetivo da presente Seção.
Para simplificar a exposição, trataremos o caso em que M n ⊂ Rn+q .
Em verdade, isto não é uma restrição muito séria, pois, por um teorema de
Nash, toda variedade riemaniana pode ser isometricamente mergulhada em
um espaço euclideano de dimensão suficientemente grande. É possı́vel evitar
o teorema de Nash desenvolvendo uma teoria geral das conexões, o que tem
várias outras aplicações. Isto entretanto introduziria certas tecnicalidades
que pretendemos evitar. Além disso, para as aplicações que temos em mente
no Capı́tulo II, a presente exposição é satisfatória.
Consideremos um espaço euclideano RN com a base canônica a1 =
(1, 0, . . . , 0), . . . , aN = (0, 0, . . . , 0, 1). O conjunto de todas as bases ortonor-
mais do RN pode ser identificado com o conjunto 0(N ) das transformações
lineares ortogonais do RN . Por outro lado, usando a base canônica, o con-
junto de todas as transformações lineares de RN pode ser identificado com
2 2
o espaço euclideano RN das matrizes N × N . Como subconjunto de RN ,
0(N ) é dado pelas equações AA∗ = ident., onde A indica uma matriz N ×N
62 Globalização do método do referencial móvel Seção 1.10

e A∗ a sua transposta. Não é difı́cil mostrar (V. Lima [Li 2] pg. 67) que
2
estas equações definem 0(N ) como uma subvariedade de R N de dimensão
N (N − 1)/2.
A variedade produto B = RN × 0(N ) será chamada o fibrado das bases
ortonormais de RN . Um ponto de B é um par (p, {eA }), onde p ∈ RN e
{eA }. A = 1, . . . , N é uma base ortonormal de RN . A projeção π : B → RN
de B em RN , definida por B(p, {eA }) = p é certamente uma aplicação
diferenciável. Uma secção de B em um aberto U ⊂ RN é uma aplicação
diferenciável σ : U → B tal que π ◦ σ = ident. Observe que uma secção de
B em U é um referencial móvel em U .
Seja agora M n ⊂ Rn+q=N uma subvariedade de RN . Usaremos as con-
venções usuais para os ı́ndices:
1 ≤ A, B, C, · · · ≤ n + q, 1 ≤ k, j, k, · · · ≤ n, n + 1 ≤ α, β, γ, · · · ≤ n + q.
Considere o subconjunto BM ⊂ B das bases adaptadas a M , isto é,
BM = {(p, {eA }) ∈ B; p ∈ M, ei ∈ Tp (M ), eα ∈ Tp (M )⊥ }.
Indicaremos com a mesma letra π a restrição a BM da projeção π definida
em B, isto é, π : BM → M é dada por π(p, {eA }) = p. A imagem inversa
π −1 (p) de um ponto p ∈ M é chamada a fibra sobre p.
BM é uma variedade diferenciável. Com efeito, seja U ⊂ M uma vizi-
nhança coordenada de M onde exista um referencial móvel adaptado {eU A }.
Os pontos (p, {eA }) de π −1 (U ) podem ser parametrizados
© pelas
ª coordenadas
de p ∈ U e pelas coordenadas dos vetores eA na base (eU A )p . É claro que na
interseção π −1 (U ) ∩ π −1 (V ), onde V ⊂ M é outra vizinhança coordenada
de M com um referencial móvel {eVA } e V ∩ U 6= φ, a mudança de tais
parâmetros é diferenciável, o que prova a afirmação feita. A construção
mostra também que a inclusão BM ⊂ B é diferenciável.
Uma secção de BM em um aberto U ⊂ M é uma aplicação diferenciável
σ : U → BM , tal que π ◦ σ = ident. Em outras palavras, uma secção é a
escolha de um referencial móvel adaptado em U .
Observe-se que BM não é mais necessariamente um produto, mas deve
ser pensado como um conjunto de fibras π −1 (p), p ∈ M . Entretanto, para
todo aberto U onde existe uma secção, © isto ªé, um referencial móvel ẽA ,
π −1 (U ) pode ser obtido aplicando a (ēA )p em cada p ∈ U as trans-
formações ortogonais que deixam Tp (M ) (donde Np (M )) fixo. Deste modo
π −1 (U ) ≈ U × (0(n) × 0(q)), isto é, BM é localmente um produto.
Passemos agora à geometria diferencial de BM . Definiremos aplicações
diferenciáveis x̃ : BM → RN , ẽA : BM → RN por
x̃(p, {eA }) = p ∈ M ⊂ RN ,
ẽA (p, {eA }) = eA ∈ RN .
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 63

Desta maneira, tem sentido falar ns diferenciais

dx̃ : T(p,{eA }) (BM ) → Rn ,


dẽA : T(p,{eA }) (BM ) → Rn .

Definiremos formas diferenciais lineares ω̃A , ω̃AB em BM por


X
dx̃ = ω̃A ẽA , (1)
A
X
dẽA = ω̃AB ẽB . (2)
B

Estas formas são definidas globalmente em BM . Como para todo V ∈


T(p,{eA }) (BM ) tem-se dx̃(V ) ∈ Tp (M ), conclui-se que as formas ω̃α = 0.
Além disto, como hẽA , ẽB i = δAB , temos

hdẽA , ẽ)Bi = ω̃AB = −hẽA , dẼB i = −ω̃BA .

Seja agora σ : U → BM uma secção de BM em U , isto é, σ é a escolha


de um referencial adaptado móvel {eA } em U . A aplicação diferenciável σ
induz formas σ ∗ ω̃i e σ ∗ ω̃AB em U . Como π ◦ σ = x̃, onde x : M ⊂ RN é a
inclusão de M em RN , tem-se que, em U , x̃◦σ = x e ẽA ◦σ = eA . Portanto,
indicando por ωi e ωBC as formas do coreferencial associado a {eA } e as
formas de conexão em {eA }, respectivamente, teremos
X X
ωi (v)ei = dx(v) = dx̃ ◦ dσ(v) = ω̃i (dσ(v))ẽi ◦ σ
i i
X
= σ ∗ ω̃i (v) ei
i
X X
ωAB (v)eB = deA (v) = dẽA ◦ dσ(v) = ω̃AB (dσ(v)) ẽB ◦ σ
B B
X
= (σ ∗ ω̃AB )(v) eB ,
B

para todo v ∈ Tp (M ). Portanto,

σ ∗ ω̃i = ωi , σ ∗ ω̃AB = ωAB .

É neste sentido que se diz que as formas ω̃i e ω̃AB globalizam em BM as


formas ωi , ωAB , respectivamente, de U .
Vamos agora mostrar que as formas ω̃i e ω̃AB satisfazem em BM as
mesmas equações de estrutura que as formas ωi e ωAB em U . Em verdade,
é mais fácil demonstrar as equações de estrutura em B e usar o fato que a
inclusão i : BM ⊂ B é diferenciável para obtê-las em BM .
64 Globalização do método do referencial móvel Seção 1.10

Procederemos da mesma maneira que no caso de RN (Cf. Seção 1.2).


Consideremos a base canônica aA do RN , e escrevamos
X
ẽA = β̃AB aB ,
B

onde β̃AB são funções diferenciáveis em B e a matriz (β̃AB ) é ortogonal.


Indicaremos as coordenadas de um ponto do RN por (x1 , . . . , xN ). Indi-
caremos ainda por xB : RN → R a projeção xB (x1 , . . . , xB , . . . , xN ) = xB ,
e por x̃B : B → R a composta xB ◦ x̃ = x̃B . Então, se V ∈ T (B),
¡X ¢
dx̃B (V ) = d(xB ◦ x̃)(V ) = dxB (dx̃(V )) = dxB αc ac
c
= αB = hdx̃(V ), aB i.

Portanto,
X X X
dx̃ = ω̃A ẽA = ω̃A β̃AB aB
A A B
X¡X ¢ X X
= ω̃A β̃AB aB = hdx̃, aB i = dx̃B aB .
B A B B

P
Decorre daı́ que dx̃B = ω̃A β̃AB , isto é,
A
X
ω̃A = β̃AB dx̃B .
B

A partir deste ponto a demonstração é exatamente a mesma que fizemos


na Seção 1.2 e não iremos repetı́-la. A conclusão é que, em B,
X
dω̃A = ω̃B ∧ ω̃BA , (3)
B
X
dω̃AB = ω̃AC ∧ ω̃CB . (4)
c

Restringindo agora as formas ω̃A , ω̃AB a BM e denotando estas re-


strições pelos mesmos sı́mbolos, como usualmente, teremos ω̃ α = 0 e
X
dω̃i = ω̃j ∧ ω̃ji , (5)
j
X X
dω̃ij = ω̃ik ∧ ω̃kj + ω̃iα ∧ ω̃αj , (6)
k α
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 65
X X
dω̃αβ = ω̃αi ∧ ω̃iβ + ω̃αγ ∧ ω̃γβ , (7)
i γ
X X
dω̃iα = ω̃ij ∧ ω̃jα + ω̃iβ ∧ ω̃βα , (8)
j α

Observação: Uma demonstração mais rápida das equações de estrutura


pode ser obtida se admitirmos (o que é possı́vel provar) que é válido aplicar
às expressões (1) e (2) as regras formais de derivação exterior. Teremos,
então,
X X ¡X ¢
0 = d(dx̃) = dω̃A ẽA − ω̃A ∧ ω̃AB ẽB
A B B
X¡ X ¢
= dω̃B − ω̃A ∧ ω̃AB ẽB ,
B
X X ¡X ¢
0 = d(dẽA ) = dω̃AB ẽB − ω̃AB ∧ ω̃BC ẽC
B B C
X¡ X ¢
= dω̃AC − ω̃AB ∧ ω̃BC ẽC ,
C B

o que implica nas equações (3) e (4).


A importância das formas ω̃i , ω̃AB , é que elas determinam a subvarie-
dade M ⊂ Rn+q a menos de um movimento rı́gido de Rn+q . Um movimento
rı́gido de Rn+q é a composta de uma translação com uma transformação
linear ortogonal. Em verdade, as formas ω̃i , ω̃AB determinam o fibrado
BM a menos de uma aplicação definida no fibrado das bases ortonormais
RN × 0(N ) da seguinte maneira. Seja ρ : RN → RN um movimento rı́gido
e seja ρ̃ : RN × 0(N ) → RN × 0(N ) a aplicação definida por
ρ̃(p, {eA }) = (ρ(p), {dρ(eA )}). (9)
Diz-se que ρ̃ é a aplicação induzida em RN × 0(N ) por ρ. É claro que
ρ̃(BM ) = Bρ(M ) . Além disto, se ω̃i e ω̃AB são as formas correspondentes a
Bρ(M ) então ρ∗ ω̃1 e ρ∗ ω̃AB são as formas correspondentes a BM ; este fato
é uma conseqüência imediata de (1), (2) e (9).
Para enunciar precisamente o fato que as formas ω̃i e ω̃AB determinam
BM a menos de um movimento rı́gido induzido em RN × 0(N ) precisamos
de mais uma definição. Sejam M e M 0 duas subvariedades de RN . Uma
aplicação f˜: BM → BM 0 é dita fibrada se ela leva fibras em fibras. Uma tal
aplicação determina uma aplicação induzida f : M → M 0 dada por f ◦ π =
π 0 ◦ f˜, onde π : BM → M e π 0 : BM 0 → M 0 são as projeções de BM e BM 0 .
Teorema 1 (de unicidade). Sejam M e M 0 duas subvariedades de Rn+q ,
com M conexa. Sejam BM e BM 0 os fibrados das bases ortonormais adap-
tados a M e M 0 , respectivamente. Suponha que existe uma aplicação fibrada
66 Globalização do método do referencial móvel Seção 1.10

f˜: BM → BM 0 que satisfaz


f˜∗ ω̃i0 = ω̃i , f˜∗ ω̃A0 B = ω̃AB .
Então existe um movimento rı́gido ρ : Rn+p → Rn+p tal que a restrição
ρ̃|BM = f˜, onde ρ̃ é a aplicação induzida por ρ no fibrado das bases ortonor-
mais de Rn+q . Em particular, ρ|M = f .
Demonstração: Seja f : M → M 0 a aplicação induzida por f˜. Seja p ∈ M
e p0 = f (p) ∈ M 0 . Efetue a translação T em Rn+q de vetor f (p) − p.
Fixe uma base {eA } em p, isto é, fixe um elemento b = (p, {eA }) ∈ BM .
Seja b0 = f˜(b) = (p0 , {e0A }) e efetue uma rotação R de Rn+q em torno de
f (p) = p0 de modo que R eA = e0A . Seja ρ = R◦T o movimento rı́gido assim
obtido e ρ̃ a aplicação induzida no fibrado das bases ortonormais. Vamos
mostrar que a aplicação g̃ = f˜ ◦ ρ̃−1 : Bρ(M ) → BM 0 é a identidade, isto é,
Bρ(M ) = BM 0 , e isto implicará que ρ̃|BM = f˜, como queremos.
Observe inicialmente que
g̃ ∗ ω̃AB
0
= (ρ̃−1 )∗ f˜∗ ω̃AB
0 ρ
= (ρ̃−1 )∗ ω̃AB = ωAB ,
ρ
onde ωAB são as formas do fibrado Bρ(M ) . De agora por diante indicaremos
as entidades de Bρ(M ) com um ı́ndice superior ρ.
Como
X ρ
dẽρA = ω̃AB ẽB ,
B
¡X ¢
d(ẽ0A ◦ g̃) = dẽ0A ◦ dg̃ − 0
ω̃AB ẽ0B ◦ (dg̃)
B
X
∗ 0
= (g ω̃AB )(ẽ0B ◦ g̃)
B
X ρ
= ω̃AB (ẽ0B ◦ g̃),
B

teremos X
d(ẽρA − ẽ0A ◦ g̃) = ρ
ω̃AB (ẽρB − ẽ ◦ g̃). (10)
B

Conclui-se daı́ que as aplicações ẽρA − ẽ0 ◦ g̃ em Bρ(M ) satisfazem ao sistema


de equações lineares (10) com condições iniciais em ρ̃ b dadas por
(ẽρA − ẽ0A ◦ g̃)(ρ̃ b) = (ẽρA − ẽ0A ◦ f˜ ◦ ρ̃−1 )(ρ̃ b) =
= (ẽρA ◦ ρ̃ − ẽ0A ◦ f˜)(b) = R(eA ) − e0A = 0.
Pelo teorema de unicidade das equações diferenciais,
ẽρA = ẽ0A ◦ g̃ (11)
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 67

em todo Bρ(M ) .
De maneira inteiramente análoga, mostrarı́amos que
X
d(x̃ρ − x̃0 ◦ g̃) = ω̃i (ẽρB − ẽ0B ◦ g̃) = 0,
B

onde a última igualdade decorre do que acabamos de provar. Levando em


conta que x̃ρ = xρ ◦ π, a relação anterior se escreve

0 = d(xρ ◦ π − x0 ◦ π 0 ◦ g̃) = d(xρ ◦ π − x0 ◦ g ◦ π) = d(xρ − x0 ◦ g) ◦ dπ,

onde g : ρ(M ) → M 0 é a aplicação induzida por g̃. Como M é conexa,


xρ − x0 ◦ g = const., isto é, ρ(q) − g(ρ(q)) = const., para todo q ∈ M . Como
em ρ(p),

ρ(p) − g(ρ(p)) = ρ(p) − f ◦ ρ−1 (ρ(p)) = p0 − f (p) = 0,

g é a aplicação identidade, isto é, ρ(M ) = M 0 .


Finalmente, se (q, e1 , . . . , en+p ) ∈ Bρ(M ) , então

g̃(q, e1 , . . . , en+p ) = (q, ē1 , . . . , ēn+p ).

Mas a equação (11) diz exatamente que

ēA = ẽ0A ◦ g̃(q, {eA }) = ẽρA (q, {eA }) = eρA ,

e portanto g̃ é identidade, como querı́amos.


Observação 3: As formas ωi , ωAB = −ωBA permitem também obter um
teorema de existência (local) para imersões de variedades Riemanianas em
Rn+k . O enunciado é o seguinte:
Sejam formas diferenciais ωi , ωAB = −ωBA definidas localmente em
uma n-variedade Riemaniana M n e suponha que elas satisfazem as equações
(3) e (4). Então, existe uma imersão isométrica local x : V ⊂ M → R n+k
e um referencial {ei } adaptado a x em V tais que as formas ωi , ωAB são,
respectivamente, as formas do coreferencial e de conexão de Levi-Civita
de x.
Para uma prova do enunciado acima V. K. Tenenblat ([Te], Lemma 2).

O Teorema 1 mostra que as formas ω̃i , ω̃AB determinam o fibrado BM a


menos de um movimento rı́gido, isto é, módulo uma relação de equivalência
pelo grupo ortogonal afim (translações mais rotações). Este último é o
grupo da geometria métrica o que dá uma indicação de porque a geometria
métrica de M está contida nas formas ω̃i e ω̃AB . Além disto, este fato
68 Globalização do método do referencial móvel Seção 1.10

sugere a possibilidade de estudar geometrias baseadas em outros grupos


(grupo projetivo, grupo conforme, grupo unitário, grupo unimodular, etc).
Embora as definições e resultados desta seção tenham sido estabeleci-
dos para subvariedades do RN , elas se estendem para o caso de imersões
x : M n → RN , com os seguintes cuidados. O fibrado BM das bases adap-
tadas a x é agora o subconjunto de variedade produto M × B dado por

BM = {(p, b) ∈ M × B; x(p) = π(b) e b é adaptado a x}

A aplicação π 0 : BM → M é definida por π(p, b) = p. É possı́vel mostrar


que BM é uma variedade diferenciável, que é localmente o produto de uma
vizinhança coordenada U ⊂ M por 0(n) × 0(q). As aplicações x̃ : BM →
RN e ẽA : BM → RN se definem de modo inteiramente análogo ao caso
de subvariedades: por exemplo, x̃(p, b) = x(p), p ∈ M . Desta maneira,
se obtém as formas ω̃A , ω̃AB em BM . A demonstração das equações de
estrutura é feita da mesma maneira que anteriormente. Na demonstração
do teorema de unicidade, prova-se primeiro o resultado localmente e observa-
se que o movimento rı́gido assim obtido é único. Segue-se daı́ o resultado
global.
A versão local do teorema de unicidade é freqüentemente útil, e se enun-
cia da maneira seguinte.

Teorema 1’ (unicidade local). Sejam U e U 0 duas subvariedades conexas


de dimensão n em Rn+q . Suponhamos que existam referenciais adaptados
{eA } em U , {e0A } em U 0 , e um difeomorfismo f : U → U 0 tais que

f ∗ ωA
0
= ωA , f ∗ ωAB
0
= ωAB .

Então, existe um movimento rı́gido ρ : Rn+q → Rn+q tal que ρ|U = f .

Demonstração: Provavelmente a maneira mais rápida de demonstrar o


Teorema 1’ é repetir os passos da demonstração do Teorema 1, o caso pre-
sente sendo ainda mais simples. Faremos um breve esquema das etapas.
Seja p ∈ M e f (p) = p0 ∈ M 0 . Efetue uma translação T em Rn+q
de vetor p0 − p e, em seguida, uma rotação R em torno de p = p0 de
modo que, em p0 , R(eA ) = e0A . Seja ρ = R ◦ T . Vamos mostrar que
g = f ◦ ρ−1 : ρ(U ) → U 0 é a identidade. Para isto, indicaremos as entidades
em ρ(U ) com um ı́ndice superior ρ.
Como, por definição, para todo q ∈ ρ(U ) e todo v ∈ Tp (ρ(U )), temos
X
(deρA )q (v) = ρ
(ωAB )q (v)(eρB )q ,
B
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 69

d(e0A ◦ g)( v) = (de0A )g(q) (dg(v))


X
= (ω)AB 0 )g(q) (dg(v))(e0B )g(q)
B
X
= (g ∗ ωAB
0
)q (v) (e0B ◦ g)(q),
B

concluı́mos, como q e v são arbitrários e g ∗ ωAB


0
= ωAB0
, que eρA − e0A ◦ g
satisfaz ao sistema de equações diferenciais
X ρ
d(eρA − e0A ◦ g) = ωAB (eρB − e0B ◦ g),
B

com condições iniciais em ρ(p) : (eρA −e0A ◦g)(ρ(p)) = 0. Portanto, eρA = e0A ◦g.
Analogamente, e usando o fato que acabamos de provar,
X ρ ρ
d(xρ − x0 ◦ g) = ωB (eB − e0B ◦ g) = 0,
B

onde xρ = p(U ) ,→ Rn+q e x0 : U 0 ,→ Rn+q são as inclusões respectivas.


