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PROCEDIMENTOS OPERACIONAIS DE UMA INDÚSTRIA

FARMACÊUTICA: PROPOSTA DE CRITÉRIOS DE ELABORAÇÃO


ELLEN CRISTINE PINEZE1, RITA DE CASSIA CONSONI1 e LUÍS CARLOS MARQUES2
1
Acadêmicas da habilitação farmacêutico industrial; 2Professor do Departamento de Farmácia e
Farmacologia – Universidade Estadual de Maringá

1. INTRODUÇÃO
As indústrias farmacêuticas no Brasil têm se desenvolvido muito nas últimas décadas.
Devido este processo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA, órgão responsável
pela determinação de normas e procedimentos técnicos relacionados a medicamentos, dentre outros
produtos, vem tentando assegurar a qualidade, segurança e eficácia dos medicamentos produzidos.
Nesse contexto, a Resolução RDC nº 134 (Brasil, 2001) foi instituída com o intuito de
aperfeiçoar as boas práticas de fabricação dos medicamentos e colocar as indústrias brasileiras nos
padrões internacionais. Quando falamos em medicamentos, sabemos que qualquer falha no
processo pode resultar em sérios prejuízos para a saúde da população, bem como para a própria
indústria produtora pelo impacto negativo que causa frente ao mercado consumidor. Isto mostra que
os requisitos de qualidade de um produto estão inteiramente relacionados com todos os
procedimentos operacionais que são executados dentro de uma empresa.
No entanto, várias dificuldades existem para o atendimento a todo o conjunto de detalhes,
normas e regras a seguir em termos de boas práticas de fabricação. E geralmente outra dificuldade
relaciona-se aos processos de fiscalização repentinos, quando um grande número de exigências
precisa ser atendido levando a um alto dispêndio econômico num curto intervalo de tempo. Deve
ser lembrado que mudanças geram custos, e nem toda empresa possui recursos financeiros
suficientes para isto.
Do conjunto de dados constantes da legislação, destacam-se os chamados procedimentos
operacionais padrão (POPs), os quais constituem-se em requisitos considerados essenciais para o
estabelecimento e cumprimento das boas práticas de fabricação. Os Pops devem existir nas
empresas e contemplar todas as etapas produtivas, atividades prévias e posteriores de modo que seja
possível planejar adequadamente o que se pretende fazer e se consiga, na seqüência, executar esse
planejamento de forma correta. Tudo isso se desdobra em inúmeros procedimentos específicos,
adaptados à cada empresa e bem elaborados, no sentido de ser um instrumento benéfico às
atividades cotidianas.
Quando se busca a elaboração de tais procedimentos, geralmente a base de literatura acaba
sendo a própria resolução, a qual por ter formato genérico, pouco esclarece nos termos detalhados
que tais procedimentos precisam atender. A literatura farmacêutica acessível ao dia a dia
profissional também é rara e nem sempre contempla o conjunto de necessidades que a realidade das
empresas exige, fatores que acabam transformando essa fase de elaboração dos procedimentos
operacionais num período de dificuldades para as indústrias farmacêuticas. Portanto, dentro do
amplo conceito de boas práticas de fabricação, nota-se que a elaboração de Pops constitui-se num
ponto chave para a sua consecução, item no entanto que geralmente é pouco enfatizado em cursos e
treinamentos.
Em âmbito universitário, os cursos de Farmácia – habilitação indústria farmacêutica,
invariavelmente abordam o tema BPF, com repasse das normas vigentes e seu detalhamento como
possível. De modo geral, no entanto, os professores dessas disciplinas são acadêmicos de carreira
com pós-graduações na área de Tecnologia Farmacêutica ou afins e normalmente com pouca – ou
nenhuma – vivência na indústria. Assim, os conceitos acabam restringindo-se a pontos teóricos
globais, nos quais nenhum destaque se dá à importância dos Pops nem a como elaborá-los.
Nesse contexto, este trabalho foi realizado no âmbito da habilitação industrial do curso de
Farmácia da Universidade de Maringá, com o objetivo de colocar as acadêmicas envolvidas em
contato real com as necessidades da indústria farmacêutica em termos de Pops. Assim, buscou-se a
complementação da formação acadêmica das alunas bem como a aproximação dos docentes com a
realidade da profissão, de modo que a academia reflita, ao máximo, o conteúdo de efetiva aplicação
prática.