Como as condições iniciais em ρ(p) são: (xρ − x0 ◦ g)(ρ(p) = 0, teremos
xρ = x0 ◦ g. Levando em conta que xρ e x0 são inclusões, isto implica em
que g é a identidade, como querı́amos.

1.11 Um modelo para o espaço hiperbólico


Depois do espaço euclideano, as variedades riemanianas mais simples são as
variedades de curvatura constante não nula. Dentre elas, a esfera e o espaço
hiperbólico (V. Exemplos 1 e 2 da Seção 1.6) ocupam uma posição especial.
A esfera S n pode ser isometricamente mergulhada em Rn+1 e isto facilita
a utilização do método do referencial móvel em questões relativas à esfera.
Nesta parágrafo, mostraremos que é possı́vel mergulhar isometricamente o
espaço hiperbólico H n em Rn+1 , não com a métrica usual do Rn+1 mas
com a métrica de Lorentz.
A métrica de Lorentz é definida do seguinte modo. Consideremos em
Rn+1 a base canônica a1 = (1, . . . , 0), . . . , an+1 = (0, . . . , 0, 1) e intro-
duzamos uma forma bilinear simétrica ( , ) em Rn+1 definida por:

(ai , aj ) = δij , (an+1 , ai ) = 0, (an+1 , an+1 ) = h < 0, i, j = 1, . . . , n,

onde h é uma constante negativa. A forma bilinear ( , ) define em R n+1 um


produto interno (que não é positivo definido) que chamaremos a métrica de
Lorentz de Rn+1 . Convém indicar o Rn+1 com esta métrica por E n+1 .
70 Um modelo para o espaço hiperbólico Seção 1.11

Seja U ⊂ E n+1 um aberto de E n+1 , e e1 , . . . , en+1 um conjunto de


campos diferenciáveis de vetores em U (referencial móvel em U ) satisfazendo
as condições:

(ei , ej ) = δij , (en+1 , ei ) = 0, (en+1 , en+1 ) = h. (1)

Sejam ω1 , . . . , ωn , ωn+1 , formas diferenciais em U que em cada p ∈ U for-


mam a base dual da base e1 , . . . , en+1 em p. Vamos definir formas ωAB em
U por
deA = Σ ωAB eA , (2)
onde A, B, C indicarão ı́ndices que variam de 1 a n + 1. Observe que a
definição dos ωA é equivalente a escrever

dx = Σ ωA eA , (3)

onde x : E n+1 → E n+1 é a aplicação identidade.


Derivando exteriormente (2) e (3) (ou por um processo análogo ao da
Seção 1.2), obteremos as equações de estrutura de E n+1 :

dωA = Σ ωA ∧ ωBA , (4)


dωAB = Σ ωAC ∧ ωCB . (5)

Além disto, (1) fornece as seguintes relações entre as formas ωAB . Como
(en+1 , en+1 ) = h, temos

0 = 2(den+1 , en+1 ) = 2(Σ ωn+1,A eA , en+1 ) = 2 ωn+1,n+1 h

e, como h 6= 0,
ωn+1,n+1 = 0. (6)
Analogamente, de (ei , en+1 ) = 0 vem

0 = (dei , en+1 ) + (ei , den+1 ) = (Σ ωiA eA , en+1 ) + (ei , Σ ωn+1,A eA )


= ωi,n+1 h + ωn+1,i ,

donde
ωn+1,i = −h ωi,n+1 . (7)
Considere agora o conjunto dos pontos x ∈ E n+1 tais que (x, x) = h.
Escrevendo
x = x1 a1 + · · · + xn an + xn+1 an+1 ,
teremos que
(x, x) = x21 + x22 + · · · + x2n + h x2n+1 = h.
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 71

Como h < 0, um tal conjunto é um “hiperbolóide de duas folhas” em E n+1 .


A componente conexa deste hiperbolóide correspondente a xn+1 > 0 será
indicada por H n (k), onde k = 1/h.
Como (x, dx) = 0, o espaço tangente em cada ponto de H n (k) é normal
a x. Como (x, x) = h, é possı́vel escolher uma base b1 , . . . , bn , bn+1 de E n+1 ,
com
bn+1 = x, (bi , bn+1 ) = 0, (bi , bj ) = δij , i, j = 1, . . . , n.
Decorre daı́ que Tx (H n (k)) é gerado pelos bi ’s, isto é, a métrica induzida
por E n+1 em H n (k) é riemaniana.
De agora por diante, usaremos referenciais locais {eA } em E n+1 que
satisfazem (1) e que são adaptados a H n (k), isto é, restritos a H n (k),
e1 , . . . , en são tangentes a H n (k) e en+1 = x descreve H n (k).
Vamos calcular a curvatura de H n (k) na métrica induzida. Para isto,
indicaremos por ωA e ωAB as restrições a H n (k) das formas de mesmo nome
em E n+1 , o que implica que ωn+1 = 0.. Observando que x é a restrição a
H n (k) da aplicação x : E n+1 → E n+1 , teremos
dx = Σ ωi ei = den+1 = Σ ωn+1,i ei ,
donde ωn+1,i = ωi . A curvatura procurada é, portanto,
1
Ωij = dωij − Σ ωik ∧ ωkj = ωi,n+1 ∧ ωn+1,j = − ωi ∧ ωj ,
h
onde usamos (6). Decorre daı́ e da Proposição 3 da Seção 1.6 que H n (k)
tem curvatura constante 1/h = k. Quando k = −1, um tal espaço tem
curvatura constante −1 e, pelo Corolário 1 da Seção 1.8, ele é localmente
isométrico ao espaço hiperbólico definido no Exemplo 2 da Seção 1.6.
É possı́vel mostrar que a isometria local acima é, em verdade, uma isome-
tria global entre H n (−1) e o espaço hiperbólico (Cf. Observação 1 da Seção
1.8). Desta maneira, H n (−1) é um mergulho isométrico em E n+1 do espaço
hiperbólico.
Para ilustrar a utilidade deste modelo, vamos demonstrar o seguinte
resultado:
Teorema (L. Amaral [Am]). Seja M n−1 uma variedade riemaniana com-
pacta com curvaturas seccionais ≤ 0. Então não existe uma imersão iso-
métrica x : M → H n .
Demonstração: Suponhamos que existe uma tal x : M n−1 → H n (−1) ⊂
E n+1 . Para todo p ∈ M consideraremos uma vizinhança U ⊂ M de p tal
que a restrição x|U seja injetiva. Seja V ⊂ E n+1 uma vizinhança de x(p)
em E n+1 de tal modo que V ∩M ⊃ x(U ) e que em V seja possı́vel definir um
referencial e1 , . . . , en−1 , en , en+1 satisfazendo (1) e as seguintes condições:
72 Um modelo para o espaço hiperbólico Seção 1.11

(a) Em x(U ), e1 , . . . , en−1 são tangentes a x(U ) e en é normal a x(U ) e


tangente a H n (−1).

b) Em V ∩ H n (−1), en+1 descreve H n (−1).

Um tal referencial é dito adaptado a x.


Restringiremos a x(U ) ⊂ V as formas de coreferencial associado e as
formas de conexão. Modificaremos ligeiramente a nosssa convenção dos
ı́ndices para:

1 ≤ i, j, k, · · · ≤ n − 1, 1 ≤ A, B, C, · · · ≤ n.

Pela segunda parte de (a) tem-se que ωn = 0. Logo ωn+1,n = ωn = 0. Além


disso, dωn = 0 e, portanto
X
0 = dωn = ωj ∧ ωjn .
j

Pelo lema de Cartan,


X
ωin = hij ωj , hij = hji ,
j

onde os hij são os coeficientes da segunda forma quadrática de x na direção


en .
Terminados estes preliminares, passaremos à demonstração propriamente
dita. Seja f : U → R a função dada por

f (p) = −(en+1 (p), an+1 ), p ∈ U.

A função f não depende da escolha do referencial adaptado e é, portanto,


globalmente definida em M . Como M é compacta, f atinge um máximo
em um ponto q ∈ M , donde dfq = 0, d2 fq ≤ 0.
Escrevendo
an+1 = Σ vi ei + vn en + vn+1 en+1 , (8)
vem que f (p) = vn+1 . Portanto as condições acima podem ser escritas

(dvn+1 )q = 0, (d2 vn+1 )q ≤ 0.

Podemos supor que a segunda forma quadrática em q, IIq , está diagonal-


izada. Então, pela equação de Gauss, temos que, em q,

Rijij = hii hjj − 1.


Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 73

Diferenciando exteriormente a expressão (8), obteremos


X
0 = dan+1 = dvi ei + dvn en + dvn+1 en+1
X ¡X ¢
+ vi ωiA eA + ωi,n+1 en+1
i A
¡X ¢ ¡X ¢
+ vn ωnA eA + vn+1 ωn+1,i ei
A i
X¡ X ¢
= dvj + vi ωij + vn ωnj + vn+1 ωn+1,j ej
j i
¡ X ¢ ¡ X ¢
+ dvn + vi ωin en + dvn+1 + vi ωi,n+1 en+1 ,
i i

donde
X
dvj = vi ωji − vn ωnj − vn+1 ωn+1,j ,
i
X
dvn = vi ωni ,
i
X X
dvn+1 = − vi ωn+1,i = − vi ω i .

Como, em q, (dvn+1 )q = 0, teremos

v1 (q) = · · · = vn−1 (q) = 0.

Além disso, (d2 vn+1 )q ≤ 0, e portanto, em q,


X X
−(d2 vn+1 )q = (dvi )q ωi = (−vn ωni − vn+1 ωn+1,i )ωi
i i
X X
= −vn ωni ωi − vn+1 (ωi )2
i i
X X
= vn hij ωi ωj − vn+1 (ωi )2
ij i
X X
= vn hii ωi2 − vn+1 (ωi )2
i
X
= (hii vn − vn+1 )ωi2 ≥ 0.
i

Aplicando a desigualdade acima para cada ei , concluı́mos que hii vn ≥ vn+1 ,


para todo i, isto é, em q,

hii hjj (vn )2 ≥ vn+1


2
, todo par i, j.
74 Um modelo para o espaço hiperbólico Seção 1.11

2
Mas vi (q) = 0. Logo an+1 = vn en + vn+1 en+1 , donde vn+1 − vn2 = 1 em q.
Portanto, obtemos finalmente,
2 2
vn+1 vn+1 −1 1
Rijij = hii hjj − 1 ≥ 2
− 1 = 2
= 2 > 0,
vn vn vn
o que contradiz o fato da curvatura seccional de M em q ser não positiva, e
termina a demonstração.
O Teorema de Amaral foi generalizado por E.F. Stiel [St] na seguinte
forma: Seja M n compacta com curvaturas seccionais K ≤ 0. Então não
existe uma imersão isométrica x : M n → H n+q , se q < n.
A maior vantagem de ter um modelo da esfera S n em Rn+1 e um modelo
de H n em E n+1 é poder estender às subvariedades destes espaços certas
construções que efetuamos para as subvariedades do espaço euclideano.
Por exemplo, a globalização do método do referencial móvel e o teo-
rema de unicidade da seção anterior se estendem sem dificuldades às sub-
variedades do S n e do H n . Trataremos rapidamente o caso de S n ⊂ Rn+1 ,
deixando o caso do H n como exercı́cio.
Seja M n ⊂ S n+q ⊂ Rn+q+1 . Escolheremos sempre referenciais locais
e1 , . . . , en , . . . , en+q , en+q+1 em Rn+q+1 de modo que en+q+1 descreve S n+q
e, restritos a M , e1 , . . . , en são tangentes a M e en+1 , . . . , en+q são normais
a M e tangentes a S n+q . Usaremos os ı́ndices:
i ≤ i, j, k . . . , ≤ n, n + 1 ≤ α, β, γ, · · · ≤ n + q, 1 ≤ A, B, C, · · · ≤ n + q + 1.
Construiremos o fibrado BM ⊂ B = RN × 0(N ), n = n + q + 1, con-
siderando M como subvariedade de RN . Como, no caso presente, x̃ =
ẽn+q+1 , teremos
dx̃ = Σ ω̃i ẽi = dẽn+q+1 = Σ ω̃n+q+1,A ẽA ,
donde
ω̃i = ω̃n+q+1,i , ω̃n+q+1,α = 0, ω̃n+q+1,n+q+1 = 0.
Portanto, as formas ω̃n+q+1,A não mais aparecem explicitamente quando
nos restringimos a M , e as equações de estrutura tomam a seguinte forma:
X
dω̃i = ω̃j ∧ ω̃ji ,
i
X X
dω̃ij = ω̃ik ∧ ω̃kj + ω̃iα ∧ ω̃αj − ω̃i ∧ ω̃j ,
k α
X X
dω̃αβ = ω̃αγ ∧ ω̃γβ + ω̃αi ∧ ω̃iβ ,
γ i
X X
dω̃iα = ω̃ij ∧ ω̃jα + ω̃iβ ∧ ω̃βα ,
j β
Cap. 1 O Método do Referencial Móvel 75

que são semelhantes às equações de estrutura de uma subvariedade M n ⊂


Rn+q com a adição apenas do termo −ω̃i ∧ ωj na segunda equação, o que
reflete o fato do espaço ambiente S n+q ter curvatura 1.
Um movimento rı́gido em S n+q é a restrição a S n+q de uma rotação
de Rn+q+1 com determinante positivo. Com esta definição, o enunciado
e a demonstração do teorema de unicidade da seção anterior se estendem
sem dificuldades ao caso presente. Basta notar que as formas ω̃n+q+1,A
não aparecem explicitamente e que, na demonstração, devemos substituir
a translação de vetor f (p) − p por uma rotação de Rn+q+1 que leve p em
f (p) (o que é possı́vel pois ambos pertencem a S n+q ). O resultado é que as
formas ω̃i , ω̃ij , ω̃αi , ω̃αβ determinam a subvariedade M ⊂ S n+q a menos de
um movimento rı́gido de S n+q .
A extensão da versão local do teorema de unicidade para o caso presente
não oferece dificuldades. Também o caso de imersão, com os cuidados men-
cionados no fim da seção anterior, pode ser tratado de maneira inteiramente
análoga.
Capı́tulo 2

Imersões em um espaço
de curvatura constante

2.1 Hipersuperfı́cies em um espaço de curvatura constante.


O lema de Chern e Lashof. Convexidade e curvatura.

Em todo este capı́tulo indicaremos por Qk (c) (ou simplesmente Qk ) um


dos três espaços seguintes: O espaço euclideano R k com curvatura c = 0,
a esfera S k de curvatura c = 1, ou o espaço hiperbólico H k de curvatura
c = −1.

Uma hipersuperfı́cie de Qn+1 (c) é uma imersão x : M n → Qn+1 (c) de


uma variedade de dimensão n em Qn+1 (c). Nesta seção e na seguinte,
trataremos das hipersuperfı́cies de Qn+1 (c). Alguns resultados só serão
considerados para o caso em que Qn+1 = Rn+1 ; isto será indicado explicita-
mente. Em geral, os resultados desta seção foram inicialmente demonstra-
dos para o caso em que Qn+1 = Rn+1 e, posteriormente generalizadas para
S n+1 e H n+1 . Quando uma tal generalização existe, daremos a referência
correspondente.

Seja x : M n → Qn+1 (c) uma hipersuperfı́cie e seja p um ponto de M .


Seja e1 , . . . , en , en+1 um referencial ortonormal móvel em uma vizinhança
V de x(p) em Qn+1 adaptado a x. Então, pelas equações da Seção 1.9,

76
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 77

teremos ωn+1 = 0 e
X
ωi,n+1 = hij ωj , hij = hn+1
ij = hji , (1)
j
X
dωi = ωj ∧ ωji , (2)
j
X
dωij = ωik ∧ ωkj + ωi,n+1 ∧ ωn+1,j − c ωi ∧ ωj (3)
k

No caso de hipersuperfı́cies, só existe, a menos de orientação, uma


única segunda forma quadrática em cada ponto p ∈ M , a saber, II =
Σ hij ωi ωj . Usando a métrica induzida em Tp (M ), podemos escolher os
vetores e1 , . . . , en em p de modo a diagonalizar IIp . Indicaremos λi (p) =
hii (p). Desta maneira, em p,
X
IIp = λi ωi2 .
i

As direções e1 , . . . , en , são chamadas direções principais em p e os números


λ1 , . . . , λn são chamados valores próprios de II em p. Observe que pode
não ser possı́vel escolher e1 , . . . , en continuamente em uma vizinhança de p
de modo a diagonalizar II nesta vizinhança.
Para obter o significado geométrico dos valores próprios de IIp , lembre-
mos da Álgebra Linear que eles são os valores crı́ticos da forma quadrática
IIp restrita à esfera unitária de Tp (M ). Por outro lado, se v ∈ Tp (M ) é
um vetor unitário, vimos na seção 1.9 que IIp (v) é a componente normal
do vetor curvatura geodésica em Qn+1 de uma curva em M passando por
p com vetor tangente v. Decorre daı́ que λi = IIp (ei ) é um valor crı́tico de
uma função definida na esfera unitária de Tp (M ) do seguinte modo: Para
cada v ∈ Tp (M ), |v| = 1, o valor da função em v é a componente normal
do vetor curvatura geodésica em Qn+1 de uma curva em M passando por p
com vetor tangente v. Por esta razão, λ1 , . . . , λn são também chamadas as
curvaturas principais de x em p.
As funções simétricas de λ1 , . . . , λn são invariantes da aplicação linear
−Ap = −An+1 p : Tp (M ) → Tp (M ) que é associada à forma quadrática IIp
(V. Seção 1.9) e, portanto, não dependem da diagonalização feita. Em
particular, o determinante de −Ap :

λ1 λ2 . . . λn = K(p)

e o traço de −Ap dividido por n:

λ1 + · · · + λ n
= H(p)
n
78 Hipersuperfı́cies em um espaço de curvatura constante. Seção 2.1

são chamadas a curvatura de Gauss-Kronecker e a curvatura média de x,


respectivamente. Observe que H é o módulo do vetor curvatura média
definido na Seção 1.9.
Uma observação importante é que o sinal de IIp (e portanto o sinal
de λi ) só fica bem definido globalmente com a escolha de uma orientação.
Portanto, H só está bem definida se M for orientável e orientada. Por outro
lado, é imediato verificar que se n é par, K está definido independentemente
de orientação.
A equação (3) (que é essencialmente a equação de Gauss da Seção 1.9)
pode ser escrita no ponto p tomando e1 , . . . , en nas direções principais em
p, e fornece
X ¡X ¢ ¡ X ¢
Ωij = dωij − ωik ∧ ωkj = hi` ω` ∧ − hjk ωk − c ω1 ∧ ωj
` k
= −λi λj ωi ∧ ωj − c ωi ∧ ωj = −(λi λj − c) ωi ∧ ωj ,

onde Ωij são as formas de curvatura da métrica induzida. Decorre daı́ que

Rijij = λi λj + c, i 6= j. (4)

Como Rijij é a curvatura seccional de M em p segundo o plano gerado por


ei , ej , concluı́mos que λi λj depende apenas de c e da métrica induzida.
Isto permite demonstrar a seguinte generalização do teorema egregium de
Gauss.
Teorema 1. Seja x : M n → Qn+1 (c) uma hipersuperfı́cie e suponha que
n = 2k é par. Então a curvatura de Gauss-Kronecker depende apenas de c
e da métrica induzida de M .
Demonstração: Com efeito,

K = (λ1 λ2 ) . . . (λ2k−1 λ2k )


= (R1212 − c) . . . (R2k−1,2k,2k−1,2k − c),

e o segundo membro só depende de c e da métrica induzida de M .


Observação 1: A demonstração mostra, em verdade, que se n é par, P qual-
quer função simétrica de ordem par dos λi ’s (por exemplo, a função λi λj )
i<j
é um invariante geométrico que só depende de C e da métrica induzida de M .
Observação 2: As definições acima se estendem facilmente a uma imersão
n+1
x: Mn → M em uma variedade riemaniana M qualquer. O Teorema
1 ainda é válido, isto é, se n é par, a curvatura de Gauss-Kronecker de x
depende apenas da métrica riemaniana de M e da métrica induzida de M .
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 79

No caso particular em que Qn+1 = Rn+1 e M n é orientada, podemos, por


analogia com o que fizemos para superfı́cies, definir uma aplicação normal de
Gauss. Para isto, escolheremos um referencial e1 , . . . , em , en+1 de modo que
a base {e1 , . . . , en } esteja na orientação de M e forme com en+1 uma base
positiva de Rn+1 . Um tal referencial é dito compatı́vel com a orientação
de M . Neste caso, en+1 : M n → Rn+1 toma valores na esfera unitária
S n ⊂ Rn+1 . Como M é orientada, esta aplicação é globalmente definida e
é chamada a aplicação normal de Gauss de x. Como
X X¡X ¢ X
den+1 (ek ) = ωn+1,i (ek )ei = − hij ω(ek ) ei = − hik ei ,
i i j i

vemos que (−hij ) é a matriz da diferencial da aplicação normal de Gauss


na base {ei }. Isto mostra que (den+1 )p = Ap .
A aplicação normal de Gauss tem implicações topológicas. Como exem-
plo, provaremos o seguinte fato.
Teorema 2. Seja M n , n ≥ 2, uma variedade compacta, conexa e ori-
entável. Se existir uma imersão x : M n → Rn+1 com curvatura de Gauss-
Kronecker diferente de zero em todo ponto de M , então M n é difeomorfa à
esfera S n .
Demonstração: Seja ν : M n → S n a aplicação normal de Gauss de x.
Como, para todo p ∈ M ,
K(p) = (−1)n det Ap = (−1)n det(dν)p 6= 0,
a aplicação ν é um difeomorfismo local. Como M é compacta e S n é conexa,
ν é uma aplicação de recobrimento. Como S n é simplesmente conexa
(n ≥ 2), ν é um difeomorfismo global. (Para detalhes sobre espaços de
recobrimento V. M. do Carmo [dC 4] cap. 5).

Voltemos às imersões em espaços de curvatura constante. Vamos de-


monstrar um resultado fundamental conhecido sob o nome de Lema de
Chern-Lashof.
Chamaremos de posto de uma forma quadrática o número de valores
próprios não nulos desta forma quadrática.
Lema 1 (Chern-Lashof). Seja x : M n → Qn+1 (c) uma hipersuperfı́cie ori-
entável em um espaço de curvatura constante c e seja IIp a segunda forma
quadrática de x em p. Seja
Um = {p ∈ M ; posto IIp = n − m}.
Então, se Um contém um aberto V , por cada ponto de x(V ) passa uma
variedade totalmente geodésica L de Qn+1 de dimensão m. Além disto, se
p é ponto de acumulação de L ∩ Um , então p ∈ Um .
80 Hipersuperfı́cies em um espaço de curvatura constante. Seção 2.1

Demonstração: Seja p ∈ V e seja Pp ⊂ Tp (M ) o subespaço de dimensão


m que anula IIp . Vamos fazer uma modificação na nossa convenção de
ı́ndices e usar:

1 ≤ α, β, γ ≤ m, m + 1 ≤ a, b, c ≤ n, 1 ≤ i, j, k ≤ n.

Escolhamos, em uma vizinhança de x(p), um referencial e1 , . . . , en , en+1 ,


adaptado a x e compatı́vel com a orientação de M , de tal modo que restritos
a x(V ), e1 , . . . , en pertençam a P . Como a matriz (hij ) de segunda forma
quadrática é dada por X
ωi,n+1 = hij ωj
j

e os vetores eα anulam II, concluı́mos que

ωα,n+1 = 0 = −ωn+1,α . (5)

Além disto, a matriz (hij ) se escreve na forma


 
0 0
  , det(hab ) = D 6= 0,
0 (hab )

onde (hab ) é uma matriz (n − m) × (n − m).


Primeiro, observe que de (5) e da equação (4) da Seção 1.9 vem
X
0 = dωα,n+1 = ωαk ∧ ωk,n+1 + Ωα,n+1
k
X X
= ωαβ ∧ ωβ,n+1 + ωαb ∧ ωb,n+1 − c ωα ∧ ωn+1
β b
X X
= ωαb ∧ ωb,n+1 = ωab ∧ hba ωa , (6)
b ba

pois ωβ,n+1 = 0 e ωm+1 = 0. Multiplicando exteriormente ambos os mem-


bros de (6) por
ωm+1 ∧ ωm+2 ∧ · · · ∧ ω̂a ∧ · · · ∧ ωn ,
onde ω̂a significa que o fator ωa não está presente, obteremos, para todo a,
X Y
hab ωαb ∧ ωc = 0,
b c
Q
onde ωc = ωm+1 ∧ · · · ∧ ωn . Como det(hab ) 6= 0, podemos escrever
c
Y
ωαb ∧ ωc = 0,
c
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 81

e portanto X
ωab = Aαba ωa . (7)
a
Decorre daı́ que as formas ωb , que anulam P , satisfazem a seguinte
condição:
X X X
dωb = ωk ∧ ωkb = ωα ∧ ωαb + ωa ∧ ωab
k α a
XX X
=− Aαba ωa ∧ ωα + ωa ∧ ωab
α a a
X ¡ X ¢
= ωa ∧ ωab − Aαba ωα , (8)
a α

isto é, as formas dωb pertencem ao ideal gerado pelas ωb ’s. Mas isto é pre-
cisamente a condição do Teorema de Frobenius, que garante a integrabili-
dade da distribuição P definida pelas formas ωb . Portanto, por cada ponto
de x(V ) passa uma subvariedade de dimensão m. Restritas a esta subvarie-
dade, as formas ωa = 0 e, de (7), as formas ωαb , que fornecem as segundas
formas quadráticas desta subvariedade nas direções normais eb , também
se anulam. Como por (5), a segunda forma quadrática na direção en+1 é
nula, concluı́mos que as subvariedades obtidas são totalmente geodésicas em
Qn+1 , o que prova a primeira parte do lema.
Para provar a segunda parte, vamos estudar o comportamento do deter-
minante D ao longo da variedade totalmente geodésica que passa por um
ponto de x(V ). Observe que
Y
ωa,n+1 = ωm+1,n+1 ∧ · · · ∧ ωn,n+1
a
Y
= det(hab )ωm+1 ∧ · · · ∧ ωn = D ωc . (9)
c

Diferenciando exteriormente ambos os membros de (9), obteremos


X
(−1)a−m−1 ωm+1,n+1 ∧ · · · ∧ dωa,n+1 ∧ · · · ∧ ωn,n+1
a
Y ¡X ¢
= dD ∧ ωc + d (−1)a−m−1 ωm+1 ∧ · · · ∧ dωa ∧ · · · ∧ ωn . (10)
c a

Mas, de (8), X X
¡ ¢
dωa = ωb ∧ ωba − Aβab ωβ . (11)
b β

Além disto, como o espaço ambiente tem curvatura constante,


X X
dωa,n+1 = ωak ∧ ωk,n+1 = ωab ∧ ωb,n+1 . (12)
k b
82 Hipersuperfı́cies em um espaço de curvatura constante. Seção 2.1

Levando (11) e (12) em (10), concluı́mos que a primeiro membro de (10)


se anula e que a segunda parcela do segundo membro de (10) se reduz a
¡X Y ¢
D Aβaa ωβ ∧ ωc .
βa c

Portanto, a equação (10) se escreve


¡ ¡X ¢¢ Y
dD + D Aβaa ωβ ∧ ωc = 0,
βa c

ou seja, D satisfaz a seguinte equação diferencial:


¡X ¢
dD + D Aβaa ωβ ≡ 0, mod ωc , (13)
βa

onde “mod ωc ” significa que o segundo membro é uma combinação linear


das ωc ’s.
As considerações acima são válidas em um ponto do interior de Um .
Seja agora p um ponto de M que é ponto de acumulação de L ∩ Um , para
alguma subvariedade totalmente geodésica L de dimensão m. Considere
uma vizinhança W de p e escolha um referencial ẽ1 , . . . , ẽn , ẽn+1 em W tal
que, restritos a L, ẽ1 , . . . , ẽm sejam tangentes a L. Indicando por ω̃i , ω̃ij as
formas do novo referencial, podemos escrever
X
ω̃αb = Beαbk ω̃k ,
k

pois os ω̃k ’s são linearmente independentes. Observe que, para todo q ∈


L, as funções B eαbk coincidem com funções Aeαbk definidas em (7). Seja
γ : [0, 1) → L uma curva diferenciável em L ∩ W tal que p pertença ao
conjunto limite de γ(t) quando t → 1. Como p é ponto de acumulação de
L, uma tal curva sempre existe. Para todo ponto de γ([0, 1)) teremos
¡X ¢
dD + D eβaa ω̃β = 0,
A (14)
βa

pois as formas ω̃c se anulam em L. Segue-se, por integração, que


 
Z X
D(t) = D(0) exp − eβaa ω̃β  , D(0) 6= 0.
A
βa

eβaa é uma função limitada,


Como D(t) é uma função contı́nua e A

D(p) = lim D(t) 6= 0,


t→1
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 83

o que mostra que p ∈ Um .


Observação 4: No caso em que Qn+1 = Rn+1 , as subvariedades total-
mente geodésicas (variedades lineares de Rn+1 ), obtidas na demonstração
do lema de Chern-Lashof, possuem a propriedade seguinte: Ao longo de tais
subvariedades o vetor normal en+1 é constante. Com efeito,
X X X
den+1 = ωn+1,i ei = ωn+1,α eα + ωn+1,b eb
i α b
X X
= ωn+1,b eb = (−hba ωa )eb ,
b ba

donde den+1 (eα ) = 0, como havı́amos afirmado.


Observação 5: O Lema de Chern-Lashof pode ser utilizado para demons-
trar o chamado “Teorema do cilindro”: Se x : M n → Rn+1 é uma imersão
isométrica de uma variedade riemaniana completa cujas curvaturas sec-
cionais são todas nulas, então x(M ) ⊂ Rn+1 é um (n − 1)-cilindro, isto
é, por cada ponto de x(M ) passa uma variedade linear de dimensão n − 1
inteiramente contida em x(M ) e duas tais (n − 1)-variedades são paralelas
ou coincidentes. Para uma demonstração deste fato V. L. Rodrı́guez ([Ro
2]).
Nestas notas, utilizaremos o lema de Chern-Lashof para caracterizar, por
meio da curvatura seccional, as hipersuperfı́cies compactas e convexas do
Rn+1 . Um subconjunto K ⊂ Rn+1 é convexo se dados dois pontos p, q ∈ K,
o segmento de reta pq está contido em K. Um corpo convexo de R n+1 é
um subconjunto convexo com pontos interiores. Uma subvariedade M n ⊂
Rn+1 é convexa se ela é fronteira de um corpo convexo de Rn+1 . O resto
desta seção será dedicado à demonstração do seguinte resultado fundamental
(Após a demonstração faremos alguns comentários sobre o desenvolvimento
histórico e as possı́veis extensões do resultado).
Teorema 3. Seja M n , n ≥ 2, uma variedade riemaniana conexa, com-
pacta, orientada, com curvatura seccional K ≥ 0. Seja x : M n → Rn+1
uma imersão isométrica. Então M é homeomorfa a uma esfera S n , x é um
mergulho e x(M ) ⊂ Rn+1 é uma subvariedade convexa do Rn+1 .
Será conveniente dividir a demonstração em uma série de lemas, para os
quais precisamos de alguns preliminares.
Dado um vetor ν̃ ∈ S n ⊂ Rn+1 , chamaremos função altura de x relati-
vamente a ν̃ à função h : M → R definida por h(p) = hx(p), ν̃i, p ∈ M . A
demonstração se baseia no estudo das trajetórias do campo grad h.
Recordamos que um ponto crı́tico de uma aplicação diferenciável f : M →
N de uma variedade diferenciável M em uma variedade diferenciável N é
84 Hipersuperfı́cies em um espaço de curvatura constante. Seção 2.1

um ponto p ∈ M no qual a diferencial dfp : Tp (M ) → Tp (N ) não é sobre-


jetiva. A imagem de um ponto crı́tico é chamado um valor crı́tico de f .
Os ponto de N que não são valores crı́ticos de f são chamados valores re-
gulares de f . O fato fundamental relativo a estas definições é o Teorema
de Sard: O conjunto dos valores regulares de f é denso em N ; para uma
demonstração V. Milnor [Mi]. Se, em particular, f : M → R é uma função
real, e p ∈ M é um ponto crı́tico de M , é possivel mostrar que a forma
bilinear d2 fp : Tp (M ) × Tp (M ) → R está bem definida. A forma quadrática
associada a d2 fp é chamada o hessiano de f no ponto crı́ticos p. Um ponto
crı́tico p é não degenerado se todos os valores próprios do hessiano de f em
p são distintos de zero.
Lema 2. Seja M n uma variedade riemaniana orientada com curvatura
seccional K ≥ 0. Seja x : M n → Rn+1 uma imersão isométrica e seja
ν : M n → S n a aplicação normal de Gauss de x. Seja ν̃ ∈ S n um valor
regular de ν. Então os pontos crı́ticos da função altura h : M → R relativa-
mente a ν̃ são todos não degenerados e são pontos de máximo ou de mı́nimo
de h.
Demonstração: Se p ∈ M é um ponto crı́tico de h,

dhp = hdxp , ν̃i = 0.

Decorre daı́ que ν̃ é um vetor normal em x(p) e que o hessiano

d2 hp = hd2 xp , ν̃i

é a segunda forma quadrática de x na direção ν̃. Como ν̃ e um valor


regular da aplicação ν, det(dνp ) 6= 0. Mas det(dνp ) é, a menos de sinal,
o determinante da forma quadrática d2 hp . Portanto, p é um ponto crı́tico
não degenerado de h.. Além disto, como as curvaturas seccionais são não
negativas, todos os valores próprios de d2 hp têm o mesmo sinal. Portanto
h(p) é um máximo ou um mı́nimo de h.
Lema 3. Seja M n , n ≥ 2 uma variedade diferenciável compacta e conexa.
Seja h : M → R uma função diferenciável tal que todos os seus pontos
crı́ticos sejam não degenerados, e sejam pontos de máximo ou pontos de
mı́nimo. Então h possui exatamente dois pontos crı́ticos.
Demonstração: Por compacidade de M existe um ponto crı́tico de h,
digamos q ∈ M . Trocando h por −h, se necessário, podemos supor que q é
um mı́nimo. Considere em M o campo de vetores grad h dado por

dhp (X) = h grad h(p), Xi ,

para todo p ∈ M e todo X ∈ Tp (M ). É claro que se p é um ponto crı́tico


de h, grad h(p) = 0.
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 85

Uma trajetória de grad h é uma curva ϕ : (−ε, ε) → M tal que dϕ


dt =
grad h (ϕ(t)). Como M é compacta, segue-se que por todo ponto de M
passa uma trajetória máxima ϕ : (−∞, ∞) → M . Observe que

dh ¡ dϕ ¢ dϕ
(ϕ(t)) = dh = h grad h (ϕ(t)), i = | grad h (ϕ(t))|2 .
dt dt dt
Diz-se que uma trajetória ϕ(t) do gradiente sai de um ponto crı́tico p se
ϕ(0) está próximo de p e lim ϕ(t) = p.
t→−∞
Considere uma trajetória ϕ(t) do gradiente de h que sai do ponto de
mı́nimo q. Como h é limitado em M , e
Z t Z f
d
h(ϕ(t)) − h(ϕ(0)) = h(ϕ(t))dt = | grad j (ϕ(t))|2 dt,
0 dt 0

concluı́mos que | grad h| se aproxima arbitrariamente de zero ao longo da


trajetória ϕ(t). Como o fecho de uma tal trajetória é um conjunto compacto,
| grad h| se anula em algum ponto deste fecho. Decorre daı́, e do fato que os
pontos crı́ticos são pontos de máximo ou de mı́nimo, que existe lim ϕ(t) =
t→+∞
p ∈ M e p é um ponto crı́tico de h. No que se segue, exprimiremos este fato
dizendo que ϕ(t) entra em p.
Vamos mostrar que p e q são os únicos pontos crı́ticos de h. Diremos
que o conjunto dos pontos de M onde h = const. = c é a superfı́cie de nı́vel
e de h. Se c é um valor regular, decorre do teorema da função implı́cita que
a superfı́cie de nı́vel c é uma subvariedade de M de dimensão n − 1. Além
disto, se p é um ponto crı́tico não degenerado de máximo ou de mı́nimo, as
superfı́cies de nı́vel “perto de p” são homeomorfas a esferas S n−1 .
Seja S uma superfı́cie de nı́vel de h, suficientemente próxima de q para
que S seja homeomorfa a uma esfera. Seja A ⊂ S o conjunto dos pontos que
são intersecções de S com uma trajetória de grad h saindo de q e entrando
em p. Como p e q são pontos de máximo ou de mı́nimo, A é aberto em S.
Por outro lado, como vimos anteriormente, uma trajetória que sai de q e
intersecta S em um ponto do complementar de A, entra em um ponto crı́tico,
digamos r, que também é um ponto de máximo ou de mı́nimo. Decorre daı́
que o complementar de A é aberto em S, e como S é conexo (aqui é usado
o fato de que n ≥ 2), A = S. Portanto todas as trajetórias de grad h que
saem de q entram em p. Por um argumento análogo, vê-se que o conjunto
de tais trajetórias constitui um conjunto aberto e fechado de M , donde todo
o M.
Portanto p e q são os únicos pontos crı́ticos de h, o que termina a de-
monstração do lema.
Passemos à demonstração do Teorema 3.
86 Hipersuperfı́cies em um espaço de curvatura constante. Seção 2.1

Demonstração do Teorema: Primeiro observamos que se p ∈ M é tal que


ν(p) = ν̃ é um valor regular de ν, então x(M ) está inteiramente contido em
um dos dois semi-espaços fechados determinados pelo hiperplano tangente
a x(M ) em x(p); caso contrário, a função altura relativamente a ν̃ teria pelo
menos três pontos crı́ticos, o que contradiz os Lemas 2 e 3. Exprimiremos
este fato dizendo que x(M ) está de um mesmo lado do hiperplano tangente
em x(p).
Seja H o conjunto dos hiperplanos de Rn+1 (não necessariamente pas-
sando pela origem) com a topologia natural, isto é, dois hiperplanos estão
próximos se os coeficientes das equações lineares que os representam estão
próximos. Seja q ∈ M tal que ν(q) é um valor crı́tico de ν, e seja π o hiper-
plano tangente de x(M ) em x(q). Vamos mostrar que para toda vizinhança
W de π em H existe r ∈ M tal que ν(r) é valor regular de ν e Tx(r) ∈ W ,
onde, por simplicidade, indicamos dxr (Tr (M )) = Tx(r) .
Para provar o afirmado, convém modificar ligeiramente a nossa notação
anterior e indicar por Um o conjunto dos pontos de M onde a segunda forma
quadrática tem posto m. Podemos supor que q ∈ Uk , k < n. Então, ou
existe uma vizinhança de q em M contida em Uk ou em toda vizinhança
de q existem pontos de Um , m > k. Repetindo o argumento um número
suficiente de vezes, acharemos, em qualquer dois dois casos, um ponto p 1 ∈
M , com Tx(p1 ) ∈ W , e tal que uma vizinhança de p1 está contida em Um ,
m ≥ k. Pelo lema de Chern-Lashof, passa por x(p1 ) uma (n − m)-variedade
linear L ao longo da qual o hiperplano tangente é constante (V. Observação
4). Seja x(p2 ) um ponto da fronteira da intersecção L ∩ M , que existe por
compacidade de M . É claro que ν(p2 ) = ν(p1 ) e que Tx(p1 ) = Tx(p2 ) . Pelo
lema de Chern-Lashof, p2 ∈ Um . Portanto, em qualquer vizinhança de p2
existem pontos de U` , ` > m. Segue-se que existe um ponto p3 ∈ M , com
p3 ∈ U` e Tx(p3 ) ∈ W . Se ` < n, repetiremos o argumento anterior até
acharmos um ponto p ∈ M , com Tx(p) ∈ W e p ∈ Un . Como p ∈ Un , ν
é um difeomorfismo local em uma vizinhança de p. Pelo Teorema de Sard,
existe r ∈ M tal que ν(r) é valor regular de ν e Tx(r) ∈ W , o que prova a
afirmação feita.
Como ν(r) é um valor regular de ν, x(M ) está de um mesmo lado de
Tx(r) . Por continuidade, x(M ) está de um mesmo lado de π.
Decorre daı́ que x(M ) está de um mesmo lado do hiperplano tangente
de cada um de seus pontos.
Como M é compacto, existem valores regulares de ν, e portanto x(M )
não está contido em um hiperplano de Rn+1 . Portanto, a intersecção de
todos os semi-espaços fechados determinados pelos hiperplanos tangentes a
x(M ), e contendo pontos de x(M ), é um corpo convexo K de R n+1 cuja
fronteira K 0 contém x(M ). Se mostrarmos que x é um homeomorfismo e
que x(M ) = K 0 , a demonstração estará terminada.
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 87