2. OBJETIVOS
Pela falta de literatura acessível e condensada sobe o assunto, o presente trabalho buscou
relatar a experiência adquirida na elaboração dos Procedimentos Operacionais Padrão (POP’s) de
uma indústria farmacêutica e apontar as dificuldades dessa elaboração, numa etapa em que a
empresa ainda se encontra em fase de aprovação da planta para posterior construção.

3. METODOLOGIA
A partir de um projeto de construção de uma indústria de medicamentos fitoterápicos
vinculada ao Departamento de Farmácia e Farmacologia da UEM e aproveitando o período
curricular ligado às disciplinas de tecnologia farmacêutica e de tecnologia de fitoterápicos,
delineou-se o desenvolvimento dos procedimentos operacionais padrão da futura indústria, visando
a sua estruturação para o atendimento às exigências da legislação em vigor para esta área.
Para se ter uma noção prévia sobre o assunto, foram realizadas visitas a Laboratórios
Farmacêuticos, pois para elaboração de tais procedimentos é preciso que se tenha um amplo
conhecimento de cargos, funções, estrutura, equipamentos e atividades da indústria. Desta forma,
foi possível acompanhar os processos que estavam sendo realizados na empresa e verificar se os
Pops eram realmente consultados pelos funcionários e seguidos como normas por estes.
Como base inicial para esse desenvolvimento, buscou-se cópias de procedimentos de outras
empresas farmacêuticas, fornecidas por profissionais conhecidos dos pesquisadores. Em paralelo, as
acadêmicas envolvidas no processo foram enviadas para um estágio de 30 dias em duas indústrias
farmacêuticas do Rio Grande do Sul, com o objetivo de promover um vivenciamento da realidade
das mesmas focadas particularmente na questão das boas práticas e dos formatos e conteúdos dos
procedimentos operacionais.

4. RESULTADOS
4.1- O que e um POP ?
Segundo a RDC 134, “POP’s são procedimentos escritos e autorizados que dão instruções
detalhadas para a realização de operações específicas na produção de produto farmacêutico e outras
atividades de natureza geral”. Em complemento, pode-se dizer que Procedimentos Operacionais
Padrão (POP’s) são normas estabelecidas e descritas por grupo de farmacêuticos, com o objetivo de
padronizar todos os processos executados em um Laboratório Industrial Farmacêutico, assegurando
a qualidade de todo procedimento e, conseqüentemente, do produto final. A importância dos POP’s
é a garantia de que todos os procedimentos serão realizados da mesma maneira independente do
operador. Devem existir procedimentos para descrever as atividades de todos os setores da empresa.
Hoje em dia o treinamento de pessoal não é suficiente para garantir que as atividades sejam
executadas de forma padronizada. O necessário é que todos os POP’s que possam ocorrer dentro de
uma indústria estejam descritos, para que sejam lidos antes de cada execução pelos respectivos
funcionários e, então, depois de descritos os POP’s que se faz o treinamento das funções com os
funcionários responsáveis por cada atividade. Da mesma forma que uma determinada atividade
estiver descrita no POP ela deverá ser realizada. Como um exemplo, a limpeza e sanitização da sala
de envase de líquidos deverão seguir todas as normas descritas no Procedimento Operacional de
Limpeza de Sala de Envase de Líquidos, o que embora seja teoricamente óbvio, nem sempre ocorre
adequada ou completamente.
Em cada setor do laboratório devem estar disponíveis os POP’s que competem àquele setor
na sua versão mais atualizada, além de livros textos, artigos e manuais que poderão ser usados como
suplemento. A Garantia da Qualidade e/ou o Controle de Qualidade tem como uma das
responsabilidades aprovar os POP’s para cada processo de produção e de Controle de Qualidade
(RDC 134).

4.2- Como elaborar um POP ?