Primeiro mostraremos que x(M ) é aberto em K 0 . Seja p ∈ M e seja


U ⊂ M uma vizinhança de p em M de tal modo que x(U ) seja o gráfico
de uma função diferenciável f definida em uma vizinhança da origem W ⊂
dxp (Tp (M )). Seja q um ponto do interior do corpo convexo K 0 ,
q pertencente à normal a x(M ) em p. Seja B(0) ⊂ W uma bola aberta
centrada na origem de dxp (Tp (M )) e seja C o conjunto das semi-retas (um
cone) de origem q e passando por B(0). É claro que C ∩ K 0 é um aberto
de K 0 . Como K é convexo, cada semi-reta r de C intersecta K 0 uma única
vez, digamos em k 0 ∈ K 0 . Seja k̄ a intersecção de r com B(0). Então
f (k̄) ∈ x(U ) e a correspondência k → f (k̄) é evidentemente um homeomor-
fismo do aberto C ∩ K 0 em x(U ) cuja imagem contém x(p). Portanto x(U )
contém um aberto de K 0 que contém x(p), donde x(M ) é aberto em K 0 .
Por compacidade, x(M ) é aberto e fechado em K 0 , donde x : M → K 0
é uma aplicação sobrejetiva. Como M é compacto, x é uma aplicação de
recobrimento. É um fato conhecido (e fácil de demonstrar) que a fronteira
de um corpo convexo e compacto é homeomorfa a uma esfera. Portanto, K 0
é simplesmente conexo, se n ≥ 2, e a aplicação de recobrimento x : M → K 0
é um homeomorfismo, como querı́amos.
Observação 6: A condição de ser n ≥ 2 é necessária, como mostra o
exemplo de uma curva plana em forma de um 8. Convém notar que o
fato da curvatura seccional ser não negativa foi usada apenas na demons-
tração do Lema 2. Em verdade, e isto será útil na Seção 2.4, demons-
tramos o seguinte fato: Seja x : M n → Rn+1 uma imersão de uma va-
riedade M conexa, compacta e orientável, e seja ν : M n → S n ⊂ Rn+1
a aplicação normal de Gauss de x. Se para todo valor regular ν̃ de ν,
a função altura relativamente a ν̃ possui exatamente dois pontos crı́ticos,
então x(M n ) ⊂ Rn+1 é a fronteira de um corpo convexo de Rn+1 .
Observação 7: O Teorema não é definitivamente um fato local, como
mostra o exemplo seguinte. Seja z = x3 (1 + y 2 ), definida na vizinhança
y 2 < 1/2 de (0, 0). Um cálculo simples mostra que a curvatura Gaussiana
K desta superfı́cie satisfaz K ≥ 0, e entretanto existem pontos da superfı́cie
em ambos os lados do plano tangente na origem.
Observação 8: O Teorema 3 pode ser estendido para o caso em que M n
(n ≥ 2) é completo, não compacto, tem curvaturas seccionais K ≥ 0 e,
em pelo menos um ponto, tem todas as curvaturas seccionais estritamente
positivas. Neste caso, resulta que M n é homeomorfo a Rn e x(M ) ⊂ Rn+1
é a fronteira de um corpo convexo de Rn+1 . Uma primeira demonstração
deste fato foi dada em Sacksteder [Sa 1], onde a situação considerada é um
pouco mais geral do que a descrita aqui.
Observação 9: O Teorema 3 tem uma longa história. Para o caso n = 2,
M compacto, K > 0, ele foi demonstrado por J. Hamadard em 1897 [Ha].
88 Hipersuperfı́cies em um espaço de curvatura constante. Seção 2.1

O caso n = 2, M completo não compacto, K > 0 foi demonstrado por J.J.


Stoker em 1936 [Sto]. O caso n = 2, M compacto, K ≥ 0 foi demonstrado
por S.S. Chern e R. Lashof em 1958 [ChLa 1]. O caso geral, mencionado
na Observação 8, foi demonstrado por R. Sacksteder em 1960 [Sa 1]. Uma
demonstração simples do caso compacto, K ≥ 0, n ≥ 2 arbitrário, foi
dada por M. do Carmo e E. Lima em 1969 [dCL 1]; esta é essencialmente a
demonstração que apresentamos aqui. Uma demonstração do caso completo
não compacto, seguindo uma linha semelhante, é dada em M. do Carmo e
E. Lima [dCL 2], onde se demonstram outros fatos que não decorrem do
trabalho de Sacksteder (V. entretanto [Cu] onde uma correção de [dCL 2]
é apresentada). Um fato importante relacionado com o Teorema 3 no caso
completo, não compacto, é que o fecho da imagem da aplicação normal de
Gauss é um subconjunto convexo da esfera. Para uma demonstração deste
fato, veja-se M. do Carmo e B. Lawson [dCLa] e H. Wu [Wu].
Observação 10: No caso em que M n é compacto, o Teorema 3 pode
ser estendido para hipersuperfı́cies da esfera S n+1 e do espaço hiperbólico
H n+1 , com a condição de que a curvatura seccional de M seja maior ou
igual a curvatura do espaço ambiente. Para uma demonstração V. M. do
Carmo [dCWar]. Para o caso em que M n é completo e o espaço ambiente é
o espaço hiperbólico, o problema está em aberto e não é sequer claro qual
deva ser o enunciado (Ver, entretanto, a Observação 13).
Observação 11: O Teorema 3 pode ser estendido para hipersuperfı́cies de
um espaço de Hilbert. Para detalhes V. M. do Carmo [dC 3], L. Jonker [Jo]
e R.L. de Andrade [An].
Observação 12: O Teorema da convexidade foi estendido para hipersu-
perfı́cies compactas com bordo por L. Rodrı́guez [Ro 2] e se enuncia da
seguinte maneira. Seja M n uma variedade conexa com bordo ∂M , e supon-
hamos que M tenha curvatura seccional não negativa. Seja x : M n → Rn+1
uma imersão isométrica e suponhamos que a imagem por x de cada compo-
nente conexa de ∂M seja a fronteira de um conjunto convexo. Seja K(∂M )
a união de tais conjuntos convexos. Então x(M ) ∪ K(∂M ) é a fronteira de
um corpo convexo de Rn+1 .
Observação 13: Um problema fundamental nesta ordem de idéias parece
n+1
ser o seguinte. Seja M uma variedade riemaniana completa, simples-
m+1
mente conexa, com curvatura seccional K ≤ 0. Sabe-se então que M
é homeomorfa a Rn+1 (V. M. do Carmo [dC 4]) e que, dados dois pontos
p̄, q̄ ∈ M existe uma única geodésica ligando p̄ e q̄. Seja M n uma variedade
n+1
riemaniana completa, e seja x : M n → M uma imersão isométrica de
modo que as curvaturas seccionais K de M e K de M satisfaçam à condição:
K(p, P ) ≥ K(x(p), dx(P )), (*)
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 89

para todo p ∈ M e todo P ⊂ Tp (M ). Pergunta-se se x(M ) ⊂ M é fronteira


de um corpo convexo e quais as implicações topológicas deste fato. Se a
desigualdade (*) é estrita, uma solução se encontra em [A`]. V. também a
tese de Ivan Tribuzy no IMPA (1978) e o trabalho de R. Currier [Cu].

2.2 Unicidade de hipersuperfı́cies. O Teorema de Cohn-


Vossen.
Seja x : M n → Qn+1 uma hipersuperfı́cie orientada de Qn+1 . Para cada
ponto p ∈ M estão definidas em Tp (M ) duas formas quadráticas Ip e IIp ,
onde I é a métrica induzida por x e II é a segunda forma quadrática de
x. Estas formas quadráticas determinam a imersão x a menos de um movi-
mento rı́gido.
Proposição 1. Sejam x, x0 : M n → Qn+1 duas imersões de uma va-
riedade conexa e orientada M , e sejam I e II as primeira e segunda formas
quadráticas de x, e I 0 e II 0 as primeira e segunda formas quadráticas de x0 .
Suponhamos que para todo p ∈ M , Ip = Ip0 , IIp = IIp0 . Então existe um
movimento rı́gido ρ : Qn+1 → Qn+1 tal que ρ ◦ x = x0 .
Demonstração: Seja p ∈ M e U ⊂ M uma vizinhança de p de tal
modo que a restrição x|U seja injetiva e que exista um referencial adap-
tado e1 , . . . , en+1 em x(U ), compatı́vel com a orientação de M . Seja f =
x0 ◦ x−1 |x(U ) e seja e01 , . . . , e0n+1 , o referencial compatı́vel com a orientação
de M , definido em x0 (U ) por
e0i = df (ei ), i = 1, . . . , n, en+1 normal a x0 (U ).
Como I = I 0 , f : x(U ) → x0 (U ) é uma isometria, e os campos e0i são ortonor-
mais. Além disso, indicando por uma linha as entidades em x0 (U ), o fato de
ser f uma isometria implica que f ∗ ωi0 = ωi , f ∗ ωij0
= ωij . Por outro lado,
0 ∗ 0
como II = II , concluı́mos que f ωi,n+1 = ωi,n+1 .
Aplicando o Teorema 1’ (unicidade local) da Seção 1.10, obtemos que
existe um movimento rı́gido ρu de Qn+1 tal que a restrição ρu |x(U ) = f ,
isto é, ρu ◦ x|U = x0 . Pela escolha dos referenciais, ρu é único. Decorre daı́
que na intersecção U ∩ V de duas tais vizinhanças, ρu = ρv . Como M é
conexa, existe ρ = ρu tal que ρ ◦ x = x0 .

Uma pergunta natural é em que condições a primeira forma quadrática


(isto é, a geometria intrı́nseca de M ) determina a segunda forma quadrática
de uma hipersuperfı́cie. Pela Proposição 1, isto implica que a imersão é
única a menos de um movimento rı́gido; em outras palavras, a geometria
intrı́nseca de M determina a “forma” de M no espaço ambiente. O proble-
ma de determinar tais condições é chamado o problema de unicidade das
hipersuperfı́cies.
90 Unicidade de hipersuperfı́cies. O Teorema de Cohn-Vossen. Seção 2.2

A proposição seguinte mostra que se a dimensão de M for maior ou igual


a três, o problema tem pouco interesse.
Proposição 2 (Beez). Seja x : M n → Qn+1 (c) uma imersão de uma
variedade conexa e orientada M em um espaço de curvatura constante c.
Suponha que o posto da segunda forma quadrática IIp de x é maior ou igual
a três para todo ponto p ∈ M . Então II é determinada por I.
Demonstração: Seja p ∈ M e seja {eA }, A = 1, . . . , n + 1, um referencial
em uma vizinhança de p que diagonaliza a segunda forma quadrática em p.
Sejam λ1 , . . . , λn os valores próprios de IIp . Por (4) da Seção 2.1, temos
que
λi λj = K(p; {ei ej }) − c, i 6= j,
onde K(p; {ei , ej }) é a curvatura seccional de M em p segundo o plano
gerado por i , ej . Por hipótese, pelo menos três valores próprios, digamos,
λ1 , λ2 , λ3 são distintos de zero. Como os produtos λ1 λ2 , λ2 λ3 , λ3 λ1 só
dependem de c e da métrica induzida, o mesmo acontece com λ1 , λ2 e
λ3 . Qualquer outro λk 6= 0, λ 6= 1, 2, 3, pode ser calculado a partir de
λk λ1 = K(p, {e1 , ek }) − c. Portanto IIp fica inteiramente determinada por
I e, como p é arbitrário, concluı́mos a demonstração.
A proposição mostra que o problema de unicidade de hipersuperfı́cies é
mais interessante no caso em que a dimensão de M é dois. No resto desta
Seção, nos restringiremos ao caso x : M 2 → R3 .
Observação 1: Convém observar que a segunda forma quadrática de
x : M n → Rn+1 só fica bem definida quando fixamos uma orientação para
M (suposta orientável). Caso contrário, o fato de serem iguais as primeira
e segunda formas quadráticas de duas imersões x, x0 : M n → Rn+1 significa
apenas que x e x0 diferem por um movimento rı́gido seguido possivelmente
de uma reflexão (uma reflexão é uma transformação linear de R n+1 com
valores próprios ±1 e com determinante negativo).

Provavelmente, o mais famoso dos teoremas de unicidade é o seguinte


resultado.
Teorema 1 (Cohn-Vossen, Herglotz). Seja M 2 uma variedade riemaniana
de dimensão dois, orientável, compacta, conexa e com curvatura Gaussiana
K ≥ 0. Sejam x, x0 : M 2 → R3 duas imersões isométricas de M 2 em R3 .
Então existe um movimento rı́gido ρ de R3 tal que ou x0 = ρ ◦ x ou x0 =
ρ ◦ R ◦ x, onde R é uma reflexão de R3 .
Demonstração: Já sabemos, pelo Teorema 3 da Seção 2.1, que x e x0 são
mergulhos, e x(M ) e x(M 0 ) são fronteiras de corpos convexos em R3 . Será
conveniente identificar x(M ) = M , x0 (M ) = M 0 e definir f : M → M 0 por
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 91

f = x0 ◦ x−1 . Seja p ∈ M e seja e1 , e2 , e3 um referencial adaptado a M em


uma vizinhança U de p. Defina

e01 = df (e1 ), e02 = df (e2 ), e03 normal a Tf (p) (M 0 ).

Como f é uma isometria, e01 , e02 , e03 é um referencial adaptado a M 0 em


uma vizinhança U 0 = f (U ), e f ∗ ωi0 = ωi , i = 1, 2, f ∗ ω12
0
= ω12 . Nestes
0
referenciais, as segundas formas quadráticas de M e M são dadas por

II = a ω12 + 2b ω1 ω2 + c ω22
II 0 = a0 ω102 + 2b0 ω10 ω20 + c0 ω202 .

Queremos provar que f ∗ II 0 = II, isto é, que f ◦a0 = a, f ◦b0 = b e f ◦c0 = c.
Como f é uma isometria, temos que

K = ac − b2 = f ◦ K 0 = f ◦ (a0 c0 − (b0 )2 ).

por simplicidade de notação, vamos escrever no que se segue f ◦ a0 = a0 ,


f ◦ K 0 = K 0 , etc.
Seja yA = hx, eA i, A = 1, 2, 3, a função altura de M relativamente a eA ,
e introduza a forma diferencial
© ª
dθ = d y1 (f ∗ ω23
0
) − y2 (f ∗ ω13
0
)

definida em U . Vamos mostrar que dθ é globalmente definida em M .


Com efeito,

dy1 = hdx, e1 i + hx, de1 i = ω1 + ω12 y2 + ω13 y3

e, analogamente
dy2 = ω2 + ω21 y1 + ω23 y3 .
Portanto, utilizando a simplificação de notação mencionada e notando que
f ∗ ω12
0
= ω12 , teremos

dθ = ω1 ∧ (f ∗ ω23
0
) − ω2 ∧ (f ∗ ω13
0
) + y3 (ω13 ∧ f ∗ ω23
0
− ω23 ∧ f ∗ ω13
0
)
0 0 0 0 0
= (a + c )ω1 ∧ ω2 + y3 (ac + ca − 2bb )ω1 ∧ ω2
= (2H 0 + y3 J)ω1 ∧ ω2 , (1)

onde y3 é a chamada função suporte de M , que mede a distância de Tp (M )


à origem de R3 , e J é dado por
 0 
a − a b0 − b
J = ac0 + ca0 − 2bb0 = −   + (a0 c0 − (b0 )2 ) + (ac − b2 )
0 0
b −b c −c
= − det(de3 − de03 ) + 2K. (2)
92 Unicidade de hipersuperfı́cies. O Teorema de Cohn-Vossen. Seção 2.2

De (1) e (2) concluı́mos que dθ tem um significado geométrico independente


do referencial e, portanto, é globalmente definida, como havı́amos afirmado.
Como dθ é globalmente definida, podemos integrá-la em M e usar o
teorema de Stokes
Z Z
0= dθ = (2H 0 + y3 J) ω1 ∧ ω2 . (3)
M M

A expressão (3) é chamada a fórmula integral de Herglotz, e é uma das


informações geométricas que necessitamos para demonstrar o Teorema 1.
A fórmula (3) é válida, em particular, quando M = M 0 , donde
Z
(H + y3 K) ω1 ∧ ω2 = 0. (4)
M

(Muitas vezes o nome de fórmula integral de Minkowski é atribuido à ex-


pressão (4), que vale para qualquer superfı́cie compacta de R 3 ). Subtraindo
(3) de (4), obtemos
Z Z
0
2 (H − H) ω1 ∧ ω2 = y3 det(de3 − de03 ) ω1 ∧ ω2 . (5)
M

Necessitamos do seguinte lema de álgebra linear.


Lema 1. Sejam A e B matrizes 2 × 2, simétricas e semi-definidas (isto
é, os valores próprios de A e B são ≥ 0). Suponhamos que det A = det B.
Então:

(1) det(A − B) = α ≤ 0

(2) Se, em adição, A e B são definidas (isto é, os valores próprios são
> 0), a igualdade em (1) ocorre se e só se A = B.

(3) Se A e B são semi-definidas e a igualdade ocorre em (1), então A e


B são proporcionais (onde o coeficiente de proporcionalidade pode ser
zero).

Demonstração: Podemos supor que a matriz A está diagonalizada, isto é,


   0 0
a 0 a b
A= , B= .
0 c b0 c 0

Então, como det A = det B,

ac = a0 c0 − (b0 )2 ,
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 93

α = det(A − B) = (a − a0 )(c − c0 ) − (b0 )2


= ac − ac0 − a0 c + a0 c0 − (b0 )2 = 2ac − ac0 − a0 c.

Observe também que, como A e B são semi-definidas e det A = det B,


teremos que a, c, a0 , c0 ≥ 0.
Para demonstrar (1), consideraremos os seguintes casos:
a) a = c = 0. Então α = 0.
b) a 6= 0, c = 0. Então α = −ac0 ≤ 0.
c) a = 0, c 6= 0. Então α = −a0 c ≤ 0.
d) a 6= 0, c 6= 0. Neste caso, escreveremos
¡ a0 c0 − (b0 )2 ¢
α = (a − a0 )(c − c0 ) − (b0 )2 = − a0 (c − c0 ) − (b0 )2
c
¡ a0 c 0 ¢ (b0 )2
= − a0 (c − c0 ) − (c − c0 ) − (b0 )2
c c
1 c0
= − (a0 c − a0 c0 )(c − c0 ) − 2(b0 )2 + (b0 )2
c c
0 0 2
1 0 a (c )
= − (a c − a0 c0 )(c − c0 ) − 2(b0 )2 + − ac0 .
c c
Se a0 = 0, então α = −2(b0 )2 − ac0 ≤ 0. Se a0 6= 0 e c0 = 0, então
a0
α=− (c − c0 )2 − 2(b0 )2 ≤ 0.
c
Finalmente, se a0 6= 0 e c0 6= 0, teremos
¡ ac + (b0 )2 ¢
α = (a − a0 )(c − c0 ) − (b0 )2 = a − (c − c0 ) − (b0 )2
c
¡ ac ¢ (b0 )2
= a − 0 (c − c0 ) − 0 (c − c0 ) − (b0 )2
c c
a c
= − (c − c0 )2 − 0 (b0 )2 ≤ 0,
c c
o que conclui a demonstração da parte (1) do lema.
Para demonstrar (2), observe que se A e B são definidas, a, c, a0 , c0 são
positivos. Usando a última expressão do caso (d) de (1), teremos que
a c
0=α=− (c − c0 )2 − 0 (b0 )2 .
c0 c
Portanto α = 0 implica em que c = c0 e b0 = 0, i.e., A = B.
Para demonstrar (3), consideraremos os seguintes casos:
94 Unicidade de hipersuperfı́cies. O Teorema de Cohn-Vossen. Seção 2.2

a) a = c = 0. Então o coeficiente de proporcionalidade é zero.


b) a 6= 0, c = 0. Então α = −ac0 = 0 implica c0 = 0. Como det A =
det B, teremos (b0 )2 = ac = 0, donde b0 = 0. Se a0 =
6 0, B = λA, com
λ = aa0 · Se a0 = 0, B = λA, com λ = 0.
c) a = 0, c 6= 0. Este caso é inteiramente análogo ao caso anterior.
d) a 6= 0, c 6= 0. Este caso é tratado como o caso (d) de (1). Por exemplo,
se a0 6= 0 e c0 6= 0, teremos,
a c
0=α=− (c − c0 )2 − 0 (b0 )2 ,
c0 c
donde, c = c0 e b0 = 0. Como det A = det B, temos que ac = a0 c0 =
a0 c, isto é, a = a0 .
Portanto, se a0 6= 0 e c0 6= 0, teremos A = B. As outras situações são
tratadas de maneira análoga, e isto conclui a demonstração do Lema 1.

Voltemos à demonstração do Teorema. Escolha a origem de R 3 no inte-


rior do corpo convexo limitado por M . Então, y3 > 0 e, pela parte (1) do
Lema 1, o segundo membro de (5) é não positivo. Portanto,
Z
(H 0 − H) ω1 ∧ ω2 ≤ 0.
M

Por simetria, devemos ter também


Z
(H − H 0 ) ω1 ∧ ω2 ≤ 0.
M

Portanto, o segundo membro de (5) é zero. Como y3 > 0, concluı́mos que


det(de3 − de03 ) = 0.
Suponha agora que K > 0. Pela parte (2) do Lema 1, teremos que
de2 = de03 , donde a = a0 , b = b0 , c = c0 , o que prova o teorema no caso em
que K > 0.
Para demonstrar o Teorema no caso em que K ≥ 0, observe que det(de3 −
de03 ) = 0 para todo q ∈ M , e que de3 = de03 nos pontos onde K 6= 0. Seja
p ∈ M , com K(p) = 0. Precisamos mostrar que de3 = de03 em p (observe
que e03 está sendo usado para representar e03 ◦ f ).
Se p é ponto de acumulação de pontos onde K 6= 0, a igualdade se
verifica em p por continuidade. Podemos portanto supor que existe uma
vizinhança W de p, onde todos os pontos têm K = 0. Convém indicar por
Um o conjunto dos pontos de M onde a segunda forma quadrática tem posto
m e por p0 = f (p).
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 95

Se p ∈ U0 e p0 ∈ U00 , então de3 = 0 = de03 . Portanto, podemos supor


que, por exemplo, p ∈ U1 , e que W foi escolhida de tal modo que W ⊂ U1 .
Pelo lema de Chern-Lashof, por p passa um segmento de reta L. Como M
é compacto, M ∩ L tem pontos na fronteira, digamos q1 e q2 . Pela parte
(3) do Lema 1, para todo q ∈ L IIq = λ IIf (q) . Como L é totalmente
geodésica, L0 = f (L) também é totalmente geodésica. Portanto, L0 é um
segmento de reta de extremidades q10 = f (q1 ) e q20 = f (q2 ). Além disso, pelo
lema de Chern-Lashof, q1 ∈ U1 , q2 ∈ U1 , e, como são pontos da fronteira de
L, são ambos pontos de acumulação de pontos de U2 . Portanto a igualdade
de3 = de03 vale em q1 e q2 . Decorre daı́ que q10 , q20 ∈ U10 . É claro que os
pontos r10 e r20 em L0 suficientemente próximos de q10 e q20 , respectivamente,
são ainda pontos de U10 . Pelo lema de Chern-Lashof, passam por r10 e r20
segmentos de reta que, por unicidade, coincidem com L0 . Decorre daı́ que
p0 ∈ U10 .
Para concluir, precisamos do seguinte lema, que é uma versão do lema
de Chern-Lashof para dimensão dois.
Lema 2. Seja x : M 2 → R3 uma imersão isométrica de uma variedade M
de dimensão dois. Seja p ∈ U1 ⊂ M e W uma vizinhança de p em M tal
que W ⊂ U1 . Seja L o segmento de reta passando por p, que é dado pelo
lema de Chern-Lashof. Seja s o comprimento de arco de L, a partir de uma
certa origem, e seja λ(s) o valor próprio não nulo de II em s. Então

d2 ¡ 1 ¢
= 0.
ds2 λ

Demonstração: Escolha um referencial e1 , e2 , e3 e, W de modo que ao



longo de L, e1 seja tangente a L, isto é, e1 = ∂s · Como L é uma geodésica
ω12 (e1 ) = 0, e portanto
ω12 = A ω2 , (6)
onde A é uma função diferenciável em W . Como L é totalmente geodésica,

ω13 = h11 ω1 + h12 ω2 = 0,

isto é, h11 = h12 = 0. Decorre daı́ que

ω23 = h21 ω1 + h22 ω2 = λ ω2 ,

onde λ = h22 é o valor próprio não nulo da segunda forma quadrática.


Usando as equações de estrutura e (6) obteremos

0 = ω21 ∧ ω13 = dω23 = dλ ∧ ω2 + λ ∧ dω2


= dλ ∧ ω2 + λ ω1 ∧ ω12 = (dλ + A λ ω1 ) ∧ ω2 ,
96 Unicidade de hipersuperfı́cies. O Teorema de Cohn-Vossen. Seção 2.2

ou seja

+ Aλ = 0.
ds
Diferenciando exteriormente (6) e usando as equações de estrutura dω2 =
ω1 ∧ ω12 , dω12 = −K ω1 ∧ ω2 , obteremos, ao longo de L,
¡ dA ¢
0 = −K ω1 ∧ ω2 = dω12 = dA ∧ ω2 + A dω2 = + A 2 ω1 ∧ ω 2 .
ds
Portanto,
d2 λ dλ dA 1 ¡ dλ ¢2
2
=− A−λ = 2λA2 = 2 .
ds ds ds λ ds
donde 2 ¡ dλ ¢2
d2 ¡ 1 ¢ λ d λ2 − 2
2
= − ds ds
= 0,
ds λ λ3
como querı́amos.
Podemos agora concluir a demonstração do Teorema 1. Como p0 ∈ U10
e, pelo Lema 2, λ1 e λ10 são lineares ao longo de L e L0 , respectivamente,
podemos escrever
1 1
λ(s) = , λ0 (s) = ,
As + B A0 s + B 0
onde, como f é uma isometria, s é o comprimento de arco comum a L e
L0 . Podemos supor que s = 0 corresponde a q1 ; então q2 corresponde a
s = ` = comp. L. Como λ(0) = λ0 (0) e λ(`) = λ0 (`), concluı́mos que
λ(s) = λ0 (s). Decorre daı́ que de3 = de03 ao longo de L, em particular, em
p, como querı́amos mostrar.
Observação 2: O Teorema de Cohn-Vossen é a parte da unicidade do
famoso problema de H. Weyl: Provar que toda variedade riemaniana de
dimensão dois, compacta e com curvatura K > 0 pode ser isometricamente
imersa em R3 . Para o caso em que a variedade e a métrica são analı́ticas,
este problema foi resolvido por H. Weyl e H. Lewy. O caso C ∞ foi re-
solvido por A. Alexandroff e A.V. Pogorelov. Em verdade, motivado por
este problema, Alexandroff iniciou o estudo das superfı́cies convexas sem
diferenciabilidade, e desenvolveu uma série de técnicas que constituem a
marca registrada de um grupo de geômetras russsos, e que permitiram re-
solver o problema de Weyl em uma grande generalidade. O Teorema 1
afirma simplesmente que, uma vez obtida uma tal imersão diferenciável, ela
é única a menos de um movimento rı́gido. A prova de Cohn-Vossen reque-
ria analiticidade e K > 0. A prova acima é uma apresentação de S. Chern
de um argumento devido a Herglotz. Uma exposição detalhada, e com re-
ferências, dos fatos acima mencionados pode ser encontrada no excelente
artigo de Efimov [Ef].
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 97

Observação 3: Existem superfı́cies compactas em R 3 que não são determi-


nadas por suas métricas induzidas. Um exemplo simples é dado

perfil de S1

perfil de S 2

eixo de rotação

pelas duas superfı́cies de revolução S1 e S2 da figura acima. S1 é obtida


de uma superfı́cie convexa de revolução com uma parte plana, retirando a
parte plana e substituindo-a por um “bulbo” saliente; para S2 , substitui-se a
parte plana pelo “bulbo” simétrico. Desta maneira S1 e S2 são isométricas,
porém não existe um movimento rı́gido de R3 que leve S1 em S2 . Deve
ser observado que este exemplo não é analı́tico e é um problema em aberto
saber se toda superfı́cie compacta analı́tica é determinada por sua métrica
induzida. A. Alexandroff resolveu este problema afirmativamente para uma
certa classe de superfı́cies (que inclui as superfı́cies difeomorfas a um toro)
chamadas as T -superfı́cies. (Para detalhes, V. o artigo de Efimov [Ef] acima
citado).
Observação 4: É um problema em aberto caracterizar as superfı́cies C ∞
compactas de R3 que são determinadas pela métrica induzida. Para o caso
em que a superfı́cie tem o tipo topológico do toro e satisfaz certas condições
bastante técnicas, uma solução foi obtida por Nirenberg [Ni]. Tais condições
são satisfeitas para o toro de revolução, que, portanto é determinado por
sua métrica induzida.
Observação 5: No caso não compacto, o nosso conhecimento é ainda mais
precário. Recentemente (1971), R. Greene e H. Wu ([GrWu]) demonstraram
que o teorema de Cohn-Vossen continua válido se retirarmos de M 2 (com-
pacta, conexa, orientável e de curvatura K ≥ 0) um número finito de pon-
tos. A prova deste resultado é extremamente delicada. Em outra direção,
Pogorelov [Po] demonstrou que se M 2 é completa, não compacta, com K ≥ 0
98 Unicidade de hipersuperfı́cies. O Teorema de Cohn-Vossen. Seção 2.2

R
e M K dMR = 2π (pelo teorema de Sacksteder citado na Observação da
Seção 2.1, M K dM ≤ 2π) então duas imersões isométricas de M 2 diferem
por um movimento rı́gido. Por outro R lado, Olowjanischnikow demonstrou,
nas mesmas condições acima, que se M K dM < 2π, então existem imersões
isométricas de M 2 que não diferem por um movimento rı́gido. Para uma
demonstração simples do resultado de Pogorelov no caso C ∞ ver Saksteder
[Sa 2].
Observação 6: O Teorema de Cohn-Vossen se estende para as hiper-
superfı́cies da esfera que possuem curvaturas seccionais maiores que a do
espaço ambiente. Para uma demonstração V. M. do Carmo e F. Warner
[dCWa];
Em geral, os problemas de unicidade estão historicamente ligados a
problemas de rigidez e rigidez infinitesimal. Por completação, daremos as
definições relevantes. M será uma variedade de dimensão dois, conexa e
orientável.
Uma deformação de uma imersão x : M → R3 é uma aplicação dife-
renciável F : [0, 1] → R3 , tal que, indicando ft (p) = F (t, p), t ∈ [0, 1],
p ∈ M , as seguintes condições sejam satisfeitas:
1) f0 = x,
2) ft é uma imersão para todo t ∈ [0, 1],
3) hdft (X), dft (Y )i = hdx(X), dx(Y )i, para todo par X, Y ∈ Tp (M ) e
todo t ∈ [0, 1].
Uma deformação de x é trivial se, para todo t, ft = At ◦ x, onde At é um
movimento rı́gido de R3 . A imersão x é rı́gida se toda deformação de x é
trivial; no caso contrário, x é deformável.
Uma versão infinitesimal da situação acima é motivada pelas considera-
ções seguintes. Suponhamos que x seja uma inclusão. Então a condição (3)
se escreve
hX, Y i = hdft (X), dft (Y )i.
Se indicarmos por Zt o vetor tangente à curva t → ft (p), em t, teremos
d
0= hdft (X), dft (Y )i = Zt hdft (X), dft (Y )i.
dt
Portanto, em t = 0,

0 = ZhX, Y i = hdZ(X), Y i + hX, dZ(Y )i, (7)

para todo X, Y ∈ Tp (M ), onde Z = Z0 : M → R3 é uma aplicação diferen-


ciável. Z(p) é chamada o vetor deformação de F em p. A equação (7) é
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 99

equivalente a

hdZ(X), Xi = 0, para todo X ∈ Tp (M ). (8)

Portanto, um campo de vetores Z : M → R3 que satisfaz (8) pode ser


pensado como a “derivada” de uma deformação. No caso em que x não é
uma inclusão, terı́amos que escrever, no lugar da equação (8),

hdZ(X), dx(X)i = 0, para todo X ∈ Tp (M ),

ou seja,
hdZ, dxi = 0. (9)
Isto motiva a seguinte definição. Um campo diferenciável de vetores
Z : M → R3 é uma deformação infinitesimal de x se (9) é verificada.
O significado preciso da condição (9) é obtido da maneira seguinte. A
métrica da deformação x + tZ de x é dada por

hdx + tdZ, dx + tdZi = hdx, dxi + 2thdZ, dxi + t2 hdZ, dZi.

Para que a diferença entre esta métrica e a métrica hdxdxi de x seja de


ordem maior ou igual a dois, é necessário e suficiente que hdZ, dxi = 0.
Assim (9) significa que a deformação dada por Z preserva a métrica em
primeira ordem.
Voltemos às considerações que motivaram a definição de deformação
infinitesimal. Se F é uma deformação trivial de x, então ft = At ◦ x, isto é
(supondo ainda x uma inclusão),

ft (p) = Ot (p) + at ,

onde Ot é uma matriz ortogonal de determinante positivo com O0 = ident.,


e at é um vetor (translação) de R3 com a0 = 0. Decorre daı́ que
¯ ¯
dft ¯¯ d ¯
Z(p) = = (Ot )¯¯ p + a00 = O00 + a00 .
dt ¯t=0 dt t=0

Como Ot é uma matriz ortogonal (Ot Ot∗ = ident.), a derivada 00t satisfaz

Ot0 · Ot∗ + Ot (Ot∗ )0 = 0,

donde, como O0 = ident., temos em t = 0

O00 + (O00 )∗ = 0,

isto é, O00 é uma matriz antisimétrica.


Isto motiva as seguintes definições.
100 Posto e número tipo de uma imersão Seção 2.3

Uma deformação infinitesimal Z de uma imersão x é trivial se Z(p) =


B(x(p)) + ω, onde B é uma matriz antisimétrica e ω ∈ R3 . A imersão x
é infinitesimalmente rı́gida se toda deformação infinitesimal é trivial; caso
contrário, x é infinitesimalmente deformável.
Para completar estas definições, diremos que uma imersão x : M → R 3
é única se dada qualquer outra imersão x0 : M → R3 que determina em
M a mesma métrica induzida que x, então x(M ) e x0 (M ) diferem por um
movimento rı́gido de R3 , seguido eventualmente de uma simetria.
É claro que unicidade implica em rigidez. A situação das outras possı́veis
implicações é ainda bastante obscura. Mencionaremos brevemente alguns
resultados.
Vamos enunciar alguns fatos cujas demonstrações podem ser encon-
tradas em Spivak ([Sp], Vol. V, Cap. 12). O parabolóide z = x2 + y 2
é infinitesimalmente deformável. Entretanto, pelo Teorema de Pogorelov
citado na Observação 5 (note que a integral da curvatura Gaussiana es-
tendida ao parabolóide é igual a 2π), ele é único, donde rı́gido. Portanto,
rigidez não implica em rigidez infinitesimal. Por outro lado, embora seja
um fato plausı́vel (V. Spivak, [Sp], Vol. V, pag. 257), não se sabe se rigidez
infinitesimal implica em rigidez.
A conjectura fundamental nesta ordem de idéias, uma das mais antigas
e difı́ceis conjecturas da Geometria Diferencial, parece ser a seguinte: Toda
superfı́cie compacta C ∞ em R3 é rı́gida.

2.3 Posto e número tipo de uma imersão. Redução de


codimensão. As formas de ordem superior de uma
imersão
Nesta seção iniciaremos o estudo mais detalhado das imersões x : M n →
Qn+q (c) de curvatura constante c. Usaremos as convenções de ı́ndices e as
notações da Seção 1.9.
Em todo ponto p ∈ M , está definida uma aplicação bilinear Bp :
Tp (M )×Tp (M ) → Np (M ) (V. Seção 1.9). A imagem Bp (Tp (M )×Tp (M )) =
(N1 )p ⊂ Np (M ) é chamado o primeiro espaço normal da imersão em
p. A dimensão de (N1 )p é chamada o posto r(p) de x em p. O espaço
Tp (M ) ⊕ (N1 )p é chamado o primeiro espaço osculador de x em p, e gene-
raliza a noção de plano osculador de uma curva em R 3 . Neste contexto, o
primeiro espaço normal generaliza a noção de normal principal a uma curva
em R3 .
É imediato verificar que o primeiro espaço normal (N1 )p é caracterizado
da maneira seguinte:
© ª⊥
(N1 )p = ν ∈ Np (M ); Aνp = 0 ,
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 101

onde ( )⊥ indica o complemento ortogonal do espaço em questão. Decorre


daı́ que r(p) = dim(N1 )p ≤ n(n+1)
2 ·
Uma outra caracterização de (N1 )p é obtida observando primeiro que
(N1 )p é gerado por Bp (X, X), |X| = 1, X ∈ Tp (M ), e que hBp (X, X), νi =
hIIpν (X), Xi para todo ν ∈ Np (M ). Como, por outro lado, IIpν (X) é a
projeção sobre ν do vetor curvatura geodésica em Q de uma curva em
M passando por p e tangente a X, concluı́mos que (N1 )p é gerado pelas
projeções sobre Np (M ) dos vetores curvaturas geodésicas em Q de todos as
curvas de M que passam por p.
Um caso particular extremamente interessante é quando x : M 2 → Q4 .
Neste caso, fazendo X = v ∈ Tp (M ), |v| = 1, teremos X = cos θ e1 +sen θ e2 .
Portanto, indicando por Hp o vetor curvatura média em p, obtemos (i, j =
1, 2; α = 3, 4)
X©X 1 X αª
Bp (X, X) − Hp = hα
ij ωi (X)ωj (X) − h eα
α ij
2 i ii
X¡ hα hα ¢
11
= hα 2 α 2
11 cos θ+2h12 sen θ cos θ+h22 sen θ− − 22 eα
α
2 2
X ¡ hα − h α µ ¶
11 22
¢ cos 2θ
= cos 2θ + hα
12 sen 2θ e α = L ,
2 sen 2θ
α

onde L é a matriz dada por


1 
(h311 − h322 ) h312
2 
L=

.

1 4
(h − h422 ) h412
2 11

Decorre daı́ que a aplicação (Bp − Hp ) restrita ao cı́rculo unitário de


Tp (M ) é a restrição de uma transformação linear de Tp (M ) em Np (M ),
obtida como a composição de uma rotação de ângulo θ com uma trans-
formação linear cuja matriz nas bases {e1 , e2 } de Tp (M ) e {e3 , e4 } de Np (M )
é L. Portanto, a imagem por Bp − Hp do cı́rculo unitário de Tp (M ) é uma
elipse chamada a indicatriz normal de x : M 2 → Q4 . É claro que o cen-
tro desta elipse é o vetor curvatura média de x e não é difı́cil verificar que
ela fica inteiramente determinada pela curvatura Gaussiana K de M 2 e
pela curvatura normal KN da imersão (a curvatura normal de uma imersão
x : M 2 → Q4 é definida por dω34 = −KN ω1 ∧ ω2 ).
Para maiores detalhes sobre a indicatriz normal e sua generalização para
n > 2, V. J. Little [Lit].
102 Posto e número tipo de uma imersão Seção 2.3

Voltemos ao caso geral x : M n → Qn+q . Um outro invariante importante


de x é o número tipo que é um inteiro definido da seguinte maneira. Seja
p ∈ M e escolha, em uma vizinhança de p, um referencial {eA } adaptado
a x tal que en+1 , . . . , en+r em p gere (N1 )p . Considere a n × r submatriz
(ωiµ ), µ = n + 1, . . . , n + r, das formas de conexão (ωAB ). O número tipo
τ de x em p é o número máximo de linhas de (ωiµ ) tal que as τ r-formas
destas linhas sejam linearmente independentes. Não é difı́cil verificar que
τ não depende do referencial escolhido. Se a codimensão q = 1, τ coincide
com o posto da segunda forma quadrática em p.