A elaboração dos POP’s pode ser realizada de diversas maneiras, dependendo se a empresa
está em fase de planejamento ou em pleno funcionamento. Quando se tem uma indústria que ainda
se encontra em fase de planejamento, todo esse processo de elaboração de POP’s fica um pouco
mais complicado, haja visto que todas as atividades, cargos, equipamentos, mobiliário, fluxo, etc.
ainda terão que ser determinados ou a sua definição teórica pode não ser exeqüível praticamente.
No caso de empresas em funcionamento, o que se constatou na prática foi que a melhor
maneira é fazer com que cada funcionário responsável pela sua função escreva o procedimento por
ele realizado. Então, estes deverão ser corrigidos pelos farmacêuticos responsáveis de maneira que
sejam realizados corretamente. Neste caso, os POP’s devem ser redigidos seguindo o Manual de
Boas Práticas de Fabricação e a RDC 134, de maneira que contenha os requisitos básicos para a
execução de um procedimento. É provável que várias revisões tenham que ser feitas nestes POP’s,
principalmente, quando se observarem alterações na prática da execução de processos,
equipamentos, limpeza, manipulação, expedição, embalagem e testes do controle de qualidade. Tais
revisões também poderão ser realizadas quando houver alterações das funções de setores como
administrativo e de vendas, assim como quaisquer outras atividades desenvolvidas dentro da
empresa. Isto será realizado com o auxílio dos farmacêuticos responsáveis por cada setor
juntamente com os funcionários que estiverem executando os procedimentos.
Devemos enfatizar que não somente a elaboração dos POP’s é necessária para a
padronização dos processos. O treinamento periódico dos funcionários pelo Farmacêutico
Responsável Técnico e pelo Farmacêutico Responsável pela Produção é de extrema importância
para a manutenção do rigor das atividades da maneira como estão descritas nos POP’s, bem como a
fiscalização durante o desenvolvimento dessas funções.

4.3- Dificuldades
De acordo com a experiência adquirida sobre o assunto, a maior dificuldade encontrada na
elaboração dos POP’s foi desenvolver um modelo prático, de fácil entendimento e boa aceitação
pelos funcionários executores dos procedimentos. Estes requisitos são ferramentas imprescindíveis
para a execução dos processos, de forma a garantir as Boas Práticas de Fabricação e qualidade do
produto final.

4.4- Modelo de pop


A melhor proposta encontrada após a observação de vários modelos contém os seguintes
itens:
Cabeçário: Deve conter:
 logomarca da empresa;
título do procedimento a ser descrito;
data de emissão do POP;
data de revisão: normalmente feita após 12 meses;
número de páginas do POP descrito; e
edição: número de revisões já feitas.
Objetivo: deve descrever a que se destina o POP.
Âmbito de Aplicação: define em qual setor será realizado o POP.
Responsabilidades: descreve as responsabilidades dos farmacêuticos e/ou funcionários que
executarão o POP descrito.
Documentos de Referência: define os materiais que servirão de consulta e apoio.
Recursos necessários: determina a utilização de materiais, planilhas e etiquetas utilizadas
durante o processo.
Procedimento: descreve detalhadamente de forma numerada todas as etapas e procedimentos
para a execução da atividade a ser realizada.
Manutenção preventiva: define quando deverá ser realizada a manutenção dos equipamentos
relacionados à execução do processo.
Roteiro para soluções de problemas: descreve quais problemas podem acontecer durante a
realização da atividade, qual a causa e a possível solução a ser tomada.
O final da primeira página de cada POP deverá conter os nomes dos responsáveis pela
elaboração, revisão e aprovação do POP.
Embora este exemplo possa ser seguido ou utilizado como roteiro inicial básico, cada indústria
poderá desenvolver seu próprio modelo de POP desde que o mesmo seja prático, de fácil
entendimento e boa aceitação pelos funcionários executores dos procedimentos.