As definições apresentadas até agora podem ser estendidas a uma imersão


n+q n+q
x: Mn → M de M n em uma variedade riemaniana qualquer M . No
que se segue, vamos estudar o problema de redução de codimensão de uma
imersão, o que só fará sentido se o espaço “ambiente” possuir um número
razoavelmente grande de subvariedades totalmente geodésicas. Como men-
cionamos na Seção 1.9, o espaço Qn+q (c) satisfaz a esta condição.
Diremos que uma imersão x : M n → Qn+q (c) de uma variedade conexa
M em um espaço Qn+q (c) de curvatura constante c é substancial se x(M )
não está contida em alguma subvariedade totalmente geodésica de Qn+q . O
problema de redução de codimensão de uma dada imersão x : M n → Qn+q
é obter um inteiro d, 1 ≤ d ≤ q, tal que a imersão x : M n → Qn+d seja
substancial. Em outras palavras, procura-se saber que parte do espaço
ambiente Qn+q pode ser desprezada sem afetar a imersão x.
O lema fundamental para tratar o problema de redução de codimensão
é a seguinte observação de E. Cartan ([Ca 2], pg. 371).

Lema 1. Se x : M n → Qn+q (c) uma imersão, p ∈ M e U ⊂ M uma


vizinhança de p tal que x|U seja injetiva. Suponha que existe um inteiro 1 ≤
d ≤ q, e um referencial {eA } adaptado a x em uma vizinhança V ⊃ x(U ) de
x(p) em Qn+q , de tal modo que ωrA = 0, para todo r = n + d + 1, . . . , n + q,
e todo A = 1, . . . , n + q. Então, se U é conexa, x(U ) está contida em uma
subvariedade totalmente geodésica Qn+d ⊂ Qn+q .

Demonstração: Suponhamos primeiro c 6= 0 e consideremos Qn+q (c) ⊂


E n+q+1 (ou em Rn+q+1 se a curvatura c é positiva), como na Seção 1.11.
Estenda o referencial {eA } de modo a incluir o vetor en+q+1 que descreve
Qn+q em E n+q+1 . Então, em U ,
n
X X
dx = ωi ei = d en+q+1 = ωn+q+1,A eA .
i=1 A

Decorre daı́ que ωn+q+1,i = ωi e ωn+q+1,α = 0, α = n + 1, . . . , n + q.


Seja fr : U → R definida por fr (p) = (x(p), (er )p ), p ∈ U onde ( , ) é o
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 103

produto interno em E n+q+1 . Então


¡ X ¢
dfr = (dx, er ) + (x, der ) = x, ωrA eA + ωr,n+q+1 en+q+1 .
A

Por hipótese, ωrA = 0, e pela construção do referencial, ωr,n+q+1 = 0, pois


X
hden+q+1 , er i = 0 = hωn+q+1,A eA , er i = ωn+q+1,r .
A

Isto mostra que der = 0, isto é, er é um vetor constante, e dfr = 0. Como
U é conexa, fr = const. Isto significa que x(U ) está contida em um hiper-
plano de E n+q+1 , perpendicular a er , para todo r = n + d + 1, . . . , n + q .
Como a intersecção de um tal hiperplano com Qn+q é uma subvariedade
totalmente geodésica de Qn+q , e os vetores er são linearmente indepen-
dentes, concluı́mos que x(U ) está contida em uma subvariedade totalmente
geodésica de Qn+q de dimensão (n + q) − (q − d) = n + d.
No caso em que c = 0, isto é, Qn+q (c) = Rn+q , não há necessidade
de imergir Rn+q em um espaço auxiliar, e a demonstração é análoga (em
verdade, mais simples).

Nas demonstrações que se seguem, será conveniente separar, como acima,


o caso c 6= 0, para o qual é conveniente utilizar o espaço auxiliar E N +1 (se
c < 0) ou RN +1 (se c > 0). Para evitar repetições, não faremos mais
menção do caso c = 0, onde as demonstrações são análogas e, em verdade,
mais simples.

Para as proposições seguintes, precisamos de algumas definições que são


n+q
válidas no contexto mais geral de uma imersão x : M n → M em uma
variedade riemaniana arbitrária M .
n+q
Seja x : M n → M . O conjunto dos pares (p, ν) onde p ∈ M e ν ∈
Np (M ) = {dxp (Tp (M ))}⊥ é chamado o fibrado normal da imersão x e
indicado por N (M ).
Um subfibrado normal N e de N (M ) é a escolha para cada p ∈ M de um
e
subespaço Np ⊂ Np (M ), de tal modo que exista uma vizinhança U de p em
M e k campos diferenciáveis de vetores normais νi , i = 1, . . . , k, definidos
em x(U ), linearmente independentes, e que geram N eq para todo q ∈ U .
Diz-se então que N e é gerado localmente pelos campos normais νi , que são
chamados as secções locais de N e em U . O inteiro k é chamado a dimensão
de N e e representa a dimensão constante da fibra N ep , para todo p ∈ M . Diz-
se que um campo de vetores normais η pertence a N e , e se escreve η ∈ N
e , se
e
η(p) ∈ Np , para todo p ∈ M .
Diz-se que um subfibrado normal N e é paralelo na conexão normal se
para todo campo diferenciável de vetores normais η ∈ N e e todo campo
104 Posto e número tipo de uma imersão Seção 2.3

diferenciável de vetores tangentes X, tem-se que ∇⊥ e e


X η ∈ N , isto é, N é
invariante pela derivação covariante normal.
Dado um subfibrado normal N e de dimensão q − d de uma imersão
n n+q
x: M → M , é conveniente introduzir referenciais da maneira seguinte.
Vamos modificar ligeiramente a nossa convenção de ı́ndices e escrever:

1 ≤ i, j, k ≤ n; n + 1 ≤ α, β, γ ≤ n + d; n + d + 1 ≤ r, s, t ≤ n + q;
1 ≤ A, B, C ≤ n + q. (1)

Dado p ∈ M , escolheremos um referencial local {eA } adaptado a x


de modo que os vetores en+d+1 , . . . , en+q geram N e . Diremos então que o
referencial é adaptado a x e a N .e
É possı́vel definir a curvatura normal de um subfibrado N e do seguinte
modo. Como na Seção 1.9, é possı́vel mostrar que as formas
X
e rs = dωrs −
Ω ωrt ∧ ωts
t

mudam, por uma mudança de referencial adaptado a x e N e , como a matriz


de uma transformação linear. Portanto, para cada p ∈ M e cada par X, Y ∈
Tp (M ), é possı́vel definir um operador de curvatura (ReXY ) : Nep → N ep da
p
maneira usual. O correspondente tensor R e é chamado o tensor curvatura
e e
de N , e as formas Ωrs são as formas de curvatura de N e no referencial {eA }.

Lema 2. Seja x : M n → Qn+q (c) uma imersão e seja N e um subfibrado nor-


mal de dimensão q − d. Suponhamos que a curvatura de N e seja nula. Então
para todo p ∈ M é possı́vel escolher um referencial local {eA } adaptado a x
eaN e de modo que ωrs = 0, para todo r, s.

Demonstração: Como no Lema 1, tome Qn+q (c) ⊂ E n+q+1 (ou Rn+q+1


se c for positivo). Considere o conjunto das bases ortonormais e1 , . . . ,
en+q+1 de E n+q+1 , isto é, das bases que satisfazem:

1
(eA , eB ) = δAB , (eA , en+q+1 ) = 0, (en+q+1 , en+q+1 ) = ·
c
Diremos que uma base ortonormal b = {eA , en+q+1 } em x(p), p ∈ M , é
adaptada a x e a Ne se dada uma vizinhança U ⊂ M de p onde x é injetiva,
as seguintes condições são satisfeitas:

a) e1 , . . . , en são tangentes a x(U ) em x(p), e en+1 , . . . , en+q são normais


a x(U ) em x(p).
ep .
b) en+d+1 , . . . , en+q ∈ N
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 105

c) en+q+1 descreve Qn+q .


eM o conjunto dos pares (p, b), onde p ∈ M e b é uma base ortonor-
Seja B
mal em x(p) adaptada a x e a N e . Sejam ω̃A , ω̃AB as formas globais de
e
BM definidas como na Seção 1.10. (Como vimos na Seção 1.11 as formas
ω̃A,n+q+1 não aparecem explicitamente). As formas ω̃rs definem em B eM
uma distribuição no sentido do Teorema de Frobenius. Por hipótese,
X
dω̃rs = ω̃rt ∧ ω̃ts . (2)
t

Mas (2) é precisamente a condição para que a distribuição dada por ω̃ rs


seja integrável. Portanto, por cada ponto de B eM passa uma subvariedade
S, restrita a qual ω̃rs = 0. Observe que o espaço tangente de cada ponto de
S contém um subespaço T (precisamente aquele subespaço que anula todas
as formas da conexão normal) que é transversal ao espaço tangente da fibra
por aquele ponto. Então, dado p ∈ M , escolhemos um ponto da fibra sobre
p e passamos por este ponto uma subvariedade de S tangente a T . Como
T é transversal à fibra, os pontos desta subvariedade definem uma secção
de BeM em uma vizinhança U de p. Uma tal secção é um referencial em U
para o qual ωrs = 0.

Observação 1: O Lema 2 fornece um significado geométrico da curvatura


como uma obstrução a uma condição de integrabilidade. Da mesma maneira
se mostraria que as formas Ωij da curvatura da conexão tangente ωij são
nulas se e só se é possı́vel obter um referencial local adaptado {eA } de
modo que ωij = 0. Estas situações são casos particulares da noção geral
de conexão (derivação covariante) em um fibrado vetorial, à qual se associa
uma curvatura que é nula se e só se é possı́vel obter secções locais do fibrado
para as quais a conexão se anula.
Observação 2: Dado um subfibrado normal N e de uma imersão x : M n→
n+q
Q existem duas curvaturas a serem consideradas. A curvatura “intrı́n-
seca” de Ne definida acima (que é essencialmente a curvatura da conexão
ωrs induzida em N e , por Qn+q ) e a restrição da curvatura normal R⊥ aos
XY
campos pertencentes a N e . Estas duas curvaturas são em geral distintas.

Podemos agora enunciar alguns resultados sobre redução de codimensão.


Teorema 1 (Erbacher [Er]). Seja x : M n → Qn+q uma imersão. Supo-
nhamos que exista um inteiro d e um subfibrado normal N , de dimensão d,
que é paralelo na conexão normal e contém o primeiro espaço normal N 1
de x, isto é, N p ⊃ (N1 )p , para todo p ∈ M . Então existe uma variedade
totalmente geodésica Qn+d ⊂ Qn+q tal que x : M n → Qn+d . Além disto,
106 Posto e número tipo de uma imersão Seção 2.3

se d é o menor inteiro que satisfaz às condições acima, a imersão x é


substancial.
Demonstração: Sejam p um ponto de M e U uma vizinhança de p onde x
é injetiva. Considere em U um referencial {eA } adaptado a x e ao comple-
mento ortogonal N e de N em N (M ). Observe que N e tem dimensão q − d.
Como N é paralelo na conexão normal, N e também o é. O fato de ser N
e
paralelo na conexão normal significa que, para todo campo tangente X,

0 = h∇⊥
X es , eα i = ωsα (X), n + d + 1 ≤ s ≤ n + q, n + 1 ≤ α ≤ n + d,

isto é, ωsα = 0, para todo s e todo α. Como N contém N1 , II s = 0, isto é,
ωsi = 0, i = 1, . . . , n. Além disto, como ωsi = 0 e ωsα = 0, teremos
X X X X
dωsr = ωsi ∧ ωir + ωsα ∧ ωαr + ωst ∧ ωtr = ωst ∧ ωtr ,
i α t t

onde estamos usando ı́ndices como em (1). Decorre daı́ que


X
e sr = dωsr −
Ω ωst ∧ ωtr = 0,
t

e tem curvatura zero.


isto é, o fibrado N
Pelo Lema 2, podemos escolher o referencial de modo que ωrs = 0.
Portanto ωsA = 0. Pelo Lema 1, x(U ) ⊂ Qn+d , onde Qn+d é a intersecção
com Qn+q de uma subvariedade linear constante E 0 de E n+q+1 ⊃ Qn+q .
Portanto, o teorema é válido localmente.
Para globalizar o resultado, observe que na intersecção de duas tais
vizinhanças U e V , temos que x(U ∩ V ) ⊂ Qn+d ; isto decorre do fato que
a subvariedade linear E 0 é constante em M . Como M é conexa, segue-se o
resultado.
Finalmente, se d é o menor inteiro que satisfaz as condições do Teorema
1, é imediato que x é substancial.

Proposição 1. Seja x : M n → Qn+q uma imersão. Suponha que o primeiro


espaço normal de x tem dimensão constante igual a d e que o número tipo
τ satisfaz τ ≥ 2. Então existe uma variedade totalmente geodésica Qn+d ⊂
Qn+q tal que x : M → Qn+d e a imersão x é substancial.
Demonstração: Escolha um referencial local {eA } adaptado a x e ao com-
plementar Ne de N1 . Então ωis = 0, donde
X X X X
0 = dωis = ωij ∧ ωjs + ωiα ∧ ωαs + ωit ∧ ωts = ωiα ∧ ωαs . (2)
j α t α
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 107

Como τ ≥ 2, podemos supor que todas as formas ω1α , ω2α são linearmente
independentes. Portanto, de (2),

ωαs = comb. lin. ω1β ,


ωαs = comb. lin. ω2β ,

donde ωαs = 0. Decorre daı́ que N1 é paralelo na conexão normal, e a


Proposição decorre do Teorema 1.

Teorema 2. Seja x : M n → Qn+q uma imersão mı́nima. Suponha que a


curvatura normal de x seja nula e que o primeiro espaço normal N1 tenha
dimensão constante d. Então d ≤ n e existe uma variedade totalmente
geodésica Qn+d ⊂ Qn+q tal que x : M n → Qn+d , e x é substancial.
Demonstração: Que d ≤ n decorre imediatamente do fato que (V. Prop.
1, Seção 1.9) é possı́vel diagonalizar simultaneamente todas as segundas
formas quadráticas em cada ponto p ∈ M .
Para obter a redução de codimensão requerida, escolha um referencial
adaptado {eA } em uma vizinhança de um ponto p ∈ M de tal modo que
os primeiros d vetores da parte normal en+1 , . . . , en+d , . . . , en+q gerem N1 .
Então, usando ı́ndices como em (1), ωir = 0, e, por diferenciação exterior,
obteremos
X X X X
0 = dωir = ωij ∧ ωjr + ωiα ∧ ωαr + ωis ∧ ωsr = ωiα ∧ ωαr .
j α s α

Vamos mostrar que as formas ωαr são nulas em U . Para isto, seja
q ∈ U e modifique a parte tangente do referencial {eA } de modo que os
vetores (ei )q diagonalizem todas as segundas formas quadráticas em q. Isto
evidentemente não altera as formas ωαr e permite escrever ωiα = λα i ωi em
q, onde λα
i é o i-ésimo valor próprio de II α
q . Utilizando a expressão anterior,
obteremos, em q,
X ¡X α ¢
λαi ωi ∧ ωαr = − λi ωαr ∧ ωi = 0,
α α

isto é, para todo i existem números ci com


¡X α ¢
λi ωαr = ci ωi .
α

Decorre daı́ que, em q,


X
λα
i ωαr (ej ) = ei δij
α
108 Posto e número tipo de uma imersão Seção 2.3

e, portanto, indicando por Aν a aplicação correspondente a IIqν ,


¡X ¢ X
ci δij ei = λα
i ωαr (ej ) ei = ωαr (ej )λα
i ei
α α
P
X ωαr (ej )eα
α
=− ωαr (ej )A (ei ) = −A α (ei ).
α

Esta
P última expressão significa que a única direção própria de
ωαr (ej )eα
Aα (ei ) com valor próprio não nulo é ej com
P valor próprio −c⊥j .
Por minimalidade, cj = 0, para todo j. Portanto ωαr (ej )eα ∈ (N1 )q ,
α
isto é, pertence ao espaço gerado pelos er . Segue-se que ωαr (ej ) = 0, para
todo j, isto é, ωαr = 0 em q. Como q é arbitrário, ωαr = 0 em U .
Como ωαr = 0, N1 é paralelo na conexão normal e o resultado decorre
do Teorema 1.

A condição sobre a curvatura normal no Teorema 2 pode ser enfraque-


cida. Mais precisamente, temos o seguinte resultado.
Teorema 3 (do Carmo, Colares [dCCo]). Seja x : M n → Qn+q uma
imersão mı́nima. Suponha que a dimensão do primeiro espaço normal seja
constante e igual a d, e que a derivada covariante da curvatura normal
seja nula, isto é, ∇⊥ R⊥ ≡ 0. Então existe uma subvariedade totalmente
geodésica Qn+d ⊂ Qn+q tal que x : M n → Qn+d , e a imersão x é substan-
cial.
Antes de iniciar a demonstração convém estabelecer alguns lemas que
não dependem da condição de minimalidade.
Lema 3. Seja x : M n → Qn+q uma imersão. Então ∇⊥ R⊥ ≡ 0 se e
somente se para todo p ∈ M , todo X, Y, Z ∈ Tp (M ), e todo ξ, η ∈ Np (M )
tem-se que £ ¤
h Aξ(t) , Aη(t) X(t), Y (t)i = const.
onde X(t), Y (t), ξ(t), η(t) são os transportes paralelos de X, Y , ξ, η,
respectivamente, ao longo de uma curva α : (−ε, ε) → M , com α(0) = p,
α0 (0) = Z.
Demonstração: Suponha que
£ ¤
f (t) = h Aξ(t) , Aη(t) X(t), Y (t)i = const.

Como Qn+q tem curvatura constante, segue da fórmula de Ricci (Cf. (7’)
da Seção 1.9) que

f (t) = hR⊥ (X(t)Y (t) ξ(t), η(t)i = const.


Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 109

Portanto, usando a definição de derivada covariante de um tensor da Seção


1.7, teremos

∇⊥ ⊥
Z R (X(t), Y (t), ξ(t), η(t))
df
= ZhR⊥ (X(t)Y (t))ξ(t), η(t) = = 0,
dt
pois ∇⊥ ⊥ ⊥ ⊥
Z X(t) = ∇Z Y (t) = ∇Z ξ(t) = ∇Z η(t) = 0. Como p e X, Y , ξ, η
⊥ ⊥
são arbitrários, teremos que ∇ R ≡ 0. Para a recı́proca, basta percorrer
o argumento em sentido contrário.

Lema 4. Seja x : M n → Qn+q © uma imersão, eξ suponha que ∇⊥ R⊥ ≡ 0.


e η
Para todo q ∈ M seja Nq = ξ ∈ Nq (M ); h[A , A ]X, Y i = 0, para todo
ª
e é um subfibrado normal que é
η ∈ Nq (M ) e todo X, Y ∈ Tq (M ) . Então N
paralelo na conexão normal.
Demonstração: Seja p ∈ M . Escolha, em uma vizinhança normal U ⊂ M
de p, uma base ortonormal e1 , . . . , en em Tp (M ) e uma base ortonormal
en+1 , . . . , en+q em Np (M ), de modo que en+d+1 , . . . , en+q ∈ N ep . Trans-
porte a base {eA } paralelamente ao longo das geodésicas radiais (os vetores
tangentes na conexão tangente e os vetores normais na conexão normal),
obtendo assim um referencial (que indicaremos ainda por {eA }) adaptado
a x.
Como (er )p ∈ N ep , temos que h[Ar , Aη ]X, Y i = 0, para todo X, Y ∈
p
Tp (M ) e todo η ∈ Np (M ). Observe que se q ∈ U , qualquer vetor de
Tq (M )⊕Nq (M ) é o transporte paralelo de um único vetor de Tp (M )⊕Np (M )
(basta tomar vetores que têm as mesmas coordenadas no referencial {e A }).
Pelo Lema 3, h[Ar , Aη ]X, Y iq = 0, para todo q ∈ U , todo X, Y ∈ Tq (M )
e todo η ∈ Nq (M ). Portanto, er ∈ N eq , para todo r e todo q ∈ U . Pela
mesma razão, eα ∈ e
/ Nq , para todo α e todo q ∈ U .
Decorre daı́ que N e é localmente gerado pelos er . N e é, portanto, um
subfibrado normal, e o referencial {eA } em U é adaptado a x e N e.
e
Finalmente, para mostrar que N é paralelo na conexão normal, seja
ξ∈N e . Como Qn+1 tem curvatura constante, R⊥ ξ = 0, para todo par de
XY
campos tangentes X, Y . Como ∇Z R⊥ ≡ 0, para todo campo tangente Z,
teremos pela Seção 1.7, ∇⊥ ⊥ ⊥ ⊥ ⊥ e
Z (RXY ξ) = RXY (∇Z ξ) = 0, isto é, ∇Z ξ ∈ N , o
que prova o afirmado.