5. CONCLUSÕES
Com base na experiência citada, pode-se concluir que infelizmente a universidade brasileira
atual, particularmente os cursos de Farmácia, embora apresente esforços para isso, ainda não
consegue atender as necessidades do mercado em termos de preparação dos acadêmicos para o
mercado industrial farmacêutico. O exemplo usado para isso - os POP’s dentro das boas práticas de
fabricação, embora abordados nos cursos, demonstra a necessidade de complementação das
informações, de modo a preparar os acadêmicos nessa área.
Quanto à questão da literatura, verificou-se que a resolução em vigor pouco oferece de
subsídios para a elaboração dos procedimentos, havendo a necessidade de complementação com
referências adicionais. A conferência com situações reais de diversas empresas permite o
fechamento do ciclo necessário ao desenvolvimento de procedimentos exeqüíveis e de boa
qualidade.

Bibliografia

BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC nº


341 de 13 de julho de 2001. Publica as normas de boas práticas de fabricação. Diário Oficial da
União, 13 de julho de 2001.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância Sanitária. Critérios para a habilitação
de laboratório segundo os princípios das Boas Práticas de Laboratório (BPL).
Procedimento GGLAS 02/BPL. Procedimentos Operacionais da REBLAS. Brasília, 2001.
SINDICATO DA INDÚSTRIA DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS NO ESTADO DE SÃO
PAULO. Boas Práticas de Fabricação. São Paulo, Sindusfarma, 1999.
LOGOMARCA POP N
DA Emissão:
EMPRESA
NOME DO PROCEDIMENTO Revisão:
Página:

1 Objetivo e Aplicação
2 Âmbito de Aplicação
3 Responsabilidades
4 Documentos de Referência
5 Recursos Necessários
6 Procedimentos
7 Manutenção Preventiva
8 Roteiro de Soluções de Problemas

Elaborado por: Nome do Farmacêutico Aprovado por:. Nome do Farmacêutico


Responsável pela elaboração do POP. Responsável pela aprovação do POP.
Data: / / Data: / /
Revisado por: Nome do Farmacêutico Revisão no:
Responsável pela revisão do POP.
Data: / / Rever em:

Figura 1- Modelo de um POP geral.


Tabela 1- Exemplos de pops de algumas das áreas teoricamente existentes nas empresas

-Normas Gerais
-Designação de cargos e suas funções
-Normas de comportamento e higiene dos funcionários
Procedimentos Operacionais
POP GER -Serviço de Atendimento ao Consumidor
Padrão Gerais
-Recolhimento e devolução de produtos terminados
-Descarte de materiais
-Desenvolvimento de novos produtos
Procedimentos Operacionais
-Aquisição de matéria prima e materiais de acondicionamento e
POP REC Padrão de Recepção de
embalagem
Insumos
Procedimentos Operacionais -Sistema de organização e endereçamento de materiais
POP ALM
Padrão de Almoxarifado -Sistema de entrada e saída de materiais
Procedimentos Operacionais -Sistema de organização e endereçamento de produto acabado
POP APT Padrão de Almoxarifado de
Produtos Terminados -Sistema de entrada e saída de produto acabado
Procedimentos Operacionais
POP EXP -Transporte e expedição de medicamentos
Padrão de Expedição
-Normas gerais de produção
-Elaboração e utilização da Ordem de Produção
Procedimentos Operacionais -Impressão de Lote
POP PRO
de Produção -Rotulagem
-Envase
-Embalagem e acondicionamento para transporte
-Limpeza e sanitização de salas, laboratórios, ralos, janelas,
telas.
-Limpeza dos equipamentos
Procedimentos Operacionais
POP LIM -Limpeza dos materiais de apoio
Padrão de Limpeza
-Limpeza e sanitização de tubulações de transporte de água
potável, das colunas deionizadoras, e do reservatório de água
deionizada
-Calibração e ajuste de balanças
Procedimentos Operacionais
POP EQP -Operação de termômetros e termohigrômetros
Padrão de Equipamentos
- Verificação de estufas
-Métodos Gerais Analíticos do Controle de Qualidade
-Método de Análise de Material de Acondicionamento e
Embalagem
-Método de Análise de Produto Acabado

POP CQ Procedimentos Operacionais -Técnica Analítica Microbiológica


Padrão de Controle de -Certificado de Análise de Matéria-Prima Química
Qualidade -Certificado de Análise de Produto Semi Elaborado
-Certificado de Análise de Produto Terminado
-Certificado de Análise de Material de Acondicionamento
Embalagem

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