Demonstração do Teorema 3: Escolha um referencial adaptado {eA }


em uma vizinhança U de um ponto p ∈ M de tal modo que os primeiros d
e o subfi-
vetores en+1 , . . . , en+d da parte normal de {eA } geram N1 . Seja N
⊥ e
brado normal do Lema 4. Como (N1 ) ⊂ N , os vetores en+d+1 , . . . , en+q ∈
110 Posto e número tipo de uma imersão Seção 2.3

Ne . Podemos supor que a dimensão de N


e é q − ρ, onde ρ < d; caso contrário,
e ⊥
N = (N1 ) , e o Teorema decorre imediatamente do Lema 4 e do Teorema
1. Escolheremos os ı́ndices da maneira seguinte

1 ≤ i, j, k ≤ n, n + 1 ≤ α, β, γ ≤ n + ρ, n + ρ + 1 ≤ µ, ν, λ ≤ n + d,
n + d ≤ r, s, t ≤ n + q.

Como N e tem dimensão q − ρ, o complemento ortogonal em N (M ) do


espaço gerado pelos vetores er , isto é, N1 , contém um subespaço de di-
mensão d − ρ que está contido em N e . Portanto, é possı́vel escolher os
vetores eµ de N1 de modo que eµ ∈ N . e
Será conveniente acompanhar a demonstração com o diagrama abaixo,
que representa a matriz das formas de conexão.

N1

~
tangente N
}}
}
i r

ij i i ir i

sr r

e é paralelo na conexão
Pela construção do referencial, ωir = 0. Como N
normal, ωrα = 0. Decorre daı́ que
X X X X
0 = dωri = ωrj ∧ ωji + ωrα ∧ ωαi + ωrµ ∧ ωµi + ωrs ∧ ωsi
j α µ s
X
= ωrµ ∧ ωµi .
µ

e , é possı́vel diagonalizar simultaneamente as


Além disso, por definição de N
µ
formas quadráticas II em cada ponto de U .
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 111

Vamos mostrar que as conclusões acima implicam em que as formas ω rµ


são nulas em U . Daı́ se segue que N1 é paralelo na conexão normal e o
Teorema decorre do Teorema 1.
Para mostrar que as formas ωrµ são nulas, procederemos de maneira
análoga ao do Teorema 2. Seja q ∈ U e modifique a parte tangente do
referencial {eA } de modo a diagonalizar as segundas formas quadráticas
II µ em q. Portanto, em q, ωµi = aµi ωi , onde aµi é o i-ésimo valor próprio
de IIqµ . Omitindo a indicação de q, por conveniência, e usando as expressões
anteriores, obteremos
X X µ
0= ωrµ ∧ ωµi = − ai ωrµ ∧ ωi .
µ µ

Portanto, existem reais ci tais que


X µ
ai ωrµ (ej ) = δij cj ,
µ

isto é,
P
X X ωrµ (ej )eµ
δij cj ei = ωrµ (ej )aµi ei = − ωrµ (ej )Aµ (ei ) = −A µ (ei ).
µ µ

Decorre daı́,
P por minimalidade, que ci = 0, para todo i.

Logo, ωrµ (ej )eµ ∈ (N1 ) , onde ωrµ = 0 em q. Como q é arbitrário,
µ
ωrµ = 0 em U , o que conclui a demonstração do Teorema.

Um fato curioso é que a curvatura normal de uma imersão está ligada


com uma generalização da curvatura seccional que passamos a descrever.
Para isto precisamos de alguns lemas.
Lema 5. Seja V um espaço vetorial com um produto interno h , i. Se A e
B são transformações lineares auto-adjuntas de V então [A, B] = AB − BA
é uma transformação linear antisimétrica.
Demonstração: Se x, y ∈ V , teremos que hAx, yi = hx, Ayi e hBx, yi =
hx, Byi. Portanto,

h[A, B]x, yi = hABx, yi − hBAx, yi


= hx, BAyi − hx, AByi
= −hx, [A, B]yi.
112 Posto e número tipo de uma imersão Seção 2.3

Lema 6. Seja M n ⊂ Qn+q e p ∈ M . Sejam P ⊂ Tp (M ) e σ ⊂ Np (M ) dois


planos orientados de Tp (M ) e Np (M ), respectivamente. Sejam {X, Y } ∈ P
e {ξ, η} ∈ σ bases positivas de p e σ, respectivamente. Então o valor de

h[Aξ , Aη ]X, Y i
0 0
(3)
(area(ξ, η))(area(X, Y ))

depende apenas dos planos orientados p e σ.


Demonstração: Seja {e1 , e2 } uma base positiva de σ. Então

ξ = a 1 e1 + a 2 e2 , A ξ = a 1 A1 + a 2 A2 ,
η = b 1 e1 + b 2 e2 , A η = b1 A1 + b2 A2 ,

onde Ae1 = A1 e Ae2 = A2 . Segue-se daı́ que


0
[Aξ , Aη ] = (a1 b2 − a2 b1 )[A1 , A2 ] = (area (ξ, η))[A1 , A2 ].

Por outro lado, seja {f1 , f2 } uma base positiva de P . Então

X = c 1 f1 + c 2 f2 ,
Y = d 1 f1 + d 2 f2 ,

donde, indicando por C a matriz antisimétrica C = [Aξ , Aη ], teremos


0
hCX, Y i = hC(c1 f1 + c2 f2 ), d1 f1 + d2 f2 i = hCf1 , f2 i(area (X, Y ))

pois hCe1 , e1 i = −he1 , Ce1 i = 0. Decorre daı́ que a expressão (3) é igual
a h[A1 , A2 ]f1 , f2 i. Como {e1 , e2 } e {f1 , f2 } são bases positivas arbitrárias,
segue-se o resultado.

Seja x : M n → Qn+q (c) uma imersão e p ∈ M . Sejam P ⊂ Tp (M )


e σ ⊂ Np (M ) planos orientados, e sejam {X, Y } ∈ P , {η, ξ} ∈ σ bases
positivas de P e σ, respectivamente. Pela equação de Ricci,

hRXY ξηi h[Aξ , Aη ]X, Y i
0 0
= 0 0
,
(area(X, Y ))(area(ξ, η) (area(X, Y ))(area(ξ, η))

e, pelo Lema 6, esta última expressão só depende dos planos orientados
P e σ. Vamos denotá-la por Kp (P, σ) e chamá-la de curvatura biseccional
da imersão x em p segundo os planos P e σ. No caso em que n = 2 e
q = 2, Kp (P, σ) se reduz a curvatura normal KN de x : M 2 → Q4 dada por
dω34 = −KN ω1 ∧ ω2 .
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 113

Diremos que a curvatura biseccional é constante por transporte paralelo,


se para todo p ∈ M e toda geodésica γ(t) partindo de p = γ(0) tem-se que

Kp (P, σ) = Kγ(t) (Pt , σt ),

onde Pt e σt são os transportes paralelos ao longo de γ(t) (Pt na conexão


tangente e σt na conexão normal) de P = P0 , σ = σ0 . Observe-se que
o Lema 3 significa que ∇⊥ R⊥ ≡ 0 se e só se a curvatura biseccional é
constante por transporte paralelo.
Define-se, de maneira análoga, ser a curvatura biseccional linear por
transporte paralelo, ou mais geralmente, polinomial de grau n por transporte
paralelo. Indicando por (∇⊥ )n a operação de derivação covariante normal
aplicada n vezes, um cálculo longo, porém simples, mostra que (∇⊥ )n ≡ 0
se e só se a curvatura biseccional é polinomial do grau n − 1 por transporte
paralelo.

Introduziremos agora uma generalização da segunda forma quadrática de


uma imersão. Para motivar a definição, consideremos o caso de uma curva
x : I → R3 . Se o primeiro espaço normal de x tem dimensão constante
(no caso presente, isto equivale a dizer que a curvatura de x não se anula
em ponto algum de I), é possı́vel definir a binormal de x, que envolve as
terceiras derivadas de x. Analogamente, se o primeiro espaço normal de
n+q
uma imersão x : M n → M tem dimensão constante, podemos definir o
segundo espaço normal da imersão, que envolve as derivadas terceiras de
x. Para simplificar a exposição, introduziremos a definição no caso em que
n+q
M = Rn+q ; Para o caso geral, V. M. do Carmo e N. Wallach [dCWa].
Seja x : M n → Rn+q uma imersão e suponhamos que o primeiro espaço
normal tem dimensão constante r. Vamos usar os ı́ndices:

1 ≤ i, j, k ≤ n; n + 1 ≤ α, β, γ ≤ n + r; n + r + 1 ≤ µ, λ, ν ≤ n + q;
1 ≤ A, B, C ≤ n + q.
P
Como dx = ωi ei , teremos
X
d2 x = ωi dei + parte tangente
i
X X X
= ωi ωij ej + ωi ωiα eα + ωi ωiµ eµ + parte tang.
ij iα iµ
X X
= ωi ωiα eα + parte tang. = II α eα + parte tang.
iα α
P
Decorre daı́ o fato já conhecido que a componente normal de d2 x é II α eα .
α
114 Posto e número tipo de uma imersão Seção 2.3

Analogamente,
X X X
d3 x = II α deα + dII α eα + Ai dei + parte tangente,
α α i

onde o conhecimento dos Ai não nos interessa. Como ωiµ = 0, a projeção


ortogonal de d3 x sobre o complemento ortogonal (N1 )⊥ do primeiro espaço
normal é dada por
X X¡X ¢
II α ωαµ eµ = ωi ωiα ωαµ eµ .
αµ µ αi

P
Por analogia com a segunda forma quadrática II α = ωi ωiα , que é a
i
projeção de d2 x sobre N (M ), chamaremos de terceira forma fundamental
de x na direção eµ à forma cúbica
X
III µ = ωi ωiα ωαµ .
αi

O complemento ortogonal em Np (M ) do espaço gerado pelos (eµ )p tais que


IIIpµ = 0 é chamado o segundo espaço normal (N2 )p de x em p. Observe
que (N2 )p ⊃ (N1 )p . A soma (N2 )p ⊕ Tp (M ) é chamada o segundo espaço
osculador de x em p.
O processo pode agora ser repetido sem dificuldades. Se o segundo
espaço normal tem dimensão constante, é possı́vel projetar d4 x sobre o
complementar em Np (M ) de (N2 )p , obtendo uma forma quártica que é
chamada a quarta forma fundamental de x. O complemento ortogonal em
Np (M ) do anulador de tais formas é chamado o terceiro espaço normal
(N3 )p de x em p, e assim sucessivamente. Diz-se que uma imersão é n-
regular se os espaços normais de ordem k, para todo k ≤ n, têm dimensão
constante.
As várias formas homogêneas associadas a uma imersão não são indepen-
dentes. Como exemplo, indicaremos uma relação entre as segundas formas
quadráticas e as terceiras formas fundamentais.
Proposição 2 (E. Cartan [Ca 2], pg. 378). Seja x : M n → Rn+q uma
imersão tal que o primeiro espaço normal tem dimensão constante r. Seja
{eA } um referencial local adaptado a x de modo que os eα gerem N1 , n+1 ≤
α, β, γ ≤ n + r. Sejam II α a segunda forma quadrática na direção eα , e
III µ a terceira forma fundamental na direção eµ , n+r+1 ≤ µ, λ, ν ≤ n+q.
Então
∂III µ X ∂ωαµ
=3 II α , (4)
∂ωi α
∂ω i
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 115

µ
onde ∂II µ
∂ωi , por exemplo, é definido considerando III como um polinômio
do terceiro grau nas variáveis ω1 , . . . , ωn .
P
Demonstração: Como III µ = ωi ωiα ωαµ , teremos

∂III µ X X ∂ωjα X ∂ωαµ


= ωiα ωαµ + ωj ωαµ + ωj ωjα · (5)
∂ωi α jα
∂ωi jα
∂ωi

Vamos mostrar que as três parcelas de (5) são iguais.


P α ∂ωjα
Em primeiro lugar, como ωjα = hjk ωk , temos que ∂ωi = hα
ji , donde
k

X ∂ωjα X
ωj = hα
ij ωj = ωiα (6)
j
∂ωi j

o que mostra que as duas primeiras parcelas de (5) são iguais.


Em seguida, observe que
X X X X
0 = dωiµ = ωij ∧ ωjµ + ωiα ∧ ωαµ + ωiλ ∧ ωλµ = ωiα ∧ ωαµ .
j α λ α

P
Portanto, fazendo ωαµ = Aµαk ωk , teremos
k
X©X µ ª
0= hα
ij Aαk ωj ∧ ωk ,
α jk

donde X X
µ µ

ij Aαk = hα
ik Aαj ,
α α

para todo i, j, k, µ. Portanto,


X µ
X µ
hαji Aαk = hα
jk Aαi .
α α

Decorre daı́ que


X µ
X X ∂ωjα

ji Aαk ωk = hα
ji ωαµ = ωαµ
α
∂ωi α
αk
X µ
X
= hα
jk Aαi ωk = ωjα Aµαi
αk α
X ∂ωαµ
= ωjα ,
α
∂ωi
116 O Teorema de Allendoerfer. Curvatura total de uma imersão. Seção 2.4

isto é,
X ∂ωjα X ∂ωαµ
ωαµ = ωjα , (7)
α
∂ωi α
∂ωi

o que mostra
P que as duas últimas parcelas de (5) são iguais. Notando que
II α = ωj ωjα , obteremos (4), como querı́amos.
j

Gostarı́amos de concluir esta seção com uma conjectura.

Conjectura (generalização do Teorema 3). Se x : M n → Qn+q é uma


imersão mı́nima n-regular e (∇⊥ )n R⊥ ≡ 0, então x : M n → Qn+ρ , onde ρ
é a dimensão do n-ésimo espaço normal.

Observação 2. Em sua tese de Doutorado no IMPA (1980), Marcos Da-


jczer obteve uma série de teoremas sobre redução de codimensão entre
os quais se encontra a prova de uma generalização de conjectura acima
(V. [Da 2], V. também [Da 1]).

Observação 3. Existe um teorema de redução de codimensão do qual se


conclue o seguinte: Se x : M n → Qk (c) × R é uma imersão isométrica e
existe um subfibrado V d , de dimensão d < k, do fibrado normal tal que
W = T M ⊕ V é invariante pelo tensor curvatura R do espaço ambiente
no sentido que quando campos X, Y, Z ∈ W temos que R(X, Y )Z e W ,
então existe uma variedade totalmente geodésica S d de Qk (c) × R tal que
x(M k ) ⊂ S d .
O teorema, em verdade, se aplica a espaços ambientes mais gerais, man-
tida a condição de invariância pela curvatura. Para detalhes V. ([ET], Teo-
rema 2). Não sabemos se o caso particular no qual Qk (c) × R é o espaço
ambiente pode ser demonstrado com os métodos desta Seção.

2.4 O Teorema de Allendoerfer. Curvatura total de uma


imersão. O Teorema de Chern e Lashof
Vimos na Seção 2.2 que se a segunda forma quadrática de uma hipersu-
perfı́cie tem posto maior ou igual a três, então a hipersuperfı́cie está inteira-
mente determinada por sua métrica induzida, a menos de um movimento
rı́gido (Teorema de Beez). Na Seção 2.3 introduzimos a noção de número
tipo de uma imersão x : M n → Qn+q que generaliza a noção de posto de
uma hipersuperfı́cie. Nesta Seção demonstraremos um análogo do Teorema
de Beez para codimensão arbitrária.
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 117

Teorema 1 (Allendoerfer). Sejam x, x0 : M n → Qn+q duas imersões de


uma variedade conexa M em Qn+q tais que as seguintes condições sejam
verificadas.
1) As métricas induzidas por x e x0 em M são iguais.
2) Para todo ponto p ∈ M , posto x = posto x0 = r, e r não depende de
p.
3) Para todo ponto p ∈ M , o número tipo de x é maior ou igual a três.
Então existe um movimento rı́gido ρ de Qn+q tal que ρ ◦ x = x0 .
Demonstração: Seja p ∈ M e U ⊂ M uma vizinhança de p tal que x|U
seja injetiva e exista um referencial {eA } adaptada a x. Como a dimensão
do primeiro espaço normal é uma constante r e o número tipo τ ≥ 2,
concluı́mos, pela Proposição 1 da Seção 2.3, que ambas x e x0 são imersões
substanciais em Qn+r . Seja f = x0 ◦x−1 |x(U ). Vamos definir um referencial
adaptado {e0A } em x0 (U ) de tal modo que

f ∗ ωA
0
= ωA , f ∗ ωAB
0
= ωAB . (1)

A definição de {e0A } será feita em várias etapas. Primeiro, definimos


a parte tangente por e0i = df (ei ). Como f é uma isometria, f ∗ ωi0 = ωi ,
f ∗ ωij
0
= ωij . A parte normal e0α será definida provisoriamente de maneira
arbitrária; nosso objetivo é mostrar que é possı́vel modificar os e0α de modo
que (1) seja satisfeita.
Como f ∗ ωij0
= ωij , teremos f ∗ dωij
0
= dωij , e portanto
¡X 0 ¢ ¡X 0 ¢
f ∗ dωij
0
= f∗ ωik ∧ ωkj0
+ f∗ 0
ωiα ∧ ωαj
k α
X X
= dωij = ωik ∧ ωkj + ωiα ∧ ωαj .
α

Decorre daı́ que, para todo i, j,


X X
f ∗ ωiα
0
∧ f ∗ ωαj
0
= ωiα ∧ ωαj . (2)
α α

Precisamos agora de um lema de álgebra linear.


0
Lema 1 (Chern). Sejam yiα , yiα , α = 1, . . . , r, i = 1, . . . , n, formas
lineares em um espaço vetorial de dimensão n. Seja τ o maior número de
linhas da matriz (yiα ) tal que as τr formas destas linhas sejam linearmente
independentes. Suponha que τ ≥ 3 e que
X X
0 0
yiα ∧ yjα = yiα ∧ yjα , (3)
α α
118 O Teorema de Allendoerfer. Curvatura total de uma imersão. Seção 2.4

para todo i, j = 1, . . . , n. Então existe uma matriz ortogonal (hβα ) tal que
X
0
yiβ = hβα yiα , β = 1. . . . , r.
α

Demonstração do Lema 1: Primeiro afirmamos que se yα , yα0 , zα e zα0


são formas lineares e:
a) yPα , zα são linearmente
P 0 independentes,
b) yα ∧ z α = yα ∧ zα0 ,
α α
então, yα0 , zα0 são também linearmente independentes e cada um dos yα0 é
combinação linear dos yβ , zβ .
Com efeito, como
¡X 0 ¢r ¡ X ¢r
yα ∧ zα0 = yα ∧ zα = cy1 ∧ · · · ∧ yr ∧ z1 ∧ · · · ∧ zr 6= 0, c 6= 0,
α α

concluı́mos que as formas yα0 , zα0 são linearmente independentes. Qualquer


uma delas, digamos, y10 , satisfaz
¡X ¢r
y10 ∧ yα ∧ zα = y10 ∧ (c0 y10 ∧ · · · ∧ yr0 ∧ z10 ∧ · · · ∧ zr0 ) = 0
α
= y10 ∧ (c y1 ∧ · · · ∧ yr ∧ z1 ∧ · · · ∧ zr ),

e portanto é uma combinação linear de yβ , zβ , o que prova a afirmação feita.


0
Considere agora as formas lineaes yiα , yiα do enunciado do lema. Como
τ ≥ 3, podemos supor que as formas

y1α , y2α , y3α

são linearmente independentes. Então, fazendo em (3) i = 1, j = 2 e i = 1,


j = 3, e usando a afirmação inicial, obteremos
0
y1α = comb. lin. y1β , y2γ ,
0
y1α = comb. lin. y1β , y3δ , γ, δ = 1, . . . , r.

Como as formas y1β , y2γ , y3δ são linearmente independentes, conclui-se que
0
y1α depende apenas de y1β , isto é,
X
0
y1α = kαβ y1β .
β

Analogamente,
X X
0 0
y2α = `αβ y2β , y3α = mαβ y3β .
α α
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 119

Indiquemos com K = (kαβ ), L = (`αβ ), M = (mαβ ). Como


X X X
0 0
y1α ∧ y2α = kαβ `αγ y1β ∧ y2γ = y1α ∧ y2α ,
α αβγ α
∗ ∗
concluı́mos que K L = I, onde K indica a matriz transposta de K e I é a
matriz identidade. Analogamente, L∗ M = I, M ∗ K = I. Isto implica que
K, L e M são matrizes ortogonais e K = L = M . Portanto, para i = 1, 2, 3,
X
0
yiβ = kβα yiα .
β

Finalmente, como para todo j,


X X
0 0
yiα ∧ yjα = yiβ ∧ yjβ ,
α β

teremos, para i = 1, 2, 3
X XX X ¡X ¢
0 0
yiα ∧ yjα = kβα yiα ∧ yjβ = yiα ∧ kβα yjβ ,
α β α α β

ou seja X© X
¡ 0
¢ª
yiα ∧ yjα − kβα yjβ = 0.
α β

Usando o lema de Cartan e o fato que τ ≥ 2, concluı́mos que, para todo j,


X
0
yjα = kβα yjβ ,
β

o que termina a demonstração do lema.

Voltemos à demonstração do Teorema de Allendoerfer. Aplicando o


lema, obteremos, para todo q ∈ U ,
X
f ∗ ωiβ
0
= kβα ωiα .
α

É fácil ver que a matriz kβα varia diferenciavelmente com q. Suponhamos


efetuada a transformação kβα em N (U ), para todo q ∈ U , e indiquemos
o referencial normal assim obtido com a mesma notação anterior. Assim,
f ∗ ωiα
0
= ωiα .
Como f ∗ ωiα
0
= ωiα , teremos que f ∗ (dωiα
0
) = dωiα , e portanto
¡ X ¢ ¡X 0 ¢
f ∗ (dωiα
0
) = f∗ 0
ωik 0
∧ ωkα + f∗ 0
ωiβ ∧ ωβα
k β
X X
= dωiα = ωik ∧ ωkα + ωiβ ∧ ωβα ,
k β
120 O Teorema de Allendoerfer. Curvatura total de uma imersão. Seção 2.4

donde, pelo que acabamos de provar,


X X
f ∗ ωiβ
0
∧ f ∗ ωβα
0
= ωiβ ∧ ωβα ,
β β

isto é,
X
ωiβ ∧ (f ∗ ωβα
0
− ωβα ) = 0.
β

Como τ ≥ 2, podemos supor que ω1α , ω2α são linearmente independentes.


Pelo lema de Cartan,

f ∗ ωβα
0
− ωβα = comb. lin. ω1γ
f ∗ ωβα
0
− ωβα = comb. lin. ω2γ ,

donde f ∗ ωβα0
= ωβα . Portanto, dado um referencial adaptado do {eA } em
x(U ), existe um referencial adaptado {e0A } em x0 (U ) tal que (1) se verifica.
Pelo teorema de unicidade local da Seção 1.10, existe um movimento
rı́gido ρU de Qn+r que leva x(U ) em x0 (U ). Como o primeiro espaço normal
tem dimensão constante r, a imersão é substancial em cada aberto U ⊂
M . Decorre daı́ que ρU é único, e que, portanto, existe ρ = ρU tal que
ρ ◦ x = x0 .

Observação 1: A hipótese sobre o número tipo no Teorema 1 é certa-


mente uma condição muito forte. Entretanto, teoremas de unicidade em
codimensão arbitrária são extremamente raros, e, sem introduzir hipóteses
globais, o teorema de Allendoerfer parece ser o único conhecido. Para um
teorema de unicidade global em codimensão arbitrária V. J.D. Moore [Mo].

Observação 2: Uma outra prova do Teorema de Allendoerfer, junto com


algumas observações pertinentes, pode ser encontrada em ([Da 1], Cap. 6).

Seja agora x : M n → Qn+q uma imersão e suponhamos M orientada. Na


Seção 2.1 introduzimos, para o caso em que q = 1, a curvatura de Gauss-
Kronecker como o determinante da (única) segunda forma quadrática de x.
No caso presente, a curvatura de Gauss-Kronecker se generaliza da seguinte
maneira.
Seja p ∈ M e ν ∈ Np (M ) um vetor normal unitário. A curvatura de
Lipschitz-Killing G(p, ν) de x no par (p, ν) é por definição

G(p, ν) = (−1)n det Aνp ,

onde Aνp é a aplicação linear auto-adjunta associada a IIpν .


Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 121

No caso em que Qn+q é o espaço euclideano Rn+q , a curvatura G(p, ν)


possui duas interpretações geométricas interessantes, que passamos a apre-
sentar.
Para a primeira delas, seja L(ν) = Tp (M ) ⊕ Rν, isto é, L(ν) é o espaço
gerado por Tp (M ) e ν. Então G(p, ν) é a curvatura de Gauss-Kronecker em
p da hipersuperfı́cie obtida projetando ortogonalmente x(M ) sobre L(ν).
Para provar este fato, basta mostrar que IIpν é a segunda forma quadrática
da hipersuperfı́cie x0 : M → L(ν) ⊂ Rn+q , onde x0 é a projeção ortogonal
de x sobre L(ν). Para isto, escolha um referencial adaptado {eA } em uma
vizinhança U ⊂ M de p com en+1 = ν. Observe que, para todo r ∈ U ,

x0 (r) − x(r) = an+2 (r)(en+2 )p + · · · + an+q (r)(en+q )p , (4)


0
x (r) − x(p) = comb. lin. (e1 )p , . . . , (en+1 )p , (5)

onde aλ (r), λ = n + 2, . . . , n + q, são funções diferenciáveis em U . Decorre


de (4) que
aλ = hx0 (r) − x(r), (eλ )p i.

Portanto, de (4) e (5), concluı́mos que


X
dx0 = dx + daλ (eλ )p
λ
X
= dx + hdx0 − dx, (eλ )p i(eλ )p
λ
X
= dx − hdx, (eλ )p i(eλ )p ,
λ

donde X
d2 x 0 = d 2 x − hd2 x, (eλ )p i(eλ )p .
λ

Assim

II ν = hd2 x, νi = hd2 x, en+1 i = hd2 x0 , en+1 i = hd2 x0 , νi,

como havı́amos afirmado.


A segunda interpretação de G(p, ν) depende de estender a definição da
aplicação normal de Gauss para o caso x : M n → Rn+q . Uma maneira
possı́vel (porém não a única) de introduzir uma tal generalização é a seguinte.
Seja x : M → Rn+q uma imersão. Seja N (M ) o fibrado normal de x e
N0 (M ) o fibrado normal unitário correspondente, isto é,

N0 (M ) = {(p, ν) : p ∈ M, ν ∈ Np (M ), (ν) = 1}.


122 O Teorema de Allendoerfer. Curvatura total de uma imersão. Seção 2.4

Seja S n+q−1 ⊂ Rn+q a esfera unitária do espaço euclidiano Rn+q . A


aplicação ν̃ : N0 (M ) → S n+q−1 dada por ν̃(p, ν) = ν é chamada a aplicação
normal de x. Como N0 (M ) é uma variedade diferenciável de dimensão
n + q − 1, é possı́vel falar no determinante de dν̃. Afirmamos que
G(p, ν) = (−1)n det dν̃(p,ν) .
Para provar este fato, observe primeiro que T(p,ν) (N0 (M )) contém Tp (M )
e que a restrição de dν̃(p, ν) coincide com a aplicação linear auto-adjunta
Aνp associada a IIpν . Com efeito, se v ∈ Tp (M ) temos, diferenciando a
expressão
hdxp (v), νi = hdx(v), ν̃(p, ν)i = 0
que
IIpν = hd2 xp (v, v), νi
= hdxp (v), dν̃p,ν) (v)i.
Além disto, para todo vetor unitário normal η, temos que dν(p,ν) (η) = η,
isto é, a aplicação dν(p,ν) restrita ao complemento ortogonal de Tp (M ) em
T(p,ν) (N0 (M )) é a identidade. Juntando estes fatos, concluı́mos
(−1)n det dν̃(p,ν) = (−1)n det Aνp = G(p, ν),
o que prova a afirmação feita.
A vantagem desta segunda interpretação é que ela é global. Como no
caso de hipersuperfı́cies, a existência da aplicação normal tem fortes im-
plicações topológicas. Mesmo no caso de curvas em R 3 (n = 1, q = 2),
onde, indicando por k a curvatura usual da curva, temos
Z Z 2π
|G(p, ν)| = |k cos θ| = 4|k|,
N0 (p) 0

e é possı́vel provar o seguinte teorema, devido a Fenchel.


Teorema (Fenchel). Seja C 1 ⊂ R3 uma curva compacta em R3 e seja k a
sua curvatura. Então
Z Z Z
1
|k| = |G(p, ν)| ≥ 2π,
C C N0 (p) 4

e a igualdade ocorre se e só se C for uma curva plana convexa.


Para uma demonstração, V. M. do Carmo [dC 4].
Motivados pelo teorema de Fenchel, S.S. Chern e R. Lashof introduziram
em [ChLa 1] o conceito de curvatura total K de x : M n → Rn+q por
Z Z
K= |G(p, ν)|dσ dm,
M N0 (p)
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 123

onde dσ indica a forma volume da esfera N0 (p) e dm indica a forma volume


de M . Com esta definição, é possı́vel generalizar o teorema de Fenchel da
maneira seguinte.
Teorema 2 (Chern, Lashof [ChLa 1]). Seja x : M n → Rn+q uma imersão
de uma variedade M n conexa, compacta e orientada, e seja cn+q−1 o volume
da esfera unitária de Rn+q . Então a curvatura total de x é maior ou igual
a 2cn+q−1 , e a igualdade ocorre se e só se x(M n ) ⊂ Rn+1 e x(M ) é a
fronteira de um corpo convexo de Rn+1 .
Demonstração: Seja ν̃ : N0 (M ) → S n+q−1 a aplicação normal de x. Ob-
serve primeiro que todo ponto ν0 ∈ S n+q−1 é coberto pelo menos duas vezes
por ν̃. Com efeito, a função h : M → R dada por h(x) = hx(p), ν0 i tem,
por compacidade, pelo menos dois pontos crı́ticos distintos p, q ∈ M ; é claro
que dois dos quatro pontos (p, ±ν0 ), (q, ±ν0 ) são levados por ν̃ em ν0 , o
que prova a afirmação feita. Como a curvatura total de x é o volume da
imagem por ν̃ dos pontos não crı́ticos de N0 (M ) e, pelo teorema de Sard,
um tal conjunto é aberto e denso em S n+q−1 , concluı́mos que
Z Z
K= |G(p, v)| dσ dm ≥ 2cn+q−1 ,
M N0 (p)

que é a desigualdade afirmada no enunciado do teorema.


Para tratar o caso da igualdade, precisaremos de um lema.
Lema 2. Se a curvatura total de x : M n → Rn+q é igual a 2cn+q−1 , então
existe uma subvariedade linear Rn+1 de Rn+q tal que x(M n ) ⊂ Rn+1 e a
curvatura total de x : M n → Rn+1 é 2cn .
Demonstração do Lema 2: Podemos supor que q ≥ 2. Seja (p, ν0 (p)) ∈
N0 tal que G(p, ν0 ) 6= 0. Escolha um referencial local em uma vizinhança
de p de modo que (en+p )p = ν0 . Seja σ ⊂ Np o subespaço de dimensão dois
gerado por {en+q , en+q−1 }. Seja ν ∈ σ um vetor normal unitário dado por

ν(θ) = ν = en+q cos θ + en+q−1 sen θ.

Como

G(p, ν) = (−1)n det dν̃(p,ν)


= (−1)n det Aνp
= (−1)n det(cos θ An+q
p + sen θ Apn+q−1 ),

concluı́mos que, fixado p e fazendo ν(θ) variar em σ, G(p, ν) é um polinômio


em cos θ e sen θ. Decorre daı́ G(p, ν) = f (θ) é uma função analı́tica de θ
que não se anula identicamente pois f (0) = G(p, ν0 ) 6= 0.
124 O Teorema de Allendoerfer. Curvatura total de uma imersão. Seção 2.4

Vamos admitir que x(M ) não está contida em um hiperplano de R n+q


e obter uma contradição.
Seja Hθ o hiperplano tangente em x(p) perpendicular a ν(θ). Como
x(M ) não está contido em um hiperplano, existem um hiperplano tangente
Hθ1 e pontos q1 , q2 ∈ M tais que x(q1 ) e x(q2 ) estão em lados opostos de
Hθ1 . Como f (θ) é analı́tica e não é identicamente nula, existe θ2 , perto
de θ1 , tal que f (θ2 ) = G(p, ν(θ2 )) 6= 0, e x(q1 ), x(q2 ) ainda estão em lados
opostos de Hθ2 . O fato de ser G(p, ν(θ2 )) 6= 0 implica que ν̃ é um difeo-
morfismo em uma vizinhança W de (p, ν(θ2 )) ∈ N0 (M ). Podemos escolher
W suficientemente pequena para que se (p0 , ν 0 ) ∈ W , então x(q1 ) e x(q2 )
estão ainda em lados opostos do hiperplano tangente a x(p0 ) e perpendi-
cular a ν 0 . A função altura hx, ν 0 i em M tem então três pontos crı́ticos:
um máximo, um mı́nimo, e p0 ; pela construção feita, p é certamente dis-
tinto do máximo e do mı́nimo. Decorre daı́ que uma vizinhança do ponto
ν̃(p, ν(θ2 )) ∈ S n+q−1 é coberta por ν̃ pelo menos três vezes. Como, pelo
argumento da desigualdade, cada ponto de S n+q−1 é coberto por ν̃ pelo
menos duas vezes, concluı́mos que a curvatura total é estritamente maior
do que 2cn+q−1 . Isto é uma contradição, e mostra que x(M ) está contido
em um hiperplano Rn+q−1 de Rn+q .

Vamos agora mostrar que a curvatura total da nova imersão x0 : M →


n+q−1
R é 2cn+q−2 . Para isto, indicaremos com uma linha as entidades
relativas à imersão x0 . Seja ω um vetor unitário perpendicular ao hiperplano
Rn+q−1 , e seja S n+q−2 a esfera unitária de Rn+q−1 . Podemos pensar em
S n+q−2 como o equador de S n+q−1 , onde ω é, digamos, o pólo norte. Seja
N0 (M )0 o fibrado normal unitário de x0 . Observe que N0 (M )0 ⊂ N0 (M ) e
que ν̃(N0 (M )0 ) ⊂ S n+q−2 . Seja ν̃ 0 a restrição de ν̃ a N0 (M 0 ). Basta provar
que a imagem inversa de um valor regular de ν̃ 0 contém exatamente dois
pontos.
Suponhamos o contrário, isto é, que existe um valor regular de ν̃ 0 cuja
imagem inversa contém pelo menos três pontos. Então existe um aberto
U ⊂ S n+q−2 tal que para todo µ ∈ U existem pelo menos três pontos de M ,
p1 , p2 , p3 , que têm µ como vetor normal. Todos os vetores unitários que
pertencem ao grande cı́rculo de S n+q−1 determinado por µ e ω são então
normais a x(M ) em x(p1 ), x(p2 ), x(p3 ). Portanto o conjunto formado pela
união de tais grandes cı́rculos é um aberto de S n+q−1 que é coberto por ν̃
pelo menos três vezes. Decorre daı́ que a curvatura total de x é maior do
que 2cn+q−1 , uma contradição.

Conclui-se do que foi visto que x(M n ) ⊂ Rn+q−1 e que a nova imersão
0
x : M n → Rn+q−1 tem curvatura total 2cn+q−2 . Por indução em q, obtém-
se que x(M n ) ⊂ Rn+1 e que a curvatura total da nova imersão é 2cn .
Cap. 2 Imersões em um espaço de curvatura constante 125

Voltemos à demonstração do Teorema 2. Como a curvatura total de


x : M n → Rn+1 é 2cn , a imagem inversa de um valor regular da aplicação
normal de Gauss ν̃ : N0 (M ) → S n de x contém exatamente dois pontos.
Portanto, a função altura h(p) = hx(p), νi, p ∈ M , relativa a um valor regu-
lar ν de ν̃ possui exatamente dois pontos crı́ticos. Segue-se da Observação
6 do Teorema 3 da Seção 2.1 que x é um mergulho e x(M n ) ⊂ Rn+1 é a
fronteira de um corpo convexo.
Reciprocamente, suponha que x é um mergulho de M n em Rn+1 e x(M )
é a fronteira de um corpo convexo. Se ν é um valor regular da aplicação
normal ν̃ : N0 (M ) → S n , então a curvatura de Gauss-Kronecker K nos
pontos da imagem inversa ν̃ −1 (ν) é não nula. Afirmamos que ν̃ −1 (ν) contém
exatamente dois pontos p1 e p2 . Com efeito, suponha que existe um terceiro
ponto p3 . Então, por convexidade, dois dos hiperplanos tangentes em x(pi ),
i = 1, 2, 3 terão que coincidir. Seja Ti o hiperplano tangente em x(pi ) e
digamos que T1 = T2 = T . Por convexidade, e como T é um hiperplano
tangente, x(M ) contém o segmento x(p1 ) x(p2 ). Mas isto contradiz o fato
de ser K(p1 ) 6= 0, e prova a afirmação feita. Decore daı́ que a curvatura
total de x é 2cn , e isto termina a demonstração do Teorema.

Observação: O Teorema de Chern-Lashoff deu origem a uma extensa lite-


ratura em Geometria Diferencial. A noção de curvatura total se relaciona
naturalmente com a teoria dos pontos crı́ticos de funções diferenciáveis em
variedades (Teoria de Morse). Para maiores detalhes V. as notas de L.
Rodrı́guez [Ro 2]. Veja-se também o artigo de Sunday [Su].

Uma condição local que implica, em variedades compactas, na mesma


conclusão do Teorema de Chern-Lashoff é dada no teorema seguinte.

Teorema 3 (do Carmo, Lima [dCLi 1]). Seja x : M n → Rn+q uma imersão
de uma variedade compacta e conexa M . Suponhamos que as segundas
formas quadráticas sejam semi-definidas (isto é, seus valores próprios não
nulos têm o mesmo sinal) e que, para algum (p, ν0 ) ∈ N0 (M ), se tenha que
IIpν é positiva definida. Então, existe uma subvariedade linear R n+1 ⊂ Rn+q
tal que x : M n → Rn+1 , x é um mergulho e x(M ) ⊂ Rn+1 é a fronteira de
um corpo convexo.

Demonstração: Para todo ν ∈ S n+q−1 defina a função altura h : M → R


por h(p) − hx(p), νi, p ∈ M . Observe que se ν é um valor regular de
ν̃ : N0 (M ) → S n+q−1 , então o Lema 2 da Seção 2.1 ainda é válido, isto é, os
pontos crı́ticos de h não-degenerados e são pontos de máximo ou de mı́nimo
de h. A demonstração é a mesma que a do Lema 2 da Seção 2.1. Pelo Lema
3 da Seção 2.1, h possui exatamente dois pontos crı́ticos.
126 O Teorema de Allendoerfer. Curvatura total de uma imersão. Seção 2.4

Observe agora que a primeira parte do Lema 2 do Teorema de Chern-


Lashoff depende apenas da existência de um ponto (p, ν0 ) com G(p, ν0 ) 6= 0,
e do fato da função altura relativa a um valor regular de ν̃ possuir apenas
dois pontos crı́ticos. Como tais condições são verificadas no nosso caso,
concluı́mos, por indução, que existe uma subvariedade linear R n+1 de Rn+q
tal que x : M n → Rn+1 e x ainda satisfaz as hipóteses do Teorema 3. Mas,
no caso de x : M n → Rn+1 , as hipóteses do teorema significam que a cur-
vatura seccional da métrica induzida de M é não-negativa. Pelo Teorema
da Seção 2.1, x é um mergulho e x(M ) ⊂ Rn+1 é a fronteira de um corpo
convexo.

Observação: O Teorema 3 foi generalizado por L. Jonker [Jo 1] para o


caso de ser M completa.
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